Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1636/19.1T8EVR.E1
Relator: MOISÉS SILVA
Descritores: MOTORISTA
TEMPO DE TRABALHO
REGISTO DO TEMPO DE TRABALHO
NÃO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO
APRESENTAÇÃO DE PROVA
AGENTE DA AUTORIDADE
Data do Acordão: 07/14/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
i) a Lei n.º 27/2010, de 30.08, deve ser interpretada e aplicada em conformidade com o direito da União Europeia, ou seja, no sentido de que a justificação objetiva de não condução nos dias em que não são apresentados os registos só pode ser efetuada através do formulário relativo às disposições em matéria social aprovado pela Decisão da Comissão de 14.12.2009, ou por documento equivalente que garanta a mesma objetividade, clareza e simplicidade, de modo a garantir a harmonização europeia nesta matéria exigida pelo direito da União, em obediência ao art.º 4.º n.º 3 do TUE e ao princípio da lealdade aí consagrado;
ii) a existência de um documento elaborado antecipadamente, de que o motorista é portador para apresentar ao agente de controlo, tem em vista um tratamento igual em todo o espaço da União para esta situação concreta e revela-se uma exigência do direito da União, que o Estado português deve respeitar, a fim de cumprir os objetivos prosseguidos por este;
iii) não afasta a ilicitude do facto, ou a culpa, a prova apresentada posteriormente no sentido de que não conduziu nos dias com registo em falta (sumário do relator).
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora

I - RELATÓRIO

Recorrente: P…, SA (arguida).
Recorrida: ACT – Autoridade para as Condições do Trabalho.

Tribunal Judicial da Comarca de Évora, Juízo do Trabalho.

