Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | PIRES ROBALO | ||
Descritores: | MARQUISES LINHA ARQUITECTÓNICA PREJUÍZO ESTÉTICO ABUSO DE DIREITO | ||
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Data do Acordão: | 09/18/2008 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A SENTENÇA | ||
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Sumário: | I - As obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício podem ser realizadas se para tanto se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio. II – A construção duma marquise constitui sempre uma modificação da linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício, pelo que a sua realização depende da autorização prevista no art.º 1422 n.º 3 do CC, tomada em assembleia de condóminos. III – O condómino que exige, apenas dos RR., e não aos demais condóminos que possuem no imóvel construções idênticas à sua e realizadas também sem qualquer autorização da assembleia de condóminos, está a agir em abuso de direito, ou seja, excedendo manifestamente os limites impostos pela boa-fé, na modalidade de “venire contra factum proprium”, o que obstaculiza o exercício do seu direito. | ||
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Decisão Texto Integral: | Proc. n.º 895/08-2 Acordam nesta secção cível os Juízes do Tribunal da Relação de Évora. 1. Relatório 1.1. Rui .................. ......... ......... e Ana ................, residentes no Sítio................ S. Brás de Alportel, intentaram a presente acção declarativa sob a forma de processo sumário, contra João José ............e Maria .................., residentes ..............., em S. Brás de Alportel, pedindo a condenação dos Réus a removerem a marquise identificada na petição inicial, e a pagarem-lhes uma indemnização no valor de 1.000 euros. Alegam para tal, e em síntese, o seguinte: Na cozinha da fracção autónoma dos Autores existe uma janela que dá para o terraço da fracção autónoma dos Réus. Sucede que os Réus fecharam com uma marquise o aludido terraço. Assim, deixou de haver circulação de ar na cozinha dos Autores, sendo que essa circulação fazia-se apenas pela dita janela. Em resultado do descrito os Autores evitam deslocar-se à sua fracção autónoma, receando pelas consequências da falta de circulação de ar, nomeadamente da acumulação de gás. E quando lá se deslocam têm de manter abertas as janelas da fracção autónoma com prejuízo para a sua privacidade. Concluem dizendo que a marquise foi construída sem a aprovação da maioria dos condóminos e sem licenciamento municipal. * 1.2. Os RR. foram citados e a fls. 22 e segs apresentaram contestação, onde referem, em síntese: Que a marquise foi construída por forma a proteger a sua fracção autónoma dos cheiros que emanam de uma chaminé existente junto ao terraço e impedir a entrada de baratas que saem da referida chaminé. Referem que existem outras marquises no edifício, pelo que concluem existir um acordo tácito dos condóminos para a construção de marquises. Por outro lado, alegam que a cozinha dos Autores dispõe de exaustor e ainda que aqueles sempre poderão abrir a porta da rua para fazer circular o ar. Alegam ainda que a fresta dos Autores viola o disposto no art.º 1.363º, n.º 2, do Código Civil, pelo que não podem exigir uma indemnização aos Réus. Também alegam que a fiscalização municipal já se pronunciou sobre o caso, sem que os Autores impugnassem a decisão no tribunal administrativo. Por isso, se é essa a pretensa dos Autores, então, este tribunal é materialmente incompetente. Concluem pela improcedência da acção. * 1.3. A fls. 57 e 58 foi proferido despacho a dispensar a condensação * 1.4. A fls. 109 e segs. foi proferida sentença, sendo que por Ac. do Tribunal desta de Relação de fls. 149 o julgamento foi anulado, tendo-se procedido a novo julgamento, conforme fls. 171 e segs. A fls. 183 e segs. foi proferida nova sentença, onde se decidiu: a) Condena-se os Réus a removerem completamente a marquise construída na fracção autónoma correspondente ao apartamento n.º 87, e para onde deita a abertura existente na cozinha da fracção autónoma correspondente ao apartamento n.º 86, do prédio constituído em regime de propriedade horizontal, denominado Central Bloco, sito em Quarteira, e descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o n.º 03464/101189-EH. b) Absolve-se os Réus do demais peticionado. * 1.5. Inconformados recorreram os RR. tendo terminado a sua motivação com as seguintes conclusões: « a) Os Recorrentes procederam à montagem da marquise na varanda da sua fracção, ao abrigo do disposto no artigo 1346.º e 337.