Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
| ||
Relator: | FÁTIMA BERNARDES | ||
Descritores: | ACESSO ILEGÍTIMO AGRAVAÇÃO CIBERCRIME | ||
![]() | ![]() | ||
Data do Acordão: | 02/25/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
![]() | ![]() | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | I - A circunstância agravante do crime de acesso ilegítimo prevista na al. a) do nº 5 do artigo 6º da Lei do Cibercrime (Lei nº 109/2009, de 15/09) - “através do acesso, o agente tiver tomado conhecimento de dados confidenciais, protegidos por lei” - não se preenche com a possibilidade de acesso aos dados confidenciais constantes da base de dados a que o agente acedeu. II - Na sua forma simples, prevista no nº 1 do artigo 6º da Lei do Cibercrime, o crime de acesso ilegítimo é um crime de perigo abstrato, bastando, para a sua consumação, a conduta de aceder, de qualquer modo, a um sistema informático, não se exigindo a verificação de qualquer dano ou de benefício ilegítimo, nem a efetiva tomada de conhecimento de informações armazenadas no sistema informático acedido (no fundo, o legislador presume que tais condutas são passíveis de constituir um perigo para a segurança dos sistemas informáticos, sem, contudo, exigir a criação de um perigo efetivo). III - Já nas formas agravadas, previstas no nº 5 do artigo 6º da Lei do Cibercrime, exigindo o legislador que, em consequência do acesso não autorizado, o agente tenha tomado conhecimento de informações abrangidas pelo segredo comercial ou industrial ou de dados confidenciais protegidos por lei, o crime de acesso ilegítimo é um crime de resultado IV - Neste quadro, no caso dos autos, estando provado que as arguidas, nas datas e horas apuradas, utilizando as suas credenciais de acesso a tal registo acederam ao sistema informático contendo as informações clínicas de terceiros, sem que, para tanto, tivessem qualquer justificação de trabalho ou de serviço e sem para tal estarem autorizadas, mas tendo sido dado como não provado que as arguidas tenham visto a informação clínica, e que, por referência à atuação descrita, acedessem às informações clínicas, forçoso é concluir que as arguidas, através das suas condutas, não preencheram a circunstância modificativa agravante prevista na al. a) do nº 5 do artigo 6º da Lei do Cibercrime, pelo que se impõe a sua absolvição do crime de acesso ilegítimo agravado (devendo as arguidas ser condenadas pela prática do crime de acesso ilegítimo simples, p. e p. pelo artigo 6º, nº 1, da Lei do Cibercrime). | ||
![]() | ![]() | ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na Secção Criminal (2.ª Subsecção) do Tribunal da Relação de Évora: 1. RELATÓRIO 1.1. Nestes autos de processo comum, n.º 1081/20.6T9EVR, do Tribunal Judicial da Comarca de Évora – Juízo Local Criminal de Évora – Juiz 2, foram submetidas a julgamento, com intervenção do Tribunal Singular, as arguidas: 1) ML; 2) MA; 3) MM; 4) S; 5) MJ e 6) V, todas melhor identificadas nos autos, estando acusadas da prática de um crime de acesso ilegítimo, p. e p. pelo artigo 6º, n.ºs 1 e 4, al. a), da Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro. 1.2. Na 1.ª sessão da audiência de julgamento, que teve lugar em 10/11/2022, após a tomada de declarações às arguidas (que as prestaram apenas no tocante às suas condições pessoais), foi pelas mesmas apresentado requerimento em que arguiram a nulidade da acusação, nos termos do disposto no artigo 283º, n.º 3, al. d), do CPP, por dela não constarem todas as disposições legais relativas à qualificação jurídica dos factos, tornando impossível às arguidas saber se lhes é imputado um crime na forma continuada ou vários crimes, em concurso e, no caso de se verificar, a sua qualificação (reportando-se à circunstância agravante). 1.3. Sobre o requerimento aludido em 1.2. recaiu despacho, proferido pela Mm.ª Juiz e exarado em ata, decidindo indeferir a arguida nulidade da acusação. Nesse mesmo despacho foi comunicada às arguidas a alteração da qualificação jurídica dos factos descritos na acusação, em termos de: a) os factos narrados no libelo acusatório integrarem também a al. a) do n.º 5 do artigo 6º da Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro, passando a ser imputado a cada uma das arguidos a prática de um crime de acesso ilegítimo agravado, p. e p. pelo artigo 6º, n.ºs 1, 4, al. a) e 5, al. a), da Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro; b) por referência ao número de acessos descritos na acusação relativamente a cada uma das arguidas, integrando a prática, do correspondente número de crimes de acesso ilegítimo agravado: - Arguida ML: 3 (três): - Arguida MA: 4 (quatro); - Arguida MM: 3 (três): - Arguida S: 7 (sete): - Arguida MJ: 6 (seis): - Arguida V: 2 (dois). 1.4. Inconformadas com o decidido no despacho mencionado em 1.3., as arguidas dele recorreram para este Tribunal da Relação [suscitando as questões da nulidade da acusação; nulidade do despacho recorrido, na parte em que se procedeu à alteração da qualificação jurídica dos factos descritos na acusação, ao abrigo do disposto no artigo 358º, n.ºs 1 e 3, do CPP, antes de produzida qualquer prova, na audiência de julgamento, que permitisse a apreciação do mérito da causa, em desrespeito pela jurisprudência fixada no Acórdão do STJ – AUJ – n.º 11/2013 e da ilegalidade do despacho recorrido, por fundamentar, no exercício do direito ao silêncio, por parte das arguidas, a alteração da qualificação jurídica dos factos, efetuada], que, por acórdão proferido em 23/01/2024, sob a Ref.ª Citius 8826376, decidiu negar provimento ao recurso. 1.5. Teve lugar a audiência de julgamento, no decurso da qual, na sessão realizada em 21/11/2022, o tribunal comunicou às arguidas uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação, ao abrigo do disposto no artigo 358º, n.º 1, do CPP, em termos de, no referente ao ponto 8. do libelo acusatório, onde se lê «registo nacional de utentes», dever ler-se «SClínico módulo médicos e SClínico módulo enfermagem», nada tendo as arguidas requerido. 1.6. Foi proferida sentença, em 09/01/2023 – depositada nessa mesma data –, com o seguinte dispositivo: «(...) decide-se: a) Condenar a arguida ML, pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de três crimes de acesso ilegítimo agravado, previsto e punido no artigo 6.º, n.º 1, n.º 4 al. a) e 5.º, al. a) da Lei 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 1 ano por cada um dos crimes praticados, e na pena única de 1 ano e 4 meses de prisão, suspensos na sua execução por igual período, na condição de pagar, no primeiro ano da suspensão da pena, a quantia de € 250,00 (a cada uma) à APAV, ao Chão dos Meninos, e à Assoc. Oncológica do Alentejo (AOA). b) Condenar a arguida MA, pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de quatro crimes de acesso ilegítimo agravado, previsto e punido no artigo 6.º, n.º1, n.º 4 al. a) e 5.º, al. a) da Lei 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 1 ano por cada um dos crimes praticados, e na pena única de 1 ano e 6 meses de prisão, suspensos na sua execução por igual período, na condição de pagar, no primeiro ano da suspensão da pena, a quantia de € 250,00 (a cada uma) à APAV, ao Chão dos Meninos, e à Assoc. Oncológica do Alentejo (AOA). c) Condenar a arguida MM, pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de três crimes de acesso ilegítimo agravado, previsto e punido no artigo 6.º, n.º1, n.º 4 al. a) e 5.º, al. a) da Lei 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 1 ano por cada um dos crimes praticados, e na pena única de 1 ano e 4 meses de prisão, suspensos na sua execução por igual período, na condição de pagar, no primeiro ano da suspensão da pena, a quantia de € 250,00 (a cada uma) à APAV, ao Chão dos Meninos, e à Assoc. Oncológica do Alentejo (AOA). d) Condenar a arguida S, pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de sete crimes de acesso ilegítimo agravado, previsto e punido no artigo 6.º, n.º1, n.º 4 al. a) e 5.º, al. a) da Lei 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 1 ano por cada um dos crimes praticados, e na pena única de 2 anos e 3 meses de prisão, suspensos na sua execução por igual período, na condição de pagar, no primeiro ano da suspensão da pena, a quantia de € 350,00 (a cada uma) à APAV, ao Chão dos Meninos, e à Assoc. Oncológica do Alentejo (AOA). e) Condenar a arguida MJ, pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de seis crimes de acesso ilegítimo agravado, previsto e punido no artigo 6.º, n.º1, n.º 4 al. a) e 5.º, al. a) da Lei 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 1 ano por cada um dos crimes praticados, e na pena única de 2 anos e 1 mês de prisão, suspensos na sua execução por igual período, na condição de pagar, no primeiro ano da suspensão da pena, a quantia de € 250,00 (a cada uma) à APAV, ao Chão dos Meninos, e à Assoc. Oncológica do Alentejo (AOA). f) Condenar a arguida V, pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de dois crimes de acesso ilegítimo agravado, previsto e punido no artigo 6.º, n.º1, n.º 4 al. a) e 5.º, al. a) da Lei 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 1 ano por cada um dos crimes praticados, e na pena única de 1 ano e 1 mês de prisão, suspensos na sua execução por igual período, na condição de pagar, no primeiro ano da suspensão da pena, a quantia de € 300,00 (a cada uma) à APAV, ao Chão dos Meninos, e à Assoc. Oncológica do Alentejo (AOA). g) Findo o prazo de 1 ano, ficam as arguidas obrigadas a demonstrar documentalmente nos autos os pagamentos condicionantes da suspensão das respectivas penas. h) Julgar o pedido cível deduzido por MC parcialmente procedente e condenar as arguidas MA, ML e V a pagarem-lhe, cada uma, a quantia de € 600,00, a arguida MJ a pagar-lhe a quantia de € 675,00, e a arguida S a pagar-lhe a quantia de € 800,00, a título de danos não patrimoniais sofridos, todas as quantias acrescidas de juros vencidos desde a data da citação para o PIC, e vincendos, à taxa legal, até integral pagamento. a) Julgar o pedido cível deduzido por J parcialmente procedente e condenar as arguidas ML, MA, e S a pagarem-lhe, cada uma, a quantia de € 500,00, a título de danos não patrimoniais sofridos, todas as quantias acrescidas de juros vencidos desde a data da citação para o PIC, e vincendos, à taxa legal, até integral pagamento. b) Julgar improcedente o pedido cível deduzido pelos demandantes em representação dos filhos menores J e T. c) Absolver as arguidas do demais peticionado. d) Condenar as arguidas nas custas criminais que se fixam em 3 UC´s para cada uma. e) As custas cíveis são responsabilidade de arguidas e demandantes, se a elas houver lugar, e em função do decaimento, que se fixa em 30% para os demandantes e 70% para as arguidas, sendo os demandantes responsáveis integralmente pelo pedido cível efectuado em nome dos filhos menores que foi julgado improcedente. (...).» 1.7. Inconformadas com o assim decidido, recorreram as arguidas para este Tribunal da Relação, suscitando no recurso as seguintes questões: Contradição entre a matéria de facto provada e não provada; contradição insanável entre a fundamentação e a decisão; insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; erro notório na apreciação da prova; impugnação da matéria de facto provada, por erro de julgamento e nulidade da sentença por excesso de pronúncia, condenação por factos diversos dos descritos na acusação e violação do disposto no artigo 355º, n.º 1, do CPP. 1.7.1. Conhecendo do recurso interposto pelas arguidas, da sentença proferida na 1.ª instância, decidiu este Tribunal da Relação, por acórdão de 23/01/2024, sob a Ref.ª Citius 8826376, conceder parcial provimento ao recurso e, em consequência: 1. Alterar a redação do ponto 9. da matéria de facto provada, em termos de onde consta «As arguidas (...) consultaram as informações clínicas (...)» passar a constar «As arguidas (...) acederam ao sistema informático contendo as informações clínicas (...)»; 2. Com a ressalva da parte em que foi julgado verificado o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, nos termos mencionados em 3., julgar improcedente a impugnação da matéria de facto dada como provada nos demais pontos, que se mantém inalterada; 3. Julgar verificado o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e determinar reenvio do processo para novo julgamento, parcial (artigo 426º, n.º 1, do Código de Processo Penal), com vista ao apuramento dos dígitos em falta, respeitantes aos dias em que ocorrem os acessos enunciados nos seguintes pontos da matéria de facto provada: - No ponto 11, com referência aos dias 14/05/2015, pelas 13h31m52, efetuado pela arguida MA e respeitante ao ofendida T e 22/12/2016, pelas 10h16m21s, efetuado pela arguida ML e respeitante ao ofendido JM; No ponto 12, com referência ao dia 21/05/2015, pelas 16h36m45s, efetuado pela arguida ML e respeitante ao ofendida T; - No ponto 13, com referência aos dias 12/11/2015, pelas 12h51m10s e pelas 12h52m52s, efetuados pela arguida S e respeitantes aos ofendidos JM e MC, respetivamente; e - No ponto 14, com referência ao dia 16/02/2017, pelas 14h45m51s, efetuado pela arguida MJ e respeitante à ofendida MC. 4. Subsequentemente, em face do que viesse a ser apurado e devendo ser extraídas as pertinentes consequências jurídicas da modificação da matéria de facto a que se procedeu, no respeitante ao ponto 9., devendo o tribunal a quo proferir nova sentença, decidindo de direito, em conformidade. 1.8. Baixados os autos à 1.