Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
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| Relator: | MARIA ISABEL CALHEIROS | ||
| Descritores: | CONTRATO DE EMPREITADA DANOS NÃO PATRIMONIAIS DECORRENTES DE RESPONSABILIDADE CONTRATUAL INCUMPRIMENTO DO CONTRATO | ||
| Data do Acordão: | 10/30/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Sumário: | I – É hoje pacífico o entendimento da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais previstos no artigo 496.º do Código Civil em sede de responsabilidade contratual. II – O simples incumprimento contratual, por si só, não tem virtualidade de gerar danos não patrimoniais, exigindo-se a prova de factos concludentes que permitam identificar a lesão de bens estranhos ao património do lesado (dor, desgosto, sofrimento, ansiedade, ou seja, situações que se reconduzam a sofrimentos e frustrações de ordem moral e melindres físicos ou psíquicos). III – Constitui também orientação jurisprudencial consolidada que as simples contrariedades ou incómodos não apresentam um nível de gravidade suficiente para os efeitos do n.º 1 do citado artigo 496.º. (Sumário da Relatora) | ||
| Decisão Texto Integral: | Proc. n.º 156/23.4T8TVR.E1 SUMÁRIO (da responsabilidade da relatora) (…) * Acordam os Juízes da 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de ÉvoraI – RELATÓRIO 1.1. (…) e (...) Construções, Lda. veio instaurar acção declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra (…) e (…), pedindo a condenação dos réus no pagamento da quantia de € 13.582,20, correspondente à factura final do contrato de empreitada para construção de habitação, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até efectivo e integral pagamento. 1.2. Os Réus contestaram e deduziram reconvenção, pedindo a condenação da autora/reconvinda, no que releva para o presente recurso, no pagamento de € 15.000,00 a título de compensação pelos danos não patrimoniais em que incorreram. 1.3. Foi realizada a audiência de julgamento, finda a qual foi proferida sentença, que julgou a acção e a reconvenção parcialmente procedentes, com o seguinte teor decisório: «Por todo o exposto, decido: A. Julgar improcedente a exceção de caducidade do direito à eliminação dos defeitos; B. Julgar procede a exceção de não cumprimento do contrato invocada pelos réus e, consequentemente, julgar a ação parcialmente procedente, condenando os réus a pagarem à autora o valor de € 13 582,20 (treze mil e quinhentos e oitenta e dois euros) contra a realização pela autora dos trabalhos elencados nos pontos 40º e 41º dos factos provados ou, em alternativa, no valor da sua reparação, tal como no ponto 44º dos factos provados; C. Absolver os réus do demais peticionado; D. Absolver a autora do demais peticionado, em sede reconvencional». 1.4. Inconformados com a sentença proferida, no segmento da absolvição do pedido de pagamento de € 15.000,00 a título de compensação pelos danos não patrimoniais, os Réus interpuseram o presente recurso de apelação, pedindo que fosse provido e se revogasse a sentença recorrida no segmento decisório posto em crise e consequentemente ser a Autora recorrida condenada no pagamento aos Réus na quantia de € 15.000,00 a título de danos não patrimoniais. Concluíram as suas alegações da seguinte forma (que aqui se reproduz): 1. Por sentença datada de 15-05-2025 o tribunal a quo julgou improcedente a exceção de caducidade do direito à eliminação dos defeitos; julgou procede a exceção de não cumprimento do contrato invocada pelos réus e, consequentemente, julgar a ação parcialmente procedente, condenando os réus a pagarem à autora o valor de € 13.582,20 (treze mil e quinhentos e oitenta e dois euros) contra a realização pela autora dos trabalhos elencados nos pontos 40º e 41º dos factos provados ou, em alternativa, no valor da sua reparação, tal como no ponto 44º dos factos provados; absolveu os réus do demais peticionado e absolveu a autora do demais peticionado, em sede reconvencional. 2. Os Réus ora Recorrentes não se conformam com a sentença de que ora se recorre quanto ao segmento decisório que decidiu absolver os Réus do pedido de indemnização realizado por danos não patrimoniais. 3. Em sede de reconvenção os Réus ora Recorrentes peticionaram a condenação da sociedade Autora no pagamento da quantia de € 15.000,00 (quinze mil euros) a título de danos não patrimoniais. 4. O tribunal a quo julgou como não provados os factos n), o), p) e q). 5. E motivou a matéria de facto da seguinte forma: “Em virtude dos factos que se deixaram provados (o acordo entre as partes quanto à prorrogação do prazo da empreitada e a realização de novos trabalhos, bem como, a construção da piscina) não se considera provado o nexo de causalidade entre o atraso na finalização da obra e a factualidade alegada nas alíneas j) a q), dos factos não provados, sendo de ressaltar o facto de não se ter produzido qualquer prova que os réus tenham alterado a sua residência por duas vezes ou que tivessem os seus bens embalados em caixas e de se ter provado que, durante este período de tempo, a ré padeceu de um cancro, situação que poderá ter contribuído para um aumento do seu estado de ansiedade e o desgosto sofrido, diminuindo a capacidade de relativização daqueles que são os riscos próprios de uma normal empreitada e que, em face dos defeitos apurados e do respetivo valor não se consideram aptos a provocar qualquer dos danos invocados pelos réus, a título de danos não patrimoniais”. 6. Tendo decidido que os réus não lograram provar os alegados danos não patrimoniais, atenta a dimensão dos defeitos encontrados na moradia, sempre consideraríamos não preenchido o pressuposto da gravidade do dano ou, ainda que assim não fosse, o pressupostos relativo ao nexo de causalidade entre a deficiente execução dos trabalhos por parte da autora e os alegado danos, donde o pedido em apreço não poderá deixar de improceder. 7. Andou mal o tribunal a quo ao absolver a Autora/Reconvinda do pedido de condenação por danos não patrimoniais. 8. Desde logo porquanto somos do entendimento que os danos sofridos pelos Réus / Reconvintes, ora Recorrentes, são merecedores de tutela jurídica. 9. Todo este circunstancialismo de facto permite concluir que no presente caso concreto se ultrapassou a barreira dos simples incómodos e aborrecimentos inerentes à grande maioria das obras de remodelação de um imóvel, de modo que a inquietação, a angústia, o sofrimento e o receio pela sua própria saúde não possam ser considerados, como álea inerente à empreitada em questão. 10. Estamos, assim, de pleno, perante danos de natureza não patrimonial merecedores de tutela indemnizatória. 11. Veja-se neste sentido o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 12-03-2009, processo n.