Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1539/06-2
Relator: ACÁCIO PROENÇA
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
NULIDADE DE SENTENÇA
AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
PENSÃO
ASCENDENTE
FUNDO DE ACIDENTES DE TRABALHO
Data do Acordão: 11/14/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO SOCIAL
Decisão: IMPROCEDENTE A APELAÇÃO DOS AUTORES
PROCEDENTE O RECURSO DO RÉU
Sumário:
I. A matéria relativa à apreciação da prova e à decisão da matéria de facto em caso algum pode envolver vício de nulidade de sentença; também não integraria nulidade de sentença o facto de na sentença se não ter considerado o subsídio de refeição para efeito de cálculo das prestações que a lei de acidentes de trabalho contempla.
II. Constitui fundamento para rejeição do recurso na parte em que se impugna a decisão de facto, os recorrentes não terem procedido às especificações a que aludem as al. a) e b) do nº 1 e nº 2 do artº 690º-A do CPC.
III. Não tendo o tribunal ampliado a base instrutória nos termos permitidos pelo artº 72º do CPT, nem as partes suscitado perante o tribunal recorrido qualquer questão dessa natureza, é inoportuno fazê-lo na fase de recurso.
IV. Não revelando a factualidade provada que as remessas de dinheiro que os sinistrados faziam para o Brasil se destinava a contribuir para o sustento dos pais e muito menos que estes careciam dessa contribuição, aos ascendentes não assiste o direito a pensão.
V. Tendo-se reconhecido que assiste ao FAT o direito à quantia a que alude o nº 6 do artº 20º da LAT, mas discutindo-se na acção a violação das condições de segurança pela entidade patronal, continua a ter interesse a decisão dessa questão pois que, existindo contrato de seguro, tal é importante para definir quem é responsável por aquele pagamento.
VI. Concluindo-se que foram violadas as condições de segurança, a entidade patronal responde a título principal pelo pagamento ao FAT e em função da retribuição auferida pelo sinistrado, e a seguradora responde a título subsidiário e apenas em função da retribuição declarada para efeitos de prémio de seguro.
Decisão Texto Integral:
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:
No Tribunal de Trabalho de …, participou em 21/12/2001, autonomamente, o acidente de que foram vítimas mortais B… e C…., ocorrido em 12/12/2001, quando trabalhavam para D…. o que deu origem à autuação de dois processos por acidente de trabalho, um com o nº 4/2002 e outro com o nº 5/2002 que, já na fase contenciosa, vieram a ser apensados (vide despacho de fls 498, proferido no início da audiência de julgamento, no processo nº 4/2002).
A tentativa de conciliação com que culminou a fase conciliatória dos processos resultou frustrada e, em cada um deles, vieram os pais das vítimas (no proc. nº 4/2002: E e F….residentes …. ; no proc. nº 5/2002: G… e H…, apresentar petição inicial contra D…., A…, I…, e J…., pedindo: - a condenação da 1ª Ré a pagar a pensão anual e vitalícia de €19 771,78, com início em 13 de Fevereiro de 2001, bem como o subsídio de funeral no montante de € 4 124,08, relativamente a cada um dos sinistrados, quantias acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos, contados do dia seguinte ao da morte do sinistrado até efectivo e integral pagamento; - a condenação subsidiária da 2ª Ré a pagar a pensão anual e vitalícia de € 984,12, com início em 13 de Dezembro de 2003, subsídio de funeral no montante de € 4,124,08, relativamente a cada um dos sinistrados, quantias acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos, contados do dia seguinte ao da morte do sinistrado até integral pagamento; -a condenação de todas as Rés, com excepção da seguradora, a pagar, solidariamente, aos Autores, relativamente a cada um dos sinistrados, a quantia de €150 000, correspondentes à indemnização pelo dano morte e a quantia de € 20 000, a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos pelos pais dos sinistrados, com juros de mora vencidos e vincendos, contados do dia seguinte ao da morte até integral pagamento. Para o efeito alegam, no essencial, que no dia 12 de Janeiro de 2001, na construção do viaduto sobre o Barranco ….no troçoAlmodôvar - São Bartolomeu de Messines da auto-estrada A2, quando os sinistrados B…. e C… procediam ao afagamento e alisamento do betão, ocorreu o colapso da estrutura onde trabalhavam, o que causou a sua morte sob os escombros; que o acidente ocorreu porque a dona da obra não nomeou um coordenador de segurança na fase da execução da obra como é legalmente imposto, porque existiam deficiências no projecto de estrutura do cimbre, porque existiam divergências entre a estrutura do projecto de cimbre e a execução deste, porque existia desconformidade fundamental entre o projecto da estrutura do cimbre e o Regulamento de Segurança e Acções para as estruturas de Edifícios e Pontes e porque o material utilizado se encontrava em mau estado de conservação; que os sinistrados faleceram quando trabalhavam ao serviço da 1ª Ré (auferindo o salário mensal de € 5 x 12 horas x 22 dias, acrescido de um subsídio de refeição de € 5,09 x 22 dias úteis) pelo que o acidente ocorrido constitui um acidente de trabalho indemnizável, indemnização que terá de ser agravada devido à ocorrência de negligência grave por banda da entidade empregadora e das Rés I… e J…, limitando-se a responsabilidade da ré seguradora ao dever de indemnizar nos limites da transferência da responsabilidade para si efectuada, tendo-se em conta que os sinistrados enviavam todos os meses para os respectivos pais, grande parte do seu salário pois estes careciam absolutamente do dinheiro enviado pelos filhos para viverem no Brasil; alegam ainda que deve tomar-se em conta a perda do direito à vida dos sinistrados e o ressarcimento do sofrimento sentido pelos Autores com a perda dos seus filhos.
Por despachos proferidos em 3 de Novembro de 2003, foram indeferidas liminar e parcialmente as petições iniciais quanto aos pedidos de condenação das Rés no pagamento das quantias peticionadas de €150 000 e € 20 000, respectivamente a título de indemnização do dano morte e a título de danos não patrimoniais, despachos que transitaram em julgado.
Contestaram as Ré D…. e a Ré A….
A Ré A…, pugnado pela improcedência da acção, impugna o montante dos salários referidos porque o contrato de seguro celebrado com a primeira Ré, era na modalidade de prémio variável, segundo folhas de férias e apenas tinha sido transferida a responsabilidade infortunística laboral pelo salário de € 403,53 (à data 80.900$00) x 14 meses; não aceita pagar as quantias peticionadas pois que o acidente teria resultado da falta de observância de várias regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho, situação que responsabiliza directamente a entidade patronal, a dona da obra e a empreiteira geral como dispõe o artigo 31 da Lei 100/97 e, ainda, porque desconhece se os sinistrados contribuíam com regularidade para o sustento dos pais.
Por seu turno a D… pugna também pela improcedência da acção, sustentando essencialmente que não tem qualquer tipo de culpa na produção do acidente uma vez que as causas da sua ocorrência não se devem a qualquer tipo de comportamento na execução dos trabalhos pela Ré (execução, aliás, que era dirigida e instruída pela empreiteira geral I…), mas as deficiências existentes no projecto da estrutura do cimbre que não eram da responsabilidade da Ré, tendo esta assegurado o cumprimento das suas obrigações legais, de acordo com o disposto no artigo 8º, nº 4, alínea c) do DL 441/91 de 14 de Novembro; que os sinistrados auferiam a retribuição correspondente ao montante do salário transferido para a ré seguradora pelo que a esta cabe a responsabilidade infortunística laboral devida pela produção do acidente; de qualquer forma aos Autores não assistiria o direito ao recebimento de subsídio por morte nem as despesas de funeral.
