Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
| ||
Relator: | TOMÉ DE CARVALHO | ||
Descritores: | DANO BIOLÓGICO DANOS PATRIMONIAIS FUTUROS EQUIDADE | ||
![]() | ![]() | ||
Data do Acordão: | 12/15/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
![]() | ![]() | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | 1 – Por dano biológico deve entender-se qualquer lesão da integridade psico-física que possa prejudicar quaisquer actividades, situações e relações da vida pessoal do sujeito, não sendo necessário que se refira apenas à sua esfera produtiva, abrangendo igualmente a espiritual, cultural, afectiva, social, desportiva e todas as demais nas quais o indivíduo procura desenvolver a sua personalidade. 2 – O prejuízo biológico, enquanto diminuição psíquico-somática e funcional de uma pessoa em geral, assume repercussões na vida individual e gerador de responsabilidade civil, tanto no domínio do dano patrimonial como na dimensão do infortúnio não patrimonial. 3 – Ao avaliar e quantificar o dano patrimonial futuro, pode e deve o Tribunal reflectir também na indemnização arbitrada a perda de oportunidades profissionais futuras que decorra do grau de incapacidade fixado ao lesado, ponderando não apenas as perdas salariais prováveis, mas também o dano patrimonial decorrente da inevitável perda de chance ou oportunidades profissionais por parte do lesado. 4 – A indemnização por danos futuros resultantes de incapacidade física do lesado causada por acidente de viação corresponde a um capital produtor do rendimento que a vítima não irá auferir por força da limitação da sua capacidade de trabalho que se traduz numa equação de correlacionação entre o rendimento anual perdido, o tempo provável de vida activa e as expectativas sustentadas de progressão na carreira. 5 – O juízo de equidade que a que lei faz menção determina que o julgador tome em conta todas as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida. (Sumário do Relator) | ||
![]() | ![]() | ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Processo n.º 3638/19.9T8FAR.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo Central de Competência Cível de Setúbal – J3 * Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora:I – Relatório: Na presente acção declarativa com processo comum, emergente de acidente de viação, proposta por (…) contra “(…) – Companhia de Seguros, SA”, Autor e Ré interpuseram recurso da sentença proferida. * O Autor pediu a condenação da Ré no pagamento do montante global de € 938.693,48, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescido do valor que viesse a ser fixado posteriormente a título de danos futuros, acrescido de juros legais contados desde a citação até integral pagamento.* Em síntese, o Autor invocou que foi vítima de um acidente de viação, cuja verificação é imputável ao condutor de um veículo seguro na Ré e desse evento resultaram danos patrimoniais e não patrimoniais.* A Ré contestou, impugnando parcialmente os factos e manifestando discordância quanto ao montante da indemnização peticionada.* A Ré “(…) – Companhia de Seguros, SA” requereu a intervenção principal provocada da seguradora “(…) – Seguros Gerais, SA” e de (…), respectivamente a seguradora do acidente de trabalho e o condutor do veículo seguro, as quais foram admitidas.* A “(…) – Seguros Gerais, SA” veio deduzir pedido de reembolso das quantias pagas ao sinistrado, a qual foi admitida e que, após ampliação, se cifrou em € 272.518,53.* A Ré apresentou oposição ao pedido de reembolso apresentado, impugnando parcialmente os factos alegados.* O interveniente (…) não apresentou articulado.* Foi citada a instituição de Segurança Social e não foi deduzido qualquer pedido de reembolso de quantias pagas.* Foi realizada audiência prévia e proferido despacho saneador, fixado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova, não sendo apresentada reclamação.* Realizada a audiência final, o Tribunal a quo decidiu julgar parcialmente procedente o pedido nos seguintes termos: a) condenar a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 1.668,88, a título de dano patrimonial, na vertente de obras de adaptação da residência, acrescida de juros de mora, à taxa de juros civis, a contar da data da citação até efectivo e integral pagamento. b) condenar a Ré a pagar ao Autor a quantia que vier a ser liquidada, em sede de incidente de liquidação em execução de sentença, a título de dano patrimonial futuro, na vertente de despesas com medicação analgésica e antiespasmódica que venha a necessitar, com o limite de € 136.572,60. c) condenar a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 250.000,00, a título de dano patrimonial, na vertente de dano biológico, acrescida de juros de mora, à taxa de juros civis, a contar do dia seguinte ao da prolação da sentença até efectivo e integral pagamento. d) condenar a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 75.000,00, a título de danos não patrimoniais, acrescidas de juros de mora, à taxa de juros civis, a contar do dia seguinte ao da prolação da sentença até efectivo e integral pagamento. e) condenar a Ré a pagar à interveniente a quantia de € 272.518,53, a título de reembolso das quantias pagas, ao abrigo do contrato de seguro de acidentes de trabalho, acrescida de juros de mora, à taxa de juros civis, a contar da data da notificação para contestar até efectivo e integral pagamento. f) absolver a Ré do demais peticionado. * O Autor não se conformou com a referida decisão e o articulado de recurso continha as seguintes conclusões:«82. É objecto deste recurso a douta sentença, de que se discorda, proferida nos autos acima identificados que decidiu parcialmente determinando uma quantia indemnizatória no total de € 463.241,48, tendo a indemnização por danos patrimoniais sido fixada em € 250.000,00, e por danos não patrimoniais em € 75.000,00. 83. O Autor não pode aceitar a fixação da indemnização por danos patrimoniais e por danos não patrimoniais, efetuada, pela douta sentença, porque os valores não permitem a reconstituição natural da situação em que o Autor se encontraria, atualmente e no futuro, se o acidente sofrido, por si, não tivesse ocorrido. 84. Por um lado, quanto aos danos patrimoniais, o valor anual global do salário foi reduzido, sem fundamento legal, enquanto o valor da pensão previsto na douta sentença não corresponde ao que o Autor teria direito a receber de pensão, caso o mesmo continuasse a trabalhar e a contribuir. 85. Por outro lado, a douta sentença não acautela o impacto redutor que a evolução das taxas de inflação durante os próximos trinta anos terá sobre o valor fixado de pensão, pondo em risco sério o sustento condigo do Autor em 30 anos. 86. A douta sentença avalia os danos patrimoniais, na vertente de dano futuro (dano biológico) em € 368.319,70, mas acaba por fixar os mesmos em € 250.000,00, sem qualquer outro fundamento que não seja de juízos de equidade. 87. O Autor, face ao pedido em sede de petição inicial, conjugado com os 42 anos de vida biológica determinada na douta sentença, teria direito a, pelo menos, receber o valor de € 441.000,00 (€ 750,00 x 14 meses x 42 anos de vida), devendo ser este o valor a atribuir de indemnização, face à incapacidade permanente sofrida, o custo de vida, a taxa de inflação, a impossibilidade de trabalhar na sua área de formação e de experiência, e ao facto de consequentemente, não poder ver o aumento do seu salário presente ou futuro. 88. Os danos não patrimoniais fixados, a título de indemnização, ficaram muito aquém do peticionado pelo Autor, que se cifravam em € 300.000,00, face aos sofrimentos, às dores, alterações na vida pessoal, profissional, pessoal e familiar, às sequelas físicas e psicológicas e a todas as patologias que passou a padecer, quando era um adulto saudável. 89. Embora os danos não patrimoniais não possuam um método avaliativo tão exacto, a jurisprudência do venerando Supremo Tribunal de Justiça tem evoluído no sentido de considerar que a indemnização por danos não patrimoniais deverá ser significativa ao contrário de meramente simbólica. 90. Sendo que aquando da consulta de jurisprudência proferida em casos semelhantes ao descrito nos autos, é verificável que as indemnizações fixadas nos mesmos foram bem superiores àquela fixada pela douta sentença recorrida e mais perto do valor peticionado pelo Autor. 91. E ainda assim, apesar da jurisprudência existir, a mesma não poderá sofrer de baliza máxima, mas sim de ser meramente indicativa, sob pena de estar-se sim a violar o princípio da igualdade, ao avaliar os casos reais, como semelhantes, quando todos eles constituem realidades diferentes e todos eles têm contornos diferentes. 92. Pelos danos físicos e psicológicos sofridos, o sofrimento passado e as sequelas com que ficou, com a idade de 31 anos de idade, e que o acompanharão para o resto da vida (perdeu parcialmente os ossos da face e da cabeça, ficou com a face desfigurada e o seu membro superior direito perdeu utilidade, tem dificuldade em andar ou agachar-se, tem dores diariamente, não consegue falar, nem conversar, perdeu a autoestima e ganhou défice sexual), o Autor tem direito a que a indemnização por danos não patrimoniais seja devidamente ajustada para uma quantia não inferior a € 150.000,00. 93. Devendo, a sentença em crise ser alterada em conformidade, no sentido de a indemnização fixada corresponder a uma real compensação pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelo Autor. Nestes termos, e nos melhores de direito, que v/exa., doutamente suprirá, deverá o presente recurso ser julgado procedente, por provado, e consequentemente deverá o valor indemnizatório ser ajustado, de acordo com o peticionado, de modo a permitiria uma reconstituição mais próxima da reconstituição natural do que seria a vida do autor, no presente imediato e no futuro se não tivesse sofrido o acidente de viação que sofreu». * A sociedade recorrente não se conformou com a referida decisão e o articulado de recurso continha as seguintes conclusões:«1 – O A. deduziu concreto pedido indemnizatório no valor de € 493.500,00, correspondente ao valor dos salários que o mesmo deixou de auferir, desde os 31 anos até à idade da reforma, acrescido do valor da reforma que se estima ser até aos 78 anos. 2 – Nessa medida exercendo o contraditório, a R. deduziu a sua Oposição a tal pedido alegando que: “31- Acresce que os danos reclamados nos artigos 101º a 106º da douta P.I. estão ressarcidos no processo de acidente de trabalho e, consequentemente, reembolsados à seguradora laboral pela ora R. 32- Não pode o A. receber duas vezes pelo mesmo dano e a R. pagar em duplicado, sob pena de enriquecimento ilegítimo daquele”. 