Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
523/22.0PAENT-A.E1
Relator: MARGARIDA BACELAR
Descritores: FALTA A ATO PROCESSUAL
JUSTIFICAÇÃO
MULTA PROCESSUAL
Data do Acordão: 05/21/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Estando o recorrente devidamente notificado para comparecer a ato processual e não o tendo feito, apresentando um documento com vista à justificação da falta de onde não se retira que estivesse impossibilitado de comparecer às diligências designadas, por injustificadamente faltoso deve o mesmo ser condenado em multa processual.
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, os juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
Nos autos nº523/22.0PAENT-A.E1 a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de … - Juízo de Instrução Criminal da …- Juiz …, AA, por não se conformar com o despacho de 04-12-2023, que o condenou na multa correspondente a 3 UC pela sua não comparecência às diligências designadas para o dia 04-12-2023, dele interpôs o presente recurso, rematando a pertinente motivação com as seguintes conclusões, que se transcrevem:

“O presente recurso tem como objecto despacho do MM JUIZ.

Não existe qualquer fundamento para a coima.

Termos em que e nos demais de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente e, em consequência ser dado sem efeito a coima.

Fazendo-se, assim, a habitual e necessária justiça!”

O Ministério Público respondeu às motivações de recurso apresentadas pelo Recorrente, pugnando pela improcedência do mesmo.

Neste Tribunal o Exmo. Procurador-Geral Adjunto teve vista dos autos, emitindo parecer no sentido do não provimento do recurso.

O recorrente, notificado nos termos e para os efeitos previstos no art.º 417º, nº 2 do CPP, quedou-se pelo silêncio, nada tendo vindo alegar.

Colhidos os vistos legais e efectuada a conferência prevista no art.º 419º do CPP, cumpre agora apreciar e decidir.

A DECISÃO RECORRIDA

O Despacho do Mmo. Juiz do Tribunal Judicial da Comarca de … - Juízo de Instrução Criminal da … - Juiz …, objecto do presente recurso é do seguinte teor:

“O arguido foi regularmente notificado das duas diligências para hoje designadas em simultâneo por expediente depositado a 13/11/2023 a fls. 321 e pessoalmente conforme fls. 316 e verso em 23 de outubro de 2023. As duas diligências (1º interrogatório e debate instrutório) foram designadas para as 14:00 horas de 4 de dezembro de 2023. Dado o teor do documento que juntou, dele consta que o arguido esteve presente na unidade de saúde do …, supõe-se, entre as 11:45 e as 11:55 do dia de hoje para marcar consulta. Não há nenhum comprovativo atinente à urgência dessa consulta ou à urgência da sua marcação, sendo que às 11:55h o arguido poderia ter-se encaminhado para a diligência das 14:00 horas em …, não se vislumbrando, considerando tal hiato temporal que tal lhe tivesse sido impossível. Nesta medida, não consideramos que seja a sua falta justificada nem consideramos que estivesse impossibilitado de comparecer às diligências para hoje designadas. Assim sendo, por injustificadamente faltoso condeno o arguido na multa processual de 3 UC tudo ao abrigo do disposto no artigo 116.º, nº 1 do Código de Processo Penal. Relativamente ao Excelentíssimo Mandatário, notificado que foi para a primeira diligência em outubro de 2023 conforme fls. 295 não colhe a explanação atinente à marcação de outras diligências cuja notificação foi posterior a tal data (documento 1). Sem prejuízo não incumbe a este Tribunal o exercício de qualquer averiguação ou ação sobre o Ilustre causídico, pelo que nada se promove.

Considerando que o arguido se mostra faltoso e considerando que quer o 1º interrogatório judicial de arguido não detido quer as diligências instrutórias prévias ao debate, tendo sido deferido esse interrogatório, exigem a sua comparência designo para a realização das duas diligências já previamente agendadas o dia 18 de dezembro pelas 14:00 horas, devendo o arguido ser notificado dupla via, via postal e via OPCs e devendo dar-se imediato conhecimento ao Excelentíssimo advogado do presente despacho e data, não sendo possível ao tribunal a realização das diligências no dia sugerido.

Notifique e DN. Mais advirta-se que adiado o debate instrutório, não poderá ocorrer um segundo adiamento por força de norma legal.”

O OBJECTO DO PRESENTE RECURSO

Como se sabe, é pelas conclusões que o recorrente extrai da sua motivação que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem, sem prejuízo para a apreciação de questões de oficioso conhecimento e de que ainda se possa conhecer (cfr. o Ac do STJ de 3.2.99 in BMJ nº 484, pág 271; o Ac do STJ de 25.6.98 in BMJ nº 478, pág 242; o Ac do STJ de 13.5.98 in BMJ nº 477, pág 263; SIMAS SANTOS/LEAL HENRIQUES in “Recursos em Processo Penal”, 5ª. ed., 2002, pp. 74 e 93; GERMANO MARQUES DA SILVA in “Curso de Processo Penal”, vol. III, 2ª ed., 2000, pág. 335; JOSÉ NARCISO DA CUNHA RODRIGUES in “Recursos”, “Jornadas de Direito Processual Penal/O Novo Código de Processo Penal”, 1988, p. 387; e ALBERTO DOS REIS in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V, págs. 362 e 363).