A Ré D… requereu ainda a intervenção da I…. e da J… e, ainda, do Engenheiro projectista, que não identifica, ao abrigo do disposto no artigo 129, nº 1, alínea b) do Código do Processo do Trabalho.
A Ré D… respondeu à contestação da Ré A…. reiterando as posições já defendidas na sua própria contestação.
O sr. Juiz indeferiu à requerida intervenção de outras entidades pela Ré D…. pretendida.
Foi proferido despacho saneador e aí se decidiu pela parcial procedência de uma excepção peremptória arguida pela Ré D…, na sequência do que as Rés foram absolvidas do pedido de pagamento de subsídio por morte. Foram seleccionados os factos considerados assentes e elaborada a base instrutória da causa, de que não houve reclamação.
Realizou-se a audiência de julgamento no termo da qual foi respondida a matéria que integrava a base instrutória da causa. Foi depois proferida sentença julgando totalmente improcedentes os pedidos dos Autores e absolvendo as Rés dos pedidos formulados, mas condenando a seguradora a pagar ao Fundo de Acidentes de Trabalho a quantia de € 33.892,52 e a entidade patronal a pagar àquele mesmo Fundo a quantia de € 58.503,48 (já considerada a rectificação ordenada pelo despacho de fls 781 e 782 dos autos).
Inconformados com o assim decidido apelaram para esta Relação tanto a Ré A… como os Autores.
A Ré A… remata a respectiva alegação com as seguintes conclusões:
A. A recorrente não se conforma com a sentença em dois aspectos fundamentais.
B. Por um lado porque não se aceita o entendimento do Mtma juiz a quo nos termos do qual “neste caso não haverá que ponderar da aplicação do disposto no artº 18º da LAT, uma vez que o regime excepcional aí estabelecido penas se aplica às prestações a serem fixadas aos beneficiários com direito ao recebimento de uma pensão, como se constata pela leitura do artº em referência.”
C. Por outro lado porque caso houvesse a obrigação de pagar ao FAT a quantia prevista no artº 20º, nº 6 da LAT, o que não se aceita, o montante não seria aquele que vem arbitrado na douta sentença recorrida.
D. Ao contrário do defendido pela Mtma juiz a quo, e salvo o devido respeito, que é muito, constitui uma das questões fulcrais nos presentes autos a de saber se deverá o sinistro sub júdice ser, ou não, indemnizável de acordo com as regaras constantes dos artºs 18º, nº 1 e 37º, nº 2 da LAT?
E. É que, no entender da recorrente, da matéria de facto provada conclui-se que o acidente resultou de falta de observação das regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho.
F. E, tendo o acidente resultado da falta de observação das regras de segurança, forçoso será ressarci-lo em função do disposto nos artºs 18º, nº 1 e 37º, nº 2, ambos da Lei nº 100/97.
G. Dispõe o artº 37º, nº 2 da L. nº 100/97 que “Verificando-se alguma das situações referidas no artº 18º, nº 1, a responsabilidade nele prevista recai sobre a entidade empregadora, sendo a instituição seguradora apenas subsidiariamente responsável pelas prestações normais previstas na presente lei.”
H. Nada permite afastar a regra constante do artº 37º, nº 2 da LAT nos casos em que, não existindo beneficiários legais, a reparação é devida ao FAT.
I. O que a lei diz é que nas situações referidas no artº 18º, nº 1, ou seja, nomeadamente, quando o acidente resultar da falta de observação das regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho, a responsabilidade de indemnizar cabe à entidade empregadora, sendo a seguradora apenas responsável subsidiária.
J. Ora tal ocorre quer quando haja beneficiários com direito a pensão quer quando, na falta destes, reverta para o FAT a quantia consignada no nº do artº 20º da Lei nº 100/97.
L. Importava, pois, in casu, determinar se o acidente resultou da falta de observação de regras de segurança, higiene e saúde no trabalho, como foi o caso,
M. Pois que assim sendo, como foi, a entidade seguradora, ora recorrente, não poderia ser condenada, a título principal, a pagar ao FAT a verba correspondente ao triplo da retribuição anual segura, mas antes deveria ser, nos termos do artº 37º, nº 2 da Lei nº 100/97, condenada apenas a título subsidiário.
N. Mesmo que assim não fosse, então sempre o certo é que o quantum indemnizatório arbitrado ao FAT na douta sentença recorrida e a suportar pela ora recorrente não está correctamente calculado.
O. Nos termos do nº 6 do artº 20º da L. 100/97 reverte para o FAT uma importância igual ao triplo da retribuição anual.
P. Por seu turno, nos termos do disposto no nº 3 do artº 37º da L. 100/97, quando a retribuição declarada para efeito de prémio do seguro for inferior à real, a entidade seguradora só é responsável em relação àquela retribuição, respondendo a entidade empregadora pela diferença.
Q. No caso sub júdice a Ré D…, tinha transferido para a Ré seguradora a responsabilidade pelo salário de € 403,53x14 meses, ou seja pelo salário anual de € 5.649,42.
R. Daí que a responsabilidade da recorrente, se existisse, em função da regra consignada no artº 20º, nº 6 da LAT seria pela quantia máxima de € 16.948,26 e não pelos € 20.643,60 em que foi condenada.
S. A douta sentença recorrida enferma, pois, de erro de interpretação e de erro na determinação da norma aplicável, bem como errou na aplicação da lei aos factos provados, carecendo de ser alterada e substituída por outra que: a) aprecie a violação de regras de segurança como causa acidente; b) conclua que, tendo o acidente resultado da falta de observação dessas regras sobre segurança, higiene e saúde no trabalho, deverá ser indemnizado pela Ré entidade empregadora em subsunção do disposto nos artºs 18º, nº 1, a) e 37º, nº 2, ambos da Lei nº 100/97, sendo a ora recorrente apenas subsidiariamente responsável; c) ou, caso assim se não entenda, altere o valor da indemnização a pagar ao FAT, fixando-se o mesmo em € 16.948,26.
Relativamente a este recurso não foi apresentada qualquer resposta.
Os Autores, por seu turno, na respectiva apelação formulam as seguintes conclusões:
I. A, aliás, douta sentença colocada em crise, não considerando no todo os sobreditos documentos comprovativos de remessas regulares cujos destinatários finais eram os ora apelantes, mas apenas parcialmente e não havendo nos autos matéria de facto, que afaste a plena eficácia dos mesmos enquanto declaração negocial e não se pronunciando sobre os mesmos como deveria, resulta a violação do disposto no artº 362º do CC e artº 72º, nº 1 do CPT, ferindo-a de nulidade – cfr. Artº 668º, nº 1, al. d) do CPC.
II. “Mutatis Mutandis”, sempre se aplicariam as razões expendidas na primeira conclusão relativamente ao subsídio por despesas de funeral;
III. Sendo certo que o seu pagamento, não está sequer, por imperativo legal, sujeito a prova e decorre do disposto no artº 22º da L. 100/97 de 13/09
IV. A Mtma juiz “a quo” não considerando a matéria e factos reportados à al. G) da especificação mas apenas ao quesitado em 4 da base instrutória, omitiu pronúncia a que estava legalmente obrigada, concretizando a sua omissão nulidade de sentença – cfr. Artº 668º, nº 1, al. d) CPC.