3 – 49. Enquanto trabalhador independente tinha a sua responsabilidade laboral transferida para a (…) – Seguros Gerais, SA, com a apólice de seguro n.º (…), pelo valor de € 750,00 x 14 meses. 50. O embate descrito em 5 foi participado à (…) – Seguros Gerais, S.A., por ter ocorrido no percurso de/para o trabalho/residência do autor. 51. Correu termos no Tribunal de Trabalho de Faro processo de acidente de trabalho, com o n.º 42/16.4T8FAR, no âmbito do qual, por sentença datada do dia 05/12/2017, foi decidido condenar a (…) – Seguros Gerais, S.A. a pagar ao autor uma pensão anual e vitalícia de € 8.400,00, a pagar adiantada e mensalmente, até ao 3º dia de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 daquela, acrescida de mais uma prestação nos meses de junho e novembro, a título de subsídio de férias e de natal; a quantia de € 5.533,68 a título de subsídio de elevada incapacidade permanente; a quantia de € 461,14 a título de prestação suplementar para assistência de terceira pessoa; a quantia de € 92,80 a título de despesas de deslocação; os juros de mora incidentes sobre as quantias referidas em 1 a 3, vencidos e vincendos, à taxa legal, que quanto ao subsídio de elevada incapacidade e despesas de deslocação se contam desde o dia da conciliação, até efetivo e integral pagamento; as despesas médicas e medicamentosas antiepiléticas e a proporcionar ao sinistrado o acompanhamento em consultas de neurocirurgia, medicina física e reabilitação, terapia da fala e ocupacional (cfr. doc. de fls. 91/100, cujo teor se dá por reproduzido). 52. A interveniente (…) – Seguros Gerais, S.A. tem acompanhado o autor e pago as quantias a que foi condenada no âmbito da referida sentença, tendo liquidado uma indemnização no montante de € 11.596,67, a quantia de € 86.359,14 a título de pensões vencidas, a quantia de € 106.617,70 a título de despesas com tratamentos, a quantia de € 36.067,94 a título de pensão de assistência de 3ª pessoa e a quantia de € 32.330,35 a título de outras despesas. 53. E constituiu uma provisão matemática para pensões, no montante de € 162.872,64, outra provisão matemática para assistência vitalícia no montante de € 143.561,00 e ainda provisão matemática para ajuda de 3ª pessoa no montante de € 119.057,13. 4 – O Tribunal a quo proferiu decisão indemnizatória por dano distinto do peticionado, considerando autonomamente o dano biológico, que não foi concretamente peticionado pelo A. 5 – E por essa razão não foi sujeito a contraditório por parte da R. 6 – O Tribunal condenou a R. em objecto diverso do peticionado na acção e, nessa medida, tal corresponde à previsão da alínea e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, sendo uma das causas de nulidade da sentença, que expressamente se invoca. Dispõe o n.º 1 do artigo 615.º do CPC: “1- É nula a sentença quando: e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido”. 7 – Neste sentido versa o Acórdão do STJ de 21/03/2019 – Processo n.º 2827/14.7T8LSB.L1.S1 II- A nulidade do acórdão quando o Tribunal condene em objecto diverso do pedido colhe fundamento no princípio do dispositivo que atribui às partes, a iniciativa do impulso processual, e no principio do contraditório, segundo o qual o Tribunal não pode resolver o conflito de interesses, que a demanda pressupõe, sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja chamada para se opor”. 8 – Tendo em conta que os valores indemnizatórios decorrentes de sinistro automóvel e de sinistro laboral não são cumuláveis, mas complementares até ao ressarcimento total do prejuízo causado, não se justifica que no dano concretamente reclamado pelo A. (perdas salariais), não seja efectuada a correspondente dedução do rendimento anual pago pela Seguradora Laboral e que a recorrente terá de reembolsar, por força do instituto da subrogação. 9 – Como dispõe o douto Acórdão 555/04.0GTAVR.C1 do Tribunal da Relação de Coimbra, de 08/01/2004: “No âmbito da indemnização pelo exercício da actividade profissional que o lesado exercia e incapacidade futura de exercício dessa mesma actividade, ressarcidas em sede de acidente de trabalho, a autora tendo optado por aquela indemnização, apenas poderá receber nova indemnização com base em pressupostos “ novos” ou “diferentes” daquele em que assentou a indemnização por acidente de trabalho”. De igual forma o Acórdão da Relação de Lisboa de 12/02/1987 , CJ ano 1987 tomo I – 125: “Em acidente de simultaneamente de viação e de trabalho há cumulação de responsabilidades mas não de indemnizações. O lesado pode pedir indemnização por qualquer delas e ambas podem ser-lhe atribuídas, optando depois pela que mais lhe convier”. Ou ainda o Acórdão do STJ de 03/04/1970, in BMJ 196 – pág. 223: “Não são cumuláveis as indemnizações por acidente simultaneamente de viação e trabalho, devendo os titulares do direito de indemnização optar por uma delas”. 10 – Arguida a nulidade da Sentença, pois que o Tribunal, neste segmento, condenou em objecto diverso do pedido, impõe-se que a presente alegação seja processada e julgada de acordo com o disposto no artigo 617.º do CPC. Caso assim não se considere: 11 – Os valores arbitrados extravasam todo o sentido de razoabilidade e não têm em conta os valores da pensão anual e vitalícia, auxílio de 3ª pessoa, e pagamento de despesas médicas e medicamentosas, todas com carácter vitalício e que é encargo da ora Recorrente, que já pagou e vai suportar para futuro, em virtude do direito de reembolso que assiste à Seguradora do ramo laboral (…) – Seguros Gerais, SA. 12 – O valor fixado para a compensação do dano biológico na vertente patrimonial no valor de € 250.000,00, acrescido de € 75.000,00 para o Dano Não Patrimonial é manifestamente exagerado. 13 – Não pode ser ignorado que por via da diminuição de capacidade do A., estão a ser prestadas parcelas compensatórias que visam atenuar as dificuldades decorrentes do sinistro, designadamente: (ponto 52 dos provados). a) A pagar ao autor uma pensão anual e vitalícia de € 8.400,00, a pagar adiantada e mensalmente até ao 3º dia de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 daquela, acrescida de mais uma prestação nos meses de junho e novembro, a título de subsídio de férias e de natal; b) A quantia de € 5.533,68 a título de subsídio de elevada incapacidade permanente; c) A quantia de € 461,14 a título de prestação suplementar para assistência de terceira pessoa; d) As despesas médicas e medicamentosas antiepiléticas e a proporcionar ao sinistrado o acompanhamento em consultas de neurocirurgia, medicina física e reabilitação, terapia da fala e ocupacional. e) A douta sentença atribui o valor de € 250.000,00 a título de Dano Biológico na sua vertente patrimonial, pelo que haveria sempre de ter em conta para a sua determinação, não só o desconto das pensões atribuídas em sede de processo laboral, mas também, que para acorrer às dificuldades resultantes da diminuição da capacidade do A., este beneficia de uma prestação suplementar vitalícia, de auxílio de 3ª pessoa. 14 – O Dano Biológico visa ressarcir um dano de natureza geral, com repercussão nas actividades da vida diária, incluindo familiares, sociais e de lazer. Ora, o facto do lesado beneficiar de auxílio diário e vitalício de 3ª pessoa, impõe que tal facto seja considerado como uma forma de mitigar essas mesmas dificuldades. Devendo, adicionalmente ser considerado o desconto das pensões atribuídas em acidente de trabalho. 15 – O A. auferia uma remuneração de € 750,00 por 14 meses, estando a receber uma pensão anual e vitalícia de € 8.400,00 (ponto 51 dos provados). Ponderando 42 anos, o diferencial seria de € 88.200,00 (750,00 x 14 = 10.500,00 - 8.400,00 = € 2.100,00 x 42 anos). 16 – Por tudo o exposto, e ponderando, nomeadamente a factualidade provada, os padrões da jurisprudência, afigura-se equitativa a atribuição ao Recorrido de uma compensação pelo dano biológico na sua vertente patrimonial não superior a € 80.000,00, uma vez que o A. beneficiaria da antecipação do valor indemnizatório. 17 – A douta Sentença ao determinar o pagamento ao A. da quantia que vier a ser liquidada na vertente de Despesas com medicação analgésica e antiespasmódica com o limite de € 136.572,60, não teve em consideração o facto de a interveniente (…) – Seguros Gerais, S.A., no âmbito da Sentença em sede de processo laboral está obrigada a pagar as despesas médicas e medicamentosas antiepiléticas e a proporcionar ao sinistrado o acompanhamento em consultas de neurocirurgia, medicina física e reabilitação, terapia da fala e ocupacional (Ponto 51 dos Provados). 18 – Nos Factos Não Provados, o Tribunal acentua o seguinte: b) Não se provaram quaisquer outros factos, nomeadamente que o A. despende a quantia mensal de € 242,15 com a medicação que toma. 19 – No âmbito do dever de reembolso a que está adstrita, a R. ora recorrente, terá de reembolsar a interveniente das verbas que esta despende a título de despesas com medicamentos, designadamente os que resultam das necessidades encontradas no âmbito das consultas que o sinistrado efectue. 20 – Reembolsos que a ora, recorrente, já efectuou e virá a efectuar no futuro, sendo que não há notícia nos autos de que a interveniente se tenha recusado a liquidar quaisquer despesas medicamentosas apresentadas pelo sinistrado. 21 – Nessa medida, a manter-se este segmento da condenação, resultará uma duplicação das entidades adstritas ao pagamento das despesas medicamentosas. Termos em que se requer seja esta parte da Sentença revogada, mantendo-se o que resulta do Ponto 51 dos Factos Provados, designadamente que a R. ora recorrente terá de reembolsar a interveniente por todas as despesas médicas e medicamentosas prestadas ao A. Termos em que, deverão V. Exas, Venerandos Desembargadores, julgar a presente Apelação procedente, revogando a douta sentença recorrida, proferindo acórdão nos termos supra expostos. Assim se fazendo: Justiça» * Admitido o recurso e observados os vistos legais, cumpre decidir.Houve lugar a resposta do Autora e da Ré que pugnaram pelo acolhimento da posição anteriormente expressa nas respectivas alegações. * * II – Objecto do recurso:É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma). Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação de: a) existência de nulidade por excesso de pronúncia. b) erro de julgamento na subsunção jurídica realizada, tendo em consideração os factos apurados, quanto à atribuição parcial dos montantes indemnizatórios. * III – Dos factos apurados:3.1 – Matéria de facto provada Discutida a causa e produzida a prova, com interesse para a decisão da causa, resultam provados os seguintes factos: 1. O Autor (…) nasceu no dia 15/03/1983. 2. No dia 18/12/2014, pelas 18h30m, o Autor circulava pela Estrada Municipal …, na faixa de rodagem no sentido … /…, conduzindo o veículo automóvel ligeiro de passageiros, de marca …, modelo …, de matrícula (…). 3. Naquelas circunstâncias de tempo e lugar, em sentido contrário e na faixa de rodagem em que aquele circulava, deparou-se com um veículo automóvel ligeiro de mercadorias, de marca …, modelo …, de matrícula (…), conduzido por (…). 4. O qual realizava uma manobra de ultrapassagem e apresentava uma taxa de álcool no sangue de 0,77 g/l. 5. O Autor não conseguiu desviar-se, embatendo os veículos de frente. 6. No local onde ocorreu o embate a faixa de rodagem apresentava linha longitudinal contínua separadora dos sentidos de trânsito e era antecedida, atento o sentido de marcha do veículo (…), de uma lomba que diminuía a visibilidade e obrigava a condução prudente. 7. Em consequência do embate o veículo conduzido pelo Autor ficou destruído, sem concerto ou arranjo. 8. E o Autor sofreu traumatismo crânio-encefálico, com perda de conhecimento, fissura distal do radio à esquerda e edema cerebral difuso. 9. Foi socorrido no local pelos bombeiros de Faro e INEM e após transportado para a urgência do Hospital de Faro, local onde lhe foram ministrados cuidados médicos e medicamentosos. 10. Apresentava hemiparesia direita, desvio de olhar para a esquerda, com ferida craniana temporal esquerda com exposição de massa encefálica, com múltiplos focos hemorrágicos e controlo parcial dos esfíncteres. 11. Foi sujeito a ventilação assistida e sedação e transferido para a Unidade de Cuidados Intensivos/Neurocirurgia, onde ficou internado. 12. Tendo sido submetido a cirurgia de craniectomia, com limpeza e correção da ferida crânio encefálica, com colocação de sensor de PC intra parenquimatoso, permanecendo sedado e ventilado. 13. Ficou internado na Unidade de Cuidados Intensivos Polivalente até ao dia 04/01/2015 em coma. 14. Nessa data foi transferido para o serviço de Neurocirurgia, onde permaneceu até ao dia 28/01/2015, com quadro de afasia motora, compreendendo ordens, mantendo hemiparesia direita e evolução cicatricial. 15. No dia 08/02/2015 recusou internamento e manteve tratamentos em ambulatório até ao dia 02/08/2016, apresentando quadro de hemiparesia de predomínio braquial direita e linguagem do quadro de afasia de boca e apraxia do discurso. 16. No dia 11/02/2015 foi observado no Hospital Particular do Algarve (HPA), após avaliação no Centro Médico de Reabilitação do Sul (CMR do Sul), onde recusou ser internado. 17. Foi proposto tratamento complementar com cranioplastia para correção de defeito e iniciar fisioterapia em regime semi-ambulatório naquele hospital. 18. Manteve recuperação em regime ambulatório no CMR do Sul e consultas regulares no HPA e terapia da fala. 19. No dia 22/04/2015 apresentava evolução favorável da afasia e da hemiparesia com marcha autónoma possível e controlo dos esfíncteres. 20. No dia 29/04/2015 foi submetido a intervenção cirúrgica no HPA para colocação de uma prótese no lado esquerdo do crânio e face (cranioplastia). 21. Teve alta no dia 01/05/2015. 22. Continuou a ser seguido e tratado no CMR do Sul. 23. No dia 17/06/2015 encontrava-se estável a nível neurocirúrgico e foi proposta reavaliação após 1 ano. 24. No dia 12/08/2015 foi observado em ortopedia que diagnosticou tendinose da coifa dos rotadores do ombro direito. 25. Realizou fisioterapia e teve alta de ortopedia no dia 12/11/2015. 26. Em novembro de 2015 teve complicação pós traumática com epilepsia e nova crise em 21/09/2017. 27. Apresentava quadro de monoparesia braquial direita. 28. Passou a tomar medicação Valproato de sódio, levetirecetam, eslicarbazepina, serralina e trazodona. 29. No dia 22/11/2018 foi reavaliado e sugerido fisioterapia diária diminuindo 3 x semana 15 sessões, com objetivo de aumento de amplitudes ativas e força muscular do hemicorpo direito, reeducação da marcha e aumento da performance da mesma; terapia ocupacional 2 x semana 10 sessões, com objetivo de reeducar destreza, manipulação fina de objetos, treino de sensibilidade, treino de atividades da vida diária; terapia da fala 2 x semana 10 sessões, com objetivo de reeducar e estratégias de compensação para fala e linguagem; com futura manutenção de programa de reabilitação de manutenção com fisioterapia, terapia ocupacional e terapia da fala. 30. Terminou as consultas de terapia ocupacional e da falta no dia 04/01/2019. 31. No dia 04/03/2019 foi observado no CMR do Sul e emitido relatório no qual se menciona que face ao quadro neuro motor e funcionais sequelares do autor não é previsível alteração significativa. 32. No dia 27/11/2019 foi observado no CMR do Sul e emitido relatório no qual se menciona que deveria manter programa de reabilitação interdisciplinar com fisioterapia e terapia da fala sob coordenação de médico fisiatra com objetivo de manutenção de funcionalidade adquirida e prevenção de complicações de doença base, com periodicidade dependente do atingimento dos objetivos. 33. O Autor era pessoa alegre, bem-disposta, com alegria de viver, trabalhador e que convivia com amigos, familiares e namorada. 34. Tinha expectativa de constituir família com esta. 35. Devido às lesões causadas pelo embate o Autor sofreu dores e dificuldade em movimentar o corpo. 36. Passou dias e noites sem descansar ou dormir. 37. Quando regressou a casa tinha de usar fraldas, o que recusava fazer, acabando por sujar a roupa de cama e toda a casa. 38. Não consegue sozinho cuidar da sua higiene, vestir-se, preparar as refeições, limpar a casa e deixou de conduzir. 39. O irmão e a mãe ajudam-no na realização dessas tarefas. 40. Deixou de conviver com os amigos e terminou a relação de namoro que mantinha. 41. O que lhe causa sofrimento, tristeza, desgosto e apatia. 42. Tornou-se ansioso e nervoso, com consciência de que as suas limitações físicas e psíquicas se manterão durante toda a vida. 43. Deixou de tratar da horta e de ajudar os familiares. 44. Tem necessidade de acompanhamento médico e de tomar medicação todos os dias. 45. Sente medo de andar de carro e de passar no local onde ocorreu o embate. 46. Por vezes foge de casa e passa largos períodos isolado, mostrando-se apático e triste, deixando os familiares preocupados. 47. Tem ataques de epilepsia e convulsões, o que obriga a acompanhamento constante de terceiros. 48. O Autor exercia as funções de pintor da construção civil por conta própria e deixou de trabalhar desde o embate. 49. Enquanto trabalhador independente tinha a sua responsabilidade laboral transferida para a “(…) – Seguros Gerais, SA”, com a apólice de seguro n.º (…), pelo valor de € 750,00 x 14 meses. 50. O embate descrito em 5 foi participado à “(…) – Seguros Gerais, SA”, por ter ocorrido no percurso de/para o trabalho/residência do Autor. 51. Correu termos no Tribunal de Trabalho de Faro processo de acidente de trabalho, com o n.º 42/16.4T8FAR, no âmbito do qual, por sentença datada do dia 05/12/2017, foi decidido condenar a “(…) – Seguros Gerais, SA” a pagar ao Autor uma pensão anual e vitalícia de € 8.400,00, a pagar adiantada e mensalmente, até ao 3º dia de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 daquela, acrescida de mais uma prestação nos meses de junho e novembro, a título de subsídio de férias e de natal; a quantia de € 5.533,68 a título de subsídio de elevada incapacidade permanente; a quantia de € 461,14 a título de prestação suplementar para assistência de terceira pessoa; a quantia de € 92,80 a título de despesas de deslocação; os juros de mora incidentes sobre as quantias referidas em 1 a 3, vencidos e vincendos, à taxa legal, que quanto ao subsídio de elevada incapacidade e despesas de deslocação se contam desde o dia da conciliação, até efetivo e integral pagamento; as despesas médicas e medicamentosas antiepiléticas e a proporcionar ao sinistrado o acompanhamento em consultas de neurocirurgia, medicina física e reabilitação, terapia da fala e ocupacional (cfr. doc. de fls. 91/100, cujo teor se dá por reproduzido). 52. A interveniente “(…) – Seguros Gerais, SA” tem acompanhado o Autor e pago as quantias a que foi condenada no âmbito da referida sentença, tendo liquidado uma indemnização no montante de € 11.596,67, a quantia de € 86.359,14 a título de pensões vencidas, a quantia de € 106.617,70 a título de despesas com tratamentos, a quantia de € 36.067,94 a título de pensão de assistência de 3ª pessoa e a quantia de € 32.330,35 a título de outras despesas. 53. E constituiu uma provisão matemática para pensões, no montante de € 162.872,64, outra provisão matemática para assistência vitalícia no montante de € 143.561,00 e ainda provisão matemática para ajuda de 3ª pessoa no montante de € 119.057,13. 54. Devido aos factos referidos em 1 a 8, o condutor (…) veio a ser condenado, no âmbito do processo n.º 545/15.8T9LLE, que correu termos no Juízo Local Criminal de Loulé-J3, na pena de 180 dias de multa, à taxa diária de € 6,50, pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ofensa à integridade física por negligência (artigo 148.º, n.ºs 1 e 3, do Código Penal, conjugado com o seu artigo 144.º, alíneas b), c) e d), e ainda os artigos 69.º, n.º 1, alínea a), 13.º e 15.º, alínea a) e 26.º, do mesmo diploma legal) e na pena acessória de inibição de conduzir veículos a motor pelo período de 5 meses (artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal) – (cfr. doc. de fls. 24 a 49 verso, cujo teor se dá por integralmente reproduzido). 