º 08A4071, disponível em www.dgsi.pt. 12. A questão de se saber se no âmbito contratual este tipo de dano é susceptível de indemnização tem sido discutida na nossa doutrina e jurisprudência. 13. O Prof. Antunes Varela ("Das Obrigações em Geral", 9.ª ed., pág. 627) assumiu a posição contrária a tal possibilidade, advertindo, na senda de Larenz, para os perigos da extensão da indemnização aos danos não patrimoniais de origem contratual. 14. Porém, posição favorável a tal quadro indemnizatório tem vindo a ser assumida frequente e uniformemente pelo STJ (cfr., por todos, os Acórdãos de 17/11/1998, in CJSTJ T. III, pág. 121; de 21/03/1995, BMJ 431, 433; de 15/06/1993, BMJ 428, 530, de 4/4/2002 e de 28/05/2004, in www.dgsi.pt) na esteira dos Profs. Almeida Costa ("Direito das Obrigações" 6.ª ed., pág. 505), Galvão Telles ("Direito das Obrigações" 1.ª ed., pág. 385) e Pinto Monteiro ("Cláusula Penal e Indemnização", pág. 31). 15. Esta é a posição também por nós sufragada, impondo-se, porém, como é óbvio, e além do mais, que os desgostos sofridos pelos lesados com os actos dos lesantes assumam pela sua gravidade, dignidade ressarcível. 16. E não se pode considerar que os danos em apreço se consubstanciam antes nos normalmente inerentes a qualquer situação de contrariedade e insatisfação, frequentes neste tipo de contrato. 17. Com efeito, os danos em apreço têm que ser considerados objectivamente graves, segundo as regras da experiência e do bom senso. 18. A sentença recorrida viola assim o disposto no artigo 496.º, n.º 1, do Código Civil e o entendimento sufragado pela nossa doutrina e pela nossa jurisprudência. 19. Termos em que deverá a sentença de que ora se recorre ser revogada no segmento decisório posto em crise e consequentemente deverá a sociedade autora ser condenada no pagamento aos Réus de uma compensação no valor de € 15.000,00 (quinze mil euros), a título de danos não patrimoniais». 1.5. A Autora não apresentou contra-alegações. * Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.* II –OBJECTO DO RECURSO O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação dos recorrentes (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do NCPC), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser as de conhecimento oficioso (artigo 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do artigo 663.º, n.º 2, in fine, ambos do NCPC). Tendo, então, em atenção as conclusões dos Recorrentes a única questão submetida à apreciação deste Tribunal é a de saber se os Réus Recorrentes têm direito à indemnização peticionada a título de danos não patrimoniais. * III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO O Tribunal de 1.ª Instância, com interesse para a decisão da causa, deu como provados os seguintes factos: 1. A autora é uma sociedade comercial por quotas, que se dedica à indústria da construção civil, incluindo atividades de reconstrução e remodelações de imóveis, compra e venda de imóveis e revenda dos adquiridos para esse fim. 2. A autora possui a sua sede no Lugar (…), C.P. 417-Z, s/n (…), (…), concelho de Tavira, distrito de Faro. 3. Os réus possuem nacionalidade francesa. 4. No ano de 2018 decidiram vir residir para o nosso país, tendo adquirido um lote de terreno. 5. Em março de 2019, os réus contactaram o sócio e gerente da autora para que esta, no âmbito da sua atividade, lhes prestasse serviço de construção de uma moradia unifamiliar, no loteamento Tavira (…), lote 1, sito na união de freguesia de (…), concelho de Tavira. 6. Em 3/4/2019, no seguimento daquele contacto, a autora entregou aos réus um orçamento, com a referência (…), no qual apresentou uma proposta para execução da obra de construção da moradia e dos respetivos trabalhos a efetuar e os excluídos e respetivos preços. 7. A mesma proposta apresentava, também, um preço para a execução dos trabalhos de construção da piscina, bem como um preço para a execução de trabalhos no exterior, caso os réus pretendessem que a autora também prestasse esses serviços. 8. Em 5/8/2019, a autora e os réus por escrito que denominaram de “Contrato de Construção de Moradia Unifamiliar e Muros”, acordaram na construção por aquela para estes, em regime de empreitada, de uma moradia unifamiliar e muros, situada no loteamento Tavira (…), Lote 1, (…), (…) – U.F. (…), Tavira, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo (…), da união de freguesias de (…) e descrito na Conservatória do Registo Predial de Tavira sob o n.º (…), daquela freguesia e concelho, e com licença de construção n.º (…), aprovada pela Câmara Municipal de Tavira em (…), pelo preço total de € 179.543,10 (cento e setenta e nove mil e quinhentos e quarenta três euros e dez cêntimos), com IVA incluído (€ 145.970,00 sem IVA). 9. De acordo com a clausula 3ª do referido acordo o prazo de execução dos trabalhos seria de 12 meses a contar da data do levantamento da Licença de Construção na Câmara Municipal de Tavira. 10. De acordo com a clausula 5ª do referido acordo, a prestação de serviço de construção da moradia, objecto da contratação inicial, incluía, os trabalhos seguintes: - Estaleiro de apoio à mão de obra, limpezas e movimento de terras e marcações: Instalação de estaleiro de apoio à obra pata depósito e proteção de materiais e equipamentos necessários á realizado e desenvolvimento dos trabalhos, tal como Assentamento de azulejos na I.S e cozinha somente entre os móveis, pavimento no interior da habitação, peças num valor até € 15,00 (quinze euros) + IVA/m2, incluindo faixas de rodapé. - Instalação Elétrica: As instalações técnicas contemplam o seguinte: • Instalação de tubagem de gás, águas em PEX ou multi-camada e tubagem de esgotos; • Pré-instalação de ar condicionado 4 pontos; • Pre-instalação de aspiração central 4 pontos mais um moletão na cozinha; • Instalação eléctrica, não incluindo luminárias, descrita no ponto seguinte; • Painel solar, termossifão de 200 litros, num valor até € 1.800,00 (mil e oitocentos euros) mais IVA. - lluminação e outros sistemas elétricos: Toda a aparelhagem elétrica será da marca EFFAPEL ou equivalente. Está contemplado para todos os edifícios um total de 80 pontos de eletricidade e telecomunicações, sendo estes pontos de iluminação, interruptores, tomadas elétricas, TV, telefones e pontos para portão, AC e estores elétricos. A proposta para a instalação elétrica ascende a um valor de € 3.550,00 (três mil e quinhentos e cinquenta euros) + IVA. A instalação de um interfone com ligação ao portão de entrada, num valor até € 380,00 (trezentos e oitenta euros) + IVA. Colocação de alimentação elétrica e aberturas, no teto da sala de refeições, cozinha e hall, para colocação de 16 spots de iluminação embutidos. Instalação quatro tomadas elétricas estanque