Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
144/08.0JAFAR.E1
Relator: MARTINHO CARDOSO
Descritores: ACTO PREPARATÓRIO
ACTOS DE EXECUÇÃO
TENTATIVA
CRIME DE VIOLAÇÃO
Data do Acordão: 03/17/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Sumário: I - O critério para a distinção entre atos preparatórios e atos de execução é um critério objetivo: os atos de execução hão-de conter já, eles próprios, um momento de ilicitude, pois ainda que não produzam a lesão do bem jurídico tutelado pela norma incriminadora do crime consumado, produzem já uma situação de perigo para esse bem.
II - Comete um crime de violação, na forma tentada, o arguido que, após ter entrado na cave de uma habitação por motivos profissionais, agarrou a ofendida pelos braços, impedindo-a de se mexer, e deu um pontapé na porta para que esta se fechasse, o que efetivamente aconteceu, sendo certo que, ao sentir-se agarrada e assustada com a situação, a ofendida gritou e tentou fugir, mas o arguido agarrou-a com mais força e atirou-a para o chão, ao mesmo tempo que lhe dizia que se ela gritasse a matava, e, ato contínuo, com a ofendida imobilizada e deitada no chão com a barriga para cima, o arguido tapou-lhe a boca com as mãos, pôs-se em cima da mesma e começou a tirar-lhe o cinto das calças de forma a despi-la, só não atingindo o arguido os seus objetivos devido ao facto de ter sido surpreendido por terceira pessoa.
Decisão Texto Integral:
I
Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
Nos presentes autos de Processo Comum com intervenção de tribunal colectivo acima identificados, do 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Loulé, em que IN se constituiu assistente, o arguido ASC foi, na parte que agora interessa ao recurso, condenado pela prática de um crime de violação na forma tentada, p. e p. pelos art.º 164.°, n.° 1 al.ª a), 22.° e 73.º, n.º 1 al.ª a) e b), do Código Penal, na pena de 6 anos de prisão.

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Inconformado com o assim decidido, o arguido interpôs o presente recurso, apresentando as seguintes conclusões:
I- A actuação do arguido descrita nos pontos 4, 5, 6, 7 e 8 da matéria de facto dada como assente no douto acórdão não consubstancia a prática de actos de execução mas tão somente de actos preparatórios, e portanto, actos não puníveis.
II- Com efeito, a conduta descrita na factualidade dada como provada não preenche qualquer dos elementos constitutivos do crime, não é idónea a produzir o resultado típico , nem segundo a experiência comum era de natureza a fazer esperar , necessariamente, ou em medida superior a qualquer acto preparatório, que se lhe seguissem actos das espécies indicadas nas alíneas a) e b) do art.º 22.° do Código Penal.
III- Em face do exposto, entendemos deverá o arguido ser absolvido da prática do crime de violação, na forma tentada, previsto e punido pelo artigo 164.°, n.º 1, al.a), 22.° e 23.° do Código Penal.
Ou caso V. Ex. ªs assim não entendam,
IV- O acórdão recorrido, ao aplicar ao arguido uma pena de 6 ( seis) anos de prisão, enferma de erro de direito, por violação do art. 40.°, n.º 1 e n.º 2, art. 71.°, n.º 1 e n.º 2 do C.P. pois que não valorou de modo proporcionado o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste , a gravidade das suas consequências, o dolo, tudo factores que, a serem valorados justificariam que a pena concreta aplicada tivesse medida mais benigna.
V- Com efeito, a entender-se que a actuação do arguido consubstancia a previsão legal do tipo de crime de violação , na forma tentada , a verdade é que resulta da matéria de facto provada que o comportamento do arguido se situa num grau de tentativa muito inicial ou preparatório, o que não pode deixar de ser ponderado em sede de determinação concreta da medida da pena a aplicar.
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A Ex.ma Procuradora do tribunal recorrido respondeu, pugnando pela manutenção do decidido.
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Nesta Relação, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.
Cumpriu-se o disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.
Procedeu-se a exame preliminar.
Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.
II
No acórdão recorrido e em termos de matéria de facto, consta o seguinte:
-- Factos provados:
1. Em inícios de Junho de 2008 o arguido e IN eram colegas de trabalho numa empresa de jardinagem.
2. No dia 3 de Junho de 2008, cerca das 15:30 horas, dirigiram-se ambos à habitação situada no (….), mais concretamente à cave da mesma, para efectuar trabalhos de manutenção do sistema de rega.
3. Uma vez aí chegados, o arguido agarrou a assistente pelos braços, impedindo-a de se mexer e deu um pontapé na porta para que esta se fechasse, o que efectivamente aconteceu.
4. Ao sentir-se agarrada e assustada com a situação, a assistente gritou e tentou fugir, mas o arguido agarrou-a com mais força e atirou-a para o chão, ao mesmo tempo que lhe dizia que se ela gritasse que a matava.
5. Acto contínuo, com IN imobilizada e deitada no chão com a barriga para cima, o arguido tapou-lhe a boca com as mãos, pôs-se em cima da mesma e começou a tirar-lhe o cinto das calças de forma a despi-la.
6. Porém, naquele momento, alertada pelos gritos da assistente e pelo barulho da porta a fechar-se, surgiu uma funcionária da habitação que ao abrir a porta da cave impediu o arguido de prosseguir a sua acção.
7. Como consequência da actuação do arguido IN sofreu equimose de cerca de 3 cm da parte posterior do braço direito e escoriação linear de 4 cms e equimose perilabial que lhe determinaram sete dias de doença, sendo os dois primeiros com incapacidade para o trabalho profissional.
8. O arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente, com o propósito de manter com IN relações de cópula contra a sua vontade, utilizando a força física para concretizar os seus intentos, que só não alcançou face à intervenção de uma terceira pessoa.
9. Sabia que a sua conduta era proibida e punida por lei.


