Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1276/14.1T8SLV-A.E1
Relator: MARIA JOÃO SOUSA E FARO
Descritores: CITAÇÃO EM PAÍS ESTRANGEIRO
CITAÇÃO POSTAL
FORMALIDADES
REGULAMENTO (CE) Nº 1393/2007
Data do Acordão: 11/07/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário:
I - Sendo os Réus residentes no Reino Unido, é-lhes aplicável o Regulamento (CE) nº 1393/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho de 13/11/2007, o qual prevê no seu art.º 14º que os Estados-Membros podem proceder directamente pelos serviços postais à citação de pessoas que residam noutro estado membro, por carta registada com aviso de recepção ou equivalente.
II - O Tribunal de Justiça determina que o Regulamento n.° 1393/2007 deve ser interpretado no sentido de que uma citação ou notificação de um acto que dá início à instância pelos serviços postais é válida mesmo que o aviso de recepção da carta registada que contém o acto objecto de citação ao seu destinatário tenha sido substituído por outro documento, na condição de este último oferecer garantias equivalentes em matéria de informações transmitidas e de prova.
III - Porém, não tendo o aviso de recepção sido devolvido nem resultado demonstrado que os Réus o hajam assinado ou a outro documento equivalente não se podem considerar validamente citados.
IV - Vindo subsequentemente a ser executados e deduzindo embargos invocando precisamente que não tinham intervindo no processo declarativo onde se produziu a sentença exequenda por a respectiva citação ter sido nula à luz do citado regulamento comunitário, ou seja, alegando o fundamento de oposição a que se refere o art.º729º, nº 1, alínea d) do CPC, caso venha a ser constatada a sua ocorrência, a acção executiva há-de ser julgada extinta (art.º732º, nº 4, do CPC).
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Integral:
ACÓRDÃO

I - RELATÓRIO

1. BB e mulher, CC, Executados nos autos à margem identificados, notificados que foram da sentença proferida nos autos de embargos que oportunamente deduziram, com fundamento na alínea d) do art.º 729º do CPC, e não se conformando com a mesma, que os julgou improcedentes, interpuseram recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões:
1. Os recorrentes não foram citados para a ação declarativa, ficando consequentemente impossibilitados de se contestarem e dessa forma exercerem o contraditório.
2. É por isso nulo tudo o que foi processado depois da petição inicial, conforme dispõe a alínea a) do artigo 187º do cpc.
3. O tribunal a quo não refere qual o documento em que baseia para atestar a citação dos recorrentes,
4. Não especificando assim os fundamentos de facto em que se baseia para considerar efetuada a citação dos recorrentes.
5. É por isso a sentença nula, nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 615º do CPC.
6. O documento de fls 100 dos autos declarativos apenas referencia uma notificação via postal em 2012/06/26, pelas 15.43 horas, tendo sido considerado "objeto entregue",
7. O que em nada se confunde com citação por carta registada com aviso de receção ou equivalente,
8. Nem nada comprova sobre onde e a quem foi esse objeto entregue.
9. A citação, ainda que tenha tido lugar, o que apenas academicamente se admite, não cumpriu com as formalidades prescritas na lei, violando o Regulamento (CE) nº 1393/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Novembro de 2007, nos seus artigos 4º, nº 3 e 14º.
10. Assim e a ter existido a citação dos réus, aqui recorrentes, a mesma é nula nos termos do artigo 191º, nº 1 do CPC.
11.Sendo nula a citação no processo declarativo onde foi proferida sentença condenatória, a consequente e necessária anulação da mesma acarreta também a extinção da presente execução, por insubsistência ou inexistência superveniente do título executivo,
12. A decisão do tribunal a quo, ao considerar realizada a citação dos Réus, aqui recorrentes, viola o artigo 20º da CRP,
Nestes temos e nos melhores de Direito e sempre com o mui douto suprimento de V.Exa, deve o recurso ser julgado procedente, por provado e, em consequência, ser anulado tudo o que foi processado posterior ao momento em que ocorreu a falta, incluindo a sentença proferida na ação declarativa e que constitui o título executivo nos presentes autos.
Deve igualmente a presente execução ser extinta, por insubsistência ou inexistência superveniente do título executivo.

2. Não houve contra-alegações.

3. Dispensaram-se os vistos.

4. O objecto do recurso - delimitado pelas conclusões dos recorrentes (cfr. art.ºs 608ºnº2,609º,635ºnº4,639º e 663º nº2, todos do CPC) - circunscreve-se às seguintes questões: se a sentença enferma de nulidade por falta de fundamentação e se ocorreu falta ou nulidade da citação dos ora executados para a acção declarativa na qual não intervieram e da qual emergiu o título exequendo.