55. O Autor é esquerdino, apresenta marcha autónoma, sem necessidade de apoio e apresenta, como sequelas: (a) Crânio: área de prótese da calote craniana parietal esquerda numa área de 12*5 cm ligeiramente deprimida (1cm), com perturbações da fala e comunicação (afasia/disfonia), perturbações de humor persistente e epilepsia focal estrutural; (b) Membro superior direito: ligeira descoordenação e hemiparesia ligeira (motor 4/5); (c) Membro inferior direito: ligeira descoordenação e hemiparesia ligeira (motor 4/5). 56. Em consequência do embate ficou a padecer de perturbação do humor (afetivo) persistente não especificado, com repercussão moderada na autonomia pessoal, social e profissional. 57. E com afasia de predomínio motor-discurso telegráfico (sim/não), agrafia com graves limitações na escrita, embora com compreensão preservada, défice motor do hemicorpo direito (grau 4/5) e epilepsia focal estrutural de etiologia pós traumática. 58. A data da consolidação médico-legal das lesões é fixável no dia 04/03/2019. 59. O Período de Défice Funcional Temporário Total foi fixado em 594 (quinhentos e noventa e quatro) dias (períodos de internamento e/ou repouso absoluto entre os dias 18/12/2014 a 02/08/2018). 60. O Período de Défice Funcional Temporário Parcial foi fixado em 944 (novecentos e quarenta e quatro) dias (entre os dias 03/08/2016 a 04/03/2019). 61. O período de Repercussão Temporária na Atividade Profissional Total foi fixado num período de 1538 (mil, quinhentos e trinta e oito) dias (entre os dias 18/12/2014 a 04/03/2019). 62. O quantum doloris foi fixado no grau 6/7. 63. O Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica foi fixado em 62 pontos. 64. A Repercussão Permanente da Atividade Profissional foi considerado que as sequelas são impeditivas do exercício da sua atividade profissional habitual e de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional. 65. O Dano Estético Permanente foi fixado no grau 6/7, tendo em consideração a alteração ao nível da voz e lentificação da marcha e deformidade a nível da calote craniana. 66. A Repercussão Permanente nas Atividades Desportivas e de Lazer foi fixada no grau 4/7, tendo em consideração a prática de atividades lúdicas anteriormente praticadas. 67. A Repercussão Permanente na Atividade Sexual foi fixada no grau 3/7, tendo em consideração a repercussão de fatores do foro psíco-emocional relacionáveis com consequências psiquiátricas resultantes e descritas como perturbações do humor de caráter afetivo. 68. É considerada a dependência permanente de ajudas: ajudas medicamentosas (analgésica, antiespasmódica e antiepilética); tratamentos médicos regulares (fisioterapia, terapia da fala/ocupacional e consultas de neurocirurgia e psiquiatria); e necessidade de apoio de 3ª pessoa a tempo parcial (4 a 6 horas/dia). 69. No dia 18/12/2014 a responsabilidade civil emergente da circulação do veículo automóvel de matrícula (…) encontrava-se transferida para a ré através da apólice n.º (…). 70. A Ré pagou ao Autor a quantia de € 2.000,00, aceite por este, pela destruição causada no veículo que conduzia e utilizava para as suas deslocações. 71. E a quantia de € 2.952,00 para a realização de obras de adaptação da habitação à mobilidade no seu interior e ainda a quantia de € 3.000,00 de adiantamento. 72. A criação de uma casa-de-banho no primeiro andar da habitação onde o Autor passava a maior parte do tempo importa na quantia global de € 7.620,88. * 3.2 – Matéria de facto não provada[1]: Com interesse para a decisão da causa ficaram por provar os seguintes factos: a) o Autor deixou de ter capacidade para se deslocar. b) o Autor despende a quantia mensal de € 242,15 com a medicação que toma. c) a taxa de álcool que o condutor (…) apresentava potenciou o propósito de efetuar a segunda manobra de ultrapassagem e fez com que fosse embater no veículo conduzido pelo autor. * IV – Fundamentação:4.1 – Nulidade relativa ao excesso de pronúncia: De acordo com a primeira parte da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, a sentença é nula, quando «o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento». Entende a sociedade recorrente que o Tribunal a quo violou a sobredita norma. Em traços gerais, a Ré invoca que o julgador a quo cometeu a referida nulidade ao ter atribuído uma indemnização pelo dano biológico, quando o mesmo não foi pedido. Questões submetidas à apreciação do Tribunal identificam-se com os pedidos formulados, com a causa de pedir ou com as excepções invocadas, desde que não prejudicadas pela solução de mérito encontrada para o litígio. É a violação daquele dever que torna nula a decisão e tal consequência justifica-se plenamente, uma vez que a omissão de pronúncia se traduz, ao fim e ao cabo, em denegação de justiça e o excesso de pronúncia na violação do princípio dispositivo que contende com a liberdade e autonomia das partes. Coisa diferente são as razões jurídicas alegadas pelas partes em defesa dos seus pontos de vista, as quais correspondem a simples argumentos e não constituem questões na dimensão valorativa estipulada na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil. A nulidade da decisão por excesso de pronúncia acontece assim, quando o acto decisório decide alguma questão não suscitada pelas partes. E tal não ocorre. Efectivamente, tanto na determinação (indagação), como na interpretação e na aplicação do direito, o juiz não está sujeito às alegações das partes (la court sait le droit; da mihi factum dabo tibi ius). Ter os movimentos livres na aplicação do Direito significa, além do mais, que o juiz não se encontra adstrito à qualificação jurídica dos factos efectuada pelas partes[2]. Na verdade, a Meritíssima Juíza de Direito limita-se a fazer um enquadramento conceptual distinto daquele que consta da petição inicial, alocando as sequelas físicas e outras ali descritas na categoria do dano biológico, enquanto que, na perspectiva teórica da parte activa, os mesmos estavam integrados no conceito do dano futuro. O Juízo Central de Competência Cível de Faro apenas enquadrou os danos apurados, categorizou e recompensou-os em sede de indemnização por factos ilícitos e não conhece de forma inovatória de qualquer pretensão que não tenha sido submetida à respectiva apreciação. Se a interpretação e a relevância que a sentença deu a certos factos e se a conclusão que deles se extraiu foram, ou não, as mais correctas, é questão relacionada com o mérito da decisão e com um eventual erro de julgamento, mas que nada tem a ver com a construção lógica da sentença que se mostra correctamente formulada. Existe uma distinção entre erros de actividade e erros de juízo. Na perspectiva do Catedrático de Coimbra «o magistrado comete erro de juízo ou de julgamento quando decide mal a questão que lhe é submetida, ou porque interpreta e aplica erradamente a lei, ou porque aprecia erradamente os factos; comete erro de actividade quando, na elaboração da sentença, infringe as regras que disciplinam o exercício do seu poder jurisdicional. Os erros da primeira categoria da decisão, os da segunda categoria são de carácter formal: respeitam à forma ou ao modo como o juiz exerceu a sua actividade de julgador. Assentemos, pois nisto: por vícios da sentença entende a lei os erros materiais e os erros formais, que se corrigem pelos meios facultados pelos artigos 667.º e 669.º[3]. Contrapõem-se aos erros substanciais, contra os quais se há-de reagir por via de recursos»[4]. Esta posição é partilhada por Antunes Varela[5] e encontra eco ainda na jurisprudência recente dos Tribunais Superiores. Na hipótese vertente, o pedido é o mesmo, a causa de pedir é aquela que foi indicada no articulado inicial e o sentenciamento aplica o direito aos factos apurados. Por conseguinte, resta afirmar que existe uma identidade absoluta entre as pretensões deduzidas pelas partes e a matéria solucionada pelo Tribunal. Em acréscimo, é jurisprudência perfeitamente consolidada que, em sede de fixação do quantum indemnizatório, o Tribunal embora esteja limitado ao montante máximo do pedido, não está circunscrito aos montantes parciais peticionados, podendo este montante ser desdobrado em função da gravidade dos danos experimentados. A eventual sobreposição indemnizatória é uma questão de mérito, que, adiante, no lugar próprio, será debatida e o Tribunal não estava vinculado a exercer o contraditório relativamente a uma possível divergência hermenêutica na classificação do dano. Carece assim de fundamento a arguição efectuada ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil. * 4.2 – Da responsabilidade pela produção do acidente e da reparação dos danos:4.2.1 – Nota introdutória: Relativamente aos pontos a) (dano patrimonial decorrente de obras de adaptação da residência), b) (quantia a liquidar a propósito do dano patrimonial futuro na vertente de despesas com medicação analgésica e antiespasmódica que o autor venha a necessitar) e e) (reembolso das quantias pagas, ao abrigo do contrato de seguro de acidentes de trabalho) a decisão mostra-se transitada e goza assim da caraterística da imutabilidade. * São vários os pressupostos da responsabilidade civil por actos ilícitos, como se extrai do n.º 1 do artigo 483.