V. Constitui uma autêntica injustiça, até para reputação do Estado Português, morrerem jovens emigrantes numa obra pública, solteiros, que em nada concorreram para o sinistrado, que como ficou provado enviam regularmente, dinheiro proveniente do seu salário para o seu país de origem e não usar o julgador do poder dever que a lei processual laboral lhe faculta a fim de fazer o melhor e mais sã justiça, não recorrendo ao disposto no artº 72º do CPT e fazer reverter em benefício do próprio Estado onde morreram as pensões devidas aos apelantes, apenas pela leve e não rigorosa apreciação da prova.
Termina pedindo a revogação da decisão recorrida.
Também relativamente a este recurso não foi apresentada qualquer resposta.
Com o despacho de admissão, a srª juiz pronunciou-se sobre a nulidade da sentença que os AA. arguem para concluir que a mesma se não verifica.
Subidos os autos a esta Relação, o juiz relator consignou que são dois os recursos interpostos e que nada obstava à respectiva apreciação
Os autos foram apresentados ao Exmo Procurador Geral adjunto que emitiu parecer apenas quanto ao recurso apresentado pelos AA para opinar que o mesmo não merece provimento que, notificado às partes, não mereceu qualquer resposta.
Mostram-se colhidos os vistos dos senhores juízes adjuntos.
Cumpre decidir.
*
A sentença recorrida assentou na seguinte factualidade que considerou provada:
1. Matéria de facto considerada assente:
A. No dia 12 de Dezembro de 2001, encontrava-se em construção o viaduto sobre o Barranco… sub lanço Almodôvar São Bartolomeu de Messines da auto-estrada A2.
B. Envolvidos em operações de betonagem, espalhamento de betão, vibramento com vibradores manuais pneumáticos e acabamento superficial manual em rodas, réguas e talochas, estava, entre outros B. filho dos autores…..,de .nacionalidade brasileira, então com a categoria profissional de carpinteiro de segunda.
C. E, C… filho dos autores,…, de nacionalidade brasileira, então com a categoria profissional de carpinteiro de segunda.
D. O viaduto sobre o barranco do … tem uma extensão total de 227 metros e encontrava-se a ser betonado o tramo entre os pilares PP2 e PP3, com uma extensão de 32 metros e altura máxima de 30,1 metros.
E. O tabuleiro poente deste viaduto, nos seus três primeiros vãos, lado norte, estava a ser construído com cofragem suportada por vigas longitudinais, treliçadas, metálicas (vigas BB70, vencendo cada vão do viaduto com duas vigas.
F. As quais se apoiavam junto ao pilar de betão e no apoio intermédio, centrado sobre o vão do viaduto.
G. Por sua vez, os apoios intermédios e os extremos junto ao pilar de betão eram constituídos por conjuntos de torres metálicas BB20, com altura de 30, 1 metros interligados por contraventamentos.
H. Sendo os restantes apoios, junto aos pilares de betão, constituídos por perfis suspensos de uma estrutura apoiada directamente nos pilares.
I. As torres BB20 estavam apoiadas no solo do lado poente, em sapatas superficiais, constituídas por lagetas de betão com 1,00 x 1,00 x 0,17 m e do lado nascente em vigas de madeira sobrepostas octogonalmente em dois níveis.
J. Pelas 4 horas e 15 minutos do referido dia 12 de Dezembro de 2001 esta descrita estrutura cedeu, ou seja, ocorreu o colapso da mesma ao solo, quando já tinham sido aplicados 248 m2 de betão correspondentes ao carregamento de 36 auto-betoneiras.
K. Naquele preciso momento, o sinistrado procedia ao alisamento e afagamento do betão pelo que o colapso da estrutura arrastou-o infortunadamente até à morte pois faleceu sob os escombros da mesma.
L. Da análise do acidente, relatada no Inquérito do acidente de trabalho elaborado pela delegação da Inspecção-Geral do Trabalho, resulta claramente que o acidente se deveu aos seguintes factores:
M. Falta de nomeação efectiva de coordenador de segurança na fase do projecto e na fase da obra pois,
N. Cabe ao dono da obra, nomear o coordenador de segurança na fase do projecto e na fase da execução da obra.
O. Na fase do projecto e deste, em especial, dada a sua maior importância ou complexidade, o coordenador de segurança deve ser pessoa colectiva que se assegure na elaboração do mesmo de que o seu autor tenha em consideração os princípios gerais de prevenção, em especial nas opções arquitectónicas, técnicas e organizativas, atenda à previsão do prazo para a realização dos trabalhos e elabore ou mande elaborar, planos de segurança e de saúde.
P. Devendo, consequentemente, ter ao seu serviço, pessoas qualificadas nas diferentes especialidades do projecto em causa.
Q. Na fase da execução da obra, cabe ao coordenador de segurança promover e coordenar a aplicação dos princípios gerais de prevenção nas opções técnicas e organizativas necessárias à planificação dos trabalhos,
R. Zelar pelo cumprimento das obrigações dos empregadores;
S. Efectuar ou mandar efectuar as adaptações ao plano de segurança,
T. Coordenar as actividades das empresas e trabalhadores intervenientes no estaleiro, tendo em vista a prevenção dos riscos profissionais;
U. Coordenar e controlar a correcta aplicação dos métodos de trabalho e promover a divulgação da informação sobre riscos profissionais dos intervenientes no estaleiro.
V. Assim sendo, deverá também nesta fase ser pessoa colectiva munida de um conjunto múltiplo de quadros técnicos necessários às diferentes fases da obra.
W. A dona da obra, ora quarta ré, impôs a todos os empreiteiros gerais a indicação de um coordenador de segurança, passando assim a existirem tantos coordenadores de segurança como empreiteiros gerais em obra.
X. As funções destes são as inerentes à qualidade de técnicos de segurança das empresas para quem trabalham, pelo que não preenchem o conteúdo funcional correspondente à coordenação de segurança legalmente exigido, tanto mais que diluído pelo número de estaleiros que têm a seu cargo.
Y. Na obra em causa a estrutura de segurança existente era apenas assegurada por um técnico de segurança do empreiteiro geral, I…., a quem a J…, dona da obra, designou para coordenador de segurança nos três viadutos que lhe adjudicou: viaduto do Barranco do …, das …. e do…..
Z. Esse técnico de segurança apenas se deslocava uma vez por mês ao conjunto dos três viadutos em construção, designadamente ao local do sinistro, cuidando apenas de aferir das protecções colectivas e individuais, tais como a existência de guarda-corpos nas bordaduras dos tabuleiros e outras.
AA. Pelo que a dona da obra não nomeou um coordenador de segurança na fase de execução da obra.
BB. Não existia uma estrutura de segurança para o empreendimento de forma a que, articulada com técnicos de segurança dos empreiteiros, pudesse identificar, avaliar e estabelecer medidas de prevenção em relação aos riscos de todo o processo produtivo, verificando de forma contínua e rigorosa a conformidade dos procedimentos adoptados em estaleiro.
CC. O plano de segurança só é eficaz se responder directamente às situações de trabalho concretas, devendo reunir elementos essenciais de informação, de caracterização e planificação, ao nível da obra, do estaleiro, das operações de trabalho e dos materiais e equipamentos a utilizar.