e quatro pontos de água no exterior do logradouro. - Cozinha e I.S madeiras interiores, roupeiros e caixilharia: A cozinha será à escolha do requerente num valor de € 3.700,00 (três mil e setecentos euros) + IVA. As loiças para as I.S serão também à escolha do requerente, incluindo torneiras, armário de casa de banho e espelho, num valor até € 2.800,00 (dois mil e oitocentos euros) + IVA. As madeiras, portas e roupeiros à escolha dos clientes folheados a pinho, faia ou lavado num valor de € 540,00 (quinhentos e quarenta euros)/cada porta de correr e € 300,00 (trezentos euros)/cada porta de abrir e roupeiros da mesma gama. Fornecimento e montagem de caixilharia em lvc, de cor branca, com vidro duplo e estes de enrolar elétricos, de acordo com o projeto de comportamento térmico apresentado e num valor até € 9.100,00 (nove mil e cem euros) + IVA. - Exterior e limpeza da obra: Todo o espaço intervencionado será devidamente limpo e liberto de todos os equipamentos que firma necessários à execução dos trabalhos; - Mão-de-obra e outros materiais: Mão de obra e materiais e equipamentos não especificados em itens anteriores e necessários para a boa realização dos trabalhos, tal como areias, cimento, colas, isolamentos e outros da gama média/alta e de acordo com os locais a aplicar. - Taxas, licenças, serviços e outros: A proposta inclui a remoção dos entulhos e lixos provenientes dos trabalhos, que serão devidamente encaminhados para reciclagem em vazadouro adequado, assim como todos os equipamentos ao bom desenvolvimento, tal como andaimes betoneiras, maquinaria especializada, etc. e com a conclusão ainda alvará de construção, seguros de responsabilidade civil e de acidentes de trabalho e acompanhamento técnico com técnico afeto à empresa. - Exterior: No exterior do edifício construído será um muro em alvenaria e peças de chapa metálica no perímetro do lote com cerca de 1,50 m de altura, onde será instalado o portão de acesso, metálico, elétrico com controlo remoto e pintado de cor cinza. Será instalado no muro delimitador, um portão elétrico com controlo remoto de 2 folhas de abrir e uma casa para abrigo de botijas de gás. Seria criado um passadiço com pavimento até € 13,00 (treze euros) + IVA, no perímetro da casa com 2 metros de largura, cerca de 82 m2. 11. De acordo com a cláusula 9ª do referido acordo o pagamento do preço seria feito em 9 (nove) prestações, em função da conclusão de cada uma das fases enunciadas na mencionada cláusula. 12. A obra foi adjudicada e a autora iniciou os trabalhos de construção da moradia no final de novembro de 2019. 13. A autora, tal como tinha ficado acordado, apresentou aos réus, para pagamento, as facturas correspondentes aos trabalhos executados em cada uma das fases descritas na cláusula 9ª, que estes receberam e foram satisfazendo, com exceção da última fase ali prevista. 14. De acordo com a cláusula 9ª do referido acordo, o pagamento da última prestação do preço, no montante de € 9.188,10 (nove mil e cento e oitenta e oito euros e dez cêntimos), seria efetuado com a conclusão dos trabalhos de pintura, acabamentos finais, limpeza da obra no interior e exterior e entrega das chaves. 15. Durante a execução dos trabalhos de construção da moradia, os réus pediram à autora para executar novos trabalhos, bem como alterações aos trabalhos contratados, não incluídos no acordo inicial, os quais consistiram no seguinte: a. Colocação de calçada entre a casa e a piscina, numa área de 27 m2, ao preço de € 15,00 (quinze euros) por metro quadrado, o que perfaz o preço total de € 405,00 (quatrocentos e cinco euros); b. Colocação de teto falso na cozinha, numa área de 11,98 m2, ao preço de € 28,00 (vinte e oito euros) por metro quadrado, o que perfaz o preço total de € 335,44 (trezentos e trinta e cinco euros e quarenta e quatro cêntimos); c. Execução de trabalhos de rede de água e de esgotos para os dois lavatórios nas casas de banho (WC) pequenos, o que perfaz o preço total de € 430,00 (quatrocentos e trinta euros); d. Apesar de, no orçamento estar prevista a execução dos degraus da piscina em inox, os réus pediram à autora a substituição do inox por blocos de betão, o que implicou uma diferença de preço, no montante de € 300,00 (trezentos euros); e. pagamento da inspeção de gás, que se cifrou em € 50,00 (cinquenta euros). 16. Para esses trabalhos, foi elaborado pela autora e entregue aos réus um orçamento, com discriminação dos trabalhos novos, alterações e respetivos preços, cujo total se cifrou em € 1.870,14 (mil e oitocentos e setenta euros e catorze cêntimos) com IVA já incluído, que foi recebido sem qualquer objeção ou reclamação, pelo que foi convencionado o preço. 17. O orçamento referido supra continha, também, uma proposta para construção da piscina, de acordo com o projeto apresentado na Câmara Municipal de Tavira, em betão armado, de enchimento bombeado ou betão projetado, salpico, reboco de alta resistência mecânica colocação de membrana bicomponente armada com rede de 160g (malha 5x5) com revestimento em pastilha tipo “Sinca” com valor até 15,00 euros/metro quadrado, coloca com cimento cola e junta de pastilha em material epoxi, incluindo, também, a colocação e fornecimento de um projector, um duche exterior, construção da casa das máquinas com maquinaria de bombagem, filtragem para sistema de água doce, e ainda, a vedação para a piscina, segundo normas de promoção de segurança infantil (APSI) e ainda patim em redor da piscina com pavimento até € 15,00 (quinze euros)/ metro quadrado. 18. Estava excluída a construção e o fornecimento da cobertura da piscina. 19. Para os trabalhos de construção da piscina enunciados supra, a autora apresentou o preço de € 19.360,00 (dezanove mil, trezentos e sessenta euros), acrescido de IVA, o que, perfez € 23.812,80 (vinte e três mil, oitocentos e doze euros e oitenta cêntimos). 20. Assim, no decurso da execução dos trabalhos de construção da moradia, vieram os réus adjudicar à autora os novos trabalhos de construção da piscina, de acordo com projeto e o mencionado orçamento. 21. No início de março de 2020, com a adjudicação dos novos trabalhos de construção da piscina, os réus pagaram à autora a quantia de € 7.143,84 (sete mil e cento e quarenta e três euros e oitenta e quatro cêntimos) (5.808,00 + 23% IVA) conforme FAC A01/453, vencida em 05/03/2020 e respetivo recibo A01/213 referente a essa fatura. 22. E, em 19/05/2020, os réus pagaram à autora a quantia de € 6.150,00 (seis mil e cento e cinquenta euros), correspondente a mais uma parte dos novos trabalhos de construção da piscina, ou seja, os serviços de construção dos muros de betão da estrutura da piscina, conforme FAC A01/459, vencida em 19/05/2020, e respetivo recibo A01/214 referente a essa fatura. 