II- FUNDAMENTAÇÃO

5. É o seguinte o quadro fáctico assente pela 1ª instância e que não foi posto em crise pelos apelantes:
“A) Factos Provados
Atentos os documentos juntos aos autos, com interesse para a decisão da causa, considera-se provada, a seguinte factualidade:
1. Em 23.11.2010, o exequente DD, SA instaurou contra os executados, no Balcão Nacional de Injunções, procedimento de injunção, no âmbito qual requereu a notificação dos requeridos, incluindo dos ora embargantes, com vista a obter o pagamento do montante global de €18 049,19, sendo €14 963,94 relativos a capital, €3 008,75 referentes a juros de mora e €76,50 referente a taxa de justiça paga
2. O referido procedimento viria a ser distribuído ao extinto 1.º Juízo do extinto Tribunal Judicial da Comarca de Silves, tendo dado origem à ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias a que coube o n.º 375343/10.5YIRT.
3. Em 05.12.2012, a secção de processos do extinto 1.º Juízo do extinto Tribunal Judicial da Comarca de Silves expediu, no âmbito dos referidos autos de ação especial, duas cartas registadas, com aviso de receção, com vista a obter a citação dos ora embargantes para os termos dos referidos autos declarativos (cfr.fls. 42).
4. As cartas mencionadas em 3) foram, ambas, endereçadas para a morada sita em 110 …, Merley …Reino, Unido (cfr.fls. 42).
5. As mencionadas cartas foram rececionadas, conforme print dos CTT, no destino, em 10.12.2012 (cfr.fls. 44).
6. Sem prejuízo do recebimento mencionado em 5), não foram devolvidos, aos referidos autos declarativos, os avisos de receção mencionados em 3).
7. Os ora embargantes não tiveram qualquer intervenção nos autos declarativos mencionados em 2), motivo pelo qual foi, em 12.06.2013, proferida sentença que julgou regular a sua citação e conferiu, nos termos do n. º2 do diploma anexo ao Dec. Lei n.º 269/98 de 1 de setembro, força executiva ao requerimento de injunção que deu origem ao procedimento mencionado em 1, sentença essa que ora se executa no âmbito dos autos principais de execução.”

6. Da ( imputada) nulidade da sentença recorrida

No entendimento dos apelantes, a sentença é nula nos termos da alínea b) do nº1 do art.º 615º do CPC por não mencionar o documento em que se baseia para atestar a citação dos recorrentes e não especificar os fundamentos de facto em que se baseia para considerar efectuada a citação dos recorrentes.
Vejamos então.
Na verdade, o legislador comina a sentença de nula quando “não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”(alínea b)) sendo que esta causa de nulidade se conexiona com o dever de fundamentação da sentença e “não deve confundir-se - mas na realidade frequentemente confunde-se - com o dever de motivação da matéria de facto, a que se refere o n.º 4 do artigo 607.º do CPC, de acordo com o qual «o juiz declara quais os factos que julga provados e quais os que julga não provados, analisando criticamente as provas», nos termos ali melhor especificados.
Ora, «[a] omissão total ou parcial da análise crítica e/ou de motivação, gera uma nulidade processual secundária (preterição de formalidade exigida por lei) com previsão no artigo 195.º, porquanto com manifesta «influência no exame ou na decisão da causa» que a lei sujeita, todavia, ao regime especial de arguição dos artigos 149.º, 195.º e 199.º[1]» do CPC. Assim sendo, a sua existência deve ser arguida no prazo de 10 dias previsto no n.º 1 do artigo 149.º do CPC, contados da data em que foi notificado da sentença (artigo 199.º, n.º 1, do CPC), ficando consequentemente sanada se não for arguida nesse prazo, diferentemente do que ocorre com a nulidade da sentença quando esta não especifique os fundamentos de facto, a qual pode ser arguida em sede de recurso (artigo 615.º, n.º 4, do CPC), e consequentemente, dispondo a parte do prazo que a lei lhe conceder para recorrer[2].”.
Ora os fundamentos de facto da sentença estão claramente especificados, como se colhe da descrição efectuada.
Sem embargo, sempre se diga que o Tribunal especificou os meios de prova que alicerçaram o facto em apreço (5. As mencionadas cartas foram rececionadas, conforme print dos CTT, no destino, em 10.12.2012) especificando tratar-se do documento junto a fls. 44 dos autos.
Em suma: a nulidade em apreço não se verifica.

7. Do mérito da apelação

Insurgem-se os apelantes contra a sentença proferida pelo Tribunal a quo que julgou improcedentes os embargos deduzidos com o fundamento único na alínea d) do art.º 729º do CPC, entendendo que não ocorreu falta ou nulidade da citação dos mesmos no âmbito da acção declarativa na qual se formou o título executivo.

Compreende-se este fundamento de embargos em decorrência da relevância que a citação assume: Como decorre do disposto no artigo 219º, nº 1 do CPC, é o acto pelo qual se dá conhecimento ao réu de que foi proposta contra ele determinada acção e se chama ao processo para se defender.

Por conseguinte, é natural que faltando tal acto, a lei determine que todo o processado depois da petição inicial seja nulo (art.º 187º a) do CPC) e que fundando-se a execução em sentença, a oposição possa ter como fundamento a falta ou nulidade da citação para a acção declarativa quando o réu não tenha intervindo no processo (art.º 729º d) do mesmo Código).

Ora, tratando-se de citação de Réu residente no estrangeiro, como é o caso, a lei determina que se observe o que estiver estipulado nos tratados e convenções internacionais. (cfr. art.º 239º nº1 do CPC).