DD. A planificação deve ter em conta dois domínios fundamentais de intervenção: a organização do estaleiro e o processo produtivo, devendo este último obedecer ao cronograma de trabalhos, operação a operação.
EE. Identificando as respectivas sub-operações e estabelecendo-se por cada uma delas, a prevenção dos riscos correspondentes, por referência à sua origem – equipamentos, modos operatórios e materiais e, identificados e hierarquizados que sejam, há que estabelecer as adequadas técnicas de prevenção.
FF. A J… contratou com cada empreiteiro geral a elaboração de planos de segurança, pelo que a cada adjudicação correspondeu um plano de segurança independente, desarticulado dos demais, não reflectindo uma lógica global do empreendimento.
GG. O plano de segurança e saúde do viaduto foi apresentado em 30 de Dezembro de 2000, cerca de cinco meses antes do início da obra e não foi objecto de qualquer actualização até à data do fatídico acidente.
HH. E, foi genérico, abrangeu os três viadutos especiais do lote G: viaduto sobre o …., viaduto das … e o Viaduto do …., onde ocorreu o acidente.
II. Ora, estes três viadutos tinham dimensões, implementação e riscos próprios e não tendo o referido plano sofrido alteração ou adaptação a situações concretas que iam surgindo ao longo da execução do viaduto, tal plano de segurança não era dinâmico, não previu a montante os riscos, nem determinou as respectivas medidas de prevenção.
JJ. A estrutura do projecto de cimbre projectada divergia daquela que efectivamente se encontrava montada no local, dia e hora do acidente nas seguintes vertentes:
KK. A introdução da memória descritiva do projecto respeitava ao cavalete ao solo para a betonagem dos tabuleiros do viaduto…. e não especificamente para as do viaduto sobre …. onde ocorreu o acidente;
LL. O número de diagonais de contraventamento montadas correspondia a cerca de metade das previstas no projecto, este previa a sua montagem de 2,80 m em 2,80 m de altura e na obra foram montados de 5,60 metros em 5,60 metros de altura;
MM. O projecto de cimbre não continha nenhum pormenor da localização das ligações entre as diagonais de contraventamento e as travessas horizontais das torres. Tais ligações apresentavam frequentes e consideráveis desvios dos nós de ligação relativamente às colunas das torres, variando de 20 a 80 cm;
NN. No viaduto poente, local do acidente, a solução adoptada foi a montagem de colunas BB20 quando o projecto de cimbre ao solo referiu que entre os pilares PP3 e PP2 seriam utilizadas torres metálicas constituídas por elementos de sistema Mills e nos pilares PN3 e PN2, do viaduto nascente, seriam utilizadas colunas BB20, pelo que era manifesta a desconformidade entre o projectado e o executado em obra.
OO. Os cálculos apresentados na memória descritiva do projecto eram insuficientes e inadequados à verificação da segurança das torres que colapsaram pois apenas foi efectuada no plano longitudinal e não igualmente na sua direcção transversal mais desfavorável para a sua segurança.
PP. A verificação da segurança das torres no seu plano longitudinal foi inadequada uma vez que o valor considerado para a sua altura – 23, 4 metros – era inferior à altura das torres montadas a meio vão – 30, 1 metros – entre os pilares PP2 e PP3 onde ocorreu o colapso.
QQ. Assim, as torres que tombaram encontravam-se submetidas a condições de funcionamento mais gravosas do que as que tinham sido consideradas no projecto.
RR. O projecto não previu sistema de contraventamento transversal (pormenor e cálculos) para as colunas interiores das torres, ficando o travamento bastante reduzido pois dependem da rigidez da flexão das travessas horizontais, as quais eram constituídas por tubos de andaime.
SS. Finalmente o projecto subavaliou o valor das cargas verticais actuantes nas colunas do lado sul das torres centrais na fase final da betonagem do tabuleiro, em resultado da omissão do peso do betão no troço do tabuleiro compreendido entre as colunas do lado norte e as colunas do lado sul das torres centrais.
TT. Da avaliação do próprio projecto, verifica-se ainda, que existe desconformidade fundamental entre o projecto da estrutura de cimbre e o regulamento de segurança e acções para as estruturas dos edifícios e pontes, uma vez que tal projecto apresentava apenas uma comparação entre esforços actuantes e resistentes aos nível dos elementos de base de sistema estrutural, não tendo em consideração as características particulares da estrutura em que esses elementos são inseridos, tais como altura e o respectivo sistema de contraventamento como manda o referido regulamento.
UU. O projecto considerou o esforço normal resistente para as Torres BB20, de 200 km, baseado num folheto com informação técnica, o qual refere esse valor em relação a colunas com altura livre de 10 metros, quando é certo que este cálculo não se poderia aplicar a colunas com 30 metros de altura como as consideradas no projecto.
VV. O valor de 200 km não estava fundamentado em termos de características resistentes do material e das hipóteses adoptadas no seu cálculo, pelo que o valor adoptado no projecto de esforço normal das torres Bb20, não oferecia credibilidade (200Kn/10m de altura) e não deveria ser o mesmo para alturas diferentes.
WW. O sinistrado B…. nasceu em 2 de Novembro de 1981 e faleceu em 12 de Dezembro de 2001.
XX. O sinistrado C… nasceu em 1 de Maio de 1978 e faleceu em 12 de Dezembro de 2001.
YY. A Ré D. … é uma empresa de construção civil para quem os sinistrados trabalhavam, exercendo as funções correspondentes à categoria de carpinteiro de segunda, sob as ordens, direcção e fiscalização desta.
ZZ. E da mesma recebiam a retribuição pelo seu trabalho, sendo certo que esta transferira a sua responsabilidade infortunística laboral para a companhia de seguros, ora segunda ré, através de contrato de seguro de acidentes de trabalho titulado pela apólice nº…..
AAA. Os sinistrados faleceram como consequência directa e necessária do descrito colapso da estrutura onde se encontrava a trabalhar.
BBB. Era à dona da obra e à empreiteira geral, respectivamente, que cabia coordenar a segurança, quer na fase do projecto quer na fase da obra e cuidar de ter um projecto de estrutura ao solo que tivesse em atenção os princípios gerais de prevenção em matéria de segurança e saúde, responsabilidades estas, das quais, na forma alegada se demitiram.
CCC. A I…. e J… tinham o pleno conhecimento das condições em que se encontrava o seu estaleiro, nele não observaram as normas de segurança a que estavam adstritas, assim expondo os trabalhadores que ali trabalhavam a constante perigo de vida e da integridade física, não obstante saberem estar obrigadas ao cumprimento de tais normas, assim omitindo um dever que lhes era exigido.
DDD. O dono da obra era a J… e o empreiteiro geral a I….
EEE. O técnico de segurança do empreiteiro geral, apenas se deslocava ao viaduto onde ocorreu o acidente uma vez por mês, cuidando apenas de aferir das protecções colectivas e individuais, tais como a existência de guarda-corpos nas bordaduras do tabuleiro.
FFF. Não foi a Ré D. …. quem elaborou o projecto de estrutura aplicada na obra.´
GGG. A Ré D. … tinha seguro por acidentes de trabalho sofridos pelos sinistrados na ré A… pelo menos pelo salário de € 403,53 mensais, 14 vezes por ano.
HHH. Tal seguro contemplava a modalidade de seguro por folhas de férias.
III. Os sinistrados auferiam, cada um, pelo menos, € 403,53 mensais, 14 vezes por ano, acrescidos de € 5,09 diários de subsídio de alimentação, 22 vezes por mês.