ª instância, o Tribunal a quo dando cumprimento ao determinado por esta Relação, procedeu à realização de audiência de julgamento, tendo a Exm.ª Juiz, na sessão que teve lugar, em 11/04/2024, exarado em acta, que na falta de oposição de qualquer dos intervenientes, se considerasse que, na página 119 do acórdão proferido por este TRE, no ponto 3. do dispositivo, onde se lê L, devesse ler-se arguida MA (cf. ata com a Ref.ª Citius 33979108). 1.8.1. Na audiência de julgamento, após obtido o expresso consentimento dos ofendidos/demandantes JM e MC, a que, na presença de todos os intervenientes, se acedesse à respetiva área pessoal do portal do SNS 24, mais, concretamente, à área onde constam os acessos que deram origem aos presentes autos e consentindo em que todos visualizassem essas informações e que fossem impressas e juntas aos autos, o que ocorreu, tendo com base nessas informação constantes dos autos a fls. 728 a 732, sido consignadas em ata, as datas dos acessos cujos dígitos estavam em falta e cujo apuramento este TRE determinou fosse efetuado (cf. atas com as Ref.ª Citius 33979108 e 34018277). 1.8.2. As arguidas invocaram a irregularidade da obtenção do meio de prova enunciado em 1.8.1. (cf. artigo 123º do CPP), com fundamento no disposto nos artigos 14º, n.ºs 1 e 6, da Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro, aplicável ex vi do artigo 11º do mesmo diploma legal, tendo o Tribunal a quo decidido, por despacho proferido para a ata, em 11/04/2024 (cf. Ref.ª Citius 3979108), não julgar verificada a arguida irregularidade. 1.9. Inconformadas com o decidido no despacho mencionado em 1.8.2., as arguidas dele recorreram para este Tribunal da Relação, extraindo da motivação do recurso as seguintes conclusões: «A. As Recorrentes vêm interpor recurso do despacho (Ref. Citius 33979188) proferido da audiência de julgamento de 11.04.2024, que indeferiu a irregularidade (cf. artigo 123.º do C.P.P.) arguida pelas mesmas relativa à seguinte determinação: “(…) a determinar a consulta a informações da base de dados onde constam os acessos em causa nos autos por parte dos ofendidos.”5 Negritos e sublinhado nossos ; B. A invocada irregularidade tem como fundamento o disposto no artigo 14.º, n.ºs 1 e 6, da Lei do Cibercrime (aplicável ex vi do artigo 11.º do mesmo diploma); C. O Tribunal a quo fundamentou o referido indeferimento remetendo para os artigos 14.º, n.º 1, 15.º, n.º 1, e 16, n.º 1, todos da Lei do Cibercrime, o que não pode merecer acolhimento, D. O referido artigo 14.º da Lei do Cibercrime, dispõe o seu n.º 1 que: “1 – Se no decurso do processo se tornar necessário à produção de prova, tendo em vista a descoberta da verdade, obter dados informáticos específicos e determinados, armazenados num determinado sistema informático, a autoridade judiciária competente ordena a quem tenha disponibilidade ou controlo desses dados que os comunique ao processo ou que permita o acesso aos mesmos, sob pena de punição por desobediência.”; E. E, o seu n.º 6 estabelece: “6 – Não pode igualmente fazer-se uso da injunção prevista neste artigo quanto a sistemas informáticos utilizados para o exercício da advocacia, das actividades médica e bancária e da profissão de jornalista.”6 Negrito e sublinhado nosso. F. Da conjugação dos aludidos preceitos decorre que o meio de obtenção de prova determinado pelo Tribunal a quo é meio de obtenção de prova proibido, o que determina a respectiva ilegalidade (cf. artigo 125.º do C.P.P.), constituindo a irregularidade invocada; G. A consulta a informações determinada pelo Tribunal a quo apenas poderá ser enquadrada no âmbito da injunção prevista no artigo 14.º, n.º 1, da referida Lei do Cibercrime, atentos os conceitos de sistema informático e dados informáticos contidos naquele diploma (cf. artigo 2.º, als. a) e b), da Lei do Cibercrime) e bem assim o tipo de crime em discussão nos presentes autos (cf. artigo 6.º, n.º 1, e artigo 11.º, n. 1, da Lei do Cibercrime); H. Ora, é indiscutível que o sistema informático em questão é efectivamente um sistema informático em uso para o exercício da actividade médica; I. Sendo que, por dispor de diversos interfaces de acesso, cujos modos de apresentação e conteúdos disponíveis variam consoante o utilizador (médicos, enfermeiros, administrativos ou utentes) que o utilize, não perde aquela natureza; J. Pelo que se encontra ao abrigo da protecção acrescida do disposto no artigo 14.º, n.º 6, da Lei do Cibercrime; K. Do exposto resulta que a determinação do Tribunal a quo enferma da invalidade invocada, e que o acesso levado a cabo na continuação da audiência de julgamento (em 22.04.2024) correspondeu a um acesso ilegítimo (cf. artigos 14.º, n.º 6, e 16.º, n.º 1, da Lei do Cibercrime); L. No intuito de legitimar o acesso determinado para fins probatórios, o Tribunal a quo veio solicitar aos ofendidos que prestassem o respectivo consentimento expresso (cf. artigo 126.º, n.º 3, do C.P.P., in casu inaplicável) para que o mesmo ocorresse e bem assim à visualização, por todos os presentes, dos dados informáticos que do mesmo resultassem; M. Contudo, salvo devido respeito por melhor opinião, tal consentimento é irrelevante in casu; N. O bem jurídico protegido no crime de acesso ilegítimo (cf. artigo 6.º, n.º 1, da Lei do Cibercrime) é, em primeira linha, «a segurança do sistema informático, no que diz respeito à sua “privacidade” e não intromissão no mesmo.» - 7 Cf. AC. TRE de 09.05.2023, Processo n.º 1275/20.4JALRA.E1, relator Nuno Garcia, disponível em www.dgsi.pt. -, ou seja, a sua integridade e inviolabilidade; O. Sendo que apenas tal circunstância poderá justificar a protecção acrescida decorrente do disposto nas normas processuais da Lei do Cibercrime, quando se verifica a necessidade de obtenção, para efeitos probatórios, de dados informáticos contidos nos sistemas informáticos; P. Assim, não se encontra na disponibilidade dos particulares titulares dos dados armazenados em sistemas informáticos, autorizarem ou não o acesso ao sistema propriamente dito; Q. Não lhes podendo ser lícito consentirem no acesso a um sistema que informático que não controlam, que não é de sua propriedade e que contém outros dados protegidos por lei para além dos seus próprios dados, ainda que através do seu acesso pessoal. R. Exemplifica-se: aquando do acesso ao sistema, no decurso da audiência de julgamento de dia 22.04.2024 (continuação), foram visíveis, a todos os intervenientes processuais (incluindo aos ofendidos), diversos nomes de profissionais de saúde (não implicados nos autos) com indicação dos respectivos locais de trabalho, em datas e horas especificadas; S. Alguns destes dados, passaram a constar dos autos, mercê da impressão das páginas (do sistema) acedidas e sua junção ao processo, conforme determinação do Tribunal a quo, passando a estar, assim, acessíveis a qualquer pessoa que consultar ou tiver acesso ao processo; T. Pelo que, entendemos, deverá ser determinado o desentranhamento de tais documentos dos autos, o que afinal se irá requerer; U. Daqui resulta inequívoco que o consentimento para acesso a um sistema informático que contém dados também de terceiros e consequente divulgação a todo e qualquer interveniente processual, conforme sucedeu, não possa estar na disponibilidade dos ofendidos; V. Donde terá de decorrer necessariamente, como se disse e reitera, a irrelevância do consentimento prestado, não podendo colher a fundamentação expendida pela Mma. Juiz a quo no despacho recorrido; W. O Tribunal a quo veio, ainda, fundamentar o despacho ora em crise no disposto nos artigos 15.º, n.º 1, e 16.º, n.º 1, ambos da Lei do Cibercrime; X. O artigo 15.º do referido diploma legal vem estabelecer o regime processual aplicável às pesquisas de dados informáticos, consubstanciando – até considerando a remissão constante do seu n.º 6 – que o meio de obtenção de prova em apreço corresponde às buscas previstas nos artigos 174.º e ss. do C.P.P., quando realizadas em ambiente informático; Y. Ora, da fundamentação do despacho recorrido não decorre que o meio de obtenção de prova pretendido determinar tenha sido o do artigo 15.º da Lei do Cibercrime, desde logo por não se encontrarem preenchidos os respectivos pressupostos, nem terem sido cumpridas quaisquer das formalidades prescritas para tanto na lei geral (C.P.P.), como na lei especial (Lei do Cibercrime); Z. Nem poderiam os ofendidos ser alvo da uma autorização, determinação ou ordem para procederem a pesquisas (buscas) de dados informáticos no sistema em causa, considerando que, nos termos legais, tal corresponde necessariamente a competência dos órgãos de polícia criminal AA. Acresce que, não pode o Tribunal a quo determinar e levar a cado as pesquisas informáticas (buscas), sem mais, conforme se afirma na fundamentação do despacho, pois tal sempre teria de respeitar toda a disciplina decorrente do artigo 15.º da Lei do Cibercrime e do C.P.P. em matéria de buscas, sob pena de nulidade, o que, não sucedeu; BB. Logo, do exposto apenas pode resultar que o meio de obtenção de prova visado pelo despacho recorrido apenas pode corresponder ao previsto no artigo 14.º, n.º 1, da Lei do Cibercrime, correspondendo, aliás, ao teor do literal do despacho proferido; CC. Igualmente, não merece acolhimento a fundamentação com recurso ao disposto no artigo 16.º, n.º 1, da Lei do Cibercrime, que estabelece o regime aplicável à apreensão de dados informáticos em consequência das pesquisas (buscas) previstas no artigo 15.º da Lei do Cibercrime ou de outro acesso legítimo a um sistema informático (cf. artigo 14.º da Lei do Cibercrime); DD. Para tanto, sempre seria imprescindível a observância do regime estabelecido nos artigos 177.º, n.ºs 5 e 6, e 180.º do C.P.P., no que concerne à actividade médica, sob pena de nulidade da prova assim obtida, o que efectivamente, não apenas não foi determinado como não sucedeu; EE. Em suma: do despacho recorrido não resulta inequívoco que a Mma. Juiz a quo tenha determinado o meio de produção de prova através da pesquisa de dados informáticos (buscas) e consequente apreensão dos dados informáticos relevantes assim obtidos, ao abrigo do disposto nos preceitos supra citados; FF. Nem o procedimento empreendido pode ser enquadrado naquelas normas, atento o incumprimento das mesmas, donde apenas se pode concluir que não foi esse o meio de obtenção de prova efectivamente determinado; GG. Contudo, sem conceder, caso assim se não entenda — o que apenas por necessidade de raciocínio se admite - desde já se invoca a nulidade de que padece o meio de obtenção de prova e, consequentemente, a prova obtida. HH. Assim, reitere-se, mais não se pode concluir para além de que o meio de obtenção de prova determinado foi a injunção prevista no artigo 14.º, n.º 1, da Lei do Cibercrime; II. E que o mesmo é inválido e ilegal (cf. artigos 123.º e 125.º ambos do C.P.P.) atento o disposto no artigo 14.º, n.º 6, da Lei do Cibercrime; JJ. O que se traduz na ilegitimidade do acesso determinado e efectuado (cf. artigo 16.º, n.º 1, a contrario sensu, da Lei do Cibercrime), considerando que de tal injunção não pode fazer-se uso relativamente a sistemas informáticos utilizados no exercício da actividade médica cf. artigo 14.º, n.º 6, da Lei do Cibercrime); KK. Donde decorre a invalidade e ilegalidade (cf. artigos 123.º e 125.º ambos do C.P.P.) da prova assim obtida (por meio de impressões/prints efectuadas na secretaria do Tribunal); LL. Consequentemente, a sentença a proferir (no caso, já proferida) — nos que aos pontos 11, 12, 13 e 14 da matéria de facto dada como provada concerne — não pode fundamentar-se no meio de prova ora em crise, o qual é insusceptível de valoração. Nestes termos e nos melhores de Direito que Vossas Excelências Doutamente suprirão, considerando o supra exposto, devem as presentes alegações ser recebidas, consideradas procedentes e em consequência ser o despacho ora recorrido substituído por outro onde: a) Seja decretada a irregularidade do meio de obtenção de prova produzido (cf. artigos 118.º, n.º 2, e 123.º, ambos do C.P.P); b) Seja decretada a consequente invalidade e ilegalidade da prova do mesmo decorrente; c) Bem como o desentranhamento dos autos dos documentos juntos (prints/impressões) na sua decorrência, atenta a respectiva nulidade; d) Caso se entenda que o meio de obtenção de prova determinado e levado a cabo se reconduz ao previsto no artigo 15.º da Lei do Cibercrime, seja decretada a nulidade do meio de obtenção de prova de consequente nulidade da prova pelo mesmo obtida (cf. artigos 15.º e 16.º da Lei do Cibercrime e artigos 174.º e ss. e 180.º, todos do C.P.P.), tudo com as legais consequências. Requerer-se, ainda, sejam supridas as eventuais deficiências e lacunas das presentes alegações e, ponderada a bondade do seu conteúdo e desiderato, seja aplicada a costumada Justiça!» 1.10. O Tribunal a quo veio a proferir nova sentença, em 30/04/2024 – depositada nessa mesma data –, sanando o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada que este TRE julgou verificado e decidindo não terem as arguidas, através das suas apuradas condutas, preenchido a circunstância agravante prevista na alínea a) do n.º 4 do artigo 6º da Lei n.º 10/2009, de 15 de setembro (“O acesso for conseguido através de violação de regras de segurança”), porque haviam sido condenadas, na anterior sentença, proferida em 09/01/2023, cujo dispositivo supra transcrevemos em 1.6., mantendo, no demais, nos seus precisos termos, o aí decidido. 