Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
21389/15.1T8LSB-A.E1
Relator: ANA MARGARIDA LEITE
Descritores: EXECUÇÃO
COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
ACÇÃO DECLARATIVA
Data do Acordão: 07/10/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I – A invocação de contracrédito sobre o exequente, com vista a obter a compensação, constitui um dos fundamentos de oposição à execução baseada em sentença expressamente previstos no artigo 729.º do CPC, facultando ao executado a obtenção da compensação no âmbito da ação executiva através da dedução de embargos;
II – Nem sempre assiste ao executado a faculdade de invocar em embargos um contracrédito com vista a obter a compensação, não sendo tal invocação admissível, designadamente, nos casos em que o mesmo pudesse ter invocado a compensação no âmbito da ação declarativa e não o tenha feito, o que preclude a respetiva invocação na oposição à execução baseada em sentença proferida nessa ação;
III – O novo Código de Processo Civil (aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06), impõe no artigo 266.º, n.º 2, alínea c), ao réu que pretenda o reconhecimento de um crédito para obter a compensação, a dedução de reconvenção;
IV – Nos casos em que o contracrédito pudesse ter sido invocado no âmbito da ação declarativa, incumbindo ao réu que pretenda o reconhecimento de um crédito para obter a compensação o ónus de deduzir reconvenção, se a não deduzir, fica precludida a posterior invocação do contracrédito em sede de embargos de executado, com vista à obtenção da compensação no âmbito da execução.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 21389/15.1T8LSB-A.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Beja
Juízo Central Cível e Criminal de Beja


Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:

1. Relatório

Por apenso à execução para pagamento de quantia certa que (…) Solutions, Lda. move contra (…), em que é apresentada, como título executivo, uma sentença condenatória, deduziu o executado os presentes embargos, nos quais invoca a titularidade de um contracrédito no montante de € 172.645,77 sobre a exequente e declara que pretende obter a compensação de créditos, acrescentando que, após trânsito em julgado da sentença exequenda, havia já declarado à exequente querer compensar tais créditos; mais alega que os juros de mora deverão ser contabilizados à taxa legal e não à taxa aplicável às transações comerciais, como tudo melhor consta do articulado que apresentou, em que peticiona a extinção do processo executivo.
Recebida a oposição à execução, a embargada contestou, sustentando a improcedência dos embargos.
Por despacho de 03-12-2024, foi comunicada às partes a intenção de vir o Tribunal a dispensar a audiência prévia e conhecer do mérito da causa no despacho saneador, sendo notificadas para informem se prescindem da realização de tal diligência e, na afirmativa, querendo, alegarem o que tiverem por conveniente.
Ambas as partes declararam não se oporem à não realização da audiência prévia.
Foi proferida decisão em 11-03-2025, na qual se dispensou a realização da audiência prévia, se fixou o valor à causa, se proferiu despacho saneador, se discriminou os factos considerados provados e se conheceu do mérito da causa, tendo os embargos de executado sido julgados parcialmente procedentes, nos termos seguintes:
Nos termos e pelos fundamentos expostos o Tribunal julga a presente oposição à execução parcialmente procedente e, consequentemente, determina que o sr. Agente de Execução proceda ao cálculo dos juros moratórios legais contabilizados à taxa legal de 4% ao ano.
Custas pelo embargante na proporção de 3/4 e pela embargada na de 1/4 – artigo 527.º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Registe, notifique e comunique ao sr. AE.
Inconformado, o embargante interpôs recurso desta decisão, na parte em que lhe foi desfavorável, pugnando pela total procedência da oposição à execução e terminando as alegações com a formulação das conclusões que se transcrevem:
«1- Por sentença proferida em 01/05/2019 nos autos 23189/15.1T8LSB, que veio a transitar em julgado a 21/06/2021, foi o ora recorrente (ali R.) condenado a pagar á exequente (…) – (…) Solutions, Lda. (ali A.) a quantia de € 152.632,99, acrescida de juros à taxa legal.
2- A referida sentença foi dada à execução em 27/07/2021.