(……..)
III
De acordo com o disposto no art.º 412.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, o objecto do recurso é definido pelas conclusões formuladas pelo recorrente na motivação e é por elas delimitado, sem prejuízo da apreciação dos assuntos de conhecimento oficioso de que ainda se possa conhecer.
De modo que as questões postas ao desembargo desta Relação são as seguintes:
1.ª – Que a actuação do arguido em 3-6-2008, descrita na matéria de facto assente como provada, não consubstancia a prática de actos de execução mas tão somente de actos preparatórios, e portanto, actos não puníveis; e
2.ª – Que a pena aplicada é exagerada.
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Vejamos:
No tocante à 1.ª das questões postas, a de que a actuação do arguido em 3-6-2008, descrita na matéria de facto assente como provada, não consubstancia a prática de actos de execução mas tão somente de actos preparatórios, e portanto, actos não puníveis:
O Código Penal vigente (diploma do qual serão todos os preceitos legais citados sem menção de origem), como sucedia já com o de 1982, não contém qualquer defini­ção de actos preparatórios, dispondo apenas, no art.º 21.º, que os actos preparató­rios não são puníveis, salvo disposição em contrário.
Os actos preparatórios são já actos externos que preparam ou facilitam a execução, mas não são ainda actos de execução. O seu conceito delimita-se, aliás, pela definição dos actos de execução do crime. O critério legal para a distinção entre actos preparatórios e actos de execução é um critério objectivo; os actos de execução hão-de conter já, eles próprios, um momento de ilicitude, pois ainda que não produzam a lesão do bem jurídico tutelado pela norma incriminadora do crime consumado, produzem já uma situação de perigo para esse bem.

Enquanto que o acto de execução é um acto dotado de capacidade potencial para a produção do evento criminoso, o acto preparatório é um acto sem essa capacidade, é ainda um acto equívoco, ambíguo, que está ainda demasiado longe da consumação e que, por isso, também não afecta geralmente o sentido jurídico da comunidade, não constitui ainda, pelo menos em regra, um perigo objectivo para o bem jurídico, e que tanto poderá servir para preparar o crime como para quaisquer outras finalidades (quando constituem um perigo para o bem jurídico são então puníveis autonomamente, isto é, independentemente do agente vir a executar o crime). É o caso de alguém parar o carro na berma de uma estrada e pôr-se apenas a olhar para dentro de uma propriedade rural, a ver se há lá alguma coisa que valha a pena vir mais tarde a furtar – é um mero acto preparatório, não punível.