1. A arguida veio impugnar judicialmente a decisão da Autoridade para as Condições de Trabalho que lhe aplicou a coima única de 40 unidades de conta e a sanção acessória de publicidade, pela prática das seguintes contraordenações:
a) A contraordenação muito grave prevista e punível nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 8.º do Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março, e 14.º, 4, a) e b), e 20.º, 2, c), da Lei n.º 27/2010, de 30 de agosto, com coima de 20 a 300 unidades de conta se cometida por negligência, e de 45 a 600 unidades de conta se cometida com dolo (incumprimento do período de repouso diário reduzido inferior aos limites mínimos de duração de duração previstos na Regulamentação Comunitária aplicável, sendo inferior a 7 horas), mais precisamente por ter permitido que o seu motorista C…, após a jornada de trabalho do dia 14.09.2017 com início às 04,11 horas, e num período de 24 horas, não respeitasse o período mínimo de repouso diário reduzido, de pelo menos 9 horas, tendo repousado 06,57 horas, entre as 21,14 horas do dia 14.09.2017 e as 04,11 horas do dia 15.09.2017 (coima de 28 unidades de conta);
b) A contraordenação grave prevista e punível nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 6.º, 2, do Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março, e 14.º, 3, a) e b), e 18.º, 3, b), da Lei n.º 27/2010 de 30 de agosto, com coima de 6 a 40 unidades de conta em caso de negligência e de 13 a 95 unidades de conta em caso de dolo (período de condução semanal superior a 56 horas), mais precisamente por ter permitido que o condutor M… conduzisse o veículo pesado de mercadorias com a matrícula … entre as 00,00 horas do dia 12.06.2017 e as 24,00 horas do dia 18.06.2017 e tivesse efetuado um tempo de condução total acumulado de 60,52 horas (coima de 7 unidades de conta);
c) A contraordenação muito grave prevista e punível nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 36.º do Regulamento (UE) n.º 165/2014, de 04 de fevereiro, 25.º, 1, b), da Lei n.º 27/2010, de 30 de agosto, e 561.º, 2, do Código do Trabalho, com coima de 20 a 300 unidades de conta se cometida por negligência, e de 45 a 600 unidades de conta se cometida com dolo (não apresentar, após solicitação por agente encarregado da fiscalização, cartão de condutor, folhas de registo utilizadas e de qualquer registo manual e impressão efetuados, que o condutor estivesse obrigado a apresentar), mais precisamente por ter permitido que o seu motorista F… conduzisse o veículo pesado de mercadorias com a matrícula … no dia 18.09.2017 ao km 63 da Estrada Nacional n.º 4, área da comarca de Évora, sem que se fizesse acompanhar da totalidade das folhas de registo referentes aos últimos 28 dias, estando em falta os dias 21.08.2017 a 07.09.2017, não tendo apresentado qualquer declaração de atividade (coima de 28 unidades de conta);
d) A contraordenação grave prevista e punível nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 4.º, g), e 8.º, 2, ambos do Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março, e 14.º, 3, a) e b), e 20.º, 1, b), ambos da Lei n.º 27/2010 de 30 de agosto, com coima de 6 a 40 unidades de conta em caso de negligência e de 13 a 95 unidades de conta em caso de dolo (incumprimento do período de repouso diário regular inferior aos limites mínimos de duração de duração previstos na Regulamentação Comunitária aplicável, sendo igual ou superior a 8,30 horas e inferior a 10 horas), mais precisamente por ter permitido que o condutor M…, após a jornada de trabalho do dia 30.06.2017, com início às 04,02 horas, e num período de 24 horas, não tivesse respeitado o período mínimo de repouso diário regular de pelo menos 11 horas, tendo repousado 09,40 horas, entre as 18,22 horas do dia 30.06.2017 e as 04,02 horas do dia 01.07.2017 (coima de 8 unidades de conta).
A recorrente impugnou judicialmente a decisão acima referida, pugnando pela sua absolvição (fls. 264 a 279).
A entidade administrativa decisora não revogou a decisão impugnada e o recurso foi recebido.
Foi realizada audiência de julgamento como consta da ata respetiva.
De seguida, foi proferida sentença e julgado improcedente o recurso de impugnação judicial interposto pela arguida.
2. Inconformada, veio a arguida interpor recurso, que motivou e concluiu da forma que se segue:
a) A recorrente cumpriu na íntegra o dever que sobre si impende de zelar e diligenciar pelo cumprimento por banda dos seus motoristas das normas legais sobre tempos de condução e repouso e utilização do aparelho tacógrafo;
b) As infrações cometidas pelos motoristas M… e C… emergiram de comportamentos única e exclusivamente a si imputáveis.
c) O motorista F… não praticou qualquer infração, tanto que, fez o registo relativo aos dias 05, 06 e 07.09.2017 no cartão através de entrada adicional.
d) Não se consegue descortinar como é que se “organiza, em concreto, o trabalho” de um motorista que vai descansar e, por esquecimento, não acionou corretamente o dispositivo de comutação, tendo deixado o tacógrafo a registar “outros trabalhos” em vez de “descanso”; e, de um motorista que estava convencido que, numa determinada semana, só havia realizado dois períodos de repouso diário reduzido quando, na verdade, havia realizado três, e, noutra, ainda não tinha excedido 56 horas de condução quando, na verdade, tinha realizado 60,52 horas, isto porque não contabilizou corretamente os tempos de condução.
e) Em bom rigor, o motorista C… não praticou qualquer infração ao prevenido no artigo 8.º do Regulamento (CE ) n.º 561/2006, uma vez que, como resultou provado, das 18,57 às 21,14 do dia 15.09.2017 esteve efetivamente a descansar, pelo que respeitou o seu período de repouso diário relativo à jornada de trabalho de 14/15.09.2017.
f) Nada pode ser imputado à recorrente, por ação e/ou omissão, a propósito da ocorrência das infrações dos autos, pelo que a recorrente não tem qualquer responsabilidade pelas mesmas.
g) Ao decidir como decidiu, violou a decisão recorrida, entre outros, os artigos 6.º, 8.º e 12.º do Regulamento n.º 561/2006 e os artigos 13.º n.º 2, 18.º e 20.º da Lei n.º 27/2010, de 30.08, pelo que deverá ser revogada e substituída por outra que absolva a recorrente.

3. O Ministério respondeu e concluiu que em face dos factos provados, a sentença deve ser confirmada.

4. O Ministério Público, junto desta Relação, emitiu parecer no sentido de ser confirmada a sentença recorrida.
Notificado, não foi apresentada resposta.

5. O recurso foi admitido pelo relator.

6. Colhidos os vistos, em conferência, cumpre apreciar e decidir.

7. Objeto do recurso

São as conclusões de recurso que delimitam o seu objeto – artigos 403.º e 412.º n.º 1 do Código de Processo Penal e aqui aplicáveis por força do artigo 50.º n.º 4 da Lei n.º 107/2009, de 14.09 – sem prejuízo do conhecimento oficioso de outras questões.
Questões a resolver: apurar se a arguida é responsável pelas contraordenações em que foi condenada.

II – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

A) A sentença recorrida deu como provados os factos seguintes:
1.º A recorrente dedica-se à atividade de serviços de transportes rodoviários de mercadorias (CAE 49410).
2.º Após a jornada de trabalho do dia 14.09.2017 com início às 04,11 horas, e num período de 24 horas, C…, motorista da recorrente, não respeitou o período de repouso diário reduzido de pelo menos 9 horas, tendo repousado 06,57 horas, entre as 21,14 horas do dia 14.09.2017 e as 04,11 horas do dia 15.09.2017.
3.º Entre as 00,00 horas do dia 12.06.2017 e as 24,00 horas do dia 18.06.2017 M…, motorista da recorrente, não efetuou o tempo máximo de condução total acumulado de 56 horas a que estava obrigado, tendo acumulado um tempo de condução superior, mais concretamente de 60,52 horas.
4.º No dia 18.09.2017 ao km 63 da Estrada Nacional n.º 4, área da comarca de Évora, F…, motorista da recorrente, conduziu o veículo pesado de mercadorias com a matrícula … sem que se fizesse acompanhar da totalidade das folhas de registo referentes aos últimos 28 dias, estando em falta os dias 21.08.2017 a 07.09.2017, e não apresentou qualquer declaração de atividade.
5.º Após a jornada de trabalho do dia 30.06.2017, com início às 04,02 horas, e num período de 24 horas, M…, motorista da recorrente, não respeitou o período mínimo de repouso diário regular de pelo menos 11 horas, tendo repousado 09,40 horas, entre as 18,22 horas do dia 30.06.2017 e as 04,02 horas do dia 01.07.2017, sendo a quarta vez que nessa semana efetuava repouso diário reduzido.
6.º Na jornada de trabalho de 14/15.09.2017 o motorista C… parou às 18,57 horas mas, por esquecimento, não acionou corretamente o dispositivo de comutação, tendo deixado o tacógrafo a registar “outros trabalhos” em vez de “descanso” entre as 18,57 e as 21,14 horas, período em que esteve a descansar.
7.º Às 21,14 horas o motorista C… acionou corretamente o tacógrafo, passando-o a “descanso”.
8.º Na jornada de trabalho de 30.06/01.07.2017 o motorista M… não realizou o período de repouso diário regular a que estava obrigado porque estava convencido de que naquela semana ainda só havia realizado dois períodos de repouso diário reduzido quando, na verdade, havia realizado três.
9.º Na semana de trabalho de 12 a 18.06.2017 o motorista M… acumulou um total de condução de 60,52 horas quando só podia acumular 56 horas, porque não contabilizou corretamente os tempos de condução da semana em causa e estava convencido que ainda não tinha excedido as 56 horas.
10.º O motorista F… foi admitido ao serviço da recorrente em 05.09.2017 e entre esse dia e o dia 07.09.2017 esteve em formação, tendo feito o registo no cartão através de entrada adicional.
11º F… apenas começou a conduzir no dia 08.09.2017.
12º O motorista tinha em seu poder o documento comprovativo de comunicação da admissão à Segurança Social e exibiu o mesmo ao agente autuante.
13º A recorrente ministra formação aos motoristas, programa-lhes o trabalho de forma a respeitarem os tempos de condução e repouso e a utilização do aparelho tacográfico, e fiscaliza regularmente os tempos de condução e repreendeu os motoristas pela prática das infrações.
14º A recorrente tem antecedentes contraordenacionais.

B) APRECIAÇÃO

B1) Organização do tempo de trabalho

A arguida conclui que não é responsável pelas contraordenações, pois está provado que “ministra formação aos motoristas, programa-lhes o trabalho de forma a respeitarem os tempos de condução e repouso e a utilização do aparelho tacográfico, e fiscaliza regularmente os tempos de condução e repreendeu os motoristas pela prática das infrações”.
Todavia, a arguida não alegou e provou que no caso concreto organizou a viagem de modo a que os motoristas pudessem observar os tempos de condução e repouso previstos na lei.
Não basta uma prova genérica. Mais importante que essa prova genérica, é a prova de que no caso concreto a empresa organizou a viagem de modo a que o motorista pudesse repousar. A viagem pode ser organizada pormenorizada e meticulosamente, mas não deixar espaço nem tempo para o motorista gozar os tempos obrigatórios de repouso.
Respondendo à interrogação da arguida para saber como é que tem de provar que organizou a viagem de modo a que o motorista tenha tempo para descansar: pode apresentar o itinerário da viagem desde o princípio até ao fim, com as distâncias a percorrer, tempos normais entre determinadas localidades, onde carrega e descarrega, prevendo sempre os períodos de tempo e de repouso a observar. Deve conter a indicação ao motorista de que em caso de atraso nas descargas, cargas, ou outros motivos, decorrido o tempo normal de condução, está obrigado a observar o repouso previsto na lei.
No caso concreto a empresa não demonstrou ter feito isso.
O facto dado como provado em que se estriba mais não é do que uma conclusão.
Assim, como este tribunal da Relação de Évora vem entendendo[1], não basta a prova de que a empresa dá formação aos motoristas e organiza em geral o seu trabalho de forma a respeitarem os tempos de condução e repouso e a utilização do aparelho tacográfico, e fiscaliza regularmente os tempos de condução, sendo indispensável a prova de como foi organizada a viagem, a fim de se poder concluir se o motorista tinha ou não possibilidade de gozar os tempos de repouso.

