Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | ANA BARATA BRITO | ||
Descritores: | PREVARICAÇÃO PERDA DO MANDATO INCONSTITUCIONALIDADE | ||
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Data do Acordão: | 03/21/2017 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
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Sumário: | I - A condenação do arguido pela prática de crime de prevaricação cometido no exercício das suas funções autárquicas implica necessariamente a perda do respectivo mandato. II – Não é inconstitucional a norma constante do artigo 29.º, n.º1, al. f) da Lei n.º34/87, de 26 de Julho, enquanto fixa, como efeito da condenação por crime de responsabilidade de titular de cargo político, a perda do mandato respectivo, bem como na interpretação de que a pena acessória de perda de mandato pode ser aplicada ainda que a pena principal de prisão venha a ser substituída por pena de suspensão de execução da pena de prisão. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Criminal: 1. No Processo n.º 54/11.4TAETZ, da Comarca de Évora (Estremoz), foi proferida sentença a condenar LF, como autor de um crime de prevaricação dos art.s 1º, 2º, 3.º,nº 1, al. i), 11º, 29.º, al. f), da Lei 34/87, de 16 de Julho, alterada pela Lei nº 30/2008, de 10 de Julho, na pena de 2 anos e 8 meses de prisão suspensa na sua execução, e a declarar a perda do mandato do mesmo arguido como Presidente da Câmara Municipal de …. Foi ainda julgado parcialmente procedente o pedido de indemnização cível deduzido por “Liga dos Amigos do Castelo de Evoramonte” (L.A.C.E.) contra LF e Município de … e, em consequência condenados os demandados no pagamento solidário à demandante da quantia de 1.882,50€ a título de danos patrimoniais acrescida de juros, e da quantia de 4.500,00€ a título de compensação de danos não patrimoniais acrescida de juros. Inconformado com o decidido, recorreu o arguido, concluindo: “A. Vem o presente recurso da Sentença da Secção de Competência Genérica da Instância Local de Estremoz da Comarca de Évora (J1) datada de 20 de junho de 2016, e na mesma data depositada, que decidiu “a) Condenar o arguido LF, pela prática, em autoria material, na forma consumada, de um crime de prevaricação, previsto e punido pelos artigos 1º, 2º, 3.º, n.º 1, alínea i), 11º, 29.º, alínea f), da Lei 34/87, de 16 de Julho, alterada pela Lei nº 30/2008, de 10 de Julho, na pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão. b) Suspender na sua execução, por igual período de tempo, a pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão. c) Declarar, após trânsito em julgado, a perda de mandato do arguido LF como Presidente da Câmara Municipal de …. d) Julgar parcialmente procedente, por provado, o pedido de indemnização cível deduzido pela “Liga dos Amigos do Castelo de Evoramonte” (L.A.C.E.) contra os demandados LF e Município de … e, em consequência, condenar os demandados no pagamento solidário à demandante: i. A quantia de 1.882,50€ (mil, oitocentos e oitenta e dois euros e cinquenta cêntimos), a título de danos patrimoniais, acrescida da quantia devida a título de juros de mora contados a partir da data da notificação dos demandados cíveis para contestarem o pedido de indemnização cível e até efetivo e integral pagamento. ii. A quantia de 4.500,00€ (quanto mil e quinhentos euros), a título de compensação de danos não patrimoniais, acrescida da quantia devida a título de juros de mora contados a partir da data da notificação dos demandados cíveis para contestarem o pedido de indemnização cível e até efetivo e integral pagamento. e) Condenar o arguido LF nas custas criminais do processo” (...). RECURSO EM MATÉRIA DE DIREITO DA CONTRADIÇÃO INSANÁVEL DA FUNDAMENTAÇÃO B. Nos termos do artigo 410.º, n.º 2, alínea b), do CPP, “Mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do Tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum: b) A contradição insanável da fundamentação” (...). C. A contradição insanável da fundamentação consiste na incompatibilidade, insuscetível de ser ultrapassada através da própria decisão recorrida, entre os factos provados. D. Ocorrerá, por exemplo, quando se considerem como provados factos incompatíveis entre si, de modo a que apenas um deles pode persistir. E. A Decisão recorrida, em determinados pontos da matéria de facto que julgou provada, é manifestamente contraditória, de forma insanável, e na aceção que o legislador consagrou no artigo 410.º, n.º 2, alínea b), do CPP. F. Entendeu o Tribunal a quo que única e exclusivamente motivado pelo “desagrado” com as afirmações publicadas no jornal Ecos e da autoria do presidente da LACE, o Recorrente determinou o não pagamento da 2.ª e 3.ª prestações do subsídio e apoios concedidos pela autarquia de Estremoz àquela associação. G. O Tribunal a quo julgou também provado que a 2.ª das prestações a atribuir à LACE haveria de ter sido paga em junho de 2010 e, efetivamente, não foi. H. Sob pena de contradição lógica e insanável, as afirmações publicadas no jornal Ecos e da autoria do presidente da LACE teriam que ser anteriores ao não pagamento da primeira das prestações não pagas, isto é, anteriores a junho de 2010. No entanto, isso não se verifica! I. Não é possível, sob pena de contradição lógica insanável, julgar-se provado que o Recorrente, exclusivamente movido pelo desagrado com o editorial do Jornal Ecos, determinou o não pagamento de subsídios devidos à LACE, e ter sido esse editorial publicado apenas num momento em que esses subsídios já não haviam sido pagos, como, no julgamento factual realizado pelo Tribunal a quo, haveria que ter ocorrido. J. A Decisão recorrida ostenta elementos suficientes para afirmar que as razões que presidiram à suspensão dos apoios à LACE são distintas daquelas que, paradoxal e contraditoriamente, se julgaram provados na Sentença recorrida. K. A única razão que presidiu à suspensão dos apoios à LACE foi, na verdade, o acautelar, que é imposto ao Arguido, da boa utilização de dinheiros públicos. L. Em suma: Verifica-se uma contradição insanável entre, por um lado, os factos julgados provados 5 a 7, e, por outro lado, os factos julgados provados 8 a 11; Essa contradição é insanável porque insuscetível de ser corrigida, nomeadamente, por via artigo 380.º, n.ºs 1 e 2, do CPP; É contraditório, paradoxal e ilógico que se julgue provado que “única e exclusivamente pelos motivos elencados na carta transcrita em 10., o arguido” (...) “não efetuou o pagamento da 2ª e da 3ª prestações relativas ao P.A.D.A. a favor da L.A.C.E. e cortou totalmente todos os apoios logísticos habitualmente fornecidos, nomeadamente montagens de palcos e cedência de equipamentos” quando, na mesma Decisão, se julga provado que no momento em que 2ª prestação não foi paga, os “motivos elencados na carta transcrita em 10.” ainda se não haviam verificado – leia-se, as afirmações do “Diretor do Jornal Ecos, relativas ao abandono do Sistema “Águas do Alentejo” pelo Município de …”, proferidas apenas a 1 de julho de 2010; Não é, logicamente, possível afirmar-se que a decisão de suspender os apoios à LACE foi motivada por acontecimentos posteriores, e não previsíveis, à própria Decisão; A contradição insanável da fundamentação da Decisão recorrida é (inadvertidamente) o espelho do que de há muito se vem afirmando: as razões da suspensão dos apoios à LACE encontram-se na salvaguarda do erário público, imposta, nomeadamente, pelo apuramento de irregularidades cometidas na utilização de dinheiros públicos pela referida Associação – irregularidades essas reconhecidas e expostas no texto da Decisão recorrida. M. Na situação dos autos, mostram-se reunidas as condições legalmente previstas para que haja lugar a uma modificação da matéria de facto por este Venerando Tribunal: porque se requererá (subsidiariamente) a renovação da prova – permitida em razão da contradição insanável que se sinalizou; porque se impugnará (subsidiariamente) a Decisão recorrida nos termos do artigo 412.º, n.º 3 do CPP; e, sobretudo, porque do processo constam todos os elementos de prova que serviram de base à decisão do Tribunal a quo sobre a matéria de facto. N. Dever-se-á, portanto, e nesta Veneranda sede, modificar a decisão do Tribunal a quo, no sentido de passar a darem-se como não provados os factos 11 a 14 julgados provados na Decisão recorrida e, consequentemente, absolver o Recorrente do crime por que vem condenado, O. Porquanto a prova existente nos presentes autos permite – mesmo sem que haja lugar a renovação da prova produzida em primeira instância – afirmar a impossibilidade de se concluir que pelas razões enunciadas na carta transcrita em 10. dos factos julgados provados pela Decisão recorrida é que foi tomada a decisão, pelo Arguido, de suspender os apoios concedidos pela Autarquia à LACE, já que essas razões surgem num momento em que esses mesmos apoios já se encontravam suspensos, como (neste caso) corretamente se julgou provado na Decisão recorrida - e se já havia julgado no primeiro julgamento e na decisão de 10 de julho de 2014 (nesta parte não contrariada pelo Acórdão desta Relação de agosto de 2015). P. Recorrendo, então, aos elementos de prova que fundaram a decisão da matéria de facto pelo Tribunal a quo (cfr. artigo 431.º, al. a), do CPP), deverá ser modificada a Decisão recorrida no sentido de serem julgados como não provados os factos 11 a 14 julgados provados na Decisão recorrida e, consequentemente, absolvendo-se o Recorrente pelo crime por que vem condenado. Sem conceder: RECURSO DA MATÉRIA DE FACTO Q. Nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 412.º, n.º 3, alínea a), do CPP, considera o Recorrente que foram incorretamente julgados os seguintes pontos da matéria de facto da Decisão Recorrida: A) Ponto 11 dos Factos provados (cfr. fls. 1.398); B) Ponto 12 dos Factos provados (cfr. fls. 1.398); C) Ponto 13 dos Factos provados (cfr. fls. 1.398); D) Ponto 14 dos Factos provados (cfr. fls. 1.398); E) Alínea b) dos Factos julgados não provados (cfr. fls. 1.403); F) Asserção realizada em sede de motivação da Matéria de Facto (cfr. fls. 1.411 e acima transcrita); G) Asserção realizada em sede de motivação da Matéria de Facto (cfr. fls. 1.412 e acima transcrita); H) Asserção realizada em sede de motivação da Matéria de Facto (cfr. fls. 1.414 e acima transcrita); I) Asserção realizada em sede de motivação da Matéria de Facto (cfr. fls. 1.414 e acima transcrita); J) Asserção realizada em sede de motivação da Matéria de Facto (cfr. fls. 1.415 e acima transcrita); K) Asserção realizada em sede de motivação da Matéria de Facto (cfr. fls. 1.415 e acima transcrita); L) Asserção realizada em sede de motivação da Matéria de Facto (cfr. fls. 1.415 e acima transcrita); M) Asserção realizada em sede de motivação da Matéria de Facto (cfr. fls. 1.416 e acima transcrita); N) Asserção realizada em sede de motivação da Matéria de Facto (cfr. fls. 1.417 e acima transcrita). R. A prova produzida em sede de audiência de julgamento não permite chegar à mesma conclusão que a chegada pelo Tribunal a quo, e não permite que se considerem provados os factos ora indicados e que o mesmo Tribunal assim considerou. S. Em cumprimento do disposto no artigo 412.º, n.º 3, alínea b), do CPP, são as seguintes as provas que impõem decisão diversa da recorrida, por abalarem as provas incorretamente julgadas pelo Tribunal a quo: 1. Depoimento da testemunha JT, na sessão de julgamento de 22 de fevereiro de 2016: entre os 24m47s e os 29m50s e entre 1h36m40s e 1h36m55s; 2. Depoimento da testemunha DP, na sessão de julgamento de 22 de fevereiro de 2016: entre os 22m33s e os 23m36s; 3. Depoimento da testemunha FR, na sessão de julgamento de 27 de abril de 2016: entre os 11m00s e os 14m02s e entre os 47m24s e os 48m25s; 4. Depoimento da testemunha SD, na sessão de julgamento de 24 de maio de 2016: entre os 2m09s e os 3m23s; entre os 5m50s e os 7m27s; entre os 14m12s e os 14m58s e entre os 50m37s e os 51m17s; (constando da motivação do presente recurso a transcrição da prova ora indicada) 5. Fls. 6 e 7 dos autos – carta de 7 de julho de 2010; 6. Fls. 35 dos autos – editorial do jornal Ecos, de 1 de julho de 2010; 7. Fls. 41 a 51 – Regulamento e Normas Específicas do PADA. T. Relativamente aos pontos de facto impugnados supra em A), B), C), D), E), H), I) e N) – no fundo, o “cerne” da condenação do Recorrente, na afirmação de que a Decisão de suspensão dos apoios concedidos à LACE se deveu, “única e exclusivamente”, pelos motivos elencados na carta de 7 de julho de 2010 – e transcrita no ponto 10. dos factos julgados provados pela Decisão recorrida –, e como acima se alegou a propósito da contradição insanável da fundamentação da Decisão recorrida, não é possível, sob pena de contradição lógica insanável, julgar-se provado que o Recorrente, exclusivamente movido pelo desagrado com o editorial do Jornal Ecos, determinou o não pagamento de subsídios devidos à LACE, e ter sido esse editorial publicado apenas num momento em que os esses subsídios já não haviam sido pagos, como, no julgamento factual realizado pelo Tribunal a quo, haveria que ter ocorrido. U. A análise conjugada dos documentos constantes de fls. 6 e 7, e 35 dos autos, concatenados com os depoimentos prestados pelas testemunhas acima sinalizadas são por si suficientes para demonstrar o erro de julgamento sobre os factos realizado pelo Tribunal a quo. V. Nessa medida, dever-se-ia ter julgado como provado que o não pagamento da 2ª e 3ª prestações relativas ao P.A.D.A. atribuído a favor da L.A.C.E. para o ano de 2010 e o corte de apoios logísticos habitualmente fornecidos pela Câmara Municipal de ..., nomeadamente montagens de palcos e cedência de equipamentos deveu-se à circunstância de a L.A.C.E. ter utilizado uma parte substancial do subsídio atribuído no âmbito do P.A.D.A. de 2009 para fim diverso do previsto no plano de atividades apresentado na respetiva candidatura. W. A razão de o Recorrente não ter a 7 de julho de 2010 anunciado a investigação em curso às irregularidades cometidas – e julgadas provadas – no seio da LACE, prende-se sobretudo com o facto de à data – julho de 2010 – inexistir ainda um apuramento integral das mesmas irregularidades. X. Apenas em 2013 foi possível, por exclusiva responsabilidade da LACE, fazer o apuramento total das irregularidades cometidas pela associação – depoimento acima sinalizado, identificado como 1). Y. À data dos factos objeto dos presentes autos, era apenas possível ao executivo camarário estremocense detetar que as verbas concedidas à LACE ao abrigo do PADA de 2009 não haviam sido utilizadas em uma das atividades para a qual a associação se candidatou ao mesmo PADA – o que, por si só, é já uma irregularidade – mas, no entanto, não era ainda possível confirmar o desvio indevido de verbas, que apenas em 2013 se pôde confirmar. Z. Relativamente ao juízo expresso formulado pelo Tribunal a quo no que diz respeito ao depoimento de determinadas testemunhas – impugnação de facto constante supra, e identificada nas alíneas G), J), K) e L) –, a transcrição dos seus depoimentos permite à saciedade demonstrar o ostensivo erro de valoração que o Tribunal recorrido realizou dos mesmos, quer ao desvirtuar o que pelas testemunhas foi afirmado, quer ao afirmar como dito o preciso oposto do que efetivamente disseram. AA. A testemunha DP confirmou em julgamento que o teor da carta de 7 de julho de 2010 é tudo menos claro. BB. A testemunha FR foi capaz de identificar o responsável pela suspensão dos apoios à LACE, bem como a data em que o assunto foi discutido por alguns membros do executivo municipal e pelo Chefe de Gabinete do Presidente da Câmara Municipal…. CC. A testemunha SD fez referência à existência de uma reunião onde foram discutidas as irregularidades imputadas à LACE, dando conta da existência de diversas reuniões informais do executivo camarário estremocense, onde participava para além dos membros do executivo, o chefe de gabinete do Presidente da Câmara. DD. Essa reunião foi confirmada pelas testemunhas JT e FR. EE. Apenas em finais de maio de 2010 é que se detetaram as primeiras irregularidades imputadas à LACE – cfr. supra alínea 1) das provas que impõe uma decisão diversa. FF. Foi já depois de aprovado e pago o montante de € 3.500,00 – por conta da Rede Europeia dos Sítios da Paz, programa autónomo do PADA – é que foram sinalizadas as mencionadas irregularidades. GG. Tivessem as irregularidades sido detetadas em momento anterior que, seguramente, não teria sido realizada essa transferência de € 3.500,00 à LACE. HH.A testemunha FR é perentório na afirmação de que esse detetar de irregularidades surge num momento posterior à referida transferência de € 3.500,00, quando afirma o seguinte: “ter-se-ia acabado de pagar um outro subsídio que nada tem que ver com o PADA, e que tem a ver com os Sítios da Paz, que era um outro projeto desenvolvido por esta associação” – supra alínea 4) das provas que impõem decisão diversa sobre os factos. Em suma: II. Dos meios de prova indicados pelo Tribunal a quo, não resulta a prova dos factos constantes dos pontos da Matéria de Facto julgada provada (e não provada) acima sinalizados. JJ. Não resulta provado que “única e exclusivamente pelos motivos elencados na carta” de 7 de julho de 2010 o Recorrente “não efetuou o pagamento da 2ª e da 3ª prestações relativas ao P.A.D.A. a favor da L.A.C.E. e cortou totalmente os apoios logísticos habitualmente fornecidos, nomeadamente montagens e cedência de equipamentos”, KK. Como não resulta provado que haja sido praticada qualquer decisão unilateral, consciente e contra o Direito, com o único fito de prejudicar a Assistente. LL. A prova constante dos autos demonstra, precisamente, que a decisão de suspensão dos apoios – incluindo subsídios – à LACE foi o culminar de um processo iniciado em finais de maio de 2010 e que se verificou em momento anterior à carta de 7 de julho de 2010 – mais concretamente, em junho. MM. Assim, e também por estas razões, deverá o Recorrente ser absolvido do crime de prevaricação por que vem condenado. NN. Sem conceder, caso V. Exas., Venerandos Desembargadores da Relação de Évora, julgarem que a prova indicada nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 412.º, n.º 3, alínea b), do CPP, não é por si, e desde já, suficiente para abalar o que na ótica do Recorrente se abalou – a Decisão do Tribunal a quo sobre a matéria de facto –, OO. Desde já se requer, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 412.º, n.º 3, alínea c) e 430.º, n.ºs 1 e 2 do CPP, que seja admitida a renovação da prova testemunhal que acima se fez referência, determinando-se a notificação das testemunhas JT, FR e SD para, nos termos do artigo 348.º – aplicável ex vi artigo 430.º, n.º 5, do CPP – serem inquiridas à matéria e aos factos incorretamente julgados pelo Tribunal a quo, tomando como referência fls. 1.414 a 1.416 dos autos (fundamentação da matéria de facto da Decisão recorrida). Acresce, ainda, o seguinte: RECURSO DA MATÉRIA CIVIL PP. O Tribunal recorrido realizou determinadas conclusões e asserções em sede de motivação da matéria de facto (respeitante à parte criminal dos autos) que, por alguma razão, não cuidou de as fazer repercutir na parte cível dos autos – quando, na verdade, o deveria. QQ. O Tribunal recorrido deu como objetivamente verificadas diversas irregularidades na execução do Regulamento do PADA em vigor em 2009 e 2010 pela Assistente LACE. RR. A prova objetiva destas irregularidades, que o Tribunal a quo deu como verificadas, impunha o consequente juízo de inadmissibilidade da prestação de qualquer verba que seja à LACE ao abrigo do PADA ou do PADC, e ainda ao abrigo do Regime Jurídico das Autarquias Locais. SS. Mesmo que se admitisse como justa a condenação do Recorrente – o que não concede e apenas se equaciona por cautela de patrocínio e coerência de raciocínio –, afirmando-se que o mesmo determinou a suspensão dos apoios à Demandante, única e exclusivamente pelos motivos elencados na carta de 7 de julho de 2010, certo é que remanesceria invariavelmente a situação de incumprimento objetivo da LACE no que concerne às normas do Regulamento do PADA que impunham a apresentação de toda a documentação que, reiterada e persistentemente, recusou dolosamente entregar, bem como à canalização indevida e não autorizada de verbas anteriormente concedidas ao abrigo do PADA de 2009 que, como é do conhecimento expresso do Tribunal a quo, determinavam a suspensão de todos os apoios à LACE, pelo menos, por um período de dois anos e a devolução de tais verbas ao Município. TT. Ao condenar o Recorrente Demandado ao pagamento da quantia de € 1.882,50 à LACE, a título de indemnização pelo não pagamento da 2.ª e 3.ª prestações do PADA de 2010, está o Tribunal a quo a permitir, sem fundamento legal, a entrega à LACE de quantias que, objetivamente, não lhe eram devidas à data, nem agora. UU. É, por isso, a Decisão recorrida manifestamente ilegal, ao determinar o ressarcimento à LACE de uma quantia que, apesar da conduta que (incorretamente) se imputa ao Recorrente, nunca lhe foi devida, desde o momento em que, objetivamente, incumpriu com as disposições regulamentares que lhe permitiam receber essas mesmas verbas, como o Tribunal a quo expressamente reconheceu. VV. No que diz respeito aos (invocados) danos não patrimoniais, ao fazer advir, num primeiro patamar, a responsabilidade no pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais “do não recebimento do remanescente do subsídio atribuído à L.A.C.E. para o ano de 2010 no âmbito do P.A.D.A.”, torna-se evidente, então, que também nenhuma quantia é devida à Demandante a este título. WW. Mesmo que o Recorrente não tivesse escrito a tão referida carta de 7 de julho de 2010, o que é certo que é a LACE não veria recebido, em qualquer caso, o remanescente dos apoios que não recebeu até hoje; por via disso não realizaria as acima identificadas atividades; por via disso, o descrédito e desinteresse da população estremocense sempre ocorreria. XX. É, assim, e também nesta medida, a Decisão recorrida ilegal ao condenar o Recorrente no pagamento de uma indemnização a título de danos não patrimoniais que, atendendo ao supra exposto, se não podem imputar ao Recorrente. YY. O Tribunal a quo, sem prejuízo de, juridicamente, sustentar a decisão quanto ao pedido de indemnização civil, no âmbito do enquadramento previsto na legislação civil, em termos factuais, assenta a Decisão nos factos juridicamente relevantes para efeitos de decisão penal. ZZ. Assim, por força dos argumentos, de Direito e de Facto, aduzidos quanto à matéria penal, e por força dos ora apresentados, requer-se a V. Exas., nos termos e para os efeitos do artigo 403.