Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
93/24.5T8LLE-A.E1
Relator: MARIA JOÃO SOUSA E FARO
Descritores: CONDOMÍNIO
ACTA DA ASSEMBLEIA GERAL DE CONDÓMINOS
TÍTULO EXECUTIVO
Data do Acordão: 10/16/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE A SENTENÇA RECORRIDA
Área Temática: CÍVEL
Sumário: Sumário:
I. A Lei n.º 8/2022, de 10. 1 que alterou o art.º6º do D.L. nº268/94, de 25.10 veio clarificar os requisitos que a acta de condomínio deve revestir para que possa servir de título executivo: que dela conste a deliberação sobre o montante das contribuições ou despesas a pagar ao condomínio; o montante anual a pagar por cada condómino e a data de vencimento das respectivas obrigações.

II. Sem embargo, o prazo de vencimento pode constar do Regulamento do condomínio oportunamente aprovado.

Decisão Texto Integral: Processo: 93/24.5T8LLE-A

ACÓRDÃO

1. Fração A- Cem- Sociedade de Administração de Bens Próprios, Lda. deduziu oposição por embargos e por apenso aos autos de execução contra si instaurados por Administração do Condomínio do Bloco Galeão do Edifício Siroco em Olhão.


Alegou para o efeito, em síntese, que são falsas as actas de 13/2/2023 e de 15/7/2023, entendendo que dai decorre a sua inexequibilidade como títulos executivos, suscitando também a invalidade das deliberações, o pagamento da quantia exequenda e a prescrição das contribuições relativas a 2018. Mais pediu a condenação do Embargado como litigante de má-fé.


O Embargado contestou pugnando pela improcedência dos embargos e a condenação da Embargante como litigante de má-fé.

2. Foi proferido despacho saneador-sentença que culminou com o seguinte dispositivo:


“Pelo exposto, decide-se

A. Julgar parcialmente procedentes os presentes embargos de executado e, em consequência:


A1) Ordenar o prosseguimento da execução relativamente às contribuições relativas ao ano de 2023, no valor global de 15.316,80 euros (quinze mil, trezentos e dezasseis euros e oitenta cêntimos);


A21) Extinguir a execução relativamente às demais quantias liquidadas no requerimento executivo;

B. Não condenar Embargante e Embargado como litigantes de má-fé; (…)”.

3. É desta sentença que recorre o Embargado/Exequente, formulando na sua apelação as seguintes conclusões:


“I. O presente recurso tem como objecto toda a matéria da douta Sentença, nomeadamente quando se decidiu julgar parcialmente procedentes os presentes embargos de executado e, em consequência, extinguiu a execução relativamente às demais quantias liquidadas no requerimento executivo, e, consequentemente, não determinou o prosseguimento da execução relativamente às contribuições relativas aos anos 2019, 2020, 2021 e 2022;


Incluindo o facto de ter condenado a Recorrente ora Embargado nas custas dos embargos, na proporção de 73 % nas custas processuais.


II. Ora, em boa verdade e relativamente à invocada admissibilidade das actas apresentadas à execução reforça o Tribunal a quo que valerão as mesmas como títulos executivos, na medida em que das mesmas decorra a obrigação do pagamento nos termos previsto no art.º 6º do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25/10.


III. Posto isto, importava pois, avaliar, em que medida decorre das duas actas dadas à execução a obrigação de pagamento nos termos previstos no art.º 6º do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25 de Outubro.


IV. Na acta de 15/7/2023 foi deliberado aprovar a reparação do elevador, com o valor de 10.221,30 euros (com IVA incluído), a pagar como contribuição extraordinária em conformidade com a permilagem, cabendo à fracção A., a quantia de 3.978,97 euros (relativa à permilagem de 389,22) e a quantia de 70,14 euros para cada uma das outras 89 fracções (sendo a permilagem de 6,862 cada).


