Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
559/22.1T9ABT-B.E1
Relator: TOMÉ DE CARVALHO
Descritores: RECLAMAÇÃO CONTRA DESPACHO QUE NÃO ADMITIR OU RETIVER RECURSO
CONTA DE CUSTAS
RECURSO
Data do Acordão: 09/20/2024
Votação: RELATOR
Texto Integral: S
Sumário: 1 – Da condenação em multa, penalidade ou taxa sancionatória excepcional fora dos casos legalmente admissíveis cabe sempre recurso, o qual, quando deduzido autonomamente, é apresentado nos 15 dias após a notificação do despacho que condenou a parte em multa, penalidade ou taxa.
2 – Da decisão do incidente de reclamação e da proferida sobre as dúvidas do funcionário judicial que tiver efectuado a conta cabe recurso em um grau, se o montante exceder o valor de 50 UC.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 559/22.1T9ABT-B.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Santarém – Juízo Local de Competência Criminal de Abrantes – J1
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I – Relatório:
(…) veio reclamar do despacho de não admissão do recurso por si interposto, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 405.º do Código de Processo Penal.
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No dia 15 de Abril de 2024, o arguido formulou um pedido de suspeição da Meritíssima Juíza titular do processo.
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No dia 07 de Maio de 2024, o Tribunal da Relação de Évora decidiu julgar «manifestamente infundado o requerido pelo Ilustre Mandatário do arguido (…), requerimento que vai indeferido.
Condena-se o Requerente em 7 UCs nos termos do n.º 7 do artigo 45.º do Código de Processo Penal».
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O referido acórdão transitou em julgado e os autos foram remetidos à Primeira Instância.
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No dia 03 de Junho de 2024, foi proferido despacho para emissão de Guia e Conta / liquidação de custas[1].
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O arguido reclamou da referida decisão, solicitando que «a correção da nota de custas e liquidação, a qual deve fazer constar as partes tal como compuseram o processo junto do Tribunal Superior e tal como vem disposto pelo Tribunal da Relação de Évora, e ser a mesma enviada ao arguido e requerente. Mais requer o envio do despacho de fls. e com referência 96896839, o presente pedido de correção da conta de custas e a decisão que sobre o mesmo venha a recair ao Conselho Superior de Magistratura para os fins que tiver por convenientes. Mais requer que, por considerar que a defesa exercida pelo mandatário subscritor pode prejudicar as garantias do arguido e a sua posição processual, não porque o mandatário subscritor não tenha competência técnico jurídica para o desempenho do seus mandato, não porque o mandatário subscritor não cumpra rigorosamente os ditames deontológicos e éticos que se lhe impõem no exercício da advocacia, não porque o mandatário subscritor demonstre falta ou insuficiente domínio da lei e do Direito e respetiva interpretação e realização… mas sim pelo simples facto de preencher todos aqueles pressuposto e de ser este o mandatário a representar este e outros arguidos e de tal poder prejudicar a defesa dos mesmos, o mandatário ora subscritor renúncia ao mandato, nos termos e para os efeitos do artigo 47.º, n.º 1, requerendo a notificação do arguido».
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Em 21 de Junho de 2024, ao emitir a informação prevista no n.º 4 do artigo 31.º do Regulamento das Custas Processuais, a escrivã adjunta responsável afirmou que a conta de liquidação de custas foi elaborada de acordo com o disposto no n.º 7 artigo 45.º do Código de Processo Penal, exarada na respectiva decisão condenatória de 07/05/2024.
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Em 25 de Junho de 2024, o Magistrado do Ministério Público pronunciou-se, dizendo que «o Juízo Local Criminal de Abrantes apenas concretizou – e bem, a nosso ver – o determinado pelo Tribunal Superior, cumprindo as demais normas legais relativas à liquidação das custas processuais, pelo que não se nos afigura assistir razão ao requerente, promovendo-se o indeferimento do requerido».
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No dia 26 de Junho de 2024, a Meritíssima Juíza de Direito decidiu que «o Juízo Local Criminal de Abrantes cumpriu corretamente o determinado pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora, cumprindo as demais normas legais relativas à liquidação das custas processuais, pelo que, salvo melhor opinião, não assiste razão ao requerente, indeferindo-se o requerido pelo Ilustre Causídico».