º do Código Civil, porque esta evita a sua invasão por cheiros, odores e baratas (Cfr. factos provados nos pontos 14 e 15 de fIs.186), o que estava a causar um prejuízo intolerável à saúde e condições de higiene da habitação. b) A marquise não viola os direitos de personalidade dos Recorridos porque a abertura, a manter-se, continuaria a ter um ponto de saída e ainda porque a cozinha dos Recorridos, além de ter um "exaustor em condições de funcionar" (Cfr. Ponto 17 de fIs. 186), "tem ligação a outras divisões do mesmo apartamento" (Cfr. Ponto 18 de fIs. 186), e ainda a distância reduzida que vai da Kittchenet até à porta da varanda dos recorridos, tal como resultou do auto de inspecção realizado a fls.; e por fim, porque no caso os recorrentes optassem pela alternativa do uso de um fogão eléctrico, já a questão de emissão de gases não se colocaria, pelo que, em ambos os casos, há a possibilidade de o ar circular por outras vias. c) Em face do referido na Conclusão anterior b), aplicando o referido no artigo 335°, n.º1 do Código Civil, resulta que as alternativas dos Recorridos (exaustor e ligação da cozinha a outras divisões e alternativa de forno eléctrico) são muito maiores e eficazes do que as alternativas dos Recorrentes que além de eficácia incerta (desinfestação já solicitada à Câmara Municipal de Loulé, ainda não realizada), são inclusive menos viáveis e de execução difícil ou mesmo impossível (alteração ou tapagem da chaminé que confina com a sua varanda que provoca a emissão de maus cheiros, vapores e saída de baratas). d) O próprio tribunal “a quo” acaba implicitamente por dar razão aos recorrentes no que diz respeito ao já referido em a), b) e c) supra quando, a fls. 189 penúltimo parágrafo, admite que não se apuraram prejuízos concretos para os recorridos resultantes da montagem da marquise pelos recorrentes, reconhecendo já porém, nos pontos 13 e 14 da matéria dada por provada, a fls. 186, que os recorrentes sofrem de danos aos seus direitos de personalidade decorrentes da chaminé que confina com a varanda que, por sua vez, está na razão de ser da montagem da dita marquise. e) Da sentença recorrida resulta que não ficou expressamente provado que a montagem da marquise operou uma modificação estética, ofensiva da linha arquitectónica do prédio (tanto mais que quer em Quarteira, quer no próprio edifício em causa estas situações são habituais e não excepcionais) pelo que tão pouco pode daí resultar a obrigatoriedade da aprovação por maioria dos condóminos, nos termos previstos pelo artigo 1422°, n.º 3 do Código Civil. Neste sentido veja-se o acórdão do S.T.J. de 5 de Fevereiro de 2004 Cfr. www.dgsi.pt Documento n° SJ200402050044532 e ainda o teor da conclusão f) seguinte. f) O facto de que (1) "No mesmo prédio existem outras marquise, noutros apartamentos" (Cfr. ponto 16 de Fls. 111) que igualmente se encontram ilegais; (2) que desde finais de 2002 (Cfr. Ponto 3 de Fls. 111) não ficou provado existirem outras reacções contrárias à marquise, para além das dos Recorridos; (3) e de que em Quarteira é notória a proliferação de marquises ilegais, sendo que é igualmente conhecida a atitude permissiva da Câmara Municipal de Loulé - (Cfr. Fls. 34 e 35 e artigo 35° da contestação cuja admissão como facto provado se requer ao abrigo do disposto no artigo 712°, n.º1, alínea a) do C.P.C., segundo a qual quanto à marquise não me parece muito correcto o levantamento de auto de noticia uma vez que é do conhecimento geral a existência de centenas de marquises em Quarteira (...)." (O destaque é nosso), (4) que em 20 de Janeiro de 2007, por motivos de higiene e salubridade foi aprovada a posteriori, já depois de estar montada, por unanimidade, a colocação de uma marquise num outro apartamento, o 117 (cfr. documento junto em audiência no dia 18 de Junho de 2007 a fls.. ), e, por fim, (5) que, finalmente, no passado dia 20 de Janeiro de 2008, os recorrentes obtiveram a aprovação expressa por unanimidade dos condóminos na manutenção da sua marquise(ponto 5, alínea d) da página 4 do doc. 1, aqui junto ao abrigo do disposto nos artigos 706 e 712, n.º 1, al. c), do C.P.C. por se tratar de facto superveniente ocorrido após a notificação da sentença proferida ), leva-nos à conclusão, por um lado, que existe um consentimento tácito quer da Câmara, quer da maioria dos condóminos (agora, desde 20/1/2008 também expresso) e, por outro, que nem o condomínio, nem os proprietários consideram que as marquises montadas prejudicam a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício. g) Em face de todos os argumentos supra aduzidos e ponderados conjuntamente, resulta que o pedido formulado pelos recorridos de remoção da marquise consubstancia uma atitude de abuso de direito (cfr. art.º 334, do C.C. e Ac. do S.T.J., de 23 de Abril de 1998, in Col. de Jurisp., 1998, vol. II, fls. 52), sendo certo que, tal como já aflorado no art.º 24 da sua contestação, os recorrentes aceitaram colocar uma conduta com a mesma largura da abertura dos recorridos em direcção à janela de forma a lhes fornecer mais luz e ventilação Nestes termos e nos demais de Direito que mui doutamente serão supridos por V.Exa deverá: a) Ao abrigo do disposto no artigo 712°, n.º 1, alínea a) do C.P.C., ser modificada a decisão da matéria de facto, relativamente ao documento de fIs. 34 e 35, considerando-se, em consequência como provado o alegado no artigo 35° da sua contestação. b) Ao abrigo do disposto no art.