V. Pelo que todos os condóminos sabiam que tinham que contribuir extraordinariamente, em conformidade com a permilagem, cabendo à Recorrida a quantia de 3.978,97 euros, facto que não depende somente de que não tenha sido estipulada a data de vencimento (nem que resultando do Regulamento do condomínio o tempo de pagamento das contribuições extraordinárias) quando exigíveis a todo o tempo, e como uma obrigação de todos os condóminos para poderem usufruir de um bem (comum) que é de todos os condóminos.


VI. Mais adiantou o Tribunal a quo, que daqui resulta também que foi fixada uma prestação única para a Recorrida no valor de 3.978,97 euros, ainda que não tenha sido estipulada a data de vencimento (apesar de não estar contemplado no Regulamento do condomínio o tempo de pagamento das contribuições extraordinárias), pelo que é do entendimento do Recorrente que, não se deve nem se pode desobrigar a Recorrida da obrigação exequenda de tal valor.


VII. Acresce ainda o facto de ter ficado expresso na ata de 17/05/2023, cuja Assembleia Extraordinária foi convocada expressamente para de acordo com o ponto número 2 da ordem de trabalhos ser prestada a informação da situação do elevador e aprovação de orçamento de reparação, de forma a ser aplicado a todos os proprietários do condomínio, sem exceção, e que resultou, ter sido proposto e aceite, uma comparticipação suplementar face ao incumprimento da Recorrida, acordado fixar-se um valor a suportar por cada condómino, em € 115,00 (cento e quinze euros), porque aquelas pessoas muitas delas, já de uma certa idade, não podiam ficar sem elevador.


VIII. Ora, estando contemplado em ata que a Recorrida é devedora na proporção da sua quota, do referido montante em divida, devida às despesas com o elevador e à sua manutenção, deve a Recorrida estar obrigada a pagar a quantia exequenda respeitante a esse item, E nessa alusão, do acordado em ata, cumpre-se o requisito do vencimento, onde consta igualmente pré-estabelecido, o prazo até ao dia 30 de setembro de 2023 para a entrega do valor acordado, podendo inclusive, se necessário, fracioná-lo.


IX. Entende pois o Recorrente, sempre com a devida vénia, que esta questão não foi interpretada à luz da experiência comum, de forma extensiva e compreensível, concluindo-se que este valor deveria igualmente estar integrado na totalidade do valor peticionado pela Recorrente, por ser uma obrigação da Recorrida, comparticipar nas despesas com o elevador, à semelhança de um qualquer outro condómino.


X. Destarte e face ao acima exposto, tem-se esta concreta matéria impugnada, com a devida vénia, porque mal interpretada/julgada e perante os fundamentos aduzidos e evocados quanto a este facto, estão no entendimento da recorrente, “de certo modo”, em oposição com a decisão tomada na sentença recorrida, porquanto a administração deve intervir em todas as situações de urgência, convocando de imediato assembleia extraordinária de condóminos.


XI. No concerne aos anos de 2019 a 2022 das quotas em falta da Recorrida, os quais salvo melhor opinião, não se encontravam à data, as respetivas dividas prescritas, em termos de prazo legal de 5 anos, era consabido a sua existência e as deliberações tomadas em Assembleia, foram sempre no sentido de cobrar-se a totalidade da divida desta fração.


XII. Pelo que, considera a Recorrente, que efetivamente se deliberou na Assembleia de cobrar toda a devida existente desta fração, razão pela qual o valor foi peticionado de forma genérica no montante total de € 52.708,81 referente ao pagamento das quotas relativos às mensalidades de 2018 a 2023; sendo que tais valores encontram-se descriminados no doc. junto aos autos como Doc. 4.


XIII. No que concerne ao ano de 2022, às quotizações em falta por parte da recorrida, a ata de 15/07/2023 faz menção expressa quer no ponto 3 da ordem de trabalhos, quer na listagem de dividas do condomínio, do montante em divida por parte da Recorrida que se cifra em € 4.613,04 (quatro mil seiscentos e treze euros e quatro cêntimos), quer ainda a par do constante da ata de 18/02/2023, deliberado como pagamento a efetuar pela Recorrida, do já supra referido, existir o valor de € 3.978,97 (três mil novecentos e setentas e oito euros e noventa e sete cêntimos) valor em divida destinado ao orçamentado para a manutenção do elevador, pelo que deliberou-se e aprovou-se ser também estes montantes em divida a englobar na totalidade da obrigação exequenda.


