Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1062/21.2T8ENT-C.E1
Relator: ISABEL DE MATOS PEIXOTO IMAGINÁRIO
Descritores: RECURSO DE REVISÃO
TRANSACÇÃO
TAXA DE JUSTIÇA EXCEPCIONAL
OBJECTO DO RECURSO
Data do Acordão: 10/30/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: Em processo executivo, caso exista incumprimento do acordo celebrado, poderá o exequente renovar a execução, nos termos do artigo 850.º, n.º 1, do CPC.
Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Évora

I – As Partes e o Litígio

Recorrente: (…)
Recorrido: Banco (…), SA

Trata-se de um recurso de revisão através do qual a Recorrente pretende anular a transação e reverter a subsequente sentença homologatória que implicou na extinção da instância executiva.
Nessa transação, a ora Recorrente, na qualidade de Executada, obrigou-se a pagar a quantia de € 13.037,91, em 12 prestações mensais e sucessivas. Invoca a Recorrente que agiu mediante aconselhamento prestado pela então patrona nomeada, tendo sido forçada a celebrar o acordo de transação, fazendo apelo ao regime inserto no artigo 696.º, alínea d), do Código de Processo Civil.

II – O Objeto do Recurso
Foi proferido o seguinte despacho:
«Quanto ao recurso de revisão, e sob pena de aplicação de taxa sancionatória excecional (artigo 531.º do Código de Processo Civil), notifique a recorrente para vir esclarecer de que despacho recorre, designadamente para clarificar a qual sentença homologatória se refere.»
Despacho que foi notificado à Recorrente a 05/11/2024.
A 12/11/2024 foi proferido o seguinte despacho:
«Uma vez que a questão suscitada não foi esclarecida, indefere-se, por inadmissibilidade, o requerimento de recurso de revisão interposto.
Custas pela recorrente (artigo 527.º do Código de Processo Civil), aplicando-se aqui a taxa sancionatória especial, por a parte não ter identificado o despacho de que recorria, sendo evidente a sua falta de prudência e a inadmissibilidade do recurso, fixando-se a taxa em 2 Unidades de Conta (artigo 531.º do Código de Processo Civil).»
Mediante requerimento apresentado a 18/11/2024, a Recorrente avançou que resulta do articulado que apresentou que, inexistindo sentença homologatória do acordo, o que pretende seja revisto é o despacho que versou o acordo alcançado ou, no limite, o de extinção da instância executiva.
Mais pugnou pela revogação do despacho de 12/11/2024, uma vez que foi proferido antes de ter decorrido o prazo de resposta.