º, n.º 3, do CPP, que seja revogada a Decisão recorrida, na parte em que condena o Recorrente Demandado na obrigação de indemnizar, por se não ter provado, nem se verificarem os pressupostos de que depende a génese dessa obrigação de indemnizar, quer a título de danos patrimoniais, quer a título de danos não patrimoniais. DA INCONSTITUCIONALIDADE DO ARTIGO 29.º, ALÍNEA F), DA LEI N.º 34/87 AAA. O Tribunal a quo não poderia ter aplicado a norma resultante do artigo 29.º, alínea f), da Lei n.º 34/87, de 16 de julho por ser a mesma materialmente inconstitucional. BBB. Estando os Tribunais, enquanto órgãos de soberania, vinculados ao poder/dever de desaplicar normas que violem o disposto na Constituição da República Portuguesa ou os princípios nela consignados (cfr. artigo 204.º da Constituição), nunca aquela norma poderia ter sido aplicada e, em consequência, não podia o Recorrente ter sido condenado na perda do seu mandato de Presidente da Câmara de …., por aplicação da mesma. CCC. Tal norma legal, ao permitir e impor que a aplicação de uma pena criminal – ainda que suspensa na sua execução – implique, necessariamente, a perda do mandato de Presidente da Câmara Municipal, por parte de uma pessoa (o Arguido) que foi sufragado democraticamente e que tem, portanto, o direito político a exercer tal cargo, viola expressamente o n.º 4 do artigo 30.º da Lei Fundamental que veda, expressis verbis, que uma pena possa ter como efeito necessário a perda de um direito político, sendo, por isso, uma norma inconstitucional, inconstitucionalidade que, desde já, se argui nos termos e para os efeitos do artigo 72.º, n.º 2 da Lei 28/82, de 15 de novembro (“Lei do Tribunal Constitucional”). DDD. Coexistindo no texto constitucional, quer o artigo 30.º, n.º 4, quer o artigo 117.º, n.º 3, nenhuma destas disposições poderá prevalecer ou eliminar a outra, tendo ambas de ter, necessariamente, o seu espaço aplicativo próprio – ou, de outra forma, não estariam ambas expressamente inscritas na Constituição – Lei Fundamental do Estado Português. EEE. A única interpretação juridicamente válida será a de considerar que, ainda que a lei possa prever a perda de mandato como uma sanção possível para um crime cometido por um titular de um órgão político, tal nunca poderá ser uma decorrência “necessária” da pena criminal, carecendo, assim, para operar essa perda, de um processo onde se analise – não os pressupostos da punibilidade criminal, alvo do processo penal de aplicação de pena – mas antes, e apenas, os pressupostos aplicativos da pena de perda de mandato que, de acordo com o artigo 30.º, n.º 4 da Constituição, não pode ocorrer de modo necessário ou automático. FFF. O caráter automático/necessário/ope legis da pena da perda de mandato, por decorrência de uma pena de prisão suspensa na sua execução – sempre violará o princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo 18.º, n.º 2 da Constituição, por ser uma consequência manifestamente excessiva e desrazoável. GGG. Não é proporcional, por ser excessivo e desrazoável, a perda de mandato de Presidente da Câmara por efeito necessário e automático da aplicação de uma pena de prisão suspensa na sua execução. HHH. A vingar a interpretação normativa segundo a qual a perda de mandato é efeito necessário e automático da aplicação de uma pena de prisão suspensa na sua execução, sempre a mesma será inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo 18.º, n.º 2 da Constituição (e ainda no artigo 266.º da mesma Lei), por ser uma consequência manifestamente excessiva, desrazoável e inaceitável à luz dos ditames da proteção da liberdade e da autonomia individual (cfr. artigo 27.º, n.º 1 da Constituição) – inconstitucionalidade que, igualmente, desde já, se invoca nos termos e para os efeitos do artigo 72.º, n.º 2 da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro. III. Motivo pelo qual, deve a condenação em perda de mandato, ordenada pelo Tribunal a quo, ser revogada por este Tribunal – o que, desde já, se requer. Nestes termos, e nos melhores de Direito que V. Exas. Venerandos Desembargadores da Relação de Évora doutamente suprirão, deve o presente Recurso ser julgado procedente, por provado, e, em consequência: A) Pelas razões acima aduzidas, deverá reconhecer-se e declarar-se que a Decisão recorrida é insanavelmente contraditória na respetiva fundamentação e na aceção que o legislador consagrou no artigo 410.º, n.º 2, alínea b), do Código de Processo Penal e, consequentemente, nos termos do artigo 431.º, alínea a), do Código de Processo Penal, deverá ser modificada a decisão do Tribunal a quo, no sentido de passar a darem-se como não provados os factos 11 a 14 julgados provados na Decisão recorrida e, consequentemente, absolver-se LF do crime por que vem condenado; B) Deverão reconhecer-se e declarar-se como incorretamente julgados os factos julgados provados e não provados pela Decisão recorrida, acima identificados e, consequentemente, deverá LF ser absolvido do crime por que vem condenado; C) Deverá reconhecer-se e declarar-se que a Sentença recorrida violou a aplicação conjugada dos artigos 483.º e 496.º, ambos do Código Civil e artigo 12.º do Regulamento do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Associativo, aprovado pela Assembleia Municipal de … e, consequentemente, deverá a mesma ser revogada na parte em que condena, solidariamente, o Demandado LF no pagamento à Demandante da quantia de € 1.882,50 a título de danos patrimoniais, e da quantia de € 4.500,00 a título de danos não patrimoniais, sendo ambas as quantias acrescidas de juros de mora contados a partir da data de notificação do Demandado para contestar o pedido de indemnização cível e até efetivo e integral pagamento; D) Deverá ser reconhecido e declarado que a norma resultante do artigo 29.º, alínea f) da Lei n.º 34/87, de 16 de julho, é materialmente inconstitucional, por, nos termos acima aduzidos, violar o disposto nos artigos 18.º, n.º 2, 27.º, n.º 1, 30.º, n.º 4 e 266.º, da Constituição da República Portuguesa e, consequentemente, deverá ser recusada a aplicação daquela norma, nos termos do artigo 204.º da Constituição da República Portuguesa, revogando-se, por conseguinte, a pena acessória a que foi sujeito LF; Subsidiariamente: E) Nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 412.º, n.º 3, alínea c) e 430.º, n.ºs 1 e 2 do CPP, que seja admitida a renovação da prova testemunhal que acima se fez referência, determinando-se a notificação das testemunhas JT, FR e SD para, nos termos do artigo 348.º – aplicável ex vi artigo 430.º, n.º 5, do CPP – serem inquiridas à matéria e aos factos incorretamente julgados pelo Tribunal a quo, tomando como referência fls. 1.414 a 1.416 dos autos (fundamentação da matéria de facto da Decisão recorrida).” O Ministério Público respondeu ao recurso pronunciando-se no sentido da confirmação da sentença e concluindo: “1 – Por sentença proferida nos presentes autos em 20/6/2016, o arguido foi condenado pela prática em autoria material, na forma consumada de um crime de prevaricação, p. e p. pelo artigo 1º, 2º, 3º, nº 1 i), 11º, 29º f) da Lei 34/87 de 16 de Julho, alterada pela lei 30/2008, na pena de 2 anos e 8 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período e na perda, após transito, do mandato do arguido como Presidente da Câmara de …, 2 – Inconformado, o arguido interpôs recurso, alegando, em síntese, que existiu contradição insanável da fundamentação; que foi incorretamente julgada a matéria de facto; e da inconstitucionalidade do artigo 29º f) da Lei 34/87 de 16 de Julho. 3 – No entender do MP, bem decidiu a sentença recorrida relativamente a estes factos, sem qualquer tipo de contradição entre os factos dados como provados e na sua correta, lógica e legal interpretação, uma vez que a mesma, bem explicitou e de forma fundamentada, que o arguido apenas determinou a suspensão de tais apoios após as afirmações terem sido publicadas e nunca antes. 4 – Ora a este propósito refere a douta sentença recorrida, quando refere que para a prova destes factos, “ o Tribunal louvou-se, desde logo no teor da carta de 7 de Julho de 2010, que assumiu importância indiscutível no processo valorativo de prova e formação de convicção do Tribunal. Com efeito, estamos perante uma carta redigida em papel timbrado da autarquia de …, escrita e assinada pelo arguido na qualidade Presidente da Câmara (que expressamente invoca) e que, atenta a sua clareza, não deixa margem para dúvidas quanto ao seu propósito: dar a conhecer à LACE, não apenas a decisão do Presidente da Câmara de …, aqui arguido de retirar todos os apoios concedidos pela autarquia (fazendo aqui expressa menção à atribuição de subsídios), como também deixar claros os fundamentos de cariz exclusivamente pessoal que subjazem a tal decisão. (…) Deste modo, fazendo apelo às mais elementares regras da experiencia comum e das quais nunca nos podemos distanciar, não se mostra verosímil que o arguido (pessoa experiente nas lides politicas e da administração publica), dispondo de fundamentos que, segundo o próprio, teriam assento no próprio regulamento do PADA, se abstivesse de os invocar, optando, antes por convocar razoes de ordem exclusivamente pessoal. “ 5 – Refere ainda a douta sentença: “ O arguido esclareceu o inspetor da IGAL, a 30 de Maio de 2011, entre mais, o seguinte: «No seguimento de várias afirmações do presidente da direção do LACE EB, em blogues pessoais e na comunicação social e inclusivamente em sites pagos pelo município de Estremoz, entendi que as mesmas colocavam em causa a idoneidade e a integridade da minha pessoa, bem como a boa imagem do Município de ... Por essa razão decidi informar o presidente da direção do LACE que até apuramento da verdade dos factos, seriam suspensos os apoios e os subsídios àquela associação (nosso oficio 4351, de 7/7/2010).” 6 – Pelo exposto, conjugando toda a prova documental junta aos autos, testemunhal, bem como as próprias declarações do arguido, bem andou o Tribunal a quo ao considerar que só após a leitura das afirmações no jornal Ecos, tomou o arguido, enviando a dita carta em 7/7/2010, a decisão de cortar as prestações à Associação LACE e não antes, pelo que inexiste qualquer contradição insanável na sentença ora recorrida. De toda a decisão se percebe e explana-se esse entendimento das mais diversas formas e apelando a toda a fundamentação, de que o arguido, enquanto presidente da Câmara tomou a decisão de cortar a atribuição das fundações após a leitura das afirmações no jornal Ecos e que essa decisão não estava tomada em Junho de 2010, como se alega. 7 – Tal como vertido na douta sentença e doutamente pormenorizado, “ coligidas as provas produzidas em sede de audiência de julgamento – mormente o teor da Carta de 7 de Julho, as declarações do legal representante da assistente, bem como os depoimentos claros e assertivos das testemunhas JR, PA e AB (testemunha que, para alem do mais, de forma espontânea teceu considerações quanto à personalidade do arguido, que, no seu entendimento, é compatível com a atuação do arguido no episodio de vida em apreço no caso dos autos) e que corroboraram o valor da carta e analisadas as mesmas à luz das regras da experiencia comum, podemos concluir, com segurança, pela atuação nos termos descritos em 12, 13 e 14, dos factos provados, revelando o conjunto das provas produzidas em julgamento de forma inequívoca, a “ vontade do arguido em retirar os apoios à LACE, com o propósito de a prejudicar. “”. 8 – O que o Recorrente alega são circunstâncias que no seu entendimento poderiam ter sido valoradas pelo Tribunal num outro sentido, pelo que o que está em causa não é um erro notório da apreciação da prova, mas sim uma outra interpretação da prova produzida. Porém, para efeitos de modificação da matéria de facto pelo Tribunal Superior não basta alegar a razoabilidade de outra interpretação da prova produzida, sendo, pelo contrário, fundamental que o Recorrente apresente provas irrefutáveis de que a conclusão retirada pelo Tribunal a quo se encontra errada. No caso sub judice o Recorrente não demonstrou que a decisão sobre a matéria de facto é irrazoável, ilógica, arbitrária ou notoriamente violadora das regras da experiência comum, na medida em que a prova por si apresentada não aponta inequivocamente no sentido da procedência da interpretação por si defendida, pelo que no nosso modesto entendimento o recurso terá que improceder nesta parte. 9 – Alega o recorrente por fim, que a norma constante do artigo 29º f) da Lei 34/87 de 16 de Julho é inconstitucional, uma vez que permite impor criminalmente a perda de um mandato – um direito politico – em violação do artigo 30º nº 4 da C.R.P que refere “ Nenhuma pena envolve como direito necessário a perda de direitos civis, profissionais ou políticos. 10 – A este propósito acompanhamos na integra o entendimento expresso na sentença recorrida de que: “ O Tribunal Constitucional foi já, por diversas vezes, convocado a pronunciar-se sobre o sentido e alcance que vem dando a este preceito Constitucional. (…) De salientar que, na génese da eliminação dos efeitos automáticos das penas subjaz o entendimento de que estes consubstanciam um verdadeiro obstáculo à realização de um fim essencial das penas da recuperação social do delinquente e sobretudo, o caráter infamante e estigmatizante que tais efeitos inelutavelmente implicam. (…) Sucede porém que, no caso de crimes de responsabilidade de titulares de cargos políticos, estatui o artigo 117º da C.R.P, sob a epígrafe “ Estatuto dos Titulares de Cargos Políticos “, que, “ os titulares de cargos políticos respondem política, civil e criminalmente pelas ações e omissões que pratiquem no exercício das suas funções. “, Mais preceituando o nº 3 do mesmo preceito normativo que “ a lei determina os crimes de responsabilidade de titulares de cargos políticos, bem como as sanções aplicáveis e os respetivos efeitos, que podem incluir a destituição do cargo ou perda de mandato. Ora, fazendo uma interpretação conjugada dos referidos preceitos constitucionais, decorre do mesmo que o artigo 117º nº 3 da C.R.P, ao remeter para a lei a determinação dos efeitos resultantes da condenação em crime de responsabilidade, se apresenta como norma especial relativamente à regra geral do artigo 30º nº 4. (…) Assim sendo, porque a perda de mandato é inerente à própria ideia de condenação em crime de responsabilidade, não repugna aceitar que ela se configure como efeito automático da condenação. Consequentemente, o artigo 29º da Lei 34/87 de 16 de Julho não viola o artigo 30º nº 4 da C.R.P porquanto o âmbito de aplicação deste se há-se ter como limitado pelo referido nº 3 do artigo 117º da C.R.P. A condenação definitiva pela prática do crime de prevaricação cometido no exercício das suas funções, implica necessariamente a perda do respetivo mandato. “. 11- O Tribunal a quo fez uma correta – porque não viciada – ponderação dos elementos probatórios reunidos em sede de audiência de julgamento, valorando os depoimentos prestados e os documentos apreciados, de acordo com o princípio da livre apreciação da prova, seguindo as regras da lógica e da experiência comum, e cotejando-os com os demais elementos constantes dos autos.” A assistente Liga Amigos dos Castelos de Evoramonte respondeu ao recurso, concluindo: “a) Não se verifica contradição insanável entre, por um lado, os factos julgados provados 5 a 7, e, por outro lado, os factos julgados provados 8 a 11, da douta sentença (cfr. págs. 8 a 10), insuscetível de ser corrigida por via do artigo 380º, nº.s 1 e 2, do CPP. b) A págs. 28/9 da douta sentença, diz-se: “De referir, ainda, que da documentação junta pelo arguido e pela Câmara Municipal de … em sede de audiência de julgamento (cfr. fls. 1226 a 1227 e fls. 1218 a 1374) decorre tão-somente que, como já havia sido referido pela testemunha AG, coordenador da contabilidade e chefe de secção desde 1997, bem como outras testemunhas ouvidas quanto a esta matéria, os pagamentos das prestações do P.A.D.A. não eram feitos de forma atempada (de referir, a título exemplificativo que a 2ª prestação foi paga a «ARCA - Associação Recreativa e Cultura, de Arcos, à «Sociedade Columbófila Rainha Santa" e à «Sociedade Recreativa Popular Estremocense, respectivamente, a 9 de Julho de 2010, a 22 de Julho de 2010 e a 3 de Dezembro de 2010), sendo possível verificar-se, igualmente que as Associações beneficiárias do P.A.D.A. não recebiam o pagamento das prestações na mesma data.” c) Assim, de acordo com as regras da experiência comum, e correspondendo ao que era usual no Município de …, tal facto é suficientemente demonstrativo da decisão de suspensão dos pagamentos da 2ª e da 3ª prestações de 2010 à recorrida no âmbito do PADA ter sido tomada entre 1 e 7 de julho. d) Assim, a decisão de suspensão é contemporânea da publicação das declarações do director da recorrida no jornal ECOS, as quais estiveram na sua génese. e) Pelo que a carta de 7 de julho, com o teor constante do facto 10 provado, não pode ser agora posta em causa. f) Constituindo a sua fundamentação a única relevante para a suspensão delituosa dos pagamentos à recorrida. g) Ademais, como decorre também da restante matéria dada como provada na douta decisão recorrida. Sobre o denominado recurso da matéria de facto h) Vem o recorrente dizer que foram incorrectamente considerados provados sobretudo os factos provados sob o nºs 11 a 14 constantes da douta sentença recorrida. i) Invocando, para efeitos do artigo 412º, 3, b), do CCP, como impondo o entendimento contrário, o depoimento da testemunha JT, na sessão de julgamento de 22 de fevereiro de 2016 (entre os 24m47s e os 29m50s e entre 1h36m40s e 1h36m55s), o Depoimento da testemunha DP, na sessão de julgamento de 22 de fevereiro de 2016 (entre os 22m33s e os 23m36s), o Depoimento da testemunha FR, na sessão de julgamento de 27 de abril de 2016 (entre os 11m00s e os 14m02s e entre os 47m24s e os 48m25s), o Depoimento da testemunha SD, na sessão de julgamento de 24 de maio de 2016 (entre os 2mO9s e os 3m23s; entre os 5m50s e os 7m27s; entre os 14m12s e os 14m58s e entre os 50m37s e os 51m17s), e os documentos de fls. 6 e 7 dos autos – carta de 7 de julho de 2010, de Fls. 35 dos autos – editorial do jornal Ecos, de 1 de julho de 2010, e de fls. 41 a 51 – Regulamento e Normas Específicas do PADA. j)Mas não tem razão. k) O Tribunal a quo formou a sua convicção principalmente na prova resultante da carta de 7 de julho de 2010, eloquente por si própria. l) E cuja clareza de conteúdo é confirmada pela testemunha DP, não tendo este dúvidas quanto a este conteúdo (leia-se, quanto aos fundamentos invocados nela), apenas não podendo afirmar se a carta consubstancia a decisão ou apenas a comunicação desta. m) A que acresce a informação prestada pelo próprio arguido ao Inspector da IGAL a 30 de Maio de 2011 (junta a fls. 58 a 60 dos autos). n) Bem como o próprio relatório da IGAL de 27 de Setembro de 2011, citado a págs. 24/5 da douta sentença recorrida. o) Dos quais decorre inequivocamente que a motivação do acto delituoso do recorrente é exclusivamente a constante da carta de 7 de julho de 2010. p) Assim, existe suficiente fundamentação de sustentação daqueles factos provados, não havendo, por isso, qualquer razão para ser ordenada a renovação da prova, como requerido. Sobre o alegado no âmbito do recurso em matéria civil q) Diz o recorrente que não há prática de crime, logo não pode haver lugar a indemnização civil. r) Mas mesmo que assim não fosse, diz, sempre o Tribunal teria que trazer para o lado da indemnização civil factos provados, como os que se referem a irregularidades praticadas pela recorrida no âmbito dos apoios do PADA em 2009. s) Não é assim, tendo-se já demonstrado à saciedade a existência da conduta criminosa do recorrente, sem a qual a recorrida teria recebido as verbas que lhe tinham sido atribuídas em 2010. t) Não tendo sido assim, devem estas ser entregues pelo recorrido ou pelo Município (conforme a condenação solidária), em sede de indemnização civil. u) Provou-se que o trabalho desenvolvido pela LACE. Contribuiu para a divulgação de Evoramonte, das suas gentes e do seu património, bem como das suas actividades e agentes económicos, quer em Portugal, quer no estrangeiro, e que trouxe a Evoramonte muitos não residentes, sendo reconhecido pela população e pelos agentes económicos da região e pelas instituições públicas e privadas regionais, tal como a Direcção Regional da Cultura do Alentejo e pelos diversos membros da Rede Europeia dos Sítios da Paz – cf. pág. 13 da douta sentença. v) Mais se provou que em consequência do não recebimento do remanescente do subsídio atribuído para o ano de 2010 não realizou várias actividades nesse ano e nos seguintes, do que resultou o desinteresse e o