XIV. No entendimento do Recorrente, sucedeu porém, não que o Mm.º Juiz tivesse deixado de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar, mas aparentemente, pronunciando-se de forma diversa dos factos efetivamente apurados; Na mesma acta consta que foi lida a listagem de dividas ao condomínio já vencidas e que foi anexa à acta elaborada dessa assembleia, constando na listagem que à data de 15/7/2023 relativamente à fracção A, encontrava-se em divida a quantia de 4.613,04 euros respeitante a 2022.


XV. Em conclusão, sempre com a devida vénia, entende o Recorrente que andou mal o Tribunal a quo, ao concluir que na acta de 15/7/2023 foi fixada a prestação única da Embargante para as despesas de reparação do elevador, mas sem fixar o momento do pagamento e quanto ao mais apenas foi lida e anexa à acta uma listagem de dividas;


XVI. Pois, que, a forma de pagamento foi processada e atribuído um vencimento para as despesas de reparação do elevador (no caso de ter que ser os outros condóminos a suportar o custo do não pagamento por parte da Recorrida) e quanto ao mais não apenas foi lida e anexa à acta a listagem de dividas, conquanto foi deliberado ficar previsto para agir com a maior brevidade possível de forma a obter o pagamento pela via judicial, caso a Recorrida não mostrasse intenção de pagar. Foi inclusivamente posto à votação avançar com as ações judiciais, pelo valor lido tendo para o efeito ficado a administração mandatada para esse concreto efeito.


XVII. Assim, no que respeita à contribuição extraordinária não podendo concordar com a sentença recorrida, foi efetivamente demonstrado o tempo do pagamento e como tal, estão demonstrados os necessários requisitos para valer como título executivo.


XVIII. Já no que respeita à comunicação feita na assembleia relativa a dividas existentes, foi igualmente deliberado acionar o mecanismo legal das ações judiciais como acima mencionado, pelo que, não só da leitura da listagem de dividas que ficou anexa à acta, terá simultaneamente que resultar, que a assembleia aceitou como valores em divida os ai relatados, e contrariamente ao elencado na douta sentença recorrida, existiu deliberação que fixou a data de vencimento de cada contribuição, pois esta encontra-se bem patente no pré-estabelecido, como prazo até ao dia 30 de setembro de 2023 para a entrega do valor acordado, por incumprimento explicito da Recorrida.


XIX. Face ao acima exposto, entende a Recorrente existir esta ata como titulo executivo, pelo que devem estes valores, integrar o valor da quantia exequenda, como sendo os montantes referente à contribuição extraordinária de € 3.978,97 (três mil novecentos e setentas e oito euros e noventa e sete cêntimos), bem como o valor peticionado referente a quota devida do ano de 2022 da Recorrida, no valor de € 4.613,04 (quatro mil seiscentos e treze euros e quatro cêntimos), o que desde já se requer a V. Excelências Venerandos Juízes Desembargadores.


XX. Logo a questão a decidir é uma só, saber se efetivamente a Ata, de 18 de fevereiro de 2023, e a ata de 15/07/2023 poderão constituir título executivo bastante para as quantias sob cobrança.


XXI. Sempre se dirá que é exigível a obrigação exequenda quando o exequente se limita a pedir as mensalidades vencidas à data da instauração da execução, por se ter esgotado o prazo para pagamento da totalidade das mensalidades devidas pela executada.


XXII. Nas atas normalmente só se refere os anos em divida a que a apresentação dos orçamentos dizem respeito, ou seja do ano transato, e daquele próprio ano, visto ser o que se propõe a aprovar.