B2) Justificação pela prática das contraordenações

Está provado que: “6.º Na jornada de trabalho de 14/15.09.2017 o motorista C… parou às 18,57 horas mas, por esquecimento, não acionou corretamente o dispositivo de comutação, tendo deixado o tacógrafo a registar “outros trabalhos” em vez de “descanso” entre as 18,57 e as 21,14 horas, período em que esteve a descansar,
7.º Às 21,14 horas o motorista C… acionou corretamente o tacógrafo, passando-o a “descanso”.
8.º Na jornada de trabalho de 30.06/01.07.2017 o motorista M… não realizou o período de repouso diário regular a que estava obrigado porque estava convencido de que naquela semana ainda só havia realizado dois períodos de repouso diário reduzido quando, na verdade, havia realizado três.
9.º Na semana de trabalho de 12 a 18.06.2017 o motorista M… acumulou um total de condução de 60,52 horas quando só podia acumular 56 horas, porque não contabilizou corretamente os tempos de condução da semana em causa e estava convencido que ainda não tinha excedido as 56 horas”.
Em relação a estas três contraordenações, em face dos factos provados, a sua prática ficou a dever-se à conduta negligente dos motoristas, sem qualquer ligação com a deficiente organização dos tempos de trabalho.
O não registo adequado do tempo de trabalho num caso e o excesso na realização de períodos de repouso diário reduzido e de trabalho semanal nos outros dois, deveu-se a falhas dos motoristas que não podem ser imputadas à empresa. Mesmo que esta tivesse organizado as viagens de modo a que fossem respeitados em concreto os tempos de repouso e descanso obrigatório, nunca poderia evitar os esquecimentos ou falhas dos motoristas, pois estas estão fora do seu controlo.
Neste contexto, a responsabilidade da arguida está legalmente excluída quanto às contraordenações seguintes:
- A contraordenação muito grave, prevista e punível nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 8.º do Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março, e 14.º, 4, a) e b), e 20.º, 2, c), da Lei n.º 27/2010, de 30 de agosto;
- A contraordenação grave, prevista e punível nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 6.º, 2, do Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março, e 14.º, 3, a) e b), e 18.º, 3, b), da Lei n.º 27/2010 de 30 de agosto; e
- A contraordenação grave prevista e punível nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 4.º, g), e 8.º, 2, ambos do Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março, e 14.º, 3, a) e b), e 20.º, 1, b), ambos da Lei n.º 27/2010 de 30 de agosto.
Os motoristas são os responsáveis pela prática destas três contraordenações, a título de negligência.