23. E ficou acordado que o remanescente do preço dos serviços de construção da piscina, no montante de € 10.518,96 (dez mil e quinhentos e dezoito euros e noventa e seis cêntimos), seria pago pelos réus à autora, no final da obra. 24. A autora e os réus acordaram na prorrogação do prazo da empreitada e por esse motivo, através de requerimento datado de 17/9/2020, pediram a prorrogação da licença de construção na C.M. de Tavira, pelo período de 6 meses, o que veio a ser deferido, tendo sido emitido recibo de pagamento da licença datado de 13/10/2020. 25. E acordaram também que a escolha da cozinha, incluindo a pedra, ficaria a cargo dos réus, o que fizeram no estabelecimento comercial Leroy Merlin. 26. A cozinha e a pedra foram encomendadas junto da Leroy Merlin em agosto de 2020 e a sua colocação e instalação na moradia teve lugar em janeiro de 2021. 27. Em meados de fevereiro/março de 2021 os autores foram morar para a casa. 28. Em meados de junho/julho de 2021, a autora concluiu os trabalhos de pintura da moradia, os acabamentos finais e limpou a obra, no interior e no exterior. 29. Desde janeiro de 2021 e até finais do mês de outubro de 2021, os réus, por intermédio da arquiteta … (técnica contratada pelos réus para acompanhar a obra), através de mensagens de WhatsApp e comunicações eletrónicas, comunicaram à autora as anomalias que a moradia apresentava, tais como, deficiente colocação da calçada à volta da piscina, deficiente colocação da vedação à volta da piscina, fissuras na parede da sala, problemas na aplicação dos azulejos de uma W.C., problemas nas tampas das caixas de eletricidade, colocação de skymmer, aspersores e ralos de fundo, fixação do portão de entrada da casa, fissuras nas paredes do hall de entrada e rachas nas outras paredes internas. 30. Algumas das situações referidas supra foram sendo reparadas pelos trabalhadores da autora, a mando desta. 31. Em data não concretamente apurada do mês de outubro de 2021, mas certamente antes do dia 28, a arquiteta (…) contactou o legal representante da autora e solicitou-lhe uma visita e reunião na obra para analisarem alguns problemas. 32. No dia 28/10/2021, o representante legal da autora/reconvinda, os réus/reconvintes, e a arquiteta (…) reuniram-se na obra para analisar os seguintes problemas: a) A vedação da piscina estava não estava bem colocada; b) O portão de entrada apresentava pequenos problemas de pintura; c) Nas portas interiores faltava o remate; d) Em volta de algumas portas/janelas de alumínio faltava o remate; e) Uma das portas da casa de banho tinha que ser afinada; f) Remate dos interiores das casas de banho tinham que ser refeitos; g) pequena fissura a sala; h) Um canto dos azulejos da casa de banho do quarto estava mal colocados. 33. A autora emitiu a fatura n.º A01/548, vencida em 17/11/2021, no valor de € 1.193,10 (mil e cento e noventa e três euros e dez cêntimos), correspondente ao preço devido pela última fase dos trabalhos acordados, mas descontando ao preço acordado o preço da cozinha, no valor de € 3.700,00 (três mil e setecentos euros), bem como o preço acordado para as loiças para instalações sanitárias, torneiras, armário da casa de banho e espelho, no valor de € 2.800,00 (dois mil e oitocentos euros), que não foram fornecidos pela autora (€ 7.470,00 - € 3.800,00 - € 2.800.00 = € 970,00 + 23% IVA = € 1.193,10), conforme cláusula nona e quinta do referido acordo. 34. Os réus receberam a referida fatura no dia 18/11/2021, sem objeções, nem reclamações, nem devoluções. 35. A autora emitiu a fatura A01/549, emitida e vencida em 17/11/2021, a qual foi entregue aos réus no dia 18/11/2021, que a receberam sem qualquer objeção, nem reclamação, nem devolução por partes destes. 36. Os serviços referentes a tal fatura foram prestados e os materiais fornecidos, de acordo com os preços e quantidades constantes do orçamento, denominado “Alterações na sua moradia, não consideradas no contrato” e, finalizada a sua execução, 37. Os serviços aludidos aos trabalhos de execução da piscina) foram prestados e os materiais fornecidos, de acordo com os preços e quantidades constantes do orçamento e aceite pelos réus e foi emitida a fatura A01/550, de 17/11/2021, a qual foi entregue, na respetiva data, aos réus, sem qualquer objeção, nem reclamação, nem devolução por partes destes. 38. Em 6/9/2022, a autora enviou aos réus uma carta registada, que foi por estes recebida, subordinada ao assunto “Cobrança de dívida – Facturas Fac A01/548, vencida em 17.11.2021; Fac A01/549, vencida a 17.11.2021; Fac A01550/17.11.2022 e ITG 12262/2021”, com o teor seguinte: “Exmos. Senhores, Fui encarregado pela gerência da sociedade comercial “(…) e (…) – Construções, Lda, da cobrança de € 13.582,20 (treze mil e quinhentos e oitenta e dois euros e vinte cêntimos) e respetivos juros de mora, às sucessivas taxas legais comerciais em vigor, que vos foram entregues, estão vencidas e não foram pagas, bem como a Inspeção do Gás (ITG) no montante de € 50,00 (cinquenta euros). Tenho por norma não recorrer a tribunal sem antes procurar resolver directamente os assuntos que me são confiados. Nesta conformidade, solicito-lhe que proceda ao pagamento da importância supra referida, impreterivelmente, até ao próximo dia 16 de setembro de 2022, podendo fazê-lo pessoalmente no meu escritório ou através de apresentação pessoal ou por envio de cheque para o meu escritório, ou, se preferir, por transferência bancária para a conta da cliente com IBAN (…) do BPI. Caso não liquide o montante em dívida ou não obtenha qualquer resposta no prazo indicado, tomarei o seu silêncio como manifestação de desinteresse pela resolução amigável da contenda, pelo que avançarei com a respetiva acção judicial para cobrança do crédito e dos respetivos juros de mora. (…)”. 39. Os réus contrataram o Eng.