XXIII. Não, que, não possam existir dívidas anteriores não prescritas e do conhecimento de todos os condóminos. Dito isto, entende a recorrente que nos termos do disposto no artigo 703.º, n.º 1, alínea d) do CPC, podem servir de base a uma execução os documentos a que por disposição especial lhes seja atribuída força executiva, pelo que, nos termos do artigo 6.º do DL nº 268/94, de 25/10, as atas de assembleia de condóminos podem constituir título executivo, o que sucede na presente lide.


XXIV. Contudo, a força executiva da ata da assembleia não depende nem da assinatura de todos os condóminos nem tão pouco do valor determinado e exato da dívida de cada condómino. Na realidade, desde que através da ata se possa determinar, de forma simples e aritmética, o montante em dívida, esta poderá constituir título executivo.


XXV. A presente administração que é composta por três residentes proprietários, não sendo nenhum deles, profissionais em termos de condomínios, fazendo o seu melhor para sem elementos poder recolher a informação necessária às suas funções, e quando tomam posse, encontram uma situação caótica, sem poder movimentar contas devido à Recorrida e às suas interferências para que assim fosse, razão porque é possível ter omitido um ou outro facto essencial que consubstanciasse os requisitos para conformar o titulo executivo. Não obstante encetou esforços para cobrar todos os montantes que efetivamente constituía dividas por parte da Recorrida ao condomínio.


XXVI. Relativamente à ausência da aprovação do respetivo orçamento dos anos de 2019, 2020 e 2021, decorre do facto das administrações em exercício nesses anos, terem omitido tal facto, por retenção das pastas do condomínio, sem serem entregues a esta administração, pelo que, salvo o devido respeito, a sentença recorrida interpretou erroneamente a ratio legis do artigo 724.º do CPC, fazendo do mesmo uma interpretação restritiva.


XXVII. A al. e) do referido art.º 724.º do CPC, diz-nos que no requerimento executivo deve-se: “Expor sucintamente os factos que fundamentam o pedido, quando não constem do título executivo”


XXVIII. A recorrente juntou prova nesse concreto sentido listando os anos em divida da Recorrida, ao que acresce, a ata de 15/07/2023 em que se faz menção expressa à deliberação de que a Recorrida tem de pagar o valor aprovado na Assembleia anterior à de agosto de 2018, mais se afirmando que esta era a maior devedora do prédio, onde foi inclusivamente proposto a votação e aceite avançar com ação judicial pelo valor ali mencionado, contra esta.


XXIX. Atendendo a que as invocadas prescrições só fazem sentido quanto ao ano de 2018 e os pagamentos dos restantes anos, estão efetivamente em falta, requer-se a V. Exas. seja a Recorrida, condenada a pagar as contribuições dos anos 2019 a 2022, por se encontrarem vencidas e em divida, nada mais havendo a determinar, para além de ordenar o prosseguimento da execução quanto a estas contribuições.


XXX. Caso assim não se entenda, requer-se a V. Exas. seja a Recorrida, condenada a pagar a contribuição do ano de 2022, bem como o pagamento da contribuição extraordinária, tal como peticionado por estarem reunidos os pressupostos previstos no art.º 6º do Decreto-Lei n.º 268/94, de 25/10, quanto ao título executivo destes valores.


Termos em que, e sempre com o douto suprimento de Vossa Excelência, deverá o presente recurso ser aceite e determinado a revogação da sentença no segmento em que considera que a recorrente não tem titulo executivo quer quanto à contribuição de 2022, no valor de € 4.613,04 (quatro mil seiscentos e treze euros e quatro cêntimos) quer quanto à contribuição extraordinária, no valor de € 3.978,97 (três mil novecentos e setentas e oito euros e noventa e sete cêntimos) por se encontrarem reunidos os requisitos para a existência do titulo executivo, não devendo pois ser extinta a execução, quanto a estas verbas.


Já quanto a dispor de título executivo quanto a tudo o mais, é do entendimento da Recorrente que também estas dividas da recorrida deviam estar integradas no título executivo ora presente, o que se requer a V. Exas. pelo que, relativamente às quais, não deverá ser extinta a execução.


