Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
367/24.5T8SNS.E1
Relator: EMÍLIA RAMOS COSTA
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO A TERMO CERTO
ACRÉSCIMO EXCEPCIONAL DE ACTIVIDADE DA EMPRESA
JUSTIFICAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
FORMALIDADES AD SUBSTANTIAM
ÓNUS DA PROVA
Data do Acordão: 07/10/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA RECORRIDA
Área Temática: SOCIAL
Sumário: Sumário elaborado pela relatora (art. 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil):

I – A entidade empregadora só pode recorrer à celebração de um contrato de trabalho a termo resolutivo (certo ou incerto) para satisfação de necessidades temporárias, objetivamente definidas pela entidade empregadora e apenas pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades.


II – Os contratos a termo têm de observar obrigatoriamente a forma escrita, neles tendo de constar, entre outros elementos, a indicação do termo estipulado e do respetivo motivo justificativo, devendo a indicação do motivo justificativo do termo ser feita com menção expressa dos factos que o integram, estabelecendo-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, sob pena de, em caso de omissão ou insuficiência das referências ao termo e ao motivo justificativo, se considerar o contrato de trabalho sem termo.


III – Será sempre em face dos factos justificativos que se mostram apostos no termo que se terá de apreciar da veracidade dos mesmos e da sua adequação à necessidade de celebração de um contrato a termo, uma vez que estamos perante uma formalidade ad substantiam, cabendo esse ónus da prova à entidade empregadora.


IV – É de converter em contrato de trabalho sem termo o contrato de trabalho a termo certo, onde consta como motivo justificativo de tal termo que a entidade empregadora, nas suas diversas atividades sociais, é subsidiada pela Segurança Social em função do número de utentes que a si recorrem, sendo imprevisível as oscilações dos utentes, pelo que nunca sabe com que apoios da Segurança Social pode contar, não sendo, por isso, possível assegurar o posto de trabalho da referida trabalhadora por tempo indeterminado.


V – E isto porque dessa fundamentação não resulta quaisquer factos concretos de onde se possa inferir (i) que, à data da contratação daquela específica trabalhadora, houve um acréscimo excecional da atividade da entidade empregadora, e (ii) que esse acréscimo excecional da atividade teria previsivelmente uma duração de 12 meses.

Decisão Texto Integral: Proc. n.º 367/24.5T8SNS.E1

Secção Social do Tribunal da Relação de Évora1





Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:


I – Relatório


O Ministério Público intentou ação especial de reconhecimento da existência de contrato de trabalho sem termo, nos termos dos arts. 186.º-K e seguintes do Código de Processo do Trabalho e arts. 2.º, n.º 3, 3.º e 15.º-A, n.º 3, da Lei n.º 107/2009, de 14-09, na redação conferida pela Lei n.º 13/2023, de 03-04, contra a Ré “Casa do Povo de Local 1”, solicitando, a final, que a ação seja julgada procedente, por provada, declarando-se a existência de um contrato de trabalho sem termo, com início a 01-04-2024, celebrado entre a Ré e a trabalhadora AA2





Citada a Ré, veio a mesma contestar, impugnando os factos constantes da petição inicial.





Proferido despacho saneador, foi efetuado o saneamento do processo, apreciados os requerimentos de prova e marcado o julgamento.





Realizado o julgamento, foi proferida a respetiva sentença, em ...-...-2025, com o seguinte teor decisório:

Pelo exposto, o tribunal julga a presente acção procedente por provada e, em consequência, declara a existência de um contrato de trabalho sem termo, com início a 1 de Abril de 2024, celebrado entre a Ré Casa do Povo de Local 1 e AA.

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Custas pela ré [art.º 527.º, n.º 1 e 2, do Código do Processo Civil, aplicável ex vi art. 1.º n.º 2 al. a) do Código de Processo do Trabalho], sem prejuízo da isenção de que beneficia.

*

Valor da acção: €2.480,00 (dois mil quatrocentos e oitenta euros) - art.º 12.º n.º 1 al. e) do Regulamento das Custas Processuais ex vi do art.º 186.º-Q, n.º 1 e 2, do Código de Processo do Trabalho, conforme supra justificado.

*

Após trânsito em julgado, comunique-se a decisão á Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) – Unidade Local do Litoral e Baixo Alentejo e ao Instituto da Segurança Social, I.P., cfr. art.º 186.º-O, n.º 9, do CPT.

Registe e notifique.




Não se conformando com a sentença, veio a Ré interpor recurso de apelação, terminando com as seguintes conclusões:

A. A Casa do Povo de Local 1, R. e ora recorrente, celebrou com AA um contrato de trabalho a termo certo, pelo prazo de um ano, com início em 01 de abril de 2024 e termo em 31 de março de 2025, com vista ao exercicio das funções de Ajudante de Ação Educativa.

B. Nesse contrato ficou estipulado que a contratação da segunda outorgante (AA) “fundamenta-se nos termos da nº 1 e 2, alínea a) do artigo 140 do código do trabalho, uma vez que a primeira outorgante (A casa do povo de Local 1) tendo acordo de cooperação com a Segurança Social para financiar o funcionamento das respostas sociais, centro de dia e serviço de apoio domiciliário a pessoas idosas ou acamadas, serviço de refeições nas próprias instalações e bem assim apoios para o serviço de creche, jardim de infância e ATL, atividade social subsidiada pela Segurança Social em função do numero de utentes da primeira outorgante, o qual tem oscilações imprevisíveis com repercussão nas comparticipações fornecidas pela Segurança Social, daí que não haja certeza de que os mesmos se prolonguem por tempo indeterminado e nas mesmas condições, o que tem implicação direta na maior ou menor necessidade de mão de ora disponível para responder as necessidades das respostas sociais e dai que não seja possível assegurar o posto de trabalho da segunda outorgante por tempo indeterminado” .

C. O Trbunal a quo, conhecendo do termo justificativo aposto no contrato de trabalho ora em causa, entendeu que o mesmo era NULO.

