Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | CRISTINA DÁ MESQUITA | ||
Descritores: | TAXA DE JUSTIÇA REDUÇÃO REMANESCENTE | ||
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Data do Acordão: | 03/10/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | A norma constante do n.º 7 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais deve ser interpretada em termos de ao juiz ser lícito dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fração ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de 275.000 euros, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes) iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da ponderação. | ||
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Decisão Texto Integral: | Apelação n.º 231/08.5TBVRS-E.E1 (1.ª Secção) Relator: Cristina Dá Mesquita Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO I.1. (…), executado no processo que lhe foi movido por (…), interpôs recurso da decisão proferida pelo Juízo de Execução de Loulé, Juiz 1, do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, o qual indeferiu o pedido de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, ou, pelo menos, a redução do valor da mesma, nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Judiciais A decisão sob recurso tem o seguinte teor: «Refª CITIUS 40079254: Veio a Oponente/executado (…) requerer a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos do artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais, ou, no limite, a redução do valor da mesma. Para tanto alegou, em suma, que a quantia que ainda se encontra por liquidar relaciona-se com o pagamento do remanescente de taxa de justiça devida pelos dois recursos interpostos no âmbito dos presentes autos, sendo que no primeiro recurso de apelação interposto a 3/6/2011 o exequente procedeu ao pagamento da taxa de justiça no valor de € 1.224,00 e pelo recurso de revista interposto a 22/05/2017 o executado fez o pagamento de € 816,00 referente à taxa de justiça devida e em ambos os casos foi tomada em consideração como valor da ação a quantia de € 850.310,07, alcançando-se desta forma o remanescente da taxa de justiça a pagar pelo ora requerente, num total de € 3.264,00 quanto ao primeiro recurso e € 3.672,00 quanto ao segundo e é quanto a este remanescente que recai o presente petitório, pretendendo o executado ser dispensado do seu pagamento ou, no limite, beneficiar de uma redução do mesmo, sendo do entendimento do Requerente que se encontram preenchidos os fundamentos para dispensa do remanescente da taxa de justiça, sendo, por força do disposto no artigo 6.º, n.º 7, do RCP, dois os critérios a atender para dispensa daquele pagamento: a complexidade da causa e a conduta processual das partes, sendo que quanto ao recurso de apelação não obstante a morosidade verificada, o mesmo culminou com um curto acórdão de 9 páginas e naquela sede não houve lugar a audiência de julgamento e não foi sequer pedida a reapreciação de prova pelo executado, aqui Requerente e quanto ao processo propriamente dito, está essencialmente em causa uma decisão de oposição à execução e reconhecimento de sentença estrangeira, ambos temas bastante consolidados tanto na jurisprudência como na doutrina, o que não confere especial complexidade ao recurso, e quanto à conduta das partes, importa incidir sobre o facto de a quantia em causa nos presentes autos de execução ter sido paga pelo executado, aqui requerente no ano de 2009 e no que respeita ao recurso de revista, o mesmo foi considerado improcedente e consequentemente não foram utilizados quaisquer meios processuais e esta decisão foi proferida em apenas 6 meses e teve por base a análise de decisões previamente definidas, compiladas em acórdão de 10 páginas, não tendo sido formulada nova fundamentação sobre a causa em crise, pelo que mais uma vez não se pode considerar proporcional a dívida de taxa remanescente de € 3.672,00 quando considerada a complexidade do processo e os meios utilizados, que foram absolutamente diminutos. Cumpre apreciar e decidir. Preceitua o n.º 1 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais que “A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual dos interessados e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela I-A, que faz parte integrante do presente Regulamento”, acrescentando o n.º 2 que “Nos recursos, a taxa de justiça é sempre fixada nos termos da tabela I-B que faz parte integrante do presente Regulamento”, e nas causas de valor superior a (euro) 275.000, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento (cfr. N.º 7 do artigo 6.