Porém, Vossas Excelências, Venerandos Juízes Desembargadores, decidiram como for de Justiça Assim se fazendo a costumada JUSTIÇA.

4. Contra-alegou a Embargante/Executada defendendo a procedência integral dos embargos.


Porém, tal pretensão só poderia ser alcançada caso o embargante/executado tivesse, ele próprio, interposto recurso (subordinado), o que não fez.

5. As questões colocadas nas conclusões do recurso da apelante – que delimitam o seu objecto (cfr.artºs 608º/2, 609º, 635º/4, 639º e 663º/2, todos do CPC) –são as seguintes:

1. Se a execução deve prosseguir também quanto à contribuição de 2022, no valor de € 4.613,04 (quatro mil seiscentos e treze euros e quatro cêntimos) quer quanto à contribuição extraordinária, no valor de € 3.978,97 (três mil novecentos e setentas e oito euros e noventa e sete cêntimos);

2. Se não ocorre prescrição das quotizações vencidas entre 2019 e 2022.


II. FUNDAMENTAÇÃO


6. É o seguinte o teor da decisão de facto inserta na sentença recorrida


“Com relevância para a decisão da causa, encontram-se provados os seguintes factos:


1º-O Exequente/Embargado é o Condomínio do Bloco Galeão, sito em Bloco Galeão, Rua da Beirinha, 8700-383 olhão.


2º-A Embargante é proprietária da fracção autónoma designada por A-100 do prédio acima referido.


3º-Na assembleia de condóminos de 18/2/2023, entre outros, foi deliberado aprovar o orçamento para 2023.


4º-Da assembleia acima referida foi elaborada a respectiva acta onde, entre outros, ficou a constar que foi aprovado o orçamento para 2023 e que o orçamento e quotizações a serem pagas por cada fracção são anexas à acta e fazer parte integrante da mesma- cfr. documento junto com o requerimento executivo e que aqui se dá por reproduzida.


5º-A acta acima referida com as assinaturas dos condóminos, com 4 páginas, mas desacompanhada de qualquer anexo, foi junta com o requerimento executivo e apresentada como um dos títulos executivos em que se funda a execução.


6º-Na assembleia de condóminos de 15/7/2023, entre outros, foi deliberado aprovar a reparação do elevador, com o valor de 10.221,30 euros (com IVA incluído), a pagar como contribuição extraordinária em conformidade com a permilagem, cabendo à fracção A a quantia de 3.978,97 euros (relativa à permilagem de 389,22) e a quantia de 70,14 euros para cada uma das outras 89 fracções (sendo a permilagem de 6,862 cada)-cfr. documento junto com o requerimento executivo e que aqui se dá por reproduzida.


7º-Na mesma assembleia de condóminos de 15/7/2023 foi lida a listagem de dividas ao condomínio já vencidas e que foi anexa à acta elaborada dessa assembleia.


8º-Na listagem acima referida consta que à data de 15/7/2023 relativamente à fracção A, apartamento 100, encontrava-se em divida a quantia de 4.613,04 euros respeitante a 2022 e a quantia de 8.934,80 euros respeitante a 2022- cfr. documento junto com o requerimento executivo e que aqui se dá por reproduzida.


9º-Das deliberações acima referidas em 6º a 8º foi elaborada acta apresentada com o requerimento executivo e como um dos títulos executivos em que se funda a execução


10º-As deliberações acima referidas em 3º a 8º, com referência ao teor das actas referidas em 3º e 9º, foram objecto de impugnação judicial, em acções instauradas pela aqui Embargantes, ambas julgas improcedentes com fundamento na caducidade do direito.


11º-No caso da deliberação e acta referida em 6º e 7º correu termos o procedimento cautelar n.º 882/23.8... do 2º Juízo de Competência Genérica de Olhão, em que foi Requerente a aqui Embargante e Requerido a “Administração do Condomínio do Bloco Galeão do Edifício”, tendo por objecto as deliberações tomadas nessa assembleia e que foi julgada improcedente por sentença proferida em 11/11/2023- cfr. documento junto com a petição de embargos.


