Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2100/18.1T8STR.E1
Relator: MARIA DOMINGAS
Descritores: SEGURO DE VIDA
EMPRÉSTIMO BANCÁRIO
DEVER DE INFORMAR
Data do Acordão: 09/10/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I. Sendo aplicável o disposto no art.º 429.º do Código Comercial, o contrato é anulável desde que se verifique ter havido qualquer declaração inexacta ou reticente de factos conhecidos do tomador do seguro que tivessem podido influenciar a existência ou as condições do seguro, independentemente de o tomador estar de boa ou de má-fé.
II. O questionário é uma das formas de declaração inicial do risco pelo candidato tomador do seguro ou pessoa segura, que tem por objectivo a ponderação por parte da seguradora dos riscos a correr com a celebração do contrato que lhe é proposto.
III. A inclusão no questionário de pergunta específica sobre determinada patologia denuncia a sua relevância para efeitos de avaliação do risco por parte da seguradora.
IV. Tendo a ré seguradora logrado demonstrar que o autor, pessoa segura, prestou declarações inexactas e que as mesmas interferiram nos termos do contrato celebrado, de modo que, a ter conhecido a real condição de saúde deste, não teria assumido o risco de invalidez que se veio a verificar, tanto basta para que possa anular o contrato de seguro.
V. A circunstância de não ter resultado comprovado um nexo causal directo entre as patologias omitidas e o evento que veio a determinar a incapacidade profissional total e permanente do autor e, consequentemente, a sua reforma, não impedem o efeito anulatório.
(Sumário da Relatora)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 2100/18.1T8STR.E1
Comarca de Santarém
Juízo Central Cível de Santarém – Juiz 4


I. Relatório
(…) instaurou contra (…) – Companhia de Seguros S.A. a presente acção declarativa de condenação, a seguir a forma única do processo comum, pedindo a final a condenação da demandada no pagamento à Caixa Geral de Depósitos, na sua qualidade de beneficiária designada, dos montantes que se mostrarem em dívida relativamente aos contratos de mútuo por si celebrados com esta entidade, e ainda a restituir-lhe as quantias que entretanto se viu obrigado a pagar à mesma instituição bancária nos montantes de € 2.450,00 e € 10.926,55, acrescidas dos juros vencidos e vincendos, bem como aquelas que vier a pagar e juros respectivos.
Em fundamento alegou, em síntese, ter celebrado com a CGD, em conjunto com o seu cônjuge, dois contratos de mútuo nos montantes de € 23.000,00 e € 102.000,00, destinado o primeiro a liquidar o saldo em dívida de um empréstimo antes concedido pelo BII, SA tendo em vista a aquisição de habitação própria, e o segundo a realização de obras no imóvel. Na mesma data, 4 de Fevereiro de 2005, o demandante e o cônjuge celebraram com a Ré contrato de seguro do ramo vida, garantindo o pagamento dos montantes mutuados e em dívida em caso de morte ou invalidez das pessoas seguras.
Mais alegou que na sequência de insuficiência renal que lhe foi posteriormente diagnosticada ficou a padecer de uma incapacidade permanente global fixada em 26/11/2013 em 70%, o que determinou a sua passagem à situação de reformado por invalidez. Não obstante tratar-se de risco coberto pelo contrato celebrado, a ré recusa-se a pagar à CGD as quantias em dívida, tendo procedido à anulação do mesmo com o argumento de que aquando da sua celebração já o demandante era portador da doença cuja evolução veio a determinar a sua incapacidade, facto que dolosamente omitiu. Porque tal não corresponde à verdade, deverá ser condenada nos termos peticionados.
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Regularmente citada a Ré apresentou contestação, peça na qual sustentou ser o contrato celebrado com o autor anulável nos termos do art.º 429.º do Código Comercial, aqui aplicável, ao que acresce o facto de aquele não se encontrar afectado de uma invalidez absoluta e definitiva, conforme a define o art.º 1.º das condições gerais, carecendo em todo o caso de fundamento a pretensão formulada em segundo lugar, atenta a natureza pecuniária das prestações, caso a contestante fosse de algum montante devedora, o que repudia.
O autor respondeu, alegando não ter tido conhecimento, por nunca lhe terem sido presentes, das condições particulares do contrato juntas pela ré.
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Tendo os autos prosseguido para julgamento teve lugar a audiência final em cujo termo foi proferida sentença que decretou a condenação da Ré “a pagar à Caixa Geral de Depósitos os montantes que se mostrarem em dívida relativamente aos contratos de mútuo celebrados entre o Autor e o seu cônjuge em 04 de Fevereiro de 2005, até ao limite do capital em dívida que em 03 de Julho de 2015 era de € 17.318,26 e € 76.802,36; a pagar ao Autor as quantias que entretanto este se viu obrigado a pagar à Caixa Geral de Depósitos, que em 29 de Junho de 2018 eram de € 2.450,54 e € 10.926,55, acrescidas de juros vencidos e vincendos contados à taxa legal desde a citação até integral pagamento, e ainda as prestações que o Autor entretanto for pagando, acrescidas de juros à taxa legal, cuja liquidação se remete para execução de sentença”.