º (…) que elaborou relatório datado de 20/10/2022, onde se pode ler: “(…) Na zona I – moradia exterior – verifica-se que a pintura exterior apresenta algumas fissuras em locais específicos, resultantes de eventuais dilatações térmicas, e ou movimentos da estrutura de betão armado ocorridas após a utilização, ou cedência das fundações; Na zona II – moradia interior – quanto à estrutura rebocos, alvenarias e acabamentos, mais concretamente na zona de entrada, verifica-se que algumas paredes, portas e guarnições aparecem desalinhadas e desaprumadas, o que afeta a estética interior da construção; Quanto às instalações sanitárias no interior dos tetos das instalações sanitárias, nota-se o desaprumo e falta de verticalidade das paredes, agora evidenciada nas esquinas entre as paredes e o teto, denotando a falta de cuidado e preocupação na sua execução; Aquando da construção das alvenarias das paredes ficou por assegurar a esquadria aquando do assentamento dos azulejos, o que evidência a falta de perpendicularidade, entre os panos da parede e do teto; Na zona iv – redes de esgotos e eletricidade analisadas as redes de infraestruturas exteriores, verificou-se que as caixas de visita, e junção da rede de esgotos domésticos, encontram-se a funcionar deficientemente. Na inspeção de cada caixa de esgotos, estas foram mal executadas, sem cuidado nos acabamentos; As valas e caixas de ligação da rede elétrica, não possuem rede de sinalização e proteção da rede de cabos e deviam estar envoltos em areia sob rede de cor apropriadas para assinalar a presença de cabos elétricos enterrados; Tal situação apresenta riscos potenciais de curto-circuito elétrico ou explosão; Na zona da piscina, muros e portão automático – muro de delimitação de propriedade este muro apresenta várias fissuras na pintura ao longo de todo o seu cumprimento; Tais fissuras tiveram surgiram após o início da utilização da moradia, pois estes cederam na horizontal, devido à falta de funcionamento da armadura de ligação entre pilares de suporte estrutural do mesmo; Estas fissuras resultam de dilatações e movimentos da sua estrutura de suporte, composta por pilares afastados de 4 em 4 metros amarrados superiormente, que por eventual falha no cintamento da armadura superior, ou fundação, terão cedido. Na piscina exterior, a calçada envolvente e a vedação de segurança cederam; O sistema de apoio da vedação de segurança no acesso e nas zonas de circulação cedeu devido a deficiente fixação da guarda de proteção ao chão; A caixa das máquinas deveria ter sido construída acima do solo para facilidade de acesso e manutenção e evitar problemas de assentamento no futuro; O portão cedeu da sua fundação no pilar e ficou afastado cerca de 5 cm, o que causa um deficiente funcionamento do mesmo; Situação que terá tendência para agravar, podendo mesmo empenar e ficar imobilizado no chão, seja em que posição for, aberto, fechado ou entreaberto, com prejuízos para a segurança no acesso à moradia. (…)”. 40. Realizada perícia e após deslocação ao local da moradia no dia 5/7/2024, pelo Eng.º (…), foram verificados os seguintes defeitos: “1) Fissuras verticais no muro de vedação em redor do lote (Fotos 3 a 6); 2) Fixação ao pavimento da vedação da piscina deficiente, os prumos não se mantêm verticais (Fotos 7 e 8); 3) Assentamento da calçada em redor da piscina (Fotos 9 e 10); 4) Deficiente inclinação da tubagem enterrada da rede de esgotos no exterior; 5) Fissuras no revestimento das paredes exteriores (Fotos 11 a 17); 6) Microfissuras em paredes interiores (Fotos 18 a 20); 7) Revestimento da parede da instalação sanitária da suite desaprumada (Fotos 21 e 22); 8) Falta rejuntamento na moldura superior da porta da instalação sanitária comum (Foto 23); 9) Acesso difícil ao motor da banheira de hidromassagem (Foto 24); 10) Faltam as tampas das caixas dos contadores de água (Foto 25); e 11) Cheiros na instalação sanitária comum (Foto 26).” 41. Consignando-se que, a causa ou origem de cada um dos defeitos de construção indicados no ponto anterior, é a seguinte: “1) Fissuras verticais no muro de vedação em redor do lote – são causadas pela falta de juntas de dilatação, pois o muro tem uma extensão total de cerca de 145 metros, sem apresentar uma única junta de dilatação, que deviam de existir a cada 15 metros. 2) Fixação ao pavimento da vedação da piscina deficiente, os prumos não se mantêm verticais – as bases dos prumos estão assentes na zona da calçada, sem maciços de betão para uma correta fixação ao solo. 3) Assentamento da calçada em redor da piscina – causada pelo abatimento dos solos de aterro ao redor da piscina, devido a deficiência de compactação desses solos. 4) Deficiente inclinação da tubagem enterrada da rede de esgotos no exterior – no primeiro troço verificou-se uma inclinação de 0,9%, valor que é inferior aos 1,0% de inclinação mínima, referidos na alínea b) do artigo 246.º do Regulamento Geral dos Sistemas de Distribuição de Água e Drenagem (DR 23/95). Nota: na segunda inspeção ao local, com o recurso a um aparelho de nível laser foram medidas no local as diferenças de cotas entre as sete caixas de esgoto que existem entre a parte posterior da casa e rede pública, o que combinado com o comprimento entre caixas permitiu determinar a inclinação de cada um dos seis troços, tendo-se verificado no primeiro troço, com o comprimento de 7,8 metros uma inclinação de 0,9%, no segundo troço, com a extensão de 11,8 metros uma inclinação de 2,1%, no terceiro troço, com um comprimento de 6,1 metros uma inclinação de 1,3%, no quarto troço, com o comprimento de 6,3 metros um inclinação de 1,11%, no quinto troço, com um comprimento de 6,5 metros uma inclinação de 1,1%, e no sexto troço, com o comprimento de 7,6 metros um inclinação de 2,1%. 5) Fissuras no revestimento das paredes exteriores – causadas pela retração das argamassas ou pequenos assentamento de alvenaria. 6) Microfissuras em paredes interiores – causadas pela retração das argamassas. 7) Revestimento da parede da instalação sanitária da suite desaprumada – desaprumo da parede. 8) Falta rejuntamento na moldura superior da porta da instalação sanitária comum – falta de rejuntamento com silicone; 9) Acesso difícil ao motor da banheira de hidromassagem – abertura executada com pouca dimensão. 10) Faltam as tampas das caixas dos contadores de água – faltam as tampas. 11) Cheiros na instalação sanitária comum – deficiente selagem da caixa sifonada.” 42. O réu executou ele próprios os trabalhos de reparação e pintura do portão. 43. O skymmer (na piscina) foi colocado pelo réu. 44. O valor das reparações em causa é de € 4.370,60 (quatro mil e trezentos e setenta euros e sessenta cêntimos), IVA não incluído. 45. Os valores indicados para as reparações incluem todos os custos necessários à sua realização, nomeadamente os referentes a mão de obra, materiais e materiais acessórios. 46. A contestação/reconvenção foi instaurada em 8/5/2023. * E deu como não provados os seguintes factos:a. Os trabalhos da empreitada foram concluídos em março de 2021; b. E estiveram parados durante o período de tempo que mediou entre a encomenda da pedra e cozinha destinados à moradia e a sua colocação; c. O legal representante da autora aceitou reparar os defeitos denunciados na reunião de 28/10/2021 no próprio dia da visita; d. O que os réus impediram; e. As caixas de visita e a junção da rede de esgotos doméstico se encontram-se a funcionar deficientemente devido ao mau uso da moradia por parte dos réus/reconvintes; f. As caixas de esgotos e os tubos foram todos nivelados com suporte de apoio de massa; g. As valas e caixas de ligação à rede elétrica possuem rede de sinalização e proteção da rede de cabos e estes foram envoltos em areia sob rede de cor apropriada para assinalar a presença de cabos enterrados; h. A autora abandonou a obra em julho de 2021; i. A autora recebeu as missivas que os réus lhe enviaram em 26/10/2021 e 22/11/2021, sendo que, o teor desta última corresponde ao alegado no ponto 10.