2. Em face das respostas dadas à base instrutória:
A. Os sinistrados auferiam cinco euros por hora de trabalho e trabalhavam, em média, 10 horas por dia, 22 dias úteis por mês.
B. Os sinistrados procediam à remessa de dinheiro proveniente dos seus salários para o Brasil.
C. A causa do colapso deve-se a deficiência do projecto de cimbre, sendo certo que se verificaram divergências entre o projecto e a estrutura de cimbre montada.
*
São dois os recursos trazidos à nossa apreciação, ambos de apelação, um interposto pela Ré seguradora A… e outro interposto pelos Autores.
No seu recurso a seguradora suscita essencialmente duas questões: a) quando houver lugar, como no caso, à aplicação do nº 6 do Artº 20º da LAT e discutindo-se se foram violadas as regras de segurança, mantém interesse apreciar esta última questão para efeitos de determinar quem é responsável pelo pagamento ao FAT, aplicando-se à distribuição de responsabilidade o regime estabelecido no artº 37º, nº 2 da LAT; como no caso ficou demonstrado que o acidente resultou da violação das regras de segurança pela entidade patronal, esta será a principal responsável pelo pagamento da indemnização ao FAT, sendo a responsabilidade da seguradora meramente subsidiária; b) em qualquer dos casos, dado o salário declarado para efeitos de seguro, a responsabilidade da recorrente estaria limitada a € 16.948,26.
Por seu turno os Autores, no respectivo recurso, suscitam as seguintes questões: a) a sentença seria nula, por omissão de pronúncia, por um lado, por não ter valorado devidamente os documentos comprovativos das remessas de dinheiro que os sinistrados enviavam para os apelantes e, por outro, por não ter considerado o subsídio de refeição para efeitos de cálculo da indemnização devida; b) tendo resultado provado que os sinistrados enviavam regularmente dinheiro proveniente do seu trabalho para o seu país de origem o tribunal deveria ter recorrido ao disposto no artº 72º do CPT para fazer melhor e mais sã justiça.
Consideramos dever começar por analisar o recurso dos Autores, pois que a sua eventual procedência pode tornar desnecessária a apreciação do recurso da Ré.
Convém assentar, liminarmente, que face à data da ocorrência do acidente (12/01/2001), o regime jurídico ao caso aplicável é já o que resulta da nova LAT, como se retira do artº 41º, nº 1, al. a) da Lei nº 100/97 de 13/09, conjugado com o disposto no artº 71º do DL nº 143/99 de 30/04 e artº 1º do DL nº 382-A/99 de 22/09.

I – Apelação dos Autores.

a) Nulidades de sentença.
No próprio requerimento de interposição de recurso os recorrentes dizem pretender arguir expressa e separadamente a nulidade da sentença. Porém, apesar daquela afirmação, acabam por no próprio requerimento de interposição de recurso não arguir qualquer nulidade de sentença; só na alegação de recurso que dirigem a este tribunal desenvolvem a argumentação tendente a caracterizar as nulidades que argúem e na base da verificação delas constroem o essencial das respectivas conclusões.
No regime do processo civil geral ou comum a arguição de nulidades de sentença (salvo o caso a que alude a al. a) do nº 1 do artº 668º do CPC) só pode ser feita perante o próprio tribunal que proferiu a decisão se esta não admitir recurso ordinário; se admitir recurso ordinário este pode ter como fundamento a arguição de nulidades (artº 668º, nº 3 do CPC).
Porém, em processo laboral, existe um regime próprio de arguição de nulidades de sentença, como claramente resulta do artº 77º do actual CPT (mas que, nesse domínio, não diverge do regime que já vinha do CPT de 1981, aprovado pelo D.L. nº 272-A/81 de 30/09, como resultava do respectivo artº 72º). Se da sentença não couber recurso ou dela não pretenda recorrer-se, a arguição de nulidades de sentença é feita perante o próprio tribunal que proferiu a decisão; no caso de recurso, a arguição de nulidade de sentença tem de ser feita no requerimento de interposição de recurso ( nºs 1 e 2 do referido artº 77º).
Não pode confundir-se o requerimento de interposição de recurso com a alegação de recurso, mesmo que, como acontece nos recursos do foro laboral, aquele deva conter esta (nº 1 do artº 81º do CPT); aquele é dirigido ao próprio tribunal que proferiu a decisão (artº 687º, nº 1 do CPC); a alegação é dirigida ao tribunal superior pois que é nela que o recorrente invoca as razões da discordância em relação à sentença e os fundamentos com que pede a sua alteração ou a sua revogação pelo tribunal “ad quem”.
No caso, a arguição de nulidades de sentença não surge propriamente no requerimento de interposição de recurso, o que seria bastante para concluir que não se mostra respeitada a exigência contida no nº 1 do artº 77º do CPT e, por isso, no seguimento do que tem sido jurisprudência repetida desta Relação e o STJ vem decidindo, tal arguição não poderia ser atendida por extemporânea (entre muitos outros vejam-se os Acºs do STJ de 1/6/1994, 19/10/1994 e 23/04/1998, respectivamente in Colect. Jurisp. 1994, Ano II, Tomo III, pág. 274, BMJ 440/242 e BMJ 476/297).
Verificamos, no entanto, que o requerimento de interposição de recurso contém uma nuance: os requerentes dão nele por inteiramente reproduzido o que alegam nos pontos I e II da respectiva alegação, precisamente aqueles em que abordam as questões atinentes às nulidades de sentença. Tal particularidade leva-nos a reponderar e a admitir que possa entender-se que os recorrentes acabam por arguir as nulidades de sentença no requerimento de interposição de recurso, embora seja algo incompreensível a técnica utilizada.
Posto isto, consideramos dever conhecer das arguidas nulidades de sentença.
Se bem entendemos a alegação dos recorrentes a primeira das arguidas nulidades estaria em o tribunal “a quo” não ter valorado devidamente os documentos comprovativos das remessas de dinheiro que os sinistrados efectuavam para os seus pais, o que feriria a sentença da nulidade a que alude o artº 668º, nº 1, l. d) do CPC.
Discordamos de que com tal fundamento estejamos perante uma nulidade de sentença.
A matéria relativa à apreciação da prova e à decisão sobre a matéria de facto, em caso algum pode envolver aquele vício, mormente a nulidade a que alude a al. d) do nº 1 do artº 668º do CPC, preceito este que se conexiona directamente com a exigência estabelecida no nº 2 do artº 668º do mesmo diploma.
No domínio da apreciação da prova e da decisão sobre a matéria de facto apenas poderá discutir-se se o sr. Juiz procedeu a uma correcta selecção da matéria de facto e, quanto àquele que era controvertida, se fez ou não um correcto julgamento na ponderação das provas que foram submetidas à sua apreciação. Porém, o erro ou o deficiente julgamento da matéria de facto constitui fundamento para impugnar, por via de recurso, a decisão que recaiu sobre o mérito da causa, uma vez verificados os pressupostos de que a lei faz depender a impugnação da decisão de facto (vide artºs 511º, nº 3 e 690º-A do CPC), estando nesse domínio os poderes da Relação confinados ao que dispõe o artº 712º do CPC.
Entendemos, pois, que com o fundamento em apreciação, não se verifica qualquer nulidade da sentença.