Inconformada, apelou a Ré e, tendo desenvolvido nas alegações apresentadas as razões da sua discordância com a decisão, formulou a final as seguintes conclusões:
“a) O ora recorrido prestou à ora recorrente declarações inexatas no momento em que preencheu os boletins de adesão aos dois seguros em causa nos autos.
b) Tais declarações inexatas influenciaram a própria existência dos contratos a que o ora recorrido aderiu, assim como as condições dos mesmos.
c) Razão porque se devem ter essas adesões como anuladas e, assim, inexistente qualquer relação contratual entre recorrente e recorrida quanto aos seguros em causa nos presentes autos.
d) Nos contratos de seguro de grupo, como é o dos autos, o dever de informação sobre as cláusulas contratuais gerais impende sobre o tomador daquele, e não sobre a seguradora.
e) Existe legislação específica e posterior à legislação geral sobre cláusulas contratuais gerais e relativamente ao dever de informação relativamente a contratos de seguro de grupo, pelo que tem que ser aquela, e não esta, a aplicável a situações como a dos presentes autos.
f) O elemento literal da norma específica, ao impor esse dever de informação ao tomador e ao estabelecê-lo apenas como ónus da seguradora quando o contrato excecionalmente o preveja, o que não acontece na situação dos autos, não deixa margem para interpretação como a defendida na sentença recorrida.
g) Acresce que, do ponto de vista prático, só o tomador de seguro está em condições de cumprir com os deveres de informação, por ser a única entidade a contactar com o destinatário dessa obrigação, sendo para mais certo que este em caso algum sai prejudicado por uma eventual violação desse dever de informação por parte do tomador/banco, já que a mesma pode sempre ser resolvida diretamente entre ambos e no âmbito da própria relação de crédito a favor da qual o seguro existe.
h) Com o que o eventual incumprimento do dever de informação por parte do banco credor do ora recorrido não é oponível à ora recorrente, devendo ter-se todas as cláusulas contratuais, e no âmbito da relação entre aquele e esta, plenamente válidas, incluindo as do art.º 2º, n.º 5.3, das condições gerais do contrato ajuizado.
i) A cláusula que define a Invalidez Absoluta e Definitiva é plenamente válida, quer por não ser abusiva, quer por corresponder a uma escolha feita entre duas de conteúdo diverso e às quais correspondem prémios de valor bastante diferentes.
j) Abusivo seria impor a uma das partes o conteúdo de uma cláusula mais cara pelo preço de outra mais barata, violando-se assim o princípio do equilíbrio das prestações contratuais.
k) De resto, o interesse a proteger pelos contratos de seguro com o dos autos não é o dos segurados que, não sendo obrigados pelas instituições de crédito, nem celebrariam aqueles, só o fazendo para garantirem que os bancos lhes emprestam os valores de que necessitam.
l) O interesse a proteger é o das entidades credoras que, estas sim, pretendem acautelar os seus créditos e que obrigam os clientes a quem concedem créditos a subscrevê-los.
m) A cláusula que define Invalidez Absoluta e Definitiva como «a limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria que incapacite a Pessoa Segura para o exercício de qualquer actividade remunerada, necessitando duma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária» há-de ter-se como válida, mas inaplicável na situação dos autos porque não preenchidos os requisitos que a mesma prevê.
n) A condenação da ora recorrente «a pagar ao Autor as quantias que, entretanto, este se viu obrigado a pagar à Caixa Geral de Depósitos que em 29 de Junho de 2018, era de € 2.450,54 e € 10.926,55 (…) e ainda as prestações que o Autor entretanto for pagando, (…) cuja liquidação se remete para execução de sentença» não tem causa de pedir nem tem acolhimento contratual nem legal.
o) A única possível base seria uma eventual mora por parte da ora recorrente, mas que não também não permite a procedência deste perdido já que, sendo a eventual obrigação de natureza pecuniária e não assentar a mesma em responsabilidade por facto ilícito nem pelo risco, a consequência prevista na lei é apenas a do pagamento de juros à taxa legal, com expressa exclusão de qualquer outra consequência.
p) Foram violadas as normas dos arts. 429º do C. Comercial, 4.º do decreto-lei nº 176/95, de 26 de julho, 286.º, 550.º e seguintes e 806º do C. Civil, 21.º, n.º 2, do decreto-lei nº 349/98, de 11 de novembro, e o decreto-lei nº 446/85, de 25 de outubro, e legislação que o alterou”.
Conclui pela revogação da sentença recorrida e substituição da mesma por decisão que, julgando anulado por declarações inexatas os seguros dos autos ou não preenchidos os requisitos do risco contratado, absolva a ora recorrente de todos os pedidos.
O autor respondeu, sustentando a manutenção do julgado, tendo ainda requerido a título subsidiário a ampliação do objecto do recurso, visando a modificação do ponto 19. dos factos provados, o qual defende que deverá ser julgado não provado.
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Assente que é pelo teor das conclusões que se fixa e delimita o objecto do recurso, são as seguintes as questões colocadas:
i. Da anulabilidade do contrato celebrado;
ii. Do obrigado ao dever de informação e da inoponibilidade à Ré/recorrente da violação desse mesmo dever;
iii. Da validade da cláusula que fixa o conceito de invalidez para efeitos da cobertura contratada;
iv. Do fundamento da condenação de restituição das prestações pagas pelo autor;
v. Da impugnação do ponto 19. dos factos provados.