Em consequência e uma vez que os então Réus e ora apelantes são residentes no Reino Unido, é-lhes aplicável o Regulamento (CE) nº 1393/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho de 13/11/2007, o qual prevê no seu art.º 14º que os Estados-Membros podem proceder directamente pelos serviços postais à citação de pessoas que residam noutro estado membro, por carta registada com aviso de recepção ou equivalente. (sublinhado nosso).

Ao contrário do que os apelantes supõem, vigora nesse conspecto o princípio da pluralidade dos meios de transmissão ou seja, o regulamento admite outros meios de transmissão entre entidades de origem e entidades requeridas com ou sem intervenção auxiliar da entidade central.

Tais meios são os seguintes: A transmissão por via diplomática e consular (art.º12º); a citação ou notificação por agentes diplomáticos ou consulares ( art.º 13º) citação ou notificação pelos serviços postais ( art.º 14º) e citação ou notificação directa ( art.º 15º).

Logo, não ocorre qualquer impedimento a que, para a citação dos ora apelantes no âmbito da acção declarativa na qual se formou o título executivo, se tenha empregado a carta registada com aviso de recepção.

A questão que se coloca é se se podem considerar validamente citados apesar do aviso de recepção não ter vindo devolvido, nem haver notícia de que o hajam assinado ou a outro documento equivalente.

Os casos de falta de citação são os previstos nas diversas alíneas do nº 1 do art.º 188º do CPC : a) omissão do acto; b) erro na identidade do citado; c) emprego indevido da citação edital; d) citação efectuada depois do falecimento do citando, ou da extinção de pessoa colectiva ou sociedade; e) falta de conhecimento do acto pelo destinatário da citação pessoal, por facto que não lhe seja imputável.

Por seu turno, a citação é nula quando não tenham sido, na sua realização, observadas as formalidades prescritas na lei (art.º 191º nº 1)

Volvendo ao caso dos autos, provou-se que em 05.12.2012, a secção de processos do extinto 1.º Juízo do extinto Tribunal Judicial da Comarca de Silves expediu, no âmbito dos referidos autos de acção especial, duas cartas registadas, com aviso de recepção, com vista a obter a citação dos ora embargantes para os termos dos referidos autos declarativos.

Tais cartas, como se provou, foram recepcionadas no destino, em 10.12.2012 mas, como se disse, não foram devolvidos, aos referidos autos declarativos, os avisos de recepção.

Portanto, a questão que se coloca é se se pode considerar a citação regularmente efectuada apesar de tais avisos se terem “extraviado”.

Num caso análogo, este Tribunal da Relação, no âmbito do processo 1816/14.6TBPTM-A.E1 [3] decidiu proceder ao reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça da União Europeia, em conformidade com o disposto no art.º 267º do TFUE, para apreciação de várias questões relativas à matéria da citação , dentre as quais a seguinte : “ (…) a 1ª Questão que colocamos ao Tribunal de Justiça da União Europeia é a de saber se, no caso de um Tribunal Português, onde corre processo judicial cível contra cidadão residente em outro Estado Membro da União Europeia, tiver ordenado a citação desse mesmo cidadão, para o referido processo, através de Carta Registada com Aviso de Recepção, no caso de não ser devolvido o respectivo Aviso de Recepção, o Tribunal Português pode considerar, tendo em conta o referido Regulamento e os princípios que lhe estão subjacentes, tal citação como efectuada com base na documentação da Entidade Postal de residência do destinatário da missiva, que comprove a entrega da Carta Registada com Aviso de Recepção ao destinatário.”.