Inconformada com o teor do referido despacho, a Recorrente apresentou-se a interpor recurso de apelação, pugnando pela respetiva revogação nos seguintes termos:
«A) Por não ter decorrido o prazo legal para a apresentação de resposta ao douto despacho de 30.11.2024 que se presume notificado à mandatária em 08.11.2024, terminando o prazo para resposta em 18.11.2024, sendo esta tempestiva, enfermando de lapso manifesto pois naquela data não havia expirado o prazo legal fixado no CPC para resposta;
B) Reconhecendo a nulidade invocada e revogando a aplicação da taxa sancionatória no valor de 2 UC à recorrente atento o vício que determina a sua a anulabilidade por falta de audição prévia da recorrente;
C) E, caso assim não se entenda, a sua nulidade ou improcedência total por falta de fundamento, na parte em que condena a recorrente na taxa sancionatória excecional.»
As conclusões da alegação do recurso são as seguintes:
«I. O Despacho Recorrido notificada no dia 18.11.2024 da notificação de 14/11/2024 (ref.ª 98119075) deverá ser modificado em dois segmentos: A. Quando considera que a questão suscitada não foi esclarecida, indeferindo por inadmissibilidade, o requerimento de recurso de revisão interposto, uma vez que, na data de prolação do Despacho de 12.11.2024 ainda não havia decorrido o prazo da recorrente para responder ao anterior despacho que lhe foi notificado em 05.11.2024 (e que determinou a sua notificação para esclarecer tal questão) B. E quando aplica uma taxa sancionatória no valor de 2 UC à recorrente.
II. O citado Despacho não teve em consideração que a data em que a mandatária se presume notificada do despacho de 30/10/2024 ref.ª 97905132 coincide com o dia 08 de novembro de 2024 – sexta-feira, nos termos dos artigos 247.º e 248.º ambos do CPC, os mandatários são notificados nos termos definidos na Portaria prevista no n.º 1 do artigo 132.º, devendo o sistema informático certificar a data da elaboração da notificação, presumindo-se esta feita no 3º dia posterior ao da elaboração ou no 1º dia útil seguinte a esse, quando o não seja – Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto.
III. foi expedida à Recorrente, na pessoa da sua Mandatária, a notificação do despacho de 30.10.2024 em 05.11.2024 (ref.ª 106539634) – 98013354 – A partir desta data há que contar até ao terceiro dia posterior para funcionar a presunção da notificação, sendo dia útil.
IV. tendo o sistema certificado a indicada data como sendo a data da notificação à Mandatária da Recorrente, e atento o preceituado no artigo 248.º do CPC, in fine, esta presume-se feita no 3º dia posterior ao da elaboração, por ser dia útil, ou seja, no dia 08 de novembro de 2024.
V. Ademais, nos termos do artigo 149.º (artigo 153.º do CPC 1961) do CPC, 1 - Na falta de disposição especial, é de 10 dias o prazo para as partes requererem … Assim, o assinalado prazo de 10 dias terminou no dia 18.11.2024, porquanto, não constando douto Despacho proferido pela Meritíssima Juiz a quo outro prazo, dispunha a parte de um prazo de 10 dias para o efeito e que cumpriu, sem prejuízo da aplicação do artigo 139.º, n.º 5, do CPC.
VI. Pelo que, o douto Despacho proferido não teve em consideração o disposto nos citados artigos 247.º e 248.º do CPC e na Portaria para o qual este remete, nem ainda os termos de contagem do prazo definido no artigo 485.º e 149.º do CPC, tal como se encontram definidos no artigo 138.º do CPC.
VII. O Despacho proferido enferma de lapso manifesto porquanto a resposta podia ser apresentada até ao dia 18.11.2024 (o que fez através do requerimento de 18/11/2024, ref.ª 11170831) cfr. print do requerimento.
VIII. Aliás, e apenas por mera tese (dado que tal entendimento não terá enquadramento legal) este prazo de 10 dias mesmo considerando a data do despacho (30.10.2024), apenas terminaria no dia 14 de novembro de 2024 (dado que a subscritora, no limite, se consideraria notificada no dia 04.11.2024), concretamente na data em que foi proferido o despacho que agora se pretende ver retificado. E que, portanto, precedeu (ainda assim) o termo deste “imaginário” prazo, sempre sem prejuízo do artigo 139.º, n.º 5, do CPC que previa a prática até ao dia 21 de novembro de 2024.
IX. Em segundo lugar, deverá ser revogado quando determina a aplicação de uma taxa sancionatória no valor de 2 UC à recorrente, porquanto tal decisão carece de total fundamento, quer formal, quer material.
X. Desde logo, decidiu o Tribunal a quo, sem a prévia audição da Recorrente, omissão que infringe os princípios constitucionais da igualdade, do acesso ao direito, do contraditório e da proibição da indefesa.
XI. Não só ainda se encontrava a decorrer o prazo para resposta como supra referido, como não ficou demonstrado que fosse manifestamente infundada/inadmissível a sua pretensão e que esta não tivesse agido com a prudência devida.
XII. A decisão proferida nos presentes autos violou, desde logo e atenta a falta de audiência prévia da Recorrente, o artigo 3.º, n.º 3, do CPC [cfr. Ac. do STJ de 11.09.2012], sendo, por isso, nula e ainda o artigo 531.º do C.P.C., uma vez que, sem fundamento, condenou a Recorrente numa taxa sancionatória excecional de 2 UC’s.