Insistem os recorrentes que o mesmo fundamento de nulidade de sentença se verifica – o do artº 668º, nº 1, al. d) do CPC – quando o sr. Juiz, tendo dado como provado que os sinistrados auferiam € 5,09 diários de subsídio de refeição, não incluiu tal subsídio no cálculo da pensão, apesar de o mesmo não constar das folhas de férias remetidas à seguradora.
Mais uma vez, é impossível configurar nulidade de sentença com tal fundamento, desde logo por que na sentença recorrida não foi reconhecido aos Autores o direito a qualquer pensão ou prestação e daí que não tenha sido abordada a questão de saber qual fosse a base retributiva a atender para o respectivo cálculo.
Porém, mesmo nessa eventualidade, se o juiz não tivesse levado em consideração o subsídio de refeição no cálculo das prestações que a lei de acidentes de trabalho confere, tal não integraria nulidade de sentença mas mais um erro de julgamento ligado ao próprio mérito da decisão que só poderia ser corrigido através de recurso a interpor dessa decisão, o que extravasa do âmbito das nulidades de sentença.
Eis porque, concluímos, não se verificam com os fundamentos invocados, logo improcedem, as arguidas nulidades de sentença.

b) Quanto à questão de fundo.
Na sua algo confusa alegação descortina-se um certo inconformismo dos recorrentes por o tribunal recorrido não ter dado como provado que os sinistrados faziam com regularidade remessas de dinheiro aos Autores e que estes delas careciam para viver e sobreviver.
O inconformismo que os recorrentes assim manifestam é, pois atinente à decisão proferida em sede de matéria de facto.
Dado que a prova produzida em audiência foi objecto de gravação, a decisão proferida pela 1ª instância quanto à matéria de facto pode ser reapreciada por esta Relação, como estabelece o artº 712º do CPC. O entanto, como é dos princípios, pretendendo o recorrente impugnar a decisão proferida pela 1ª instância em sede de matéria de facto tem de, sob pena de rejeição, nas conclusões da respectiva alegação, proceder às especificações constantes do artº 690º-A do CPC, isto é tem de aí especificar quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados bem como os concretos meios de prova constantes do processo ou da gravação que impunham decisão diversa sobre os pontos da matéria de facto impugnada, devendo no caso de gravação indicar os depoimentos em que se funda por referência ao assinalado em acta.
Analisando as conclusões com que os recorrentes rematam a respectiva alegação vê-se que nelas não tem a preocupação de proceder àquelas especificações. Por outro lado, faz apelo ao disposto no artº 72º do CPT, dando a entender que o tribunal teria desrespeitado o estabelecido em tal preceito.
E certo que se no decurso da produção da prova surgirem factos que, embora não articulados, o tribunal considere com interesse para boa decisão da causa, deve ampliar a base instrutória, desde que sobre a matéria tenha incidido discussão (nº 1 do artº 72º do CPT); mesmo depois de findos os debates o tribunal pode ainda ampliar a matéria de facto, verificados os pressupostos estabelecidos no nº 4 do mesmo artigo. Porém, tais iniciativas têm de ocorrer no momento oportuno e, mormente no domínio da aplicação do estabelecido no nº 1 do referido artº 72º, nada obsta a que sejam as partes a requerer ao tribunal o uso dos poderes aí conferidos, não representando tal mais que o desenvolvimento do princípio consagrado no nº 3 do artº 264º do CPC, que em processo laboral assume ainda mais ampla dimensão.
Os Autores ou qualquer das partes não usaram de tal diligência, sendo, agora, de todo inoportuno vir suscitar questões que não foram suscitadas no devido momento perante o tribunal recorrido.
Temos, assim que os recorrentes além de nas conclusões da respectiva motivação de recurso não terem dado cumprimento às exigências das al. a) e b) do nº 1 e nº 2 do artº 690º-A do CPC (o que só por si constituiria fundamento para a rejeição do recurso na parte em que pretensamente impugnam a decisão proferida em sede de matéria de facto) acaba também por não ter razão ao fazer agora apelo ao que estabelece o artº 72º do CPT.
Apesar do que se deixa dito é para nós claro que o inconformismo dos recorrentes respeita à resposta dada à matéria do quesito 3º da base instrutória (no qual se questionava: “O(s) sinistrado(s) enviava(m) grande parte do seu salário aos Autores, carecendo estes de tais remessas para viverem no Brasil?”) que mereceu uma resposta restritiva :”Provado apenas que os sinistrados procediam à remessa de dinheiro proveniente dos seus salários para o Brasil”.
Repescando no corpo da respectiva alegação, vê-se que os Autores parecem pretender que os documentos juntos em audiência (estão certamente a referir-se aos documentos que constam de fls 661 e 673, juntos aquando da sessão da audiência de julgamento de 23/09/2005 – vide acta de fls 674) conjugados com o depoimento da testemunha Z… deveriam ter conduzido o tribunal a dar como provado que os sinistrados faziam remessas regulares de dinheiro para os Autores que delas careciam para viver e sobreviver.
Analisando o teor dos referidos documentos é manifesto que, com base neles o tribunal não poderia ir mais longe do que fez na resposta que deu ao artº 3º da base instrutória.
No que respeita ao depoimento da testemunha Z…, que ouvimos, constatamos que se trata de um advogado no Brasil (que, aliás, tem procuração nos autos passada pelos Autores – vide fls 31 e 32 do Proc. nº 4/2002 e fls 18 e 19 do Proc. nº 5/2002) que se desloca com frequência a Portugal e que, devido a outras relações foi contactado para acompanhar tudo o que dissesse respeito aos sinistrados após o acidente, mormente quanto à trasladação dos cadáveres para o Brasil. Porém, revelou não conhecer nem os sinistrados nem os respectivos pais e, quanto às condições em que estes viviam ou vivem ficou-se por generalidades afirmando o estado de pobreza em que muitos vivem nas roças no interior do Brasil, mas revelando que não conhecia pessoal e directamente as condições concretas de vida dos pais dos Autores.
Na análise conjugada dos referidos documentos e de tal depoimento não encontramos razão para divergir da convicção a que na 1ª instância se chegou quanto à resposta dada ao artº 3º da base instrutória, pelo que sempre consideraríamos inexistir base probatória para decidir diferentemente quanto à matéria de tal artigo.
E perante a matéria de facto provada outra não poderia ser a decisão quanto à questão de direito.
Resulta do disposto no artº 20º nº 1 al. d) e nº 2 da Lei nº 100/97 que para os ascendentes de vítima mortal de acidente de trabalho terem direito às prestações legais terá de provar-se que a vítima contribuía com regularidade para o seu sustento, exigência esta que corresponde à que já resultava da anterior LAT (vide base XIX nº 1 al. d) e nº2 da Lei nº 2.127), pelo que mantêm actualidade os ensinamentos da doutrina e da jurisprudência que se impuseram no domínio desta lei sobre tal matéria.
A doutrina e a jurisprudência desde há muito vêm afirmando que para estarem preenchidos os pressupostos da atribuição do direito a pensão aos ascendentes das vítimas de acidente de trabalho se exige não apenas que o sinistrado contribuísse para o seu sustento mas também que essa contribuição fosse regular e ainda que esses familiares tivessem necessidade dessa contribuição (vide Melo Franco, in suplemento ao BMJ (1979), pág. 82; Ac. do STJ de 26/07/85, in BMJ 349/358; Ac. da Relação de Évora de 10/01/84, in Col. Jurisp., XIX, tomo I, pág. 75; vejam-se também os recentes acórdãos desta Relação de 09/04/2003, 03/02/2004, 04/05/2004, proferidos respectivamente nos recursos nºs 2664/02, 2619/03 e 2875/03; entre outros acórdãos recentes do STJ, veja-se o de 10/03/2005, in Colect. Jurisp., Ano XIII (2005), Tomo I, pág. 257). Obviamente que a prova de verificação desses requisitos, porque constitutivos do direito à pensão, sobre quem invoca o direito recai, funcionando aqui o princípio-regra estabelecido no nº 1 do artº 342º do CC.