D. Com efeito, a Decisão recorrida enferma de erro de julgamento ao considerar insuficiente e inverídica a fundamentação para a celebração do contrato de trabalho a termo certo entre a Casa do Povo de Local 1 e AA.

E. O contrato de trabalho celebrado expõe de forma clara os fundamentos legais e materiais para a aposição do termo, nomeadamente a dependência do financiamento público variável e incerto, vinculado ao número de utentes assistidos no ambito das respostas sociais objecto de acordo de cooperação com a Segurança Social.

F. A matéria de facto dada como provada na sentença confirma a oscilação do número de utentes e das comparticipações financeiras da Segurança Social, bem como a imprevisibilidade da procura do serviço de ATL, Ceche e Jardim de Infancia elementos que justificam a necessidade de flexibilidade laboral e a contratação a termo.

G. A oscilação do número de utentes dos serviços sociais prestados pela Casa do Povo de Local 1, em especial o serviço de ATL, Creche e Jardim de Infancia, é um facto incontornável e reconhecido pelo próprio Tribunal a quo, não sendo possível antecipar desistências, nem controlar saídas de utentes, o que reforça a imprevisibilidade que justifica a contratação a termo.

H. As Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS), como é o caso da Casa do Povo de Local 1, ora R, atuam n âmbito da economia social, em conformidade com os principios da solidadariedade, da subsididredade e da promoção do bem comum, conforme consagrado no artigo 64 e 72 da CRP e na Lei baes da economia social (Lei 30/23 de 8/05).

I. Estas Instituições, sem fins lucrativos, têm como missão o interesse público, sendo que a sua sustentabilidade e viabilidade depende diretamente do equilíbrio entre as receitas (essencialmente públicas) e as despesas.

J. A Casa do Povo de Local 1, R. e ora recorrente. recebe apoios financeiros da Segurança Social, sempre em função do numero de utentes a quem presta apoio social, nunca em função numero de trabalhadores ao seu serviço.

K. Qualquer diminuição da procura dos serviços sociais que a Casa do Povo de Local 1 reflete-se de imediato nas receitas da mesma e nas contas finais, sem que essa diminuição se reflita nas despesas, nomeadamente de natureza laboral.

L. A gestão das Instituições sociais, como é o caso da Caso do Povo de Local 1, exige maior rigor, pois não há “almofada” financeira para periodos de baixa procura, o que pode comprometer o seu objecto social e a continuidade dos serviços prestados, quando estas situações.

M. A distinção feita pelo Tribunal a quo entre utentes abrangidos ou não por acordos de cooperação com a Segurança Social é irrelevante, uma vez que toda a oscilação no número de utentes impacta diretamente nas receitas da instituição e, consequentemente, na sua capacidade de manter postos de trabalho.

N. A justificação do termo resolutivo aposta no contrato não é vaga, abstrata ou genérica, mas concreta e diretamente ligada às condições de financiamento público e à variabilidade da procura dos serviços sociais prestados, como impõem os artigos 140.º e 141.º do Código do Trabalho.

O. O termo resolutivo aposto no contrato em apreço respeita os requisitos legais dos artigos 140.º e 141.º do Código do Trabalho e não colide com o artigo 53.º da CRP, antes compatibiliza o direito ao emprego com a sustentabilidade financeira da Ré, em linha com os princípios constitucionais da solidariedade e da promoção do bem comum.

P. O modelo de financiamento exige uma gestão laboral flexível e ajustada à realidade económica da instituição.

Q. O Tribunal a quo questiona a fixação do prazo de 12 meses, mas a Casa do Povo justifica a escolha com a necessidade de oferecer alguma estabilidade à trabalhadora, considerando as flutuações nas necessidades dos serviços sociais.

R. Um contrato a termo certo oferece à trabalhadora mais segurança e previsibilidade em relação a um contrato a termo incerto, permitindo-lhe planejar a sua vida pessoal e profissional.

S. A opção por um contrato a termo certo visa conciliar a estabilidade social da trabalhadora com a sustentabilidade financeira da instituição, ajustando os recursos humanos conforme as oscilações dos financiamentos públicos e a procura pelos serviços sociais.

T. A decisão do Tribunal a quo não valoriza devidamente o contexto particular da atividade da Ré, nem a especificidade do regime de financiamento das IPSS, sendo certo que a jurisprudência e a doutrina reconhecem estas especificidades como fundamento legítimo para contratos a termo

U. O princípio da estabilidade no emprego (art. 53.º da CRP) deve ser interpretado em equilíbrio com os princípios da subsidiariedade e da promoção do bem comum (artigos 63.º e 72.º da CRP), aplicáveis à atuação das IPSS.

V. A interpretação do Tribunal a quo sobre os requisitos legais do contrato a termo é excessivamente formalista, literal, rigida, imbuida de um elevado grau de subjetivisnmo, desconsiderando o contexto social de atuação da Instituição, comprometendo a aplicação justa e equilibrada das normas legais aplicaveis ao contrato de trabalho a termo ora em causa.

W. O Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 23/01/2025 refere que a justificação do termo no contrato de trabalho deve ser clara e especifica, o que está refletido no contrato de trabalho ora em causa.

X. Tambem o voto de vencido no Acórdão do STJ de 21/09/2022, refere que a justificação não deve ser excessivamente detalhada, mas deve ser suficiente para compreender o motivo da contratação a termo, o que tambem é atendido no caso ora em causa.

Y. Assim, o termo justificativo não enferma de qualquer nulidade, sendo legítima a contratação a termo certo da trabalhadora AA não existindo violação do disposto nos artigos 140º, nº1 alínea f), o artigo 141º, nº 1, alínea e) e 3 e bem assim o artigo 53º da C.R.P..

Z. O Tribunal a quo, ao considerar nulo o termo justificativo, desconsiderou a realidade concreta e factual provada nos autos, nomeadamente a variação do número de utentes e do financiamento associado e a respectiva interconexão, violou os artigos 140º, nº1 alínea f), o artigo 141º, nº 1, alínea e) e 3 e bem assim o artigo 53º da C.R.P..

Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis, e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deve a Douta Sentença, ora sob recurso, proferida pelo Tribunal a quo, ser revogada e substituída por Douto Acordão que absolva a R. do pedido contra si formulado pelo Ministério Publico, fazendo-se assim, mais uma vez, sã, serena e objetiva JUSTIÇA




O Ministério Público apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso, devendo manter-se inalterada a sentença recorrida.





O tribunal de 1.ª instância admitiu o recurso como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo, após a subida dos autos ao Tribunal da Relação, sido tal recurso admitido nos seus precisos termos.


Após a ida aos vistos, cumpre, agora, apreciar e decidir.





II – Objeto do Recurso


Nos termos dos arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis por remissão do art. 87.º, n.º 1, do Código de Processo de Trabalho, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da recorrente, ressalvada a matéria de conhecimento oficioso.


No caso em apreço, a questão que importa decidir é:


1) Validade do termo justificativo.





III – Matéria de Facto


O tribunal de 1.ª instância deu como provados os seguintes factos:

1. A ré é uma pessoa colectiva de utilidade pública, tendo por objecto social desenvolver actividades de carácter social, cultural e outras, em colaboração com o Estado, as Autarquias e outas instituições da mesma natureza, proporcionando-lhes apoio que em cada caso se justifique, por forma a contribuir para a resolução dos problemas da população da respectiva área, prestando serviços e outras iniciativas de promoção de bem-estar e qualidade de vida das pessoas, famílias e comunidades, nomeadamente no domínio do apoio à família e pessoas idosas.

2. Para esse efeito, a ré detém um Centro de Dia, denominado Centro de Dia de ..., com instalações sitas na Rua 1, n.º 10, em Local 1, onde desenvolve serviços a idosos, utentes do Centro de Dia de ..., designadamente refeições e actividades sociais, prestando também outros serviços de apoio domiciliário a pessoas idosas ou acamadas.

3. Também detém uma valência no âmbito de apoio às famílias, com serviços de creche, jardim de infância e ATL.

4. Para desenvolver a prestação destes serviços, a ré contrata diversos trabalhadores.

5. Entre esses trabalhadores a ré admitiu ao seu serviço, a 01.04.2024, AA, atribuindo-lhe as funções de ajudante de acção educativa.

6. Fê-lo por documento escrito intitulado “Contrato de Trabalho a Termo Resolutivo”, datado de 01.04.2024.

7. Por esse acordo, sob a cláusula 2.ª, o local de trabalho seria a sede da ré sita em Local 1, ou em outras instalações pertencentes à ré, podendo exercer fora desses locais, nomeadamente acompanhamento de utentes da ré em deslocações fora da área de abrangência do seu objecto.

8. Por esse acordo, sob a cláusula 3.ª, foi estipulado que o período normal de trabalho seria de quarenta horas semanais, 8 horas diárias, distribuídas de segunda a sexta-feira, de acordo com o horário em vigor na sede da ré, fixado desde logo unilateralmente pela ré.

9. Por esse acordo, sob a cláusula 5.ª foi estipulado que em contrapartida do trabalho prestado, a trabalhadora auferiria uma retribuição mensal ilíquida no valor de €830,00, acrescida de refeição nas instalações da ré ou em outro local onde exercesse funções, a que foi atribuído o valor de €3,50 por cada dia completo de trabalho.

10.Resulta da cláusula 7.ª desse contrato:

«1.O presente contrato de trabalho é celebrado a termo certo, pelo prazo de um ano, com início em 01 de abril de 2024 e termo no dia 31 de março de 2025, renovável, por iguais ou diferentes e sucessivos períodos, enquanto não for denunciado por qualquer uma das partes nos termos da lei e do disposto no presente contrato.

2.A eventual renovação do presente contrato, só pode ocorrer até três vezes, sendo que a duração total das renovações não pode exceder a do período inicial fixado.

3. A contratação da segunda outorgante fundamenta-se nos termos do Nº 01 e 02 alínea a), do artigo 140.º, do Código do Trabalho, uma vez que a primeira outorgante tendo acordo de cooperação com a Segurança Social para financiar o funcionamento das respostas sociais, centro de dia e serviço de apoio domiciliário a pessoas idosas ou acamadas, serviço de refeições nas próprias instalações e bem assim apoios para o serviço de creche, jardim de infância e ATL, atividade social subsidiada pela Segurança Social em função do número de utentes da primeira outorgante, o qual tem oscilações imprevisíveis com repercussão nas comparticipações fornecidas pela Segurança Social, daí que não haja certeza de que os mesmo se prolonguem por tempo indeterminado e nas mesmas condições, o que tem implicação direta na maior ou menor necessidade de mão de obra disponível para responder ás necessidades das respostas sociais e daí que não seja possível assegurar o posto de trabalho da primeira outorgante por tempo indeterminado.»

11. Em 18.07.2024, pelas 14:10 horas, a Autoridade Para as Condições do Trabalho – Unidade Local do Litoral e Baixo Alentejo efectuou uma visita inspectiva à Instituição Casa do Povo de Local 1, visando a verificação dos requisitos materiais e formais dos contratos de trabalho a termo em vigor, no âmbito da agenda do trabalho digno.

12. Nesse âmbito, foram solicitados à ré os contratos de trabalho de diversas trabalhadoras, entre os quais, a trabalhadora AA, que se encontrava a exercer as suas funções no Centro Infantil e na ATL do Local 2.

13. Nessa sequência, foi apresentado ao Sr. Inspector do Trabalho o contrato de trabalho datado de 01.04.2024.

14. Foi então concluído pelo Senhor Inspector do Trabalho que os motivos justificativos da celebração do contrato de trabalho a termo certo por doze meses, existentes neste contrato referente a AA não se verificaram, já que apesar de ser indicado o artigo 140.º, n.º 1 e 2 al. a), do Código do Trabalho não ocorreu substituição directa ou indirecta de qualquer trabalhador e as restantes referências eram insuficientes e genéricas, sem menção expressa dos factos que integram o motivo justificativo da aposição do termo, tendo sido lavrado o correspondente “Auto por inadequação do vínculo que titula a prestação de uma atividade Artigo 15.º-A, da Lei n.º 107/2009”, com este fundamento.