1.11. Inconformadas com a sentença proferida, as arguidas dela interpuseram recurso para esta Relação, extraindo da motivação apresentada as seguintes conclusões: «A) Inconformadas, as ora Recorrentes vêm recorrer da Douta Sentença, de 30 de Abril de 2024, proferida nos presentes autos, que as condenou nos seguintes termos: “Pelo exposto, decide-se: a) Condenar a arguida ML, pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de três crimes de acesso ilegítimo agravado, previsto e punido no artigo 6.º, n.º 1, n.º 4 al. a) e 5.º, al. a) da Lei 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 1 ano por cada um dos crimes praticados, e na pena única de 1 ano e 4 meses de prisão, suspensos na sua execução por igual período, na condição de pagar, no primeiro ano da suspensão da pena, a quantia de € 250,00 (a cada uma) à APAV, ao Chão dos Meninos, e à Assoc. Oncológica do Alentejo (AOA). b) Condenar a arguida MA, pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de quatro crimes de acesso ilegítimo agravado, previsto e punido no artigo 6.º, n.º1, n.º 4 al. a) e 5.º, al. a) da Lei 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 1 ano por cada um dos crimes praticados, e na pena única de 1 ano e 6 meses de prisão, suspensos na sua execução por igual período, na condição de pagar, no primeiro ano da suspensão da pena, a quantia de € 250,00 (a cada uma) à APAV, ao Chão dos Meninos, e à Assoc. Oncológica do Alentejo (AOA). c) Condenar a arguida MM, pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de três crimes de acesso ilegítimo agravado, previsto e punido no artigo 6.º, n.º1, n.º 4 al. a) e 5.º, al. a) da Lei 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 1 ano por cada um dos crimes praticados, e na pena única de 1 ano e 4 meses de prisão, suspensos na sua execução por igual período, na condição de pagar, no primeiro ano da suspensão da pena, a quantia de € 250,00 (a cada uma) à APAV, ao Chão dos Meninos, e à Assoc. Oncológica do Alentejo (AOA). d) Condenar a arguida S, pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de sete crimes de acesso ilegítimo agravado, previsto e punido no artigo 6.º, n.º1, n.º 4 al. a) e 5.º, al. a) da Lei 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 1 ano por cada um dos crimes praticados, e na pena única de 2 anos e 3 meses de prisão, suspensos na sua execução por igual período, na condição de pagar, no primeiro ano da suspensão da pena, a quantia de € 350,00 (a cada uma) à APAV, ao Chão dos Meninos, e à Assoc. Oncológica do Alentejo (AOA). e) Condenar a arguida MJ, pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de seis crimes de acesso ilegítimo agravado, previsto e punido no artigo 6.º, n.º1, n.º 4 al. a) e 5.º, al. a) da Lei 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 1 ano por cada um dos crimes praticados, e na pena única de 2 anos e 1 mês de prisão, suspensos na sua execução por igual período, na condição de pagar, no primeiro ano da suspensão da pena, a quantia de € 250,00 (a cada uma) à APAV, ao Chão dos Meninos, e à Assoc. Oncológica do Alentejo (AOA). f) Condenar a arguida V, pela prática, em autoria material e concurso efectivo, de dois crimes de acesso ilegítimo agravado, previsto e punido no artigo 6.º, n.º1, n.º 4 al. a) e 5.º, al. a) da Lei 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 1 ano por cada um dos crimes praticados, e na pena única de 1 ano e 1 mês de prisão, suspensos na sua execução por igual período, na condição de pagar, no primeiro ano da suspensão da pena, a quantia de € 300,00 (a cada uma) à APAV, ao Chão dos Meninos, e à Assoc. Oncológica do Alentejo (AOA). g) Findo o prazo de 1 ano, ficam as arguidas obrigadas a demonstrar documentalmente nos autos os pagamentos condicionantes da suspensão das respectivas penas. h) Julgar o pedido cível deduzido por MC parcialmente procedente e condenar as arguidas MA, ML e V a pagarem-lhe, cada uma, a quantia de € 600,00, a arguida MJ a pagar-lhe a quantia de € 675,00, e a arguida S a pagar-lhe a quantia de € 800,00, a título de danos não patrimoniais sofridos, todas as quantias acrescidas de juros vencidos desde a data da citação para o PIC, e vincendos, à taxa legal, até integral pagamento. a) Julgar o pedido cível deduzido por J parcialmente procedente e condenar as arguidas ML, MA, e S a pagarem-lhe, cada uma, a quantia de € 500,00, a título de danos não patrimoniais sofridos, todas as quantias acrescidas de juros vencidos desde a data da citação para o PIC, e vincendos, à taxa legal, até integral pagamento. b) Julgar improcedente o pedido cível deduzido pelos demandantes em representação dos filhos menores J e T. c) Absolver as arguidas do demais peticionado. d) Condenar as arguidas nas custas criminais que se fixam em 3 UC´s para cada uma. e) As custas cíveis são responsabilidade de arguidas e demandantes, se a elas houver lugar, e em função do decaimento, que se fixa em 30% para os demandantes e 70% para as arguidas, sendo os demandantes responsáveis integralmente pelo pedido cível efectuado em nome dos filhos menores que foi julgado improcedente. -11 Cf. sentença proferida nos autos –. B) No Douto Acórdão de 23 de Janeiro de 2024, o Tribunal da Relação de Évora promoveu a alteração do ponto 9. da matéria de facto dada como provada da Douta sentença recorrida, do qual passou a constar: “9. As arguidas utilizando as suas credenciais de acesso a tal registo acederam ao sistema informático contendo as informações clínicas de MC, JM, J e TM, sem que para tanto tivessem qualquer justificação de trabalho ou de serviço e sem para tal estarem autorizadas.” - 12 Negrito e sublinhados nossos -. C) E reenviar o processo para novo julgamento parcial por referência à matéria de facto constante dos pontos 11, 12, 13 e 14; D) Mais determinou que “em face do que venha a ser apurado e devendo ser extraídas as pertinentes consequências jurídicas da modificação da matéria de facto a que se procedeu, no respeitante ao ponto 9., deve o tribunal a quo proferir nova sentença, decidindo de direito, em conformidade.” E) Realizado o novo julgamento, entendeu a Mma. Juiz a quo manter, na sentença ora recorrida, inalterada a decisão de condenação das arguidas, desconsiderando a relevante modificação à matéria de facto provada fixada pelo Douto Acórdão de 23 de Janeiro de 2024; F) Do mesmo modo, não foram retiradas as pertinentes consequências jurídicas no que concerne ao pedido de indemnização civil apresentado pelos Demandantes. G) Assim, entende-se enfermar a sentença ora recorrida de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, erro notário na apreciação da prova (cf. artigo 410.º, n.º 2, als. a) e c), do C.P.P.) e erro de julgamento (cf. artigo 412.º, n.º 2, al. c), do C.P.P.); H) Com efeito, o Tribunal recorrido fundamentou a decisão em apreço na tese de que o crime em causa (crime agravado) se preenche “com a intenção de acesso e com o efectivo acesso à possibilidade de conhecer dados que não lhes estão legitimamente acessíveis. / E isto sob pena de se esvaziar o crime. / A etiologia do crime em causa é criminalizar o acesso a dados confidenciais ou a bases de dados de onde os mesmos constem, independentemente da sua consulta efectiva.”13 – Cf. sentença recorrida, pp.23. I) Entende-se que tal tese não pode merecer acolhimento. Na verdade, o crime de acesso ilegítimo (cf. artigo 6.º, n.º 1, da Lei do Cibercrime) pretende proteger a segurança e integridade dos sistemas informáticos, sendo este o bem jurídico concretamente visado pelo âmbito da norma; J) Tal decorre, de resto, do teor do Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 09/05/2023, e bem assim da Doutrina mais avisada, cf. Nunes, Duarte Rodrigues, in “Os crimes previstos na lei no cibercrime”, GestLegal, 2021. K) Assim, considerando meramente provado o acesso efectuado pelas Recorrentes ao sistema informático em discussão nos presentes autos e, simultaneamente, como não provado que tenham visto e/ou acedido (cf. pontos i) e ii) dos factos não provados) a “dados confidencias, protegidos por lei” (cf. artigo 6.º, n.º 5, da Lei do Cibercrime) correspondentes às informações clínicas dos ofendidos/Demandantes, sempre terá que se concluir que as arguidas apenas podem ser condenadas pelo crime de acesso ilegítimo, na sua forma simples (cf. artigo 6.º, n.º 1, da Lei do Cibercrime). L) Na verdade, a ter acolhimento a tese defendida pela Mma. Juiz a quo, resultaria esvaziado o crime de acesso ilegítimo na sua forma simples, pois, sempre que se provasse o acesso, independentemente de se provar ou não o tipo de informação acedida ou sequer se de alguma informação foi efectivamente tomado conhecimento, estar-se-ia sempre perante o cometimento do referido crime na sua forma agravada. M) O que não pode merecer acolhimento, atentando no teor e literalidade dos n.ºs 1 e 5 do artigo 6.º da Lei do Cibercrime. N) Ora, considerando que as Recorrentes só poderão ser condenadas pelo crime de acesso ilegítimo na sua forma simples, há que retirar as respectivas consequências no que respeita à moldura penal aplicável e, bem assim, à pena efectivamente a aplicar, que terá de ser determinada considerando os limites previstos no artigo 6.º, n.º 1, da Lei do Cibercrime. O) E bem assim, atento o disposto no artigo 70.º do Código Penal, sempre terá de se optar pela aplicação às arguidas de uma pena não privativa da liberdade, atento o preenchimento dos respectivos pressupostos legais. P) Relativamente ao Pedido de Indemnização Civil (doravante PIC), deduzido pelos Demandantes, atendendo às alterações promovidas pelo Douto Acórdão, e acima referidas, cumprirá esclarecer: Q) Os Demandantes invocam no respectivo PIC: “22. Os demandantes MC e JM, quando tiveram conhecimento dos factos em 14/11/2017, sentiram-se humilhados, revoltados, com a sua intimidade exposta, desrespeitados, tristes, e envergonhados pela exposição a terceiros das suas condições de saúde mormente das da filha T.”14 Cf. sentença de 30.04.2024, p. 6. Negrito e sublinhados nossos. R) Contudo, considerou-se, e bem, não provado: “i) Que as arguidas tenham visto a informação clínica./Por referência a 16, que acederam às informações clínicas.” – 15 Cf. sentença de 30.04.2024, p. 7. S) Acresce que, dos factos provados passou a constar: “9. As arguidas utilizando as suas credenciais de acesso a tal registo acederam ao sistema informático contendo as informações clínicas de MC, JM, J e T, sem que para tanto tivessem qualquer justificação de trabalho ou de serviço e sem para tal estarem autorizadas.” – 15 Cf. sentença de 30.04.2024, p. 4. T) Na verdade, toda a fundamentação constante dos PIC deduzidos pelos Demandantes, encontra respaldo na circunstância de as Recorrentes terem tomado conhecimento das informações clínicas àqueles relativas. Ora, tendo tal resultado não provado, fica por preencher o nexo de causalidade entre facto e dano, pressuposto da responsabilidade civil (cf. artigo 483.º, n.º 1, do Código Civil). U) Note-se, ainda, que sendo o bem jurídico protegido pela norma o próprio sistema informático, e respectiva segurança, a violação desse bem (nos termos provados nos autos), não pode fundamentar os danos invocados pelos Demandantes, que não promoveram prova susceptível de demonstrar a verificação de qualquer nexo de causalidade entre os factos efectivamente provados e os danos invocados. V) Pelo que devem as Recorrentes ser absolvidas de todos os PIC deduzidos. W) No âmbito do presente recurso releva, ainda, a apreciação que vier a ser feita do recurso interposto em 13.05.2024, por referência ao despacho (Ref. Citius 33979108) proferido pela Mma. Juiz a quo. X) No aludido recurso discute-se a (ir)regularidade do meio de obtenção de prova de que o Tribunal a quo lançou mão, a fim de promover a demonstração dos factos constantes dos pontos 11, 12, 13 e 14 da matéria de facto provada da (1ª) sentença recorrida: Ponto 11 – acesso de 14.05.2015, pelas 13h 31m 52s, realizado pela Arguida MA; – acesso de 22.12.2016, pelas 10h 16m 21s, realizado pela Arguida MA; Ponto 12 – acesso de 21.05.2015, pelas 16h 36m 45s, realizado pela Arguida ML; Ponto 13 – acesso de 12.11.2015, pelas 12h 51m 10s, realizado pela Arguida S; – acesso de 12.11.2015, pelas 12h 52m 52s, realizado pela Arguida S; Ponto 14 – acesso de 16.02.2017, pelas 14h 45m 51s, realizado pela Arguida MJ. Y) Ora, da procedência do referido recurso (de 13.05.2024), decorrerá a absolvição das Recorrentes no que concerne a estes factos; Z) Com as necessárias consequências ao nível das medidas concretas das penas a aplicar às Recorrentes, o que não poderá deixar de ser atendido no Douto Acórdão a proferir; AA) Donde decorre manterem as Recorrentes interesse na apreciação do recurso interposto a 13.05.2024 (cf. artigo 412.º, n.º 5 do C.P.P.). Nestes termos e nos melhores de Direito que Vossas Excelências Doutamente suprirão, considerando todo o supra exposto, devem as presentes motivações ser recebidas, consideradas procedentes e em consequência ser a Douta sentença ora recorrida substituída por Douto Acórdão que, com fundamento no erro notório na apreciação da prova, na insuficiência da prova para a decisão proferida e no evidente erro de julgamento, determine: a) A alteração/modificação da decisão condenatória, passando as Recorrentes a serem condenadas pelo crime de acesso ilegítimo, p.p. no artigo 6.º, n.º 1, da Lei do Cibercrime; b) Em consequência, serem as Recorrentes absolvidas no que concerne aos Pedidos de Indemnização Civil ainda em causa; c) Serem as Recorrentes absolvidas quanto à matéria de facto em crise constante dos pontos 11, 12, 13 e 14 da matéria de facto provada. Requerer-se, ainda, sejam supridas as eventuais deficiências e lacunas das presentes alegações e, ponderada a bondade do seu conteúdo e desiderato, seja aplicada a costumada Justiça!» 