No que respeita ao último dos referidos requisitos (o da necessidade da contribuição), ele não resulta expressamente do texto do artº 20º, nº 1, al. d) e nº 2 da actual LAT (como também não resultava do texto da al. d), do nº 1 e nº 2 da Base XIX da anterior LAT), mas emana dos princípios gerais em matéria de obrigação alimentar (vide artºs 2003º e 2004º do CC), que tem semelhanças com a situação em apreço, segundo os quais a atribuição do direito a alimentos depende das possibilidades de quem houver de prestá-los e da necessidade de quem houver de recebê-los; quem pretenda obter alimentos deve alegar e provar a sua necessidade, igualmente acontecendo com os ascendentes de sinistrado que pretendam obter o reconhecimento do direito a pensão, pois que esta representa, nesse caso, um sucedâneo daquela obrigação alimentícia, visando ressarcir os ascendentes da perda de rendimentos que a morte do sinistrado representou para eles.
Pelo que à apreciação do(s) caso(s) dos autos respeita, a matéria de facto provada revela apenas que a vítimas procediam à remessa de dinheiro proveniente dos seus salários para o Brasil. De tal factualidade não é possível concluir que essas remessas se destinavam a contribuir para o sustento dos Autores e muito menos que estes careciam dessa contribuição. Por isso outra não poderia ser a decisão que no sentido do não reconhecimento aos Autores das prestações que reclamavam a título de pensão.
No que respeita às despesas de funeral, cuja reparação é feita em função dos valores a que alude o nº 3 do artº 22º da Lei nº 100/97, há ainda que considerar o disposto no artº 50º do DL nº 143/99 segundo o qual ais despesas são pagas a quem provar tê-las suportado. Precisamente porque os Autores não lograram provar que suportaram tais despesas não é possível reconhecer-lhe o direito àquele subsídio.
Improcede, pois, totalmente, a apelação dos Autores.

II. Apelação da Ré seguradora.
a) Da necessidade de apreciar e decidir se foram ou não vi9oladas as condições de segurança.
Sustenta a seguradora que quando, por ausência de beneficiários com direito a pensão, haja lugar ao pagamento ao FAT da importância a que alude o nº 6 do artº 20º da LAT, se aplica o regime previsto no nº 2 do artº 37º deste último diploma; por isso, questionando-se a violação das condições de segurança, higiene e saúde, há que conhecer de tal questão e, caso se conclua que aquela violação ocorreu, a responsabilidade principal pelo pagamento ao FAT caberá à entidade patronal, sendo a responsabilidade da seguradora meramente subsidiária.
Na decisão recorrida optou-se por outro entendimento. Na base de que quando haja lugar à aplicação do disposto no nº 6 do artº 20º da LAT não há que atender ao regime especial de reparação a que alude o artº 18º do mesmo diploma e, por isso, apenas haverá que apurar o montante das retribuições auferidas pelos sinistrados para proceder ao cálculo a que alude o nº 6 do artº 20º da LAT. Depois funcionaria a regra do nº 3 do artº 37º da LAT: a seguradora responderia em função de retribuição declarada para efeito de prémio de seguro; a entidade patronal responderia pela diferença se a retribuição real for superior.
Concordamos em que quando haja lugar à aplicação do nº 6 do artº 20º da LAT a importância a pagar ao FAT seja estritamente a aí prevista (o triplo da retribuição anual do sinistrado), não havendo lugar ao agravamento dessa prestação mesmo que se verifiquem os pressupostos estabelecidos no artº 18º, nº 1 da LAT, pois que esse agravamento só está previsto para o cálculo de prestações devidas a pensionistas.
Porém, questão diferente dessa é a de saber quem é responsável pelo pagamento ao FAT; nesse domínio, cremos que o melhor entendimento é o de que se aplicam integralmente as regras definidas nos nºs 2 e 3 do artº 37º da LAT. Por um lado, existindo seguro a seguradora responderá em função da retribuição declarada para efeito do prémio de seguro; caso a retribuição real seja superior a entidade patronal responderá pela diferença (nº 3 do artº 37º); no entanto, se o acidente tiver sido provocado pela entidade empregadora ou um seu representante ou resultar da falta de observação das regras de segurança, higiene e saúde no trabalho, a responsabilidade principal recai totalmente sobre a entidade patronal, sendo a responsabilidade da seguradora meramente subsidiária e estritamente em função da retribuição declarada para efeitos de seguro (nº 2 do artº 37º).
Não se compreenderia que, no respeitante à definição e distribuição da responsabilidade, se ponderasse de outro modo, pois que também a prestação a que alude o artº 20º, nº 6 da LAT é devida em virtude do acidente de trabalho; se é certo que a responsabilidade deste derivada é, em princípio, objectiva, a lei em determinadas situações manda a atender à culpa para definir e atribuir responsabilidades e não se vê que na situação em que a indemnização seja devida ao FAT seja de ponderar de outra forma.
Esta solução cabe perfeitamente na letra e no espírito da lei e representaria uma quebra de lógica que o legislador optasse por solução diferente no caso de os responsáveis serem confrontados com a obrigação de suportar a importância a que alude o nº 6 do artº 20º da LAT. Na interpretação da lei o intérprete deve sempre levar em conta a unidade do sistema jurídico e presumir que o legislador consagrou as soluções mais acertadas (artºs 9º, nºs 1 e 3 do CC), princípios estes que também orientam para que se acolha aquela forma de interpretar a lei.
Assiste, pois, razão à seguradora, não sendo despiciendo analisar se o acidente dos autos ficou a dever-se a falta de observação das regras de segurança, higiene e saúde no trabalho, questão essa que de seguida se vai analisar, o que este tribunal pode fazer, ao abrigo do que estabelece o nº 2 do artº 715º do CPC, até porque as partes já tiveram oportunidade de sobre ela se pronunciar porque suscitada pela seguradora recorrente na respectiva alegação.

b) Da violação das regras de segurança.
A responsabilidade por acidentes de trabalho recai sobre a entidade empregadora que, no entanto, deve obrigatoriamente transferir para entidades seguradoras (artº 37º, nº 1 da Lei nº 100/97 de 13/09 e artº 11º do D.L. nº 143/99 de 30/04); se essa transferência não se verificar o dever de indemnizar recai sobre a entidade patronal (vide nº 3 do artº 37º do mesmo diploma). Trata-se, aliás, de um caso de responsabilidade objectiva da entidade patronal que assenta basicamente no princípio do risco de autoridade ou na teoria do risco económico (entre nós introduzida pela Lei nº 1942 de 27/07/1936, continuada pela Lei nº 2127 de 3/08/1965 e mantida pela Lei nº 100/97 de 13/09). É assim que, uma vez que se mostre preenchido o conceito de acidente de trabalho (como está no caso dos autos, como se demonstra na sentença recorrida) estão, em princípio, reunidos os pressupostos para que a entidade patronal responda pelas consequências do acidente, independentemente de este ser imputável a culpa do empregador. Mesmo que o acidente seja causado por terceiro, tal não afasta a responsabilidade da entidade patronal (ou da seguradora, no caso de transferência de responsabilidade), embora a esta assista o direito de acção contra o terceiro responsável, nos termos da lei geral (artº 32º, nº 1 da Lei nº 100/97).