3- Consta também como provado na referida sentença que veio a constituir o título executivo, a existência de um crédito de suprimentos pertencente à quota amortizada de (…) no valor de € 149.933,99, bem como a existência de um saldo em conta corrente a favor da quota amortizada a (…) no valor de € 15.211,78 e a própria quota amortizada a (…) no seu valor nominal de € 7.500,00.
4- Visando a extinção da instância executiva, o recorrente deduziu oposição à execução, mediante embargos de executado, alegando o seu contracrédito sobre a exequente, no valor de € 172.645,77, resultante do valor dos suprimentos, da conta corrente e do valor nominal da quota amortizada, cuja intenção de compensar já havia sido manifestada, como forma de obter a compensação (de resto já anteriormente ordenada por sentença transitada).
5- Junto com a sua petição de embargos e como doc. n.º 2 da mesma, encontra-se a decisão proferida pelo Tribunal Judicial de Beja, em 09/03/2023, nos autos 1414/16.0T8BJ-A do Juízo Local Cível de Beja – Juiz 1, de que estes autos de onde veio a resultar o título executivo foram causa prejudicial.
6- Conforme resultou provado naqueles autos 1414/16.0T8BJ-A do Juízo Local Cível:
Ponto 9 – Os factos que fundamentam o pedido indemnizatório formulado na ação identificada em 1 (autos 21389/15.1T8LSB) são os mesmos que sustentam o direito de créditos invocado pelo aqui A, configurando as respetivas petições iniciais nessa parte mera cópia.
7- Na referida sentença (autos 1414/16.0T8BJ-A,) resulta ainda:
“Sucede que os AA alegaram, logo aceitam que os sócios foram concretizando suprimentos (a sociedade A) os quais em 2015 se cifram em – quota amortizada a (…) no valor de € 149.933,99. Na conta corrente em Abril de 2015 existe um saldo a favor da quota amortizada de (…) de € 15.211,78, , postula-se um contracrédito do 1º Réu (o aqui recorrente) relativamente à segunda A, no montante de € 165.145,77, pelo que deve operar-se a sua compensação (artigo 847.º do C.C.) oportunamente excecionada pelo Réu, porquanto apenas após a prolação da sentença da causa prejudicial a mesma poderia ser deduzida, como ocorreu em 07/01/2022. Do exposto tem necessariamente de concluir-se que falece o direito potestativo da Impugnação Pauliana em virtude da inexistência de qualquer crédito da aqui 2º A. (a embargada nestes autos de que se recorre) (…).
8- A decisão proferida nestes autos (1414/16.0T8BJ-A) de que os autos declarativos de que extraiu o título executivo foram causa prejudicial, foi confirmada pelo Tribunal da Relação de Évora, que mantendo na integra a sentença proferida na 1ª Instância decide: “O crédito de suprimentos existe e é compensável (o que foi pedido nos autos).(…)
9 – Não obstante ambas as sentenças se encontrarem juntas como docs. 2 e 3 da petição de embargos, tendo transitado em julgado em 02/11/2023, determinando que o crédito existe, que é compensável e que tal foi pelo A., aqui recorrente, pedido naqueles autos, considerou a Meritíssima Juiz a quo, que o recorrente não juntou com a petição de embargos, documento que prove que tal declaração de compensação foi pedida, não podendo portanto concluir-se que a compensação se tenha efetivado em momento anterior ao da declaração de embargos.
10 – As sentenças juntas como docs. 2 e 3 ditam claramente que tal compensação foi pedida nos autos e em virtude ordenaram a compensação entre ambos os créditos.
11- Ao não levar em consideração as decisões proferidas naquelas sentenças, a Meritíssima Juiz a quo, com a sua decisão, viola o princípio do caso julgado material, pois existe efetivamente nos autos documento que prova que, não só a declaração de compensação foi manifestada pelo aqui recorrente, naqueles autos, como, tendo tal sentença transitado em julgado em 02/11/2023 foi efetuada, antes da dedução dos presentes embargos, pelo que se encontram preenchidas para além da alínea g) também a alínea f) do artigo 729.º do C.P.C..