º 712, n.º 1, alínea c) do C.P.C., ser modificada a decisão da matéria de facto, relativamente ao documento superveniente n.º 1, ora junto, considerando-se, em consequência como provado que o Condomínio em causa não se opõe à manutenção da marquise na varanda dos recorrentes. c) O presente recurso ser julgado procedente, e em consequência a sentença recorrida ser revogada.» * 1.6. Não houve contra-alegações. * 1.7. Os Exm.ºs Desembargadores-adjuntos tiveram visto nos autos. * 2. Motivação de facto 2.1. Factos dados como provados na 1.ª instância 2.1.1. - Encontra-se descrita na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o n.º 03464/101189-EH, a fracção autónoma designada pela letra EH, do prédio constituído em regime de propriedade horizontal, denominado Central Bloco, sito em Quarteira, correspondente ao 4º andar anterior direito, apartamento com o n.º 86, composta por habitação com hall, cozinha, sala, quarto e casa de banho e terraço; cujo direito de propriedade encontra-se inscrito a favor dos Autores pela apresentação n.º 34/291298, sendo os Autores os actuais donos dessa fracção autónoma. 2.1.2. - Os Réus são donos de uma fracção autónoma, do prédio referido no Facto 1º, contígua à fracção autónoma acima referida e com o nº 87 de apartamento. 2.1.3. - Em finais de 2002 os Réus construíram uma marquise em alumínio azul na sacada/frente do seu apartamento. 2.1.4. - Na cozinha do apartamento referido no Facto 1º existe uma “abertura na parede” que dá para o terraço do apartamento referido no Facto 2º. 2.1.5. -A marquise construída pelos Réus no terraço acima referido, diminui a luz natural recebida atrás dessa “abertura”, bem como impede a circulação de ar que se fazia através da mesma. 2.1.6. - A circulação de ar entre a cozinha e o exterior fazia-se directamente apenas pela referida “abertura”. 2.1.7. - Habitualmente os Autores passavam os fins-de-semana na fracção autónoma referida no Facto 1º. 2.1.8. - Os Autores interpelaram, os Réus para removerem a marquise, sem sucesso. 2.1.9. - A construção da marquise, por parte dos Réus, não está licenciada pela Câmara Municipal de Loulé nem autorizada pelo Condomínio do Edifício. 2.1.10 - Os Autores participaram a situação à Câmara Municipal de Loulé e à Administração do Condomínio. 2.1.11- Em 10/01/2005 a Câmara Municipal de Loulé elaborou um auto de notícia e por ofício expedido em 4/3/2005 notificou o Réu para retirar a marquise no prazo de 30 dias. . 2.1.12 - Junto à varanda do apartamento referido no Facto 2º, existe uma chaminé colocada no terraço do bloco de apartamentos em banda que lhe é contíguo. 2.1.13 - Da referida chaminé emanam cheiros e odores. 2.1.14. - E saem baratas que invadem a varanda do apartamento referido no Facto 2º. 2.1.15. - A marquise limita a entrada de baratas e odores. 2.1.16. - No mesmo prédio existem outras marquises, noutros apartamentos. 2.1.17 Na cozinha do apartamento referido no Facto 1º existe um exaustor em condições de funcionar. 2.1.18. - A cozinha do apartamento referido no Facto 1º tem ligação a outras divisões do mesmo apartamento, divisões essas que por sua vez fazem ligação à divisão onde se encontra a porta de entrada na fracção autónoma. 2.1.19 - A abertura referida no Facto 4º corresponde a uma abertura na parede que separa a fracção autónoma referida no Facto 1º do terraço da fracção autónoma referida no Facto 2º, com uma largura de 51,5 cm. e altura de 62 cm., e que se encontra , na sua base, a 1,50 cm. do solo do terraço do apartamento referido no Facto 2º, a qual dá directamente para esse terraço, encontrando-se instalada nessa abertura uma “janela tipo basculante”, a qual poderá ser aberta. ». * 3. Fundamentação 3.1. Como se sabe são as conclusões de recurso que delimitam o âmbito do recurso (cfr. art.ºs 684, n.º 3 e 690. n.º 1, do C.P.C.), sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso. Assim, as questões a apreciar são: a) Saber se ao abrigo do art.º 712, n.º 1, al. a), do C.P.C., a matéria de facto relativamente ao alegado no art.º 35 da contestação deve ser modificada face ao documento de fls. 34 e 35,. b) Saber se ao abrigo do disposto no art.º 712, n.º 1, alínea c) do C.P.C., deve ser modificada a decisão da matéria de facto, relativamente ao documento superveniente n.º 1, ora junto, considerando-se, em consequência como provado que o Condomínio em causa não se opõe à manutenção da marquise na varanda dos recorrentes. c) Saber se a sentença recorrida deve ser revogada e em consequência julgar-se improcedente a pretensão dos AA. Tendo presente que são várias as questões ventiladas no recurso, por uma questão metodológica vejamos cada uma de per si. * 3.1.1. Saber se ao abrigo do art.º 712, n.º 1, al. a), do C.P.C., a matéria de facto relativamente ao alegado no art.º 35 da contestação deve ser modificada face ao documento de fls. 34 e 35,. Segundo os recorrentes a matéria vertida no art.