15. A ré foi notificada desse auto para, no prazo de 10 dias, regularizar a situação ou pronunciar-se, dizendo o que tivesse por conveniente, sendo que caso decidisse regularizar a situação, deveria fazer prova de tal regularização perante a ACT, mediante a apresentação de Declaração assinada por ambas as partes (Empregador e Trabalhadora) reconhecendo o vínculo Sem termo/Efectividade.

16. A ré não procedeu á regularização nos termos para os quais foi notificada, pelo que com o fundamento, vertido no “Auto por inadequação do vínculo que titula a prestação de uma atividade Artigo 15.º-A, da Lei n.º 107/2009”, com data de 04.12.2024 foi elaborada Participação, a qual foi enviado ao Ministério Público junto deste Juízo do Trabalho, tendo dado entrada nessa mesma data.

17. AA foi contratada pela ré para assegurar os serviços prestados por esta, na parte da manhã, no Centro Infantil e, na parte da tarde, de ATL, no Local 2 e a partir de Setembro de 2024, exclusivamente no Centro Infantil, devido nessa altura ao aumento do número de crianças.

18. Com a contratação de AA não ocorreu substituição directa ou indirecta de qualquer trabalhador da ré.

19. AA manteve-se ao serviço da ré após 31.03.2025.

20. O número de utentes da ATL, da Creche e do Jardim de Infância de Minas do Local 2 pode ser variável e incerto.

21. No Centro Infantil do Local 2, resposta social Creche, com uma capacidade de 12 utentes:

-em Janeiro/2024, a ré tinha 6 utentes abrangidos pelo Acordo de Cooperação com a Segurança Social, celebrado em 30.08.1999 e com última revisão em 01.09.2023, inexistindo utentes não abrangidos pelo Acordo e tendo sido verificada a saída de 2 utentes e a entrada de 1 utente;

-em Julho/2024, a ré tinha 6 utentes abrangidos por aquele Acordo de, inexistindo utentes não abrangidos pelo Acordo;

-em Outubro/2024, a ré tinha 6 utentes abrangidos por aquele Acordo de Cooperação e 1 utente não abrangido pelo Acordo, no total de 7 utentes;

-em Dezembro/2024, a ré tinha 6 utentes abrangidos por aquele Acordo de Cooperação e 2 utente não abrangido pelo Acordo, no total de 8 utentes.

22. No Centro Infantil do Local 2, resposta social estabelecimento de educação pré-escolar, com uma capacidade de 20 utentes e com a capacidade de 17 utentes abrangidos pelo Acordo de Cooperação com a Segurança Social, celebrado em 30.08.1999 e com última revisão em 01.09.2023:

- em Janeiro/2023, a ré tinha 12 utentes abrangidos pelo Acordo de Cooperação, inexistindo utentes não abrangidos pelo Acordo e tinha em número de 5 as vagas não ocupadas com justificação;

-em Março/2023, a ré tinha 13 utentes abrangidos por aquele Acordo de Cooperação, inexistindo utentes não abrangidos pelo Acordo e tinha em número de 4 as vagas não ocupadas com justificação;

-em Julho/2023, a ré tinha 14 utentes abrangidos por aquele Acordo de Cooperação, inexistindo utentes não abrangidos pelo Acordo e tinha em número de 3 as vagas não ocupadas com justificação;

-em Dezembro/2023, a ré tinha 12 utentes abrangidos por aquele Acordo de Cooperação, inexistindo utentes não abrangidos pelo Acordo e tinha em número de 5 as vagas não ocupadas com justificação;

-em Julho/2024, a ré tinha 14 utentes abrangidos por aquele Acordo de Cooperação, inexistindo utentes não abrangidos pelo Acordo e tinha em número de 3 as vagas não ocupadas com justificação;

-em Outubro/2024, a ré tinha 13 utentes abrangidos por aquele Acordo de Cooperação, inexistindo utentes não abrangidos pelo Acordo e tinha em número de 4 as vagas não ocupadas com justificação;

-em Dezembro/2024, a ré tinha 11 utentes abrangidos por aquele Acordo de Cooperação, inexistindo utentes não abrangidos pelo Acordo e tinha em número de 6 as vagas não ocupadas com justificação.

23. Parte dos serviços sociais prestados pela ré aos seus utentes são comparticipados em função do um número de utentes pré-estabelecido, inexistindo comparticipação quanto aos demais utentes além daquele número fixado nos Acordos de Cooperação com a Segurança Social, sendo neste caso o serviço pago pelos utentes.

24. Existindo uma capacidade máxima de utentes, com número pré-definido de utentes abrangidos nos Acordos de Cooperação com a Segurança Social e com número pré-definido de utentes não abrangidos por esses Acordos, a procura de serviços, como de Creche e Jardim de Infância pode variar.

25. Desde o início do ano de 2023 até Dezembro de 2024 houve variações das comparticipações pagas pela Segurança Social á ré.

26. Os recursos financeiros da R. decorrem maioritariamente dos Acordos de Cooperação que esta tem com a Segurança Social.

27. Se o número de utentes num determinado momento for superior ao limite estabelecido nos Acordos de Cooperação, a R. não recebe qualquer comparticipação da Segurança Social relativamente a esses utentes não abrangidos pelos Acordos.

28. Caso o número de utentes diminua abaixo do número fixado nos Acordos de Cooperação com a Segurança Social, o financiamento é reduzido em função dessa redução, após a sua comunicação pela ré.

29. A oscilação no número de utentes tem reflexo nas contas da ré.

30. Verificaram-se alterações no âmbito do financiamento da Segurança Social ao apoio do serviço de Creche e Jardim de Infância ao longo do ano de 2023 e 2024 em função do número de utentes.