B3) Não apresentação da justificação pela ausência dos registos

Resta a contraordenação por o motorista não se fazer acompanhar da totalidade das folhas de registo referentes aos últimos 28 dias, estando em falta os dias 21.08.2017 a 07.09.2017, não tendo apresentado qualquer declaração de atividade.
A empresa alegou e provou que: “o motorista F… foi admitido ao serviço da recorrente em 05.09.2017 e entre esse dia e o dia 07.09.2017 esteve em formação, tendo feito o registo no cartão através de entrada adicional e que F… apenas começou a conduzir no dia 08.09.2017”.
Esta Relação de Évora tem decidido reiteradamente que “o motorista que não exerce a condução todos os dias deve trazer consigo a declaração de atividade de modelo oficial que contenha a causa objetiva que justifica a não apresentação das folhas de registo do tacógrafo, relativamente àqueles dias, e apresentá-la ao agente de controlo sempre que necessário”[2].
E como se escreveu noutro acórdão desta Relação:“ao não apresentar os registos do tacógrafo nem o formulário Anexo à Decisão da Comissão, ou documento equivalente, mostra-se consumada a contraordenação ao disposto no art.º 15.º n.º 7, alínea a) do Regulamento CEE n.º 3821/1985, de 20.12, punida nos termos dos art.ºs 13.º n.ºs 1 e 2, 14.º n.º 4, alínea a), e 25.º da Lei 27/2010, de 30.08[3]”.
E como se sumariou neste último acórdão citado: “a existência de um documento elaborado antecipadamente, de que o motorista é portador para apresentar ao agente de controlo, tem em vista um tratamento igual em todo o espaço da União para esta situação concreta e revela-se uma exigência do direito da União, que o Estado português deve respeitar, a fim de cumprir os objetivos prosseguidos por este.
Não afasta a ilicitude do facto, ou a culpa, a prova apresentada posteriormente no sentido de que não conduziu nos dias com registo em falta”.
Mantém-se integralmente este entendimento.
O motorista está obrigado a disponibilizar de imediato os registos do tacógrafo. Se não tiver conduzido em algum dos dias, deve apresentar também no ato os documentos comprovativos do não registo, sendo ineficaz a sua apresentação posterior.
Nestes termos, a arguida é responsável pela prática desta contraordenação.

B4) Medida da coima

A arguida foi condenada em cúmulo jurídico numa coima única.
Tendo em conta que foi absolvida de três das quatro contraordenações, impõe-se reformular esta decisão.
A autoridade administrativa condenou a arguida na coima de 28 UC pela prática desta contraordenação.
Não foi colocada em causa a sua moldura concreta, nem encontramos motivos para a alterar, pelo que se mantém.
A autoridade administrativa aplicou à arguida a sanção acessória de publicidade.
Está provado que a arguida tem antecedentes contraordenacionais.
O art.º 562.º n.º 1 do CT, prescreve que no caso de contraordenação muito grave ou reincidência em contraordenação grave, praticada com dolo ou negligência grosseira, é aplicada ao agente a sanção acessória de publicidade.
Os factos provados referem apenas que a arguida tem antecedentes contraordenacionais, o que é insuficiente para apurar se estão verificados os requisitos para a aplicação da sanção acessória de publicidade.
Esta sanção acessória só é aplicada em caso de contraordenação muito grave ou reincidência em contraordenação grave, praticada com dolo ou negligência grosseira. A prova genérica de antecedentes contraordenacionais não basta para apurar a reincidência.
Assim, absolve-se a arguida da condenação na sanção acessória de publicidade.

III - DECISÃO

Nestes termos, acordam os juízes que integram a Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar parcialmente procedente o recurso apresentado pela arguida e em consequência decidem:
1. Absolver a arguida:
a) - Da contraordenação muito grave, prevista e punível nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 8.º do Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março, e 14.º, 4, a) e b), e 20.º, 2, c), da Lei n.º 27/2010, de 30 de agosto;
b) – Da contraordenação grave, prevista e punível nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 6.º, 2, do Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março, e 14.º, 3, a) e b), e 18.º, 3, b), da Lei n.º 27/2010 de 30 de agosto; e
c) – Da contraordenação grave prevista e punível nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 4.º, g), e 8.º, 2, ambos do Regulamento (CE) n.º 561/2006, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de março, e 14.º, 3, a) e b), e 20.º, 1, b), ambos da Lei n.º 27/2010 de 30 de agosto.
d) Da sanção acessória de publicidade.
2. Confirmar a condenação da arguida quanto à contraordenação muito grave prevista e punível nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 36.º do Regulamento (UE) n.º 165/2014, de 04 de fevereiro, 25.º, 1, b), da Lei n.º 27/2010, de 30 de agosto, e 561.º, 2, do Código do Trabalho, bem como o montante da coima em 28 UC (vinte e oito UC).
Custas pela arguida recorrente.
Notifique e comunique à ACT.
(Acórdão elaborado e integralmente revisto pelo relator).
Évora, 14 de julho de 2020.
Moisés Silva (relator)
Mário Branco Coelho
_______________________________________________
[1] Ac. RE, de 08.03.2018, processo n.º 1278/16.3T8TMR.E2, em que o aqui relator interveio como adjunto, www.dgsi.pt/jtre, e jurisprudência aí citada.
[2] Ac. RE, de 20.04.2017, processo n.º 957/16.0T8STR.E1, www.dgsi.pt/jtre.
[3] Ac. RE, de 19.01.2019, processo n.º 742/16.9T8BJA.E2, www.dgsi.pt/jtre