XIII. De facto, neste sentido se pronunciaram inúmeros arestos, tendo o Tribunal Constitucional vindo a emitir pronúncia, no Acórdão n.º 652/2017, de 11 de Outubro, tendo concluído que a decisão que aplica aquela sanção processual pressupõe a prévia audição do interessado em termos de este poder alegar o que tiver por conveniente quanto à condenação prevista como possível o regime da condenação em taxa sancionatória excecional, cuja natureza é – para efeitos de garantia do contraditório – equiparável à da sanção prevista em caso de litigância de má fé. Neste sentido, podem ler-se, designadamente, os Acórdãos n.ºs 440/94, 103/95, 357/98 e 289/2002.
XIV. Pelo que, não podia ter sido privada de apresentar perante o tribunal qualquer tipo de defesa, acabando por ser confrontado com uma decisão condenatória que não teve
oportunidade de contraditar, direito processual que corresponde à esfera última irredutível do contraditório, garantia inscrita no direito a um processo equitativo consagrada no artigo 20.º, n.º 4, da CRP.
XV. Remete-se, pois, para a fundamentação dos Acórdãos n.ºs 440/94, 103/95, 357/98 e 289/2002, concluindo-se pela inconstitucionalidade da norma contida no artigo 531.º do Código de Processo Civil, na interpretação segundo a qual a decisão constante de um acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido pela formação prevista no artigo 672.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, que condene uma parte em taxa sancionatória excecional não tem de se precedida da audição da parte interessada (…).»
XVI. Tal não ocorreu na situação em apreço, não tendo sido facultada à recorrente a possibilidade de pronúncia sobre o que veio a pronunciar-se a decisão recorrida.
XVII. Ademais, afigura-se não estarem verificados os pressupostos que determinam a aplicação de taxa sancionatória excecional.
XVIII. O desiderato desta norma encontra-se assinalado no preâmbulo do 34/2008, de 26 de fevereiro que aprova o Regulamento das Custas Processuais e visa, essencialmente, penalizar o uso manifestamente desnecessário do processo, pelas partes, em quadro de falta de prudência ou diligência, censurável do ponto de vista ético-jurídico.
XIX. Decorre do artigo 531.º do CPC a necessidade da verificação de pressupostos cumulativos: formulação de pretensão manifestamente improcedente; e não ter a parte agido com a prudência ou diligência devidas.
XX. Poderá considerar-se que a pretensão de ver julgada procedente o recurso de revisão interposto constitui dedução de pretensão manifestamente improcedente? Crê-se que a resposta deverá ser negativa.
XXI. Pode ainda ler-se o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Processo n.º 136/13.8JDLSB.L2-A.S, de 18-12-2019.
XXII. Forçoso é concluir não ter a apelante feito um uso anormal e desadequado dos meios processuais que a lei lhe concede, não agiu com fins dilatórios (nada resulta nesse sentido), sendo que as questões pela mesma suscitada não se subsumem no âmbito dos requisitos da taxa sancionatória excecional, visto não estar propriamente em causa a manifesta improcedência de pretensões de índole processual ou substantiva. E não traduz pretensão manifestamente infundada, abusiva e reveladoras de violação do dever de diligência por parte da recorrente e que tenha dado azo a assinalável atividade processual, que se possa qualificar de excecionalmente reprovável.
XXIII. Pode ler-se, de igual modo, o douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora (Processo n.º 173/21.9T8ELV-A.E1 de 24 Março 2022), o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora (Processo: n.º 2647/16.4T8PTM-A.E1 de 24-05-2018, com referência ao artigo 447.º-B, o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 06-02-2012 (Proc. n.º 425885/09.6YIPRT-B.P1), o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 12-11-2013 (Proc. n.º 41/12.5YUSTR.L1-5, disponível em www.dgsi.pt) «com a taxa sancionatória excecional pretende-se sancionar comportamentos abusivos manifestamente improcedentes – censuráveis enquanto decorrentes de exclusiva falta de prudência ou diligência da parte que os utiliza, com isto se induzindo as partes a evitar comportamentos que excedam os limites do razoável ou se situam abaixo do patamar da diligência mínima».
XXIV. O mesmo se há de entender em relação ao citado n.º 1 do artigo 531.º, do qual decorre que para que possa haver lugar a condenação em taxa sancionatória excecional (i) devem as questões suscitadas ser manifestamente improcedentes ou dilatórias, sem qualquer interesse atendível, e (ii) a parte não ter agido com a diligência devida, ou seja, haver uma falta de prudência e de diligência da parte.
XXV. E ainda no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora (Processo n.º 1267/09.4TBBNV.E1, de 07-06-2018): A taxa sancionatória excecional prevista no artigo 531.º do CPC destina-se a sancionar condutas da parte que, não atingindo a gravidade pressuposta pela litigância de má-fé, se traduzem na formulação de pretensão ou prática de ato que a parte não teria introduzido em juízo ou praticado no processo caso tivesse atuado com a prudência e diligência que lhe são exigíveis e o Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra (Processo n.º 2466/20.3T8VIS-F.C1), de 09-11-2021.»