12º-Em momento posterior ao da celebração da acta referida em 4º e 5º, pelo administrador do condomínio foi apagado com tinta corretora o traço aposto na última página e após a última assinatura dos intervenientes na assembleia e, nesse espaço, foram escritos os seguintes dizeres: «Em tempo: Após conclusão da Ata foi detectado um erro na passagem do número de votos “a favor”, onde se lê no ponto 1 e 3 que foi aprovada por unanimidade, deve ler-se, com a abstenção do Proprietário da Fracção DV Apartamento 615. Por ser verdade efetua-se esta correcção à Ata, a qual vai ser assinada pro mim, administradora do condomínio, que a redigi. 23/03/2023 AA.»-cfr. documento junto em 14/1/2025.


13º-A acta com a alteração acima apontada e agora acompanhada do anexo composta por duas folhas, incluindo a denominada proposta orçamento para 2023, foi junta aos autos em 14/1/2025 e na sequência do despacho proferido em 13/1/2025.


14º-No anexo à acta acima referida, constituído pela “proposta orçamento para 2023” consta que o valor da quotização anual e fundo de reserva soma a quantia de 39.347,00 euros, sendo a quotização mensal para a fracção A de 1.276,40 euros (permilagem 389,282) e para os demais apartamentos 22,50 euros (permilagem de 6,862).


15º-A acta referida em 11º, nos termos que aí consta, não foi notificada ou comunicada aos condóminos, que receberam apenas a acta na versão referida em 4º e 5º.


16º-No Regulamento do Condomínio do Bloco Galeão prevê-se sob o n.º 1 do artigo 12º:


«As quotas do condomínio poderão ser pagas em 12 prestações mensais, sempre por antecipação, isto é o condomínio do mês corrente é pago até ao dia 8 deste mesmo mês, poderão ser pagos também em 4 prestações trimestrais, sendo pago até aos dias 8 dos meses de Janeiro, Abril, Julho e Outubro; poderão ainda ser pagos em 2 prestações semestrais, sendo a primeira paga até ao dia 8 dos meses de Janeiro e a segunda paga até ao dia 8 de Julho.» Cfr. documento junto com a petição de embargos.


17º-A exequente emitiu uma declaração datada de 20/11/2023 onde fez constar os valores que entende em dívida pela aqui Embargante e relativos ao período de 2018 a 2023- cfr. documento junto com o requerimento executivo e que aqui se dá por reproduzido”

7. Do mérito do recurso

1. Vejamos então se a execução deve prosseguir também quanto à contribuição de 2022, no valor de € 4.613,04 (quatro mil seiscentos e treze euros e quatro cêntimos) quer quanto à contribuição extraordinária, no valor de € 3.978,97 (três mil novecentos e setenta e oito euros e noventa e sete cêntimos).


O Tribunal “a quo” após ter explicitado os requisitos que as actas de condomínio devem revestir para serem títulos executivos, aprecia as actas das assembleias de condóminos realizadas em 18/2/2023 e 15/7/2023 que para o efeito foram dadas à execução e conclui que apenas a acta de 18/2/2023 na qual consta que foi deliberado aprovar o orçamento para 2023, constando no anexo a essa acta que para o ano de 2023 a Embargante terá de pagar a quotização mensal de 1.276,40 euros constitui título executivo.


Relativamente à acta de 15/7/2023 em foi deliberado aprovar a reparação do elevador, com o valor de 10.221,30 euros (com IVA incluído), a pagar como contribuição extraordinária em conformidade com a permilagem, cabendo à fracção A a quantia de 3.978,97 euros (relativa à permilagem de 389,22) e a quantia de 70,14 euros para cada uma das outras 89 fracções (sendo a permilagem de 6,862 cada) porque não foi estipulada a data de vencimento (nem resultando do Regulamento do condomínio o tempo de pagamento das contribuições extraordinárias) da mesma, entende que fenece um dos requisitos para a mesma constituir título executivo.