31. Os resultados dos exercícios da ré, salvo o período de pandemia Covid 19 em 2020 e 2021, têm sido negativos.

32. Os financiamentos da Segurança Social destinam-se a cobrir as despesas associadas ao apoio a pessoas idosas, acamadas e o fornecimento de refeições e ao serviço de Creche e Jardim de Infância, sendo o número de utentes o principal factor para o cálculo do financiamento.


E deu como não provados os seguintes factos:

A. Na altura da admissão da trabalhadora em 01.04.2024, a ré estava a ser confrontada com um aumento excecional de pedidos de prestação de serviços de Creche e Jardim de Infância (educação pré-escolar).

B. A procura de serviços de ATL e de Creche e Jardim de Infância, no Local 2, antevia-se temporária aquando da contratação de AA




IV – Enquadramento jurídico


1 – Validade do termo justificativo


Entende a Ré que a sentença recorrida errou ao considerar insuficiente e inverídica a fundamentação constante do contrato de trabalho celebrado a termo certo com AA


Alegou que a referida fundamentação não é insuficiente porque se mostra exposta de forma clara, indicando, nomeadamente a dependência do financiamento público, variável e incerto, vinculado ao número de utentes assistidos no âmbito das respostas sociais, objeto de acordo de cooperação com a Segurança Social. E que é verdadeira porque a própria matéria factual dada como provada confirma a oscilação do número de utentes e das comparticipações financeiras da Segurança Social, bem como a imprevisibilidade da procura do serviço de ATL, Creche e Jardim de Infância, elementos que justificam a necessidade de flexibilidade laboral e a contratação a termo, não sendo possível antecipar desistências, nem controlar saídas de utentes, o que reforça a imprevisibilidade que justifica a contratação a termo.


Esclareceu ainda que a fixação do prazo de 12 meses se justificou com a necessidade de oferecer alguma estabilidade à trabalhadora, considerando as flutuações nas necessidades dos serviços sociais, sendo que um contrato a termo certo oferece à trabalhadora mais segurança e previsibilidade em relação a um contrato a termo incerto, permitindo-lhe planejar a sua vida pessoal e profissional.


Concluiu que a sentença recorrida não valorizou devidamente o contexto particular da atividade da Ré, nem a especificidade do regime de financiamento das IPSS, não enfermando, assim, o termo aposto de qualquer nulidade.


Apreciemos.


Dispõe o art. 140.º, nºs. 1 e 2, als. a) e f), do Código do Trabalho que:

1 - O contrato de trabalho a termo resolutivo só pode ser celebrado para a satisfação de necessidades temporárias, objetivamente definidas pela entidade empregadora e apenas pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades.

2 - Considera-se, nomeadamente, necessidade temporária da empresa:

a) Substituição directa ou indirecta de trabalhador ausente ou que, por qualquer motivo, se encontre temporariamente impedido de trabalhar;

(…)

f) Acréscimo excepcional de actividade da empresa;

Dispõe o art. 141.º do Código do Trabalho que:

1 - O contrato de trabalho a termo está sujeito a forma escrita e deve conter:

a) Identificação, assinaturas e domicílio ou sede das partes;

b) Actividade do trabalhador e correspondente retribuição;

c) Local e período normal de trabalho;

d) Data de início do trabalho;

e) Indicação do termo estipulado, ou da duração previsível do contrato, e do respetivo motivo justificativo, consoante se trate, respetivamente, de contrato a termo certo ou incerto;

f) Datas de celebração do contrato e, sendo a termo certo, da respectiva cessação.

2 - Na falta da referência exigida pela alínea d) do número anterior, considera-se que o contrato tem início na data da sua celebração.

3 - Para efeitos da alínea e) do n.º 1, a indicação do motivo justificativo do termo deve ser feita com menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado.

4 - Constitui contra-ordenação grave a violação do disposto na alínea e) do n.º 1 ou no n.º 3.

Dispõe ainda o art. 147.º do Código do Trabalho que:

1 - Considera-se sem termo o contrato de trabalho:

a) Em que a estipulação de termo tenha por fim iludir as disposições que regulam o contrato sem termo;

b) Celebrado fora dos casos previstos nos n.os 1, 3 ou 4 do artigo 140.º;

c) Em que falte a redução a escrito, a identificação ou a assinatura das partes, ou, simultaneamente, as datas de celebração do contrato e de início do trabalho, bem como aquele em que se omitam ou sejam insuficientes as referências ao termo e ao motivo justificativo;

d) Celebrado em violação do disposto no n.º 1 do artigo 143.º

2 - Converte-se em contrato de trabalho sem termo:

a) Aquele cuja renovação tenha sido feita em violação do disposto no artigo 149.º;

b) Aquele em que seja excedido o prazo de duração ou o número de renovações a que se refere o artigo seguinte;

c) O celebrado a termo incerto, quando o trabalhador permaneça em actividade após a data de caducidade indicada na comunicação do empregador ou, na falta desta, decorridos 15 dias após a verificação do termo.

3 - Em situação referida no n.º 1 ou 2, a antiguidade do trabalhador conta-se desde o início da prestação de trabalho, excepto em situação a que se refere a alínea d) do n.º 1, em que compreende o tempo de trabalho prestado em cumprimento dos contratos sucessivos.

Atendendo ao disposto nos artigos citados do Código do Trabalho, a entidade empregadora só pode recorrer à celebração de um contrato de trabalho a termo resolutivo (certo ou incerto) para satisfação de necessidades temporárias, objetivamente definidas pela entidade empregadora e apenas pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades. Por sua vez, consideram-se necessidades temporárias todas aquelas que se mostram descritas no n.º 2 do art. 140.º do Código do Trabalho.


Exige-se ainda que os contratos a termo observem obrigatoriamente a forma escrita, neles tendo de constar, entre outros elementos, a indicação do termo estipulado e do respetivo motivo justificativo, devendo a indicação do motivo justificativo do termo ser feita com menção expressa dos factos que o integram, estabelecendo-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, sob pena de, em caso de omissão ou insuficiência das referências ao termo e ao motivo justificativo, se considerar o contrato de trabalho sem termo.