12- Acresce ainda, que a sentença ora em crise, ao considerar não poder o recorrente em sede de embargos à execução, fazer operar o seu contracrédito com o crédito exequendo, por não ter na ação declarativa deduzido reconvenção com vista ao seu reconhecimento, faz uma incorreta interpretação do disposto na alínea h) do artigo 729.º do C.P.C., porque em tal alínea não levanta a Lei qualquer restrição para a sua aplicação, da mesma forma que o faz para a alínea g) desta mesma normal e os requisitos previstos para cada alínea não são cumulativos.
13- Neste mesmo sentido, a decisão proferida no douto Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa no processo 604/18.5T8LSB-A.L1.6 em que foi Ilustre Relator Vera Antunes, de 02/06/2021 e visível em www.dgsi.pt , onde se pode Ler “A lei não estabelece qualquer restrição para a alínea h) do artigo 729.º do C.P.C. da forma que o estabelece para a alínea g) desta mesma norma e os requisitos previstos para cada alínea não são cumulativos, pelo que nada obsta a que os executados venham agora , em sede de embargos à execução, invocar e discutir o contracrédito que alegadamente detém sobre a exequente de forma a operar a sua compensação.
14 – E invoca ainda este mesmo Acórdão, o Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Coimbra de 28/10/2020 no processo 51796/18.1YIPRT-B.C1 “Na verdade a nova lei tem a utilidade de deixar claro que a compensação (até ao montante da divida exequenda) pode constituir fundamento de embargos de executado).
15- Seria muito estranho que, enquanto a Doutrina Alemã maioritária procura não aplicar à compensação uma regra legal que literalmente a abrange, a Doutrina Portuguesa percorre-se exatamente o sentido inverso, e a partir de uma base legal que não impõem qualquer preclusão quanto á invocação da compensação na ação executiva acabasse afinal por vir a defender tal preclusão.
16 – Ao ter invocado como fundamento da oposição à execução, nos termos do disposto na alínea h) do artigo 729.º do C.P.C, o contracrédito que detém sobre a exequente/embargada, o recorrente alega um facto extintivo ou modificativo da Instância executiva, e fá-lo em respeito ao disposto no artigo 732.º, n.º 5, do C.P.C. do mesmo diploma, sendo nesta Instância que verdadeiramente se fixa o ónus da concentração na defesa, pois se não alegar nesta sede, a decisão de mérito proferida nos embargos à execução constitui nos termos gerais, caso julgado quanto à existência, validade e exigibilidade da obrigação exequenda.
17 – Acresce que, tendo o ora recorrente, na ação declarativa que veio a dar origem ao título executivo, negado o crédito da A ora exequente/embargada) apenas a título subsidiário ou condicional poderia naqueles autos e para o caso de vir a ser reconhecido o alegado crédito da A. deduzir pedido reconvencional, invocando o seu contracrédito.
18 – É, no entanto, extensa a Doutrina e a Jurisprudência, que não aceitam nem permitem a dedução de pedido reconvencional a título subsidiário invocando-se a título de exemplo os Acórdãos do TRP de 18/06/2020 no processo 586/19.6T8VNG-A.P1; STJ de 9/09/2010; STJ de 10/02/1983, como exemplos de Jurisprudência em que não foi aceite a reconvenção a título subsidiário.
19- Perante a existência de tão vasta Jurisprudência e Doutrina que não aceitam reconvenção a título subsidiário, corria o ora recorrente (nos autos declarativos R) o sério risco de não ver admitida a reconvenção, pelo que também por esta circunstância, deve ser admitida em sede de embargos de executado, invocação do contracrédito do recorrente como forma de extinção da instância executiva.»
A embargada apresentou contra-alegações, defendendo a manutenção do decidido.
Face às conclusões das alegações do recorrente e sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso, cumpre apreciar se os motivos apresentados pelo embargante configuram fundamentos legais de oposição à execução baseada em sentença.
Corridos os vistos, cumpre decidir.