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da impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto
Pese embora a ampliação do objecto do recurso tenha sido deduzida a título subsidiário, porque as questões de facto precedem logicamente as de direito e sendo certo ainda que eventual procedência da impugnação deduzida determinaria a decisão do primeiro fundamento recursivo apresentado pela ré, por ela começaremos a apreciação do objecto do recurso.
Deu-se como assente na sentença recorrida que
“19. Quando preencheu as declarações clínicas em Fevereiro de 2005, o Autor sabia que em 2001 lhe havia sido diagnosticada DRPAD, num contexto de cólica renal, assim como sabia que já era portador de litíase renal e quistos renais”.
A convicção do Mm.º juiz de julgamento quanto a este específico ponto da matéria de facto formou-se, conforme revela a motivação elaborada, “com base nos depoimentos das testemunhas (…), (…), (…), declarações de parte do Autor, tudo conjugado ainda com a análise dos documentos de fls. 71 a 75 e com as regras da experiência comum”.
O autor/apelado impugna a decisão, argumentando que nem os documentos juntos aos autos nem os testemunhos identificados permitem concluir que o A. tivesse conhecimento em 2001 que padecia da doença que lhe foi, entretanto, diagnosticada, tendo então ficado a saber apenas que tinha quistos nos rins, situação que afecta uma larga percentagem da população e não é, em si mesma, considerada uma doença. Apela para tanto aos testemunhos prestados pelos Drs. (…) e (…), nas passagens que localizou.
Ouvidos na íntegra os testemunhos prestados pelos Srs. Drs. (…), (…), (…) e (…), impõe-se destacar as declarações da Dr.ª (…), a única nefrologista inquirida e autora da informação clínica de fls. 72-73, por si assinada.
Refira-se, a título prévio, que nenhuma das testemunhas acompanhava o autor em 2001, data fixada no impugnado ponto 19. como sendo a do diagnóstico. Com efeito, mesmo a testemunha (…), médico-cirurgião na situação de reformado, tendo declarado conhecer o apelado e a família há vários anos, com este travou conhecimento fora do seu contexto profissional -ainda que no âmbito da profissão de mecânico/auto pelo autor desenvolvida, de que resultou uma amizade-, tendo resultado evidente das declarações que prestou que o seu conhecimento da situação clínica do amigo lhe advinha de informações pelo próprio fornecidas e também por colegas médicos seus conhecidos. Desconhecia, no entanto, em que altura lhe havia sido diagnosticada a DRPAD e até que o pai do autor estava sujeito a diálise.
Fazendo-se ainda notar que não existem nos autos elementos clínicos anteriores ao episódio de urgência ocorrido em Dezembro de 2006 (doc. de fls. 73 v.º a 75 dos autos), altura em que o próprio autor referiu como antecedentes litíase e quistos renais, a referência na informação clínica de fls. 72-73, criada em 23/9/2013, ao diagnóstico da doença em contexto de cólica renal quando o autor contava 32 anos de idade, o que nos remete para o ano de 2001, só poderia provir do próprio.
No atestado de doença datado de 6/7/2016, subscrito pela médica de família, a testemunha (…), refere-se ter o diagnóstico tido lugar, sem precisão, há mais ou menos 12 anos, mas na informação datada de 7/8/2015, subscrita pela Dr.ª (…), que acompanhou o autor durante o período em que se sujeitou a hemodiálise, mais uma vez se refere ter o diagnóstico sido feito quando aquele contava 32 anos de idade, em contexto de cólica renal. É certo que aí se menciona ainda o anormal valor de creatinina de 2,2 mg/l, o qual terá surgido nas análises de rotina realizadas em 2007, que determinaram o seu encaminhamento nesse mesmo ano para a consulta de nefrologia, conforme consta da mais completa informação clínica a que se fez já referência (fls. 72 verso a 75), mas mais uma vez se localiza o diagnóstico da doença nos 32 anos de idade do autor, informação que, repete-se, só o próprio poderia ter fornecido.
Da conjugação de tais elementos com os testemunhos prestados pelas respectivas autoras, e pese embora as informações clínicas existentes no centro de saúde onde o autor foi acompanhado sejam posteriores a 2007, por ter sido esta a data em que foi instalado o sistema informático, a existência da doença já era aí conhecida, sendo seguro que em Dezembro de 2006 aquele detinha conhecimento de que tinha litíase e quistos renais, do que informou aquando da sua admissão em episódio de urgência. Do mesmo modo, é seguro que quando contava 32 anos de idade teve uma cólica renal o que, se nada indicia quanto à existência ou não de quistos nos rins, é todavia causada por pedras ou areias, conforme explicou a Dr.ª (…). Acresce que, conforme também esclareceu, tendo o autor referido – a informação, conforme se explicitou, só este a poderia ter dado – que lhe foi então diagnosticada a DRPAD, tal ficou a dever-se seguramente ao facto de ter sido sujeito a um exame ecográfico e aos seus antecedentes. Note-se que o pai do autor tinha necessidade de diálise desde os 42 anos por sofrer de insuficiência renal causada pela mesma doença, facto que com toda a segurança já se verificava em 2001 (data em que o autor contava, relembra-se, 32 anos). Esclareceu, a este respeito, a mesma Dr.ª (…), afastando uma dúvida suscitada pelo Dr. (…), que o diagnóstico da doença, neste contexto, tratando-se de doença hereditária, pode ser feito por exame ecográfico, e que se trata de uma doença dos rins, ao invés da doença quística adquirida, situação comum e geralmente benigna que afecta grande parte da população. Acrescentou que se é verdade que os doentes com DRPAD não desenvolvem necessariamente insuficiência renal, têm maior probabilidade de a desenvolver, risco acrescido no caso do autor, dado o antecedente paterno.