1.12. Os recursos foram regularmente admitidos. 1.13. O Ministério Público, na 1ª instância, respondeu aos recursos, formulando, a final, as seguintes conclusões: «1. Não alcançamos por que o Tribunal a quo não podia nem devia determinar, como determinou, tal produção de prova nos termos dos artigos 14.º n.º1 e 15.º n.º1 da Lei do Cibercrime. 2. Se os ofendidos se tivessem recusado, o Tribunal a quo sempre poderia determinar a apreensão dos referidos dados informáticos em plena harmonia com o estipulado no artigo 16.º, n.º 1 do mesmo diploma legal. 3. Nos termos do artigo 14.º, n.º 1 da Lei do Cibercrime, a competência para autorizar o recurso à injunção para apresentação ou concessão do acesso a dados é da autoridade judiciária, pelo que, conjugando essa norma com o artigo 1.º, alínea b) do Código de Processo Penal (que contém o conceito legal de “autoridade judiciária”), a competência para emitir tal ordem é do Magistrado do Ministério Público na fase de inquérito, do JIC na fase de instrução e do Juiz na fase de julgamento, sendo este último o caso em concreto. 4. A ordem deverá especificar se se pretende a comunicação dos dados ao processo ou a permissão do acesso aos dados. Ora, in casu, aos ofendidos foi comunicado que se pretendia o acesso aos dados em plena audiência de discussão e julgamento. 5. O recurso à injunção para apresentação ou concessão do acesso a dados revelou-se mais vantajoso de forma a evitar a restrição de direitos fundamentais mais intensa que, tendencialmente, ocorreria se, em lugar de recorrer-se à injunção, a autoridade judiciária tivesse lançado mão de uma pesquisa no sistema informático em causa, não olvidando que o Tribunal a quo tinha, ainda, ao seu dispor o mecanismo de apreensão, previsto no artigo 16.º da Lei do Cibercrime. 6. O despacho proferido pelo Tribunal a quo não enferma de qualquer vício, bem como reforça a legitimidade para a respectiva apreensão dos dados solicitados, caso os visados não tivessem prestado o seu consentimento. 7. Dúvidas inexistem de que as arguidas acederam aos dados dos utentes ofendidos, com recurso às respectivas password, ficando, isso sim, por esclarecer, o que as motivou. 8. A etiologia do crime em causa visa criminalizar o acesso a dados confidenciais ou a bases de dados de onde os mesmos constem, independentemente da sua consulta efectiva. 9. Sendo as acções humanas motivadas e finalistas, só por absurdo se poderia conceber que as arguidas acederam aos sistemas informáticos e nada viram do seu conteúdo. 10. Os acessos tiveram a finalidade alcançada e corresponderam a tomada de conhecimento de dados daqueles sistemas. 11. O acesso por profissionais de saúde a dados pessoais e a dados clínicos de utente do SNS por profissional de saúde tem de justificar-se por necessidade de prestação de assistência médica ou de enfermagem ao titular daqueles dados. 12. O uso não justificado por necessidade de prestação de assistência médica ou de enfermagem da palavra passe para aceder ao sistema informático que contém esses dados constitui, por si, violação das regras de segurança destinadas a preservar o sigilo e a confidencialidade dos mesmos. 13. Tratando-se de sistemas informáticos de acesso reservado ao titular dos dados e a profissional de saúde habilitado com palavra passe pessoal e confidencial, ou seja, que só deve ser utilizada pelo próprio e que o titular deve zelar por que não seja conhecida de terceira pessoa, tem de concluir-se que o acesso registado no sistema foi realizado pela pessoa que aí consta. 14. Os mencionados dados de facto, sem que exista outra hipótese factual plausível, permitem estabelecer presunção de facto de que as arguidas utilizaram as suas credenciais para acederem ao RSE dos ofendidos. 15. Não nos merece qualquer censura a condenação das arguidas pelo crime em apreço na sua forma agravada, bem como a sua condenação ao pagamento dos pedidos de indemnização civil peticionais. 16. Os factos dados como assentes na sentença recorrida e a fundamentação que os justifica formam um todo logicamente coerente e perceptível ao cidadão médio, não se detectando qualquer incongruência indiciadora de erro (muito menos notório) na apreciação da prova. 17. O que realmente resulta das conclusões do recurso é a divergência entre a convicção pessoal das condenadas sobre a prova produzida em audiência e aquela que o Tribunal a quo firmou sobre os factos, o que se prende com a apreciação da prova em conexão com o princípio da livre apreciação da mesma, explanado no artigo 127º do Código de Processo Penal. 18. Do raciocínio elaborado pelas recorrentes resulta que estas somaram os valores das indemnizações, ou seja, foram somadas as indemnizações que serão pagas individualmente. No fundo, cremos ter sido feito uma soma indevidamente. 19. Este raciocínio não prevalece, porquanto a proporção é por referência ao montante peticionado a cada uma das arguidas e por referência ao montante fixado a cada uma das arguidas em contraposição com o raciocínio das recorrentes que assume um único valor global de indemnizações. IV. Do pedido Nestes termos, e nos demais de Direito aplicável, que V. Ex.as doutamente suprirão, parece-nos apodíctico que o recurso interposto pelas condenadas deve improceder e, em consequência, manter-se a douta decisão proferida pelo Tribunal de primeira instância, no que farão a habitual Justiça.» 1.14. Subidos os autos a esta Relação, o Exm.º Procurador-Geral Adjunto, aderindo aos argumentos expendidos pelo Ministério Público junto da 1ª instância, na resposta aos recursos apresentada, emitiu parecer no sentido de os recursos não deverem obter provimento, com os seguintes aditamentos (transcrição): «Ao fixar a matéria de facto nos exatos termos em que o fez, o tribunal a quo valorou correta e criteriosamente, sem dúvidas, a prova produzida à luz das regras da lógica, da experiência comum e da normalidade da vida a que estava vinculado, sem extravasar os poderes/deveres que emergem dos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, sem violação, por conseguinte, dos princípios in dubio pro reo e da livre apreciação da prova ofensiva de qualquer preceito constitucional, sem violação das garantias de defesa de arguido. O tribunal valorou a prova em sentido diferente do entendimento das recorrentes, é certo. Porém, não é suficiente pretender o reexame da convicção alcançada pelo tribunal de primeira instância apenas por via de argumentos que apontem para a possibilidade de uma outra convicção, antes seria necessário demonstrar que as provas indicadas impõem uma diversa convicção, ou, dito de outro modo, é indispensável a demonstração de que a convicção obtida pelo tribunal recorrido é uma impossibilidade lógica por violação de regras de experiência comum, o que, manifestamente, as recorrentes não lograram fazer. Uma mera discordância subjetiva quanto a factualidade dada como provada, com base numa análise e valoração da prova diferente da efetuada pelo tribunal a quo e, daí partindo, chegar-se inexoravelmente a uma conclusão diferente, não basta para colocar em crise o fundadamente decidido como no caso. Não basta que se diga que determinado facto está mal julgado, sendo necessário constatar-se esse mal julgado face às provas que especifica e a que o julgador injustificadamente retirou credibilidade. Atente-se que o artº 412, nº3, al. b), do C.P.P. fala em provas que imponham decisão diversa. Por isso entendemos que a decisão recorrida só é de alterar quando for evidente que as provas não conduzam àquela, não devendo ser alterada quando, perante duas versões, o juiz optou por uma, fundamentando-a devida e racionalmente. A prova produzida em audiência é livremente valorável pelo tribunal, não tendo outra limitação, em sede de prova, que não seja a credibilidade que mereça. “(…) a censura quanto à forma de formação da convicção do Tribunal não pode consequentemente assentar de forma simplista no ataque da fase final da formação dessa convicção, isto é, na valoração da prova; tal censura terá de assentar na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente porque não existem os dados objectivos que se apontam na motivação ou porque se violaram os princípios para a aquisição desses dados objectivos ou porque não houve liberdade na formação da convicção. Doutra forma, seria uma inversão da posição dos personagens do processo, como seja a de substituir a convicção de quem tem de julgar, pela convicção dos que esperam a decisão” – cfr. Acórdão do T.C. nº198/2004, de 24/03/04, DR II Série, de 2/06/2004. E a certeza judicial não se confunde com a certeza absoluta, física ou matemática, sendo antes uma certeza prática, empírica, moral, histórica – crf. Climent Durán, La Prueba Penal, ed. Tirant Blanch, Barcelona, p. 615. Toda a decisão judicial constitui, precisamente, a superação não só da dúvida metódica, como da “dúvida razoável” sobre a matéria da acusação e da presunção de inocência do acusado. Daí a submissão a um rígido controlo formal e material do processo de formação da decisão e do conteúdo da sua motivação, a fim de assegurar os padrões inerentes ao Estado de Direito moderno. In casu o tribunal recorrido valorou de forma exaustiva, minuciosa e conjugada os meios de prova de acordo com a experiência comum e com critérios objetivos, sendo que, pela conferência do texto da decisão recorrida, não se vislumbra que o julgador tenha tido dúvidas sobre a verificação dos factos que considerou assentes. Ao invés, a motivação da decisão de facto é bem esclarecedora quer quanto aos meios de prova que sustentaram a convicção formada, quer quanto ao percurso lógico seguido na sua formação, nenhuma falha ou incorreção se detetando no exame crítico da prova. De facto, aí vêm explicados, de forma inteiramente congruente e plausível, os meios de prova a que conferiu credibilidade e as razões por que a conferiu, não se extraindo minimamente da fundamentação da decisão recorrida que o julgador tenha tido dúvidas sérias e razoáveis sobre a prova de qualquer dos factos que considerou assentes, os quais se encontram sem margem para dúvidas corretamente subsumidos no tipo legal de crime. No caso inexiste qualquer desconformidade insanável entre a prova produzida em julgamento, na qual o tribunal recorrido fundamentou a sua convicção e os factos que, com base em tal prova, veio a considerar provados, sendo certo que no juízo alcançado pelo tribunal não se vislumbra qualquer atropelo das regras da lógica, da ciência e da experiência comum, porque a fundamentação da sentença tem suporte na regra estabelecida no art.127º do C.P.P., de acordo com a qual o tribunal forma livremente a sua convicção, estando apenas vinculado às regras da experiência comum e aos princípios estruturantes do processo penal, nomeadamente ao princípio da legalidade da prova e ao princípio in dubio pro reo. Conclui-se, pois, que o tribunal a quo apreciou a prova de modo racional, objetivo e motivado, com respeito pelas regras da experiência comum, não competindo ao tribunal ad quem censurar a decisão recorrida com base na convicção pessoal das recorrentes sobre a prova produzida, sob pena de se postergar o princípio da livre apreciação da prova consagrado no art.127º do C.P.P.. Tudo ponderado, emitimos parecer no sentido de que os recursos não devem obter provimento.» 1.15. Foi cumprido o disposto no artigo 417º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, não tendo as recorrentes oferecido resposta. 1.16. Efetuado exame preliminar e colhidos os vistos, vieram os autos à conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.
2.2. Para que possamos apreciar as questões suscitadas nos recursos, importa ter presente o teor do despacho e da sentença recorridos, nos segmentos relevantes, que se passam a transcrever: * Tendo as arguidas invocado a irregularidade da obtenção do enunciado meio de prova (cf. artigo 123º do CPP), com fundamento no disposto nos artigos 14º, n.ºs 1 e 6, da Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro, aplicável ex vi do artigo 11º do mesmo diploma legal, o Tribunal a quo decidiu não julgar verificada a arguida irregularidade, conforme despacho do seguinte teor: «O Tribunal proferiu despacho a determinar a consulta a informações da base de dados onde constam os acessos em causa nos autos por parte dos ofendidos. Não só os dados foram voluntariamente juntos pelos mesmos aquando a apresentação da queixa, como os mesmos consentiram nesse mesmo acesso e junção dos dados aos autos conforme feito constar supra. Entendemos que os dados em concreto se encontram na disponibilidade dos ofendidos, seus titulares, desde logo porque, como é sabido, o crime de acesso ilegítimo protege a segurança dos sistemas informáticos e reflexamente a intimidade, a privacidade, e outros bens jurídicos que no caso não interessam. Estando em causa saber se as arguidas acederam ao sistema nos termos determinado pelo Tribunal da Relação de Évora, o Tribunal pode e deve determinar tal produção de prova nos termos dos artigos 14.º n.º 1 e 15.º n.º 1 da Lei 109/2009 de 15 de Setembro. Por outro lado, sempre se dirá, que sendo essencial a produção da requerida prova para a descoberta da verdade, e ainda que houvesse oposição dos ofendidos a tal, o Tribunal não está impedido de determinar a apreensão dos referidos dados informáticos nos termos do artigo jurº n.º 1 da citada lei. Entende-se, pois, que o despacho não padece da irregularidade invocada pelas arguidas ou qualquer outra. Notifique.»