2. Fundamentos

2.1. Decisão de facto
Factos considerados provados em 1.ª instância:
1) Por sentença proferida em 01/05/2019 nos autos 21389/15.1T8LSB, transitada em julgado em 21/06/2021, a que estes autos correm por apenso, foi o embargante condenado pagar à embargada a quantia de € 157.632,99, acrescida de juros à taxa legal;
2) Consta dos factos provados da sentença
14. Os sócios foram concretizando suprimentos, os quais, em 2015, se cifram em:
- Quota amortizada a … (aqui Réu), no valor global de 149.933,99 euros;
- (…), no valor global de 187.460,00 euros;
15. Na conta corrente em abril de 2015 existe um saldo a favor da quota amortizada de (…) de € 15.211,78.
3) Na ação declarativa identificada não foi deduzida reconvenção;
4) O embargante não procedeu ao pagamento da quantia determinada na sentença.

2.2. Apreciação do objeto do recurso
Vem posta em causa na apelação a decisão através da qual a 1.ª instância julgou improcedente a oposição deduzida pelo apelante à execução para pagamento de quantia certa que lhe é movida, com base em sentença condenatória, pela apelada.
Invoca o executado, nos embargos que deduziu, a titularidade de um contracrédito sobre a exequente, com vista a obter a compensação de créditos, acrescentando que, após o trânsito em julgado da sentença exequenda, havia já declarado à exequente querer compensar tais créditos.
Entendeu a 1.ª instância que os motivos apresentados não integram qualquer dos fundamentos de oposição à execução baseada em sentença enumerados no artigo 729.º do Código de Processo Civil (CPC), designadamente os previstos nas alíneas g) e h) do preceito, o que determinou a improcedência dos embargos.
Em síntese, considerou-se que incumbia ao executado ter deduzido reconvenção no âmbito da ação declarativa em que foi proferida a sentença exequenda, com vista à obtenção da compensação de créditos, bem como que a falta de dedução de reconvenção preclude a posterior invocação, nos presentes embargos, com o indicado objetivo, do contracrédito em causa sobre a exequente, entendimento que cumpre reapreciar, face à discordância manifestada pelo apelante.
Tendo em conta o objeto da apelação, cumpre averiguar se se mostra oportuna a invocação pelo executado, nos embargos que deduziu, de contracrédito sobre a exequente, visando obter a compensação de créditos, bem como, em caso afirmativo, se se encontram preenchidos os requisitos legais para o efeito.
Consiste a compensação numa causa de extinção das obrigações, diversa do cumprimento, prevista e regulada nos artigos 847.º a 856.º do Código Civil (CC).
Os requisitos da compensação encontram-se previstos no artigo 847.º do CC, preceito que dispõe o seguinte: 1. Quando duas pessoas sejam reciprocamente credor e devedor, qualquer delas pode livrar-se da sua obrigação por meio de compensação com a obrigação do seu credor, verificados os seguintes requisitos: a) Ser o seu crédito exigível judicialmente e não proceder contra ele excepção, peremptória ou dilatória, de direito material; b) Terem as duas obrigações por objecto coisas fungíveis da mesma espécie e qualidade. 2. Se as duas dívidas não forem de igual montante, pode dar-se a compensação na parte correspondente. 3. A iliquidez da dívida não impede a compensação.
Conforme explica Mário Júlio de Almeida Costa (Direito das Obrigações, 12.ª ed. revista e atualizada, 2.ª reimpressão, Coimbra, Almedina, 2013, pág. 1099), a “compensação traduz-se fundamentalmente na extinção de duas obrigações, sendo o credor de uma delas devedor na outra, e o credor desta última devedor na primeira”. Esclarecem Pires de Lima e Antunes Varela (Código Civil Anotado, volume II, 3.ª edição revista e atualizada, Coimbra, Coimbra Editora, 1986, pág. 135) que a “compensação é uma forma de extinção das obrigações em que, no lugar do cumprimento, como sub-rogado dele, o devedor opõe o crédito que tem sobre o credor. Ao mesmo tempo que se exonera da sua dívida, cobrando-se do seu crédito, o compensante realiza o seu crédito liberando-se do seu débito, por uma espécie de acção directa”.