º da contestação e se dá por integralmente reproduzido; j. Em virtude do atraso na conclusão da obra os réus tiveram que viver de favor em casas de pessoas amigas; k. E alteraram a sua residência por duas vezes; l. Ficando por utilizar os eletrodomésticos e as mobílias que já haviam adquirido; m. Tendo os seus bens em caixas e malas; n. A ré (…) teve várias crises de choro, vivendo triste e com ansiedade; o. Os réus sofreram pela espera e ansiedade vividas no atraso na conclusão e entrega da obra; p. E o desgosto por verem que a casa padecia de tais defeitos e imperfeições; q. E (pela necessidade de) contratação de engenheiro perito. r. Enviando constantes e-mails e mensagens à autora, as quais não tinham resposta; s. A autora aproveitou-se do facto dos réus desconhecerem a língua portuguesa; t. O facto de a parte exterior da obra estar por concluir inviabilizava a obtenção de certificados e licença de habitabilidade; u. Em virtude dos defeitos descritos o valor de mercado do imóvel sofreu um decréscimo; v. Mostrando-se inapto para o fim a que se destina, a habitação; w. A reparação dos defeitos que a moradia apresenta ascende ao valor de € 42.500,00 (quarenta e dois mil e quinhentos euros). * A matéria de facto (provada e não provada) acima transcrita não foi objecto de impugnação, pelo que se considera definitivamente fixada.* IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITOSe os Réus Recorrentes têm direito à indemnização peticionada a título de danos não patrimoniais Os Réus Recorrentes peticionaram em sede reconvencional a condenação da Autora no pagamento de € 15.000,00 a título de compensação pelos danos não patrimoniais em que incorreram. O Tribunal a quo julgou improcedente esse pedido com o seguinte fundamento: «(…) se por um lado, é certo que, os réus não lograram provar os alegados danos não patrimoniais, atenta a dimensão dos defeitos encontrados na moradia, sempre consideraríamos não preenchido o pressuposto da gravidade do dano ou, ainda que assim não fosse, o pressupostos relativo ao nexo de causalidade entre a deficiente execução dos trabalhos por parte da autora e os alegado danos, donde o pedido em apreço não poderá deixar de improceder». Os Recorrentes discordam da decisão e consideram que os danos sofridos pelos Réus/Reconvintes são merecedores de tutela jurídica pois que o circunstancialismo de facto apurado permite concluir se ultrapassou a barreira dos simples incómodos e aborrecimentos inerentes à grande maioria das obras de remodelação de um imóvel, de modo que a inquietação, a angústia, o sofrimento e o receio pela sua própria saúde não possam ser considerados, como álea inerente à empreitada em questão. Não vem posto em causa que foi celebrado entre Autora e Réus um contrato de empreitada para construção de casa de habitação dos Réus e que ocorreram vícios de construção e defeitos da responsabilidade da empreiteira. E a primeira questão que se coloca é a de saber se os danos não patrimoniais previstos no artigo 496.º do CC são indemnizáveis em sede de responsabilidade contratual. Hoje é pacífico o entendimento da ressarcibilidade desses danos, na medida em que o artigo 798.º do CC não faz qualquer distinção entre danos patrimoniais e não patrimoniais, nem a restringe a reparação dos prejuízos verificados aos danos patrimoniais, considerando-se subsidiariamente aplicável o disposto no artigo 496.º do CC no domínio da responsabilidade contratual. Como se argumentou no Ac. do STJ de 24.01.2012, Proc. n.º 540/2001.P1.S1, rel. Martins de Sousa (disponível em www.dgsi.pt, como os demais citados), «são de natureza meramente formal os argumentos que sustentam o contrário, filiados, ora, em razões de ordem sistemática pela colocação daquele normativo no Código, ora em factores de insegurança que se introduziriam no comércio jurídico (cfr. A. Varela, Das Obrigações em Geral, II, 2ª ed, 102, Código Civil Anotado, II, 4º ed, 53 e Ac STJ de 30.09.1997, CJ (STJ), ano V, tomo 3, 37 e ss.). Na verdade, como já antes do actual Código Civil, maioritariamente, se entendia, a aplicação analógica à responsabilidade contratual daquele princípio expresso no capítulo da responsabilidade extracontratual há-de justificar-se pela necessidade de proteger de forma igual os contraentes que forem vítimas da inexecução contratual, igualmente, carecidos de tutela quando as consequências resultantes dessa inexecução assumirem gravidade bastante. Como escreveu Vaz Serra “se o direito não deve tutelar somente os interesses económicos, mas, também, os espirituais, dos homens, é razoável que o dano não patrimonial, derivado da inexecução de uma obrigação, seja susceptível de satisfação, tal como o dano patrimonial que dela, eventualmente, resulte” (BMJ, 83º, 102 e ss.)». É também disso exemplo o Ac. do STJ de 13.12.2022, Proc. n.º 497/19.5T8TVD.L1.S1, rel. António Barateiro Martins, que decidiu, numa situação de «abundantes faltas de conformidade/defeitos na obra executada», numa empreitada de consumo, que «III - Deve ocorrer a reparação de danos não patrimoniais decorrentes do incumprimento de obrigações contratuais se se descortinar uma conexão entre os danos não patrimoniais e o vínculo obrigacional em causa, de forma a poder concluir-se que os mesmos se compreendem ainda na órbita do vínculo assumido pelas partes. IV - É o que acontece com a remodelação dum apartamento, para nele se passar a habitar em permanência, que configura uma situação jurídica objetivamente funcionalizada a interesses de índole não patrimonial, pelo que o incumprimento por parte do empreiteiro da obrigação de realizar a obra sem defeitos determina, em face dos concretos defeitos verificados e dos desgostos, perturbações e incómodos para o dono da obra, a responsabilização do empreiteiro por danos não patrimoniais, uma vez que foram afetados a qualidade do gozo do apartamento por parte do dono da obra e os interesses não patrimoniais que lhes estão ligados». Importa, aqui, reter que a factualidade dada como provada neste acórdão incluía o seguinte: «27. Em consequência do atraso, o Autor teve que cancelar as férias com os seus filhos»; «45. Toda a descrita situação causou e continua a causar desgosto, perturbação e incómodos ao Autor, uma vez que o mesmo não dispõe no imediato de disponibilidade financeira para pagar a terceiros todos os trabalhos necessários». Perfilhando idêntico entendimento veja-se ainda o Ac. do STJ de 19.12.2023, Proc. n.