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Ao ser notificado, o arguido veio interpor recurso, onde pediu que o Tribunal da Relação de Évora declarasse nulo o despacho recorrido, por falta de fundamentação, por falta de acolhimento legal e por liquidar e realizar a operação de conta de custas e seus destinatários de forma contrária ao disposto no acórdão.
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Por decisão de 02 de Setembro de 2024, o Tribunal a quo não admitiu o recurso, por extemporaneidade.
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Devidamente notificado, o arguido veio apresentar reclamação contra a não admissão do recurso, sublinhando que o mesmo deveria ser admitido, por estar em tempo e por ter legitimidade.
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A conta de custas foi emitida em nome de (…) tem o valor de € 714,00 (setecentos e catorze euros).
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O sr. dr. (…) é advogado e assumiu a representação forense do arguido (…), tendo, entretanto, renunciado ao mandato.
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II – Dos factos com interesse para a decisão:
Os factos com interesse para a justa decisão do litígio são os que constam do relatório inicial.
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III – Enquadramento jurídico:
Do despacho que não admitir ou que retiver o recurso, o recorrente pode reclamar para o presidente do tribunal a que o recurso se dirige, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 405.º[2] do Código de Processo Penal.
Após ter feito uma descrição cronológica dos actos processuais relevantes, o Tribunal a quo entendeu que o prazo de 15 dias consignado na lei para a interposição do recurso havia terminado no dia 27/05/2024 e, como tal, não admitiu o recurso interposto no dia 12/07/2024, por o mesmo ser intempestivo.
A Meritíssima Juíza de Direito apoiou-se no texto do n.º 6 do artigo 27.º[3] do Regulamento das Custas Processuais, que prescreve que o recurso é apresentado nos 15 dias após a notificação do despacho que condenou a parte em multa, penalidade ou taxa.
Se fosse este o cenário, era evidente que o recurso era intempestivo, pelos fundamentos ali expressos.
Porém, o arguido afirma que se insurgiu não contra o acórdão do Tribunal da Relação de Évora, com o qual concordava «e não enferma de qualquer nulidade, dúvida ou imprecisão» mas sim relativamente ao despacho de dia 26 de Junho de 2024 que, a título pessoal, condena o mandatário em custas.
Sucede que, ainda que a Meritíssima Juíza de Direito estivesse em erro quanto à real decisão sob censura e ao destinatário da condenação, mesmo que assistisse razão ao arguido no que tange ao objecto do recurso interposto, existiria um impedimento legal à admissão do mesmo, que está relacionado com as regras do valor e da sucumbência.
Na realidade, quanto à reforma e reclamação da conta existe norma expressa e a mesma dita que da decisão do incidente de reclamação e da proferida sobre as dúvidas do funcionário judicial que tiver efectuado a conta cabe recurso em um grau, se o montante exceder o valor de 50 UC, tal como está precipitado no n.º 6 do artigo 31.º[4] do Regulamento das Custas Processuais.
A conta de custas emitida em nome do sr. dr. Rui Manuel Fernandes tem o valor de € 714,00 (setecentos e quatorze euros), verba esta que é notoriamente inferior a 50 unidades de conta[5] [50 x € 102 = € 5.100,00].
Deste modo, seja por via da data do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora, seja pela alocação à decisão que incidiu sobre a reclamação apresentada, a matéria em causa não admite a interposição de recurso – no primeiro caso por extemporaneidade e na segunda hipótese pelo limite associado ao valor da conta.
Neste espectro lógico-jurídico, mantém-se o despacho de não admissão de recurso, por irrecorribilidade legal, indeferindo-se a pretensão formulada pelo arguido.
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IV – Sumário: (…)
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V – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção as considerações expendidas e o quadro legal aplicável, mantém-se o despacho reclamado, não se admitindo o recurso interposto.
Custas a cargo do arguido, fixando a taxa de justiça em 2 UC´s.
Notifique.
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Processei e revi.
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Évora, 20/09/2024

José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho


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[1] Na sua parte mais pertinente, o despacho tinha o seguinte conteúdo:
«Vi o Acórdão que antecede, o qual indeferiu o pedido de recusa por parte do Ilustre Defensor do arguido.