A compensação de créditos configura uma causa de extinção das obrigações baseada na reciprocidade de créditos e débitos, a qual exige uma declaração unilateral de vontade, impondo-se apreciar, face ao objeto da apelação, os termos em que a lei admite a invocação desta forma de extinção das obrigações no âmbito da ação executiva.
Estando em causa execução baseada em sentença, prevê o artigo 729.º do CPC, entre as diversas situações que podem constituir fundamento de oposição à execução, a invocação, nos termos da alínea h), de contracrédito sobre o exequente, com vista a obter a compensação de créditos.
Face à alínea h) do citado artigo 729.º, a invocação de contracrédito sobre o exequente, com vista a obter a compensação, constitui um dos fundamentos de oposição à execução baseada em sentença expressamente previstos, facultando ao executado a obtenção da compensação no âmbito da ação executiva através da dedução de embargos.
No entanto, nem sempre assistirá ao executado a faculdade de invocar em embargos um contracrédito com vista a obter a compensação não sendo tal invocação admissível designadamente nos casos em que o mesmo pudesse ter invocado a compensação no âmbito da ação declarativa e não o tenha feito, o que preclude a respetiva invocação na oposição à execução baseada em sentença proferida nessa ação.
O novo Código de Processo Civil (aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26-06), impõe no artigo 266.º, n.º 2, alínea c), ao réu que pretenda o reconhecimento de um crédito para obter a compensação, a dedução de reconvenção. Como tal, nos casos em que o contracrédito pudesse ter sido invocado no âmbito da ação declarativa, incumbindo ao réu que pretenda o reconhecimento de um crédito para obter a compensação o ónus de deduzir reconvenção, se a não deduzir, fica precludida a posterior invocação do contracrédito em sede de embargos de executado, com vista à obtenção da compensação no âmbito da execução.
Neste sentido, em anotação ao citado artigo 729.º, explicam António Santos Abrantes Geraldes/Paulo Pimenta/Luís Filipe Pires de Sousa (Código de Processo Civil Anotado, vol. II, Coimbra, Almedina, 2020, pág. 85) o seguinte: “(…) o sentido da al. h), que foi introduzida pelo CPC de 2013, é inseparável do regime que ficou consagrado no art. 266.º, n.º 2, alínea c), onde foi estabelecida a solução segundo a qual a invocação de um contracrédito em processo declarativo pendente, independentemente do seu valor, deve ser feita por via reconvencional”. Sintetizam estes autores (ob. cit., págs. 85-86) o quadro seguinte: “a) Se o réu, no momento em que contesta na ação declarativa, estiver em condições de invocar crédito de que seja titular sobre o autor, deverá fazê-lo por via reconvencional, assegurando a sua apreciação e o (eventual) reconhecimento nessa ação, com o inerente efeito compensatório (…). b) Se o réu, no cenário que antecede, não tiver agido nos termos indicados e vier a ser condenado, fica impedido de invocar o contracrédito em sede de embargos de executado, o que significa que, neste contexto, a reconvenção tem carácter necessário, mas não propriamente preclusivo quanto ao direito de crédito, isto é, o impedimento de invocação do contracrédito em embargos de executado não obsta à invocação desse direito em ação declarativa que o tenha por objeto. c) Porém, se o contracrédito apenas se constituir ou puder ser invocado depois do oferecimento da contestação na precedente ação declarativa, poderá constituir fundamento de embargos ao abrigo desta al. h), nos mesmos termos em que poderia ser invocado em ação própria, sem sujeição a quaisquer requisitos diferentes dos aplicáveis numa ação declarativa que vise o reconhecimento de um crédito e a fixação dos efeitos decorrentes, ainda que no caso dos embargos de executado tal efeito seja somente o compensatório (…)”.
No mesmo sentido, defendendo a inadmissibilidade da invocação da compensação em sede de embargos de executado quando ela já era possível à data da contestação da ação declarativa, cfr. José Lebre de Freitas, A Ação Executiva, 7.ª edição, 2017, Coimbra, Gestlegal, pág. 205.