Em resposta, foi proferido o Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia, de 02 de Março de 2017, com o seguinte teor [4]:
“1 O pedido de decisão prejudicial diz respeito à interpretação do Regulamento (CE) n.° 1393/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de novembro de 2007, relativo à citação e à notificação dos atos judiciais e extrajudiciais em matérias civil e comercial nos Estados-Membros («citação e notificação de atos») e que revoga o Regulamento (CE) n.° 1348/2000 do Conselho (JO 2007, L 324, p. 79).
2 Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio entre A. M. H. e o Banco..., a propósito de um recurso interposto por este último no seguimento da não execução por A. M. H. de dois contratos de arrendamento comercial celebrados entre as partes.
Quadro jurídico Direito da União
Regulamento n.° 1393/2007
3 Na ótica do bom funcionamento do mercado interno, o Regulamento n.° 1393/2007 tem por objetivo, nos termos do seu considerando 2, melhorar a eficácia e a celeridade dos processos judiciais, ao instituir o princípio da transmissão direta dos atos judiciais e extrajudiciais.
4 Segundo o seu artigo 1.°, n.° 1, este regulamento é aplicável em matéria civil ou comercial, quando um ato judicial ou extrajudicial deva ser transmitido de um Estado-Membro para outro Estado-Membro para aí ser objeto de citação ou notificação.
5 Nos termos do seu artigo 1.°, n.° 2, o referido regulamento não se aplica quando o endereço do destinatário for desconhecido.
6 O n.° 3 do referido artigo 1.° precisa que, «[p]ara efeitos do presente regulamento, entende-se por 'Estado-Membro' todos os Estados-Membros com exceção da Dinamarca».
7 O capítulo II do Regulamento n.° 1393/2007 contém disposições que preveem diferentes meios de transmissão e de citação ou notificação de atos judiciais. Este capítulo divide-se em duas secções.
8 A secção 1 deste capítulo respeita à transmissão pelas entidades designadas pelos Estados-Membros, designadas «entidades de origem» e «entidades requeridas», competentes, respetivamente, para transmitir os atos para efeitos da sua citação ou notificação noutro Estado-Membro e para receber tais atos provenientes de outro Estado-Membro.
(…)
11 No que respeita à citação ou notificação pelos serviços postais, o artigo 14.° deste regulamento dispõe:
«Os Estados-Membros podem proceder diretamente pelos serviços postais à citação ou notificação de atos judiciais a pessoas que residam noutro Estado-Membro, por carta registada com aviso de receção ou [envio] equivalente.»
12 O artigo 19.° do referido regulamento, sob a epígrafe «Não comparência do demandado», tem a seguinte redação:
«1. Se tiver sido transmitida uma petição inicial ou ato equivalente a outro Estado-Membro para citação ou notificação nos termos do presente regulamento, e se o demandado não tiver comparecido, o juiz sobrestará na decisão enquanto não for determinado:
a) Que o ato foi objeto de citação ou notificação segundo a forma prescrita pela legislação do Estado-Membro requerido para a citação ou notificação de atos emitidos no seu território e dirigidos a pessoas que aí se encontrem; ou
b) Que o ato foi efetivamente entregue ao demandado ou na sua residência, segundo outra forma prevista pelo presente regulamento; e que, em qualquer destes casos, quer a citação ou notificação, quer a entrega, foi feita em tempo útil para que o demandado pudesse defender-se.
2. Os Estados-Membros podem declarar, nos termos do n.° 1 do artigo 23.°, que os seus juízes, não obstante o disposto no n.° 1, podem julgar, embora não tenha sido recebida qualquer certidão da citação ou notificação, se se reunirem as seguintes condições:
a) Ter o ato sido transmitido segundo uma das formas previstas pelo presente regulamento;
b) Ter decorrido, desde a data da transmissão do ato, um prazo não inferior a seis meses e que o juiz considere adequado no caso concreto;
c) Não ter sido recebida qualquer certidão ou certificado, não obstante terem sido feitas todas as diligências razoáveis para esse efeito junto das autoridades ou entidades competentes do Estado-Membro requerido.
3. Não obstante o disposto nos 1 e 2, o juiz pode, em caso de urgência, ordenar medidas provisórias ou conservatórias.
4. Se tiver sido transmitida uma petição inicial ou ato equivalente a outro Estado-Membro para citação ou notificação, nos termos do presente regulamento, e tiver sido proferida uma decisão contra um demandado que não tenha comparecido, o juiz pode relevar ao demandado o efeito perentório do prazo para recurso, se concorrerem as condições seguintes:
a) Não ter tido o demandado, sem que tenha havido culpa da sua parte, conhecimento do dito ato em tempo útil para se defender ou conhecimento da decisão em tempo útil para interpor recurso; e
b) Não parecerem as possibilidades de defesa do demandado desprovidas de qualquer fundamento.
O pedido de relevação deve ser formulado em prazo razoável a contar do momento em que o demandado tenha conhecimento da decisão.
Qualquer Estado-Membro pode comunicar, nos termos do n.° 1 do artigo 23.°, que esse pedido não será atendido se for formulado após o decurso de um prazo que indicará na comunicação, contanto que esse prazo não seja inferior a um ano contado da data da decisão.
[...]»
13 A República Portuguesa fez a seguinte comunicação, nos termos do artigo 23.° do Regulamento n.° 1393/2007:
«Artigo 9.° — Data da citação ou da notificação
De acordo com a legislação portuguesa, na ausência de disposição específica, a citação ou notificação deverá ter lugar dentro do prazo de cinco dias, nos termos do artigo 166.° do Código de Processo Civil. [...]
Artigo 19.° — Não comparência do demandado
Portugal não fará uso da faculdade outorgada pelo n.° 2 do artigo 19.°, pelo que os tribunais portugueses não poderão fazer uso da faculdade aí prevista.
Portugal declara que é de um ano, contado da data da decisão recorrida, o prazo para formular o pedido de relevação do efeito preclusivo do decurso do prazo para o recurso (cfr. Artigo 19.°, n.° 4).»