Não foram apresentadas contra-alegações.

Do despacho que apreciou o requerimento de interposição do recurso consta, designadamente, o seguinte:
«Tais fundamentos merecem adesão, na medida em que aquando da prolação do despacho datado de 12-11-2024 ainda estava em curso o prazo geral de 10 dias (artigo 149.º, n.º 1, do Código de Processo Civil) para que a recorrente procedesse em conformidade com a 2ª parte do despacho de 30-10-2024, o qual foi notificado à Ilustre patrona por via do ofício que consta da ref.ª 98013354, de 05-11-2024.
Desse modo, e considerando ainda o disposto no artigo 248.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, tal prazo só se esgotaria em 18-11-2024, razão por que a pronúncia que constitui a ref.ª 11170831, de 19-11-2024, subscrita pela Ilustre patrona pelas 23:39:31 de 18-11-2024, foi tempestiva.
(…)
Pois bem, tendo sido arguida a nulidade do despacho recorrido, importa apreciá-la nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 617.º, n.º 1, e 641.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil.
Nessa medida, não será necessário grande esforço argumentativo, face ao que já ficou enunciado, para considerar que tal nulidade se verifica, efetivamente.
Com efeito, já sublinhámos que o despacho recorrido foi proferido quando ainda corria o prazo de 10 dias para resposta ao despacho que o antecedeu, razão por que o pressuposto em que a decisão nele plasmada se baseou (falta de esclarecimento da questão antes suscitada) não podia ainda considerar-se consolidado.
Desse modo, e como houve clara influência na decisão proferida, está verificada a nulidade decorrente do artigo 195.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, a qual se impõe suprir à luz do já citado artigo 617.º, n.º 1, do mesmo diploma, o que em primeira linha passa por apreciar a tempestiva resposta que foi oferecida através da ref.ª 11170831, de 19-11-2024, que voltamos a transcrever, mas desta feita apenas nos segmentos que se nos afiguram mais relevantes:
«(…)
2. Considera a subscritora, e tal decorre do teor do seu articulado, ter identificado na interposição do Recurso de Revisão da transação e subsequente sentença homologatória proferida de fls. do referido processo principal – alínea d) do artigo 696.º do Código de Processo Civil, a sua pretensão.
3. Ora, neste caso, não tendo existido sentença homologatória do acordo, sempre se impõe que este incida sobre o despacho que teve por objeto o acordo alcançado nos autos ou, no limite, o de extinção dos mesmos (caso não tenha existido o primeiro) – o que resulta dos autos principais.
4. Deve assim, ter por alcance o despacho proferido em sequência daquele acordo, subscrito na convicção de que existiria recurso do indeferimento liminar.
(…)».
Diante do assim esclarecido, parece não restar dúvida de que a decisão que a recorrente teve em vista foi a que a sra. Agente de execução notificou às partes através dos ofícios atinentes às ref.ªs 8556393 e 8556452, de 23-03-2022 do processo principal e que tem o seguinte teor:
«Fica V.ª Exa. devidamente notificado que, por se encontrarem reunidos os pressupostos necessários para a extinção da instância, é a mesma declarada extinta pelo acordo de pagamento celebrado entre as partes, nos termos do disposto no artigo 849.º, n.º 1, alínea f), do CPC e artigo 806.º, n.º 2, do CPC.
Caso exista incumprimento do acordo celebrado, poderá o exequente renovar a execução, nos termos do artigo 850.º, n.º 1, do CPC».
Sobre tal decisão não incidiu qualquer reclamação nos termos do artigo 723.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil, pelo que, em linha com o entendimento que cremos pacificado ao nível jurisprudencial, a mesma passou a constituir caso estabilizado / consolidado (por todos, vide os Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 02-05-2023, do Tribunal da Relação de Lisboa de 04-07-2023, do Tribunal da Relação de Guimarães de 15-02-2024: Procs. n.º 1799/18.3T8VIS.C1, 9761/10.8YYLSB-A.L1-7 e 6874/16.6T8VNF-F.G1, respetivamente).
Sem prejuízo de tal constatação, estamos em crer que as decisões transitadas em julgado a que alude o proémio do artigo 696.º do Código de Processo Civil serão apenas, ao nível das decisões judiciais, as sentenças, os despachos e os acórdãos, a que acrescem, a outro nível, as decisões arbitrais (com este entendimento vejam-se José Lebre de Freitas, Armindo Ribeiro Mendes e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Volume 3.º, 3.ª edição, Almedina, 2022, págs. 301-302, assim como Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 8.ª edição, Almedina, 2024, pág. 660).