º 35 da sua contestação deve ser dada como provada face ao teor do documento de fls. 34 e 35. Vejamos Nos termos do n.º 1, al.a), do art.º 712, do C.P.C. o tribunal pode da Relação pode alterar a matéria de facto se do processo constarem todos os elementos de prova que serviram de base à decisão sobre os pontos da matéria de facto em causa. O Tribunal “ a quo” deu como não provado o constante no art.º 35 da contestação sem prejuízo do que consta da resposta aos factos 28 e 29 da mesma peça processual (cfr. fls. 178). Operando à leitura da fundamentação sobre a matéria de facto verificamos que o Tribunal “ a quo” no que concerne à matéria vertida no art.º 35 da contestação refere « no que respeita à prova documental foram considerados os documentos juntos, e o que deles resulta, à excepção feita do documento de fls. 34 e 35 junto pelos RR. Esse documento, para além de não se mostrar legível na sua segunda folha, também não é explicito, desde logo porque essa segunda folha apresenta-se como tendo sido emitida na Câmara Municipal de Albufeira, que não é competente para o procedimento». Compulsado o documento verificamos que efectivamente embora no rosto de fls. 34 conste que foi dirigido ao Presidente da Câmara Municipal de Loulé, o certo é que a fls. 35 consta um despacho como sendo emitido pela Câmara Municipal de Albufeira. Assim, sem mais delongas não se vislumbra qualquer razão ao recorrente, tanto mais que o despacho de fls. 35 consta um despacho como tendo sido emitido pela Câmara Municipal de Albufeira. * 3.3.2. Saber se ao abrigo do disposto no art.º 712, n.º 1, alínea c) do C.P.C., deve ser modificada a decisão da matéria de facto, relativamente ao documento superveniente n.º 1, ora junto, considerando-se, em consequência como provado que o Condomínio em causa não se opõe à manutenção da marquise na varanda dos recorrentes. Segundo o recorrente a matéria de facto deve ser modificada tendo por base o documento superveniente que agora junta, referindo para tanto que se deve dar como provado que o Condomínio em causa não se opõe à manutenção da marquise na varanda dos recorrentes. Para tanto invoca o preceituado nos artigos 706, do C.P.C. e 712, n.º 1, al. c), do mesmo diploma. Vejamos Se a parte pretende oferecer prova documental terá que atentar em dois aspectos: o momento da apresentação e a pertinência, ou necessidade, do documento. Este percurso - tempo e conteúdo - é seguido pelo julgador. O momento - regra, seria o do normal oferecimento de todos os meios de prova, a fase de instrução. Mas a prova documental tem uma especificidade já que determina a junção do documento, quando espontaneamente oferecida pela parte, com o articulado respectivo (seja como fundamento da acção, seja como base da defesa). É esta a fisiologia da oferta deste tipo de prova. (artigo 523º do Código de Processo Civil). Em momento posterior, há que distinguir dois " terminus ad quem": o encerramento da discussão em primeira instância e na fase de recurso, aqui até ao inicio da fase de vistos. Em qualquer das situações, o apresentante tem de alegar, e demonstrar, a impossibilidade de junção tempestiva. Impossibilidade objectiva, se o documento não existia no momento adequado; impossibilidade subjectiva, se o requerente ignorava a sua existência ou a ele não tinha acesso (aqui, mau grado o disposto no artigo 531º). Se a apresentação ocorre em sede de recurso, para além das situações de impossibilidade, o documento não é intempestivo " no caso da junção apenas se tornar necessária, em virtude do julgamento proferido "no juízo "a quo" (artigos 524º e 706º nº 1 do Código citado). Quanto a este ponto, sobre o qual nos debruçaremos com mais detalhe, por ter sido o invocado, diz o Prof. A. Varela que o " legislador quis cingir - se aos casos em que, pela fundamentação da sentença, ou pelo objecto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes da decisão ser proferida". (in "Manual de Processo Civil", 1984, p.517). Diz ainda este Mestre: " E o documento torna-se necessário só por virtude desse julgamento (e não desde a formulação do pedido ou a dedução da defesa), quando a decisão se tenha baseado em meio probatório inesperadamente junto por iniciativa do tribunal ou em preceito jurídico com cuja aplicação as partes justificadamente não tivessem contado." (R.L.J, 115º, 95). Teve adesão do Ac. STJ de 24/10/95. Nesta linha, também o Cons. Amâncio Ferreira (in "Manual dos Recursos em Processo Civil", 6ª Ed., 209) embora, lucidamente, refira que, actualmente, o nº3 do artigo 3º da lei adjectiva, em muito limita a ultima hipótese, perante o contraditório impeditivo de decisões surpresa. Contraditório, dizemos, mais, também quanto a qualquer meio de prova, "maxime" se oficiosamente carreada. Dai que a necessidade da junção face ao decidido pela 1ª instância não deva ser apreciada apenas no quadro de prova inesperada ou de fundamentação de direito surpresa, mas casuisticamente e considerando a lide em concreto. Como se acenou os recorrentes invocaram uma razão objectiva a não existência do documento. A questão que se nos coloca é a de saber se o documento em causa se reporta a factos alegados pelos recorrentes. Os mesmos na contestação afirmam que existe um acordo tácito da maioria dos condóminos no sentido de autorizar a montagem de marquises nas varandas existentes no edifício, (cfr. art.