Por outro lado, os factos justificativos do termo têm de esclarecer os motivos que levaram à celebração de um contrato a termo, bem como a adequação do termo indicado às necessidades da entidade empregadora. Acresce que apenas os factos constantes da fundamentação da aposição do termo ao contrato de trabalho podem ser indicados na ação judicial, visto estarmos perante uma formalidade ad substantiam. Por sua vez, o ónus da prova desses factos é da entidade empregadora.


Conforme bem refere Monteiro Fernandes na obra Direito do Trabalho:3

É necessário, em suma, que a indicação requerida permita duas coisas: a verificação externa da conformidade da situação concreta com a tipologia do art. 140.º; e a realidade e a adequação da própria justificação invocada face à duração estipulada para o contrato.

Na verdade, a exigência legal da indicação de motivo justificativo é uma consequência do carácter excepcional que a lei atribui à contratação a termo e do princípio de tipicidade funcional que se manifesta no art. 140.º: o contrato a termo só pode ser (validamente) celebrado para certos fins e na medida em que estes o justifiquem.

Veja-se, a este propósito, também, o Código do Trabalho Anotado, de Pedro Romano Martinez e outros4, que se cita:

[…] apenas é susceptível de ser considerado motivo justificativo do termo a necessidade do empregador que seja concretizada no texto contratual, através da “menção expressa dos factos” que integram o aludido motivo. Na verdade, as razões determinantes da forma do negócio opõem-se a que a vontade real dos contraentes possa ter relevância na afirmação da validade da estipulação do termo, se essa vontade não estiver expressa no texto do contrato. Quer isto dizer que só podem ser considerados como justificação os fundamentos de facto constantes da cláusula contratual.

Ao impor a necessidade de redacção que permita com clareza relacionar a justificação invocada e o termo estipulado, a lei introduz significativo grau de exigência na concretização formal do motivo que permite a contratação a termo. Pretende-se que o nexo de causalidade entre o motivo invocado e a duração do contrato transpareça da mera apreciação formal da cláusula contratual relativa à estipulação do termo, para o que não basta a descrição da justificação e a indicação do prazo.

Cita-se, ainda, o acórdão do STJ, proferido em 09-06-2010:5

VI – A validade do termo resolutivo impõe que: (i) se mostrem vertidos no texto contratual factos recondutíveis a algum dos tipos legais de justificação plasmados no referido art. 41.º n.º 1 (da LCCT, depois o art. 129.º n.º 2 do CTrabalho de 2003); (ii) que esses factos tenham correspondência com a realidade.

VII – Assim a tarefa do tribunal, neste âmbito, pressupõe duas análises: - a de saber se o texto contratual obedece aos pressupostos legais da contratação precárias; - ultrapassado, sem mácula, esse crivo liminar, a de saber se o motivo invocado e o prazo previsto têm correspondência com a realidade prestacional do trabalhador contratado e com a conjuntura laboral da empresa.

VIII – O juízo censório do tribunal, no que se restringe à conformação legal da justificação, há-de circunscrever-se aos motivos factuais levados ao texto vinculístico, sendo irrelevantes todos os que, extravasando o clausulado, venham a ser aduzidos pelo empregador em juízo.

E, por fim, o Acórdão do STJ, proferido em 22-02-2017:6

I Para que se possa afirmar a validade do termo resolutivo aposto ao contrato é necessário que se explicitem no seu texto os factos que possam reconduzir ao motivo justificativo indicado e que tais factos tenham correspondência com a realidade.

Posto isto, apreciemos a situação em apreço.


Consta do facto provado 10 a fundamentação do termo aposta no contrato de trabalho celebrado entre a Ré e a trabalhadora AA e que foi a seguinte:

3. A contratação da segunda outorgante fundamenta-se nos termos do Nº 01 e 02 alínea a), do artigo 140.º, do Código do Trabalho, uma vez que a primeira outorgante tendo acordo de cooperação com a Segurança Social para financiar o funcionamento das respostas sociais, centro de dia e serviço de apoio domiciliário a pessoas idosas ou acamadas, serviço de refeições nas próprias instalações e bem assim apoios para o serviço de creche, jardim de infância e ATL, atividade social subsidiada pela Segurança Social em função do número de utentes da primeira outorgante, o qual tem oscilações imprevisíveis com repercussão nas comparticipações fornecidas pela Segurança Social, daí que não haja certeza de que os mesmo se prolonguem por tempo indeterminado e nas mesmas condições, o que tem implicação direta na maior ou menor necessidade de mão de obra disponível para responder ás necessidades das respostas sociais e daí que não seja possível assegurar o posto de trabalho da primeira outorgante por tempo indeterminado.

Em primeiro lugar, importa referir que, apesar de na citada fundamentação constar a al. a) do n.º 2 do art. 140.º do Código do Trabalho, a menção subsequente reporta-se ao que consta da al. f) desse n.º 2.


Efetivamente, não é feita qualquer referência a que a trabalhadora AA tenha ido substituir, direta ou indiretamente, uma trabalhadora temporariamente impedida de trabalhar. Por outro lado, ao aludir a oscilações imprevisíveis dos utentes que recorrem à Ré, apenas a al. f) poderá estar em causa.


Feita esta ressalva, apreciemos a fundamentação que a sentença recorrida teceu sobre a insuficiência da fundamentação aposta no contrato a termo certo:

A ré sustenta que os requisitos legais para a celebração de um contrato a termo estão integralmente preenchidos, pois na altura da admissão da trabalhadora, a ré tinha um aumento excepcional de pedidos de prestação de serviços, nomeadamente de Creche e Jardim de Infância, pelo que foi necessário aumentar a equipa de trabalhadores para responder á procura, conforme descrito no termo justificativo do contrato, o que justifica uma resposta flexível e adaptada, pois qualquer oscilação no número de utentes que não seja acompanhada de redução de custos, em especial no de mão de obra, coloca de imediato em causa as contas da ré que se encontra dependente de financiamento ao abrigo dos Acordos de Cooperação com a Segurança Social.