Regulamento (CE) n.° 44/2001
14 O artigo 26.°, n." 2 e 3, do Regulamento (CE) n.° 44/2001 do Conselho, de 22 de dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 2001, L 12, p. 1), dispõe:
«2. O juiz deve suspender a instância enquanto não se verificar que a esse requerido foi dada a oportunidade de receber o ato que iniciou a instância, ou ato equivalente, em tempo útil para apresentar a sua defesa, ou enquanto não se verificar que para o efeito foram efetuadas todas as diligências.
3. Será aplicável, em vez do disposto no n.° 2, o artigo 19.° do Regulamento (CE) n.° 1348/2000 do Conselho, de 29 de maio de 2000, relativo à citação e à notificação dos atos judiciais e extrajudiciais em matéria civil e comercial nos Estados-Membros [(JO 2000, L 160, p. 37)], se o ato que iniciou a instância tiver sido transmitido por um Estado-Membro a outro em execução desse regulamento.»
15 O artigo 34.°, ponto 2, do Regulamento n.° 44/2001 prevê que uma decisão proferida por um tribunal de um Estado-Membro não será reconhecida noutro Estado-Membro «[s]e o ato que iniciou a instância, ou ato equivalente, não tiver sido comunicado ou notificado ao requerido revel, em tempo útil e de modo a permitir-lhe a defesa, a menos que o requerido não tenha interposto recurso contra a decisão embora tendo a possibilidade de o fazer».
Regulamento (CE) n.° 805/2004
16 Nos termos do artigo 14.°, n.° 1, do Regulamento (CE) n.° 805/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de abril de 2004, que cria o título executivo europeu para créditos não contestados (JO 2004, L 143, p. 15), sob a epígrafe «Citação ou notificação sem prova de receção pelo devedor»:
«A citação ou notificação do documento que dá início à instância ou ato equivalente, bem como qualquer ordem de comparência em audiência dirigida ao devedor, pode igualmente ser efetuada pelos seguintes meios: a) Citação ou notificação pessoal, no endereço do devedor, das pessoas que vivem no mesmo domicílio ou que nele trabalhem;
Direito português
17 Nos termos do artigo 188.°, n.° 1, alínea e), do Código de Processo Civil, a citação não é válida quando se demonstre que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do ato objeto de citação, por facto que não lhe seja imputável, ou seja, quando o interessado ilidiu a presunção prevista no artigo 230.° do mesmo código.
18 Contudo, em aplicação do artigo 189.° do Código de Processo Civil, a nulidade é sanada se o réu intervier no processo sem arguir a existência desse vício.
19 Resulta do artigo 191.°, n.° 1, desse código que, sem prejuízo do seu artigo 188.°, a citação é nula quando não hajam sido observadas as formalidades prescritas na lei.
20 Em conformidade com o artigo 191.°, n.° 2, do referido código, esta nulidade deve ser arguida no prazo indicado na carta de citação para a contestação dos pedidos do réu no ato que dá início à instância ou, não tendo sido indicado esse prazo, quando da primeira intervenção do citado no processo.
21 No processo principal, é pacífico que esse prazo era de 20 dias, ou seja, um prazo de 10 dias, aplicável em matéria de medidas provisórias, acrescido de 10 dias de prazo de dilação em razão da distância, a partir da data em que a citação do ato que dá início à instância é considerada realizada.
22 Nos termos do artigo 191.°, n.° 4, do mesmo código, a arguição da nulidade só é atendida se o vício em causa puder prejudicar a defesa do citado.
23 Nos termos do artigo 228.° do Código de Processo Civil, sob a epígrafe «Citação de pessoa singular por via postal»:
«1. A citação de pessoa singular por via postal faz-se por meio de carta registada com aviso de receção, de modelo oficialmente aprovado, dirigida ao citando e endereçada para a sua residência ou local de trabalho, incluindo todos os elementos a que se refere o artigo anterior e ainda a advertência, dirigida ao terceiro que a receba, de que a não entrega ao citando, logo que possível, o faz incorrer em responsabilidade, em termos equiparados aos da litigância de má-fé.
2. A carta pode ser entregue, após assinatura do aviso de receção, ao citando ou a qualquer pessoa que se encontre na sua residência ou local de trabalho e que declare encontrar-se em condições de a entregar prontamente ao citando.
3. Antes da assinatura do aviso de receção, o distribuidor do serviço postal procede à identificação do citando ou do terceiro a quem a carta seja entregue, anotando os elementos constantes do cartão do cidadão, bilhete de identidade ou de outro documento oficial que permita a identificação.»
24 Nos termos do artigo 230.°, n.° 1, deste código, a citação por via postal por meio de envio de carta registada com aviso de receção considera-se feita no dia em que se mostre assinado o aviso de receção. Presume-se, então, que o ato objeto de citação foi entregue à pessoa do citando, na data que consta do aviso de receção, mesmo quando o aviso de receção haja sido assinado por terceiro, salvo demonstração em contrário por este último.
25 Resulta dos autos apresentados ao Tribunal de Justiça que, em concreto, o destinatário do ato deve, assim, demonstrar que a citação não lhe foi entregue, ou que foi feita numa data posterior à presumida, por razões que não lhe são imputáveis.
Litígio no processo principal e questões prejudiciais
(…)
70 Com estas questões, que há que analisar conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o Regulamento n.° 1393/2007 deve ser interpretado no sentido de que uma citação ou notificação de um ato que dá início à instância pelos serviços postais é válida, mesmo que o aviso de receção da carta registada não tenha sido devolvido ao remetente e se verifique que o correio foi recebido não pelo destinatário do ato mas por terceiro.