Dos meios de prova a que se fez referência resulta a corroboração da apreciação feita pelo Mm.º juiz de julgamento e a convicção de que o autor tinha conhecimento, desde 2001, de que tinha pedra nos rins e padecia de DRPAD, facto não infirmado pela referência simplificadora a “quisto” aquando da sua admissão na urgência no episódio ocorrido em 2006, por ser perfeitamente natural que não lhe ocorresse o nome complexo da doença. Daqui não pode, no entanto, extrair-se, conforme pretende, que não tivesse conhecimento de que se tratava de doença hereditária e dos riscos, dadas a situação clínica do pai, o que seria em absoluto contrário às regras da experiência, conforme na sentença não deixou igualmente de se fazer notar.
Improcede, pelo exposto, a impugnação deduzida, mantendo-se a decisão proferida sobre a matéria de facto nos seus precisos termos.
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II. Fundamentação
De facto
É a seguinte a factualidade a considerar:
1. Entre a Ré e a Caixa Geral de Depósitos foi celebrado um contrato de seguro do ramo vida grupo, o qual é titulado pela apólice nº (…), através do qual aquela assumiu o risco de Morte por Doença ou Acidente e os riscos complementares de Invalidez Absoluta e Definitiva por Doença e de Invalidez Total e Permanente por Acidentes de clientes que com esta celebrassem contrato de empréstimo para a compra de habitação própria e respectivos fiadores, desde que estes aderissem ao dito contrato.
2. No dia 04 de Fevereiro de 2005, o Autor, conjuntamente com o seu cônjuge (…), celebrou com a Caixa Geral de Depósitos dois contratos de mútuo com hipoteca nos montantes de € 23.000,00 (vinte e três mil euros) e € 102.000,00 (cento e dois mil euros), respectivamente, que se destinavam, o primeiro à liquidação do saldo em dívida de um crédito concedido pelo Banco de Investimento Imobiliário, S.A., o qual, por sua vez, se havia destinado à construção de habitação própria e permanente dos mutuários, e o segundo a obras do mesmo imóvel.
3. No mesmo dia, e na sequência dos contratos de mútuo referidos no ponto anterior, o Autor e sua mulher aderiram ao contrato de seguro referido no ponto 1., tendo as adesões tomado os números (…) e (…).
4. No art.º 3.º das condições particulares do referido contrato de seguro, enunciam-se os riscos cobertos da seguinte forma:
“1. O contrato de seguro abrange as seguintes garantias:
a) Garantia Principal – Morte por doença ou acidente
i) Garantia de Morte por Doença tem um período de carência de 3 anos
b) Garantia Complementar – Invalidez Absoluta e Definitiva por Doença
i) A garantia corresponde à antecipação de 100% do capital seguro.
ii) Esta garantia tem um período de carência de três anos
c) Garantia Complementar – Invalidez Total e Permanente por Acidente
Considera-se inválida a Pessoa Segura que apresente um grau de desvalorização igual ou superior a 50% de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais em vigor na data de avaliação da desvalorização sofrida pela Pessoa Segura, não entrando para o seu cálculo quaisquer incapacidades ou patologias preexistentes.
A garantia corresponde à antecipação de 100% do capital seguro 1. (…)” [Vide doc. de fls. 38 a 42 e 60v a 62v].
5. No art.º 1 das “Condições Gerais” do referido contrato estão definidos os conceitos de “Invalidez Total e Permanente” e Invalidez Absoluta e Definitiva” nos seguintes termos:
Invalidez Total e Permanente
A limitação funcional permanente sem possibilidade de melhoria em que, cumulativamente, estejam preenchidos os seguintes requisitos:
a) A Pessoa Segura fique completa e definitivamente incapacitada de exercer a sua profissão ou qualquer outra actividade remunerada compatível com os seus conhecimentos e aptidões.
b) Corresponda a um grau de desvalorização igual ou superior à percentagem definida em Condições Particulares, de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais em vigor na data de avaliação da desvalorização sofrida pela Pessoa Segura, não entrando para o seu cálculo quaisquer incapacidades ou patologias preexistentes;
c) Seja reconhecida previamente pela Instituição de Segurança Social pela qual a Pessoa Segura se encontra abrangida ou pelo Tribunal de Trabalho ou, caso a Pessoa Segura não se encontra abrangida por nenhum regime ou Instituição de Segurança Social, por Junta Médica;
Invalidez Absoluta e Definitiva
A limitação funcional permanente e sem possibilidade clínica de melhoria que incapacite a Pessoa Segura para o exercício de qualquer actividade remunerada, necessitando de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária.”
6. Em 01/01/2015 o capital seguro para a adesão nº (…) era de € 17.633,86.
7. Na mesma data o capital seguro para a adesão nº (…) era de € 78.202,09.
8. Em 03 de Julho de 2015 encontravam-se em dívida à Caixa Geral de Depósitos os valores de € 17.318,22 e € 76.802,36, respectivamente.