Explica igualmente que a listagem de dívidas ao condomínio já vencidas e que foi anexa à acta elaborada dessa assembleia não é suficiente para preencher os requisitos exigidos por lei para constituir título executivo relativamente a essas quotizações.


Vejamos se lhe assiste razão.


O art.º 703.ºdo CPC esclarece que :


“1- À execução apenas podem servir de base:


a) As sentenças condenatórias;


b) Os documentos exarados ou autenticados, por notário ou por outras entidades ou profissionais com competência para tal, que importem constituição ou reconhecimento de qualquer obrigação;


c) Os títulos de crédito, ainda que meros quirógrafos, desde que, neste caso, os factos constitutivos da relação subjacente constem do próprio documento ou sejam alegados no requerimento executivo;


d) Os documentos a que, por disposição especial, seja atribuída força executiva.


2 – (…)”.


É precisamente no art.º6º do D.L. nº268/94, de 25.10 na sua actual redacção 1que se consagra uma destas situações:


“1 - A ata da reunião da assembleia de condóminos que tiver deliberado o montante das contribuições a pagar ao condomínio menciona o montante anual a pagar por cada condómino e a data de vencimento das respetivas obrigações.


2 - A ata da reunião da assembleia de condóminos que reúna os requisitos indicados no n.º 1 constitui título executivo contra o proprietário que deixar de pagar, no prazo estabelecido, a sua quota-parte.


3 - Consideram-se abrangidos pelo título executivo os juros de mora, à taxa legal, da obrigação dele constante, bem como as sanções pecuniárias, desde que aprovadas em assembleia de condóminos ou previstas no regulamento do condomínio.


4 - O administrador deve instaurar ação judicial destinada a cobrar as quantias referidas nos n.os 1 e 3.


5 - A ação judicial referida no número anterior deve ser instaurada no prazo de 90 dias a contar da data do primeiro incumprimento do condómino, salvo deliberação em contrário da assembleia de condóminos e desde que o valor em dívida seja igual ou superior ao valor do indexante dos apoios sociais do respetivo ano civil.”.


Por conseguinte, através desta disposição é atribuída força executiva à acta da assembleia de condóminos que reúna determinados requisitos, permitindo-se ao condomínio instaurar acção executiva contra o proprietário da fracção, condómino devedor, relativamente à sua contribuição para as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns e ao pagamento de serviços de interesse comum sem que, previamente, tenha que lançar mão ao processo de declaração a fim de obter o reconhecimento da existência daquela(s) dívida(s).


Que requisitos deve então revestir a acta de condomínio para que possa servir de título executivo?


Como decorre dos nºs 1 e 2 da citada norma, tais requisitos reconduzem-se à:


-Deliberação sobre o montante das contribuições ou despesas devidas ao condomínio;


-Fixação da quota-parte devida por cada condómino;


-Fixação do prazo de pagamento respectivo.


Apenas a acta que preencha estes requisitos constitui fonte da obrigação exequenda e vale como expressão da vontade do colectivo que se impõe aos condóminos, ainda que não tenham aprovado a dívida.


Conquanto na acta não seja mencionado o prazo para pagamento da despesa com os elevadores, cremos que o prazo fixado no regulamento do condomínio se aplica, com as devidas adaptações, a todas as quotizações.


Efectivamente, nele se alude ao prazo de pagamento das “quotas do condomínio” não se fazendo qualquer distinção entre quotizações ordinárias e extraordinárias. E, por isso, não distinguindo a lei, neste caso o regulamento, tais realidades, não deve o interprete fazê-lo.


Note-se que nada obsta que o regulamento do condomínio – que na sua essência se destina a disciplinar o uso, fruição e conservação das partes comuns (artº.1429º-A do Cód.Civil) – contenha normas de carácter regulamentar, i.e. que estabeleçam prazos para pagamento das quotizações, como sucede no caso.