71 Para responder a estas questões, há que salientar, antes de mais, que o Regulamento n.° 1393/2007 prevê de maneira exaustiva diferentes meios de citação e notificação dos atos judiciais, cujas regras aplicáveis enuncia, sem, no entanto, estabelecer uma hierarquia entre eles (v., neste sentido, acórdãos de 9 de fevereiro de 2006, Plumex, C-473/04, EU:C:2006:96, n." 20 a 22, e de 19 de dezembro de 2012, Alder (C-325/11, EU:C:2012:824, n." 31 e 32). Um desses meios de transmissão é o realizado pelos serviços postais, em causa no processo principal, que é objeto essencialmente do artigo 14.° do referido regulamento.
72 Como o Tribunal de Justiça já declarou, as disposições do Regulamento n.° 1393/2007 devem ser interpretadas de maneira a garantir, em cada caso concreto, um justo equilíbrio entre os interesses do demandante e os do demandado, destinatário do ato, conciliando os objetivos de eficácia e de celeridade da transmissão dos atos processuais com a exigência de assegurar a proteção adequada dos direitos de defesa do destinatário desses atos, isto através, nomeadamente, da garantia de uma receção real e efetiva desses mesmos atos (acórdão de 16 de setembro de 2015, Alpha Bank Cyprus, C-519/13, EU:C:2015:603, n.° 33 e jurisprudência referida).
73 Estas últimas exigências são particularmente importantes no que respeita, como no processo principal, à citação de um ato que dá início à instância, na medida em que se impõe que o destinatário do ato seja informado da existência de uma ação judicial proposta contra si noutro Estado-Membro e compreenda o sentido, o alcance e as modalidades processuais, nomeadamente em matéria de prazos, da ação proposta contra ele, para que se possa defender utilmente.
74 No que respeita ao primeiro aspeto das duas primeiras questões submetidas, relativo à circunstância de o aviso de receção da carta registada que continha a citação do ato que dá início à instância não ter sido devolvido ao órgão que, no Estado-Membro de origem, mandou efetuar essa citação, há que observar que o Regulamento n.° 1393/2007 prevê, no seu artigo 14.°, que a citação ou notificação, pelos serviços postais, de um ato judicial a uma pessoa que resida noutro Estado-Membro é efetuada, em princípio, por carta registada com aviso de receção.
75 Com efeito, o legislador da União considerou que essas formalidades eram suscetíveis de oferecer ao destinatário a garantia de que recebe efetivamente o envio registado que contém o ato citado e de constituir para o remetente uma prova fiável da regularidade do procedimento.
76 Mais particularmente, um correio registado permite acompanhar as diferentes etapas do seu envio ao destinatário. Por seu lado, o aviso de receção, que é preenchido no momento em que o destinatário, ou, sendo caso disso, o seu representante, recebe o correio, contém a indicação da data e do local da entrega, da qualidade da pessoa que recebeu esse correio e a sua assinatura. Em seguida, o aviso de receção é devolvido ao remetente, levando, assim, estes elementos ao seu conhecimento e permitindo-lhe prová-los em caso de impugnação.
77 Por conseguinte, o aviso de receção da carta registada constitui um elemento de prova da receção do ato judicial citado ou notificado pelo seu destinatário no Estado-Membro requerido bem como das modalidades de entrega desse ato.
78 Todavia, como resulta da própria redação do artigo 14.° do Regulamento n.° 1393/2007, uma citação ou notificação pelos serviços postais não tem necessariamente de ser efetuada por carta registada com aviso de receção.
79 Com efeito, a referida disposição precisa que se pode igualmente proceder a semelhante citação ou notificação através de um «[envio] equivalente» a uma carta registada com aviso de receção.
80 Para determinar o sentido e o alcance dos termos «[envio] equivalente», na aceção desse artigo 14.°, há que precisar que decorre da finalidade da referida disposição, como descrita nos n." 75 a 77 do presente acórdão, que pode ser qualificado de «[envio] equivalente» qualquer meio de citação ou notificação de um ato judicial e da prova desta que ofereça garantias comparáveis às de um envio por carta registada no correio com aviso de receção.
81 Mais precisamente, o meio alternativo de transmissão do ato deve apresentar o mesmo nível de certeza e de fiabilidade que uma carta registada com aviso de receção, no que respeita tanto à receção do ato pelo seu destinatário como às circunstâncias desta.
82 Com efeito, no interesse da celeridade dos processos judiciais, há que garantir, na medida do possível, que o destinatário receba efetivamente o ato objeto de citação ou notificação e que essa receção possa ser demonstrada de maneira fiável pelo remetente.
83 Em caso de litígio, incumbirá, assim, ao remetente demonstrar, através dos elementos materiais relativos à transmissão do ato, a regularidade do procedimento de citação ou notificação, devendo o órgão jurisdicional do Estado-Membro de origem apreciar a pertinência desses elementos tendo em conta as circunstâncias concretas de cada caso.
84 Daqui resulta que o facto de, no caso em apreço, o aviso de receção não ter sido devolvido não é, enquanto tal, suscetível de viciar o procedimento de transmissão por via postal, podendo esta formalidade ser substituída por um documento que ofereça garantias equivalentes.
85 O órgão jurisdicional de reenvio do Estado-Membro de origem, chamado a pronunciar-se, deverá, no entanto, garantir que os elementos de prova invocados para esse efeito demonstram que o destinatário recebeu a citação ou a notificação do ato em causa, em condições que respeitam os seus direitos de defesa.
86 Quanto ao segundo aspeto da primeira e da segunda questão, relativo à circunstância de, no caso em apreço, o envio registado que contém o ato objeto de citação ter sido recebido no Estado-Membro requerido não pelo destinatário desse ato mas por uma terceira pessoa, há que notar que o artigo 14.° do Regulamento n.° 1393/2007 não inclui nenhuma indicação expressa a esse respeito.