* II. II Factos não provados: Não se provou que: i) Que as arguidas tenham visto a informação clínica. ii) Por referência a 16, que acederam às informações clínicas. iii) Que os menores T e J hajam sofrido danos não patrimoniais com os acessos efectuados pelas arguidas nos termos provados supra. Os demais factos constantes dos pedidos cíveis foram desconsiderados porque se mostram conclusivos, repetidos ou contendo apenas matéria de Direito. * III. Fundamentação da motivação da matéria de factoPara a formação da sua convicção, na indicação dos factos provados e não provados, o Tribunal analisou de forma livre, crítica e conjugada, a prova produzida em audiência de discussão e julgamento de acordo com o artigo 127º do Cód. Proc. Penal, respeitando o disposto no artigo 355º do mesmo Código e os critérios da experiência comum e da lógica. Deste modo, foram tidos em conta: • Assento de nascimento de fls. 12 e 16 (filhos/demandantes) • Registos de fls. 18 a 38 (comprovativos dos acessos) • Informação do SNS sobre data de inscrição do agregado na UCSP de (…………) a fls. 20 em 13/05/2015 (e fls. 154) • Fichas de identificação de fls. 52, 89 a 91 (inscrições esporádicas) • Informação da Administração Regional de Saúde do Alentejo, fls. 154 • Informação da Administração Central do Sistema de Saúde de fls. 224 (informações profissionais das arguidas) • Certificados de registo criminal • Informação junta em audiência de 11/04/2023 – impressões obtidas após consulta direta da plataforma SNS24 em julgamento, conforme actas que antecedem Sendo certo que as arguidas não prestaram declarações quanto aos factos, o que não as pode prejudicar, mas também não poderá beneficiar, Que as arguidas foram credíveis e não contraditadas quanto às condições pessoais (factos 25 a 47), Que não se provou em concreto que hajam visualizado as informações clínicas dos visados porque nenhuma prova foi produzida sobre esta matéria, Que apesar de se referir em 1 a 6 as funções exercidas no Centro de Saúde de (….), nos factos referentes às condições pessoais especifica-se qual o centro de saúde em causa, actualmente e desde as datas referidas, a Unidade de Saúde Familiar (…..), pertencente ao agrupamento de centros de saúde de (….). Que as testemunhas abonatórias foram desinteressadas, espontâneas e por isso fiáveis (facto 23), Que os factos provados de 19 a 21 foram acrescentados porque relevantes para contextualização dos factos e correcta apreciação do mérito da causa, Que 19 a 21 resultam dos documentos juntos e do depoimento da ofendida MC que igualmente nos pareceu sincera e confiável, Que 22 resulta das declarações dos ofendidos, corroborados pelas testemunhas AF, C e AC, todos coerentes entre si, verdadeiros e nada se demonstrou que lhes retirasse fiabilidade, Resta fazer uma apreciação genérica da prova produzida, denotando-se a alteração parcial do facto provado em 9 na senda do determinado pelo Tribunal da Relação de Évora. Ora, Resulta da conjugação de toda a prova produzida que à data dos factos existia um Registo Nacional de Utentes acessível aos funcionários administrativos (assim o disse a ofendida e L), de onde constam as informações básicas de identificação dos utentes do SNS, como sejam, nome, morada, número de telefone, número de identificação fiscal, número da Segurança Social e de utente, e respectivo agregado familiar, elementos recolhidos através da própria pessoa e do Cartão de Cidadão. Dos mesmos depoimentos resulta ainda que a base de dados do RNU não é acessível aos médicos nem aos enfermeiros. Ambos acedem, e acediam à data, ao SClínico médico, e ao SClínico enfermagem (uma mera evolução dos sistemas informáticos anteriores), através de passwords cedidas pelo ACeS (agrupamento de centros de saúde), que permite aceder a qualquer utente inscrito no Concelho de (….), conforme explicou a ofendida, a testemunha LC, e L (funcionário dos serviços de informação do ACeS do Alentejo Central). Resulta também que os médicos e enfermeiros acedem a tais sistemas aquando da prática de acto médico ou de enfermagem devidamente legitimado. E, naturalmente como resulta da lei, tais dados são confidenciais podendo tal confidencialidade ceder nos casos exclusivamente aí previstos, e não verificados nos autos. Os acessos pelas arguidas aos dados dos utentes ofendidos, resultam da consulta pelos próprios (MC e JM) através do portal do SNS, na Área do Cidadão, em Histórico de Acessos, como demonstram os documentos juntos aos autos, como os próprios confirmaram de forma descomprometida, e como o Tribunal parcialmente atestou aquando da audição do ofendido JM, que, em audiência, entrou no referido Portal e exemplificou como aceder a tais dados, conforme acta de julgamento de 21/11/2022. Tais acessos foram reforçados ainda pelas impressões juntas aos autos no dia 22/04/2024, que confirmam todos os acessos cujas datas, de alguma forma, podiam não estar totalmente claras na mera consulta dos documentos juntos com a denúncia (conforme acta e em obediência ao acórdão da Relação proferido nos autos). Aliás, veja-se que nos documentos ora juntos, por baixo de “Quem viu a minha informação”, consta: “Nesta secção poderá consultar informações relativas aos acessos efectuados, por profissionais de saúde, à sua informação clínica”. A razão pela qual as arguidas o fizeram é desconhecida para este Tribunal, embora não possa deixar de se referir que, de acordo com os ofendidos, nenhuma razão válida existia para o fazerem, isto é, não consentiram tais acessos. Como o fizeram as arguidas? Desde logo utilizando as passwords respectivas. Mas se as passwords apenas permitem aceder a fichas de utentes do Concelho de (….), e (….) pertence a concelho diverso, como acederam então às informações dos ofendidos? Embora a nosso ver tal matéria não seja essencial para a decisão da causa, porque verdadeiramente o que está em causa é o acesso e não a forma do mesmo, entendemos que o meio utilizado foi o seguinte: Explicou L que a mudança de centro de saúde não determina a total eliminação dos dados dos utentes do centro de saúde anterior. Na verdade, no centro de saúde antigo o utente permanece como “esporádico”, o que permite aceder aos elementos clínicos do mesmo, e isto assim é sem necessidade de inscrição do utente para efectiva consulta esporádica, como aconteceria, por exemplo, com um utente que, de férias, necessita de uma consulta num qualquer centro de saúde que não o seu. Ou seja, entendemos que perante isto ficou claro que as arguidas tinham acesso aos dados dos ofendidos porque a sua mudança em (…..) não eliminou informaticamente as fichas dos utentes. E evidentemente que não o fizeram por qualquer lapso ou erro o que se evidencia desde logo pelo número de acessos e as datas dos mesmos. Aliás, se alguma justificação existisse para o comportamento das arguidas a si caberia explicá-la, o que não fizeram. Como é sabido, A prova indirecta ou indiciária reporta-se a factos diversos do tema da prova, mas que permitem atestar essa mesma prova com o auxílio de regras da experiência comum. A eficácia probatória da prova indiciária está dependente da verificação de quatro requisitos, a saber: a prova dos indícios; concorrência de uma pluralidade de indícios; raciocínio dedutivo entre os indícios provados e os factos que deles se inferem, devendo existir um nexo preciso, directo, coerente, lógico e racional. Ora, inexistindo qualquer elemento que permita admitir que alguém obteve as credenciais das arguidas para aceder aos ditos sistemas sem que as mesmas disso tivessem conhecimento, o número de acessos, as datas e horas, a frequência com que foram feitos, induz sem dúvidas a autoria por parte das arguidas, e a experiência comum e as regras da lógica não permitem, pois, outra conclusão, que não a de que foram efectivamente as arguidas a praticar os factos. Entendemos, em conclusão, que as provas produzidas sustentam cabalmente os factos tal como provados, sendo que quanto aos factos não provados nenhuma prova foi produzida que os suporte. * IV. Fundamentação de DireitoEm função do circunstancialismo fáctico supra descrito, cumpre, por ora, fazer a subsunção jurídico-penal da conduta das arguidas. Desde logo algum enquadramento que nos parece pertinente, Conforme https://www.spms.min-saude.pt/2020/07/sclinico-cuidados-de-saude-primarios-csp/, O SClínico Cuidados de Saúde Primários (CSP) é um sistema de informação evolutivo, desenvolvido pela SPMS, que nasce da vasta experiência com duas anteriores aplicações usadas por milhares de médicos, enfermeiros e outros técnicos de saúde: o SAM (Sistema de Apoio ao Médico) e o SAPE (Sistema de Apoio à Prática de Enfermagem). Tem crescido para ser uma aplicação única, comum a todos os prestadores de cuidados de saúde e centrada no doente. Esta ferramenta é adotada por mais de 300 instituições, sendo utilizado por mais de 13 000 profissionais. O SClínico insere-se na estratégia definida pelo Ministério da Saúde para a área de informatização clínica do SNS, que prevê a uniformização dos procedimentos dos registos clínicos, de forma a garantir a normalização da informação. O acesso à informação clínica variada do utente, a utilização e partilha dos dados com profissionais de saúde de diversas áreas e a sistematização dos mesmos, permitirá homogeneizar as práticas e a informação recolhida a nível nacional, tornando a atuação dos profissionais de saúde mais eficaz e eficiente, fazendo com que desempenhem melhor o seu papel na equipa multidisciplinar, possibilitando, desta forma, um melhor apoio, assistência e acompanhamento ao utente. Conforme informação disponibilizada em 24 de Outubro de 2013, em http://www.spms.min-saude.pt/2013/10/hospitais-do-norte-e-centro-sao-os-primeiros-a-usar-o-sclinico/, O SClínico já foi instalado e está em pleno funcionamento, desde de 21 de outubro, no Centro Hospitalar de São João do Porto e, desde do dia 22, no Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho. Ainda esta semana fica a funcionar em Aveiro e em Famalicão. O SClínico é um software evolutivo, desenvolvido pela SPMS, que une o SAM (Sistema de Apoio ao Médico) e o SAPE (Sistema de Apoio à Prática de Enfermagem), de forma a existir uma aplicação única comum a todos os prestadores de cuidados de saúde. A aplicação mantém as funções dos “velhos” softwares, organizadas dentro de um novo layout gráfico que facilita a usabilidade da aplicação. O SClínico apresenta uma série de novidades, que passam pela alteração gráfica e redimensionamento do layout, e integração novas áreas de registo de dados, como as Notas de Alta Médicas/Enfermagem gerais e unidade de Medicina Intensiva e a Notícia de Nascimento (com integração à PDS para atualização do eBoletim). Esta nova aplicação tem ainda integrações com a PEM (Prescrição Eletrónica Médica), SI-Vida (Sistema de Informação para a Infeção VIH/sida) e PCDR (Prescrição de Cuidados Respiratórios Domiciliários). Na sessão de apresentação do software, realizada a 25 de setembro, no auditório do Hospital Pediátrico de Coimbra (CHUC), o Presidente do Conselho de Administração da SPMS, Prof. Henrique Martins, sublinhou o facto de os sistemas de informação da saúde estarem “ em tempo de mudança” e o SClínico é um exemplo do que se pretende para o futuro – integração dos sistemas, novas funcionalidades que garantam maior qualidade da informação e melhor usabilidade das aplicações. Por outro lado, O Despacho n.º 1774-A/2017, de 24 de fevereiro, disponível em https://dre.pt/dre/detalhe/despacho/1774-a-2017-106531278, que define regras de organização e mecanismos de gestão referentes ao Registo Nacional de Utentes (RNU), bem como estabelece os critérios e os procedimentos de organização e atualização das listas de utentes nos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACeS) e nas suas unidades funcionais, refere, em preâmbulo, O XXI Governo Constitucional estabeleceu como prioridade a defesa do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e, nesse âmbito, identificou a necessidade de concretizar a centralidade da rede de cuidados de saúde primários na política de saúde do país, expandindo e melhorando a sua capacidade de resposta, e assegurando a atribuição de médicos de família e de equipa de saúde familiar a todos os portugueses. O Registo Nacional de Utentes (RNU) foi criado com o objetivo de constituir uma base de dados nacional da inscrição dos utentes do SNS, a qual integra para além dos dados de identificação, a caracterização da inscrição dos utentes nos cuidados de saúde primários, a afetação a um médico de família e equipa de saúde familiar, privilegiando a inscrição do agregado familiar, respeitando-se a padronização legalmente prevista, entre outras. Considera-se assim premente que sejam adotados os procedimentos necessários à atualização e manutenção desta base de dados nacional dos utentes do SNS, assegurando a identificação única dos utentes, e que sejam disponibilizados mecanismos de articulação aos diversos sistemas de informação da saúde que necessitam dessa informação para o cumprimento da legislação sobre direitos e benefícios no SNS, respeitando os exatos termos das autorizações da Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD). Atenta a complexidade e as interdependências existentes no sistema, quer no que se refere ao processo de recolha e registo de dados, quer nos processos de comunicação e interconexão, devem ser envidados os esforços necessários por parte das entidades envolvidas, tendentes à obtenção da melhoria da qualidade dos dados presentes no RNU. Nos termos do disposto no artigo 4.º da Lei n.º 5/2012, de 23 de janeiro, a constituição de ficheiros para as finalidades nele previstas, entre as quais se destaca o tratamento de dados destinado a organizar, uniformizar e manter atualizada a informação relativa à identificação nacional de utentes do SNS, compete à entidade responsável pelo tratamento dos dados de acordo com a autorização da CNPD que, no caso do RNU, é a Administração Central do Sistema de Saúde, I. P. (ACSS), que articulará com os Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, E. P. E. (SPMS), entidade que tem a seu cargo o desenvolvimento, manutenção e operação dos sistemas de informação do Ministério da Saúde. Por outro lado, o Despacho n.º 13795/2012, de 24 de outubro, que pretendia estabelecer os critérios e os procedimentos de organização das listas de utentes nos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACeS), não conseguiu uma atualização coerente da base de dados do RNU e, assim, uma gestão eficaz das listas de utentes, tendo resultado em alguns casos numa fragmentação de inscrição familiar, menorizando o papel da promoção da saúde e prevenção da doença. O Despacho n.