º 14 da contestação), tendo tal matéria obtido resposta negativa. (cfr. fls. 178). Afigura-se-nos que a junção do documento agora pretendido juntar se pode enquadrar na matéria alegada no art.º 14 da contestação por isso se admite. A questão que se coloca é a de saber se o mesmo tem potencialidade, por si só, como exige a al. c), do art.º 712, do C.P.C. levar-nos à modificabilidade da matéria de facto como pretendem os recorrentes. Entendemos que não. Na verdade o que consta do documento é que o condomínio não se opõe à manutenção da marquise e não que alguma vez este mesmo tacitamente permitisse a montagem de marquises nas varandas. Tanto assim, que a testemunha Sebastião Simão, administrador do prédio, em audiência referiu como se refere na fundamentação de fls. 179 que « o condomínio nunca aprovou a construção de quaisquer marquises, sendo que relativamente a uma ou a outra fracção autónoma apenas deliberaram não se opor à construção de uma marquise porque existia um “problema “ nesse caso. Ora, se apenas numa ou noutra situação deliberaram não se opor à construção por existirem problemas naturalmente não havia o acordo tácito, pois se existisse não era necessário deliberar a autorização da sua construção, para se verificar se havia ou não problemas. Assim, também não merece aceitação esta pretensão dos recorrentes. * 3.1.3. Saber se a sentença recorrida deve ser revogada e em consequência julgar-se improcedente a pretensão dos AA. Os recorrentes entendem que a sentença recorrida deve ser alterada assentando nas seguintes razões: a) Não ficou expressamente provado que a montagem da marquise tenha operado a uma modificação estética, ofensiva da linha arquitectónica. b) Houve abuso de direito por parte dos AA. c) Existe colisão de direitos entre os AA. e os RR. Tendo presente as razões invocadas por uma questão de método vejamos cada uma das questões. 3.1.3.a.) Saber se a montagem da marquise operou a uma modificação estética e ofensiva da linha arquitectónica. Segundo a sentença recorrida é inegável que as vulgares conhecidas marquises, prejudicam a linha arquitectónica e o arranjo estático do edifício. Opinião oposta têm os recorrentes. Vejamos. Segundo o que se dispõe no artº 1422º nº2 al. e nº 3 do C.Civil que estabelece limitações ao exercício do direito dos condóminos, nas relações entre si - «É especialmente vedado aos condóminos:" prejudicar, quer com obras novas, quer por falta de reparação, a segurança, a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício». E «As obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício podem ser realizadas se para tanto se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada por maioria representativa de dois terços do valor total do prédio». Como anotam Pires de Lima e A. Varela in “C.Civil Anotado”, vol. III, pág. 366: o “nº 2 estabelece uma série de limitações aos poderes dos condóminos, cuja explicação se encontra, não nas regras sobre a compropriedade, mas antes no facto de, estando as diversas fracções autónomas integradas na mesma unidade predial, como propriedades sobrepostas ou confinantes, haver entre elas e no respectivo uso especiais relações de interdependência e de vizinhança. Desta última conexão deriva para cada um dos condóminos o direito de, em certas circunstâncias, obrigar os demais a realizar certas obras ou a abster-se da prática de determinados actos”. Por “linha arquitectónica do edifício” deve entender-se o “conjunto de elementos estruturais e sistematizados que conferem à construção a sua individualizada específica”, aquela, “enquanto elemento individualizador de uma construção”, saindo, como é apodíctico, prejudicada pelas alterações ou inovações que coloquem em risco o equilíbrio visual, ou seja a aparência externa, ocorram elas na fachada do edifício onde se inserem, ou tenham sido levadas a cabo nas traseiras daquele, “pois a lei não faz qualquer distinção entre as diversas zonas ou áreas do edifício para tal fim”, cfr. Ac. do STJ de 25.05.2000, in CJ/STJ, Ano VIII, tomo II, págs. 80 e segs. Está assente na nossa Jurisprudência que a “linha arquitectónica” a que se refere o artº 1422º do C.Civil, e as inovações a que se refere o artº 1425º do mesmo diploma, se reportam ao desenho inicial do prédio, ou seja, ao prédio tal como foi projectado, licenciado e construído, e não às situações de facto eventualmente existentes à data em que as alterações foram praticadas. A expressão “arranjo estético de um edifício” como é defendido por Aragão Seia, ”refere-se, em especial, ao conjunto das características visuais que conferem unidade sistemática ao conjunto”, os novos elementos da fracção autónoma que podem afectar o arranjo estético do edifício tendo de “possuir visibilidade do exterior”, in “Propriedade Horizontal - Condóminos e Condomínios”, pág. 101). Conforme foi referido no Ac.do STJ de 16.07.74, in BMJ 239-199, “será de considerar nova a obra que, apreciada em si mesma ou objectivamente, altere a edificação no estado em que foi recebida pelos adquirentes...». Ou, mais claramente, como se escreve no Ac. do STJ de 19.01.2006, in www.dgsi.pt: “ao projecto inicial do edifício é que há que atender!... Não ao “traçado arquitectónico” do edifício, filho da feitura de obras novas ilegais ...”