No caso presente, em que o contracrédito em causa, cuja titularidade foi invocada pelo executado como fundamento dos embargos, decorre da fundamentação da sentença exequenda e não foi alegado qualquer impedimento à dedução de reconvenção visando obter a compensação na ação declarativa em que foi proferida tal sentença, mostra-se acertada a decisão recorrida, ao considerar precludida invocação desse contracrédito na oposição à execução movida com base em tal sentença, visando obter a compensação.
Mais defende o apelante que a prova documental que apresentou deve ser considerada bastante para se julgar procedente a oposição à execução, com fundamento na previsão da alínea g) do artigo 729.º.
Estando em causa execução baseada em sentença, prevê o artigo 729.º do CPC que pode constituir fundamento de oposição à execução, a invocação, nos termos da alínea g), de qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento; sendo que a prescrição do direito ou da obrigação pode ser provada por qualquer meio.
Este fundamento reporta-se à invocação de qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração.
Como tal, a questão essencial centra-se, em primeira linha, na própria invocação do facto extintivo ou modificativo da obrigação, impondo-se que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração, só num segundo momento cabendo apreciar se os meios de prova apresentados respeitam a exigência expressa de certa espécie de prova para a existência do facto, isto é, a exigência de prova documental, salvo se se tratar da prescrição do direito ou da obrigação.
Sobre o que deve entender-se por facto posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração, esclarece Marco Carvalho Gonçalves (Lições de Processo Civil Executivo, Coimbra, Almedina, 2016, pág. 203) que “aquilo que releva é que o facto tenha ocorrido posteriormente ao encerramento da discussão no processo de declaração, isto é, que seja supervenientemente objetivo, e não que a invocação seja posterior ao encerramento da discussão, ainda que o facto se tenha verificado num momento anterior a esse marco temporal”.
Tratando-se da invocação da extinção da obrigação exequenda por força de declaração extrajudicial de compensação de um contracrédito operada após a prolação da sentença exequenda, impondo o citado artigo 266.º, n.º 2, alínea c), ao réu que pretenda o reconhecimento de um crédito para obter a compensação, a dedução de reconvenção e não se tratando de uma situação em que o contracrédito não pudesse ter sido invocado no âmbito da ação declarativa, a falta de dedução de reconvenção igualmente preclude a posterior invocação, em sede de embargos de executado, da extinção da obrigação por força de compensação operada extrajudicialmente.
Verifica-se, assim, que nem sempre assistirá ao executado a faculdade de invocar em embargos factos extintivos da obrigação, com vista a obter a extinção da execução, não sendo tal invocação admissível, designadamente, quando se trate da invocação de compensação operada extrajudicialmente após a prolação da sentença exequenda, numa situação em que podia o contracrédito em causa ter sido deduzido em sede de reconvenção no âmbito da ação declarativa, visando obter a compensação, e não o foi, o que preclude a posterior invocação, na oposição à execução baseada em sentença proferida nessa ação, de compensação operada extrajudicialmente.
Em conclusão, tendo-se concluído que o contracrédito em causa podia ter sido invocado no âmbito da ação declarativa, sendo certo que incumbe ao réu que pretenda o reconhecimento de um crédito para obter a compensação o ónus de deduzir reconvenção, verifica-se que a falta de dedução de reconvenção no âmbito da ação declarativa preclude a posterior invocação, em sede de embargos de executado, seja da extinção da obrigação exequenda por força de declaração extrajudicial de compensação de tal contracrédito, seja do próprio contracrédito, visando obter compensação por via judicial.
Nesta conformidade, verifica-se que a argumentação apresentada pelo apelante não poderá triunfar, o que prejudica a utilidade da apreciação das demais questões de direito suscitadas.
Improcede, assim, a apelação.

Em conclusão: (…)

3. Decisão

Nestes termos, acorda-se em julgar a apelação improcedente e, em consequência, confirmar a decisão recorrida.
Custas pelo recorrente.
Notifique.
Évora, 10-07-2025
(Acórdão assinado digitalmente)
Ana Margarida Carvalho Pinheiro Leite (Relatora)
Eduarda Branquinho (1ª Adjunta)
Isabel de Matos Peixoto Imaginário (2ª Adjunta)