«São só as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas conclusões [da respectiva motivação] que o tribunal [ad quem] tem de apreciar» (GERMANO MARQUES DA SILVA in “Curso de Processo Penal”, vol. III, 2ª ed., 2000, p. 335) «Daí que, se o recorrente não retoma nas conclusões as questões que desenvolveu no corpo da motivação (porque se esqueceu ou porque pretendeu restringir o objecto do recurso), o Tribunal Superior só conhecerá das que constam das conclusões» (SIMAS SANTOS/LEAL HENRIQUES in “Recursos em Processo Penal”, 5ª. ed., 2002, p. 93, nota 108).

A única questão suscitada pelo Recorrente (nas conclusões da sua motivação) é a seguinte:

a) A pretensa falta de fundamento para a aplicação de uma multa ao arguido/recorrente.

O MÉRITO DO RECURSO DO ARGUIDO

1- A pretensa falta de fundamento para a aplicação de uma multa ao arguido/recorrente.

O artigo 116º, nº 1, do C.P.P., prevê a condenação em multa de quem faltar injustificadamente a acto ou diligência processual para a qual tenha sido regularmente convocado ou notificado.

Por seu turno, o artigo 117º do citado diploma legal rege sobre a justificação da falta, dispondo, no seu nº 1: “considera-se justificada a falta motivada por facto não imputável ao faltoso que o impeça de comparecer no acto processual para que foi convocado ou notificado”.

O arguido/recorrente devidamente notificado para o efeito não compareceu no Tribunal dia 4 de Dezembro de 2023, pelas 14:00h, data agendada para realização do seu interrogatório e debate instrutório.

Dúvidas não existem quanto à regularidade da notificação em questão, bem como quanto à não comparência do arguido/recorrente no dia e hora agendada para as diligências em questão.

Com vista à justificação da falta às diligências designadas, o arguido/recorrente juntou aos autos no próprio dia 4.12.2023, pelas 11h 41m., um documento para “justificação a sua falta”.

O referido documento tem o seguinte teor: Declaro para os fins convenientes que compareceu nesta unidade de Saúde AA, no dia 4/12/23 das 11-45 às 11-55, por motivo de marcar consulta.

Insurge-se o Arguido/Recorrente contra o facto de o Tribunal a quo o ter condenado na multa processual de 3 UC’s por ter faltado injustificadamente à diligência designada para as 14:00h do dia 4/12/2013.

O tribunal “a quo” fundamentou do seguinte modo a condenação do Arguido ora Recorrente na multa processual de 3 UC’s:

“……As duas diligências (1º interrogatório e debate instrutório) foram designadas para as 14:00 horas de 4 de dezembro de 2023. Dado o teor do documento que juntou, dele consta que o arguido esteve presente na unidade de saúde do …, supõe-se, entre as 11:45 e as 11:55 do dia de hoje para marcar consulta. Não há nenhum comprovativo atinente à urgência dessa consulta ou à urgência da sua marcação, sendo que às 11:55h o arguido poderia ter-se encaminhado para a diligência das 14:00 horas em …, não se vislumbrando, considerando tal hiato temporal que tal lhe tivesse sido impossível. Nesta medida, não consideramos que seja a sua falta justificada nem consideramos que estivesse impossibilitado de comparecer às diligências para hoje designadas.”

Os argumentos aduzidos pelo tribunal “a quo” para fundamentar a condenação do arguido ora recorrente na multa processual de 3 UC’s por ter faltado às diligências designadas para as 14:00h do dia 4/12/2013, são irrefutáveis.

De resto, o recorrente nem se preocupa, minimamente, em pôr em crise a bondade da linha argumentativa adoptada pelo despacho recorrido limitando-se a alegar nas conclusões da sua peça recursiva que “Não existe qualquer fundamento para a coima”, não fundamentando, porém, onde se alicerça tal falta de fundamento, dispensando-se assim de carrear para a discussão novos argumentos.

Esta Relação não pode senão subscrever as razões doutamente aduzidas no despacho recorrido, não se mostrando sequer necessário aditar, em abono da solução perfilhada pela 1º instância, quaisquer novos argumentos.

Face ao exposto, improcede o recurso.

DECISÃO

Nestes termos, acordam os juízes da Secção Criminal deste Tribunal da Relação em negar provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.

Fixa-se a taxa de justiça devida pelo Recorrente em 4 (quatro) Ucs.

Évora, 21 / 05 / 2024