. No caso concreto dos autos, na fachada sul do imóvel, onde havia um vão que constituía a varanda da fracção, passou a existir uma a área coberta por uma estrutura de alumínio e vidro. Dúvidas não subsistem pois de que o réu realizou obra nova. Sendo ainda evidente que a marquise ali e assim colocada pelos RR., afecta a linha arquitectónica do prédio e o arranjo estético do mesmo e nisso consiste o “prejuízo” a que se refere a al.a) do nº2 do artº 1422º do C.Civil. A fachada do imóvel passou a ter aspecto diverso ou passou a apresentar uma diferente configuração, relativamente à que tinha à data da sua construção. Como se escreveu no Ac. da Relação do Porto de 14.04.93, in CJ, Ano XVIII, Tomo 2, pág. 42 “prejuízo para a linha arquitectónica de um prédio existirá sempre desde que ela seja modificada”. Ou seja, qualquer modificação arquitectónica de um edifício, desde que não prevista no respectivo projecto, prejudica, em princípio, a linha arquitectónica do mesmo. Pelo exposto é manifesto concluir, como em 1.ª instância que a construção da marquise, prejudica a linha arquitectónica do imóvel. Como se viu as obras que modifiquem a linha arquitectónica ou o arranjo estético do edifício podem ser realizadas se para tal se obtiver prévia autorização da assembleia de condóminos, aprovada pela maioria representativa de 2/3 do valor total do prédio, cfr. nº3 do artº 1422º do C.Civil. No caso dos autos os RR. não provaram que tivessem solicitado autorização, previamente à realização de tais obras, e junto da assembleia de condóminos do edifício, autorização para as realizar. Assim, escreve Aragão Seia, in “Propriedade Horizontal”, pág. 106 que: “A sanção correspondente à realização das referidas obras novas é a destruição delas, isto é, a reconstituição natural, que não pode ser substituída por indemnização em dinheiro, ao abrigo do princípio da equidade estabelecido nos artº 566º nº 1 e 829º nº 2, porque este princípio só vale para o não cumprimento das obrigações em geral e não para a violação do estatuto real do condomínio em que estão em jogo regras de interesse e ordem pública atinentes à organização da propriedade, que bolem com os interesses de todos os condóminos do prédio”. Assim, e quanto a este ponto a pretensão dos recorrentes seria improcedente. * 3.1.3.b.) – Saber se houve abuso de direito por parte dos AA. Referem os recorrentes que os AA. procederam com abuso de direito. Vejamos Como vem sendo vulgarmente qualificado, a figura do abuso de direito apresenta-se como válvula de segurança do nosso ordenamento jurídico. Ora, segundo o disposto no artº 334º do C.Civil: “É ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costume ou pelo fim social ou económico desse direito.” Como ensinam Pires de Lima e Antunes Varela, in “Código Civil anotado”, vol. I, pág. 299, “o exercício de um direito só poderá ser ilegítimo quando houver manifesto abuso, ou seja, quando o direito seja exercido em termos clamorosamente ofensivos da justiça, traduzindo uma clamaorosa ofensa ao sentimento jurídico socialmente dominante.” Segundo o Prof. Menezes Cordeiro, in “Tratado de Direito Civil Português”, I, Parte Geral, Tomo 1, pág, 241 e segs., “o abuso de direito representa a fórmula mais geral de concretização do princípio da boa fé, constituindo um excelente remédio para garantir a supremacia do sistema jurídico e da Ciência do Direito sobre os infortúnios do legislador e as habilidades das partes, mas com aplicação subsidiária, desde que não haja solução adequada de Direito estrito que se imponha ao intérprete aplicar”. E segundo o Prof. Baptista Machado, in “Obra dispersa” vol I, págs. 415 a 418, “o efeito jurídico próprio do instituto só se desencadeia quando se verificam três pressupostos: 1. Uma situação objectiva de confiança; uma conduta de alguém que de facto possa ser entendida como uma tomada de posição vinculante em relação a dada situação futura; 2. Investimento na confiança: o conflito de interesses e a necessidade de tutela jurídica surgem quando uma contraparte, com base na situação de confiança criada, toma disposições ou organiza planos de vida de que lhe surgirão danos se a confiança legítima vier a ser frustrada; 3. Boa fé da contraparte que confiou: a confiança do terceiro ou da contraparte só merecerá protecção