87 No entanto, pode deduzir-se do artigo 19.°, n.° 1, alínea b), desse mesmo regulamento que o ato objeto de citação ou notificação pode ser entregue não só à pessoa do seu destinatário mas também, na sua ausência, a uma pessoa que se encontre na sua residência.
88 Com efeito, na prática, nem sempre é possível uma entrega por mão própria ao demandado. Por conseguinte, o Regulamento n.° 1393/2007 não exclui que, em certas circunstâncias, um terceiro possa receber o ato em causa.
89 No entanto, nesse caso, há que assegurar que todas as garantias necessárias à proteção efetiva dos direitos de defesa do destinatário do ato sejam respeitadas.
90 A fortiori, numa situação como a que está em causa no processo principal, em que o demandado não compareceu na audiência introdutória da instância, cuja data de fixação estava especificada no ato que lhe tinha sido citado por via postal, é, com efeito, primordial certificar-se de que, por um lado, o demandado recebeu realmente o ato que dá início à instância, que lhe permite tanto ter conhecimento de que foi proposta contra si uma ação judicial noutro Estado-Membro como identificar o objeto do pedido e a causa de pedir, e que, por outro, o referido demandado dispôs de tempo suficiente para preparar a sua defesa.
91 Essa proteção dos direitos do demandado revel, prevista mais particularmente no artigo 19.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1393/2007, responde, além disso, ao objetivo prosseguido pelas disposições de outros atos do direito da União relativos à cooperação judiciária em matéria civil e comercial, como o Regulamento n.° 44/2001, cujo artigo 34.°, ponto 2, pressupõe igualmente que o ato em causa foi previamente citado ou notificado ao referido demandado (v., neste sentido, despacho de 28 de abril de 2016, Alta Realitat, C-384/14, EU:C:2016:316, n.° 86 e jurisprudência referida, e acórdão de 7 de julho de 2016, Lebek, C-70/15, EU:C:2016:524, n.° 41 e jurisprudência referida).
92 Como o advogado-geral salientou no n.° 36 das suas conclusões, a questão de saber se um ato que dá início à instância foi citado ou notificado de modo a que o demandado tenha efetivamente podido tomar conhecimento dele é, assim, decisiva para determinar se a decisão judicial proferida posteriormente pode ser considerada executória.
93 Nestas condições, embora um terceiro possa validamente receber um ato judicial em nome e por conta do destinatário, essa possibilidade está, no entanto, reservada a casos claramente circunscritos, para garantir o melhor possível o respeito dos direitos de defesa do referido destinatário.
94 Consequentemente, há que compreender o conceito de «residência», na aceção do Regulamento n.° 1393/2007, como o local onde o destinatário do ato habita e permanece de maneira habitual.
95 Além disso, à semelhança do previsto no artigo 14.°, n.° 1, alínea a), do Regulamento n.° 805/2004 no que respeita à citação ou notificação de um ato que dá início à instância em matéria de créditos não contestados, a faculdade de um terceiro receber um ato judicial em vez do seu destinatário apenas se pode aplicar às pessoas adultas que se encontrem no interior da residência do destinatário, quer sejam membros da sua família que vivem no mesmo endereço quer sejam pessoas por ele empregadas nesse endereço.
96 Com efeito, é razoável considerar que essas pessoas entregarão efetivamente o ato em causa ao seu destinatário.
97 Em contrapartida, isso não é necessariamente o caso de outros terceiros, como um habitante de um imóvel vizinho ou uma pessoa que reside no mesmo imóvel onde o destinatário ocupa um apartamento. Uma vez que a receção de um ato por esse terceiro não oferece garantias suficientes de que o destinatário seja realmente informado nos prazos exigidos, a mesma não pode ser considerada suficientemente fiável para efeitos da aplicação do Regulamento n.° 1393/2007.
98 Em todo o caso, mesmo que as condições enunciadas nos n.`'s 93 a 96 do presente acórdão estejam reunidas e que a citação ou notificação se afigure, consequentemente, regular, o destinatário do ato mantém a possibilidade de demonstrar, através de todos os meios de prova admissíveis no órgão jurisdicional do Estado-Membro de origem, chamado a pronunciar-se, que não pôde efetivamente tomar conhecimento de que tinha sido proposta contra si uma ação judicial noutro Estado-Membro, ou identificar o objeto do pedido e a causa de pedir, ou dispor de tempo suficiente para preparar a sua defesa. Incumbe ao referido órgão jurisdicional apreciar a pertinência destes elementos de prova, tendo devidamente em conta todas as circunstâncias do caso em apreço.
99 Atendendo às considerações precedentes, há que responder às duas primeiras questões submetidas que o Regulamento n.° 1393/2007 deve ser interpretado no sentido de que uma citação ou notificação de um ato que dá início à instância pelos serviços postais é válida mesmo que: o aviso de receção da carta registada que contém o ato objeto de citação ao seu destinatário tenha sido substituído por outro documento, na condição de este último oferecer garantias equivalentes em matéria de informações transmitidas e de prova. Incumbe ao órgão jurisdicional do Estado-Membro de origem, chamado a pronunciar-se, certificar-se de que o destinatário recebeu o ato em causa, em condições que respeitam os seus direitos de defesa; o ato objeto de citação ou notificação não tenha sido entregue à pessoa do seu destinatário, desde que o tenha sido a uma pessoa adulta que se encontrasse no interior da residência habitual desse destinatário, na qualidade de membro da sua família ou de empregado ao seu serviço. Cabe ao destinatário, se for caso disso, demonstrar através de todos os meios de prova admissíveis no órgão jurisdicional do Estado-Membro de origem, chamado a pronunciar-se, que não pôde efetivamente tomar conhecimento de que tinha sido proposta contra si uma ação judicial noutro Estado-Membro, ou identificar o objeto do pedido e a causa de pedir, ou dispor de tempo suficiente para preparar a sua defesa.
Quanto às despesas
(…).”.