9. Desde 03 de Julho de 2015 até 29/06/2018 os valores pagos pelo Autor ascendiam a € 2.450,54 e € 10.926,55, respectivamente.
10. No referido contrato de seguro os beneficiários são: pelo capital em dívida até ao limite do capital seguro irrevogável a favor da Caixa Geral de Depósitos S.A. e pelo eventual remanescente para o capital seguro a Pessoa Segura.
11. Aquando das duas adesões o ora Autor preencheu dois boletins de adesão, cada um com o seu questionário sobre o seu estado de saúde.
12. Nessas declarações sobre o seu estado de saúde perguntava-se se o ora Autor “é portador de qualquer incapacidade ou defeito físico” e “se teve ou tem qualquer doença”, tendo o ora Autor respondido “Não“ a ambas as perguntas.
13. Perguntava-se aí se “o seu estado de saúde actual é perfeito”, tenho o ora Autor respondido “Sim”.
14. Quanto a antecedentes pessoais, perguntava-se “se sofre ou sofreu de qualquer das seguintes perturbações ou doenças”, tendo o ora Autor respondido que “Não” a todas as questões, incluindo “hipertensão arterial”, “reumatismo, gota, espondilose” e “doenças do rim ou bexiga (nefrite, pedra do rim)”.
15. Perguntado sobre “Exames complementares (informe quando fez, porquê e os resultados)” o ora Autor respondeu “Não” quanto a “análises”, “radiografias”, electrocardiogramas” e “outros”.
16. Tendo aposto em 04/02/2005 a sua assinatura no final de cada uma das Declarações de Estado de Saúde.
17. Em 2001, quando o ora Autor tinha 32 anos de idade, foi-lhe diagnosticada Doença Renal Poliquística Autossómica Dominante (DRPAD) no contexto de um episódio de cólica renal.
18. O Autor sabia que o seu pai e a sua irmã sofreram da mesma patologia, tendo o pai do Autor tido necessidade de técnica dialítica desde os 42 anos e a irmã, aparentemente apenas com atingimento hepático.
19. Quando preencheu as declarações clínicas em Fevereiro de 2005 o Autor sabia que em 2001 lhe havia sido diagnosticada DRPAD, num contexto de cólica renal, assim como sabia que já era portador de litíase renal e quistos renais.
20. Se a Ré soubesse da patologia que havia sido diagnosticada ao ora Autor em 2001, quando este tinha 32 anos, as adesões propostas apenas teriam sido aceites com exclusão das coberturas de invalidez e com agravamento de 300% relativamente ao risco morte.
21. Em 2013 foi diagnosticada ao Autor insuficiência renal, tendo iniciado Hemodiálise em 17/09/2013.
22. Em consequência da insuficiência renal foi-lhe atribuída em 26/11/2013 uma incapacidade permanente de 70%, tendo o Autor ficado incapacitado de exercer qualquer actividade remunerada.
23. A partir de 13 de Novembro de 2013 foi atribuída ao Autor uma pensão por invalidez relativa, que em Janeiro de 2015 era de € 482,40.
24. O Autor foi transplantado em 22 de Janeiro de 2017, tendo-lhe sido atribuída em 12/07/2018 uma incapacidade permanente de 54,1%.
25. Em consequência da insuficiência renal que o afectou, o Autor está incapacitado de exercer a sua profissão de mecânico de automóveis.
26. O Autor não tem aptidões e conhecimento para exercer qualquer outra actividade, para além de mecânico de automóveis.
27. Comunicou tal facto à seguradora, assim como o facto de, entretanto, ter sido reformado com base na mesma incapacidade, de modo a que a seguradora pagasse à Caixa Geral de Depósitos os montantes de capital garantido em ambos os contratos de mútuo à data em que foi determinada a sua invalidez.
28. Através do escrito de fls. 75v a 76 datado de 22/12/2016, que a Ré enviou e o Autor recebeu, aquela comunicou-lhe a não aceitação do sinistro, com o fundamento no facto de que “…a doença poliquística cuja evolução veio a referir a causa da invalidez que actualmente o afecta, já se verificava à data de adesão ao contrato de seguro” referindo, ainda que, mesmo que essa patologia não fosse pré-existente, “…também não seria de proceder ao pagamento da indemnização, uma vez que a incapacidade de que é portador também não preenche os requisito exigidos contratualmente, uma vez que pela documentação clínica enviada não ficou comprovado que necessita de ajuda de terceira pessoa para conseguir efectuar os actos da sua vida diária”.
29. No referido escrito a Ré propôs ao Autor a alteração do contrato de seguro, consubstanciada na exclusão da exclusão da cobertura de invalidez e no agravamento de 50% na cobertura de morte devida à patologia renal, dando ao Autor um prazo de 15 dias para aceitar a proposta, sob pena de, não o fazendo, cessar o contrato de seguro.
30. O Autor respondeu a este escrito através da ilustre mandatária, onde não se pronunciou sobre a proposta de alteração do contrato, referindo que desconhecia em absoluta ser portador de qualquer doença.
31. Através do escrito de fls. 44 e 45, enviado pela Ré ao Autor em 30 de Junho de 2017, e que este recebeu, a Ré manteve a recusa do sinistro e procedeu à anulação do contrato de seguro.