º). Feito o enquadramento legal, revertendo agora ao caso dos autos, temos que Do exposto, resulta, pelo menos nosso ver, os presentes autos que à partida não se revestiam de especial complexidade, obrigaram a um esforço redobrado dos Tribunais Superiores, mormente do Colendo Supremo Tribunal de Justiça, pelo que a nosso ver, não se justifica que o Oponente/executado seja dispensado do pagamento do remanescente da taxa de justiça, nem da redução da mesma, sendo certo que, no que respeita à conduta processual das partes, a mesma está documentada nos autos. Assim, indefere-se o requerido pelo Oponente/executado (…). Notifique, sendo também a senhora Agente de Execução». I.2. O recorrente formula alegações que culminam com as seguintes conclusões: «1. O presente recurso é interposto nos termos do artigo 644.º, alínea g), do C.P.C., por se entender que a decisão final em sede de processo executivo é a sentença que recai sobre a oposição à execução, cujo trânsito em julgado data de 19/03/2018 (cfr. Certidão junta ao Apenso A, a 26/03/2018). 2. Se assim não se entender, a presente apelação deverá ser admitida tendo por base o artigo 644.º, alínea h), do C.P.C., na medida em que a impugnação do despacho recorrido com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil. 3. No seguimento de notificação, a 13/09/2021, para pagamento da conta de custas da sua responsabilidade, o aqui Recorrente veio pedir dispensa do pagamento do valor remanescente de taxa de justiça em requerimento datado de 08/10/2021. 4. O despacho de que ora se recorre indeferiu esse pedido por considerar que os presentes autos “obrigaram a um esforço redobrado dos Tribunais Superiores”. 5. De acordo com o artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais, a decisão sobre o pedido de dispensa do pagamento da taxa de justiça baseia-se na complexidade da causa e na conduta processual das partes. 6. Nos presentes autos, não nos encontramos perante uma questão ambígua ou lacunosa. 7. A totalidade da dívida exequenda foi liquidada, pelo Executado, na data de 06/07/2009, tal como foi reconhecido por sentença proferida pelo Tribunal do país de origem da dívida e o mero cálculo aritmético permite verificar que o montante pago constitui a totalidade da quantia exequenda no estrangeiro – situação analisada e decidida no apenso C dos presentes autos (cfr. Acórdão do TRE de 27/05/2021). 8. A Agente de Execução confirmou que não procedeu ao cálculo da quantia exequenda, devida no país de origem, e bem assim que não procedeu à atualização da quantia exequenda em Portugal, e foi confessada pelo Exequente a receção do valor da dívida exequenda, na data de 10/02/2015. 9. Assim, apenas se logrou demonstrar que outra não poderia ser a conclusão senão a de que não existe qualquer valor em dívida, carecendo de fundamento os presentes autos de execução. 10. Pelo que a conduta do Executado, que se encontra “documentada nos autos” (expressão utilizada no despacho recorrido), consiste numa tentativa constante de resolução de um processo que perdura há mais de uma década, colaborando ativamente com o Tribunal no sentido da resolução da questão controvertida. 11. Quanto à atuação dos Tribunais Superiores, no âmbito do recurso de apelação datado 03/06/2011, que recaiu sobre a decisão da oposição à execução, não houve lugar a audiência de julgamento, e não foi sequer pedida reapreciação de prova pelo aqui Recorrente. 12. O recurso de revista interposto a 22/05/2017 foi considerado improcedente. 13. Não houve um “esforço redobrado dos Tribunais Superiores”. 14. Recorrer de uma decisão para um Tribunal Superior não requer “especial esforço” da máquina judicial, nem demonstra sequer uma “especial complexidade” do processo, antes sendo um direito fundamental de qualquer cidadão nos termos do artigo 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa. 15. Ao afirmar que o mero recurso aos Tribunais Superiores é em si revelador de um “especial esforço”, quando na verdade esse é apenas um direito concedido às partes de qualquer processo, o despacho recorrido encontra-se em violação de um dos princípios basilares do Direito Português, o acesso à justiça, plasmado no artigo 20.º da CRP. 16. Sendo ainda manifesto, por tudo quanto foi dito, que os presentes autos não se revestem de especial complexidade, bem como não revelam uma conduta imprópria por parte do Executado. 17. Motivo pelo qual mal andou o Tribunal a quo na sua aplicação do artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais, que cabia de ser interpretado e aplicado no sentido de admitir a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça conforme requerido pelo ora Recorrente. Nestes termos e nos melhores de Direito, deve o despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que declare que o aqui Recorrente deve ser dispensado do pagamento do remanescente da taxa de justiça ou, no limite, ser aquele valor alvo de redução, por força do disposto no artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Processuais». I.3. Não houve resposta às alegações de recurso. O recurso foi recebido pelo tribunal a quo. Corridos os vistos em conformidade com o disposto no artigo 657.