No domínio dos acidentes de trabalho a culpa da entidade patronal só é atendível para efeitos de agravamento e alargamento da sua responsabilidade e, no caso de existência de contrato de seguro, para efeitos de torná-la principal responsável pelas consequências do acidente (artº 18º e 37º, nº 2, ambos da Lei nº 100/97).
Para que essa responsabilidade e respectivo agravamento se estabeleçam, o acidente tem de ser provocado pela entidade patronal (ou seu representante), o que inculca a ideia de que o acidente tem de ser imputado à entidade patronal a título de culpa (por dolo ou mera negligência); esse nexo de imputação subjectiva fica também estabelecido, ou melhor, presume-se, quando o acidente resultar da inobservância das regras de segurança, higiene e saúde.
Postas estas considerações, analisemos o caso sub judice.
Como resultou provado o acidente que vitimou os sinistrados acorreu quando se procedia à betonagem (operação em que estavam envolvidos) de um viaduto em construção (numa extensão de 32 metros e a uma altura máxima de 30,1 metros). Quando já tinham sido aplicados 248 m2 de betão a estrutura que suportava o tabuleiro do viaduto cedeu e tudo caiu ao solo arrastando os sinistrados que faleceram sob os escombros.
A que terá ficado a dever-se o colapso da estrutura e a queda do tramo do viaduto que estava a ser betonado?
Fora as questões ligadas à falta de nomeação de um coordenador de segurança seja na fase de projecto seja na fase de execução da obra – que, em nosso ver, poderá representar a violação de obrigações legais mas em si mesma dificilmente permitirá o estabelecimento de um nexo causal entre a ocorrência do acidente e a violação daquela obrigação – resultou também provado que, no viaduto em questão, a estrutura do cimbre projectada não correspondia à que se encontrava montada no local, verificando-se, além do mais, que o número de diagonais de contraventamento montadas correspondia a cerca de metade das previstas no projecto (o projecto previa a sua montagem de 2,80 m em 2,80 m e apenas foram montadas de 5,60 m em 5,60 m); por outro lado, na verificação da segurança das torres no seu lado longitudinal foi considerada uma altura de 23,4 m quando no tramo em que se verificou o colapso essa altura era de 30,1 m, encontrando-se essas torres submetidas a condições de funcionamento mais gravosas que as consideradas no projecto.
Bastaria destacar estas deficiências para que se assuma a nototiedade de que as condições de estabilidade e, logo, de segurança, não estavam asseguradas numa obra com a envergadura da que estava a ser realizada. Mas outras deficiências são apontadas, como se vê dos pontos UU) e VV) da factualidade provada. Resultou também provado que a causa do colapso da estrutura se deveu a deficiências do projecto de cimbre e também a divergências entre o projecto e a estrutura de cimbre montada.
É certo que o dono da obra era a J… e a I…. o respectivo empreiteiro geral e que não foi a D…., entidade patronal dos sinistrados, que elaborou o projecto de estrutura aplicada na obra. Porém, a Ré D…., enquanto empregadora dos sinistrados, estava obrigada a assegurar-lhes condições de segurança, higiene e saúde em todos os aspectos relacionados com o trabalho (artº 8º, nº 1 do DL nº 441/91 de 14/11). Ao permitir que executassem o trabalho a que se dedicavam, apesar das deficiências que se verificavam na estrutura do cimbre, em violação de regras básicas de segurança, tornou-se principal responsável pelas consequências de acidentes que sofressem trabalhadores que aí estivessem ao seu serviço.
É certo que se a Ré D. …, entender que o acidente foi causado por terceiros, isto é, no caso, que a J…. e a I… são os responsáveis pela ocorrência do acidente, pode recorrer à acção de regresso nos termos gerais, como estabelece o o artº 31º, nº 1 da LAT, questão de que não interessa aqui curar.

c) Da indemnização a favor do FAT.
Porque não se perfilaram ou não foram reconhecidos beneficiários com direito a pensão, estão verificados os pressupostos de aplicação do disposto no nº 6 do artº 20º da LAT e, por isso, terá de reverter a favor do FAT uma importância equivalente ao triplo da retribuição anual de cada um dos sinistrados, como acabou por reconhecer-se na sentença recorrida.
Responsabilidade por esse pagamento, como já se referiu, cabe a título principal à entidade patronal dos sinistrados, sendo a responsabilidade da seguradora meramente subsidiária e apenas em função da retribuição declarada para efeitos do premio de seguro, isto porque o acidente ficou a dever-se à violação das condições de segurança, o que implica que o caso, em termos de imputação e distribuição de responsabilidades se subordine ao regime estabelecido nos nºs 2 e 3 do artº 37º da LAT.
Como resultou provado os sinistrados auferiam, na realidade, cada um, a retribuição de € 5 por cada hora de trabalho e trabalhavam em média 10 horas por dia, em 22 dias úteis por semana; porém, para efeitos de prémio de seguro, apurou-se que a entidade patronal apenas declarava o salário mensal de €403,53, pago 14 meses por ano.
Temos, assim, que a retribuição anual real de cada sinistrado era de € 15.400,00 (€5x22x14). No entanto, para efeitos de prémio de seguro apenas estava declarado o salário anual de €5.649,42 (€ 403,53x14).
Por isso, enquanto a Ré D…, entidade patronal dos sinistrados, responde perante o FAT com a importância de € 46.200,00 (€ 15.400,00x3) por cada sinistrado, ou seja, por € 92.400,00 no total, a Ré seguradora responde e apenas subsidiariamente pela importância de € 16.948,26 (€ 5.649,42x3) por cada um dos sinistrados, ou seja pela importância total de € 33.896,52. Esta importância corresponde, aliás, à que resulta do despacho de rectificação de sentença que consta de fls 780 a 782 dos autos, que não mereceu qualquer reparo das partes.
*
Procede, pois, no seu conteúdo essencial o recurso da seguradora, embora improceda totalmente o recurso dos Autores.
*
Termos em que acordam os juízes na Secção Social desta Relação em:
a) Julgar totalmente improcedente a apelação dos Autores e confirmar a sentença recorrida na parte em que absolveu as Rés dos pedidos pelos Autores formulados (ponto A) da parte decisória da sentença recorrida).
b) Julgar procedente o recurso da Ré seguradora e em consequência revogar os pontos B) e C) da parte decisória da sentença recorrida que, nessa parte, é substituída por estoutra condenando:
1. A Ré patronal, D…, a pagar, como responsável principal, ao Fundo de Acidentes de Trabalho a quantia global de € 92.4000,00;
2. A Ré seguradora a pagar ao Fundo de Acidentes de Trabalho, como responsável subsidiária, a quantia de € 33.896,52 €.
*
As custas da apelação dos Autores ficam a cargo destes.
As custas da Apelação da Seguradora ficam a cargo da Ré D… atendendo-se para o efeito ao valor da respectiva condenação.
*
Évora, 14/11/2006
Acácio Proença
Gonçalves Rocha
Chambel Mourisco.