º 4389/2015, de 13 de abril, veio posteriormente proceder à alteração do anterior normativo no sentido de garantir que não houvesse eliminação das listas ou perda do direito a médico de família para quem não frequentasse os serviços e ficasse incluído na referida classificação de «utente não frequentador», facto que não produziu os efeitos pretendidos. De revelo, mencionar ainda algumas notas sobre o Portal do SNS 24, Conforme https://www.sns24.gov.pt/guia/aceder-a-area-pessoal-do-portal-do-sns-24/#o-que-e-a-area-pessoal-do-portal-do-sns-24, A área pessoal do portal do SNS 24 reúne informação essencial de saúde de cada cidadão. Se é utente do Serviço Nacional de Saúde tem de aceder à área pessoal do portal do SNS 24 e realizar o seu registo. É construído por dados clínicos recolhidos eletronicamente, de forma individualizada, sendo produzidos por entidades que prestam cuidados de saúde ao cidadão dentro do Serviço Nacional de Saúde (SNS). São consultados mediante autorização do cidadão. A área pessoal do portal do SNS 24 é a forma de acesso do cidadão à sua informação de saúde dentro do SNS. Na área pessoal do portal do SNS 24 encontra várias áreas como: dados pessoais resumo de saúde plano individual de cuidados Sistema Integrado de Gestão de Acesso (SIGA) serviços (como a marcação de consultas para o médico de família, pedido de isenção de taxa moderadora, consulta do boletim de vacinas eletrónico e da prescrição eletrónica) benefícios SNS. Por fim, e mais actual, https://www.spms.min-saude.pt/2020/07/registo-de-saude-eletronico/, O Registo de Saúde Eletrónico (RSE) – visa reunir informação essencial de cada cidadão para a melhoria da prestação de cuidados de saúde; o RSE é construído por dados clínicos recolhidos eletronicamente para cada Cidadão e produzidos por entidades que prestam cuidados de saúde. Permite o registo e partilha de informação clínica entre o utente, profissionais de saúde e entidades prestadoras de serviços de Saúde, de acordo com os requisitos da Comissão Nacional de Proteção de Dados (Autorização n.º 940/2013). É constituído pela Área Pessoal do SNS 24, Área do Profissional e Área Institucional. RSE – Área Pessoal do SNS 24 Portal lançado em maio de 2012, destinado aos utentes com o objetivo de melhorar a qualidade dos serviços prestados. Na secção “A minha saúde”, o utente passa a ter um papel ativo na manutenção, promoção e melhoria do seu estado de saúde e, consequentemente, um atendimento mais eficaz e seguro. Desde o dia 20 de maio de 2019 que a autenticação é feita através de Chave Móvel Digital (CMD) ou Cartão do Cidadão. Serviços eletrónicos disponíveis: Registo de contactos de emergência Registo de informação sobre hábitos, medicação, alergias e doenças Registo das medições de peso, altura, glicémia, tensão arterial, colesterol, triglicéridos, saturação de oxigénio e de tempo de coagulação do sangue(INR) Carregamento de documentos de saúde, como análises clínicas, relatórios médicos e similares; Partilha dos dados de saúde com os profissionais de saúde do SNS (hospitais, urgências, cuidados de saúde primários), mediante autorização prévia do utente, e com a possibilidade de poder consultar o histórico de acessos a essa informação; Contacto direto com o seu centro de saúde (administrativo, enfermeiro ou médico) Marcação online de consultas médicas para os prestadores de Cuidados de Saúde Primários do SNS; Pedido de prescrição de medicação crónica prevista na lista de medicamentos autorizados pelo médico do prestador de cuidados de saúde primários do SNS; Associação do seu agregado familiar, possibilitando a realização de marcações de consulta médica e pedidos de prescrição de medicação crónica para os seus familiares; Consulta da situação da inscrição, a posição na lista e o tempo de espera previsível para cirurgia por parte dos utentes do SNS inscritos para cirurgia através da aplicação e SIGIC; Consulta do eBoletim de Saúde Infantil e Juvenil (marcações de consultas, reforço de vacinas ou a realização de exames clínicos, entre outros); Preenchimento e submissão de pedidos de isenção do pagamento das taxas moderadoras, bem como a consulta do estado do pedido e a reclamação sobre o resultado obtido; Consulta dos dados que constam do Resumo Clínico Único (RCU): alergias, medicação, diagnósticos, cirurgias e vacinação. Consulta do cronograma referente ao historial clínico. RSE – Área do Profissional Consiste numa plataforma centrada no utente que permite aos profissionais de saúde (médicos e enfermeiros) terem acesso à informação clínica do utente. Desde o seu lançamento, em junho de 2012, já conta com mais de 530 instituições, incluindo todos os CS e todos os hospitais do SNS. A informação que o utente disponibiliza na Área do Cidadão e que, posteriormente, autoriza a sua consulta, permite ao profissional de saúde obter alguns indicadores que o podem auxiliar a um melhor conhecimento, diagnóstico e tratamento do mesmo. Dito isto, E quanto ao crime imputado, É imputado às arguidas a prática do crime de acesso ilegítimo agravado, previsto e punido no artigo 6.º, n.º1, n.º 4 alínea a) e 5.º, alínea a) da Lei 109/2009 de 15 de Setembro. Uma nota para referir o seguinte, O artigo 6º da Lei 109/2009 de 15/09 foi alterado pela Lei n.º 79/2021, de 24/11. Contudo, considerando que as circunstâncias qualificativas atualmente previstas nas enunciadas alíneas, já o eram na versão originária do mesmo diploma legal (no n.º 3 e na alínea a) do n.º 4 do artigo 6º), sendo a mesma a moldura penal aplicável, é a esta versão da Lei 79/2021 que nos reportaremos, porque totalmente coincidente com a versão aplicável à data da prática dos factos. Assim, Nos termos do artigo 6º da Lei do CiberCrime, Lei 109/2009, de 15 de Setembro, 1 - Quem, sem permissão legal ou sem para tanto estar autorizado pelo proprietário, por outro titular do direito do sistema ou de parte dele, de qualquer modo aceder a um sistema informático, é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias. 2 - Na mesma pena incorre quem ilegitimamente produzir, vender, distribuir ou por qualquer outra forma disseminar ou introduzir num ou mais sistemas informáticos dispositivos, programas, um conjunto executável de instruções, um código ou outros dados informáticos destinados a produzir as ações não autorizadas descritas no número anterior. 3 - A pena é de prisão até 2 anos ou multa até 240 dias se as ações descritas no número anterior se destinarem ao acesso para obtenção de dados registados, incorporados ou respeitantes a cartão de pagamento ou a qualquer outro dispositivo, corpóreo ou incorpóreo, que permita o acesso a sistema ou meio de pagamento. 4 - A pena é de prisão até 3 anos ou multa se: a) O acesso for conseguido através de violação de regras de segurança; ou b) Através do acesso, o agente obtiver dados registados, incorporados ou respeitantes a cartão de pagamento ou a qualquer outro dispositivo, corpóreo ou incorpóreo, que permita o acesso a sistema ou meio de pagamento. 5 - A pena é de prisão de 1 a 5 anos quando: a) Através do acesso, o agente tiver tomado conhecimento de segredo comercial ou industrial ou de dados confidenciais, protegidos por lei; ou b) O benefício ou vantagem patrimonial obtidos forem de valor consideravelmente elevado. 6 - A tentativa é punível, salvo nos casos previstos nos n.os 2 e 3. 7 - Nos casos previstos nos n.os 1, 4 e 6 o procedimento penal depende de queixa. O acesso é ilegítimo quando o agente atua num quadro não justificado, visando somente conhecer dados ou informações que não lhe estavam acessíveis, por exemplo, por via das suas funções profissionais e sem prévia autorização do titular dos dados, agindo por motivos exclusivamente pessoais ou particulares. Tanto mais que no tipo em análise o consentimento ao acesso prestado pelo titular do sistema informático é, indubitavelmente, uma causa de exclusão da tipicidade do facto. Como diz Duarte Rodrigues Nunes, in “Os crimes previstos na Lei do Cibercrime”, GestLegal, 2021, que acompanhamos, “... entendemos que, estando aqui em causa essencialmente a necessidade de gerir, operar e controlar os sistemas informáticos de forma livre e tranquila, esta incriminação tutela a segurança dos sistemas informáticos, sem prejuízo de, reflexamente, acabar por proteger outros bens jurídicos como a intimidade/privacidade, o património, a concorrência, e a liberdade de comércio, ...”. No que concerne ao dolo, e como é sabido, A estrutura do dolo comporta um elemento intelectual e um elemento volitivo. O elemento intelectual consiste na representação pelo agente de todos os elementos que integram o facto ilícito – o tipo objetivo de ilícito – e na consciência de que esse facto é ilícito e a sua prática censurável. O elemento volitivo consiste na especial direção da vontade do agente na realização do facto ilícito, sendo em função da diversidade de atitude que nascem as diversas espécies de dolo a saber: o dolo direto – a intenção de realizar o facto – o dolo necessário – a previsão do facto como consequência necessária da conduta – e o dolo eventual – a conformação da realização do facto como consequência possível da conduta. Denote-se que o tipo subjectivo não exige qualquer intenção específica, como seja a prova de prejuízo ou a de obtenção de benefício ilegítimo; fica preenchido com o dolo genérico. Por outro lado, O Regulamento Geral de Protecção de Dados veio introduzir alterações significativas ao enquadramento legal da proteção de dados pessoais dentro da União Europeia (UE), estabelecendo regras relativas à proteção das pessoas singulares, no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados. Estas alterações devem influenciar o modo de tratamento dos dados de saúde pelas entidades prestadoras de cuidados de saúde, quer no âmbito da prestação de cuidados de saúde quer para efeitos de investigação. São considerados dados pessoais todos os dados que contêm informação que permite identificar ou tornar identificável (ou seja, que exista a possibilidade de vir a ser identificada) uma pessoa singular e titular dos dados (utente, cidadão, colaborador). Pode fazer parte deste conceito, o nome, um número de identificação, dados de localização, identificadores por via eletrónica, bem como um ou mais elementos específicos da identidade física, fisiológica, genética, mental, económica, cultural ou social dessa pessoa singular. Estão também abrangidos os dados genéticos e os dados biométricos. Resulta assim do RGPD - Regulamento UE 679/2016, de 27/04, no seu artigo 9º nº 1que, É proibido o tratamento de dados pessoais que revelem a origem racial ou étnica, as opiniões políticas, as convicções religiosas ou filosóficas, ou a filiação sindical, bem como o tratamento de dados genéticos, dados biométricos para identificar uma pessoa de forma inequívoca, dados relativos à saúde ou dados relativos à vida sexual ou orientação sexual de uma pessoa. No caso dos autos, impõe-se ainda a referência à Lei 12/2005, de 26 de Janeiro, relativa à Informação Genética Pessoal e à Informação de Saúde, que dispõe, nos seus artigos 2º, 3º e 5º, Para os efeitos desta lei, a informação de saúde abrange todo o tipo de informação directa ou indirectamente ligada à saúde, presente ou futura, de uma pessoa, quer se encontre com vida ou tenha falecido, e a sua história clínica e familiar. 1 - A informação de saúde, incluindo os dados clínicos registados, resultados de análises e outros exames subsidiários, intervenções e diagnósticos, é propriedade da pessoa, sendo as unidades do sistema de saúde os depositários da informação, a qual não pode ser utilizada para outros fins que não os da prestação de cuidados e a investigação em saúde e outros estabelecidos pela lei. 2 - O titular da informação de saúde tem o direito de, querendo, tomar conhecimento de todo o processo clínico que lhe diga respeito, salvo circunstâncias excepcionais devidamente justificadas e em que seja inequivocamente demonstrado que isso lhe possa ser prejudicial, ou de o fazer comunicar a quem seja por si indicado. 3 - O acesso à informação de saúde por parte do seu titular, ou de terceiros com o seu consentimento ou nos termos da lei, é exercido por intermédio de médico, com habilitação própria, se o titular da informação o solicitar. 4 - Na impossibilidade de apuramento da vontade do titular quanto ao acesso, o mesmo é sempre realizado com intermediação de médico. O processo clínico só pode ser consultado por médico incumbido da realização de prestações de saúde a favor da pessoa a que respeita ou, sob a supervisão daquele, por outro profissional de saúde obrigado a sigilo e na medida do estritamente necessário à realização das mesmas, sem prejuízo da investigação epidemiológica, clínica ou genética que possa ser feita sobre os mesmos, ressalvando-se o que fica definido no artigo 16.º Volvendo ao caso dos autos, Considerando os factos provados, e mesmo tendo em conta a data da prática dos mesmos pois as leis citadas já estavam em vigor nas datas referenciadas, entendemos que não existe qualquer causa de exclusão da ilicitude ou da culpa na conduta das arguidas pelo que devem ser condenadas pela prática do crime de que vêm acusadas. Na verdade, devem sê-lo mesmo que não haja ficado provado a que tipo de informações em concreto as arguidas acederam. O crime preenche-se com a intenção de acesso e com o efectivo acesso à possibilidade de conhecer dados que não lhes estão legitimamente acessíveis. E isto sob pena de se esvaziar o crime. A etiologia do crime em causa é criminalizar o acesso a dados confidenciais ou a bases de dados de onde os mesmos constem, independentemente da sua consulta efectiva. Ademais sejamos realistas, se as arguidas não tivessem conseguido aceder a nenhum tipo de informação, qual a razão para repetirem os acessos vezes sem conta? Acediam para nada ver? Como se diz no acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 09/05/2023, em que é relator o Exmo. Sr. Juiz Desembargador Nuno Garcia, “No crime de acesso ilegítimo protege-se a segurança do sistema informático no que diz respeito à sua “privacidade” e não intromissão no mesmo. Basta a intromissão, mesmo que nada mais ocorra, ou seja, é como se fosse “introdução em casa alheia”, aqui no sentido de introdução num sistema informático alheio. Pretende-se proteger o “domicílio” informático”, na feliz expressão utilizada no ac. da rel. de Coimbra de 15/10/2008, relatado pela Exmª Desembargadora Alice Santos (consultável em www.dgsi.pt).”. Ora, foi precisamente este “domicilio” que as arguidas violaram. E nesse “domicilio” constam exclusivamente dados pessoais e confidenciais. * Apesar de se imputar às arguidas o disposto no artigo 6º nº 4 alínea a) - O acesso for conseguido através de violação de regras de segurança – entendemos que tal não se verifica no caso concreto.Ou seja, não houve violação de regras de segurança tal como elas estão pensadas para esta disposição legal. No caso dos autos o sistema não foi “pirateado”, não existiu transformação, adulteração, nem forma fraudulenta de acesso ao sistema. As arguidas eram titulares de passwords que legitimamente lhes permitiam aceder aos sistemas informáticos em causa (o SClínico Médicos e o SClínico Enfermeiros). O que não podiam era aceder ao local onde constam informações confidenciais de doentes/utentes que não eram seus, informações que não lhes estavam acessíveis nem existia qualquer justificação para os ditos acessos, e muito menos consentimento dos seus titulares. Concluímos, pois, que não se encontra preenchida a agravação a que se refere o artigo 6º nº 4 alínea a). * Entendemos ainda que as arguidas devem ser condenadas por cada um dos acessos efectuados, correspondendo cada acesso a um crime.Na verdade, Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 30º, do Cód. Penal, “1- O número de crimes determina-se pelo número de tipos de crime efectivamente cometidos ou pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente. 2- Constitui um só crime continuado a realização plúrima do mesmo tipo de crime ou de vários tipos de crime que fundamentalmente protejam o mesmo bem jurídico, executada por forma essencialmente homogénea e no quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que diminua consideravelmente a culpa do agente.”