distanciamento da população, bem como a afectação da imagem, da reputação e da credibilidade da recorrida, a nível local e regional – cf. factos provados 32 a 35, a págs. 13 e 14 da douta sentença. w)Assim, não se crê exagerado o montante de € 4500 fixado a título de danos não patrimoniais. Sobre o recurso em matéria de inconstitucionalidade da alínea f) do artigo 29º da Lei nº 34/87 x) Ao contrário do alegado pelo recorrente, não se verifica a inconstitucionalidade da alínea f) do artigo 29º da Lei 34/87, por violação do artigo 30, nº 4, da CRP. y) Tal como esse Venerando Tribunal tem decidido em vários acórdãos, o artigo 117º, nº 3, da CRP, é norma especial face ao nº 4 do artigo 30º, pelo que“o artigo 29. °, alínea f), da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, é uma lei especial, estando-lhe associada a ideia da indignidade para o exercício de funções de quem pratica no exercido delas algum dos crimes previstos nessa lei e, nesses casos tem também subjacente a necessidade de salvaguarda e defesa do prestígio das instituições, onde era exercido o cargo de que o agente era titular” - cfr. Acórdão 114/13.7TARMR.E1, datado de 02-02-2016. z) Mais se entende admissível a perda de mandato efetiva, ainda que a pena pelo crime que a motivou tenha sido suspensa na sua execução, não se violando o princípio da proporcionalidade, podendo corresponder “... a um modo de o legislador poder conferir protecção efectiva a certos bens jurídicos específicos, relacionados com o exercício de funções políticas, quedando a reacção criminal efectiva aos limites do considerado como adequado e de justa medida” - cfr. Acórdão 540/12.9TASTR.E1, datado de 10-07-2014.” A assistente respondeu também ao recurso, concluindo: “a) Não se verifica contradição insanável entre, por um lado, os factos julgados provados 5 a 7, e, por outro lado, os factos julgados provados 8 a 11, da douta sentença (cfr. págs. 8 a 10), insuscetível de ser corrigida por via do artigo 380º, nº.s 1 e 2, do CPP. b) A págs. 28/9 da douta sentença, diz-se: “De referir, ainda, que da documentação junta pelo arguido e pela Câmara Municipal de … em sede de audiência de julgamento (cfr. fls. 1226 a 1227 e fls. 1218 a 1374) decorre tão-somente que, como já havia sido referido pela testemunha AG, coordenador da contabilidade e chefe de secção desde 1997, bem como outras testemunhas ouvidas quanto a esta matéria, os pagamentos das prestações do P.A.D.A. não eram feitos de forma atempada (de referir, a título exemplificativo que a 2ª prestação foi paga a «ARCA - Associação Recreativa e Cultura, de Arcos, à «Sociedade Columbófila Rainha Santa" e à «Sociedade Recreativa Popular Estremocense, respectivamente, a 9 de Julho de 2010, a 22 de Julho de 2010 e a 3 de Dezembro de 2010), sendo possível verificar-se, igualmente que as Associações beneficiárias do P.A.D.A. não recebiam o pagamento das prestações na mesma data.” c) Assim, de acordo com as regras da experiência comum, e correspondendo ao que era usual no Município de Estremoz, tal facto é suficientemente demonstrativo da decisão de suspensão dos pagamentos da 2ª e da 3ª prestações de 2010 à recorrida no âmbito do PADA ter sido tomada entre 1 e 7 de julho. d) Assim, a decisão de suspensão é contemporânea da publicação das declarações do director da recorrida no jornal ECOS, as quais estiveram na sua génese. e) Pelo que a carta de 7 de julho, com o teor constante do facto 10 provado, não pode ser agora posta em causa. f) Constituindo a sua fundamentação a única relevante para a suspensão delituosa dos pagamentos à recorrida. g) Ademais, como decorre também da restante matéria dada como provada na douta decisão recorrida. Sobre o denominado recurso da matéria de facto h) Vem o recorrente dizer que foram incorrectamente considerados provados sobretudo os factos provados sob o nºs 11 a 14 constantes da douta sentença recorrida. i) Invocando, para efeitos do artigo 412º, 3, b), do CCP, como impondo o entendimento contrário, o depoimento da testemunha JT, na sessão de julgamento de 22 de fevereiro de 2016 (entre os 24m47s e os 29m50s e entre 1h36m40s e 1h36m55s), o Depoimento da testemunha DP, na sessão de julgamento de 22 de fevereiro de 2016 (entre os 22m33s e os 23m36s), o Depoimento da testemunha FR na sessão de julgamento de 27 de abril de 2016 (entre os 11m00s e os 14m02s e entre os 47m24s e os 48m25s), o Depoimento da testemunha SD, na sessão de julgamento de 24 de maio de 2016 (entre os 2mO9s e os 3m23s; entre os 5m50s e os 7m27s; entre os 14m12s e os 14m58s e entre os 50m37s e os 51m17s), e os documentos de fls. 6 e 7 dos autos – carta de 7 de julho de 2010, de Fls. 35 dos autos – editorial do jornal Ecos, de 1 de julho de 2010, e de fls. 41 a 51 – Regulamento e Normas Específicas do PADA. j)Mas não tem razão. k) O Tribunal a quo formou a sua convicção principalmente na prova resultante da carta de 7 de julho de 2010, eloquente por si própria. l) E cuja clareza de conteúdo é confirmada pela testemunha Diogo Freitas do Amaral, não tendo este dúvidas quanto a este conteúdo (leia-se, quanto aos fundamentos invocados nela), apenas não podendo afirmar se a carta consubstancia a decisão ou apenas a comunicação desta. m) A que acresce a informação prestada pelo próprio arguido ao Inspector da IGAL a 30 de Maio de 2011 (junta a fls. 58 a 60 dos autos). n) Bem como o próprio relatório da IGAL de 27 de Setembro de 2011, citado a págs. 24/5 da douta sentença recorrida. o) Dos quais decorre inequivocamente que a motivação do acto delituoso do recorrente é exclusivamente a constante da carta de 7 de julho de 2010. p) Assim, existe suficiente fundamentação de sustentação daqueles factos provados, não havendo, por isso, qualquer razão para ser ordenada a renovação da prova, como requerido. Sobre o alegado no âmbito do recurso em matéria civil q) Diz o recorrente que não há prática de crime, logo não pode haver lugar a indemnização civil. r) Mas mesmo que assim não fosse, diz, sempre o Tribunal teria que trazer para o lado da indemnização civil factos provados, como os que se referem a irregularidades praticadas pela recorrida no âmbito dos apoios do PADA em 2009. s) Não é assim, tendo-se já demonstrado à saciedade a existência da conduta criminosa do recorrente, sem a qual a recorrida teria recebido as verbas que lhe tinham sido atribuídas em 2010. t) Não tendo sido assim, devem estas ser entregues pelo recorrido ou pelo Município (conforme a condenação solidária), em sede de indemnização civil. u) Provou-se que o trabalho desenvolvido pela LACE. Contribuiu para a divulgação de Evoramonte, das suas gentes e do seu património, bem como das suas actividades e agentes económicos, quer em Portugal, quer no estrangeiro, e que trouxe a Evoramonte muitos não residentes, sendo reconhecido pela população e pelos agentes económicos da região e pelas instituições públicas e privadas regionais, tal como a Direcção Regional da Cultura do Alentejo e pelos diversos membros da Rede Europeia dos Sítios da Paz – cf. pág. 13 da douta sentença. v) Mais se provou que em consequência do não recebimento do remanescente do subsídio atribuído para o ano de 2010 não realizou várias actividades nesse ano e nos seguintes, do que resultou o desinteresse e o distanciamento da população, bem como a afectação da imagem, da reputação e da credibilidade da recorrida, a nível local e regional – cf. factos provados 32 a 35, a págs. 13 e 14 da douta sentença. w)Assim, não se crê exagerado o montante de € 4500 fixado a título de danos não patrimoniais. Sobre o recurso em matéria de inconstitucionalidade da alínea f) do artigo 29º da Lei nº 34/87 x) Ao contrário do alegado pelo recorrente, não se verifica a inconstitucionalidade da alínea f) do artigo 29º da Lei 34/87, por violação do artigo 30, nº 4, da CRP. y) Tal como esse Venerando Tribunal tem decidido em vários acórdãos, o artigo 117º, nº 3, da CRP, é norma especial face ao nº 4 do artigo 30º, pelo que“o artigo 29. °, alínea f), da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, é uma lei especial, estando-lhe associada a ideia da indignidade para o exercício de funções de quem pratica no exercido delas algum dos crimes previstos nessa lei e, nesses casos tem também subjacente a necessidade de salvaguarda e defesa do prestígio das instituições, onde era exercido o cargo de que o agente era titular” - cfr. Acórdão 114/13.7TARMR.E1, de 02-02-2016. z) Mais se entende admissível a perda de mandato efetiva, ainda que a pena pelo crime que a motivou tenha sido suspensa na sua execução, não se violando o princípio da proporcionalidade, podendo corresponder “... a um modo de o legislador poder conferir protecção efectiva a certos bens jurídicos específicos, relacionados com o exercício de funções políticas, quedando a reacção criminal efectiva aos limites do considerado como adequado e de justa medida” - cfr. Acórdão 540/12.9TASTR.E1, datado de 10-07-2014.” Neste Tribunal, a Sra. Procuradora-geral Adjunta emitiu parecer pronunciando-se no sentido da confirmação da sentença. O arguido respondeu, reiterando a posição defendida em recurso. Colhidos os vistos, teve lugar a conferência. 2. Na sentença, consideraram-se os seguintes factos provados: “1. No ano de 2007, a Câmara Municipal de …. criou um programa denominado P.A.D.A. (Programa de Apoio ao Desenvolvimento Associativo) para promover a realização e o aprofundamento de projectos e acções recreativas, sociais e desportivas de iniciativas dos cidadãos, a título individual ou em associações de reconhecida qualidade e de interesse para o concelho de …, atribuindo por essa via, verbas pecuniárias, bens ou serviços. 2.A Liga dos Amigos do Castelo de Evoramonte, designada por L.A.C.E., representada pelo Presidente da respectiva Direcção, EB, é uma associação sem fins lucrativos, com o nº de pessoa colectiva n.º ----, com sede na Rua …., Evoramonte, constituída em 23 de Março de 2000, e tem como objecto a intervenção cívica, cultural e social, através de todas as formas legais para propiciar a defesa, a dinamização e a valorização do património arquitectónico, histórico e cultural relacionado com o Castelo de Evoramonte. 3. A referida Associação, desde o início do programa P.A.D.A., no ano de 2007, sempre apresentou anualmente a sua candidatura ao mesmo na categoria de plano de desenvolvimento, tendo em todos os anos recebido o respectivo apoio. 4. No dia 24 de Fevereiro de 2010, em sede de reunião ordinária realizada na Câmara Municipal ---, e após prévia entrega do processo de candidatura por parte da L.A.C.E., foi decidido atribuir a favor dessa entidade para o ano de 2010, um subsídio no valor de 3.765,00€ (três mil setecentos e sessenta e cinco euros). 5. Ficou estabelecido o pagamento do referido subsídio em 3 (três) prestações, a primeira no valor de 1.882,50€, a ser paga em Março de 2010, a 2ª prestação no valor de €941,25 a ser paga no mês de Junho de 2010 e a 3ª prestação no valor de € 941,25 a ser paga no mês de Outubro de 2010. 6. Do montante total do referido subsídio atribuído foi pago, em 6 de Março de 2010, metade do seu valor total. 7. Em Junho de 2010, a Câmara Municipal de … deveria ter efectuado o pagamento relativo à 2ª tranche do subsídio concedido, no valor de 941,25€, o que não o fez. 8. Nessa sequência, por carta datada de 7 de Julho de 2010, redigida em papel timbrado da autarquia de …, escrita e assinada pelo respectivo Presidente da Câmara, ora arguido, foi aquela Associação informada de que a Câmara Municipal de … iria deixar de apoiar as iniciativas da L.A.C.E., incluindo a atribuição de subsídios. 9. Tal decisão de suspensão da atribuição do remanescente do subsídio foi determinada pelo arguido, sem que para o efeito tivesse havido prévia deliberação camarária nesse sentido. 10. De facto, em data anterior a tal decisão, foram publicadas afirmações no jornal Ecos, do qual o legal representante dessa Associação é director, que na opinião do arguido, colocou em causa a sua idoneidade pessoal, motivo pelo qual o arguido decidiu unilateralmente e sem qualquer justificação suspender a atribuição do referido subsídio, tendo para o efeito redigido, assinado e dirigido ao Presidente da Direcção da L.A.C.E., EB uma carta com o seguinte teor: “Na sequência das recentes afirmações que V. Ex.ª tornou públicas, enquanto Director do Jornal Ecos, relativas ao abandono do Sistema “Águas do Alentejo” pelo Município de ---, e considerando: • Que tais afirmações colocam em causa a idoneidade da minha pessoa, quer enquanto Presidente da Câmara, quer enquanto cidadão; • Que V. Exa. é Presidente da Direcção da LACE e que, enquanto Presidente da Camara Municipal de …, me reservo o direito de não dissociar esse cargo dos restantes cargos que desempenha e, consequentemente, das posições que tem tomado relativamente à minha pessoa. Serve a presente para informar V. Exa. que esta autarquia deixará de apoiar as iniciativas da Liga dos Amigos do Castelo de Evoramonte, incluindo a atribuição de subsídios, enquanto se mantiver o comportamento que o seu Presidente da Direcção tem vindo a manter em relação do Município de --- e às pessoas que o dirigem e que foram eleitas, para o efeito, pela maioria dos ….. Não posso admitir que sejam usados dinheiros públicos para subsidiar uma instituição que é dirigida por um Presidente que adopta uma postura de constante difamação da figura do principal responsável pela gestão da entidade que, quer através do apoio financeiro, quer logístico, tem contribuído para a sua sobrevivência, enquanto associação. Devo ainda salientar que, se a maioria destas pessoas confiou à equipa que dirijo os destinos do Concelho de …., certamente foi porque confiam tanto na estratégia que temos para o Concelho, como na nossa capacidade de decisão acerca daquilo que melhor sirva os seus interesses e necessidades de desenvolvimento. Por último, quero deixar bem claro que, ao longo da minha vida pessoal, profissional e política as pessoas sempre puderam confiar em mim e sempre saí, como é hábito dizer-se “pela porta grande”, pelo que jamais permitirei que sejam efectuadas insinuações difamatórias acerca da minha pessoa, em especial para quem, como é do conhecimento geral, nem sempre teve a mesma atitude durante a vida.” 11. Nesse contexto e única e exclusivamente pelos motivos elencados na carta transcrita em 10., o arguido, na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de --- e representante desta não efectuou o pagamento da 2ª e da 3ª prestações relativas ao P.A.D.A. a favor da L.A.C.E. e cortou totalmente todos os apoios logísticos habitualmente fornecidos, nomeadamente montagens de palcos e cedência de equipamentos. 12. O arguido agiu bem sabendo da ilegalidade da sua actuação descrita em 7. a 11., ou seja, do facto de estar a tomar uma decisão unilateral, sem qualquer justificação, desprovida de cobertura legal e, por isso, contra direito. 13. Não obstante, actuou no âmbito das suas funções de titular de cargo político, ou seja, de Presidente da Câmara Municipal de …, e fê-lo com o propósito alcançado de prejudicar a associação L.A.C.E, porquanto a mesma tinha como presidente de Direcção EB, o que quis. 14. O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei. 15. Até à presente data, a Câmara Municipal de …não efectuou o pagamento das 2ª e 3ª prestações relativas ao P.A.D.A. do ano de 2010 a favor da L.A.C.E. 16. A. L.A.C.E. não foi convocada para uma reunião que teve lugar no ano de 2010, em que participaram as Associações Culturais do Concelho e em que discutiu o Programa de Apoio ao Desenvolvimento Cultural. 17. A L.A.C.E. apresentou candidatura ao P.A.D.A. para o ano de 2011, solicitando a atribuição de um subsídio no montante global de 7.750,00€. 18. Em reunião ordinária da Câmara Municipal de …, realizada a 2 de Fevereiro de 2011, foi deliberado não atribuir qualquer apoio à L.A.C.E. no âmbito do P.A.D.A para o ano de 2011 até que esta “regularizasse a situação de falta de documentação”. 19. Por carta datada de 18 de Março de 2011 e entrada nos Serviços da Câmara Municipal de … a 21 de Março de 2011, a L.A.C.E. entregou os seguintes documentos: cópia autenticada do Relatório da Direcção do Exercício de 2009; cópia autenticada das contas da gerência do exercício de 2009; cópia autenticada do parecer do Conselho Fiscal do exercício de 2009; cópia autenticada da acta da Assembleia Geral Eleitoral de 20 de Março de 2010; e cópia autenticada do registo dos membros da Direcção nos Serviços das Finanças. 20. A L.A.C.E. apresentou candidatura ao Programa de Apoio ao Desenvolvimento Cultural (P.A.D.C.) para o ano de 2012, solicitando a atribuição de um subsídio no montante global de 6.200,00€. 21. A candidatura referida em 20. não foi submetida à apreciação da Reunião da Câmara Municipal realizada a 18 de Abril de 2012, que aprovou as candidaturas apresentadas ao P.A.D.C.. 22. Entre os anos de 2000 a 2006 a assistente desenvolveu diversas actividades, entre as quais: • Concerto de Música Antiga, realizado a 30 de Dezembro de 2000, na Igreja de São Pedro com o apoio da Região de Turismo de Évora e do Ministério da Cultura e louvado pelo Senhor Presidente da República, Dr. Jorge Sampaio, nos termos constantes da mensagem de fls. 317 e 318, que aqui se dá por integralmente reproduzida; • “Passagem para o III Milénio”, actividade realizada no ano 2000; • “Convenção Euro”, actividade realizada no ano 2001, integrada por acções de formação e sensibilização junto de comerciantes locais e idoso, com o apoio de jovens através do Carnaval das Escolas de Estremoz, com a utilização do tema “Euro”; • Festival de Música “Tardes no Castelo”, realizado nos anos de 2001/2002, a que foi atribuído apoio financeiro no âmbito do Programa Operacional da Cultura; • Festival de Artes e Música “Tardes no Castelo”, realizado nos anos de 2002/2003, a que foi atribuído apoio financeiro no âmbito do Programa Operacional da Cultura; • “Percurso do Imaginário”, traduzido num percurso temático realizado no Centro Histórico de Evoramonte, realizado com o apoio e participação da comunidade local, que entre o mais, elaborou todos os factos e acessórios históricos utilizados no percurso; • Presépio de Rua de Évoramonte, no ano de 2006, realizado com o apoio da Câmara Municipal de Estremoz; • Comemorações Anuais da Assinatura da Convenção de Évoramonte. 23. Parte das actividades descritas em 22. foi co-financiada pelos programas comunitários “Programa Operacional Regional do Alentejo”, “Programa Operacional da Cultura” e “Iniciativa Comunitária Leader +” 24. No âmbito e com o apoio do Programa de Desenvolvimento Associativo (P.A.D.A.), a L.A.C.E realizou, entre os anos de 2007 a 2010: • As comemorações do Aniversário da Convenção de Evoramonte, realizadas nos anos de 2007, 2008, 2009 e 2010; • A actividade “Evoramonte – Castelo Vivo”, realizada nos anos de 2007 e 2008; • A actividade “Evoramonte – Castelo da Paz”, realizada nos anos de 2007, 2008 e 2009, com montagem do Presépio de Rua de Evoramonte e animação natalícia; 25. A L.A.C.E. lançou e dinamizou a Rede Europeia de Sítios da Paz (Associação European Network of Places of Peace/ENPP), que foi fundada a 28 de Maio de 2010, por escritura pública outorgada em Évoramonte, à qual presidiu. 26. A Rede Europeia de Sítios da Paz tem como principais objectivos promover a cooperação, o conhecimento mútuo e a valorização dos locais da Europa onde foram assinados Tratados e Convenções de Paz como Évoramonte; promover a defesa de uma Cultura de Paz na Europa; promover o Turismo Cultural pela Paz com a criação de uma Rota Europeia da Paz (Places of Peace Route). 27. A L.A.C.E participou em diversas reuniões e iniciativas no âmbito da Rede Europeia de Sítios da Paz, que tiveram lugar quer em Portugal, quer no Estrangeiro, tendo sido considerada como prioridade para 2012/2013 pela Tourism Task Force do Parlamento Europeu. 28. O trabalho desenvolvido pela L.A.C.E. contribuiu para a divulgação de Évoramonte, das suas gentes e do seu património, bem como das suas actividades e agentes económicos, quer em Portugal, quer no estrangeiro. 29. As actividades desenvolvidas pela L.A.C.E. trouxeram a Évoramonte várias pessoas aí não residentes, que fizeram as suas refeições e pernoitaram em estabelecimentos da Região. 30. O trabalho desenvolvido pela L.A.C.E. é reconhecido pela população e pelos agentes económicos da região, bem como pelas instituições públicas e privadas regionais, tal como a Direcção Regional da Cultura do Alentejo e pelos diversos membros da Rede Europeia dos Sítios da Paz. 31. A partir do ano de 2007, as iniciativas desenvolvidas pela Assistente passaram a estar dependentes do apoio logístico e financeiro da Câmara Municipal de ….. 32. Em consequência do não recebimento do remanescente do subsídio atribuído à L.A.C.E. para o ano de 2010 no âmbito do P.A.D.A., a L.A.C.E deixou de realizar, nesse mesmo ano, as actividades “Évoramonte – Castelo Vivo, 3ª Edição” e “Évoramonte – Castelo da Paz, 5ª Edição”. 33. Por não dispor de meios financeiros, a L.A.C.E. não realizou as Actividades Évoramonte – Castelo Vivo,” e “Évoramonte – Castelo da Paz”, no ano de 2011. 34. Por não dispor de meios financeiros, a L.A.C.E. não realizou as Actividades Évoramonte – Castelo Vivo,” “Évoramonte – Castelo da Paz” e as Comemorações do 178º do Aniversário da Convenção de Évoramonte” no ano de 2012. 35. Como consequência directa e necessária da não realização das actividades referidas em 32., 33. e 34., a população desinteressou-se e distanciou-se da L.A.C.E.. 36. Como consequência directa e necessária da não realização das actividades referidas em 32., 33. e 34., a imagem, a reputação e a credibilidade da L.A.C.E. foram afectadas perante os agentes económicos e culturais e perante a população da freguesia e região. 