A preparação antecede o momento em que se inicia a agressão do objecto material do crime.

O acto de execução já contém, ele mesmo, um momento de ilicitude.
Materialmente, constitui acto de execução aquele que ataca o bem jurídico tutelado; formalmente, tal acto integra a acção típica prevista na lei.
(Germano Marques da Silva, «Direito Penal Português, Parte Geral, Teoria do Crime» 1998, II, fls. 232-234).
De acordo com o estatuído no art.º 22.º, n.º 2, são actos de execução de um crime: a) aqueles que preenchem um elemento constitutivo de um tipo legal de crime, quando idóneos para a produção de um resultado típico; b) aqueles que, segundo a experiência comum e salvo um caso imprevisível, são de natureza a fazer esperar que se lhes sigam actos idóneos para a produção do resultado típico ou actos que preencham o resultado típico; c) ou finalmente aqueles que, em matéria de comparticipação criminosa, se inserem no desenvolvimento de actividades conjuntas dos diversos agentes, concorrencialmente indispensáveis para a produção do resultado típico ou para o preenchimento daquele elemento constitutivo do tipo legal de crime, ainda que, em relação a um dos agentes, se não traduzam na prática material de actos típicos do mesmo crime (ac. RL de 17-4-1985; CJ, 1985, II - 167);
A configuração da tentativa como ilícito autónomo nasce da conjugação de duas normas: a da parte especial que incrimina determinado facto e a do art.º 22.º, que estende a incriminação a actos que não representam ainda a consumação do crime a que se referem. Há pois a fusão de duas normas: a da parte especial que prevê determinado tipo de crime que o agente queria cometer e a da parte geral que estende a punição ao comportamento que o agente efectivamente comete (Germano Marques da Silva, op. cit., pág. 239).
Assim, no caso dos autos, temos que conjugar aquele art.º 22.º com o estipulado no art.º 164.º, n.º 1 al.ª a), que pune:
1 - Quem, por meio de violência, ameaça grave, ou depois de, para esse fim, a ter tornado inconsciente ou posto na impossibilidade de resistir, constranger outra pessoa:
a) A sofrer ou a praticar, consigo ou com outrem, cópula, coito anal ou coito oral;
Ora no caso dos autos, o arguido praticou materialmente actos necessários à violação da ofendida, só não logrando consumar os seus propósitos porque foi surpreendido, ou seja, por circunstâncias alheias à sua vontade.
Na verdade, após o arguido e a IN terem entrado na cave de uma habitação por motivos profissionais, o arguido agarrou-a pelos braços, impedindo-a de se mexer e deu um pontapé na porta para que esta se fechasse, o que efectivamente aconteceu. Ao sentir-se agarrada e assustada com a situação, a assistente gritou e tentou fugir, mas o arguido agarrou-a com mais força e atirou-a para o chão, ao mesmo tempo que lhe dizia que se ela gritasse que a matava. Acto contínuo, com IN imobilizada e deitada no chão com a barriga para cima, o arguido tapou-lhe a boca com as mãos, pôs-se em cima da mesma e começou a tirar-lhe o cinto das calças de forma a despi-la.
Ora estes factos, além de preencherem um elemento constitutivo de um tipo de crime, o de violação (art.º 22.º, n.º 2 al.ª a)) – elemento constitutivo que é o da violência ou ameaça grave mencionado no art.º 164.º, n.º 1 –, eram ainda, segundo a experiência comum e salvo circunstâncias imprevisíveis, de natureza a fazer esperar que se lhes seguisse a efectiva violação da ofendida (art.º 22.º, n.º 2 al.ª c)) [circunstâncias imprevisíveis que no caso foram as de, alertada pelos gritos da assistente e pelo barulho da porta a fechar-se, ter surgido uma funcionária da habitação que ao abrir a porta da cave impediu o arguido de prosseguir a sua acção], ou seja, eram actos de execução de um crime que o arguido decidiu cometer e que não chegou a consumar-se (art.º 22.º, n.º 1).
De resto, a jurisprudência tem entendido serem já actos de execução os praticados anteriormente às relações sexuais que preencham o elemento violência (inscrito no tipo) ou sejam idóneos a causar o resultado típico, de que é exemplo o acórdão da Relação do Porto de 25-1-89, CJ, 1989, I-209: Comete o crime de violação na forma tentada quem procurou constranger rapariga menor de 16 anos à prática da cópula contra a vontade dela, por meio de violência física, agarrando-a, deitando-se sobre ela, puxando-lhe as saias, beijando-a e apalpando-a, só não atingindo o seu objectivo devido à resistência da ofendida e por terem aparecido dois rapazes que fizeram com que o agente debandasse.
Carece, assim, o recorrente de razão nesta matéria.