O motivo justificativo inserido no contrato não parece espelhar com clareza e rigor o alegado, já que, reportando-se a todos os serviços prestados pela ré/respostas sociais, isto é, centro de dia e serviço de apoio domiciliário a pessoas idosas ou acamadas, serviço de refeições nas próprias instalações e bem assim apoios para o serviço de creche, jardim de infância e ATL, e pressupondo que a ré tendo acordo de cooperação com a Segurança Social para financiar o funcionamento das respostas sociais, assenta apenas e só no facto de a atividade social ser subsidiada pela Segurança Social em função do número de utentes da ré, o qual tem oscilações imprevisíveis com repercussão nas comparticipações fornecidas pela Segurança Social, daí que não haja certeza de que os mesmo se prolonguem por tempo indeterminado e nas mesmas condições, o que tem implicação direta na maior ou menor necessidade de mão de obra disponível para responder ás necessidades das respostas sociais e daí que não seja possível assegurar o posto de trabalho da primeira outorgante por tempo indeterminado.»

Por outras palavras, a justificação vertida no contrato para a aposição do termo prende-se com a natureza intrínseca, a normal e regular actividade da ré, uma IPSS, com o seu modo de funcionamento, máxime com a subsidiação por parte da Segurança Social, consoante o número de utentes que se encontrem abrangidos pelos Acordos de Cooperação, pelo que, naturalmente, quanto maior for o número de utentes ao abrigo desses Acordos (com limites pré-definidos), maior será a subsidiação por parte da Segurança Social e, pelo contrário, quanto menor for o número de utentes ao abrigo desses Acordos, menor será o valor do subsídio atribuído, o que dependerá da procura que pode ser, naturalmente, oscilante relativamente a cada uma das respostas sociais.

Ocorre que, do contrato não consta a verificação efectiva de um acréscimo de procura por parte de utentes (onde e em que número), relativa a que resposta social em concreto, máxime ATL e/ou Creche e/ou Jardim de Infância, desde quando e até quando (em que período temporal concreto), por forma a que se possa estabelecer qualquer nexo de causalidade entre a necessidade da contratação de AA e por um período temporal concreto (de 01.04.2024 até 31.03.2025), com possibilidade de renovação.

Com efeito, na descrição do contrato de trabalho não se depreende desde logo em que medida é que as incertezas referentes à actividade social subsidiada pela Segurança se prendem com efectivo acréscimo do número de utentes, qual esse número, em que período temporal, que justificam a contratação de AA para exercer as funções de ajudante de acção educativa, de 01.04.2024 a 31.03.2025.

Acresce que, no texto do contrato não estão suficientemente detalhados os factos que permitem estabelecer a relação entre essa possível justificação e o termo estipulado. Na verdade, não se consegue depreender o motivo pelo qual eventual acréscimo, só por si e apenas relacionado com aquela subsidiação da Segurança Social, leva à contratação a termo de uma trabalhadora pela ré, pelo período de 12 meses. Isto porque, não se identifica/detecta em que medida é que as incertezas associadas à subsidiação por parte da Segurança Social, consoante o número de utentes abrangidos, convocadas no contrato de trabalho, estão relacionadas com a necessidade de recorrer à contratação a termo de uma trabalhadora para o exercício de funções de ajudante de acção educativa, pelo período de 12 meses.

A incerteza inerente à atividade da recorrente, como forma de justificar a contratação da trabalhadora AA, encontra-se assente em razões vagas que são susceptíveis de fundamentar qualquer outra contratação a termo em qualquer outra localidade onde a ré exerça a sua atividade e relativamente a qualquer uma das suas respostas sociais, ficando assim por apurar a menção do motivo justificativo para a ré recorrer à contratação a termo certo.

No caso, para além do motivo justificativo do termo ser vago e inerente à actividade da ré, enquanto IPSS, foi fixado no contrato o prazo de 12 meses, não resultando suficientemente aflorada a razão para a fixação daquele prazo e não de outro, bem como da sua possível renovação.

Em suma, perante o contrato celebrado, sendo que apenas este interessa, como acima analisado e concluído, não pode a trabalhadora, a ACT e este tribunal compreender as razões concretas que determinaram a contratação da trabalhadora por apenas 12 meses, pois não foram feitas constar do contrato as necessárias especificações que deveriam ter sido vertidas para justificação da aposição do termo e que, por não constarem, a tornam insuficiente.

Em consequência, é de concluir, pela nulidade do termo aposto no contrato, tal como foi entendido pela ACT.

Concordamos inteiramente com tal fundamentação.


Na realidade, na fundamentação apresentada, a Ré apenas refere genericamente que, nas suas diversas atividades sociais, é subsidiada pela Segurança Social em função do número de utentes que a si recorrem, sendo imprevisível as oscilações dos utentes, pelo que nunca sabe com que apoios da Segurança Social pode contar, não sendo, por isso, possível assegurar o posto de trabalho da referida trabalhadora por tempo indeterminado.


Ora, daqui não resulta sequer que à data da contratação da trabalhadora AA tenha havido um acréscimo excecional da atividade da Ré, sendo que, de qualquer modo, esse acréscimo sempre teria de ser concretizado, designadamente, com a indicação do local onde tinha havido esse acréscimo de utentes e com a especificação de quantos utentes habitualmente recorriam à Ré e quantos tinham passado a recorrer naquele período. Acresce que, como bem refere a sentença recorrida, a Ré também não indicou qualquer facto que permitisse inferir que esse acréscimo excecional de atividade (que nem sequer invocou) previsivelmente iria terminar decorridos 12 meses.