37. O arguido não tem antecedentes criminais. 38. O arguido exerceu as funções de Presidente da Câmara Municipal de …., entre os anos de 1994 a 2004, exercendo as mesmas funções desde o ano de 2009 até à presente data; o arguido é casado, vivendo com a sua esposa em casa própria, tendo a seu cargo a prestação mensal de 122,00€ relativa a um empréstimo à habitação; o arguido aufere o vencimento mensal de 2.500,00€, a que acresce o montante de 900,00€ a título de despesas de representação, auferindo a sua esposa o vencimento mensal de 900,00€, enquanto bibliotecária; o arguido é proprietário de três veículos automóveis dos anos de 1999, 2004 e 2013, das Marcas Opel e Dacia; o arguido contribui para o sustento de um dos seus filhos maiores, com a quantia mensal de 300,00€; o arguido tem o 2º ano do Curso de Contabilidade e Administração.” E foram considerados como não provados os factos seguintes: “a) O não pagamento da 2ª e 3ª prestações relativas ao P.A.D.A atribuído a favor da L.A.C.E. para o ano de 2010 e o corte de apoios logísticos habitualmente fornecidos pela Câmara Municipal de …, nomeadamente montagens de palcos e cedência de equipamentos deveu-se à circunstância de a L.A.C.E. não ter entregado, a 25 de Fevereiro de 2010, a documentação prevista no nº3 do artigo 11º do Regulamento do P.A.D.A. referente ao exercício de 2009, o que determinou a suspensão automática de todos os apoios concedidos. b) O não pagamento da 2ª e 3ª prestações relativas ao P.A.D.A atribuído a favor da L.A.C.E. para o ano de 2010 e o corte de apoios logísticos habitualmente fornecidos pela Câmara Municipal de …, nomeadamente montagens de palcos e cedência de equipamentos deveu-se à circunstância de a L.A.C.E. ter utilizado uma das prestações do subsídio atribuído no âmbito do P.A.D.A. de 2009 para fim diverso do previsto no plano de actividades apresentado na respectiva candidatura. c) A decisão de não atribuir qualquer apoio à L.A.C.E no âmbito do P.A.D.A. para o ano de 2011 foi tomada pelo arguido na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de … e representante desta, única e exclusivamente pelos motivos elencados na carta transcrita em 10. dos factos provados. d) A decisão de não atribuir qualquer apoio à L.A.C.E no âmbito do P.A.D.C. para o ano de 2012 foi tomada pelo arguido na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de … e representante desta, única e exclusivamente pelos motivos elencados na carta transcrita em 10. dos factos provados, o arguido, e) Como consequência directa e necessária da não aprovação das candidaturas apresentadas ao PA.D.A para o ano de 2011 e para o P.A.D.C. de 2012, a L.A.C.E não apresentou candidatura ao P.A.D.C. para o ano de 2013. f) Como consequência directa e necessária da conduta referida em c), a L.A.C.E. deixou de receber no ano de 2011, um subsídio no montante global de 3.765,00€. g) Como consequência directa e necessária da conduta referida em d), a L.A.C.E. deixou de receber no ano de 2012, um subsídio no montante global de 3.765,00€. h) A L.A.C.E não foi convocada para a reunião referida em 16. dos factos provados por decisão do arguido. i) O arguido mandou desactivar o site da L.A.C.E hospedado no servidor da Câmara, impedindo-a de divulgar, por esse meio, as suas acções e informações. j) O arguido deu ordens directas para que fosse recusada a impressão na Câmara Municipal de --- de materiais de uma exposição de fotografia organizada pela Fundação Obras pela circunstância de estes materiais conterem o logotipo e o nome da L.A.C.E. como co-organizadora do evento. k) Várias entidades privadas manifestaram receio em colaborar com a L.A.C.E. por terem medo de que o arguido e o Município de…. lhe cortarem o financiamento e/ou de dificultarem as suas actividades l) As condutas descritas em c), d), h), i), j) foram adoptadas pelo arguido com o propósito concretizado de prejudicar a L.A.C.E., atingindo-a na sua reputação e na sua imagem perante as demais associações, perante os outros agentes culturais e económicos e perante a população em geral e de impedir o relacionamento da L.A.C.E. com outros agentes culturais do Conselho. m) A actividade “Passagem para o III Milénio” referida em 22. dos factos provados juntou mais de 400 pessoas vindas de todo o país, na Torre/Paço de Évoramonte. n) A actividade “Convenção Euro” referida em 22. dos factos provados foi realizada com o apoio técnico da Associação Comercial do Distrito de Évora. o) No âmbito das actividades Festival de Música “Tardes no Castelo” e Festival de Artes e Música “Tardes no Castelo” referida em 22. dos factos provados tiveram lugar, respectivamente, 6 e 10 concertos. p) A actividade “Percurso do Imaginário” referida em 22. dos factos provados foi realizada com o apoio da Região de Turismo de Évora e da Rede Europeia de Turismo de Aldeia. q) Entre os anos de 2000 a 2006, a L.A.C.E desenvolveu a actividade “Convenção Euro das Escolas”, na qual participaram mais de 800 crianças dos Jardins de Infância e 2º Ciclo do Ensino Básico do Concelho de …, e participou em Bruxelas no concurso europeu “Euro - uma moeda para todos”. r) Entre os anos de 2000 a 2006 a L.A.C.E produziu e editou o documentário em CD “Évoramonte o espírito da Paz”, com o apoio da Delegação Regional de Cultura do Alentejo e da Câmara Municipal de ---. s) Parte das actividades descritas em 22. dos factos provados foi co-financiada pelo programa “INTERREG IIIC”. t) As actividades descritas em 22. dos factos provados acarretaram um investimento total de 210.739,72€, dos quais 148.535,21€ foram co-financiados por programas comunitários. u) A actividade “Evoramonte – Castelo Vivo” referida em 24. dos factos provados realizou-se ao longo de 8 dias, sendo composta de exposições, conferências e espectáculos culturais. v) O trabalho desenvolvido pela L.A.C.E. é reconhecido pela Direcção da Associação Rede de Turismo de Aldeia do Alentejo.” A motivação da matéria de facto foi a que segue: “O Tribunal formou a sua convicção conjugando e entrecruzando os vários meios de prova, designadamente, a prova documental junta aos autos (designadamente, a carta de fls. 6 e 7, documentos de fls. 8 a 17, editorial do Jornal Ecos junto a fls. 35, certidão da acta da reunião ordinária de 24 de Fevereiro de 2010, junta a fls. 36 a 40 dos autos, Regulamento e Normas Especificas do PADA juntos, respectivamente, a fls. 41 a 44 e a fls. 45 a 51, ordem de pagamento de fls. 54 e recibo de fls. 57, o documento epigrafado “nota interna” de fls. 55 e 56, a informação datada de 30 de Maio de 2011, subscrita pelo arguido, junta a fls. 58 a 60, carta datada de 10 de Agosto de 2010, subscrita pelo arguido, junta a fls. 66 e a fls. 121 dos autos, carta datada de 20 de Agosto de 2010, subscrita pelo legal representante da assistente, junta a fls. 67 a 71, carta de documentação anexa junta a fls. 72 a 89, carta e documentação anexa de fls. 90 a 104, cartas datadas de 15 de Outubro de 2010, juntas a fls. 106 a 120, cartas de fls. 122 a 128, documentos de fls. 131, 132, 134, 135, 139, 141, 144 a 149, recibos de fls. 150 a 153, 154 a 156 e de fls. 158 a 169, Relatório da Inspecção-Geral da Administração Local, datado de 27 de Setembro de 2011, junto a fls. 191 a 210 dos autos, cópia dos Estatutos da assistente, junta a fls. 223 a 228, certidão da acta da reunião ordinária de 3 de Novembro de 2010, junta a fls. 237 e 238, documentos de fls. 290 a 303, de fls. 305 a 338, Regulamento do PADC junto a fls. 338 a 354, documentos de fls. 355 a 371, 372 a 374 e 377 e 402 a 409, documentos de fls. 374, 375 a 376, 378, 379 a 387, Certidão de fls. 388 a 394, documentos de fls. 395 a 401, 410 a 428, de fls. 615 e 616, de fls. 632 a 635, documentos de fls. 647 a 650, de fls. 651, 652 a 656, certidão da acta da reunião ordinária de fls. 657 a 659, documentos de fls. 666 a 704, documentos de fls. 720 e 722, de fls. 748 a 752, impressão da publicação em Diário da República de fls. 781 e 782, documentos de fls. 1124 a 1205, documentos de fls. 1218 a 1374, o Certificado de Registo Criminal de fls. 1386 e documento de fls. 1387) as declarações do arguido – na medida e na parte em que as mesmas se revelaram credíveis – as declarações do representante legal da assistente e os depoimentos daquelas testemunhas ouvidas em sede de audiência e julgamento que o Tribunal entendeu terem deposto de forma serena, séria e coerente e cujos depoimentos e declarações, por via disso, se afiguraram credíveis, nos moldes infra expostos. Todos os elementos de prova supra referidos foram apreciados à luz do disposto no artigo 127.º do Código de Processo Penal, ou seja, segundo as regras de experiência e a livre convicção do julgador, já que o julgador é livre de decidir segundo o bom senso e a experiência de vida, claro está, tendo em mente a capacidade crítica, o distanciamento e a ponderação que se impõem. Assim, a formação da convicção do Tribunal dependeu essencialmente de duas operações: de um lado a actividade cognitiva de filtragem de informações dadas e sua relevância ético-jurídica; de outro lado, elementos racionalmente não explicáveis – ou pelo menos de explicação menos linear – como a credibilidade que se concede a um certo de meio de prova em detrimento de outro, já que não é a quantidade de prova produzida que releva, mas antes a sua qualidade. Com efeito, desde logo, quando estejam em causa depoimentos ou declarações, deverá o Tribunal formular um juízo sobre a veracidade e autenticidade do declarado, o qual depende do contacto oral e directo com os declarantes e da forma como estes transmitem a sua versão dos factos – postura e comportamento, características de personalidade reveladas, carácter e probidade. De salientar ainda que a afirmação da prova de um certo facto representa sempre o resultado da formulação de um juízo humano e uma vez que jamais este pode basear-se na absoluta certeza, o sistema jurídico basta-se com a verificação de uma situação que, de acordo com a natureza dos factos e/ou dos meios de prova, permita ao Tribunal a formação da convicção assente em padrões de probabilidade, que permita afastar a situação de dúvida razoável, pelo que a existência de duas versões antagónicas dos factos trazidos para os autos não conduz necessariamente a um estado de incerteza. Neste conspecto, em causa estará sempre o princípio da livre apreciação da prova, sendo de aplicar o princípio fundamental do in dubio pro reo quando o Tribunal de forma racionalmente objectivável e motivável e, portanto capaz de convencer os outros, não tenha logrado convencer-se da verdade dos factos para além de toda a dúvida razoável. De referir ainda que, se via de regra um depoimento/declarações se revelará aos olhos do julgador totalmente credível ou não credível, a verdade é que tal nem sempre sucederá, desde logo quando a mesma pessoa, quanto a determinados factos, ocupe uma posição processual que a coloque num lugar de particular constrangimento (por exemplo por aquilo a que se refere contender com a sua própria responsabilidade criminal), sendo pois perfeitamente verosímil e lógico que haja necessidade de se cindir aquilo que é relatado, atentando no particular circunstancialismo que rodeia os concretos factos em causa. Sinteticamente, podemos dizer que foi deste conjunto de vectores e da essência deste processo – sempre complexo – de apreciação e valoração da prova que resultou ou não comprovada a factualidade descrita em sede de acusação pública. Concretizando, no que à prova dos factos vertidos em 1. a 9. e 15. concerne, importa atentar que o Tribunal louvou-se, desde logo, nas declarações do arguido, que confessou os factos em apreço. Ademais, para prova dos factos enunciados em 1. a 9. e 15. o Tribunal louvou-se, igualmente, de forma conjugada, nas declarações do legal representante da assistente, nos depoimentos claros e assertivos das testemunhas AA, JT, PA, JC, JP e AG, ouvidas em sede de audiência de julgamento e que, em maior ou menor medida, elucidaram o Tribunal quanto à criação e objectivos do PADA, bem como quanto à apresentação e aprovação das candidaturas no âmbito do mesmo projecto e quanto aos vários momentos de pagamento dos subsídios aprovados, e, bem assim, quanto às apresentações de candidatura por parte da LACE ao mencionado programa nos anos de 2007 a 2010, e ainda no que respeita ao pagamento da 1ª tranche e o não pagamento da 2ª tranche do subsidio atribuindo à assistente no ano de 2010. Ademais, ainda no que a estes factos respeita (factos vertidos em 1. a 9.), o Tribunal valorou, de forma entrecruzada e conjugada com as declarações do arguido, do legal representante da assistente e dos depoimentos das referidas testemunhas, o teor da prova documental junta aos autos, muito particularmente, o teor dos documentos de fls. 6 e 7, a certidão da acta da reunião ordinária de 24 de Fevereiro de 2010, junta a fls. 36 a 40 dos autos, o Regulamento e Normas Especificas do PADA, juntos, respectivamente, a fls. 41 a 44 e a fls. 45 a 51, a ordem de pagamento de fls. 54 e recibo de fls. 57, o documento epigrafado “nota interna” de fls. 55 e 56, os documentos de fls. 290 a 301, Certidão de fls. 388 a 394, cópia dos Estatutos da assistente junta a fls. 223 a 228 e da publicação em Diário da República, nº121, III série, de 25 de Maio de 2000, junta a fls. 781 e 782, bem como o documento de fls. 1387. Já no que respeita aos factos vertidos sob os números 10. a 14., importa, desde logo, notar que, não obstante reconhecer a existência e o teor da carta datada de 7 de Julho de 2010, transcrita em 10. dos factos provados, dirigida a Eduardo Basso enquanto Presidente da L.A.C.E. (carta cuja autoria o arguido espontaneamente assumiu), e reconhecer, também, as afirmações publicadas no jornal Ecos, do qual o legal representante da assistente é director, o arguido negou ter tomado a decisão unilateralmente e sem qualquer justificação de suspender a atribuição do subsidio em análise e ter, para o efeito, redigido a aludida carta. Com efeito, ouvido em declarações em sede de audiência de julgamento, o arguido afirmou, em suma, que o não pagamento à LACE do montante remanescente do subsídio atribuído à LACE no ano de 2010 se deveu à não entrega de documentação concernente ao subsídio atribuído à mesma no âmbito do PADA no ano de 2009 e à utilização indevida desse subsídio para fins distintos dos previstos na candidatura (fundamentos que, de acordo com o arguido, seriam do seu conhecimento à data aposta na carta), estando, pois, em causa, no entendimento do arguido, o incumprimento do Regulamento do PADA por parte da LACE, o que acarretaria, nos termos do mesmo Regulamento, uma suspensão automática dos pagamentos. Mais declarou o arguido que, ao redigir e remeter ao legal representante da assistente a carta em apreço nos autos, pretendia apenas manifestar a sua indignação perante o autor das afirmações no jornal “ECOS”, procurando contextualizar, de resto, a redacção da carta num ambiente político que era, então, de grande crispação. Do mesmo modo, no que respeita aos factos descritos em 11. a 14. o arguido afirmou não corresponderem os mesmos à verdade. Ora, para prova dos factos vertidos em 10. a 14., o Tribunal louvou-se, desde logo, no teor da carta datada de 7 de Junho de 2010, que assumiu importância indiscutível no processo valorativo de prova e formação da convicção do Tribunal. Com efeito, estamos perante uma carta redigida em papel timbrado da autarquia de … escrita e assinada pelo arguido na qualidade de Presidente da Câmara (que expressamente invoca) e que, atenta a sua clareza, não deixa margem para dúvidas quanto ao seu propósito: dar a conhecer à LACE não apenas a decisão do Presidente da Câmara de …., aqui arguido, de retirar todos os apoios concedidos pela autarquia (fazendo expressa menção à atribuição de subsídios), como também deixar claros os fundamentos de cariz exclusivamente pessoal que subjazem a tal decisão. De salientar que na carta que ora nos ocupa (que está longe de consubstanciar uma carta telegráfica) não foi feita qualquer menção, por mais ténue que fosse, à existência de quaisquer outros motivos para além dos que nela se mostram exarados. De notar que, contrariamente ao que parece ser o entendimento do arguido, não se trata de exigir ao arguido sumo rigor terminológico na redacção da carta, designadamente no maior ou menor grau de precisão no emprego de termos e conceitos dotados de relevância jurídica. Em causa está, na verdade, coisa bem distinta: por um lado, uma incompreensível alusão a questões que, de acordo com o arguido, seriam absolutamente alheias à decisão e, por outro lado, a total ausência das razões que, de acordo com a versão trazida pelo arguido, consubstanciariam os fundamentos da decisão aquando da comunicação desta. E nem se diga que da simples alusão ao termo “subsídios” se poderia deduzir a imputação à LACE do incumprimento das disposições Regulamentares do PADA que determinariam a suspensão imediata do subsídio atribuído, não tendo tal entendimento arrimo no texto da carta. Acrescente-se, ainda que, tendo presente o ambiente de crispação politica vivido em …. e, bem assim, a experiência política do arguido, não colhe a explicação de que a carta em apreço se tenha tratado tão-somente de uma manifestação de indignação, sem quaisquer consequências. Não se compreende, pois, que caso a decisão do arguido tivesse sido efectivamente motivada pelas razões que o mesmo disse existirem à data e que, segundo o próprio, seriam já do seu conhecimento, não tenha o mesmo feito qualquer alusão, mesmo que de forma genérica, a tais razões, particularmente se atentarmos nas largas linhas dispensadas à explanação dos fundamentos que expressamente invocou na carta em apreço nos autos. Deste modo, e fazendo apelo às mais elementares regras da experiência comum e das quais nunca nos podemos distanciar, não se mostra verosímil que o arguido (pessoa experiente nas lides politicas e da administração pública), dispondo de fundamentos que, segundo o próprio, teriam assento no próprio Regulamento do PADA, se abstivesse de os invocar, optando, antes por convocar razões de ordem exclusivamente pessoal. E nem se diga que a carta de 7 de Julho de 2010 não faz referência ao P.A.D.A, que, como está bom de ver, e como o próprio arguido assumiu de forma expressa e espontânea em sede de declarações, se mostra implicitamente contida no segmento “atribuição de subsídios” (nas palavras exactas do arguido: “eu quando falo nos subsídios, isto tem implícito os subsídios atribuídos pela Câmara. E os subsídios atribuídos pela Câmara à L.A.C.E. têm logicamente o PADA”). Diga-se, além do mais, que é atentatório das regras do normal suceder que o arguido não tenha feito referência aos fundamentos de que entendia dispor por considerar que ainda não poder “ser claro”, por o “processo” estar numa fase embrionária (estando nessa altura em fase de “pesquisa”) e tenha, simultaneamente, tomado a decisão em apreço nos autos estribada em fundamentos que, segundo o próprio, não poderia ainda invocar de forma expressa. Ademais, não pode o Tribunal olvidar que o primeiro ofício dirigido à L.A.C.E. a solicitar à assistente o envio de documentação “com o intuito de avaliar o grau de execução do Plano de Actividade (…) e os apoios recebidos no âmbito do PADA” apenas foi remetido a 10 de Agosto de 2010 e, portanto, volvido mais de um mês após a carta de 7 de Julho de 2010 (cfr. fls. 121). Por outro lado, não pode o Tribunal deixar de estranhar que o arguido não tenha feito referência à utilização indevida do subsídio atribuído à L.A.C.E. no âmbito do P.A.D.A. no ano de 2009, aquando do oferecimento da contestação (quer à acusação pública, quer ao pedido de indemnização civil), apenas o fazendo em sede de audiência de julgamento, particularmente se atentarmos a que, de acordo com as declarações do próprio arguido, esta teria sido a principal razão da suspensão do pagamento da 2ª e da 3ª prestações do subsidio atribuído à L.A.C.E. no âmbito do P.A.D.A relativo ao ano de 2010. Do mesmo modo, não se compreende que na informação remetida pelo arguido ao Inspector da IGAL a 30 de Maio de 2011, junta a fls. 59 a 60 dos autos (mais de 10 meses após a carta de 7 de Agosto de 2010), também não seja feita referência à utilização indevida do subsídio atribuído à L.A.C.E. no âmbito do P.A.D.A. no ano de 2009. De salientar, também, que a reacção da L.A.C.E. ao recebimento da carta enviada pelo arguido a 7 de Julho de 2010 (evidenciada quer na acta de 14 de Julho de 2010 quer na carta de 16 de Julho de 2010, juntas, respectivamente, a fls. 12 e a fls. 8 dos autos) é reveladora da clareza do teor da carta que ora nos ocupa – clareza, também, reconhecida por várias das testemunhas ouvidas em sede de audiência de julgamento, designadamente a testemunha DP. Na verdade, muitas outras provas apontam também, e conjuntamente, nesse sentido, como sucede, desde logo, com a informação prestada pelo próprio arguido ao Inspector da IGAL a 30 de Maio de 2011 (junta a fls. 58 a 60 dos autos) nos termos da qual o arguido esclareceu, entre o mais, o seguinte “no seguimento de várias afirmações do Presidente da Direcção da LACE, EB, em bloques pessoais e na comunicação social e inclusivamente em sites pagos pelo Município de Estremoz entendi que as mesmas colocavam em causa a idoneidade e a integridade da minha pessoa, bem como a boa imagem do Município de …. Por essa razão decidi informar o Presidente da Direcção da L.A.C.E. que até ao apuramento da verdade dos factos, seriam suspensos os apoios e subsídios àquela associação (nosso oficio 4351, de 07/07/2010) Acresce que, na sobredita informação de 30 de Maio de 2011 é feita referência à informação anteriormente prestada à IGAL através do Oficio com o nº 4760 de 30 de Julho de 2010. Ora, compulsado a Relatório da IGAL, datado de 27 de Setembro de 2011, pode ler-se, de forma impressiva, sob o título “ESCLARECIMENTOS PRESTADOS PELA CM ----”, no ponto 6, “Em resposta datada de 30.07.2010, e entrada na IGAL a 4.08.2010, o PC vem informar que: (…) determinei a suspensão da transferência de verbas para a Associação em causa, pelo tempo que se vier a revelar necessário, tendo em vista analisar a prestação de contas da referida Associação referente ao ano económico de 2009 (na vertente que comporta subsídios concedidos), bem como da documentação produzida pela entidade para aferir da sua aplicação nas finalidades contratualizadas” (sublinhados nossos). É, portanto, o próprio arguido que, em resposta à IGAL, atribui à carta em apreço o valor de decisão e comunicação da decisão que havia tomado. Na verdade, no que concerne ao teor do Relatório da IGAL datado de 27 de Setembro de 2011 (documento de que, não raras vezes, ao longo das suas declarações, o arguido se tentou socorrer para legitimar a sua actuação), e nos permite conhecer a percepção da IGAL quanto a esta matéria, pode ler-se, de forma impressiva o seguinte: “III. ANÁLISE DOS FACTOS 5. Assim, como decorre dos factos apurados, temos que, num primeiro momento, o Sr. PCM de Estremoz reage a uma notícia publicada em órgão de imprensa local, comunicando ao seu autor, Sr. EB, que por tal facto, a autarquia deixará de apoiar as iniciativas da LACE, incluindo a atribuição de subsídios, pelo facto de entender as declarações por aquele proferidas na imprensa, como sendo difamatórias (oficio 07.07.2010). 