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, cumpre decidir. II. FUNDAMENTAÇÃO II.1. As conclusões das alegações de recurso (cfr. supra I.2) delimitam o respetivo objeto de acordo com o disposto nas disposições conjugadas dos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, ambos do CPC, sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2 e artigo 663.º, n.º 2, ambos do CPC), não havendo lugar à apreciação de questões cuja análise se torne irrelevante por força do tratamento empreendido no acórdão (artigos 608.º, n.º 2 e 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil). II.2. A questão que cumpre decidir consiste em saber se o executado/apelante deve ser dispensado do pagamento da taxa de justiça remanescente ou, pelo menos, se o montante do remanescente deve ser objeto de redução. II.3. Factos provados Dão-se aqui por integralmente reproduzidos os factos constantes da decisão recorrida acima transcrita. Resulta ainda dos autos que: 1 – A taxa de justiça nos recursos de Apelação e de Revista, respetivamente, foi calculada sobre a base tributável de € 850.310,17; 2 – O apelante pagou de taxa de justiça pela interposição do recurso de Apelação o valor de € 1.224,00; 3 - O apelante pagou de taxa de justiça pela interposição do recurso de Revista o valor de € 816,00; 4 – O remanescente da taxa de justiça devida pela interposição do recurso de Apelação ascende ao valor de € 3.264,00. 5 – O remanescente da taxa de justiça devida pela interposição da Revista é no montante de € 3.672,00. II.4. Mérito do recurso Está em causa no presente recurso uma decisão proferida pelo tribunal de primeira instância que não dispensou o executado/apelante do pagamento da taxa de justiça remanescente, nem reduziu o seu valor. A taxa de justiça remanescente em causa está relacionada (apenas) com os dois recursos interpostos pelo apelante no âmbito dos presentes autos, em 06.04.2017 e 22.05.2017, respetivamente, o primeiro, de Apelação, que foi julgado improcedente por acórdão prolatado pelo Tribunal da Relação de Évora em 06.04.2017, e o segundo, de Revista, no âmbito do qual foi proferida decisão singular que não admitiu o recurso de revista em termos gerais e ordenou a remessa dos autos à formação para se decidir sobre a (in)admissibilidade do recurso de revista como revista excecional, tendo o STJ proferido acórdão que não admitiu a revista excecional. Nos termos do disposto no artigo 529.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, a taxa de justiça – que é componente das custas processuais[1] – corresponde ao montante devido pelo impulso processual de cada interveniente e é fixado em função do valor e complexidade da causa, nos termos do Regulamento das Custas Processuais. Como se salienta no recente acórdão do STJ de 20-12-2021[2] : «representando a taxa de justiça o quantitativo que se destina a compensar o Estado pelas despesas inerentes a qualquer processo judicial, é natural que o seu pagamento seja exigido aos interessados que não estejam isentos, na medida em que não se encontra instituído um regime que se traduza na gratuitidade absoluta e generalizada do recurso aos meios judiciais». O critério da “complexidade” da causa extrai-se do artigo 530.º do CPC, concretamente do seu n.º 7, o qual sob a epígrafe Taxa de justiça, dispõe o seguinte: «Para efeitos de condenação no pagamento da taxa de justiça, consideram-se de especial complexidade as ações e os procedimentos cautelares que: a) Contenham articulados ou alegações prolixas; b) Digam respeito a questões de elevada especialização jurídica, especificidade técnica ou importem a análise combinada de questões jurídicas de âmbito muito diverso; ou c) Impliquem a audição de um elevado número de testemunhas, a análise de meios de prova complexos ou a realização de várias diligências de produção de prova morosas». De acordo com o disposto no artigo 6.º, n.º 7, do Regulamento das Custas Judiciais, nas causas de valor superior a € 275.000,00 o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento. Sobre o preceito legal em análise (artigo 6.º, n.º 7, do RCP) escreveu-se no Acórdão do STJ Uniformizador de Jurisprudência n.º 1/2022, publicado no DR de 3 de janeiro de 2022, 1.ª Série, o seguinte: «(…) a ratio desta norma é, assim, evitar casos de disparidade clara entre o expediente do Tribunal e a conta de custas, por uma questão de Justiça Material, e do cumprimento dos princípios da proporcionalidade e adequação, e ainda do livre acesso à justiça, todos plasmados na CRP. Este aditamento do n.º 7 ao artigo 6.º do R.C.J. ocorreu na sequência da decisão do Tribunal Constitucional n.º 421/2013, de 15 de julho de 2013, que julgou inconstitucionais, por violação do direito de acesso aos tribunais, consagrado no artigo 20.º da Constituição, conjugado com o princípio da proporcionalidade, decorrente dos artigos 2.