Na fundamentação por si aposta, a Ré limitou-se a descrever a sua atividade regular, a qual pode ser imprevisível, ignorando que a contratação a termo apenas é admitida para a satisfação de necessidades temporárias, devidamente fundamentadas, quer quanto ao seu carácter temporário, quer quanto ao período previsível de duração. A contratação a termo de um trabalhador apenas porque, no futuro, pode existir um menor número de utentes e, portanto, menos subsídios, não se enquadra nem na al. f) do citado n.º 2, nem em qualquer outra alínea.


Importa também esclarecer que a lei não admite a celebração de um contrato a termo certo apenas porque o termo certo oferece maior estabilidade à trabalhadora do que o termo incerto, conforme alega a recorrente, visto que, verificando-se os requisitos que admitem a contratação a termo, a opção entre termo certo ou termo incerto terá de ser feita de acordo com a previsibilidade ou imprevisibilidade do motivo temporário que permitiu a contratação a termo. Essa é a razão pela qual, nos termos do art. 141.º, n.º 3, do Código do Trabalho, na fundamentação do termo tem de ser estabelecida “a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado”.


Assim, sendo evidente a insuficiência da fundamentação do termo aposto no contrato de trabalho, nos termos do art. 147.º, n.º 1, al. c), do Código do Trabalho, considera-se o contrato de trabalho celebrado entre a Ré e AA sem termo, improcedendo, por isso, a pretensão da recorrente.


Diremos, ainda, por ter sido apreciado na sentença recorrida e fazer parte das conclusões recursivas que, de igual modo, concordamos com a conclusão da sentença recorrida relativa à inverídica fundamentação do termo, aposta no referido contrato de trabalho.


Na realidade, não tendo a Ré provado que, à data da contratação da trabalhadora AA (01-04-2024), houve um acréscimo excecional (não se bastando, assim, sequer, com um normal acréscimo) da atividade da empresa, é manifesta a inveracidade de tal fundamentação.


Efetivamente resultou provado, quanto aos dois locais onde a trabalhadora AA prestava serviço, o seguinte (factos provados 21 e 22):


- quanto ao Centro Infantil do Local 2, resposta social Creche, com capacidade de 12 utentes, em janeiro de 2024, a Ré tinha 6 utentes abrangidos pelo Acordo de Cooperação com a Segurança Social, celebrado em 30-08-1999, e com última revisão em 01-09-2023, inexistindo utentes não abrangidos pelo Acordo e tendo sido verificada a saída de 2 utentes e a entrada de 1 utente e que, em julho de 2024, a Ré tinha 6 utentes abrangidos por aquele Acordo de, inexistindo utentes não abrangidos pelo Acordo; e


- quanto ao Centro Infantil do Local 2, resposta social estabelecimento de educação pré-escolar, com uma capacidade de 20 utentes e com a capacidade de 17 utentes abrangidos pelo Acordo de Cooperação com a Segurança Social, celebrado em 30-08-1999 e com última revisão em 01-09-2023, em Dezembro de 2023, a Ré tinha 12 utentes abrangidos por aquele Acordo de Cooperação, inexistindo utentes não abrangidos pelo Acordo e tinha em número de 5 as vagas não ocupadas com justificação; e, em julho de 2024, a ré tinha 14 utentes abrangidos por aquele Acordo de Cooperação, inexistindo utentes não abrangidos pelo Acordo e tinha em número de 3 as vagas não ocupadas com justificação;


Assim, para além de a Ré não ter invocado qualquer facto, concreto, na fundamentação da aposição do termo certo, relativamente aos utentes que habitualmente recorriam à sua oferta social na Creche e no estabelecimento de educação pré-escolar e que, à data da contratação da trabalhadora AA, tinham passado a recorrer, constata-se que a Ré apenas provou, quanto à Creche, que em janeiro e em julho de 2024 a Ré tinha exatamente os mesmos utentes (6 utentes), inexistindo utentes não abrangidos pelo Acordo. Por sua vez, quanto ao estabelecimento de educação pré-escolar, a Ré apenas provou que em dezembro de 2023 tinha 12 utentes abrangidos por aquele Acordo de Cooperação, inexistindo utentes não abrangidos pelo Acordo e que em julho de 2024 tinha 14 utentes abrangidos por aquele Acordo, inexistindo utentes não abrangidos, desconhecendo-se, assim, a partir de que momento é que os utentes abrangidos pelo Acordo passaram de 12 para 14. Existindo um hiato de seis meses entre dezembro de 2023 e julho de 2024, desconhece-se que variações ocorreram nesses seis meses, bem como qual a situação existente em 01-04-2024, data da contratação da referida trabalhadora.


Não resultou, assim, da matéria dada como provada, que no período da contratação da trabalhadora AA a Ré tivesse tido uma necessidade temporária que urgisse satisfazer, tanto mais que nem sequer se provou qualquer acréscimo temporário da atividade, quanto mais um acréscimo excecional dessa atividade.


Nesta conformidade, também pela não comprovação de qualquer necessidade temporária a satisfazer pela Ré, designadamente em virtude de um acréscimo excecional da atividade, o termo aposto não é válido, considerando-se, por isso, o contrato de trabalho celebrado sem termo.


Improcede, também quanto a este fundamento, a pretensão da recorrente.








V – Decisão


Pelo exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso totalmente improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.


Custas a cargo da Ré (art. 527.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).


Notifique.



Évora, 10 de julho de 2025

Emília Ramos Costa (relatora)

Paula do Paço

Filipe Aveiro Marques

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1. Relatora: Emília Ramos Costa; 1.ª Adjunta: Paula do Paço; 2.º Adjunto: Filipe Aveiro Marques.↩︎

2. Doravante AA↩︎

3. 18.ª edição, Almedina, Coimbra, 2017, p. 175.↩︎

4. 4.ª edição, 2006, pp. 285 e 286.↩︎

5. No âmbito do Processo n.º 1389/07.6TTPRT.S1, consultável em www.dgsi.pt.↩︎

6. No âmbito do Processo n.º 2236/15.0T8AVR.P1.S1, consultável em www.dgsi.pt.↩︎