Tratando-se de uma quotização extraordinária aprovada em 15.7.2023 deveria a mesma ter sido liquidada, de acordo com o regulamento, até ao dia 8 do mês subsequente.


Por conseguinte, não há quaisquer dúvidas, face ao título e ao regulamento de que a obrigação em apreço se encontra vencida e é exigível.


Já no que concerne listagem de dívidas ao condomínio já vencidas e que foi anexa à acta elaborada dessa assembleia de 15.7.2023 relativas a quotizações anteriores, é manifesto que não há título executivo que as suporte.


Como se refere no Acórdão do STJ de 02-06-2021 (Pº 1549/18.4T8SVL-A.E1.S1, rel. FERREIRA LOPES): “Para valer como título executivo nos termos do art.º 6º do DL nº 268/94 de 25.10, a acta da assembleia de condomínio tem de conter a deliberação sobre o montante das contribuições ou despesas devidas ao condomínio, a fixação da quota-parte devida por cada condómino e o prazo de pagamento respectivo. A acta que se limita a documentar a aprovação pela assembleia da existência de uma dívida de um condómino por não pagamento de quotas, tal como referido pela administração, não reúne os requisitos de exequibilidade que resultam do art.º 6º do DL n 268/94”.


A execução para pagamento de uma determinada ( e certa) quantia na medida em que permite a realização coactiva da prestação devida - cfr. n.º 4 do art.º 10.º do C.P.C- pressupõe e exige um título suficientemente revelador da existência da dívida.


Por isso, nem todas as actas do condomínio são título executivo, só podendo revestir tal qualidade quando demonstrem ao Tribunal a existência do direito de crédito exequendo.


Não o revelando, deverá o credor em competente acção declarativa efectuar tal demonstração.

2. Pretende igualmente o apelante que se aprecie a questão da prescrição das quotas no sentido da sua improcedência.


Mas o certo é que a sentença recorrida não apreciou tal questão.


Efectivamente, basta atentar no que na sentença é dito: “Assim sendo a exequente apenas dispõe de titulo executivo para as contribuições de 2023 no valor de 15.316,80 euros, mas não dispõe quanto a tudo o mais (incluindo as alegadas despesas de pré-contencioso) relativamente ao qual deverá ser extinta a execução.


Atendendo a que as invocadas prescrições e pagamento não respeita às contribuições de 2023, nada mais cumpre determinar, para além de ordenar o prosseguimento da execução apenas quanto às contribuições de 2023.”.


Como é consabido, no nosso sistema processual predomina o «esquema do recurso de reponderação: o objeto do recurso é a decisão impugnada, encontrando-se à partida, vedada a produção de efeitos jurídicos “ex-novo”. Através do recurso, o que se visa é a impugnação de uma decisão já ex ante proferida, que não o julgamento de uma qualquer questão nova2.”


Por isso está vedado a este Tribunal apreciar uma questão que não foi – justificadamente, diga-se de passagem – apreciada na sentença recorrida.


É que se a acta não constitui título executivo para cobrança de tais quotizações, fica prejudicado o conhecimento da prescrição das mesmas.


III. DECISÃO


Por todo o exposto se julga a apelação parcialmente procedente e, em consequência, altera-se a alínea A) do dispositivo de modo a nela ser contemplado não só as contribuições relativas ao ano de 2023, no valor global de 15.316,80 euros (quinze mil, trezentos e dezasseis euros e oitenta cêntimos) mas também a contribuição extraordinária, no valor de € 3.978,97 (três mil novecentos e setenta e oito euros e noventa e sete cêntimos).


Custas por apelante e apelado na proporção do decaimento.


Évora, 16 de Outubro de 2025


Maria João Sousa e Faro (relatora)


Ricardo Miranda Peixoto


Filipe Aveiro Marques

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1. Emergente da Lei n.º 8/2022, de 10/01.↩︎

2. Assim, FRANCISCO FERREIRA DE ALMEIDA “Direito Processual Civil”, Vol. II, 2.ª Ed., Almedina, 2019, p. 468.↩︎