º e 18.º, n.º 2, segunda parte da Constituição, as normas contidas nos artigos 6.º e 11.º conjugadas com a tabela I-A anexa, ao Regulamento das Custas Processuais, na redação introduzida pelo D/L n.º 52/2011, de 13 de abril, quando interpretadas no sentido de que o montante da taxa de justiça é definido em função do valor da ação sem qualquer limite máximo, não se permitindo ao tribunal que reduza o montante da taxa de justiça devida no caso concreto, tendo em conta, designadamente, a complexidade do processo e o carácter manifestamente desproporcional do montante exigido a esse título. Assim se introduziu a possibilidade de graduação prudencial do montante das custas devidas nos processos de valor especialmente elevado. (…) Assim, embora a taxa de justiça até ao valor de 275.000,00 euros tenha de ser autoliquidada pela parte, por referência, em regra, à Tabela I-A anexa ao RCP, dessa forma impulsionando a ação, incidente, procedimento cautelar, recurso ou execução (com a junção do documento que comprove o prévio pagamento da taxa de justiça então devida), veio o legislador, por forma a se sintonizar com as exigências constitucionais, dispor que para além daquele valor da causa de 275.000,00 euros, o valor da taxa de justiça acresce, a final, por cada € 25.000,00 ou fração, três UC, no caso da coluna A; 1,5 UC, no caso da coluna B; e 4,5 UC, no caso da coluna C (cfr. parte final da tabela I-A anexa ao RCP). E conferiu, ainda, ao juiz o poder (dever?) de ex officio, ou a requerimento das partes, dispensar (ou reduzir) o pagamento (fundamentando-o na decisão final a proferir quanto à ação, incidente, procedimento cautelar, recurso ou execução) da taxa de justiça remanescente, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes (cit. n.º 7 do artigo 6.º do RCP). Nesta senda, «a norma constante do n.º 7 do artigo 6.º do RCP deve ser interpretada em termos de ao juiz ser lícito dispensar o pagamento, quer da totalidade, quer de uma fração ou percentagem do remanescente da taxa de justiça devida a final, pelo facto de o valor da causa exceder o patamar de 275.000 euros, consoante o resultado da ponderação das especificidades da situação concreta (utilidade económica da causa, complexidade do processado e comportamento das partes) iluminada pelos princípios da proporcionalidade e da ponderação». Representando a taxa de justiça, tendencialmente, o custo ou preço da despesa necessária à prestação do serviço desenvolvido pelos tribunais – cfr. Ac. STJ Uniformizador de Jurisprudência n.º 1/2022 –, o princípio da proporcionalidade consagrado no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição da República deve assegurar que o valor cobrado ao utente que recorre ao sistema público de administração da justiça reflita o custo do serviço que lhe foi prestado. Destarte, a fixação do valor que for devido a final pelos utilizadores desse serviço de justiça deve ter em linha de conta as especificidades da ação concreta, designadamente, a sua utilidade económica, a complexidade do processado e o comportamento das partes, tendo como pano de fundo, como se disse, os princípios da proporcionalidade e adequação. Da leitura do artigo 6.º, n.º 7, do RCP resulta, desde logo, que os fatores ali indicados como ponderáveis na decisão de dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente o são a título meramente exemplificativo. Pelo que não está afastada a possibilidade de atender também à natureza e à atividade exercida por cada uma das partes, aos interesses económicos em discussão ou aos resultados que cada uma delas procurou assegurar – vide, por todos, o supra citado acórdão do STJ de 20-12-2021. Feito este enquadramento legal e retornando ao caso em apreço, na decisão sob recurso o tribunal de primeira instância reconhece que a causa não se revestiu de especial complexidade, nada tendo apontado ao comportamento processual das partes, o que nos leva a crer que terá entendido que o comportamento do recorrente, em particular, se terá pautado pela defesa dos seus legítimos interesses. O tribunal a quo fundou a decisão posta em crise no facto de «os autos terem obrigado a um esforço redobrado dos Tribunais Superiores, mormente do Colendo Supremo Tribunal de Justiça» (sic). Como assinalado supra está em causa a taxa de justiça remanescente relativa aos (dois) recursos interpostos pelo apelante. Extrai-se dos autos que houve um recurso de Apelação que foi decidido pelo Tribunal da Relação de Évora e do qual foi interposto recurso de Revista para o STJ ao abrigo do disposto no artigo 671.º, n.º 1, do CPC e que, a título subsidiário, o apelante / executado requereu que o recurso fosse admitido como recurso de revista excecional, isto é, para o caso de se entender que existe dupla conformidade; foi proferida decisão singular, em 07.11.2017, que não admitiu o recurso de revista como recurso de revista em termos gerais e ordenou a remessa dos autos à formação para se decidir sobre a admissibilidade, ou não, do recurso de revista como revista excecional, tendo sido proferido acórdão na formação prevista no artigo 672.