º 1754/18.3T8CSC.L1.S1, rel. Maria Olinda Garcia, que decidiu que «Não merece censura o acórdão que fixou em € 10.000,00, com base na equidade, a compensação por danos não patrimoniais (grave depressão) sofridos pela dona de obra, face ao incumprimento do empreiteiro que a privou da sua habitação». E neste acórdão a factualidade provada incluía o seguinte circunstancialismo: «32º. A Autora continua a não poder regressar à sua casa, dado o estado em que se encontra a vivenda, que tem o esqueleto interior sem portas, sem janelas, sem louças sanitárias, sem chão de azulejo e sem escadas com degraus»; «36º. A Autora, em face do abandono da obra e por ter a casa inabitável, sem possibilidades monetárias de a concluir, entrou em depressão psiquiátrica»; «39º. A partir de Maio de 2012 e até 2018, a Autora teve que passar a ser assistida pela Médica Psiquiatra …»; «40º. Tendo estado internada na enfermaria de Psiquiatria no Hospital ....»; «42º. Está a tomar anti-depressivos, sendo que, antes da adjudicação da obra, não tinha problemas de saúde do foro mental». Importa, depois, notar, que, como resulta da letra da lei, os danos têm de ter um nível de gravidade que imponha a atribuição de indemnização ao lesado (lê-se no artigo 496.º, n.º 1, do CC que «na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito»). A este propósito e ainda no dizer do citado Ac. do STJ de 24.01.2012, Proc. n.º 540/2001.P1.S1, «a apreciação da gravidade dos danos desta natureza reclama o recurso a “um critério o mais objectivo possível e em que o juiz se possa desprender da atribuição de reparações a casos em que o sofrimento ou a dor dependam, exclusivamente, de sensibilidades particularmente requintadas, portanto, anormais” (cfr. Ribeiro de Faria, Direito das Obrigações, I, 491). Como se escreveu no Acórdão deste Tribunal e secção, de 25.05.2007, proc. n.º 07A1187 (base de dados do ITIJ), “dano grave não terá que ser considerado apenas aquele que é “exorbitante ou excepcional”, mas também aquele que “sai da mediania que ultrapassa as fronteiras da banalidade. Um dano considerável que, no seu mínimo, espelha a intensidade de uma dor, duma angústia, dum desgosto, dum sofrimento moral que, segundo as regras da experiência e do bom senso, se torna inexigível em termos de resignação” – ac. de 5/6/79, CJ IV, 3, 892». Por outro lado, a indemnização de danos não patrimoniais exige que estejam verificados os requisitos da obrigação de indemnizar previstos no artigo 483.°, n.° 1, do Código Civil: a ilicitude, a culpa, a existência de danos (como vimos, com gravidade tal para merecerem a tutela do direito) e o nexo de causalidade entre a conduta ilícita e os danos. Na verdade, «a responsabilidade contratual que fundamentará a indemnização por danos deste tipo supõe o incumprimento da obrigação, a culpa, o prejuízo e o nexo causal» (sempre o mesmo Ac. do STJ de 24.01.2012). Por fim, no que respeita à fixação do montante compensatório por estes tipo de danos há que considerar que estamos em presença de danos em relação aos quais não é possível a reposição ou reconstituição natural, nem é válida a teoria da diferença, havendo, sim, que atender ao disposto nos artigos 496.º, n.º 1 e n.º 3 e 494.º, ambos do C.C.. Isto porque «os interesses cuja lesão desencadeia um dano não patrimonial são infungíveis, não podem ser reintegrados por equivalente. Mas é possível, em certa medida, contrabalançar o dano, compensá-lo mediante satisfações derivadas do dinheiro. Não se trata, portando, de atribuir ao lesado “um preço de dor” ou “um preço de sangue”, mas de lhe proporcionar uma satisfação, em virtude da aptidão do dinheiro para propiciar a realização de uma ampla gama de interesses, na qual se podem incluir interesses de ordem refinadamente ideal» (Carlos Alberto da Mota Pinto, Teoria Geral do Direito Civil, 3ª edição, 1991, pág. 115). Lê-se, por isso, no n.º 3 do citado artigo 496.º, que «o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artigo 494.º», isto é, ao «grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado, e as demais circunstâncias do caso», sem esquecer os padrões adoptados pela jurisprudência (artigo 8.º, n.º 3, do mesmo CC). Trata-se, no fundo, da atribuição de certa soma pecuniária, que se julga adequada a compensar e a minorar dores e sofrimentos, mercê das alegrias e satisfações que a mesma pode proporcionar. Assente isto, vejamos o caso dos autos. Provou-se, como vimos, que Recorrentes e Recorrida acordaram na construção por esta para aqueles, em regime de empreitada, de uma moradia unifamiliar. E de relevante, para o objecto do recurso, provou-se que a moradia apresentava os seguintes vícios: «1) Fissuras verticais no muro de vedação em redor do lote (Fotos 3 a 6); 2) Fixação ao pavimento da vedação da piscina deficiente, os prumos não se mantêm verticais (Fotos 7 e 8); 3) Assentamento da calçada em redor da piscina (Fotos 9 e 10); 4) Deficiente inclinação da tubagem enterrada da rede de esgotos no exterior; 5) Fissuras no revestimento das paredes exteriores (Fotos 11 a 17); 6) Microfissuras em paredes interiores (Fotos 18 a 20); 7) Revestimento da parede da instalação sanitária da suite desaprumada (Fotos 21 e 22); 8) Falta rejuntamento na moldura superior da porta da instalação sanitária comum (Foto 23); 9) Acesso difícil ao motor da banheira de hidromassagem (Foto 24); 10) Faltam as tampas das caixas dos contadores de água (Foto 25); e 11) Cheiros na instalação sanitária comum (Foto 26).». Provou-se, ainda, que a causa ou origem de cada um dos defeitos de construção acima indicados, é a seguinte: «1) Fissuras verticais no muro de vedação em redor do lote – são causadas pela falta de juntas de dilatação, pois o muro tem uma extensão total de cerca de 145 metros, sem apresentar uma única junta de dilatação, que deviam de existir a cada 15 metros. 2) Fixação ao pavimento da vedação da piscina deficiente, os prumos não se mantêm verticais – as bases dos prumos estão assentes na zona da calçada, sem maciços de betão para uma correta fixação ao solo. 3) Assentamento da calçada em redor da piscina – causada pelo abatimento dos solos de aterro ao redor da piscina, devido a deficiência de compactação desses solos. 4) Deficiente inclinação da tubagem enterrada da rede de esgotos no exterior – no primeiro troço verificou-se uma inclinação de 0,9%, valor que é inferior aos 1,0% de inclinação mínima, referidos na alínea b) do artigo 246.