Extraia certidão do acórdão e do despacho e entregue-me em mão.
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Notifique o Ministério Público para o mesmo efeito.
Proceda à liquidação das custas nos termos determinados (...)».
[2] Artigo 405.º (Reclamação contra despacho que não admitir ou que retiver o recurso):
1 - Do despacho que não admitir ou que retiver o recurso, o recorrente pode reclamar para o presidente do tribunal a que o recurso se dirige.
2 - A reclamação é apresentada na secretaria do tribunal recorrido no prazo de 10 dias contados da notificação do despacho que não tiver admitido o recurso ou da data em que o recorrente tiver tido conhecimento da retenção.
3 - No requerimento o reclamante expõe as razões que justificam a admissão ou a subida imediata do recurso e indica os elementos com que pretende instruir a reclamação.
4 - A decisão do presidente do tribunal superior é definitiva quando confirmar o despacho de indeferimento. No caso contrário, não vincula o tribunal de recurso.
[3] Artigo 27.º (Disposições gerais):
1 - Sempre que na lei processual for prevista a condenação em multa ou penalidade de algumas das partes ou outros intervenientes sem que se indique o respectivo montante, este pode ser fixado numa quantia entre 0,5 UC e 5 UC.
2 - Nos casos excepcionalmente graves, salvo se for outra a disposição legal, a multa ou penalidade pode ascender a uma quantia máxima de 10 UC.
3 - Nos casos de condenação por litigância de má fé a multa é fixada entre 2 UC e 100 UC.
4 - O montante da multa ou penalidade é sempre fixado pelo juiz, tendo em consideração os reflexos da violação da lei na regular tramitação do processo e na correcta decisão da causa, a situação económica do agente e a repercussão da condenação no património deste.
5 - A parte não pode ser simultaneamente condenada, pelo mesmo acto processual, em multa e em taxa sancionatória excepcional.
6 - Da condenação em multa, penalidade ou taxa sancionatória excepcional fora dos casos legalmente admissíveis cabe sempre recurso, o qual, quando deduzido autonomamente, é apresentado nos 15 dias após a notificação do despacho que condenou a parte em multa, penalidade ou taxa.
[4] Artigo 31.º (Reforma e reclamação):
1 - A conta é sempre notificada ao Ministério Público, aos mandatários, ao agente de execução e ao administrador de insolvência, quando os haja, ou às próprias partes quando não haja mandatário, e à parte responsável pelo pagamento, para que, no prazo de 10 dias, peçam a reforma, reclamem da conta ou efectuem o pagamento.
2 - Oficiosamente, a requerimento do Ministério Público ou dos interessados, o juiz mandará reformar a conta se esta não estiver de harmonia com as disposições legais.
3 - A reclamação da conta pode ser apresentada:
a) Pelo responsável pelas custas, no prazo de pagamento voluntário, enquanto não o realizar;
b) Por qualquer interveniente processual, até 10 dias após o recebimento de quaisquer quantias;
c) Pelo Ministério Público, no prazo de 10 dias a contar da notificação do n.º 1.
4 - Apresentada a reclamação da conta, o funcionário judicial que tiver efectuado a conta pronuncia-se no prazo de cinco dias, depois o processo vai com vista ao Ministério Público, após o que o juiz decide.
5 - Não é admitida segunda reclamação dos interessados sem o depósito das custas em dívida.
6 - Da decisão do incidente de reclamação e da proferida sobre as dúvidas do funcionário judicial que tiver efectuado a conta cabe recurso em um grau, se o montante exceder o valor de 50 UC.
7 - (Revogado.)
8 - Se da reforma da conta resultar a necessidade de qualquer reposição por parte do Instituto de Gestão Financeira e de Infra-Estruturas de Justiça, I. P., ou de outras entidades que já tenham recebido as custas, é a importância da reposição descontada nas quantias que no mês seguinte caibam à entidade devedora, sendo-lhe comunicado o facto por nota de estorno.
9 - No caso de não ser possível a reposição nos termos do número anterior, as entidades devedoras procederão à devolução da importância em causa no prazo de 10 dias após a respectiva notificação.
[5] No ano de 2024 a Unidade de Conta (UC) que serve de cálculo para as custas judiciais cifra-se em € 102,00.