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Factos não provados:
a) Que tenham sido apresentadas ou explicadas ao Autor as condições gerais do contrato de seguro juntas a fls. 63 a 68.
b) A insuficiência renal diagnosticada ao Autor em 2013 foi consequência directa da DRPAD (Doença Renal Poliquística Autossómica Dominante) diagnosticada em 2001.
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De Direito
Da anulabilidade do contrato celebrado
Não se discute nos autos que o autor e o seu cônjuge aderiram no ano de 2005 ao contrato de seguro de grupo contributivo do Ramo Vida Grupo[1], titulado pela apólice nº (…), nos termos do qual a apelada garantiu o pagamento à beneficiária CGD do capital em dívida proveniente de empréstimos contraídos para aquisição de habitação própria em caso de morte por doença ou acidente dos mutuários, tendo ainda assumido os riscos complementares de invalidez absoluta e definitiva por doença e de invalidez total e permanente por acidentes.
A recorrente insiste na tese de que o contrato celebrado é anulável, decorrência das declarações inexactas prestadas pelo autor, pessoa segura, que omitiu as patologias de que sofria, respondendo falsamente aos questionários constantes dos boletins de adesão.
Previamente, importa clarificar que, atendendo à data da celebração do contrato ajuizado, e tal como se entendeu na decisão recorrida, é aplicável o art.º 429.º do Código Comercial então em vigor, e não o regime estabelecido pelo DL 72/2008, de 16 de Abril (Lei do Contrato de Seguro) que, tendo entrado em vigor em 1/1/2009, se aplica apenas aos contratos celebrados após esta data[2].
Sob a epígrafe “Nulidade do seguro por inexactidões ou omissões” estatuía-se no corpo do art.º 429.º do Código Comercial que “Toda a declaração inexacta, assim como toda a reticência de factos ou circunstâncias conhecidas pelo segurado ou por quem fez o seguro, e que teriam podido influir sobre a existência ou condições do contrato tornam o seguro nulo”.
A disposição citada não exigia o dolo do declarante, sendo suficiente que a omissão ou declaração inexacta se devessem a culpa daquele, conforme resulta claro do disposto no § único.
Pese embora o “nomen iuris”, consolidou-se na doutrina e jurisprudência o entendimento de que o vício aqui previsto era o da anulabilidade, por ser a sanção geralmente estabelecida para a tutela dos interesses particulares de uma das partes contratantes[3].
Previa-se assim no preceito sob apreciação um regime distinto da comum disciplina dos vícios da vontade, consagrando a invalidade do contrato “(…) desde que se verificasse ter havido qualquer declaração inexacta ou reticente de factos conhecidos do tomador do seguro que tivessem podido influenciar a existência ou as condições do seguro, independentemente do tomador estar de boa ou de má-fé[4] (…), e não se exigindo qualquer nexo de causalidade entre o facto ou circunstância omitido(a) ou inexactamente declarado(a) e o facto ou circunstância que determinou o sinistro”[5].
Exigia assim a lei que a inexactidão ou ocultação incidissem sobre factos ou circunstâncias susceptíveis de interferir na decisão de contratar ou não contratar e em que condições, de sorte que, sendo conhecidos do segurador, este, ou não contrataria de todo, ou celebraria o contrato em diferentes termos, encargo probatório da seguradora[6]. Estavam (estão), pois, em causa factos e/ou circunstâncias capazes de influenciarem a avaliação do risco, sendo de reconhecer como tal todos aqueles relativamente aos quais existiam no questionário proposto perguntas específicas[7].
O questionário, conforme se sintetizou no acórdão do STJ de 12/7/2018[8], “(…) é uma das formas de declaração inicial do risco pelo candidato tomador do seguro ou pessoa segura que tem por objectivo a ponderação por parte da seguradora dos riscos a correr com a celebração do contrato que lhe é proposto. As respostas a esse questionário correspondem ao “repositório das declarações da pessoa segura, declarações em que a seguradora deve confiar e em função das quais aceita ou não o contrato e fixa as respectivas condições; Tal “questionário” não constitui cláusula contratual geral do contrato de seguro, para efeito de vinculação da seguradora aos deveres de comunicação e informação dessas cláusulas, em contratos de adesão”[9].
Importa por último referir que a severidade da sanção legal encontra o seu fundamento na caracterização do contrato de seguro como de boa-fé, assim constituída em seu elemento essencial, sublinhando a absoluta necessidade do segurado ou tomador do seguro prestarem declarações iniciais exactas e completas como forma de assegurar o equilíbrio da relação contratual em formação, já que, quer para tomar a decisão de aceitação da proposta e celebração do contrato, quer para fixar o prémio, a seguradora terá normalmente que confiar nas declarações por aqueles prestadas[10]. A máxima boa-fé surge assim como característica determinante do contrato de seguro, sujeitando a lei o segurado a um especial dever de prestar declarações exactas e completas.
Distinguia-se no art.º 429.º entre a inexactidão das declarações prestadas e a reticência, que referencia a sua omissão, sendo uma e outra relevantes apenas e só quando reportadas a factos ou circunstâncias conhecidas do proponente na altura da formação do contrato[11].