º[6] do Código Civil.Relativamente à integração fática apurada e à respectiva subsunção a delitos de contra-ordenação nada a apontar à decisão recorrida, a qual faz a correcta avaliação das infracções estradais cometidas. No caso em apreço, para além da Ré seguradora ter aceite a culpa do condutor do veículo segurado pela produção do acidente, face aos elementos fácticos apurados, o Tribunal da Relação de Évora tem de aceitar que as lesões verificadas ocorreram em consequência do sinistro automóvel e que são causa directa e necessária do mesmo. Vem-se entendendo que, provindo a lesão de um facto ilícito, seja de acolher e seguir a formulação negativa, segundo a qual o facto que actuou como condição do dano só não deverá ser considerado causa adequada do mesmo se, dada a natureza geral e em face das regras de experiência comum, se mostrar indiferente para a verificação dano. Causalidade adequada essa que se refere – e não apenas ao facto ou dano isoladamente considerado – a todo o processo factual que, em concreto, conduziu ao dano[7]. Da análise da matéria fáctica assente resulta que todos os referidos pressupostos impulsionadores da reparação fundada na responsabilidade civil por factos ilícitos se encontram preenchidos. * Ensina Gomes da Silva que «elementos fundamentais da responsabilidade são o dano e a relação em que ele se encontra com o responsável. (...) A responsabilidade é, por conseguinte, a obrigação nascida de um prejuízo e tem por objecto a reparação deste. O intuito com que a lei o estabelece não é o de intimar os indivíduos nem o de reprimir os factos ilícitos: é apenas o de satisfazer a justiça comutativa, reparando danos causados. O prejuízo, por conseguinte, é o fulcro de toda a responsabilidade»[8]. Na lição de Pereira Coelho «por dano pode entender-se (...) o prejuízo real que o lesado sofreu in natura, em forma de destruição, subtracção ou deterioração de um certo bem corpóreo ou ideal»[9]. Assim, defende-se que dano é «todo o prejuízo, desvantagem ou perda que é causada nos bens jurídicos, de carácter patrimonial ou não, de outrem»[10]. * O Autor peticionava o pagamento de uma indemnização no valor total de € 938.693,48, respeitando desse valor € 300.000,00 a danos não patrimoniais e em relação a danos patrimoniais no valor de € 136.572,60 relativo a despesas com medicamentos, de € 1.000,00 relativo à diferença do valor do veículo, de € 7.620,88 relativo a obras de adaptação da residência e de € 493.500,00 relativo às lesões sofridas e incapacidade permanente de que ficou a padecer, a que acresce agravamento clínico que possa vir a ocorrer. Foi atribuída uma indemnização por dano patrimonial, na vertente do dano biológico, no valor de € 250.000,00 e de € 75.000,00, a título de danos não patrimoniais, ambas acrescidas de juros de mora, à taxa de juros civis, a contar do dia seguinte ao da prolação da sentença até efectivo e integral pagamento.O Autor entende que as referidas parcelas indemnizatórias deveriam ser superiores e a companhia de seguros Ré manifesta posição no sentido de ser excessiva a obrigação de indemnizar. * 4.2.2 – Do dano biológico: vertente patrimonial e não patrimonial. Danos actuais e futuros. Breve introdução à questão do dano biológico:Para além da bibliografia geral dos direitos das obrigações, sobre o dano futuro, dano biológico e a obrigação de indemnização podem ser consultados Vaz Serra[11], Sinde Monteiro[12], João Álvaro Dias[13], Armando Braga[14], Maria da Graça Trigo[15] [16], Manuel Carneiro da Frada[17], Ana Mafalda Barbosa[18], Cátia Gaspar e Maria Manuela Chichorro[19], Duarte Nuno Vieira e José Alvarez Quintero[20], Brandão Proença[21], Maria Manuel Veloso[22] e Paula Meira Lourenço[23]. No plano jurisprudencial a teoria do dano biológico tem progressivamente ganho aceitabilidade enquanto realidade dogmática, traduzindo-se «na diminuição somático psíquica do indivíduo, com natural repercussão na vida de quem o sofre» e que «tanto pode ser ressarcido como dano patrimonial tal como compensado a título de dano moral»[24]. Por dano biológico deve entender-se qualquer lesão da integridade psico-física que possa prejudicar quaisquer actividades, situações e relações da vida pessoal do sujeito, não sendo necessário que se refira apenas à sua esfera produtiva, abrangendo igualmente a espiritual, cultural, afectiva, social, desportiva e todas as demais nas quais o indivíduo procura desenvolver a sua personalidade. É assim dominante a ideia que o prejuízo biológico, enquanto diminuição psíquico-somática e funcional de uma pessoa em geral, assume repercussões na vida individual e gerador de responsabilidade civil, tanto no domínio do dano patrimonial como na dimensão do infortúnio não patrimonial[25]. O dano biológico derivado de incapacidade geral permanente, de cariz patrimonial, é susceptível de justificar a indemnização por danos patrimoniais futuros, independentemente de o mesmo se repercutir na vertente do respectivo rendimento salarial, já que constitui um dano de esforço, porquanto o sujeito para conseguir desempenhar as mesmas tarefas e obter o mesmo rendimento, necessitará de um maior empenho, de um estímulo acresci[26]. Sustentado na ideia do «dano de esforço» pode ser configurado um «um dano base ou dano central, um verdadeiro dano primário, sempre presente em caso de lesão da integridade físico-psíquica, e sempre lesivo do bem saúde» e uma lesão da capacidade laboral da vítima, que surge como «dano sucessivo ou ulterior e eventual; não um dano evento, mas um dano consequência», representando «um ulterior coeficiente ou plus de dano a acrescentar ao dano corporal»[27]. Este dano visa ressarcir mais do que a capacidade e de perda de rendimentos laborais ou profissionais, pois, acima de tudo, aquilo que mais releva neste segmento é tornar indemne o sofrimento psíco-somático que afecta a disponibilidade do autor para o desempenho de quaisquer actividades do seu dia-a-dia. Sobre a conceptualização, valorização e finalidades da compensação do dano biológico pode ser lido o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10/10/2012[28]. Para Maria da Graça Trigo o dano biológico abrange um espectro alargado de prejuízos incidentes na esfera patrimonial do lesado, desde a perda do rendimento total ou parcial auferido no exercício da sua atividade profissional habitual até à frustração de previsíveis possibilidades de desempenho de quaisquer outras atividades ou tarefas de cariz económico, passando ainda pelos custos de maior onerosidade no exercício ou no incremento de quaisquer dessas actividades ou tarefas, com a consequente repercussão de maiores despesas daí advenientes ou o malogro do nível de rendimentos expectáveis[29]. O mesmo evento pode produzir danos patrimoniais e não patrimoniais, e é isso que se verifica na presente situação: as lesões que a vítima do acidente sofreu, além dos danos não patrimoniais que causaram, determinaram também o prejuízo patrimonial da diminuição da capacidade aquisitiva do lesado. Neste enquadramento o Tribunal de Recurso conhecerá sucessivamente da concreta privação da capacidade de angariação de rendimentos e, em seguida, a violação do direito à integridade físico-psíquica total, seguida e, por fim, o dano estritamente de natureza não patrimonial. * 4.2.3 – Dos danos relacionados com a capacidade de ganho:A Meritíssima Juíza de Direito entendeu que, face ao tempo de vida, em associação com os rendimentos percebidos, o lesado teria jus a uma indemnização de € 368.319,70, mas acabou por considerar justo e adequado fixar em € 250.000,00 a indemnização devida pelo dano decorrente do Défice Funcional da Integridade Físico-Psíquica. A isto contrapõe a Ré “(…) – Companhia de Seguros, SA” a questão da sobreposição entre a indemnização aqui atribuída e aquela que é recebida em sede de Tribunal de Trabalho. * Vaz Serra diz que «a desvalorização física que afecte a capacidade aquisitiva do lesado constitui um dano (além de não patrimonial) patrimonial, pois traduz-se na redução da possibilidade de obtenção de valores patrimoniais, isto é, no não aumento do património do lesado (lucro cessante).Está aliás enraizada na jurisprudência dos Tribunais Superiores a ideia que para a fixação da justa indemnização para ressarcir o prejuízo inerente à perda de capacidade de ganho determinada pela incapacidade parcial permanente, causada por lesões sofridas em acidente de viação, a lei não dá qualquer orientação que não seja a constantes do n.º 2 do artigo 564.º[30] – atendibilidade dos danos futuros previsíveis – e dos n.ºs 2 e 3 do artigo 566.º[31] – vulgarmente designada teoria da diferença – ambos do Código Civil, conjugados com o recurso à equidade se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos. A indemnização por danos futuros resultantes de incapacidade física do lesado causada por acidente de viação corresponde a um capital produtor do rendimento que a vítima não irá auferir por força da limitação da sua capacidade de trabalho que se traduz numa equação de correlacionação entre o rendimento anual perdido, o tempo provável de vida activa e as expectativas sustentadas de progressão na carreira. No que concerne aos danos futuros a jurisprudência, inicialmente a indemnização estava apenas alocada ao tempo provável de vida activa da pessoa lesada[32]. Progressivamente, por força da constatação empírica do aumento médio do tempo de vida, em função do valor constitucional da defesa da lesão da integridade corporal que mantém o mesmo valor axiológico após a idade provável da reforma, passaram a ser valorizados os impactos negativos na qualidade de vida findo o período habitual de vida laboral até o decurso do tempo de vida médio do cidadão português[33]. De acordo com os dados estatísticos disponibilizados a esperança de vida média do cidadão português é estimada em 77.7 para pessoas do sexo masculino e os 83.4 para cidadãs do género feminino. A situação terá de ser analisada em concreto, decompondo a afectação da sua potencialidade física, psíquica ou intelectual, por um lado, a uma perda da capacidade de ganho durante o período activo do lesado ou da sua vida, noutra matriz. * Nesta dimensão temos de ter em conta que correu termos no Tribunal de Trabalho de Faro um processo de acidente de trabalho, que, por sentença datada do dia 05/12/2017, condenou a “(…) – Seguros Gerais, SA” a pagar ao Autor uma pensão anual e vitalícia de € 8.400,00, a pagar adiantada e mensalmente, até ao 3º dia de cada mês, correspondendo cada prestação a 1/14 daquela, acrescida de mais uma prestação nos meses de junho e novembro, a título de subsídio de férias e de natal; a quantia de € 5.533,68 a título de subsídio de elevada incapacidade permanente; a quantia de € 461,14 a título de prestação suplementar para assistência de terceira pessoa; a quantia de € 92,80 a título de despesas de deslocação; os juros de mora incidentes sobre as quantias referidas em 1 a 3, vencidos e vincendos, à taxa legal, que quanto ao subsídio de elevada incapacidade e despesas de deslocação se contam desde o dia da conciliação, até efetivo e integral pagamento; as despesas médicas e medicamentosas antiepiléticas e a proporcionar ao sinistrado o acompanhamento em consultas de neurocirurgia, medicina física e reabilitação, terapia da fala e ocupacional.Mais é de