6. Ou seja, uma posição assumida pelo Sr. EB, na qualidade de editor do Jornal “Ecos”, leva a que o Sr. PCM de …. faça repercutir na associação que aquele outro dirige, a LACE, a intenção de, por esse facto, deixar de apoiar a mesma, incluindo na atribuição de subsídios. (…)”. Verifica-se, pois, que, contrariamente ao entendimento defendido pelo arguido e, bem assim, pela testemunha por este arrolada FR, o Relatório da IGAL não se trata de um documento “elogioso” (expressão utilizada por FR), não consubstanciando, pois, qualquer chancela à conduta do arguido, antes concluindo pela “Recomendação” de que, “no exercício de funções públicas [o arguido] deverá ter sempre presente os principais jurídicos norteadores de toda a actividade administrativa, designadamente os previstos nos artigos 5º e 6º do CPA, devendo as questões pessoas, que considere atentatórias da sua honra ou consideração, ser dirimidas nas instâncias competentes para o efeito”. É certo que o Relatório da IGAL dá conta da subsistência de uma “questão objectiva de incumprimento” por parte da L.A.C.E., contudo, como resulta à saciedade de toda a prova produzida nos autos, os fundamentos que estiveram subjacentes à decisão tomada pelo arguido foram única e exclusivamente os motivos elencados na carta de 7 de Julho de 2010 e não num eventual incumprimento do Regulamento do PADA detectado pelo arguido a posteriori, e de que se dá nota no Relatório em análise. Com efeito, não obstante afirmar que, por volta do mês de Maio de 2010, ter-se-ia verificado que havia documentação em falta, mormente no que respeitava à deslocação da LACE à Holanda, a testemunha JT, (Vereador do Pelouro da Cultura à data dos factos) acabou por assumir que “[o] Sr. Presidente quando manda aquele ofício, adiantou-se, de certo modo, a uma determinação que acabaria forçosamente por ser feita”.Questionado pelo Ministério Público, JT afirmou, de forma peremptória, ter sido o arguido quem tomou a decisão de suspender o pagamento à LACE, ainda que, no entendimento desta testemunha, à data da carta de 7 de Julho de 2010, já existissem elementos que justificassem a suspensão, não estando, porém, certo de que o arguido soubesse à data da carta da existência de tais fundamentos. De onde se conclui que, ainda que as alegadas irregularidades pudessem existir, a verdade é que não foram elas que determinaram a conduta do arguido, mas apenas e tão só os motivos expressamente elencados pelo mesmo na carta transcrita em 10. dos factos provados. De salientar que o depoimento da testemunha FR, Vice-presidente da Câmara Municipal de …, em nada abala tudo quanto supra se deixou dito. Na verdade, se é certo que FR iniciou o seu depoimento relatando os factos de modo similar ao que havia sido feito pelo arguido, apresentando-se com um discurso aparentemente fluente, também é certo que, ao longo do seu depoimento, esta testemunha evidenciou a fragilidade do seu relato. Com efeito, não se afigura crível que alguém que acaba por assumir não ter tido contacto directo com o processo administrativo da LACE, apenas dizendo saber aquilo que lhe havia sido transmitido (muito concretamente, que a LACE tinha recusado entregar documentação) e que, assumidamente, não é capaz de responder, quando questionado pelo Ministério Público, sobre quem tomou a decisão de suspender o pagamento à LACE, tenha presente, volvidos mais de seis anos, a data concreta (o mês de Maio de 2010) em que teria ocorrido uma reunião entre a testemunha, o arguido, o vereador JT, a Vereadora SD e o Chefe de Gabinete e em que teria sido abordado (de forma genérica e, aparentemente sem qualquer suporte documental) que a LACE não teria realizado uma das actividades. Note-se, que o depoimento de FR não se mostra suportado pelo depoimento de SD que não fez qualquer referência à existência de uma reunião em que teria sido genericamente abordada a não realização de uma actividade por parte da LACE, limitando-se a afirmar que o Vice-presidente a alertou de forma genérica para que esta verificasse a situação das associações, designadamente das associações desportivas. Do mesmo modo, a testemunha JT não fez tampouco qualquer referência à existência da reunião relatada por FR, antes esclarecendo não ser capaz de afirmar que a 7 de Julho de 2010 o arguido soubesse da invocada falta de documentação. Desta forma, considerando o que se acaba de expor, e atendendo ao supra exarado quanto à demais prova produzida nos autos, a testemunha FR não mereceu a credibilidade do Tribunal, não logrando, por isso, convencer o Tribunal. Diga-se ainda a propósito que a versão segundo a qual, em Maio de 2010, o arguido e outros membros do executivo camarário, já teriam elementos que permitiam concluir pela existência das alegadas irregularidades por parte da L.A.C.E, não se mostra compatível com o pagamento à Assistente do montante de 3.500,00€ no dia 12 de Maio de 2010 (cfr. fls. 656). Com efeito, e ainda que destinada ao 3º encontro da Rede Europeia Sítios da Paz, trata-se de um pagamento de uma quantia considerável (particularmente se atentarmos que o subsídio global atribuído à L.A.C.E. para o ano de 2010 se cifrava em quantia pouco superior – 3.765,00€) feita directamente à L.A.C.E.. Ora, se já havia suspeitas da prática de irregularidades por parte da L.A.C.E., mormente quanto à utilização indevida de dinheiro público, como compreender que em reunião ordinária da Câmara Municipal de … de 5 de Maio de 2010 (cfr. fls. 419 e 420 dos autos), a Câmara tenha aprovado por unanimidade a proposta feita pelo Vereador JT de atribuição à L.A.C.E. da quantia de 3.500,00€, nos exactos termos solicitados pela mesma? Não pode, de resto, o Tribunal deixar de salientar que da prova produzida em audiência de julgamento resultou clara a existência de conflitos de ordem pessoal e política entre o arguido e o legal representante da assistente, sendo manifesta a forma diferenciada e pessoalizada com que o arguido conduziu o processo administrativo da L.A.C.E, avocando-o e dando-lhe tratamento especial, como, de resto, nos deu conta a testemunha PA. Com efeito, tal como esclareceu a testemunha JP, Presidente da Câmara Municipal… entre 2005 a 2009, não obstante ser uma faculdade que assiste ao Presidente da Câmara, a avocação de processos é pouco usual. De referir, ainda, que da documentação junta pelo arguido e pela Câmara Municipal de … em sede de audiência de julgamento (cfr. fls. 1226 a 1227 e fls. 1218 a 1374) decorre tão-somente que, como já havia sido referido pela testemunha AG, coordenador da contabilidade e chefe de secção desde 1997, bem como outras testemunhas ouvidas quanto a esta matéria, os pagamentos das prestações do P.A.D.A. não eram feitos de forma atempada (de referir, a título exemplificativo, que a 2ª prestação foi paga a “ARCA – Associação Recreativa e Cultural de Arcos, à “Sociedade Columbófila Rainha Santa” e à “Sociedade Recreativa Popular Estremocense, respectivamente, a 9 de Julho de 2010, a 22 de Julho de 2010 e a 3 de Dezembro de 2010), sendo possível verificar-se, igualmente, que as Associações beneficiárias do P.A.D.A. não recebiam o pagamento das prestações na mesma data. Importa referir, ainda no que concerne aos factos vertidos em 10. a 14. dos factos provados, e muito particularmente no que respeita ao elemento do tipo subjectivo de ilícito, que os elementos subjectivos do crime pertencem à vida íntima e interior do agente, sendo, contudo, possível captar a sua existência através e mediante a factualidade material que os possa inferir ou permitir divisar, ainda que por meio de presunções ligadas ao princípio da normalidade ou às regras da experiência comum (cfr., neste sentido, Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de Outubro de 2009, disponível in www.dgsi.pt). Na verdade, e fazendo apelo à praxis dos Tribunais, verificamos que “os actos interiores” que respeitam à vida psíquica, a maior parte das vezes não se provam directamente, mas por ilação de indícios ou factos exteriores (vide, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, página 101, apud Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21 de Outubro de 2009 supra mencionado) Deste modo, e no que aos factos integradores do elemento subjectivo de ilícito concerne, o Tribunal louvou-se na factualidade objectiva dada como provada, conjugada com as regras de experiência comum. Os factos externos e visíveis permitem concluir, sem margem para qualquer dúvida, pela demonstração de uma “intenção de prejudicar” a assistente por parte do arguido, retirando-lhe, por razões de ordem pessoal, um apoio concedido pelo Município e que, como resulta do texto da própria carta, sabia contribuir para a sobrevivência da L.A.C.E. enquanto Associação. Coligidas as provas produzidas em sede de audiência e julgamento – mormente o teor da carta de 7 de Julho de 2010, as declarações do legal representante da assistente, bem como os depoimentos claros e assertivos das testemunhas JR, PA e AR (testemunha que, para além do mais, de forma espontânea teceu considerações quanto à personalidade do arguido que, no seu entendimento, é compatível com actuação do arguido no episódio de vida em apreciação em apreço no caso dos autos) e que corroboram o valor da carta – e analisadas as mesmas à luz das regras da experiência comum, podemos concluir, com segurança, pela actuação nos termos descritos em 12., 13. e 14. dos factos provado, revelando o conjunto das provas produzidas em julgamento, de forma inequívoca, a “vontade do arguido em retirar os apoios à LACE, com o propósito de a prejudicar.”. No que respeita, por seu turno, aos factos vertidos em 16., o Tribunal louvou-se no teor da acta da reunião de Câmara Municipal de… de 17 de Novembro de 2010, junta a fls. 316 e 317 dos autos. Já no que respeita aos factos enunciados em 17. a 21., o Tribunal louvou-se no teor dos documentos juntos a fls. 305 a 309, a fls. 310 e 311 e a fls. 312 e 313, bem como nos documentos de fls. 90 a 104, de fls. 316 e 317, de fls. 320 e 321, de fls. 322 a 334 e de fls. 335 a 337, e no teor do Regulamento do P.A.D.C. junto a fls. 338 a 354 analisados de forma conjugada com as declarações do legal representante da assistente e com os depoimentos das testemunhas PA e JT. No que tange, por outra banda, aos factos vertidos em 22. a 36. o Tribunal louvou-se, desde logo, no depoimento espontâneo e esclarecedor de MR (Técnica de Turismo), conjugado com as declarações de EB, legal representante da Assistente, e com os depoimentos escorreitos das testemunhas António AA (membro da direcção da L.A.C.E. desde a sua constituição até à presente data), AP (Técnica Superior da Direcção Regional da Cultura do Alentejo), PA, AD e MB, ambas habitantes em Évoramonte, BO (Presidente da Junta de Freguesia de Évoramonte entre 2005 a 2013), em conjugação com o documento de fls. 418 dos autos, AR, JR, bem como da testemunha DP – testemunhas que, em maior ou menor medida, mercê do exercício da sua actividade profissional e ou política, ou do contacto mais próximo com a L.A.C.E. e com as suas actividades, relataram ao Tribunal, de forma circunstanciada, as actividades realizadas pela assistente e que, mercê da falta de fundos, deixaram de ser desenvolvidas, dando nota, também, dos frutos do trabalho desenvolvido pela L.A.C.E, e, bem assim, do prestígio de que a assistente gozava na região e no âmbito da Rede Europeia de Sítios da Paz, relatando, ainda, a forma como a imagem, reputação e a credibilidade da L.A.C.E. foram afectadas em consequência directa e necessária da não realização das actividades, perante os agentes económicos e culturais e perante a população da freguesia e da região que se afastou da L.A.C.E. Para prova aos factos enunciados em 22. a 36. o Tribunal considerou, ainda, a diversa prova documental junta aos autos, muito particularmente os documentos juntos a fls. 355, 356 a 358, 359 a 362, 363 e 364, 365 e 366, 367, 368, 369, 370, 371, 372, 373, 374, 375 e 376, 377, 378, 379, 380, 381, 382 a 383, 384 a 385, 386 a 387, bem como a certidão da Escritura da constituição da Associação European Network of Places of Peace e respectivos Estatutos, juntos a fls. 388 a 394, e, bem assim, o teor dos documentos de fls. 402 a 409, de fls. 414 a 417, 418, acta de fls. 419 a 420. No que respeita à ausência de antecedentes criminais do arguido (cfr. factos vertidos em 37.), o Tribunal atendeu ao Certificado de Registo Criminal do arguido, junto aos autos a fls. 1386; sendo que, quanto à situação pessoal e económica (cfr. factos enunciados sob o número 38.) relevaram as declarações do arguido que, porque feitas de forma espontânea e coerente no que a esta matéria concerne, se afiguraram credíveis. Relativamente aos factos não provados, não foi produzida em audiência de julgamento qualquer prova que permitisse dar como provados outros factos para lá dos que nessa qualidade se descreveram, desde logo por nenhum dos ouvidos ter revelado conhecimento ou por o conhecimento revelado se ter limitado ao que resultou provado ou ainda de o descrito ter sido contraditado pela prova produzida; não resultando distinto resultado probatório dos demais elementos juntos aos autos. Vejamos. No que concerne aos factos constantes das alíneas a) e b), os mesmos resultaram não provados na medida em que, como supra explanado em sede de motivação da prova dos factos vertidos em 10. a 14. dos factos provados – e que, brevitatis causa, aqui se dá por integralmente reproduzida, para todos os efeitos – a versão trazida aos autos pelo arguido e consubstanciada nos factos em apreço foi contraditada pela prova produzida. No que respeita, por seu turno, aos factos enunciados nas alíneas c) a g), importa notar que, considerando a globalidade da prova produzida nos autos verifica-se que, em momento posterior à carta de 7 de Julho de 2010 (e que, como resulta do exposto supra, não esteve na génese da decisão em apreço nos autos), foi solicitada à L.A.C.E a entrega de documentação que, como resulta da matéria de facto provada, apenas foi entregue pela Assistente por carta datada de 18 de Março de 2011 e entrada nos Serviços da Câmara Municipal de …. a 21 de Março de 2011 (tendo a L.A.C.E, num primeiro momento, recusado entregar parte da documentação) e, portanto, já após a rejeição da candidatura ao P.A.D.A. relativa ao ano de 2011, com fundamento na falta de documentação. Na verdade, compulsada a acta da reunião ordinária da Câmara Municipal de … de 2 de Fevereiro de 2011 (cfr. fls. 310 e 311), verifica-se ter sido expressamente invocado aquando da apresentação da proposta pelo Vereador JT que a “Liga dos Amigos do Castelo de Évoramonte: a entidade possui documentação em falta, pelo que, até ser regularizada a situação, não será atribuído qualquer subsídio.” De notar também, e tendo presente o teor do artigo 2º, nº1, do Regulamento do P.A.D.A., e não o obstante a documentação entregue pela L.A.C.E em Março de 2011, não resulta que a assistente tenha dado cumprimento integral à entrega de documentos solicitada, já que tendo remetido, entre o mais, cópia autenticada da acta da Assembleia Geral da Aprovação das Contas de Gerência (3ª via), não remeteu o Relatório propriamente dito. Do mesmo modo, no que respeita à candidatura apresentada pela L.A.C.E ao P.A.D.C. de 2012, não obstante resultar do teor do documento de fls. 322 a 334 conjugado com o depoimento de PA (que, de forma espontânea e assertiva reconheceu a rubrica aposta a fls. 322 como sendo sua), o certo é que da análise conjugada do teor das actas de 18 de Abril e de 16 de Maio de 2012, verifica-se que a não submissão da candidatura a apreciação em reunião de Câmara foi, então, fundamentada na ausência de requisitos necessários à respectiva apreciação. Acresce que, não pode o Tribunal olvidar que a utilização de parte do subsídio atribuído à L.A.C.E no âmbito do P.A.D.A do ano de 2009 que se destinava à realização da actividade “Évoramonte – Castelo Vivo” para a deslocação da delegação da L.A.C.E. à 2ª Reunião Europeia que se realizou em Wageningen, na Holanda, no mês de Outubro de 2009, no âmbito da Rede Europeia dos Sitos da Paz (circunstâncias suscitada em momento posterior à carta de 7 de Julho de 2010 e que, como resulta do exposto supra, não esteve na génese da decisão em apreço nos autos) não se mostra autorizada quer verbal, quer oralmente. Com efeito, ouvida a testemunha JP (Presidente da Câmara Municipal …nos anos de 2005 a 2009) pelo mesmo foi dito que, aquando da reunião realizada com o legal representante da L.A.C.E e MR, apenas foi verificado junto do departamento da contabilidade que a L.A.C.E. estaria em condições de receber a última prestação referente do P.A.D.A. do ano de 2009. Na verdade, JP afirmou, de forma peremptória, não ter autorizado (quer pela forma escrita, quer pela forma oral) a utilização da prestação atribuída à L.A.C.E. no âmbito do P.A.D.A. para a deslocação a Wageningen (deslocação expressamente assumida pelo legal representante da assistente e que consta igualmente do Relatório Final junto a fls. 699 a 703) Neste conspecto, resultaram, assim, como não provados os factos enunciados nas alíneas c) a g), respeitantes às candidaturas relativas aos anos de 2011 e 2012. Já no que respeita aos factos constantes das alíneas i) a l), importa notar que atenta a exiguidade da prova produzida quanto a tais factos, resultaram os mesmos como não provados. Com efeito, considerando que o documento de fls. 421 consubstancia uma publicação da autoria da própria assistente, atendendo o documento de fls. 422 mais não é do que uma noticia publicada no Jornal “O Público”, que não permite perceber se o arguido foi ouvido aquando da elaboração do artigo jornalístico, e tendo em consideração que nada se retira dos e-mails juntos a fls. 422-A, 422-B e 423 e que os documentos de fls. 424 a 426 serão da Autoria de Ludger Van Der Erden, que, aparentemente não terá sido arrolado como testemunha pela Demandante, por indisponibilidade do mesmo para o efeito, e tendo presente, ainda, que o legal representante da assistente revelou não ter conhecimento directo dos factos em apreço e à mingua de outros elementos, resultaram tais factos como não provados. No que respeita, por seu turno, aos factos vertidos nas alíneas h), m) a v), não foi produzida qualquer prova. De referir, por fim, que a testemunha RN (arrolada pela defesa), revelou não ter conhecimento quanto a qualquer dos factos em apreço nos autos.” 3. Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente, sem prejuízo do conhecimento oficioso dos vícios do art. 410º, nº 2 do CPP (AFJ de 19.10.95), as questões a apreciar são as seguintes: (a) a contradição insanável da fundamentação (art. 410.º, n.º 2, a. b), do CPP), (b) o erro na decisão da matéria de facto, (c) a inconstitucionalidade do art. 29.º, al. f) da Lei n.º 34/87 e (d) o erro na decisão de direito relativa à matéria cível. (a) Da contradição insanável da fundamentação (art. 410.º, n.º 2, a. b), do CPP) O recorrente invoca o vício previsto no art. 431.º, al. a), do CPP argumentando que a decisão recorrida é “insanavelmente contraditória na respetiva fundamentação” e que a sanação do vício deverá passar pela modificação da sentença “no sentido de passar a darem-se como não provados os factos 11 a 14 julgados provados, absolvendo-se em consequência o arguido”. A contradição residiria em o Tribunal ter considerado demonstrado que “única e exclusivamente motivado pelo desagrado com as afirmações publicadas no jornal Ecos e da autoria do presidente da LACE, o Recorrente determinou o não pagamento das 2.ª e 3.ª prestações do subsídio e apoios concedidos pela autarquia de … àquela associação” e que “a 2.