De volta ao caso dos autos verifica-se que o autor, ao responder aos questionários constantes dos boletins de adesão, respondeu falsamente que não sofria nem tinha sofrido de doença dos rins, declaração que, conforme resulta claro do ponto 19., sabia não ser verdadeira. Faz-se notar que a circunstância de a referência (entre parêntesis) a nefrite e pedra nos rins não significa que outras doenças do rim ou bexiga não devessem ser declaradas, mas antes que também estas, enumeradas a título exemplificativo, o deveriam ser, não fazendo sentido que a seguradora entendesse relevante ter conhecimento da eventual existência de litíase renal, comumente designada “pedra no rim” (actual ou passada), e não da doença mais grave de que padecia o autor. Em todo o caso, a verdade é que, conforme resultou demonstrado, o autor, à data, não só padecia da diagnosticada DRPAD como também de litíase, factos que eram do seu conhecimento.
Por outro lado, e admitindo que aquando da celebração dos contratos de seguro em 2005 o autor se sentisse perfeitamente saudável, não interferindo aquelas doenças no seu bem-estar, não podia olvidar, dados os antecedentes familiares, que a DRPAD era doença com potencial risco de vir a causar insuficiência renal como, de resto, havia sucedido a seu pai, sujeito a diálise desde os 42 anos de idade, sendo portanto relevante o seu conhecimento para a seguradora, o que qualquer declaratário médio não podia desconhecer.
O autor prestou declarações inexactas, tendo a ré/recorrente logrado demonstrar que as mesmas interferiram nos termos do contrato celebrado, de modo que, a ter conhecido a real condição de saúde do autor, não teria assumido o risco de invalidez que se veio a verificar (cf. ponto 20. dos factos assentes). Acrescenta-se que a circunstância de não ter resultado comprovado um nexo causal directo entre as doenças omitidas, designadamente a DRPAD, e a insuficiência renal que veio a determinar a incapacidade profissional total e permanente do recorrido e, consequentemente, a sua reforma, não impedem o efeito anulatório[12].
Tendo-se concluído na sentença apelada que o autor prestara declarações inexactas sobre a sua situação de saúde e antecedentes familiares, omitindo a pré-existência de doença, considerou-se, no entanto, que estávamos perante o preenchimento de uma cláusula de exclusão da cobertura do contrato de seguro, na qual a Ré teria fundamentado a anulabilidade do mesmo. E porque se considerou a mesma cláusula excluída do contrato por violação do dever de informação que recairia sobre a seguradora (e não sobre o tomador do seguro) nos termos do DL 446/85, de 27 de Outubro, dado que esta não logrou provar “Que tenham sido apresentadas ou explicadas ao Autor as condições gerais do contrato de seguro” e, portanto, inoponível a este, foi meramente consequente a decisão de improcedência da excepção.
Tal raciocínio, porém, ressalvado o respeito que nos merece, não o podemos acompanhar.
Com efeito, e tal como a apelante chama a atenção nas suas alegações, a anulabilidade de que se pretende prevalecer não resulta da estatuição de qualquer cláusula contratual, porquanto, tal como se deixou dito, a sanção cominada no art.º 429.º do Código Comercial, que expressamente convocou, respeita ainda à previsão de erro-vício na formação da vontade, uma vez que as declarações inexactas ou as omissões relevantes impedem a formação da vontade real da seguradora, situação que escapa ao alcance da previsão do invocado DL 445/85[13]. Para tal, repete-se, cabe alegar e provar que a omissão ou a declaração inexacta influenciou a sua decisão de contratar ou os termos em que o fez, irrelevando a verificação de nexo de causalidade entre os factos omitidos e o sinistro.
No caso vertente, como resulta dos factos provados, logrou a ré seguradora fazer prova clara de que, caso tivesse tido conhecimento das circunstâncias omitidas, não teria celebrado o contrato ou, pelo menos, tê-lo-ia feito em diversas condições (cf. ponto 20.), ou seja, as declarações inexactas constantes do questionário clínico sobre o estado de saúde conhecido do recorrido/aderente influenciaram em termos causais a decisão, por parte daquela, de aceitação da adesão ao contrato ajuizado nos precisos termos e condições que dele constam, o que lhe confere o direito à respectiva anulação.
Atento o exposto, e porque o contrato é anulável, tendo a ré emitido declaração no sentido da sua anulação, não se encontra vinculada ao pagamento do capital seguro.
A anulação do contrato prejudica as restantes questões suscitadas no recurso, não cabendo discutir sobre quem recai o dever de informação e esclarecimento das cláusulas predispostas no caso, como o dos autos, de seguro de grupo, se é ou não válida a cláusula de invalidez ou ainda se no caso havia ou não lugar ao reembolso ao autor das prestações, entretanto pagas à entidade mutuante e beneficiária do seguro (art.º 608.º, n.º 2, 1.ª parte, do CPC).
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III. Decisão
Acordam os juízes da 2.ª secção cível do Tribunal da Relação de Évora em julgar procedente o recurso, absolvendo a ré Seguradora dos pedidos formulados pelo autor.
Custas nesta e na 1.ª instância a cargo do autor/apelado.
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Sumário: (…)
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Évora, 10 de Setembro de 2020
Maria Domingas Alves Simões

Vítor Sequinho dos Santos
Mário Rodrigues da Silva
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[1] Seguro de grupo (contributivo, temporário anual e renovável) é aquele que reúne um conjunto de pessoas ligadas entre si e ao tomador do seguro por um vínculo do interesse comum (art.º 1.º, als. g) e i) do Decreto-Lei n.º 176/95, de 26 de Julho).