atender que a Ré “(…) – Companhia de Seguros, SA” foi condenada a pagar à interveniente “(…) – Seguros Gerais, SA” a quantia de € 272.518,53, a título de reembolso das quantias pagas, ao abrigo do contrato de seguro de acidentes de trabalho, acrescida de juros de mora, à taxa de juros civis, a contar da data da notificação para contestar até efectivo e integral pagamento. Com a habitual eloquência, Vaz Serra aponta que «as indemnizações por acidentes simultaneamente de viação e de trabalho se não cumulam e apenas se completam até ao ressarcimento total do dano causado ao lesado é manifestamente exacta, pois a finalidade da indemnização é reparar o prejuízo causado ao lesado e não atribuir a este um lucro. Se, portanto, o lesado receber a indemnização que lhe é devida pela entidade patronal ou seguradora da responsabilidade civil dela, não pode exigir do responsável pelo acidente de viação uma indemnização que represente uma duplicação daquela outra: na medida da indemnização satisfeita pela entidade patronal ou seguradora, a titulo de responsável pelo acidente de trabalho, o dano deixou de existir e, por isso, não tem já de ser reparado pelo responsável pelo acidente»[34]. Neste campo, é assim inegável que não são cumuláveis as indemnizações por acidente simultaneamente de viação e trabalho, devendo os titulares do direito de indemnização optar por uma delas[35]. Na realidade, no âmbito da indemnização pelo exercício da actividade profissional que o lesado exercia e incapacidade futura de exercício dessa mesma actividade, ressarcidas em sede de acidente de trabalho, a autora tendo optado por aquela indemnização, apenas poderá receber nova indemnização com base em pressupostos “ novos” ou “diferentes” daquele em que assentou a indemnização por acidente de trabalho[36]. Por isso, a jurisprudência assentou na ideia que no caso de perdas salariais pagas em sede de processo laboral seja efectuada a correspondente dedução do rendimento anual pago pela Seguradora Laboral e que a recorrente terá de reembolsar, por força do instituto da sub-rogação. Havendo concorrência entre a responsabilidade civil, por um lado, e a responsabilidade laboral infortunística, por outro lado, é sempre exigível, por força e no âmbito da primeira, a indemnização pela totalidade dos danos decorrentes do correspondente acidente de viação, cabendo depois à entidade patronal/seguradora, o reembolso do excesso que foi antecipadamente pago pelos mesmos ao sinistrado, como indemnização pelo acidente de trabalho[37]. E, assim, neste parâmetro, assiste parcialmente razão à Ré seguradora que não pode ser duplamente condenada a proceder ao pagamento de indemnizações decorrentes da perda salarial e correspectivamente também o lesado não poderá receber duas verbas tendentes a ressarcir o mesmo prejuízo. Nesta ordem ideias, temos de ter em atenção que a “(…) – Seguros Gerais, SA” disponibilizou a quantia de € 86.359,14 a título de pensões vencidas e constituiu uma provisão matemática para pensões no montante de € 162.872,64. O Autor auferia uma remuneração de € 750,00 (750 x 14 = 10,500) e encontra-se a receber uma pensão anual e vitalícia de € 8.400,00. Existe assim um diferencial de € 2.100,00, que multiplicado por 42 anos daria um resultado de € 88.200,00. * Todavia, esta soma não esgota toda a matéria atinente ao ressarcimento dos danos relacionados com a evolução da actividade profissional e dos recursos remuneratórios associados. Esta verba apenas inclui a sua componente exclusivamente patrimonial da perda de rendimentos laborais futuros, numa perspectiva estática (atendendo ao salário percebido no momento da ocorrência do acidente, não contemplando a hipótese de aumento do salário mínimo, a inflação, a evolução profissional e outros factores de correcção de rendimentos). E a jurisprudência entende que a vertente da perda da capacidade laboral específica ou genérica como no aumento da penosidade de futuras tarefas laborais (no sentido de que o lesado alcança o mesmo trabalho que alcançaria se não tivesse a lesão, mas fá-lo com mais esforço)[38] tem de ser ressarcida. Isto é, apenas não haverá cumulação de indemnizações se estivermos perante o mesmo dano, o que não sucede se os danos forem distintos, o que ocorre entre o dano biológico, enquanto dano esforço em geral, e o dano decorrente da incapacidade permanente parcial para uma profissão, que é um dano específico, não sendo abrangido por aquele outro[39]. A doutrina e a jurisprudência estão de acordo quando sublinham que pelo facto de o ofendido não exercer à data do acidente qualquer profissão, não está afastada a existência de dano patrimonial, compreendendo-se neste as utilidades futuras e as simples expectativas de aquisição de bens. Neste leque, cingindo-nos agora à capacidade para o trabalho, encontrar-se-ão os indivíduos lesados que se encontram fora do mercado do trabalho, da vida activa laboral, e considerando a duração cronológica de vida, seja a montante – caso das crianças e jovens, ainda estudantes, ou não, mas que ainda não ingressaram no mundo laboral –, seja, a jusante, com os reformados/aposentados, que dele já saíram, sem esquecer os que estando fora destes parâmetros temporais, situando-se pela sua idade no período de vida activa, estão porém fora daquele mercado, porque desempregados[40]. E esta tese aplica-se igualmente àqueles que, por conta das sequelas sofridas, ficam inibidos de continuar a exercer uma determinada profissão. Não oferece assim dúvidas que a mera necessidade de um maior dispêndio de esforço e de energia corresponde a um sofrimento psico-somático autónomo que se pode identificar com um dano patrimonial strictu senso. Neste particular, ao avaliar e quantificar o dano patrimonial futuro, pode e deve o Tribunal reflectir também na indemnização arbitrada a perda de oportunidades profissionais futuras que decorra do grau de incapacidade fixado ao lesado, ponderando por esta via na indemnização, não apenas as perdas salariais prováveis, mas também o dano patrimonial decorrente da inevitável perda de chance ou oportunidades profissionais por parte do lesado[41]. E este cálculo será realizado mais adiante aquando da definição do montante a atribuir em sede de dano biológico strictu sensu. * 4.2.4 – Dos danos de natureza não patrimonial. Noção, extensão e recurso a critérios de equidade:O artigo 496.º[42] do Código Civil impõe que na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. Os interesses cuja lesão desencadeia um dano não patrimonial são infungíveis, não podem ser reintegrados mesmo por equivalente. Mas é possível, em certa medida, compensá-los mediante satisfações derivadas da utilização do dinheiro. Não se trata, portanto, de atribuir ao lesado «um preço de dor» ou «um preço de sangue», mas de lhe proporcionar uma satisfação, em virtude da aptidão do dinheiro para propiciar a realização de uma ampla gama de interesses, na qual se podem incluir mesmo esses interesses de ordem refinadamente ideal[43] [44]. Almeida e Costa entende «que os danos não patrimoniais, embora insusceptíveis de uma verdadeira e própria reparação ou indemnização, porque inavaliáveis pecuniariamente, podem ser, em todo o caso, de algum modo compensados. E mais vale proporcionar à vítima essa satisfação do que deixá-la sem qualquer amparo»[45] [46] [47] [48]. É ainda de alertar que, tal como atesta a jurisprudência constante dos Tribunais Superiores, a referida compensação tem natureza mista, pois visa simultaneamente reparar o prejuízo mas também encerra um juízo reprovador da conduta lesiva. O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo Tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º (primeira parte do n.º 3 do artigo 496.º do Código Civil). Conforme faz notar Pessoa Jorge, «na generosa formulação do artigo 496.º do Código Civil, que confia ao legislador a tarefa de determinar o que é equitativo e justo em cada caso, no que fundamentalmente releva, não o rigor algébrico de quem faz a adição de custas, despesas, ou de ganhos (como acontece no cálculo da maior parte dos danos de natureza patrimonial), mas, antes, o desiderato de, prudentemente, dar alguma correspondência compensatória ou satisfatória entre uma maior ou menor quantia de dinheiro a arbitrar ao lesado e a importância dos valores de natureza não patrimonial em que ele se viu afectado»[49]. O juízo de equidade a que lei faz menção determina que o julgador tome «em conta todas as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e da criteriosa ponderação das realidades da vida»[50]. A equidade na visão de Menezes Cordeiro visa ordenar determinado problema perante um conjunto articulado de proposições objectivas[51]. E está limitada sempre pelos imperativos da justiça real (a justiça ajustada às circunstâncias), em oposição à justiça meramente formal[52]. O juízo de equidade das instâncias, essencial à determinação do montante indemnizatório por danos não patrimoniais, assente numa ponderação, prudencial e casuística, das circunstâncias do caso – e não na aplicação de critérios normativos – deve ser mantido sempre que – situando-se o julgador dentro da margem de discricionariedade que lhe é consentida – se não revele colidente com os critérios jurisprudenciais que, numa perspectiva actualística, generalizadamente vêm sendo adoptados, em termos de poder pôr em causa a segurança na aplicação do direito e o princípio da igualdade. Aliás, estamos num domínio em que claramente não nos devemos afastar dos padrões indemnizatórios decorrentes da prática jurisprudencial, «procurando – até por uma questão de justiça relativa – uma aplicação tendencialmente uniformizadora ainda que evolutiva do direito, como aliás impõe o n.º 3 do artigo 8.