Vale dizer, a contrario, que não estão abrangidas as decisões dos agentes de execução.
Efetivamente, e seguindo agora na esteira do Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 07-06-2023 (Proc. 633/16.3T8CHV-B.G1), há que realçar que «o agente de execução não exerce, na execução, funções materialmente judiciais, mas sim materialmente administrativas e que os atos e as decisões que aí profere não são materialmente judiciais, mas sim materialmente administrativas, pelo que, quanto a elas, por não se estar perante qualquer decisão judicial, não faz sentido falar-se em caso julgado, uma vez que se trata de instituto apenas aplicável às decisões judiciais (…).
Acresce que, os atos e decisões do agente de execução, quando não sejam objeto de, respetivamente, reclamação ou de impugnação para o juiz da execução, apesar de se estabilizarem na ordem jurídica, tornando-se inalteráveis e imodificáveis, onde adquirem uma força vinculativa semelhante ao trânsito em julgado que cobre as decisões judiciais, essa definitividade e inalterabilidade não se confunde com a que é própria do trânsito em julgado, na medida em que, contrariamente ao que acontece com as decisões judiciais transitadas em julgado, em que a definitividade e inalterabilidade do nelas decidido é absoluta, os atos e as decisões do agente de execução que não sejam objeto, respetivamente, de reclamação ou de impugnação, não gozam de definitividade e inalterabilidade absolutas, posto que podem, em determinadas circunstâncias, ser alteradas/modificadas, compreendendo-se, por isso, que a doutrina fale em relação a estes de “caso estabilizado”.
Por conseguinte, não sendo a decisão do agente de execução (…) uma decisão judicial, mas sim uma decisão materialmente administrativa, nem exercendo o agente de execução, no âmbito da execução, funções judiciais, mas antes funções materialmente administrativas, (…) essa decisão, na medida em que não foi objeto de impugnação para o juiz, apesar de se encontrar consolidada na ordem jurídica em termos semelhantes às decisões judiciais transitadas em julgado, não se encontra coberta pelo caso julgado, mas sim pelo “caso estabilizado”.
Daí que essa decisão do agente de execução (…) não possa ser objeto de recurso extraordinário de revisão por, reafirma-se, esse recurso ter necessariamente por objeto decisões judiciais, já transitadas em julgado, que padeçam dos vícios taxativamente elencados no artigo 696.º do CPC, o que não é o caso daquela decisão do agente de execução».
Concordamos em absoluto, tanto mais que um tal entendimento subsumido ao caso concreto não deixa a aqui recorrente sem tutela jurídica, pois que de harmonia com o já anteriormente mencionado artigo 291.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil, terá sempre à sua disposição «a ação destinada à declaração de nulidade ou à anulação» da transação com base na qual a agente de execução exarou a sobredita decisão de extinção.
Assim sendo, e não obstante a nulidade que importa declarar, manter-se-á o indeferimento liminar do recurso de revisão (artigo 699.º, n.º 1, in fine, do Código de Processo Civil), agora com base no fundamento vindo de enunciar, apenas não subsistindo fundamento para a anterior condenação da recorrente em taxa sancionatória excecional.
Na defluência de todo o conspecto fáctico-jurídico acima percorrido, decido:
(…)
D) Admitir como apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito evolutivo, o recurso interposto por via da ref.ª 11219265, de 04-12-2024 e que incidiu sobre o despacho proferido em 12-11-2024;
E) Julgar verificada a nulidade do despacho proferido em 12-11-2024 e, suprindo a mesma, considerar a resposta oferecida através da ref.ª 11170831, de 19-11-2024, declarando sem efeito a condenação da recorrente (…) em taxa sancionatória excecional e mantendo o indeferimento liminar do presente recurso de revisão, agora com fundamento na inadmissibilidade do mesmo relativamente à decisão de extinção da execução que a sra. Agente de Execução notificou às partes através dos ofícios atinentes às ref.ªs 8556393 e 8556452, de 23-03-2022 dos autos principais.»