. Sendo de afastar, nesta matéria, um critério puramente naturalístico para determinar o número de infracções cometido pelo agente, havendo que relevar o número de valorações que, no mundo criminal, correspondem a uma certa actividade e funcionando a culpa do agente como elemento limite da unidade da infracção, teremos tantos crimes quantos os juízos de censura, correspondendo a uma pluralidade de resoluções criminosas uma pluralidade de juízos de censura. É assim necessário determinar se numa determinada situação concreta existe uma pluralidade de resoluções criminosas ou se o agente age no desenvolvimento de uma única e mesma motivação, sendo essencial para tal determinação a conexão temporal que liga as várias condutas do agente. Ora, in casu, e analisando a factualidade apurada, A arguida ML, acedeu ao sistema de 3 pessoas diferentes em 3 momentos diferentes, uma vez em Maio de 2015, e duas vezes em Setembro de 2017 mas a utentes distintos, A arguida MA acedeu ao sistema em 4 momentos distintos, visando 3 pessoas distintas, ainda que tenha acedido ao SClinico de Maria por duas vezes, mas com um intervalo de mais de 1 ano, A arguida MM acedeu na mesma data ao registo de 3 pessoas distintas, A arguida S acedeu 7 vezes, em momentos situados entre 12/11/2015 e 30/06/2017, a fichas de 4 pessoas distintas e sem qualquer conexão temporal, A arguida MJ acedeu 6 vezes, entre Fevereiro e Julho de 2017, à ficha de 3 pessoas diferentes, e sem continuidade no tempo, E, a arguida V, acedeu 2 vezes, em 4 e 7 de Julho de 2017, à ficha da demandante MC. Ora, Tal significa que a resolução criminosa das arguidas é diferente de cada vez que actuaram, pois acederam em vários momentos no tempo, e a vários membros do agregado demandante, de forma absolutamente injustificada, e ainda que tenham actuado de forma essencialmente homogénea não resultou provado qualquer quadro de uma mesma situação exógena que diminua a sua culpa. Como se refere no acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 08/11/2017, em que é relator o Exmo. Sr. Juiz Desembargador Luís Teixeira, São requisitos do crime continuado descritos nos nºs 2 e 3 do artigo 30º, do Código Penal: a) A realização plúrima de violação típicas do mesmo bem jurídico, desde que este não proteja bens eminentemente pessoais. b) Execução essencialmente homogénea das sobreditas violações. c) No quadro da solicitação de uma mesma situação exterior que lhe diminua consideravelmente a culpa. d) Um elemento subjectivo que se há-de estender à inteira relação de continuação, abrangendo as hipóteses de um dolo conjunto (planeamento prévio pelo agente das diversas resoluções típicas) ou de um dolo continuado (o plano do agente de que repetiria a realização típica sempre que a ocasião se proporcionasse). O crime continuado distingue-se do concurso real de crimes apenas em razão dos elementos aglutinadores que a lei prevê: unidade do bem jurídico protegido, execução por forma essencialmente homogénea e diminuição considerável da culpa em razão de uma mesma situação exterior. É necessário ser rigoroso na aferição dos requisitos de que depende a figura do crime continuado, sob pena de se premiar e promoverem as carreiras criminosas longas. E no caso dos autos, ainda que se admita, como se disse supra, a realização plúrima de violações típicas do mesmo bem jurídico, e uma execução essencialmente homogénea das sobreditas violações, não há qualquer solicitação de uma mesma situação exterior que lhes diminua consideravelmente a culpa. Aliás, como as arguidas não prestaram declarações, ficou por esclarecer quais os motivos para os seus comportamentos. E não vislumbramos que solicitação exterior lhes possa diminuir, e diminuir consideravelmente, a culpa. Entendo, pois, que não estamos perante a figura do crime continuado, mas sim perante um concurso real. * V. Da determinação da medida concreta da penaAqui chegados, urge proceder à determinação da medida concreta da pena a aplicar ao arguido pela prática do crime que resultou provado. Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 40º do Cód. Penal, “A aplicação de penas e de medidas de segurança visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”. O Código Penal traça assim um sistema punitivo que arranca do princípio basilar de que as penas devem ser executadas com um sentido pedagógico e ressocializador. Na determinação da medida concreta da pena, haverá, pois, que ter em conta, nos termos dos artigos 71º e 72º do dito Código, para além das exigências de reprovação e de prevenção do crime, o grau de ilicitude, a intensidade do dolo, e os antecedentes criminais. A culpa e a prevenção são assim as referências norteadoras da determinação da medida da pena. O critério de determinação da respectiva medida – artigo 71º – valida-se no princípio de que o legislador se encontra limitado pela exigência do respeito pela dignidade da pessoa humana e de que toda a pena tem de ter como suporte axiológico normativo uma culpa concreta. Princípio que significa que não há pena sem culpa, e que a culpa decide sobre a medida da pena a aplicar a cada crime concreto, ou seja, a culpa é o pressuposto de validade e o limite da pena em relação a cada crime. Por seu turno, o conceito de prevenção significa protecção de bens jurídicos pela tutela das expectativas comunitárias na manutenção (e reforço) da validade da norma violada (cfr. Figueiredo Dias, “Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime”, pág. 227 e segs.). A culpa, pelo facto e pela personalidade nele reflectida, é pressuposto e limite da pena, cuja medida se determina em função das exigências de prevenção geral (protecção de bens jurídicos), e especial (reintegração do agente na sociedade). Assim, e atendendo agora ao preceituado no artigo 71º, diremos que a determinação da medida da pena deverá fazer-se em função da culpa do agente e das exigências de prevenção e atendendo a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de legal de crime, deponham a favor ou contra o agente. Por outro lado, determina o artigo 70º que “Se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.”. De acordo com o exposto, a determinação da medida da pena pressupõe a escolha da pena a aplicar e a escolha da pena concreta dentro da moldura penal abstracta aplicável ao caso. Na prossecução desta tarefa o juiz é auxiliado pelos critérios determinados no artigo 71º nº 2. Vejamos. O crime em causa, agravado, é punido com pena de prisão de 1 a 5 anos. Aceita-se que o concreto crime em análise apresenta pouca repercussão social, ainda que nos tempos que correm os cidadãos estejam, e bem, cada vez mais cientes dos direitos inerentes à protecção dos seus dados, o que lhes dá mais consciencialização e, por inerência, mais impacto terão as violações aos mesmos; O grau de ilicitude e a intensidade do dolo mostram-se elevados, não só pelo tempo em que os factos ocorreram, com menos relevância para as arguidas MM e V, mas acima de tudo porque as profissões de médicas e enfermeiras que exercem lhes confere um dever acrescido de zelar pela protecção dos dados dos utentes e naturalmente lhes demanda a não intromissão em dados de utentes que não acompanham profissionalmente e a que apenas tiveram acesso porque o sistema informático o permite mesmo que o(s) utente(s) tenha(m) alterado a unidade de saúde onde é(são) seguido(s); Na verdade, não existindo motivo válido para o acesso e não se descortinando qualquer motivo que não a futilidade e a leviandade das suas condutas, a intensidade do dolo revelada nas mesmas não pode ser minorada; Por outro lado, não assumiram os factos nem mostraram qualquer arrependimento ou interiorização do desvalor das suas condutas, ao invés, o seu comportamento revela um total desrespeito pela privacidade e intimidade dos demandantes; A seu favor apenas a integração familiar, profissional e social, e a ausência de antecedentes criminais. Ponderando todos os factores supra descritos, a culpa e as exigências de prevenção geral e acima de tudo especial, sem olvidar naturalmente o desvalor das condutas e a completa integração das arguidas, afigura-se-nos justa e adequada a opção de 1 ano de prisão por cada um dos crimes cometidos por cada uma das arguidas. Relativamente a ML, 1 ano por cada um dos 3 crimes, MA, 1 ano por cada um dos 4 crimes, MM, 1 ano por cada um dos 3 crimes, S, 1 ano por cada um dos 7 crimes praticados, MJ, 1 ano por cada um dos 6 crimes praticados, E V, 1 ano por cada um dos 2 crimes. * No que diz respeito ao cúmulo jurídico de penas,Em decorrência do disposto no artigo 77º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal, devem as arguidas ser condenadas numa pena única, a qual terá como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas. Ou seja, in casu tal pena única – em cuja medida deverão ser considerados, em conjunto, os factos, a culpa, os eventuais antecedentes criminais e a personalidade das arguidas já supra analisados – oscilará, Quanto a ML, entre 1 e 3 anos, optando-se por uma pena única que se fixa em 1 ano e 4 meses; Quanto a MA, entre 1 ano e 4 anos, optando-se por uma pena única que se fixa em 1 ano e 6 meses; Quanto a MM, entre 1 ano e 3 anos, optando-se por uma pena única de 1 ano e 4 meses; Relativamente a S, entre 1 ano e os 7 anos (ou melhor 5 anos), optando-se por uma pena que se fixa em 2 anos e 3 meses; Relativamente a MJ, entre 1 ano e os 6 anos (5 anos), fixando-se a pena em 2 anos e 1 mês; E, no que diz respeito a V, entre 1 ano e os 2 anos, optando-se por 1 ano e 1 mês de prisão. * Entendendo-se que não há razões que demandem a aplicação de pena privativa da liberdade,O artigo 58º do CP, dispõe que se ao agente dever ser aplicada pena de prisão não superior a 2 anos, o tribunal substitui-a por prestação de trabalho a favor da comunidade sempre que concluir que por este meio se realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. A cada dia de prisão corresponde uma hora de trabalho, num máximo de 480 horas. Por fim, nos termos do artigo 50º do Cód. Penal, a pena de prisão aplicada em medida não superior a 5 anos pode ser suspensa na sua execução, se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, o tribunal concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição. A suspensão pode ser acompanhada da imposição de deveres, regras de conduta, ou, em certos casos, de regime de prova. Ora, por tudo o exposto, entendemos que os interesses que o tipo incriminatório pretende proteger, e os fins que são alcançados com a punição deste crime, desaconselham, tanto do ponto de vista da prevenção geral como especial, a aplicação de uma “mera” substituição pela prestação de trabalho a favor da comunidade. Portanto, atendendo ao supra expandido e acreditando que a resposta perante este Tribunal constituirá já censura suficiente para as próprias arguidas (apesar do não arrependimento) e para a comunidade, decido suspender a execução de todas as penas de prisão ora aplicadas pelo exacto tempo da sua duração. Nestes termos, suspendo a execução das penas únicas de prisão aplicadas respectivamente pelos períodos de 1 ano e 4 meses, 1 ano e 6 meses, 1 ano e 4 meses, 2 anos e 3 meses, 2 anos e 1 mês, e 1 ano e 1 mês, nos termos do artigo 50º, nºs 1 e 5 do Cód. Penal. Julgando que a pena suspensa, sem mais, poderá ser entendida como uma “não pena”, acima de tudo, pela ausência de admissão dos factos pelas arguidas, permanecendo em si sentimentos de impunidade que urge afastar, decido sujeitar a suspensão à condição das arguidas entregarem valores a instituições de apoio social, reputando que desta forma as mesmas interiorizarão de vez o desvalor dos seus comportamentos. Assim, tendo em conta as condições económicas das arguidas e as concretas penas únicas a aplicar, nos termos do artigo 51º nº 1 alínea c), mais condeno as arguidas, Ao pagamento, Durante o primeiro ano do período da suspensão das respectivas penas, À Associação de Amigos da Criança e da Família Chão dos Meninos, sita na Av. (……………..). À Associação Oncológica do Alentejo, sita na Av. (…………), e, À Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, sita na (…………) Nos seguintes termos: A arguida ML, € 250,00 a cada uma das três instituições identificadas; A arguida MA, € 250,00 a cada uma das três instituições identificadas; A arguida MM, € 250,00 a cada uma das três instituições identificadas; A arguida S, € 350,00 a cada uma das três instituições identificadas; A arguida MJ, € 250,00 a cada uma das três instituições identificadas; A arguida V, € 300,00 a cada uma das três instituições identificadas. * VI. Dos pedidos de indemnizaçãoSocorremo-nos necessariamente do disposto no artigo 129.º do Código Penal, que determina que a indemnização por perdas e danos emergentes de um crime seja regulada pela lei civil, valendo neste domínio o princípio consignado no artigo 483º, do Código Civil, de harmonia com o qual, podemos isolar como pressupostos da responsabilidade civil subjectiva extracontratual ou aquiliana: (i) O facto, (ii) A ilicitude; (iii) O nexo de imputação subjectiva do facto ao lesante; (iv) O dano; e (v) o nexo de causalidade. O dano patrimonial traduz um prejuízo susceptível de expressão pecuniária que, tendo por objecto um interesse privado patrimonial, pode ser reparado ou indemnizado atendendo à diferença entre a situação real actual do lesado e a situação hipotética em que este estaria se não fosse o facto lesivo (artigo 562º do Cód. Civil), directamente (mediante a restauração natural ou reconstituição específica da situação anterior do lesado, que existiria se não fosse a lesão), ou indirectamente (por equivalente ou indemnização pecuniária, tendo em conta a diferença entre a situação patrimonial real do lesado, na data mais recente, e a situação hipotética que ele teria se não fosse a lesão - artigo 566º nºs 1 e 2, ou, se tal for impossível, por recurso à equidade - art. 566º nº 3 do CC). O dano não patrimonial é o dano insusceptível de avaliação pecuniária, reportado a valores de ordem espiritual, ideal ou moral. É o prejuízo que não atinge em si o património e que apenas pode ser compensado com a obrigação pecuniária. Sendo os danos não patrimoniais, pela sua específica natureza, insusceptíveis de medida certa e absoluta, o artigo 496.º, n.º 3, do CC manda fixar o quantitativo da indemnização que lhes corresponde segundo critérios de equidade, devendo atender-se, para tanto, às circunstâncias enunciadas no artigo 494.º, n.