º, n.º 3, do CPC que não admitiu a revista excecional. Resulta ainda dos autos que da decisão singular do STJ o executado/apelante reclamou, reclamação que foi julgada improcedente por acórdão do STJ de 09.01.2018. Liminarmente se dirá que o direito de acesso ao direito e aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva – o que compreende, designadamente, o direito de recurso – constituem direitos fundamentais – cfr. artigo 20.º da Constituição da República – e estruturantes do Estado de Direito Democrático e que as alegações dos supra mencionados recursos não evidenciam que o apelante haja extravasado a sua defesa legal. Pondera-se, ainda, que o executado / apelante é uma pessoa singular e pretendeu, com os recursos interpostos, que a execução fosse julgada extinta e evitar a penhora de bens, alegando que já pagara, no estrangeiro (África do Sul), a totalidade da quantia exequenda (o que, diga-se, veio a ser reconhecido por sentença proferida por tribunal da África do Sul). No que respeita ao recurso de Apelação verifica-se que as alegações não são particularmente prolixas (contendo 23 conclusões) e suscitam o tratamento de questões de direito processual e substantivo que não revestem particular complexidade, tendo originado um acórdão do Tribunal da Relação de nove (9) páginas que confirmou a decisão da primeira instância. Tudo ponderado, julgamos que o remanescente da taxa de justiça devida pela interposição do recurso de Apelação – € 3.264,00 – se afigura particularmente elevado, sendo que o apelante já pagou o montante de € 1.224,00. Assim sendo, entendemos ser adequado e proporcional dispensar o pagamento do valor do remanescente da taxa de justiça devida pela interposição do recurso de Apelação. Já no que respeita ao recurso de Revista, reconhecemos que este convocou mais meios/diligências, pois que para além da Revista em termos gerais, o apelante deduziu, a título subsidiário, revista excecional, o que exigiu a elaboração de acórdão na formação prevista no artigo 672.º, n.º 3, do CPC e reclamou da decisão singular que não admitiu a Revista em termos gerais, reclamação em que invocou uma questão – violação das regras de competência internacional pelo Tribunal da Relação – que não constava das alegações do recurso de revista. Daí que se entenda que não é possível dispensar o apelante do pagamento da taxa de justiça remanescente, pois que o montante que ele já pagou – € 816,00 – é manifestamente baixo tendo em conta o serviço que lhe foi prestado. Mas, por outro lado, há que considerar que as alegações do recurso (de Revista) não se mostram particularmente extensas (contendo apenas 25 conclusões) e as questões suscitadas também não se revelam de particular dificuldade; no acórdão na formação a que alude o artigo 672.º, n.º 3, do CPC, o coletivo de Conselheiros decidiu muito sumariamente que do acórdão recorrido no âmbito de um incidente de oposição não é admissível recurso de revista e quanto à decisão sobre a oposição à execução decidiu que «o que se encontra controvertida é a matéria relacionada com a eficácia de uma sentença estrangeira apresentada pelo recorrente sobre as sentenças estrangeiras apresentadas como título executivo, o que não chegou a ser apreciado no acórdão recorrido porque se entendeu que a sentença apresentada pelo executado não estava revista e confirmada e que apreciada a mesma como simples meio de prova, nos termos do artigo 1098.º, n.º 2, do CPC, não tem a capacidade para levar à conclusão pretendida pelo executado». Dito isto, conclui-se que o remanescente da taxa de justiça em dívida – € 3.672,00 – afigura-se-nos demasiado elevada, justificando-se, em face do exposto, a redução do seu montante em 50% (€ 3.672,00/2). III. DECISÃO Em face do exposto, julgam parcialmente procedente a apelação e em conformidade: 1) Dispensam o apelante do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida pelo recurso de Apelação; 2) Reduzem para 50% o remanescente da taxa de justiça em dívida relativa ao recurso de Revista. Sem custas porquanto o recorrente procedeu ao pagamento da taxa de justiça devida pelo impulso processual e, não tendo havido resposta às alegações de recurso, não há lugar a custas de parte na presente instância recursiva. Notifique. Évora, 10 de março de 2022 Cristina Dá Mesquita (Relatora) José António Moita (1.º Adjunto) Mata Ribeiro (2.º Adjunto) __________________________________________________ [1] As custas processuais compreendem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte – artigo 529.º, n.º 1, do CPC e artigo 2.º, n.º 1, do RCP. [2] Processo nº 2104/12.8TBALM.L1.S1, relator Abrantes Geraldes. |