ª das prestações a atribuir à LACE haveria de ter sido paga em junho de 2010 e, efectivamente, não foi”. Sempre na argumentação do recorrente, “sob pena de contradição lógica e insanável, as afirmações publicadas no jornal Ecos e da autoria do presidente da LACE teriam de ser anteriores ao não pagamento da primeira das prestações não pagas, isto é, anteriores a Junho de 2010”, o que não se verificaria pois as afirmações publicadas no jornal Ecos e da autoria do presidente da LACE são datadas de 1 de Julho de 2010”. A contradição insanável da fundamentação é um vício da sentença que ocorre quando a fundamentação desta aponta no sentido de decisão oposta à tomada, ou no sentido da colisão entre os fundamentos invocados. É uma “incompatibilidade, não ultrapassável através da própria decisão recorrida, entre os factos provados, entre estes e os não provados ou entre a decisão probatória e a decisão. Ou seja, há contradição insanável da fundamentação quando, fazendo um raciocínio lógico, for de concluir que a fundamentação leva precisamente a uma decisão contrária àquela que foi tomada ou quando, de harmonia com o mesmo raciocínio, se concluir que a decisão não é esclarecedora, face à colisão entre os fundamentos invocados; há contradição entre os fundamentos e a decisão quando haja oposição entre o que ficou provado e o que é referido como fundamento da decisão tomada; e há contradição entre os factos quando os factos provados e os não provados se contradigam entre si ou por forma a excluírem-se mutuamente” (Simas Santos, Recursos em Processo Penal, 2007, p. 71). No caso presente, da leitura estrita e descontextualizada da sequência de datas elencadas pelo recorrente poderia resultar efectivamente a existência de uma contradição. E note-se que essas datas estão correctas, pois duas delas integram factos provados que não são impugnados em recurso e a terceira resulta da linearidade do documento especificado pelo recorrente e mencionado nos factos provados e também não posto em causa no recurso. A contradição existiria no sentido de uma colisão entre factos provados, já que a publicação no jornal “Ecos” ocorreu em data posterior à da atribuição da 2ª prestação, a primeira cujo pagamento foi suspenso por determinação do arguido, e não se pode agir influenciado por algo que ainda não sucedeu. Mas esta contradição é aparente e surge como mero resultado de um alinhamento apressado e descontextualizado das datas em causa. Na verdade, consta da matéria de facto provada que “ficou estabelecido o pagamento do referido subsídio em 3 (três) prestações, a primeira no valor de 1.882,50€, a ser paga em Março de 2010, a 2ª prestação no valor de €941,25 a ser paga no mês de Junho de 2010 e a 3ª prestação no valor de €941,25 a ser paga no mês de Outubro de 2010”, que “do montante total do referido subsídio atribuído foi pago, em 6 de Março de 2010, metade do seu valor total” e que “e m Junho de 2010, a Câmara Municipal … deveria ter efectuado o pagamento relativo à 2ª tranche do subsídio concedido, no valor de 941,25€, o que não o fez”. Assim, dos factos provados resulta que, de acordo com a calendarização do pagamento das prestações em causa, o pagamento da 2ª prestação deveria ocorrer, ter ocorrido, ou ocorreria em princípio, em Junho de 2010. Tratava-se de uma prestação “a ser paga no mês de Junho de 2010”, como se enuncia na matéria de facto provada. Mas dizer-se que em princípio devia ser paga não significa que o tivesse sido, não impede nem exclui a possibilidade de atrasos (e está concretamente em causa um atraso de apenas escassos dias). Apresenta-se assim perfeitamente compatível com o desenrolar dos acontecimentos que o arguido, tendo tido conhecimento da notícia publicada a 01 de Julho, e não se mostrando ainda entregue a 2ª prestação, tenha decidido então suspender essa entrega. Inexiste uma colisão entre os factos provados, no sentido de se estar a afirmar algo que não poderia ter acontecido ou de se estar a afirmar simultaneamente algo e o seu contrário. Referiu o recorrente que “se apenas a 1 de julho de 2010 é que aquelas afirmações foram publicadas (e isso resulta evidente de fls. 35 dos autos) como poderia em junho de 2010 – isto é, em momento anterior –, e movido pelo “desagrado” com afirmações que ainda não haviam sido proferidas, o arguido determinar a suspensão dos apoios à LACE?” Mas não é o que consta da matéria de facto da sentença. Não consta dos factos provados que o arguido determinou em Junho a suspensão dos apoios, consta sim que determinou em Julho a suspensão das prestações ainda não entregues: a de Junho (a que devia ter sido paga em Junho mas ainda não o fora existindo um ligeiro atraso) e a de Outubro. Em suma, inexiste o apontado vício da sentença, não ocorrendo a contradição nos fundamentos. Consequentemente, fica prejudicada a renovação de prova também requerida pelo arguido (art. 430º, nº 1, do CPP a contrario). (b) Do erro na decisão da matéria de facto Agindo ao abrigo do disposto no art. 412º, nºs 3 e 4 do CPP, o recorrente impugna a decisão proferida sobre a matéria de facto considerando que não se provaram os factos descritos nos pontos 11 a 14 de factos provados e que se provaram os constantes da al. b) dos factos não provados. Requer a alteração da matéria de facto em conformidade, e peticiona a absolvição. Os factos que no entender do arguido foram indevidamente dados como provados são os seguintes: - “Nesse contexto e única e exclusivamente pelos motivos elencados na carta transcrita em 10., o arguido, na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de … e representante desta não efetuou o pagamento da 2ª e da 3ª prestações relativas ao P.A.D.A. a favor da L.A.C.E. e cortou totalmente todos os apoio logísticos habitualmente fornecidos, nomeadamente montagens de palcos e cedência de equipamentos”; - “O arguido agiu bem sabendo da ilegalidade da sua atuação descrita em 7. a 11., ou seja, do facto de estar a tomar uma decisão unilateral, sem qualquer justificação, desprovida de cobertura legal e, por isso, contra direito”; - “Não obstante, atuou no âmbito das suas funções de titular de cargo político, ou seja, de Presidente da Câmara Municipal de …, e fê-lo com o propósito alcançado de prejudicar a associação L.A.C.E., porquanto a mesma tinha como presidente a Direção EB, o que quis”; - “O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei”. O facto indevidamente considerado não provado, sempre na visão do arguido, é o seguinte: - “O não pagamento da 2ª e 3ª prestações relativas ao P.A.D.A. atribuído a favor da L.A.C.E. para o ano de 2010 e o corte de apoios logísticos habitualmente fornecidos pela Câmara Municipal de …., nomeadamente montagens de palcos e cedência de equipamentos deveu-se à circunstância de a L.A.C.E. ter utilizado uma das prestações do subsídio atribuído no âmbito do P.A.D.A. de 2009 para fim diverso do previsto no plano de atividades apresentado na respetiva candidatura”. O recorrente especifica como concretas provas excertos de depoimentos das testemunhas JT, DP, FR e SD, asseverando que destes excertos resultaria uma decisão da matéria de facto diversa da tomada na sentença. Mostram-se cumpridos os ónus legais de impugnação da matéria de facto por via do recurso amplo, o que significa que o recurso é de conhecer. Mas daí não decorre que seja de proceder. Começa por lembrar-se que o recurso da matéria de facto visa a reparação de erros de facto e, como se tem afirmado sem dissensão na jurisprudência e na doutrina, não é um segundo julgamento. Não interessa (porque não releva) vir requerer a reapreciação de provas em segunda instância se essa reapreciação, do modo como é requerida, exorbita os efectivos poderes de cognição da Relação em matéria de facto. No presente caso, o recorrente pretende reiterar (e reitera) a posição que defendeu em julgamento e não obteve ali vencimento, pretendendo consegui-lo aqui. Mas a Relação não pode nunca proceder a uma reapreciação de provas na mesma medida em que o fez o juiz de julgamento - o que sucede porque a segunda instância não se encontra na mesma posição perante as provas, faltando-lhe a imediação com a prova oral e a possibilidade de interagir com a prova pessoal, e também porque o objecto do recurso é a sentença e o objecto da sentença é a acusação - havendo que aceitar a ocorrência de uma impressão causada no julgador de primeira instância pelo prestador da prova oral, que só a imediação possibilita ao nível mais elevado. Tem de aceitar-se, pois, que no modelo de recurso do Código de Processo Penal e em interpretação conforme à Constituição, existirá sempre uma margem de insindicabilidade da decisão do juiz de primeira instância sobre a matéria de facto. E se a convicção se encontra devidamente fundamentada e explicada, de acordo com as regras legais e os princípios de prova, e se assentou nas provas efectivamente produzidas em julgamento, decorrendo delas, não é identificável um erro de julgamento cognoscível em recurso, mesmo pela via do recurso amplo em matéria de facto. A linha de argumentação do recorrente desenvolve-se numa vertente abstractamente pertinente, pois defende que as testemunhas que identifica no recurso não terão dito exatamente aquilo que o Tribunal terá ouvido (ou que refere ter ouvido, na sentença). E procura demonstrá-lo cotejando os excertos de depoimentos que especifica com os excertos do exame crítico da prova correspondentes. Mas este esforço não permite a detecção de um erro de julgamento. Na verdade, procedendo-se à sindicância da “sentença de facto” (consistente nos factos provados, nos não provados e no exame crítico das provas), no confronto das razões da discordância apresentada pelo recorrente, sustentado nas concretas provas que suportam a sua argumentação, é de concluir que a totalidade da prova, ou as provas na sua globalidade, permitem chegar às conclusões a que o Tribunal de julgamento chegou. Melhor dizendo, não se vislumbra nenhum fundamento para que o Tribunal a quo devesse ter permanecido na dúvida relativamente a todos os factos que considerou como provados, bem como devesse ter considerado como demonstrado o facto não provado. É absolutamente inexacta a afirmação do recorrente de que “analisando de forma paradoxal e absolutamente contraditória a prova documental existente nos autos, concatenando isso com a afirmação do oposto do que a prova testemunhal efetivamente sustenta, o Tribunal a quo” tenha dado como “provados factos sem que a prova produzida permitisse esse juízo”. Consigna-se, sim, a correcção e exaustão do exame das provas, apresentando-se a fundamentação da matéria de facto como um exemplo de como bem motivar. As provas produzidas em julgamento (e os excertos especificados em recurso não o alteram) apontam impressivamente no sentido do decidido: no sentido de que o arguido agiu individualmente, por sua iniciativa, agastado com as declarações proferidas contra si pelo representante da assistente, e actuou com a intenção de por isso a prejudicar. Foi este motivo pessoal o determinante da decisão (individual) de suspensão do pagamento de um subsídio que a Câmara Municipal atribuíra à assistente. Foi o arguido que o afirmou na carta que enviou à assistente e cuja autoria assumiu em julgamento, e que depois concretizou ordenando pessoalmente a suspensão do pagamento do subsídio em causa. Conforme consta dos factos provados da sentença, que não estão impugnados em recurso, o arguido, na qualidade de presidente da Câmara, redigiu assinou e dirigiu ao presidente da LACE a carta com os dizeres seguintes: “Na sequência das recentes afirmações que V. Exa. tornou públicas, enquanto Director do Jornal Ecos, relativas ao abandono do Sistema “Águas do Alentejo” pelo Município de …, e considerando: Que tais afirmações colocam em causa a idoneidade da minha pessoa, quer enquanto Presidente da Câmara, quer enquanto cidadão; Que V. Exa. é Presidente da Direcção da LACE e que, enquanto Presidente da Câmara Municipal de …, me reservo ao direito de não dissociar esse cargo dos restantes cargos que desempenha e, consequentemente, das posições que tem tomado relativamente à minha pessoa. Serve a presente para informar V. Exa. que esta autarquia deixará de apoiar as iniciativas da Liga dos Amigos do Castelo de Evoramonte, incluindo a atribuição de subsídios, enquanto se mantiver o comportamento que o seu Presidente da Direcção tem vindo a manter em relação ao Município de … e às pessoas que o dirigem e que foram eleitas, para o efeito, pela maioria dos …. Não posso admitir que sejam usados dinheiros públicos para subsidiar uma instituição que é dirigida por um Presidente que adopta uma postura de constante difamação da figura do principal responsável pela gestão da entidade que, quer através de apoio financeiro, quer logístico, tem contribuído para a sua sobrevivência, enquanto associação. (…) Jamais permitirei que sejam efectuadas insinuações difamatórias acerca da minha pessoa, em especial por quem, como é do conhecimento geral, nem sempre teve a mesma atitude durante a vida”. E ficou igualmente provado (sem impugnação também) que o pagamento do subsídio em causa foi suspenso. E foi-o por decisão do arguido que quis desse modo prejudicar, causar prejuízo à assistente. Se depois foi procurada a obtenção e a formalização de uma outra justificação (justificação eventualmente “mais legal”) para a suspensão do subsídio já ocorrida, trata-se de factualidade já posterior à prática do crime e à sua consumação. A suspensão fora ordenada e concretizada, pelos referidos motivos e com aqueles fundamento e intenção, não relevando para a tipicidade o que se passou depois. Convém atentar também no excerto da resposta do Ministério Público, que se passa a transcrever dada a pertinência: “O Tribunal a quo formou a sua convicção principalmente na prova resultante da carta de 7 de julho de 2010, eloquente por si própria, como já se viu acima, e cuja clareza de conteúdo é confirmada pela testemunha DP, não tendo dúvidas quanto a este conteúdo (leia-se, quanto aos fundamentos invocados nela), apenas não podendo afirmar se a carta consubstancia a decisão ou apenas comunicação desta. Mas também assenta na “informação prestada pelo próprio arguido ao Inspector da IGAL a 30 de Maio de 2011 (junta a fls. 58 a 60 dos autos) nos termos da qual o arguido esclareceu, entre o mais, o seguinte "no seguimento de várias afirmações do Presidente da Direcção da LACE EB, em bloques pessoais e na comunicação social e inclusivamente em sites pagos pelo Município de … entendi que as mesmas colocavam em causa a idoneidade e a integridade da minha pessoa, bem como a boa imagem do Município de.... Por essa razão decidi informar o Presidente da Direcção da LACE, que até ao apuramento da verdade dos factos, seriam suspensos os apoios e subsídios àquela associação (nosso oficio 4351, de 07/07/2010)”, bem como no próprio relatório da IGAL de 27 de Setembro de 2011, onde se diz "III. ANÁLISE DOS FACTOS 5. Assim, como decorre dos factos apurados, temos que, num primeiro momento, o Sr. PCM de … reage a uma notícia publicada em órgão de imprensa local, comunicando ao seu autor, Sr. EB, que por tal facto, a autarquia deixará de apoiar as iniciativas da LACE, incluindo a atribuição de subsídios, pelo facto de entender as declarações por aquele proferidas na imprensa, como sendo difamatórias (oficio 07.07.2010). 6. Ou seja, uma posição assumida pelo Sr. EB, na qualidade de editor do Jornal "Ecos", leva a que o Sr. PCM de … faça repercutir na associação que aquele outro dirige, a LACE, a intenção de, por esse facto, deixar de apoiar a mesma, incluindo na atribuição de subsídios (...)". A carta escrita e enviada pelo arguido revela e dá a conhecer do modo mais evidente possível a intenção do seu autor, que era a de retirar, por razões pessoais, um apoio concedido pelo Município à assistente. A carta destina-se a comunicar essa intenção do arguido ao Presidente da Direcção daquela associação. E nessa carta não se alude a qualquer outra razão diferente para assim proceder, razão de natureza jurídica ou de incumprimento de regras por parte da assistente. Refere o recorrente que “a testemunha DP confirmou, precisamente, que essa carta é tudo menos clara. Efetivamente, quando perguntado se “diria que aquela carta, no sentido em que a leu, representa a decisão definitiva sem qualquer outro desenvolvimento, ou seja, aquela decisão é, em si mesmo, uma decisão, tal como nos disse, absolutamente definitiva?”, O que esta testemunha depôs em Tribunal foi que a mesma carta “tem a aparência de ser definitiva, tem. Mas eu não posso, daquela carta, apenas concluir se ela é o ato definitivo que cancela o subsídio, ou se é apenas uma comunicação ao destinatário de que isso vai ser feito, ou de que isso acabou de ser feito”, concluindo, assim, que “Não fica claro da leitura da carta” que a mesma configure uma decisão definitiva de suspensão dos apoios anteriormente concedidos à LACE.” A testemunha não assumiu no processo a posição de perito nem foi ouvida nessa qualidade. Independentemente de se tratar de um Professor de Direito de reconhecido e incontestado mérito, o seu depoimento é livremente apreciado e a apreciação (pessoal) que fez do conteúdo da carta pôde fazê-la o próprio Tribunal. A interpretação da carta não exige especiais conhecimentos (técnicos científicos ou artísticos) de que um magistrado não disponha. A carta consubstancia uma comunicação de uma decisão de suspensão da atribuição do remanescente do subsídio em causa, determinada unilateralmente pelo seu subscritor, tal como se considerou na sentença e se repercutiu no desenrolar dos acontecimentos e nos restantes factos provados. Os restantes excertos dos depoimentos especificados em recursos referem-se a questões laterais à centralidade dos factos e da prova, e respeitam a eventuais justificações de um resultado já concretizado, posteriores a ele. Interessam essencialmente às vicissitudes do que aconteceu depois e que, como tal, não foram o determinante da conduta já realizada pelo arguido. Em suma e para concluir, lidas as razões do recurso, a sentença de facto permanece perfeitamente compreensível e suficientemente justificada, não sofrendo o mínimo abalo. Não indo contra as vicissitudes da prova que o recorrente relata, resolve-as sempre de um modo racional e lógico, embora diferente do pretendido pelo arguido. Valoradas as provas produzidas em julgamento e justificada a convicção formada sempre de acordo com princípios e regras legais de apreciação da prova, não é visível o erro de julgamento. (c) Da (in)constitucionalidade do art. 29.º, al. f) da Lei n.º 34/87 O recorrente suscita a questão da inconstitucionalidade do art. 29.º, al. f) da Lei n.º 34/87 concluindo que deverá ser reconhecido e declarado que esta norma é materialmente inconstitucional por violar os arts. 18.º, n.º 2, 27.º, n.º 1, 30.º, n.º 4 e 266.º, da CRP, devendo ser recusada a sua aplicação nos termos do art. 204.º da CRP e revogada a pena acessória a que foi sujeito. Na sua argumentação desenvolveu que a norma legal em causa, “ao permitir e impor que a aplicação de uma pena criminal – ainda que suspensa na sua execução – implique, necessariamente, a perda do mandato de Presidente da Câmara Municipal, por parte de uma pessoa (o Arguido) que foi sufragado democraticamente e que tem, portanto, o direito político a exercer tal cargo, viola expressamente o n.º 4 do art. 30.º da Lei Fundamental que veda, expressis verbis, que uma pena possa ter como efeito necessário a perda de um direito político, sendo, por isso, uma norma inconstitucional”, que “coexistindo no texto constitucional, quer o art. 30.º, n.º 4, quer o art. 117.º, n.º 3, nenhuma destas disposições poderá prevalecer ou eliminar a outra, tendo ambas de ter, necessariamente, o seu espaço aplicativo próprio” e que “a única interpretação juridicamente válida será a de considerar que, ainda que a lei possa prever a perda de mandato como uma sanção possível para um crime cometido por um titular de um órgão político, tal nunca poderá ser uma decorrência “necessária” da pena criminal, carecendo, assim, para operar essa perda, de um processo onde se analise – não os pressupostos da punibilidade criminal, alvo do processo penal de aplicação de pena – mas antes e apenas os pressupostos aplicativos da pena de perda de mandato que, de acordo com o art. 30.º, n.º 4 da Constituição, não pode ocorrer de modo necessário ou automático”. Por último, argumenta que “o caráter automático/necessário/ope legis da pena da perda de mandato, por decorrência de uma pena de prisão suspensa na sua execução – sempre violará o princípio da proporcionalidade consagrado no art. 18.º, n.º 2 da Constituição, por ser uma consequência manifestamente excessiva e desrazoável”, que “não é proporcional, por ser excessivo e desrazoável, a perda de mandato de Presidente da Câmara por efeito necessário e automático da aplicação de uma pena de prisão suspensa na sua execução”, que “a vingar a interpretação normativa segundo a qual a perda de mandato é efeito necessário e automático da aplicação de uma pena de prisão suspensa na sua execução, sempre a mesma será inconstitucional, por violação do princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo 18.º, n.º 2 da Constituição (e ainda no artigo 266.º da mesma Lei), por ser uma consequência manifestamente excessiva, desrazoável e inaceitável à luz dos ditames da proteção da liberdade e da autonomia individual (cfr. artigo 27.º, n.