jurídica quando de boa fé e tenha agido com cuidado e precaução usuais no tráfico jurídico”. A figura do abuso de direito pode apresentar-se, na prática, em quatro formas-padrão ou modalidades de violação do princípio da boa fé, traduzidas: 1. na proibição de tomar, dolosamente, posições processuais ou “exceptio doli”; 2. a proibição de “venire contra factum propprium”; 3. a proibição de abuso de poderes processuais e 4. a dupla formada pela “surrectio” e pela “suppresio”. E mais em pormenor : O “venire contra factum propprium” acontece, por exemplo, quando uma situação de aparência jurídica é criada, em termos tais, que cria nas pessoas a legítima confiança ou expectativa de que a posição jurídica contrária não será actuada. A “surrectio” ou surgimento, como oposto que é da “suppresio” ou neutralização, acontece quando uma pessoa, por força da boa-fé da outra parte, vê surgir na sua esfera jurídica uma possibilidade que, de outro modo, não lhe assistiria, cfr. Menezes Cordeiro, in obra citada, pág. 241 e segs. A “suppresio” consiste na situação em que uma pessoa incorre quando, tendo suscitado noutra, por força de um não exercício prolongado, a confiança de que a posição em causa não seria actuada, não pode mais fazê-lo, por imposição da boa fé, implicando a demonstração, ainda que mínima, que da inactividade do lesado resultou uma expectativa fundada de que o direito não seria exercido. Depois destas considerações gerais, vejamos o caso dos autos. Ora, com interesse para a presente questão está assente que no mesmo prédio existem outras marquises, noutros apartamentos. Assim sendo, consistirá a presente actuação do condomínio-autor numa situação de “venire contra factum propprium”, no que concerne ao analisado em 3.3.1.a. ? Entendemos que sim na verdade o facto de existirem outras marquises noutros apartamentos do prédio incutiu nos RR. a confiança legítima de que se eregessem na sua fracção, como fizeram, uma marquise idêntica às pré-existentes no imóvel, mesmo sem solicitar, para o efeito, prévia autorização à assembleia de condóminos, o condomínio não iria exercer, contra si, os direitos de acção consubstanciados no nº 3 do artº 1422º do C.Civil. E assim sendo, os RR. decidirem investir na realização da tais obras, cuja demolição lhe acarretará naturais danos. Por tudo isto, não nos repugna considerar que o condomínio-autor ao exigir, apenas dos RR., e não aos demais condóminos que possuem no imóvel construções idênticas à sua e realizadas também sem qualquer autorização da assembleia de condóminos, está a agir em abuso de direito, ou seja, excedendo manifestamente os limites impostos pela boa-fé, na modalidade de “venire contra factum propprium”, o que obstaculiza o exercício do seu direito, pelo que nesta questão acompanhamos os recorrentes, no que concerne apenas quanto ao ponto 3.1.3.a. Porém, a sentença recorrida assentou também a sua decisão na violação dos direitos de personalidade a que alude o art.º 70, do C.C. Por essa razão referem os recorrentes que há conflito de direitos, vejamos, então essa questão. * 3.1.3.c.) Saber se existe colisão de direitos entre os AA. e os RR. Referem os recorrentes que procederam à montagem da marquise na varanda da sua fracção, ao abrigo do disposto nos artigos 1346 e 337, do C.C., porque esta evita a sua invasão por cheiros, odores e baratas., sendo que a marquise não viola os direitos de personalidade dos recorridos porque a abertura a manter-se, continuaria a ter um ponto de saída e ainda porque a cozinha dos recorridos além de ter um exaustor em condições de funcionar tem ligação a outras divisões do mesmo apartamento. Vejamos Não há dúvidas que quer a lei constitucional (designadamente artºs 1º, 2º, 69º, nº 1, 70º, nº 2, 72º, nº 2 da CRP), quer a Declaração Universal dos Direitos do Homem (v. respectivo preâmbulo e designadamente os artºs 6º, e 29º, nº 1) garantem e protegem os direitos de personalidade do ser humano (designadamente enquanto manifestação da salvaguarda do princípio da dignidade da pessoa humana). O mesmo acontece com a lei ordinária, conforme resulta designadamente do artº 70º do CC. Também não suscita grandes dúvidas que a lei tutela a personalidade enquanto reportada à especificidade de cada pessoa. Parafraseando Rabindranath Capelo de Sousa (v. O Direito Geral de Personalidade, pág 116), podemos dizer que a lei não tutela aqui um arquétipo como a personalidade normal, física ou sócio-culturalmente abstractamente dominantes, mas cada homem em si mesmo, concretizado na sua específica realidade física e psíquica e moral, o que, incluindo a sua humanidade, abrange também a sua individualidade, nomeadamente o seu direito à diferença e à sua concepção e actuação moral próprias. É também ponto assente que os direitos de personalidade têm como objecto as mais variadas realidades atinentes à pessoa humana: vida, o próprio corpo, elementos anatómicos destacados do corpo, equipamento psíquico, identidade, honra ... saúde