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No tocante à 2.ª das questões postas, a de que a pena aplicada é exagerada:
O tribunal "a quo" fundamentou a escolha e graduação da pena da seguinte maneira:
A aplicação de penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração social do agente; em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa (artigo 40.°, n.°s 1 e 2, do Código Penal).
A defesa da ordem jurídico-penal, tal como é interiorizada pela consciência colectiva (prevenção geral positiva ou de integração), é a finalidade primeira, que se prossegue, no quadro da moldura penal abstracta, entre o mínimo em concreto, imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada e o máximo que a culpa do agente consente; entre esses limites, satisfazem-se, quanto possível, as necessidades de prevenção especial positiva ou de socialização.
Devendo ter um sentido eminentemente pedagógico e ressocializador, as penas são aplicadas com a finalidade primordial de restabelecer a confiança colectiva na validade da norma violada, abalada pela prática do crime e, em última análise, na eficácia do próprio sistema jurídico-penal.
No caso em apreço, o crime praticado pelo arguido é punido, em abstracto, com pena de prisão de 7 meses e 6 dias até 6 anos e 8 meses [cf. artigos 164.°, n.° 1, al. a), e 73.°, n.° 1, als. a) e b), do Código Penal].
Para a fixação concreta da pena, em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, o tribunal deve atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo, depuserem a favor ou contra o agente (artigo 71.° do Código Penal).
Não se identifica qualquer circunstância que possa depor a favor do arguido.
Contra o arguido depõe o dolo, na forma de dolo directo, os meios utilizados, o nível de violência física e psíquica exercido sobre a vítima e ainda o grau de ilicitude dos factos que é elevado e que se relaciona com a auto-conformação e a liberdade de determinação sexual.
São, pois, prementes as exigências de prevenção geral.
Por outro lado, na avaliação da personalidade do condenado, além da sua idade (42 anos), importa considerar o que consta dos factos provados, a saber: é originário de uma família desestruturada e de baixa condição socioeconómica; o relacionamento dos progenitores era conflituoso, o que originou a separação do casal quando o arguido tinha 6 anos; nessa sequência ficou a residir com a progenitora e o padrasto; apesar de os irmãos terem ficado a residir com o pai, por insistência da mãe manteve-se uma relação próxima entre todos os filhos; frequentou o sistema de ensino na idade normal, não tendo completado o ensino básio e abandonado a escola com 14 anos; ao nível laboral desempenhou várias actividades, ainda que de forma inconsistente, destacando-se a profissão de manobrador de máquinas da construção civil; aos 17 anos estabeleceu uma relação marital, da qual nascem duas filhas (actualmente já adultas); nesse período inicia o consumo de álcool em excesso, o que lhe provoca alterações comportamentais e leva à ruptura do casal, ocorrida alguns anos depois; encetou posteriormente uma nova relação afectiva, da qual nasceu um outra descendente e que terminou devido a desavenças entre o casal; mais tarde, num período de liberdade condicional, casou novamente e dessa relação nasceu uma menina, actualmente com 24 meses; é portador de distúrbio da personalidade do tipo "border-line", por vezes com características anti-sociais; à data dos factos em julgamento vivia na casa de família com a mulher e a filha de ambos; no âmbito profissional exercia funções na área da construção civil, actividade realizada de forma inconstante (com despedimentos sucessivos por iniciativa própria ou da entidade patronal), fruto da sua instabilidade pessoal; em meio prisional manifesta dificuldades em cumprir as normas da instituição prisional, encontrando-se inactivo e continua a usufruir do apoio da actual mulher, com quem mantém um contacto próximo, que se mostra permissiva em relação aos seus comportamentos com incidência criminal e constituiu o seu principal suporte afectivo.