º 1 da Constituição) ”. Começa por se recordar que também em matéria de pena o recurso mantém o arquétipo de “remédio jurídico”. Os recursos são sempre “remédios jurídicos”. Assim o têm afirmado a doutrina mais representativa e a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça e das Relações e não se vê razão para divergências. A propósito da determinação da medida da pena tem sido sufragado o entendimento de que a sindicabilidade da medida concreta da pena em via de recurso abrange a determinação da pena que desrespeite os princípios gerais respectivos, as operações de determinação impostas por lei, a indicação e consideração dos factores de medida da pena, mas “não abrangerá a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto de pena, excepto se tiverem sido violadas regras da experiência ou se a quantificação se revelar de todo desproporcionada” (cf. Figueiredo Dias, DPP. As Consequências Jurídica do Crime 1993, §254, p. 197)”. É, pois, sempre de um controlo do processo de determinação da sanção que se trata, no sentido da detecção de violações de normas e princípios legais e constitucionais que regem em matéria de pena, de toda a pena, o que inclui a pena principal, as penas de substituição, a pena acessória e os efeitos da pena. Cumpre, assim, partir da sentença de modo a apreciar se nela se decidiu correctamente relativamente ao (único) ponto aqui em discussão no recurso: o da constitucionalidade da aplicação da perda de mandato, na dupla vertente de efeito automático da condenação e de proporcionalidade no caso de condenação em pena de prisão suspensa. E o Tribunal justificou, na sentença, a declaração da perda de mandato do modo seguinte: “De acordo com o preceituado no artigo 29.º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, sob a epígrafe dos “Efeitos das penas aplicadas a titulares de cargos políticos de natureza electiva”, “[i]mplica a perda do respectivo mandato a condenação definitiva por crime de responsabilidade cometido no exercício das suas funções (…)” por titulares de cargos políticos, entre os quais se encontram os membros dos órgãos representativos das autarquias locais [alínea f)]. Ora, nos termos do disposto no nº4 do artigo 30º da Constituição da República Portuguesa “[n]nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos”. O Tribunal Constitucional foi já, por diversas vezes, convocado a pronunciar-se sobre o sentido e alcance que vem dando a este preceito constitucional (cfr., v. g., Acórdãos n.º 165/86 e n.º 282/86, publicados, respectivamente, no Diário da República, I Série, de 3 de Junho e de 11 de Novembro de 1986, bem como os Acórdãos n.º 255/87 e n.º 284/89, publicados no Diário da República, II Série, de 10 de Agosto de 1987 e de 12 de Junho de 1989, respectivamente). De salientar que, na génese da eliminação dos efeitos automáticos das penas subjaz o entendimento de que estes consubstanciam um verdadeiro obstáculo à realização do um fim essencial das penas da recuperação social do delinquente e, sobretudo, o carácter infamante e estigmatizante que tais efeitos inelutavelmente implicam. O nº 4 do artigo 30º da Constituição da República Portuguesa deriva “ (…) em linha recta, dos primordiais principais definidores da actuação do Estado de direito democrático que estruturam a nossa Lei Fundamental, ou sejam os princípios do respeito pela dignidade humana (artigo 1.°) e os do respeito e garantia dos direitos fundamentais (artigo 2.°).”. Na verdade, “ (…) se da aplicação da pena resultasse, como efeito necessário, a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos, far-se-ia tábua rasa daqueles princípios [os grandes princípios constitucionais de política criminal: o princípio da culpa; o princípio da necessidade da pena ou das medidas de segurança; o princípio da legalidade e o da jurisdicionalidade da aplicação do direito penal; o princípio da humanidade; e o princípio da igualdade], figurando o condenado como um proscrito, o que constituiria um flagrante atentado contra o princípio do respeito pela dignidade da pessoa humana.” (cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional nº 16/84, disponível in www.tribunalconstitucional.pt/). Sucede, porém, que, no que ao caso de crimes de responsabilidade de titulares de cargos políticos respeita estatui o artigo 117º da Constituição da República Portuguesa, sob a epígrafe “Estatuto dos Titulares de Cargos Políticos”, que “[o]s titulares de cargos políticos respondem política, civil e criminalmente pelas acções e omissões que pratiquem no exercício das suas funções” (nº1); mais preceituando o nº3 do mesmo preceito normativo que “[a] lei determina os crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos, bem como as sanções aplicáveis e os respectivos efeitos, que podem incluir a destituição do cargo ou a perda do mandato”. Ora, fazendo uma interpretação conjugada dos referidos preceitos constitucionais, decorre dos mesmos que o artigo 117º, nº3, da Constituição da República Portuguesa, ao remeter para a lei a determinação dos efeitos resultantes da condenação em crime de responsabilidade, se apresenta como norma especial relativamente à regra geral constante do artigo 30.º, n.º 4. Na verdade, a perda do mandato apresenta-se como uma característica historicamente ligada, de forma indissolúvel, ao próprio conceito de crime de responsabilidade [neste sentido, J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 2.ª ed., pp. 85 e 86: “Tendo em conta a densificação histórica do conceito, é possível defini-lo com recurso às seguintes características: […] existe uma conexão entre esta responsabilidade criminal e a responsabilidade política, transformando-se a censura criminal necessariamente numa censura política (com a consequente demissão ou destituição como pena necessária)”]. Assim sendo, porque a perda do mandato é inerente à própria ideia de condenação em crime de responsabilidade, não repugna aceitar que ela se configure, in casu, como efeito automático da condenação. Consequentemente, o artigo 29.º da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho não viola o n.º 4 do artigo 30.º da Lei Fundamental, porquanto o âmbito de aplicação deste se há-de ter como limitado pelo referido n.º 3 do artigo 117.º da Constituição da República Portuguesa (vide, neste sentido, entre outros, o Acórdão do Tribunal Constitucional 274/90, disponível in www.tribunalconstitucional.pt/). A condenação definitiva pela prática de crime de prevaricação cometido no exercício das suas funções implica necessariamente a perda do respectivo mandato. De salientar que ainda que assim não o fosse, isto é, ainda que a condenação definitiva pela prática de crime de responsabilidade, in casu um crime de prevaricação, cometido no exercício das suas funções não implicasse, necessariamente, a perda do respectivo mandato, sempre seria de a determinar no caso dos autos. Com efeito, atentando na concreta forma de actuação do arguido e nas consequências da sua conduta, e fazendo apelo a tudo quanto se deixou dito em sede de determinação de medida da pena e que, brevitatis causa, aqui se dá por integralmente reproduzido, e tendo presente os princípios da culpa, tipicidade, proporcionalidade e necessidade, sempre o Tribunal concluiria pela inaptidão do arguido para o exercício das respectivas funções, mostrando-se o efeito da perda do mandato essencial para a salvaguarda do Município e da Câmara Municipal de…. O Tribunal deve, portanto, decidir em conformidade, declarando a perda de mandato que, naturalmente, apenas se tornará definitiva com o trânsito em julgado.” Para finalizarmos, cumpre ainda indagar se pode ou não ser suspensa a perda de mandato decretada na sentença recorrida. Em nosso entendimento e salvo sempre melhor opinião, entendemos que a resposta tem de ser negativa, pois que nem a mencionada lei especial, nem a lei geral penal contempla essa possibilidade. E acrescentamos ainda, seguindo o entendimento preconizado a este respeito no Ac.TC. 46/2009, de 28-01-2009, citado pela recorrente, “que dada a especificidade dos bens jurídicos que estão em causa e a finalidade político-criminal que a lei visa com o instituto da suspensão da pena (cf. Jorge Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, p. 343), não se vislumbra qualquer razão para considerar como manifestamente desproporcionada a opção legislativa de permitir a aplicação da pena de perda de mandato não obstante a pena principal fique suspensa.” A decisão apresenta-se inteiramente correcta, respondendo adequadamente às duas objecções suscitadas no recurso. A aplicação da norma em causa, do modo como o foi, não é inconstitucional em nenhuma das duas vertentes sinalizadas Sobre a não inconstitucionalidade da norma em crise, e nas duas vertentes invocadas no recurso, se tem vindo a pronunciar o Tribunal Constitucional, sempre no sentido apreciado na sentença e oposto ao defendido pelo recorrente. Como a Sra. Procuradora-geral Adjunta destaca pertinentemente no parecer, “chamado a pronunciar-se sobre a constitucionalidade desta última disposição legal (o art. 29º da lei nº 34/87), o Tribunal Constitucional pronunciou-se invariavelmente sobre tal constitucionalidade: - no Acórdão n.º 274/90 - Não julga inconstitucional a norma constante do artigo 29.°, alínea f) da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, enquanto fixa, como efeito da condenação por crime de responsabilidade de titular de cargo político, a perda do mandato respectivo. - no Acórdão n.º 246/95 - Não julga inconstitucional a norma constante do artigo 29.º alínea f) da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, enquanto fixa, como efeito da condenação por crime de responsabilidade de titular de cargo político, a perda do mandato respectivo. - no Acórdão n.º 46/2009 - Não julga inconstitucional a norma artigo 29.°, alínea f), da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, na interpretação de que a pena acessória de perda de mandato pode ser aplicado ainda que a pena principal de prisão venha a ser substituída por pena de suspensão de execução da pena de prisão. - no Acórdão n., 287/2012 - Confirma decisão sumária que não conheceu dos recursos, em parte, e que não julgou inconstitucional a norma constante do artigo 29.°, alínea f), da Lei n.º 34/87. de 16 de Julho, enquanto fixa, como efeito da condenação por crime de responsabilidade de titular de cargo político, a perda do mandato respectivo.” Também a Relação de Évora assim o tem entendido, designadamente no acórdão de 10-07-2014 (rel. Gilberto Cunha) em que se considerou expressamente que a circunstância da pena de prisão aplicada ter sido suspensa não acarreta a suspensão da perda do mandato, pois não existe entre elas qualquer relação de necessidade em termos de o efectivo cumprimento de uma implicar o cumprimento da outra e vice-versa. E ali se desenvolveu, sempre com interesse também para os autos, e na indagação sobre se poderia ou não ser suspensa a perda de mandato decretada na sentença recorrida, que: “Em nosso entendimento e salvo sempre melhor opinião, entendemos que a resposta tem de ser negativa, pois que nem a mencionada lei especial, nem a lei geral penal contempla essa possibilidade. E acrescentamos ainda, seguindo o entendimento preconizado a este respeito no Ac.TC. 46/2009, de 28-01-2009, citado pela recorrente, “que dada a especificidade dos bens jurídicos que estão em causa e a finalidade político-criminal que a lei visa com o instituto da suspensão da pena (cf. Jorge Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, 1993, p. 343), não se vislumbra qualquer razão para considerar como manifestamente desproporcionada a opção legislativa de permitir a aplicação da pena de perda de mandato não obstante a pena principal fique suspensa. Tal corresponde, exactamente, pelo contrário, a um modo de o legislador poder conferir protecção efectiva a certos bens jurídicos específicos, relacionados com o exercício de funções políticas, quedando a reacção criminal efectiva aos limites do considerado como adequado e de justa medida, não arrastando com a efectividade dessa pena a outra pena igualmente (principal) aplicada e desse modo afectando, em menor grau, o direito fundamental de liberdade das pessoas (cf. art. 27.º, n.º 1, da CRP). Não existe qualquer relação de necessidade entre as duas penas em termos de o efectivo cumprimento de uma dever implicar o cumprimento da outra. Ao invés, a ponderação dos bens jurídicos lesados e as finalidades político-criminais da suspensão da pena poderão justificar, em face do próprio princípio da proporcionalidade, a solução legislativa”. Pelo exposto, não ocorre violação da Constituição e a sentença é aqui de manter. (d) Do erro na decisão relativa à matéria cível Por último, o recorrente impugna a sentença na parte relativa à matéria cível, pedindo também aqui a absolvição. Considera terem sido violados os arts. 483.º e 496.º, do Código Civil e o art. 12.º do Regulamento do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Associativo, aprovado pela Assembleia Municipal de … devendo a sentença ser revogada na parte em que condena, solidariamente, o demandado-arguido no pagamento da quantia de € 1.882,50 a título de danos patrimoniais e da quantia de € 4.500,00 a título de danos não patrimoniais. Para tanto, argumenta que o tribunal retirou determinadas conclusões em sede de decisão da matéria de facto respeitante à parte criminal que não cuidou de fazer repercutir na parte cível, ou seja, que deu como verificadas diversas irregularidades na execução do Regulamento do PADA em vigor em 2009 e 2010 pela Assistente LACE e a prova destas imporia o consequente juízo de inadmissibilidade da prestação de qualquer verba à LACE. Prossegue dizendo que mesmo que se admitisse como justa a condenação do recorrente por ter determinado a suspensão dos apoios à Demandante única e exclusivamente pelos motivos elencados na carta de 7 de julho de 2010, remanesceria sempre a situação de incumprimento objetivo da LACE no que concerne às normas do Regulamento do PADA, que determinavam a suspensão de todos os apoios à LACE, pelo menos, por um período de dois anos e a devolução de tais verbas ao Município. No que respeita aos danos não patrimoniais, argumenta que mesmo que o recorrente não tivesse escrito a tão referida carta de 7 de julho de 2010, o que é certo que é a LACE não teria recebido, em qualquer caso, o remanescente dos apoios que não recebeu até hoje; por via disso não realizaria as acima identificadas atividades; por via disso, o descrédito e desinteresse da população estremocense sempre ocorreria. Adianta-se que o recorrente tem em parte razão, assim sucedendo no que respeita a alguns dos danos não patrimoniais. Mais uma vez, cumpre partir da fundamentação da sentença. E a decisão em matéria cível foi a que segue: “A assistente L.A.C.E. (Liga dos Amigos do Castelo de Evoramonte) deduziu pedido de indemnização cível contra o arguido e contra o Município de …., peticionando a condenação dos demandados no pagamento, solidiário, de indemnização no montante global de 9.933,33 (nove mil, novecentos e trinta e três euros e trinta e três cêntimos), a título de danos patrimoniais, acrescido dos montantes devidos a título de juros contados desde a data da citação até integral pagamento e no pagamento do montante de 25.000,00€ (vinte e cinco mil euros) a título ressarcimento de danos não patrimoniais sofridos pela demandante, acrescido da quantia devida a título de juros contados desde a data da citação até integral pagamento. Nos termos do disposto no artigo 71.º do Código de Processo Penal, e em conformidade com o princípio da adesão que aí se consagra, deve o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime ser deduzido no âmbito do processo penal em que se aprecia a responsabilidade criminal emergente da infracção cometida. Nos termos do artigo 129.º do Código Penal, “a indemnização de perdas e danos emergente de crime é regulada pela lei civil”. Ora, incorre na obrigação de indemnizar o lesado, em consequência de responsabilidade por factos ilícitos, aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente um direito de outrem ou qualquer disposição destinada a proteger interesses alheios e assim lhe causar danos (cfr. artigo 483.º do Código Civil). Assim, a existência de responsabilidade civil por factos ilícitos depende da verificação dos seguintes pressupostos: a) Facto voluntário do agente (acção ou omissão controlável pela vontade do agente); b) Ilicitude do facto do lesante (decorrente da violação de direitos subjectivos alheios ou de disposições legais destinadas a proteger interesses alheios); c) Imputação do facto ao lesante a título de culpa lato sensu (juízo de reprovação da acção ou omissão do agente que podia e devia ter agido de outro modo, susceptível de assumir as vertentes de dolo o mera negligência – culpa stricto sensu); d) Dano (perda in natura sofrida pelo lesado em consequência de certo facto, nos interesses materiais, espirituais ou morais que o direito violado ou a norma infringida visam tutelar); e) Nexo de causalidade entre o facto voluntário do agente e o dano sofrido pela vítima (a aferir segundo o critério da causalidade adequada adoptado pelo artigo 563.º do Código Civil, ou seja, exigindo-se que a acção ou omissão do agente seja uma das condições concretas do evento e que, em abstracto, tal facto seja adequado ou apropriado ao seu desencadeamento) – cfr. artigos 483.º, n.º1; 487.º, n.º2; 562.º; 563.º e 564.º, n.º1, todos do Código Civil. A ilicitude pressupõe a existência de uma acção ou omissão consciente e livre, proibida pelo direito, ou seja, pressupõe um comportamento humano, controlável pela vontade, consubstanciado na violação de um direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios. A culpa lato sensu exprime um juízo de reprovação pessoal da acção ou da omissão do agente que podia e devia ter agido de outro modo, e é susceptível de assumir as vertentes de dolo ou de negligência. A culpa stricto sensu ou mera negligência traduz-se, grosso modo, na omissão pelo agente da diligência ou do cuidado que lhe era exigível, envolvendo, por seu turno, as vertentes de consciente ou inconsciente. No primeiro caso, o agente representa como possível a realização do facto ilícito, mas, por leviandade, precipitação, desleixo ou incúria, crê na sua não verificação (actuando sem se conformar com esta); no segundo, o agente, embora o pudesse e devesse prever, por imprevidência, descuido, imperícia ou inaptidão, não chega sequer a prever/representar a possibilidade (d)a realização do facto ilícito. Quanto à obrigação de indemnizar, o artigo 562.º do Código Civil estabelece como princípio geral em matéria de indemnização, o dever de se reconstituir a situação anterior à lesão, isto é, o dever de reposição das coisas no estado em que estariam se não se tivesse produzido o dano. Apenas quando esta reconstituição não seja possível a indemnização é fixada em dinheiro (cfr. artigo 566.º, n.º1 do Código Civil), fixando a lei civil como critério orientador no cálculo de tal indemnização pecuniária, o critério da diferença entre a situação em que o lesado se encontra e a situação em que este se encontraria caso não tivesse ocorrido o facto gerador do dano, devendo reportar-se à data mais recente que puder ser atendida pelo Tribunal, em regra a do encerramento da discussão na primeira instância (cfr. artigo 566.º, n.º2 do Código Civil). Derradeiramente, quando não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, caberá ao Tribunal julgar equitativamente, dentro dos limites que tiver dado como provados (cfr. artigo 566.º, n.º3 do Código Civil). São indemnizáveis, além do mais, os danos patrimoniais emergentes do facto gerador de responsabilidade civil, ou seja, os prejuízos susceptíveis de avaliação pecuniária causados em bens ou direitos já existentes à data da lesão, bem como os lucros cessantes, ou seja, os benefícios que o lesado deixou de obter por causa do facto ilícito, mas a que ainda não tinha direito à data da lesão. Já os danos não patrimoniais constituem uma forma de ressarcimento tendencial da angústia, dor física, doença ou abalo psíquico-emocional resultante de uma situação danosa. Porque atingem bens como a vida, a saúde, a liberdade, a honra ou o bom-nome, estes danos não são avaliáveis em dinheiro; assumindo o seu ressarcimento uma função essencialmente compensatória, embora sob a envolvência de uma certa vertente sancionatória. No que respeita ao direito ao bom nome e à reputação de outrem, estes encontram consagração constitucional no artigo 26º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, sendo a tutela da personalidade realizada através das normas de Direito Civil. O direito ao bom nome e à reputação não é exclusivo das pessoas singulares, podendo também ser dele titular as pessoas colectivas que, efectivamente, podem ser lesadas na sua boa imagem e no seu crédito (v.g. o Acórdão do Tribunal Constitucional nº 292/2008, disponível na página electrónica supra mencionada). Com efeito, se é certo que as pessoas colectivas não são portadoras do valor da honra, enquanto direito de personalidade, também é certo que estas transmitem para o exterior uma determinada imagem da forma como se organizam, prestam serviços ou fornecem bens que constituem o seu escopo. Questão de maior complexidade é saber se relativamente às pessoas colectivas, como é o caso da demandante/assistente, o dano causado por uma conduta violadoras do direito acautelado apenas pode ser ressarcido ao nível do dano patrimonial ou se também o pode ser em sede de dano não patrimonial. Não ignorando o Tribunal que esta questão tem tido tratada de forma díspar na jurisprudência dos Tribunais superiores, e na esteira dos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Março de 2007 e de 12 de Fevereiro de 2008 (disponíveis in www.dgsi.pt) é nosso entendimento que também o dano não patrimonial é indemnizável independentemente da existência de um dano patrimonial indirecto na esfera da pessoa colectiva. Na verdade, não obstante as pessoas colectivas serem desprovidas de emoções, sofrimento, prazer, alegrias e tristezas, importa reconhecer que as mesmas são portadoras de determinada imagem, que transmitem para o exterior relativamente à forma como se organizam, funcionam e prestam serviços ou fornecem bens que constituem o seu escopo. Trata-se, pois, de um direito análogo ao direito de personalidade reconhecido constitucionalmente aos indivíduos, sendo que as pessoas colectivas têm todo o interesse em defender o seu bom nome no universo da sua actividade, bem como o prestígio de que gozam no meio social em que se integram. Portanto, a ofensa ao bom nome, reputação, imagem e credibilidade das pessoas colectivas não relevam apenas como dano patrimonial indirecto, podendo também relevar como dano não patrimonial, desde que pela sua gravidade, mereça a tutela do direito. No que respeita à responsabilidade civil emergente de crime de responsabilidade de titular de cargo político, dispõe o artigo 45º, nº2, da Lei n.