Cumpre conhecer das seguintes questões:
i. da nulidade decorrente da precipitada prolação do despacho recorrido;
ii. da falta de fundamento para aplicação de taxa de justiça sancionatória excecional.

III – Fundamentos
A – Dados a considerar: os que resultam do supra exposto.

B – As Questões do Recurso
i. Da nulidade decorrente da precipitada prolação do despacho recorrido
A Recorrente sustenta que o despacho recorrido é nulo por ter sido proferido antes de decorrido o prazo de resposta ao anterior despacho.
O que efetivamente se verificou.
Trata-se de vício de cariz processual que, na verdade, consubstancia nulidade processual sujeita ao regime inserto nos artigos 195.º e ss. do CPC.[1]
No entanto, por se encontrar coberta por decisão judicial, acaba por a inquinar, ferindo-a de nulidade (nulidade por excesso de pronúncia)[2], pelo que pode ser esgrimida em sede de recurso interposto dessa decisão.[3]
A nulidade, porém, foi apreciada em 1ª Instância, conforme previsto no artigo 617.º/1, do CPC. Dando-a como verificada, foi subsequentemente proferida decisão que supriu a nulidade, tomando em consideração os argumentos invocados no articulado-resposta.
O despacho proferido, que julgou verificada a nulidade do despacho de 12/11/2024 e, suprindo a mesma, manteve o indeferimento liminar do recurso de revisão (com fundamento na inadmissibilidade do mesmo relativamente à decisão de extinção da execução que a Agente de Execução notificou às partes através dos ofícios atinentes às ref.ªs 8556393 e 8556452, de 23/03/2022 dos autos principais), constitui complemento ou parte integrante do despacho recorrido (o proferido a 12/11/2024), ficando o recurso interposto a ter como objeto a nova decisão – cfr. artigo 617.º/2, do CPC.
Tomando, então, como decisão recorrida aquela que resulta dos termos conjugados dos despachos proferidos a 12/11/2024 e em sede de pronúncia sobre a admissibilidade do recurso, afigura-se ter sido satisfeita a pretensão recursória da Recorrente. O vício que apontava ao despacho era aquele que decorria da falta de consideração da sua resposta (cfr. alínea A) do segmento final das alegações de recurso[4]), o que foi sanado.
Certo é que não foi alargado o âmbito do recurso interposto (cfr. artigo 617.º/3, do CPC), pelo que o objeto do mesmo não contende com a falta de fundamento para o indeferimento liminar do recurso de revisão.
Esgotado está, portanto, o objeto do recurso nesta matéria.

ii. Da falta de fundamento para aplicação de taxa de justiça excecional
A Recorrente pugnou, em sede de recurso, pela revogação da condenação no pagamento da taxa sancionatória excecional.
Uma vez que o despacho recorrido complementado não contempla a condenação da Recorrente no pagamento da taxa sancionatória excecional (condenação que foi dada sem efeito), esgotado está também o objeto do recurso nesta matéria.

Sem custas, por não serem devidas, uma vez que a Recorrente alcançou os efeitos pretendidos com a interposição do recurso.

IV – DECISÃO
Nestes termos, resulta prejudicado, pelo despacho complemento, o presente recurso.
Sem custas.
Évora, 30 de outubro de 2025
Isabel de Matos Peixoto Imaginário
Cristina Dá Mesquita
Anabela Raimundo Fialho


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[1] Neste sentido, entre muitos outros, Ac. TRL de 15/05/2014.
[2] Cfr. Ac. do STJ de 22/02/2017.
Miguel Teixeira de Sousa sustenta que a decisão proferida enferma de nulidade por excesso de pronúncia prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) e n.º 4, do CPC – cfr. artigos publicados no blogippc.blogspot.pt, entre os quais “Dispensa da audiência prévia e observância do dever de consulta”.
[3] Cfr. Acs. entre outros, do TRL de 11/01/2011, do STJ de 13/01/2005, do TRP de 18/06/2007 e do TRE de 10/04/2014.
[4] Cuja formulação é a seguinte:
«Eis os motivos pelos quais considera que este Venerando Tribunal da Relação de Évora, decorridos os trâmites do presente recurso de Apelação, deverá revogar o douto despacho de 14.11.2024,
A) Por não ter decorrido o prazo legal para a apresentação de resposta ao douto despacho de 30.11.2024 que se presume notificado à mandatária em 08.11.2024, terminando o prazo para resposta em 18.11.2024, sendo esta tempestiva, enfermando de lapso manifesto, pois naquela data não havia expirado o prazo legal fixado no CPC para resposta».