º[53] do Código Civil, por forma a evitar exacerbações subjectivas»[54]. Neste campo, a proporção, a adaptação às circunstâncias, a objectividade, a razoabilidade e a certeza objectiva são as linhas motrizes de actuação da equidade. * 4.2.5 – Do dano psíco-somático. Das lesões à saúde, da perda de qualidade de vida, dos prejuízos de afirmação pessoal e dos danos laborais futuros indirectos.Ao analisar e ponderar a factualidade apurada, este Tribunal terá de tomar em consideração as circunstâncias do acidente, o sofrimento experimentado, as avaliações e os tratamentos médicos variados, os períodos de internamento e de recuperação, a afectação decorrente da incapacidade parcial permanente, as alterações na dinâmica familiar, as dificuldades acrescidas de convívio sócio-familiar, as adversidades várias na execução de tarefas e a perda do prazer de prática de actividades de lazer que outrora realizava sem problemas, os bloqueios no exercício da condução, os problemas que as lesões trouxeram no desempenho profissional, a necessidade de ser acompanhado na prossecução de rotinas pessoais, as complicações no sono e a necessidade de tomar medicação permanente e definitivamente e os transtornos psicossomáticos que passou a registar, entre outros exemplos de danos ao nível da afirmação pessoal que estão descritos nos factos provados. Em particular, o Autor apresenta as lesões mencionadas no ponto 55 dos factos provados e a data da consolidação médico-legal das lesões é fixável no dia 04/03/2019, recordando aqui que o acidente ocorreu no dia 18/12/2014. Neste campo, o Período de Défice Funcional Temporário Total foi fixado em 594 (quinhentos e noventa e quatro) dias (períodos de internamento e/ou repouso absoluto entre os dias 18/12/2014 a 02/08/2018) e Défice Funcional Temporário Parcial foi fixado em 944 (novecentos e quarenta e quatro) dias (entre os dias 03/08/2016 a 04/03/2019). O período de repercussão temporária na actividade profissional total foi fixado num período de 1538 (mil e quinhentos e trinta e oito) dias (entre os dias 18/12/2014 a 04/03/2019), o défice funcional permanente da integridade físico-psíquica foi fixado em 62 pontos, o dano estético permanente foi fixado no grau 6/7 (alteração ao nível da voz e lentificação da marcha e deformidade a nível da calote craniana) e a repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer foi fixada no grau 4/7 (tendo em consideração a prática de actividades lúdicas anteriormente praticadas). A repercussão permanente na actividade sexual foi fixada no grau 3/7, tendo em consideração a repercussão de factores do foro psico-emocional relacionáveis com consequências psiquiátricas resultantes e descritas como perturbações do humor de carater afetivo. Em adição, foi considerada a existência de dependência permanente de ajuda medicamentosas (analgésica, antiespasmódica e antiepilética), tratamentos médicos regulares (fisioterapia, terapia da fala/ocupacional e consultas de neurocirurgia e psiquiatria) e a necessidade de apoio de 3ª pessoa a tempo parcial (4 a 6 horas/dia). Ficou definitivamente afectada a repercussão permanente da actividade profissional, pois as sequelas são impeditivas do exercício da sua actividade profissional habitual e de qualquer outra dentro da sua área de preparação técnico-profissional. Assim, a indemnização por danos resultantes de maiores dificuldades e de esforços para exercer uma profissão, deve ser calculada em atenção ao tempo provável de vida activa da vítima, de forma a representar um capital produtor de rendimentos que cubra a diferença entre a situação actual e a que existiria se não fora a existência do evento danoso[55] [56]. Antecipadamente deixa-se aqui um alerta no sentido que as dores, os sofrimentos registados, a perda de prazer e as adversidades experimentadas na realização de actividades e os problemas psicológicos atrás referidos são danos biológicos, mas apenas serão atendidos em sede de dano não patrimonial para efeitos de atribuição de indemnização. A sentença recorrida apoia-se em jurisprudência consolidada que afirma que para executar o cálculo dos danos futuros decorrentes de uma lesão física não se deve circunscrever à redução da sua capacidade de trabalho, mas numa análise global dos danos experimentados enquanto corolário do direito fundamental do lesado à saúde e à integridade física. E, por isso, não deve ser arbitrada uma indemnização que apenas tenha em conta aquela redução[57], mas que valorize igualmente a perda de rendimento que dela resulte, ou a necessidade de um acréscimo de esforço para a evitar[58]. Na hipótese vertente, para além da capacidade de trabalho do recorrente estar definitivamente comprometida, é de atender que subsiste o dano patrimonial decorrente da inevitável perda de chance ou oportunidades profissionais por parte do lesado e, bem assim, aqueles que estão associados a perdas salariais provindas do não acompanhamento do natural aumento da massa salarial em função da evolução da economia e da actualização do vencimento mínimo nacional. Nestes termos, sopesando a natureza e a extensão da lesão física, o grau de incapacidade, os dias de internamento e sujeição a diversas intervenções médicas, o período de incapacidade temporária, o convocado prejuízo de afirmação pessoal e os demais entraves físicos acima referenciados, aliados à idade do Autor que deve ser ponderada tanto na dimensão do lapso temporal em que ocorreu o acidente e na esperança média de vida como na vertente da consolidação das expectativas pessoais de um jovem adulto, levam o Tribunal de Recurso a fixar o valor da indemnização por dano biológico em € 200.000,00 (duzentos mil euros), incluindo aqui € 50.000,00 (cinquenta mil euros) destinados a recompensar os prejuízos laborais indirectos, os quais não coincidem com a noção de lucro cessante atrás debatida. * 4.2.6 – Dos danos não patrimoniais (vulgo danos morais):Reitera-se que a indemnização devida pelo acidente de viação compreende tanto os danos patrimoniais como os não-patrimoniais causados ao lesado e recorda-se que as questões fundamentais relacionadas com a recompensa por danos morais foram já assinaladas anteriormente, ao nível dos fundamentos da indemnização e da necessidade de recurso a critérios de equidade, não subsistindo, por isso, a necessidade de os reescrever. Neste ponto, à data do acidente o lesado tinha 31 anos de idade e no capítulo da indemnizações por danos morais é de atender às dores, aos sofrimentos registados, à perda de prazer e às adversidades experimentadas na realização de actividades e aos problemas psicológicos experimentados. Efectivamente, as lesões, as cirurgias, os internamentos e tratamentos vários perduraram por cerca de 4 anos e causaram, para além da dor física, reflexos psicológicos e entraves no desenvolvimento de uma vida quotidiana normal. Neste domínio, o quantum doloris foi fixado no grau 6/7 e o Autor ficará, em termos irreversíveis, a sofrer de patologias diversas. A circunstância de necessitar de acompanhamento para tratar da sua higiene e cuidados básicos e de ficar dependente de uma terceira pessoa para a generalidade dos actos normais da sua vida diária provoca desgaste emocional. Da leitura dos pontos 33 a 47 dos factos provados resulta que o Autor era pessoa alegre, bem-disposta, com alegria de viver, trabalhador e que convivia com amigos, familiares e namorada, com quem tinha expectativa de constituir família. Devido às lesões causadas pelo embate o Autor sofreu dores e dificuldade em movimentar o corpo, passou dias e noites sem descansar ou dormir. Quando regressou a casa tinha de usar fraldas, o que recusava fazer, acabando por sujar a roupa de cama e toda a casa e não conseguia sozinho cuidar da sua higiene, vestir-se, preparar as refeições, limpar a casa e deixou de conduzir. Deixou de conviver com os amigos e terminou a relação de namoro que mantinha. Tudo isto lhe causa sofrimento, tristeza, desgosto e apatia e tornou-se uma pessoa ansiosa e nervosa e tem consciência de que as suas limitações físicas e psíquicas se manterão durante toda a vida. Tem necessidade de acompanhamento médico e de tomar medicação todos os dias. Sente medo de andar de carro e de passar no local onde ocorreu o embate. Por vezes foge de casa e passa largos períodos isolado, mostrando-se apático e triste, deixando os familiares preocupados. Tem ataques de epilepsia e convulsões, o que obriga a acompanhamento constante de terceiros. É de recordar que, no plano estético, o lesado perdeu parcialmente os ossos da face e da cabeça (as fotografias juntas aos autos são elucidativas do seu aspecto) e ficou com a face desfigurada. Além disso, o seu membro superior direito perdeu utilidade, tem dificuldade em andar ou movimentar-se, tem dores diariamente, não consegue falar, nem conversar, perdeu a auto-estima e ficou com problemas de performance sexual. Por força do acidente, é hoje uma pessoa triste, angustiada e martirizada, ficou a padecer de perturbação do humor persistente, entre outras repercussões de nível social e psicossomático que a matéria de facto apurada ilustra de forma transparente e cruel. Embora os danos não patrimoniais não possuam um método avaliativo exacto, é de reconhecer que a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça tem evoluído no sentido de considerar que a indemnização por danos não patrimoniais deverá ser significativa e não meramente simbólica. Em conformidade com princípios de razoabilidade e justiça do caso concreto[59], seguindo um critério situado dentro do arco de decisões próximas deste Tribunal[60], o bom senso determina que os danos morais sofridos pelo Autor sejam dignos de protecção legal e que neste parâmetro a indemnização seja fixada em € 100.000,00 (cem mil euros). Deste modo, julga-se parcialmente procedente o recurso do Autor e improcedente aquele que foi apresentado pela Ré, revogando-se em parte a decisão recorrida, alterando-se correspondentemente nos termos acima enunciados os montantes indemnizatórios arbitrados a título de danos biológicos, futuros e morais. * V – Sumário:(…) * VI – Decisão:Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar parcialmente procedente o recurso interposto, revogando-se parcialmente a decisão recorrida, condenando-se a Ré “(…) – Companhia de Seguros, SA” a pagar ao Autor (…) a indemnização a título de indemnização por dano biológico (incluindo aqui o dano futuro por perdas remuneratórias) no montante de € 288.200,00 (duzentos e oitenta e oito mil e duzentos euros) e a indemnização por danos não patrimoniais (danos morais) no valor de € 100.000,00 (cem mil euros), mantendo no mais a decisão recorrida. Custas a cargo dos apelantes na proporção do respectivo decaimento, ao abrigo do disposto no artigo 527.º do Código de Processo Civil. Notifique. * Processei e revi.