º 34/87, de 16 de Julho, “[o] Estado responde solidariamente com o titular de cargo político pelas perdas e danos emergentes de crime de responsabilidade cometido no exercício das suas funções”, assistindo ao Estado direito de regresso contra o titular de cargo político por crime de responsabilidade cometido no exercício das suas funções de que resulte o dever de indemnizar (nº2) e ficando o Estado sub-rogado no direito do lesado à indemnização, nos termos gerais, até ao montante que tiver satisfeito (nº 3). Regressando ao caso dos autos, verificamos ter resultado provado que no ano de 2007, a Câmara Municipal de … criou um programa denominado P.A.D.A. (Programa de Apoio ao Desenvolvimento Associativo) para promover a realização e o aprofundamento de projectos e acções recreativas, sociais e desportivas de iniciativas dos cidadãos, a título individual ou em associações de reconhecida qualidade e de interesse para o conselho de Estremoz, atribuindo por essa via, verbas pecuniárias, bens ou serviços. Mais se provou que a Liga dos Amigos do Castelo de Evoramonte, designada por L.A.C.E., representada pelo Presidente da respectiva Direcção, EB, é uma associação sem fins lucrativos, com o nº de pessoa colectiva ---, com sede na Rua …, Evoramonte, constituída em 23 de Março de 2000, e tem como objecto a intervenção cívica, cultural e social, através de todas as formas legais para propiciar a defesa, dinamização e valorização do património arquitectónico, histórico e cultural relacionado com o Castelo de Evoramonte. Provado resultou, também, que a referida Associação, aqui assistente, desde o início do programa P.A.D.A., no ano de 2007, sempre apresentou anualmente a sua candidatura ao mesmo na categoria de plano de desenvolvimento, tendo em todos os anos recebido o respectivo apoio. Mais se verifica resultar, igualmente, provado nos autos que, no dia 24 de Fevereiro de 2010, em sede de reunião ordinária realizada na Câmara Municipal de …., e após prévia entrega do processo de candidatura por parte da L.A.C.E., foi decidido atribuir a favor dessa entidade para o ano de 2010, um subsídio no valor de 3.765,00€ (três mil setecentos e sessenta e cinco euros), tendo ficado estabelecido o pagamento do referido subsidio em 3 (três) prestações, a primeira no valor de 1.882,50€, a ser paga em Março de 2010, a 2ª prestação no valor de €941,25 a ser paga no mês de Junho de 2010 e a 3ª prestação no valor de €941,25 a ser paga no mês de Outubro de 2010. Apurado nos autos resultou, ainda que, do montante total do referido subsídio atribuído foi pago, em 6 de Março de 2010, metade do seu valor total e que, no mês de Junho de 2010, a Câmara Municipal de … deveria ter efectuado o pagamento relativo à 2ª prestação do subsídio concedido, no valor de 941,25€, o que não o fez. Nessa sequência, por carta datada de 7 de Julho de 2010, redigida em papel timbrado da autarquia de …, escrita e assinada pelo respectivo Presidente da Câmara, ora arguido, foi aquela Associação informada de que a Câmara Municipal … iria deixar de apoiar as iniciativas da L.A.C.E., incluindo a atribuição de subsídios. Compulsada a matéria de facto provada nos autos, verifica-se que tal decisão de suspensão da atribuição do remanescente do subsídio foi determinada pelo arguido, sem que para o efeito tivesse havido prévia deliberação camarária nesse sentido. Na verdade, em data anterior a tal decisão, foram publicadas afirmações no jornal Ecos, do qual o legal representante dessa Associação é director, que na opinião do arguido colocou em causa a sua idoneidade pessoal, motivo pelo qual o arguido decidiu unilateralmente e sem qualquer justificação suspender a atribuição do referido subsídio, tendo para o efeito redigido, assinado e dirigido ao Presidente da Direcção da L.A.C.E., EB uma carta com o seguinte teor: “Na sequência das recentes afirmações que V. Ex.ª tornou públicas, enquanto Director do Jornal Ecos, relativas ao abandono do Sistema “Águas do Alentejo” pelo Município de …, e considerando: • Que tais afirmações colocam em causa a idoneidade da minha pessoa, quer enquanto Presidente da Câmara, quer enquanto cidadão; • Que V. Exa. é Presidente da Direcção da LACE e que, enquanto Presidente da Camara Municipal ---, me reservo o direito de não dissociar esse cargo dos restantes cargos que desempenha e, consequentemente, das posições que tem tomado relativamente à minha pessoa. Serve a presente para informar V. Exa. que esta autarquia deixará de apoiar as iniciativas da Liga dos Amigos do Castelo de Evoramonte, incluindo a atribuição de subsídios, enquanto se mantiver o comportamento que o seu Presidente da Direcção tem vindo a manter em relação do Município de … e às pessoas que o dirigem e que foram eleitas, para o efeito, pela maioria dos ---. Não posso admitir que sejam usados dinheiros públicos para subsidiar uma instituição que é dirigida por um Presidente que adopta uma postura de constante difamação da figura do principal responsável pela gestão da entidade que, quer através do apoio financeiro, quer logístico, tem contribuído para a sua sobrevivência, enquanto associação. Devo ainda salientar que, se a maioria destas pessoas confiou à equipa que dirijo os destinos do Concelho de …., certamente foi porque confiam tanto na estratégia que temos para o Conselho, como na nossa capacidade de decisão acerca daquilo que melhor sirva os seus interesses e necessidades de desenvolvimento. Por último, quero deixar bem claro que, ao longo da minha vida pessoal, profissional e política as pessoas sempre puderam confiar em mim e sempre saí, como é hábito dizer-se “pela porta grande”, pelo que jamais permitirei que sejam efectuadas insinuações difamatórias acerca da minha pessoa, em especial para quem, como é do conhecimento geral, nem sempre teve a mesma atitude durante a vida.” Mais se provou que, nesse contexto e na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de … e representante desta não efectuou o pagamento da 2ª e da 3ª prestações relativas ao P.A.D.A. a favor da L.A.C.E. e cortou totalmente todos os apoios logísticos habitualmente fornecidos, nomeadamente montagens de palcos e cedência de equipamentos. Decorre, pois, com clareza da matéria provada nos autos que, ao determinar, na qualidade de presidente da Câmara Municipal de … (e, portanto, qualidade de membro de órgão representativo de autarquia local) e no exercício das respectivas funções, unilateralmente, sem qualquer justificação e única e exclusivamente pelos motivos elencados na carta de 7 de Julho de 2010 (motivos contrários à ordem jurídica) o não pagamento à L.A.C.E. da 2ª e da 3ª prestações relativas ao P.A.D.A., bem como o corte total dos apoios logísticos habitualmente fornecidos, o arguido decidiu, manifestamente, contra direito. Percorrida a matéria de facto provada nos autos, verifica-se, igualmente, que o arguido agiu bem sabendo da ilegalidade da sua actuação descrita em 7. a 11. dos factos provados, ou seja, do facto de estar a tomar uma decisão unilateral, sem qualquer justificação, desprovida de cobertura legal e, por isso, contra direito e que, não obstante, actuou no âmbito das suas funções de titular de cargo politico, ou seja, de Presidente da Câmara Municipal de …., e fê-lo, com o propósito alcançado de prejudicar a associação L.A.C.E, porquanto a mesma tinha como presidente de Direcção EB, o que quis, agindo de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida pela lei. Mais se verifica ter resultado que, até à presente data, a Câmara Municipal de … não efectuou o pagamento das 2ª e 3ª prestações relativas ao P.A.D.A. do ano de 2010 a favor da L.A.C.E. Neste conspecto, e no que aos danos patrimoniais concerne, e resultando, in casu, provado que em consequência da conduta ilícita e culposa do arguido não foi paga à demandada/assistente a quantia global de 1.882,50€, correspondente ao montante da da 2ª e da 3ª prestações relativas ao P.A.D.A. do ano de 2010, impende sobre o arguido e sobre o Município de …. a obrigação solidária de indemnizar a demandante pelos danos patrimoniais sofridos pela assistente no valor de 1.882,50€ (mil, oitocentos e oitenta e dois euros e cinquenta cêntimos), acrescidas das quantias devidas a título de juros de mora contados a partir da data da notificação dos Demandados cíveis para contestarem o pedido de indemnização cível e até efectivo e integral pagamento. No que concerne, por seu turno, aos danos não patrimoniais, e fazendo apelo à matéria de facto provada nos autos, importa desde logo atentar nas concretas actividades realizadas pela L.A.C.E. nos anos de 2000 a 2010 que mereceram não apenas o louvor de entidades várias, como também foram apoiadas financeiramente por entidades de valor indiscutível. Acresce que, da matéria de facto provada nos autos, decorre, igualmente, o importante contributo da L.A.C.E., através das suas actividades, para a divulgação de Évoramonte, das suas gentes e do seu património, bem como das suas actividades e agentes económicos, quer em Portugal, quer no estrangeiro e que, como também resultou provado, se traduziu na chegada a Évoramonte de várias pessoas aí não residentes, que fizeram as suas refeições e pernoitaram em estabelecimentos da Região. O trabalho desenvolvido pela L.A.C.E. é reconhecido pela população e pelos agentes económicos da região, bem como pelas instituições públicas e privadas regionais, tal como a Direcção Regional da Cultura do Alentejo e pelos diversos membros da Rede Europeia dos Sítios da Paz. Decorre, pois, da matéria de facto provada que a L.A.C.E gozava de uma boa imagem, reputação e de credibilidade no universo da sua actividade, sendo pessoa colectiva prestigiada no meio em que se integra. Ora, volvendo à matéria de facto provada nos autos, verificamos ter resultado apurado que, em consequência do não recebimento do remanescente do subsídio atribuído à L.A.C.E. para o ano de 2010 no âmbito do P.A.D.A., a L.A.C.E deixou de realizar, nesse mesmo ano, as actividades “Évoramonte – Castelo Vivo, 3ª Edição” e “Évoramonte – Castelo da Paz, 5ª Edição”. Mais resultando provado que a não realização das mencionadas actividades no ano de 2010, bem como a não realização de actividade nos anos de 2011 e 2012 tiveram como consequência directa e necessária não apenas o desinteresse da população, como também a afectação a imagem, a reputação e a credibilidade da L.A.C.E perante os agentes económicos e culturais e perante a população da freguesia e região. Deste modo, em face da factualidade acima descrita e dada como provada, não restam dúvidas de que, com a sua conduta culposa (dolosa), o arguido violou direitos da demandante, atentando contra a sua imagem, reputação e credibilidade, pelo que o arguido e o Município de …. (de forma solidária) se acham incursos em responsabilidade civil extracontratual, com a correlativa obrigação de indemnizar os danos causados. Não restam, pois, dúvidas quanto à verificação de danos causalmente resultantes da actuação do arguido que se reveste naturalmente de gravidade, uma vez que causou um transtorno relevante para a imagem, reputação e credibilidade da demandante, sendo por via disso merecedores da tutela do direito e devendo, pois, ser indemnizados. No que concerne aos danos não patrimoniais, sendo estes insusceptíveis de avaliação pecuniária porque atingem bens que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, importa pois fixar o quantum indemnizatório a atribuir como forma a compensar a demandante, havendo para tanto que atentar no critério do artigo 496.º, n.º 3, 1ª parte do Código Civil, de acordo com o qual o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo Tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º – grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso que o justifiquem. Importa, pois, atentar, in casu, na actuação dolosa do arguido, no grau de ilicitude dos factos supra já descrito e na situação económica do demandado (supra vertida), tendo em mente que a indemnização por danos não patrimoniais não visa ressarcir o lesado de qualquer prejuízo, sendo antes uma compensação. Por todo o exposto, reputa-se equitativa a fixação de uma indemnização global a título de danos não patrimoniais a pagar pelo demandado à demandante no valor de 4.500,00€ (quatro mil e quinhentos euros).” Mais resultando provado que a não realização das mencionadas actividades no ano de 2010, bem como a não realização de actividade nos anos de 2011 e 2012 tiveram como consequência directa e necessária não apenas o desinteresse da população, como também a afectação a imagem, a reputação e a credibilidade da L.A.C.E perante os agentes económicos e culturais e perante a população da freguesia e região. A decisão em matéria cível apresenta-se integralmente correcta na parte referente à atribuição e fixação dos danos patrimoniais, demonstrado que ficou que o não recebimento das 2ª e 3ª prestações de um subsídio que se encontrava atribuído à assistente, pela Câmara Municipal, se deveu exclusivamente a uma decisão individual do arguido, que agiu determinado pelos comprovados motivos pessoais. Assim, e sendo ainda certo que, nesta parte, o recurso se apresenta interposto mais na decorrência da procedência da impugnação da matéria de facto do que na invocação de um erro de direito, também o decaimento que ocorreu ali se repercute necessariamente aqui. Ou seja, dele decorre a improcedência do recurso em matéria de direito na parte relativa ao arbitramento da indemnização por danos patrimoniais, que é devida e se encontra correctamemte fixada. E a tal não obsta também o argumento de que o subsídio em causa teria sempre de vir a ser restituído, por força de eventuais incumprimentos por parte da assistente. Referiu o recorrente que, independentemente da procedência da sua impugnação da matéria de facto, sempre remanesceria a situação de incumprimento da LACE no que concerne às normas do Regulamento do PADA, o que determinaria a suspensão de todos os apoios por um período de dois anos e a devolução ao Município das verbas entregues. Mas esta é uma avaliação que compete à Câmara Municipal ajuizar. Trata-se de decisão da competência da entidade que atribuiu o subsídio, que extravasa a presente decisão em matéria cível e que não é sequer prejudicial a esta mesma decisão. Não o é (prejudicial) seguramente na parte relativa aos danos patrimoniais arbitrados, que decorrem de actos praticados exclusivamente pelo arguido e que integraram um crime. Já no que respeita à fixação de danos não patrimoniais, e reconhecendo-se embora o acerto da posição adoptada na sentença quanto à reparabilidade do dano não patrimonial sofrido por pessoa colectiva (toda a fundamentação jurídica da sentença é de acolher), a indemnização não pode ser mantida na totalidade fixada dada a insuficiência de base factual bastante. Na verdade, a avaliação dos danos não patrimoniais arbitrados na sentença teve por base determinadas consequências sofridas pela assistente em determinado período temporal, ou seja, nos anos de 2010, de 2011 e de 2012. Sucede que, numa parte desse período alargado, ou seja, nos anos de 2011 e 2012, os prejuízos sofridos pela assistente já não têm correspondência com a conduta delituosa do arguido. Assim, não lhe podem ser objectivamente imputáveis, pois inexiste uma base factual que permita considerar que tenham sido também uma consequência da acção do arguido, ou seja, que esses danos tenham decorrido da prática do crime. Na verdade, se é certo que no ano de 2010 a não entrega do remanescente do subsídio que fora atribuído pela Câmara à assistente se ficou a dever exclusivamente à conduta do arguido, no que respeita aos anos de 2011 e de 2012 ficaram apenas provados os factos seguintes e que relevam aqui: “17. A L.A.C.E. apresentou candidatura ao P.A.D.A. para o ano de 2011, solicitando a atribuição de um subsídio no montante global de 7.750,00€. 18. Em reunião ordinária da Câmara Municipal de …, realizada a 2 de Fevereiro de 2011, foi deliberado não atribuir qualquer apoio à L.A.C.E. no âmbito do P.A.D.A para o ano de 2011 até que esta “regularizasse a situação de falta de documentação”. 19. Por carta datada de 18 de Março de 2011 e entrada nos Serviços da Câmara Municipal de … a 21 de Março de 2011, a L.A.C.E. entregou os seguintes documentos: cópia autenticada do Relatório da Direcção do Exercício de 2009; cópia autenticada das contas da gerência do exercício de 2009; cópia autenticada do parecer do Conselho Fiscal do exercício de 2009; cópia autenticada da acta da Assembleia Geral Eleitoral de 20 de Março de 2010; e cópia autenticada do registo dos membros da Direcção nos Serviços das Finanças. 20. A L.A.C.E. apresentou candidatura ao Programa de Apoio ao Desenvolvimento Cultural (P.A.D.C.) para o ano de 2012, solicitando a atribuição de um subsídio no montante global de 6.200,00€. 21. A candidatura referida em 20. não foi submetida à apreciação da Reunião da Câmara Municipal realizada a 18 de Abril de 2012, que aprovou as candidaturas apresentadas ao P.A.D.C..” No reverso, foi considerado como não provado na sentença que: “c) A decisão de não atribuir qualquer apoio à L.A.C.E no âmbito do P.A.D.A. para o ano de 2011 foi tomada pelo arguido na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de … e representante desta, única e exclusivamente pelos motivos elencados na carta transcrita em 10. dos factos provados. d) A decisão de não atribuir qualquer apoio à L.A.C.E no âmbito do P.A.D.C. para o ano de 2012 foi tomada pelo arguido na qualidade de Presidente da Câmara Municipal de… e representante desta, única e exclusivamente pelos motivos elencados na carta transcrita em 10. dos factos provados, o arguido, e) Como consequência directa e necessária da não aprovação das candidaturas apresentadas ao PA.D.A para o ano de 2011 e para o P.A.D.C. de 2012, a L.A.C.E não apresentou candidatura ao P.A.D.C. para o ano de 2013. f) Como consequência directa e necessária da conduta referida em c), a L.A.C.E. deixou de receber no ano de 2011, um subsídio no montante global de 3.765,00€. g) Como consequência directa e necessária da conduta referida em d), a L.A.C.E. deixou de receber no ano de 2012, um subsídio no montante global de 3.765,00€. h) A L.A.C.E não foi convocada para a reunião referida em 16. dos factos provados por decisão do arguido. i) O arguido mandou desactivar o site da L.A.C.E hospedado no servidor da Câmara, impedindo-a de divulgar, por esse meio, as suas acções e informações. j) O arguido deu ordens directas para que fosse recusada a impressão na Câmara Municipal de …. de materiais de uma exposição de fotografia organizada pela Fundação Obras pela circunstância de estes materiais conterem o logotipo e o nome da L.A.C.E. como co-organizadora do evento. k) Várias entidades privadas manifestaram receio em colaborar com a L.A.C.E. por terem medo de que o arguido e o Município de …lhe cortarem o financiamento e/ou de dificultarem as suas actividades l) As condutas descritas em c), d), h), i), j) foram adoptadas pelo arguido com o propósito concretizado de prejudicar a L.A.C.E., atingindo-a na sua reputação e na sua imagem perante as demais associações, perante os outros agentes culturais e económicos e perante a população em geral e de impedir o relacionamento da L.A.C.E. com outros agentes culturais do Concelho.” Todos estes últimos factos, que suportariam o pedido de indemnização por danos não patrimoniais sofridos pela assistente e relativos aos anos de 2011 e 2012, ficaram indemonstrados. Na resposta ao recurso do arguido, a assistente contrapôs que se teriam provado “os factos justificativos da condenação no montante de € 4500,00”, que elencou como sendo os descritos em 28., 32. e 35. da matéria de facto provada da sentença. Mas estes enunciados referem-se apenas a prejuízos sofridos pela assistente nos anos 2011 e 2012. E a existência de um dano é um dos pressupostos da responsabilidade civil mas não os esgota. Falhou a demonstração da imputação do dano à conduta do agente. O(s) demandado(s) civis respondem apenas pelos danos a que a sua conduta tenha dado lugar, o que, no caso presente, e de acordo com os factos provados, relativamente à pessoa do arguido, se esgotou no ano de 2010. Cumpre assim proceder ao reajustamento do quantum indemnizatório em conformidade com o exposto. Ou seja, proceder à redução proporcional da quantia devida à assistente a título de danos não patrimoniais, e a pagar solidariamente pelos dois demandados civis. Fixa-se agora esse valor em € 1.500,00, que substitui o de € 4.500,00 anteriormente arbitrado na sentença 4. Face ao exposto, acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em julgar improcedente o recurso em matéria crime, confirmando-se integralmente nesta parte a sentença, e julgar parcialmente procedente o recurso em matéria cível, reduzindo-se para € 1.500,00 o valor da indemnização por danos não patrimoniais, mantendo-se no mais toda a decisão. Custas crime pelo recorrente que se fixam em 5UC e custas cíveis na proporção do decaimento (arts 513º /1 e 514º/1 CPP e 8º/5 e Tab. III RCP). Évora, 21.03.2017 (Ana Maria Barata de Brito) (Maria Leonor Vasconcelos Esteves) |