º 3, e, nomeadamente, ao grau de culpabilidade do responsável, às respetivas situações económicas de cada um, a sua proporcionalidade em relação à gravidade do dano, tomando ainda em conta todas as regras da justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida, e sem perder de vista a peculiaridade de que se reveste o caso concreto, por forma a que, a essa luz, sejam condignamente compensados. In casu, não resultaram demonstrados quaisquer danos patrimoniais, e não resultaram provados danos sofridos pelos filhos menores. Mas os danos não patrimoniais dos ofendidos MC e JM merecem tutela penal na medida em que as arguidas violaram as regras deontológicas, éticas e legais mais básicas nas respectivas profissões, como sejam o acesso, ainda que potencial, à confidencialidade dos dados clínicos e à intimidade das pessoas, e causaram danos aos ofendidos, que, como provado, se sentiram vexados, humilhados, tristes e revoltados por verem os seus dados acedidos por quem para tal não tinha legitimidade nem autorização. Considerando, Que aos dados de JM acederam as arguidas ML (1 vez), MA (1 vez), e S (1 vez), entendendo adequada e proporcional a fixação de € 500,00 a cada umas das arguidas, bastante para compensar os danos sofridos. Que aos dados de MC acederam as arguidas MA (2 vezes), MM (2 vezes), S (4 vezes), MJ (4 vezes), e V (2 vezes), reputo suficiente e justa a fixação de indemnização no montante de € 600,00 a pagar por cada uma das arguidas MA, MM e V, € 800,00 a pagar pela arguida S, e € 675,00 a pagar pela arguida MJ. * Por irem condenadas, é da responsabilidade das arguidas o pagamento das custas processuais criminais que se fixam em 3 UC´s por cada uma dela (cfr. artigos 513º e 514º do CPP).As custas cíveis são responsabilidade de arguidas e demandantes, se a elas houver lugar, e em função do decaimento, que se fixa em 30% para os demandantes e 70% para as arguidas, sendo os demandantes responsáveis integralmente pelo pedido cível efectuado em nome dos filhos menores que vai julgado improcedente. (...).» 2.3. Apreciação do mérito dos recursos 2.3.1. Recurso interlocutório Invocam as arguidas/recorrentes a irregularidade do meio de obtenção de prova produzido, qual seja, o ordenado acesso, a que se procedeu, na audiência de julgamento, ao portal do SNS 24, área pessoal, com vista a apurar as datas em que tiverem lugar os acessos imputados às arguidas/recorrentes e que o TRE determinou fossem apurados, no acórdão proferido nos autos, em 23/01/2024. Sustentam as recorrentes que o aludido acesso não podia ser ordenado e efetuado, nos termos em que foi, atento o disposto nos artigo 14º, n.ºs 1 e 6, da Lei n.º 109/2009, de 15 de setembro, aplicável ex vi do artigo 11º do mesmo diploma legal, sendo irrelevante o consentimento prestado pelos ofendidos, para tanto, por estar em causa o acesso a um sistema informático que contém dados também de terceiros e a sua consequente divulgação “a todo e qualquer interveniente processual, conforme sucedeu”, não pode estar na disponibilidade dos ofendidos. Donde, defendem as arguidas/recorrentes que o acesso levado a cabo na sessão da audiência de julgamento, realizada em 22.04.2024, consubstancia um acesso ilegítimo. O Ministério Público pronuncia-se no sentido de não assistir razão às recorrentes, defendendo que, uma vez prestado o consentimento, pelos titulares dos dados informáticos para o acesso aos mesmos, fica afastada qualquer ilicitude do procedimento de obtenção dessas informações. Apreciando: Entendemos não se verificar qualquer irregularidade ou nulidade na obtenção do meio de prova de que se trata. Dito de outro modo, consideramos que se mostra legal e legitimamente obtida a prova documental em causa e que se mostra junta aos autos, a fls. 728 a 732. Explicitando: Desde logo, importa referir que sufragamos o entendimento de que o bem jurídico protegido pelo crime de acesso ilegítimo é, em primeira linha a segurança dos sistemas informáticos. Mas a tutela repercute-se ainda na confiança que o cidadão tem nos sistemas informáticos, nomeadamente na privacidade, segurança e fiabilidade dos mesmos[1]. Contrariamente ao que defendem as arguidas/recorrentes o acesso aos dados constantes do Portal do SNS 24, área pessoal, do utente, à qual este pode livremente aceder, através das respetivas credenciais, respeitam a dados pessoais, dos quais é titular o utente, podendo este aceder e a tais dados e dar o seu consentimento para que sejam acedidos e visualizados por terceiros. Tal decorre inequivocamente do disposto no artigo 3º da Lei n.º 12/2005, de 26 de janeiro[2], que, no seu artigo 3º, sob a epígrafe “Propriedade da informação de saúde”, dispõe: «1 - A informação de saúde, incluindo os dados clínicos registados, resultados de análises e outros exames subsidiários, intervenções e diagnósticos, é propriedade da pessoa, sendo as unidades do sistema de saúde os depositários da informação, a qual não pode ser utilizada para outros fins que não os da prestação de cuidados e a investigação em saúde e outros estabelecidos pela lei. 2 - O titular da informação de saúde tem o direito de, querendo, tomar conhecimento de todo o processo clínico que lhe diga respeito, salvo circunstâncias excepcionais devidamente justificadas e em que seja inequivocamente demonstrado que isso lhe possa ser prejudicial, ou de o fazer comunicar a quem seja por si indicado. 3 - O acesso à informação de saúde por parte do seu titular, ou de terceiros com o seu consentimento ou nos termos da lei, é exercido por intermédio de médico, com habilitação própria, se o titular da informação o solicitar. 4 - Na impossibilidade de apuramento da vontade do titular quanto ao acesso, o mesmo é sempre realizado com intermediação de médico.» No aludido Portal do SNS 24, na área pessoal do utente, constam informações/dados pessoais que são acessíveis ao utente, podendo esses dados ser consultados por terceiros, mediante autorização/consentimento do utente a que respeitam. Ora, o acesso efetuado na audiência de julgamento ao Portal do SNS 24, área pessoal do utente, e especificamente, à área “Quem viu a minha informação”, teve lugar com o consentimento expresso dos utentes a que respeita, ou seja, os ofendidos JM e MC, através das credenciais pelos mesmos facultadas. Por outro lado, importa esclarecer que contrariamente ao que alegam as recorrentes e como não podem deixar de saber, no portal do SNS 24, na área pessoal do utente, não se conseguem visualizar as específicas notas e informações clínicas introduzidas pelos profissionais de saúde (médicos e enfermeiros), as quais são por estes feitas na plataforma do Registo de Saúde eletrónico (RSE), área profissional, cujo acesso é efetuado, através do SClínico, disponível nas unidades de saúde do setores público e privado. Apenas quanto a estes dados clínicos se poderia colocar a questão do sigilo profissional e só relativamente a alguns deles, mais concretamente, à informação de saúde do respetivo titular, se exigindo, que o respetivo acesso, por parte deste ou de terceiros com o seu consentimento ou nos termos da lei, seja exercido por intermédio de médico (cf. artigo 3º, n.º 3, da Lei n.º 12/2005, de 26 de janeiro). Neste âmbito estatui o artigo 6º da Lei n.º 12/2005, sob e epígrafe “Informação médica”: «1 - Para os efeitos desta lei, a informação médica é a informação de saúde destinada a ser utilizada em prestações de cuidados ou tratamentos de saúde. 2 - Entende-se por «processo clínico» qualquer registo, informatizado ou não, que contenha informação de saúde sobre doentes ou seus familiares. 3 - Cada processo clínico deve conter toda a informação médica disponível que diga respeito à pessoa, ressalvada a restrição imposta pelo artigo seguinte. 4 - A informação médica é inscrita no processo clínico pelo médico que tenha assistido a pessoa ou, sob a supervisão daquele, informatizada por outro profissional igualmente sujeito ao dever de sigilo, no âmbito das competências específicas de cada profissão e dentro do respeito pelas respectivas normas deontológicas. 5 - O processo clínico só pode ser consultado por médico incumbido da realização de prestações de saúde a favor da pessoa a que respeita ou, sob a supervisão daquele, por outro profissional de saúde obrigado a sigilo e na medida do estritamente necessário à realização das mesmas, sem prejuízo da investigação epidemiológica, clínica ou genética que possa ser feita sobre os mesmos, ressalvando-se o que fica definido no artigo 16.º» Sucede que, in casu, os dados cujo acesso foi determinado e efetuado na audiência de julgamento, aconteceu com o consentimento expresso, livre e esclarecido e, por isso válido e eficaz, dos respetivos titulares, não são dados clínicos, nem contêm qualquer informação de saúde, a qual é definida no artigo 2º da enunciada Lei n.º 12/2005, como abrangendo todo o tipo de informação directa ou indirectamente ligada à saúde, presente ou futura, de uma pessoa, quer se encontre com vida ou tenha falecido, e a sua história clínica e familiar. Em suma, o acesso efetuado, ao Portal do SNS 24 e através do qual foram obtidos os documentos juntos aos autos, onde constam os acessos ocorridos nas datas neles referenciadas, foi à área pessoal dos utentes, ora ofendidos, JM e MC, podendo estes aceder livremente a essa área e aos dados dela constantes e, nessa medida, podendo autorizar/dar o seu consentimento a que terceiros, consultem tais dados/informações, como aconteceu, na audiência de julgamento, tudo conforme ficou a constar da respetiva ata. Não havia, pois, qualquer fundamento para que fosse, pelo Tribunal a quo, determinada a injunção à entidade responsável pelo tratamento dos dados em apreço, para a sua apresentação ou concessão de acesso aos mesmos, nos termos previstos no artigo 14º, n.ºs 1 e 6, da Lei do Cibercrime. Termos em que, não se existe qualquer irregularidade ou nulidade na obtenção do meio de prova de que se trata, a qual se mostra válida. Improcede, assim, o recurso interlocutório
2.3.2.2. Da escolha e medida da pena Procedendo ao cúmulo jurídico de penas e à determinação da medida concreta da pena única, considerando a moldura penal abstrata correspondente ao concurso de crimes, que é, no referente: No referente à taxa diária da multa, a fixar entre €5,00 e €500,00 (cf. artigo 47º, n.º 2, do CP), atendendo à situação económica de cada uma das arguidas – sendo as arguidas ML, MA, MM e MJ, enfermeiras e as arguidas S e V médicas, auferindo o salário líquido, as arguidas ML e MM, de €1.500,00, a arguida MA de €1 400,00, a arguida MJ de €1 600,00, a arguida S de €3 000,00 e a arguida V de €2 800,00 – e aos encargos que respetivamente suportam dados como provados, conjuntamente com o respetivo marido ou companheiro, não tendo a arguida S encargos com amortização de empréstimos ou renda de casa, decide-se fixar em €20.00 (vinte euros), a taxa diária da multa a aplicar às arguidas ML, MA, MM e MJ e em €40,00 (quarenta euros), a aplicar às arguidas S e V, perfazendo a multa global, em que as arguidas/recorrentes são condenadas, de: 2.3.2.3. No referente aos pedidos de indemnização civil, para além de não ser recorrível esse segmento da decisão, atento o valor do montante indemnizatório a cujo pagamento aos demandantes MC e JM, cada uma das arguidas/demandadas/recorrentes foi condenada (cf. artigo 400º, n.º 2, do CPP), a absolvição das arguidas/demandadas agora decidida, relativamente ao crime de acesso ilegítimo, na forma agravada e a não prova de que as arguidas/demandadas tivessem consultado e tomado conhecimento das informações de saúde dos demandantes, não tem como consequência, de modo algum, que fique sem sustentação os pedidos de indemnização cíveis formulados pelos demandantes MC e JM. * O recurso conjuntamente interposto pelas arguidas é, pois, parcialmente procedente.3. DECISÃO Nestes termos, em face do exposto, acordam os Juízes que compõem esta Secção Criminal (2ª Subsecção) deste Tribunal da Relação de Évora em: 1. Negar provimento ao recurso conjuntamente interposto pelas arguidas ML; MA; MM; S; MJ e V do despacho interlocutório proferido em11/04/2024, sob a Ref. Citius 33979188 e, em consequência, confirmar o despacho recorrido; 2. Conceder parcial provimento ao recurso conjuntamente interposto pelas arguidas ML; MA; MM; S; MJ e V e, em consequência A) Absolver as identificadas arguidas/recorrentes da prática dos crimes de acesso ilegítimo agravado, nos termos do disposto na al. a), do n.º 5 do artigo 6º da Lei 109/2009 de 15 de setembro (Lei do Cibercrime), por que foram condenadas na 1.ª instância, B) Condenar as identificadas arguidas/recorrentes pela prática, em concurso efetivo: a) A arguida ML, de 3 (três) crimes de acesso ilegítimo, p. e p. pelo artigo 6º, n.º 1, da Lei n.º 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, por cada um desses crimes; b) A arguida MA, de 4 (quatro) crimes de acesso ilegítimo, p. e p. pelo artigo 6º, n.º 1, da Lei n.º 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, por cada um desses crimes; c) A arguida MM, de 3 (três) crimes de acesso ilegítimo, p. e p. pelo artigo 6º, n.º 1, da Lei n.º 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, por cada um desses crimes; d) A arguida S, de 7 (sete) crimes de acesso ilegítimo, p. e p. pelo artigo 6º, n.º 1, da Lei n.º 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, por cada um desses crimes; e) A arguida MJ, de 6 (seis) crimes de acesso ilegítimo, p. e p. pelo artigo 6º, n.º 1, da Lei n.º 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, por cada um desses crimes; f) A arguida V, de 2 (dois) crimes, de acesso ilegítimo, p. e p. pelo artigo 6º, n.º 1, da Lei n.º 109/2009 de 15 de Setembro, na pena de 80 (oitenta) dias de multa, por cada um desses crimes. C) Em cúmulo jurídico, condenar as arguidas nas seguintes penas únicas: a) A arguida ML, na pena única de 160 (cento e sessenta) dias de multa, á taxa diária de €20,00 (vinte euros), perfazendo a multa global de €3 200,00 (três mil e duzentos euros); b) A arguida MA, na pena única de 200 (duzentos) dias de multa, á taxa diária de €20,00 (vinte euros), perfazendo a multa global de €4 000,00 (quatro mil euros); c) A arguida MM, na pena única de 160 (cento e sessenta) dias de multa, à taxa diária de €20,00 (vinte euros), perfazendo a multa global de €3 200,00 (três mil e duzentos euros); d) A arguida S, na pena única de 320 (trezentos e vinte) dias de multa, à taxa diária de €40,00 (quarenta euros), perfazendo a multa global de €12 800,00 (doze mil e oitocentos euros); e) A arguida MJ, na pena única de 280 (duzentos e oitenta) dias de multa, à taxa diária de €20,00 (vinte euros), perfazendo a multa global de €5 600,00 (cinco mil e seiscentos euros); e f) A arguida V, na pena única de 120 (cento e vinte) dias de multa, à taxa diária de €40,00 (quarenta euros), perfazendo a multa global de €4 800,00 (quatro mil e oitocentos euros). D) No mais, confirmar a sentença recorrida. Custas do recurso interlocutório a cargo das arguidas/recorrentes, fixando-se a taxa de justiça devida por cada uma delas em 4 (quatro) UC (cf. artigos 513º, n.ºs 1 e 3 do CPP e 8º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III, anexa). Sem tributação, o recurso interposto da sentença, dada a sua procedência parcial. |