fisico-psíquica... É igualmente certo que quando se fala de saúde não se pode deixar de ter em vista também as realidades que lhe são co-envolventes, como o sossego, o descanso, o lazer, o sono reparador, o ar puro, o ambiente sadio... É ainda indiscutível que os direitos de personalidade são absolutos, no sentido de que geram uma universal obrigação de respeito e abstenção de lesão (oponibilidade erga omnes), incorrendo em responsabilidade civil indemnizatória quem os violar (exige-se aqui que se verifiquem os necessários pressupostos da responsabilidade civil) e permitindo a lei a imposição de medidas preventivas, atenuadoras e supressoras da lesão (aqui independentemente de culpa do sujeito passivo e até independentemente de dano efectivo). Isto resulta claro do disposto no artº 70º do CC, e não deixa de ser afirmado pela doutrina (v. R. Capelo de Sousa, ob. cit., pág 451 e sgts). É também certo que os direitos de personalidade não são postergados pelo facto de quem os viola o fazer no exercício de uma actividade lícita e respeitar as normas atinentes a esse exercício, a começar pelas que se referem aos níveis máximos de poluição (designamente sonora, rectius ruído) legalmente estabelecidos. Trata-se de asserção mais que garantida por toda uma jurisprudência constante e pacífica. Feitos estes considerando gerais a respeito do direito de personalidade, temos para nós, evidente que a feitura da marquise viola esses direitos. Na verdade resulta provado que a marquise construída pelos RR. no terraço referido, diminui a luz natural recebida e impede a circulação de ar que se fazia através da “abertura” que dá para o terraço, sendo que a circulação do ar entre a cozinha e o exterior fazia-se directamente apenas pela referida “abertura”. Face a estes factos não restam dúvidas que os direitos de personalidade dos AA. foram violados, pois não é pelo facto de a cozinha ter ligações a outras divisões ou o facto dos AA. poderem utilizar fogão a electricidade que lhe evita a violação dos deveres de personalidade dos AA., como pretendem os recorrentes. Na verdade os AA. não são obrigados a utilizar fogão a electricidade nem são obrigados a estar com as portas abertas e janelas quando cozinham. Assim, não restam dúvidas que os direitos de personalidade dos AA. foram violados com a construção da marquise. Referem os recorrentes que a feitura da marquise ficou a dever-se ao facto de existirem cheiros e a vinda de baratas e que a mesma foi feita ao abrigo do disposto nos art.ºs 1346 e 337 do C.C. Nos termos do art.º 1346, do C.C. o proprietário de um imóvel pode opor-se à emissão de fumo, fuligem, vapores, cheiros, calor ou ruídos, bem como à produção de trepidações e a outros quaisquer factos semelhantes, provenientes de prédio vizinho, sempre que tais factos importem um prejuízo substancial para o uso do imóvel ou não resultem da utilização normal do prédio de que emanam. E refere o art.º 337, do mesmo diploma considera-se justificado o acto destinado a afastar qualquer agressão actual e contrária à lei contra a pessoa ou património do agente ou de terceiro, desde que não seja possível fazê-lo pelos meios normais e o prejuízo causado pelo acto não seja manifestamente superior ao que pode resultar da agressão. Dos factos provados e com interesse para estar matéria resulta provado junto à varanda do apartamento referido no Facto 2º, apartamento dos RR., existe uma chaminé colocada no terraço do bloco de apartamentos em banda que lhe é contíguo, de onde emanam cheiros e odores e saem baratas que invadem a varanda do referido apartamento e que a marquise limita a entrada de baratas e odores. Destes factos não resulta que a feitura da marquise seja a única forma de evitar os cheiros e os odores nem a entrada de baratas na fracção dos RR. sendo que também não resultou provado, embora os RR. alegassem que a construção da marquise foi feita para evitar a invasão de maus cheiros e baratas provenientes da chaminé. Pois o que se provou foi apenas que a marquise limita a entrada de baratas e odores. Assim, não se vislumbra a existência de colisão de direitos invocada pelo recorrentes, desde logo, por os RR. não terem provado que a única forma de evitar os cheiros e a invasão de baratas fosse a feitura da marquise, nem que esta fosse feita para evitar tais odores e a invasão de baratas. Pelo exposto, esta pretensão dos recorrentes não pode proceder. Diga-se, ainda que face ao referido em 3.1.3.b) a respeito do abuso de direito este não se verifica no que concerne à matéria analisada no ponto 3.1.3.c), razão pela qual a decisão recorrida será de manter. * 4. Decisão Pelo exposto, acorda-se em negar provimento à apelação, mantendo a decisão recorrida. Custas da apelação a cargo do recorrente. Évora, 18/9/08 ------------------------------------------ (Pires Robalo – Relator ) ---------------------------------------------- (Almeida Simões – 1.º Adjunto) --------------------------------------------- (D´Orey Pires – 2.º Adjunto) |