[2] Cfr. acórdãos do STJ de 12/7/2018, processo 3016/15.9T8CSC.L1.S1, e de 28/6/2018, processo 32090/15.6T8LSB.L1.S1, acessíveis em www.dgsi.pt), esclarecendo-se, naquele primeiro aresto, que nos termos do artigo 2.º, n.º 1, a lei nova aplica-se aos contratos de seguro celebrados após a sua entrada em vigor, "assim como ao conteúdo dos contratos de seguro celebrados anteriormente que subsistam à data da sua entrada em vigor, com as especificidades constantes dos artigos seguintes", mas em relação a estes, e conforme explica o Prof. Romano Martinez (Lei do Contrato de Seguro Anotada, Almedina, 3.ª edição, p. 23) ali citado, “a lei nova não se aplica à formação do contrato, mas tão só ao seu conteúdo, ou seja, a questões relacionadas com a execução do vínculo”. Neste mesmo sentido, Helena Tapp Barroso, “Aplicação da lei no tempo”, em “Temas de Direito dos Seguros”, Almedina, pág. 43.
[3] Cfr. Abrantes Geraldes, “O novo regime do contrato de seguro – antigas e novas questões”, acessível em http://www.trl.mj.pt/PDF/REGIME.pdf. Na jurisprudência o acórdão do STJ de 12/7/2018 já citado e ainda o acórdão do TRC de 21/9/2010, no processo 337/08.0 TBALB.C1, acessíveis em www.dgsi.pt).
[4] Com efeito, “incidindo sobre a própria formação do contrato, as declarações falsas ou as omissões relevantes impedem a formação da vontade real da contraparte (seguradora), pois que essa formação assenta em factos ou circunstâncias ignorados, por não revelados ou deficientemente revelados. Daí que, como resulta do citado art.º 429.º e é entendimento corrente, não é necessário que as declarações ou omissões influam efectivamente sobre a celebração ou condições contratuais fixadas, bastando que pudessem ter influído ou fossem susceptíveis de influir nas condições de aceitação do contrato” – Ac. do STJ de 6/7/2011, processo 2617/03.2 TBAVR e de 9/9/2010, processo 3139/06.5TBBCL.G1.S1., ainda acessíveis no identificado sítio
[5] Joana Galvão Teles, “Deveres de Informação das partes”, em “Temas de Direito dos Seguros”, pág. 365-366. Na jurisprudência o acórdão do STJ de 26/1/2017, processo 1937/11.7 TBBNV.E1.S1, acessível em www.dgsi.pt
[6] José Vasques, “Contrato de seguro”, pág. 225, acórdão do TRC de 21/9/2010, citado em 2.
[7] José Vasques, ob. e loc. citados. Na jurisprudência, acórdão do STJ de 27/05/2008, processo 08A1373, acessível em www.dgsi.pt
[8] Processo 3016/15.9T8CSC.L1.S1, acessível em www.dgsi.pt e ainda Ac. STJ de 27/03/2014 proc. 2971/12.5TBBRG.G1.S, citado na sentença recorrida e de 6/7/2011, processo 2617/03.2TBAVR.C1.S1, todos no citado sítio.
[9] No sentido desta última proposição os Acs. do mesmo STJ de 4/2/2017, processo 2294/12.0TVLSB.L1.S1 e de 6/7/2011, identificado em 8., relevando os seguintes pontos do sumário:
“II - As respostas ao “questionário” são o repositório das declarações de risco da pessoa segura em que a seguradora deve confiar e em função das quais aceita o não o contrato e fixa as respectivas condições, não se concebendo a formulação de perguntas inúteis ou irrelevantes.
IV- O “questionário” não constitui cláusula contratual geral do contrato de seguro para efeito de vinculação da seguradora aos deveres de comunicação e informação dessas cláusulas em contratos de adesão” e também desenvolvidamente, acórdão do TRL de 23/9/2010, processo 1295/04.6 TBMFR-6, acessíveis em www.dgsi.pt.
[10] Caracterizando igualmente o contrato de seguro como de boa-fé, esclarece José Vasques, in “Contrato de Seguro”, pág. 110,: “porque se baseia nas declarações prestadas pelo segurado, referindo-se alguns Autores a uma (…) máxima boa-fé, considerando-o o elemento peculiar do contrato de seguro; a caracterização do seguro como contrato de boa-fé não pretende reforçar a ideia de que quem negoceia com outrem para a conclusão do contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa-fé (…) mas sublinhar a necessidade absoluta de lealdade do segurado para manter a equidade da relação contratual, uma vez que a seguradora é normalmente obrigada a confiar nas suas declarações, sem poder verificá-las aquando da subscrição”.
[11] Cfr. arestos do STJ de 4/3/2004, proferido no processo 03B 3631 e de 12/7/2018, processo 3016/15.9T8CSC.L1.S1, acessíveis em www.dgsi.pt.
[12] Constitui jurisprudência constante no quadro do art.º 429.º do Código Comercial. V., por todos, ac. do STJ de 12/7/2018, processo 3016/15.9T8CSC.L1.S1, acessível em www.dgsi.pt
[13] Assim, os acórdãos do STJ de 6/7/2011, processo 2617/03.2 TBAVR.