Noutro plano do seu certificado de registo criminal constam as seguintes condenações:
- Por factos praticados em 17.11.1994, respeitantes à prática de um crime de emissão de cheque sem provisão, foi condenado em 26.10.1995 na pena de 7 (sete) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 (dois) anos;
- Por factos praticados em 19.06.1993, respeitantes à prática de um crime de violação, de um crime de sequestro, de um crime de coacção, de um crime de furto e de um crime de ofensa à integridade física com dolo de perigo, foi condenado em 16.02.1996 na pena única de 16 (dezasseis) anos de prisão;
- Por factos praticados em 13.05.2000, respeitantes à prática de um crime de dano, foi condenado em 29.01.2003 na pena de multa de 150 (cento e cinquenta dias) à taxa diária de € 1,50;
- Por factos praticados em 08.05.2007, respeitantes à prática de um crime de dano, foi condenado em 25.09.2009 na pena de multa de 180 (cento e oitenta) dias à taxa diária de € 2,00;
- Por factos praticados em 25.10.2008, respeitantes à prática de um crime de violação, foi condenado em 15.01.2010 na pena de 10 (dez) anos de prisão.
Assim, no que toca à prevenção especial, dúvidas não há de que o arguido carece de socialização, tendo-se em vista a prevenção de novos ataques a bens jurídicos alheios, com destaque para a auto-determinação sexual que se vem manifestando de alguma forma como padrão do seu comportamento em sociedade.
Tudo ponderado, valorando o ilícito global perpetrado, ponderando em conjunto a gravidade dos factos e a sua relação com a personalidade do arguido, é de concluir que será adequada a imposição da pena de 6 (seis) anos de prisão.
Ora bem.
No tocante à escolha e graduação da pena que a um arguido há-de ser imposta, é a medida da sua culpa que condiciona decisivamente a pena concreta a aplicar-lhe.
Para além de ser fundamento, a culpa concreta é o máximo de condenação possível e nunca, em caso algum, as razões de prevenção poderão impor uma pena que ultrapasse essa culpa concreta do agente (Figueiredo Dias, “Direito Penal Português, “As Consequências Jurídicas do Crime”, Notícias Editorial, pág. 238 e ss.).
Do que se trata é de sancionar um delinquente concreto que, num determinado circunstancialismo, cometeu um facto jurídico-penalmente relevante, desvalioso, merecedor de censura penal.
Deve assumir-se a pena como sanção adequada, proporcionada aos factos e ao agente, e, procurando-se com ela dar satisfação aos fins de prevenção-ressocialização do agente, evitar-se que outros cometam infracções semelhantes.
Há que ponderar, na situação concreta, como elementos ou factores a reflectirem-se na culpa, a gravidade da ilicitude, a intensidade do dolo, os fins ou motivos que determinaram o crime, as condições pessoais do agente e sua situação económica e, em suma, em todo o demais condicionalismo mencionado não só no corpo como nas respectivas alíneas do n.º 2 do art.º 71.º do Código Penal.
No tocante aos presentes autos, a decisão recorrida valorou correctamente todos os índices necessários no caso concreto à fixação da pena, que se mostra justa e ponderada, sendo pois imerecidas as críticas que o recorrente lhe dirige.
IV
Termos em que se decide negar provimento ao recurso e manter na íntegra a decisão recorrida.
Custas pelo arguido, fixando-se a taxa de justiça, atendendo ao trabalho e complexidade de tratamento das questões suscitadas, em cinco UC’s (art.º 513.º e 514.º do Código de Processo Penal e 8.º, n.º 9, do RCP e tabela III anexa).
Para os efeitos do disposto no art.º 215.º, n.º 6, do Código de Processo Penal, remeta à 1.ª Instância, eventualmente ao processado mencionado no art.º 414.º, n.º 7, do mesmo diploma legal, certidão do presente acórdão, fazendo nela menção de que o mesmo não transitou ainda em julgado.

Évora, 17-03-2015
(elaborado e revisto pelo relator, que escreve com a ortografia antiga)

João Martinho de Sousa Cardoso

Ana Maria Barata de Brito