Como se viu, o Tribunal de Justiça determina que o Regulamento n.° 1393/2007 deve ser interpretado no sentido de que uma citação ou notificação de um acto que dá início à instância pelos serviços postais é válida mesmo que o aviso de recepção da carta registada que contém o acto objecto de citação ao seu destinatário tenha sido substituído por outro documento, na condição de este último oferecer garantias equivalentes em matéria de informações transmitidas e de prova.

Isto significa que, de acordo com tal decisão, funcionando o aviso de recepção como meio de prova da citação, é de admitir que a mesma se prove por outros meios (de prova) designadamente por documento com força igual ou superior (v.g. declaração assinada pelo destinatário que ateste o seu recebimento).

Porém, no caso dos autos não só não existe aviso de recepção como também não existe sequer tal documento análogo; por conseguinte não se pode afirmar que os destinatários receberam a citação em condições que respeitaram os seus direitos de defesa.

É que o acto de citação é um acto receptício e tendo em vista o seu assinalado escopo – de chamar o réu ao processo para se defender – compreende-se que o legislador o tenha rodeado de cautelas destinadas a assegurar-se de que o citando toma conhecimento do processo.

A aposição da assinatura do citando no aviso de recepção (ou em documento análogo) constituem uma garantia de que esse conhecimento se efectiva e reveste, por isso, a natureza de formalidade prescrita na lei.

Perante a constatada omissão, há que concluir que não foram cumpridos todos os requisitos para que a citação dos ora recorrentes na acção declarativa se considere devidamente efectuada à luz do citado regulamento comunitário[5] e por consequência o acto de citação está viciado de nulidade (art.º191º, nº 1, do CPC).

Como se viu, os executados deduziram embargos invocando precisamente que não tinham intervindo no processo declarativo onde se produziu a sentença exequenda por a respectiva citação ter sido nula à luz do citado regulamento comunitário.

Trata-se do fundamento de oposição a que se refere o art.º729º, nº 1, alínea d) do CPC o que significa, no caso, que verificada a sua ocorrência, a acção executiva há-de ser julgada extinta (art.º732º, nº 4, do CPC); sendo essa a pretensão dos embargantes que o tribunal “a quo” julgou improcedente mas cuja decisão não pode, pelo exposto, subsistir.

III- DECISÃO

Por todo o exposto, na procedência da apelação, acorda-se em revogar a sentença recorrida, julgam-se os embargos procedentes e, por consequência, extinta a execução a que os mesmos estão apensos.

Custas pelo apelado.

Évora, 7 de Novembro de 2019
Maria João Sousa e Faro (relatora)
Florbela Moreira Lança
Elisabete Valente (tem voto de conformidade da Exma. Desembargadora que não assina por não estar presente)

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[1] Cfr. Francisco Manuel Lucas Ferreira de Almeida, in Direito Processual Civil, vol. II, Almedina 2015, pág. 352.
[2] Acórdão deste Tribunal proferido em 30.11.2016 no Processo n.º 1510/10.7TBSTB.E1 do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal.
[3] Cfr. Acórdão desta Relação de 27.4.2017 relatado pelo Desemb. Silva Rato, consultável na Base de Dados do IGFEJ.
[4] Suprimindo-se as partes que não apresentam relevância para a situação subjudice e assinalando-se a negrito as mais pertinentes.
[5] Aliás, nem face à lei portuguesa, já que se exige que a assinatura do aviso de recepção preceda a entrega da carta ( cfr. art.º 228º nº2 do CPC), o que bem inculca que se tal aviso se extraviar e não houver outra prova de igual valia da efectivação da citação, a mesma não se pode considerar válida.