º do Regulamento Geral dos Sistemas de Distribuição de Água e Drenagem (DR 23/95). Nota: na segunda inspeção ao local, com o recurso a um aparelho de nível laser foram medidas no local as diferenças de cotas entre as sete caixas de esgoto que existem entre a parte posterior da casa e rede pública, o que combinado com o comprimento entre caixas permitiu determinar a inclinação de cada um dos seis troços, tendo-se verificado no primeiro troço, com o comprimento de 7,8 metros uma inclinação de 0,9%, no segundo troço, com a extensão de 11,8 metros uma inclinação de 2,1%, no terceiro troço, com um comprimento de 6,1 metros uma inclinação de 1,3%, no quarto troço, com o comprimento de 6,3 metros um inclinação de 1,11%, no quinto troço, com um comprimento de 6,5 metros uma inclinação de 1,1%, e no sexto troço, com o comprimento de 7,6 metros um inclinação de 2,1%. 5) Fissuras no revestimento das paredes exteriores – causadas pela retração das argamassas ou pequenos assentamento de alvenaria. 6) Microfissuras em paredes interiores – causadas pela retração das argamassas. 7) Revestimento da parede da instalação sanitária da suite desaprumada – desaprumo da parede. 8) Falta rejuntamento na moldura superior da porta da instalação sanitária comum – falta de rejuntamento com silicone; 9) Acesso difícil ao motor da banheira de hidromassagem – abertura executada com pouca dimensão. 10) Faltam as tampas das caixas dos contadores de água – faltam as tampas. 11) Cheiros na instalação sanitária comum – deficiente selagem da caixa sifonada.». Estamos, assim, perante defeitos e vícios de construção, cometidos pela Recorrida na execução do contrato, e, portanto, da sua responsabilidade, consubstanciando um ilícito contratual que lhe impõe o dever de indemnizar os danos causados (artigo 798.º do CC), presumindo-se que agiu com culpa (artigo 799.º, n.º 1, do CC). Mostram-se, assim, verificados o facto ilícito e a culpa. Passando, agora, à análise dos danos, como referiu o Ac. do TRL de 23.11.2010, Proc. 2753/08.9TJLSB.L1-7, o «simples incumprimento contratual, por si só, não tem virtualidade de gerar danos morais (…). A emergência de danos morais exige factos concludentes que permitam efectivamente reconhecer algum tipo de perda ou de ofensa de algum interesse que tenha dimensão insusceptível de poder ser avaliado pecuniariamente. No fundo do que se trata é de ver apurado, com consistência, a condição essencial de toda a obrigação de indemnizar – a verificação do dano ou prejuízo». E o certo é que os Réus, a quem incumbia a sua prova, não lograram provar que: j. Em virtude do atraso na conclusão da obra os réus tiveram que viver de favor em casas de pessoas amigas; k. E alteraram a sua residência por duas vezes; m. Tendo os seus bens em caixas e malas; n. A ré (…) teve várias crises de choro, vivendo triste e com ansiedade; o. Os réus sofreram pela espera e ansiedade vividas no atraso na conclusão e entrega da obra; p. E o desgosto por verem que a casa padecia de tais defeitos e imperfeições; q. E pela necessidade de contratação de engenheiro perito. r. Enviando constantes e-mails e mensagens à autora, as quais não tinham resposta. Não contemplando o presente recurso a impugnação da decisão tomada quanto a estes mesmos factos, tem-se por assente a sua não verificação. A lei, como vimos, não define quais são os danos não patrimoniais merecedores de tutela jurídica, mas não merece dúvidas que neles se integram as dores e os padecimentos físicos sofridos, o abalo psicológico (desgosto, angústia, ansiedade), as lesões e tratamentos padecidos, o défice do bem-estar e tranquilidade. Como bem sintetizou o Ac. do TRL de 07.11.2018, Proc. n.º 158/16.7T8SRQ.L2-4, rel. Leopoldo Soares (disponível em www.dgsi.pt), «os danos morais, resultam da lesão de bens estranhos ao património do lesado (a integridade física, a saúde, a tranquilidade, o bem-estar físico e psíquico, a liberdade, a honra, a reputação), verificando-se quando são causados sofrimentos físicos ou morais, perdas de consideração social, inibições ou complexos de ordem psicológica, vexames, etc., em consequência de uma lesão de direitos, maxime, de personalidade (ver Mota Pinto, Teoria geral do direito Civil, págs. 85 e 86, edª de 1976). Como tal não são merecedores da tutela do direito os meros incómodos, as indisposições, preocupações e arrelias comuns. (…) Tal como se refere em Acórdão da RL de 24 de Maio de 2007 (Processo n.º 07A1187), “os danos não patrimoniais podem consistir em sofrimento ou dor, física ou moral, provocados por ofensas à integridade física ou moral de uma pessoa, podendo concretizar-se, por exemplo, em dores físicas, desgostos por perda de capacidades físicas ou intelectuais, vexames, sentimentos de vergonha ou desgosto decorrente de má imagem perante outrem, estados de angústia, etc.. Todavia, a avaliação da respectiva gravidade tem – e deve – aferir-se de acordo com um critério objectivo e não à luz de factores subjectivos (vide Antunes Varela, Obrigações em Geral, I, 9ª edição, pág. 628)», a que acresce que «constitui orientação jurisprudencial consolidada que as simples contrariedades ou incómodos apresentam um nível de gravidade objectiva insuficiente para os efeitos do n.º 1 do artigo 496.º do CC (vide, neste sentido, entre outros, o Ac. do STJ de 11.05.98, Processo n.º 98A1262ITIJ)». Ora, como vimos, não se provaram, quaisquer situações que espelhem dor, desgosto, sofrimento, ansiedade, vivenciados pelos Recorrentes, ou seja, situações que se reconduzam sofrimentos e frustrações de ordem moral e melindres físicos ou psíquicos, sofridos em consequência dos sobreditos vícios de construção, que obriguem à sua ressarcibilidade, ou sequer que os defeitos e vícios de construção tenham inutilizado / impossibilitado a utilização de parte da casa dos Recorrentes. E, como se disse, os defeitos e vícios de construção apurados, por si só, e sem mais, não se mostram suficientes para justificar a indemnização impetrada. Não lograram, pois, os Recorrentes provar a ocorrência de quaisquer danos (ao contrário do sucedido nos acima citados Acs. do STJ proferidos nos Proc. 540/2001.P1.S1, 497/19.5T8TVD.L1.S1, Proc. 1754/18.3T8CSC.L1.S1), sendo também certo que só os objectivamente graves são merecedores de reparação. Em suma, e concluindo, os Recorrentes não lograram provar, de acordo com o disposto no artigo 342.º, n.º 1, do CC, que padeceram de “sofrimento moral que, segundo as regras da experiência e do bom senso, se tornam inexigíveis em termos de resignação”. Deste modo, improcede o recurso de apelação. * V – DECISÃOPelo exposto, e nos termos das disposições legais citadas, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar improcedente o recurso de apelação interposto pelos Recorrentes e, em consequência, confirmar a sentença recorrida, no segmento aqui posto em causa. * Custas da apelação pelos Recorrentes (conforme artigo 527.º, n.º 1 e n.º 2, do CPC, por nela terem decaído).* Évora, 30/10/2025Maria Isabel Calheiros (relatora) Miguel Vieira Teixeira (1º adjunto) Anabela Raimundo Fialho (2º adjunto) |