* Évora, 15/12/2022José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho Isabel de Matos Peixoto Imaginário Maria Domingas Alves Simões __________________________________________________ [1] A este propósito, ficou consignado na sentença que: «não se selecionou dos articulados alusões genéricas ou de carácter conclusivo/hipotético, matéria de direito, citações de jurisprudência e de doutrina, factos irrelevantes para a decisão a proferir ou que constituem mera impugnação». [2] Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 1984, pág. 659. [3] A que actualmente correspondem os artigos 614.º e 617.º do novo Código de Processo Civil. [4] José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, Coimbra Editora, Coimbra, 1984, págs. 124-125. [5] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, Coimbra, págs. 687-689. [6] Artigo 483.º (Princípio geral): 1. Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação. 2. Só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos especificados na lei. [7] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 20/06/2006, in CJ STJ XIV-II-120. [8] Gomes da Silva, O dever de prestar e o dever de indemnizar, vol. I, pág. 245. [9] Pereira Coelho, O Problema da Causa Virtual na Responsabilidade Civil, pág. 250. [10] Vaz Serra, Boletim do Mistério da Justiça, n.º 84, pág. 8. [11] Adriano Vaz Serra, Anotação ao acórdão do STJ de 22 de Janeiro de 1980, Revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 113º, n.º 3678, 1980. [12] Jorge Sinde Monteiro, Dano Corporal (Um Roteiro do Direito Português), Revista de Direito e Economia, ano XV, 1989, págs. 367-374. [13] João Álvaro Dias, Dano Corporal Quadro Epistemológico e Aspectos Ressarcitórios, Almedina, Coimbra, 2001. [14] Armando Braga, a Reparação do Dano Corporal na Responsabilidade Civil Extracontratual, Almedina, Coimbra, 2005. [15] Maria da Graça Trigo, Adoção do Conceito de “Dano Biológico” pelo Direito Português, Revista da Ordem dos Advogados, ano 72, vol. I, 2012, págs. 147-178. [16] Maria da Graça Trigo, Responsabilidade Civil. Temas Especiais, Universidade Católica Portuguesa, Lisboa, 2015, págs. 69-87. [17] Manuel Carneiro da Frada, Nos 40 anos do Código Civil Português. Tutela da Personalidade e Dano Existencial, Forjar o Direito, Almedina, Coimbra, 2015, págs. 289-313 [18] Ana Mafalda Castanheira Neves de Miranda Barbosa, Lições de Responsabilidade Civil, Princípia, Cascais, 2017. [19] Cátia Marisa Gaspar e Maria Manuela Ramalho Sousa Chichorro, A Valoração do Dano Corporal, 3ª edição, Almedina, Coimbra, 2017, [20] Duarte Nuno Vieira e José Alvarez Quintero (coordenação), Aspectos práticos da avaliação do dano em Direito Civil, Biblioteca Seguros, Julho, 2008, número 2. [21] José Carlos Brandão Proença, Estudos de Direito das Obrigações, Universidade Católica Portuguesa, Porto, 2018. [22] Maria Manuel Veloso, “Danos Não Patrimoniais”, in Comemorações dos 35 anos do Código Civil e dos 25 Anos da Reforma de 1977, vol. III. [23] Paula Meira Lourenço, A função punitiva da responsabilidade civil, Coimbra Editora, Coimbra, 2006. [24] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27/10/2009, incorporado em www.dgsi.pt. [25] Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 12/12/2017, de 14/12/2017 e 08/01/2019, todos disponibilizados em www.dgsi.pt. [26] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05/12/2017, pesquisável em www.dgsi.pt. [27] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 13/05/2014, integrado na plataforma www.dgsi.pt.. [28] O acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10/10/2012, publicitado em www.dgsi.pt., refere que: «compensação do dano biológico tem como base e fundamento, quer a relevante e substancial restrição às possibilidades de exercício de uma profissão e de futura mudança, desenvolvimento ou conversão de emprego pelo lesado, implicando flagrante perda de oportunidades, geradoras de possíveis e futuros acréscimos patrimoniais, frustrados irremediavelmente pelo grau de incapacidade que definitivamente o vai afectar; quer a acrescida penosidade e esforço no exercício da sua actividade diária e corrente, de modo a compensar e ultrapassar as graves deficiências funcionais que constituem sequela irreversível das lesões sofridas. Na verdade, a perda relevante de capacidades funcionais - mesmo que não imediata e totalmente reflectida no valor dos rendimentos pecuniários auferidos pelo lesado – constitui uma verdadeira «capitis deminutio» num mercado laboral exigente, em permanente mutação e turbulência, condicionando-lhe, de forma relevante e substancial, as possibilidades de exercício profissional e de escolha e evolução na profissão, eliminando ou restringindo seriamente a carreira profissional expectável – e, nessa medida, o leque de oportunidades profissionais à sua disposição –, erigindo-se, deste modo, em fonte actual de possíveis e futuramente acrescidos lucros cessantes, a compensar, desde logo, como verdadeiros danos patrimoniais (…)». [29] Maria da Graça Trigo, Obrigação de indemnização e dano biológico, in Responsabilidade Civil - Temas Especiais, Capítulo IV, Universidade Católica, Lisboa, 2015, págs. 69 e seguintes. [30] Artigo 564.º (Cálculo da indemnização): 1. O dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão. 2. Na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior. [31] Artigo 566.º (Indemnização em dinheiro): 1. A indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor. 2. Sem prejuízo do preceituado noutras disposições, a indemnização em dinheiro tem como medida a diferença entre a situação patrimonial do lesado, na data mais recente que puder ser atendida pelo tribunal, e a que teria nessa data se não existissem danos. 3. Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados. [32] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/01/1979, in BMJ 283-260. [33] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28/09/1995, in CJ (S) III/36) e 16/03/1999, in CJ (S) I/167). [34] Vaz Serra, revista de Legislação e de Jurisprudência, ano 111º, págs. 327-331, em anotação ao Acórdão de 30 de Maio de1978. [35] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 03/04/1970, in Boletim do Ministério da Justiça n.º 196, pág. 223. [36] Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 08/01/2004, disponível em www.dgsi.pt. [37] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 14/05/2020, divulgado em www.dgsi.pt. [38] Maria da Graça Trigo, Obrigação de indemnização e dano biológico, in Responsabilidade Civil. Temas Especiais, Universidade Católica Editora, 2015, pág. 78. [39] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 14/05/2020, divulgado em www.dgsi.pt. [40] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 25/11/2009, publicado em www.dgsi.pt. [41] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10/11/2016, publicado em www.dgsi.pt. [42] Artigo 496.º (Danos não patrimoniais): 1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. 2 - Por morte da vítima, o direito à indemnização por danos não patrimoniais cabe, em conjunto, ao cônjuge não separado de pessoas e bens e aos filhos ou outros descendentes; na falta destes, aos pais ou outros ascendentes; e, por último, aos irmãos ou sobrinhos que os representem. 3 - Se a vítima vivia em união de facto, o direito de indemnização previsto no número anterior cabe, em primeiro lugar, em conjunto, à pessoa que vivia com ela e aos filhos ou outros descendentes. 4 - O montante da indemnização é fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º; no caso de morte, podem ser atendidos não só os danos não patrimoniais sofridos pela vítima, como os sofridos pelas pessoas com direito a indemnização nos termos dos números anteriores. [43] Mota Pinto, Teoria Geral, 3ª Ed., pág. 115. [44] Sobre a vida, a morte e a sua indemnização veja-se o estudo de Leite Campos, no BMJ 365, pág. 5 e seguintes. [45] Almeida e Costa, Direito das Obrigações, 6ª Ed., pág. 502. [46] Pessoa Jorge, Ensaio sobre os pressupostos da responsabilidade civil, pág. 374 e seguintes. [47] Pinto Monteiro, Sobre a reparação de danos morais, in Revista Portuguesa do Dano Corporal, ano 1, n.º 1, Coimbra, 1992, pág. 17 e seguintes. [48] Vaz Serra, Reparação do dano não patrimonial, Boletim do Ministério da Justiça, n.º 83, pág. 69. [49] Pessoa Jorge, Ensaio sobre os pressupostos da responsabilidade civil, pág. 376. [50] Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Vol. I, 10ª Edição, Almedina, Coimbra, pág. 605, nota 4. [51] Menezes Cordeiro, “O Direito”, n.º 122º, pág. 272. [52] Dário Martins de Almeida, Manual de Acidentes de Viação, Almedina, Coimbra, 1987, págs. 107/110. [53] Artigo 8.º (Obrigação de julgar e dever de obediência à lei): 1. O tribunal não pode abster-se de julgar, invocando a falta ou obscuridade da lei ou alegando dúvida insanável acerca dos factos em litígio. 2. O dever de obediência à lei não pode ser afastado sob pretexto de ser injusto ou imoral o conteúdo do preceito legislativo. 3. Nas decisões que proferir, o julgador terá em consideração todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito. [54] Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 25/11/2014, que pode ser igualmente lido na plataforma www.dgsi.pt. [55] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 15/06/2004, publicitado em www.dgsi.pt. [56] A indemnização em dinheiro do dano decorrente da incapacidade permanente corresponde a um capital produtor do rendimento que a vítima não irá auferir, mas que se extinga no final do período provável de vida, tal como definem os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 07/06/2003 e 27/11/2003, também disponibilizados em www.dgsi.pt. [57] Acórdãos do Supremo Tribunal de 28/10/1999, 25/06/2002, 30/10/2008, disponibilizados em www.dgsi.pt. [58] Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 20/10/2011 e de 31/05/2012, publicado em www.dgsi.pt. [59] Armando Braga, A Reparação do Dano Corporal na Responsabilidade Civil Extracontratual, pág. 229. [60] A propósito da indemnização equitativa, embora abrangendo diversos assuntos, podem ser conferidos os acórdãos do Tribunal da Relação de Évora de 08/03/2018, de 14/07/2020 (ambos deste colectivo de Desembargadores), de 22/09/2020 e de 23/09/2021, todos incluídos em www.dgsi.pt. |