Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | ANA PESSOA | ||
Descritores: | EXECUÇÃO PARA ENTREGA DE COISA CERTA QUESTÃO PREJUDICIAL SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO CASO JULGADO | ||
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Data do Acordão: | 12/05/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | I. Exige-se, pois, para declarar a suspensão fundada em prejudicialidade, a comprovação de uma efetiva relação de dependência, de tal modo que a apreciação do litígio esteja efetivamente condicionada pelo que venha a decidir-se na ação prejudicial, a qual constitui, pois, um pressuposto da outra decisão. II. Constituindo a sentença, nos termos do disposto no artigo 621º do Código de Processo Civil, caso julgado nos limites e termos em que julga, é esta decisão judicial que contém e define a obrigação exequenda, pelo que é em função da natureza dos elementos essenciais desta obrigação, tal como consta do título executivo, que se delimita o fim da execução e, por conseguinte, a própria espécie de ação executiva. III. Basta atentar no segmento condenatório constante da alínea b), para facilmente se concluir que a obrigação principal que dele resulta é a “obrigação de entrega da área da fração pertencente aos Exequentes que o Executado mantinha na sua posse. IV. E se é certo resultar ainda do segmento decisório constante da alínea c) da sentença que o Réu (ora executado) está também obrigado à reposição da fração no estado anterior, seguro é também que o facto de ali se afirmar que a dita fração deve ser entregue com a prévia reposição do estado antecedente às obras que o Réu realizou, ocupando parte da área da fração “o”, tal não transmuta, por si só, a prestação de dare em prestação de facere, já que a referida reposição não reveste autonomia em relação à prestação de entrega da coisa. V. Sempre, portanto, que o título configure uma obrigação de prestação de coisa, deverá usar-se o processo de execução para entrega de coisa certa - ainda que esta já não exista, seja objeto de um direito incompatível com o do exequente ou não venha a ser encontrada, casos estes em que tem lugar a subsequente conversão da execução para entrega de coisa certa em execução para pagamento de quantia certa - e não a execução para prestação de facto. (Sumário elaborado pela relatora) | ||
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Decisão Texto Integral: | Processo nº 1446/21.6T8LLE-B.E1 - Recurso de Apelação Tribunal Recorrido: Tribunal da Comarca Local 1 - Juízo de Execução Local 2 – J... Recorrente: AA Recorrida: BB e CC * Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora, * I. RELATÓRIO. Por apenso à execução para entrega de coisa certa que contra si foi instaurada por BB e DD, veio AA deduzir embargos de executado, pedindo que pela procedência dos embargos, se reconheça a existência de exceção dilatória não suprível, com a determinação da extinção da ação executiva, que seja considerado que o executado é dono do bem imóvel cuja posse foi ilegalmente tomada pelos exequentes, que seja reconhecido que a tomada de posse do imóvel pelos exequentes ofende o seu direito real, devendo considerar-se a referida diligência ilegal, por ofensiva aos direitos do executado, que seja reconhecido o erro na forma do processo, anulando todo o processado e que seja impedida a realização de quaisquer obras até que sejam emitidas as competentes e obrigatórias licenças municipais para salvaguarda dos direitos do executado. Para tanto alegou, em suma, que o titulo executivo oferecido à execução é a sentença proferida no processo nº 1074/12.7TBVRS, que os Exequentes indicam erradamente a finalidade do requerimento para entrega de coisa certa, alegando que o executado foi condenado a entregar aos exequentes a área dessa fração autónoma de que dispõe como sendo sua, correspondente ao espaço que se encontra inscrito na matriz predial urbana como fracção autónoma designada pela letra 1, que o Tribunal não condenou a entregar a fração autónoma mas sim o espaço conforme memória descritiva constante da propriedade horizontal inicial, pelo que os Exequentes quiseram e conseguiram enganar o Tribunal. Acrescentou que em face da condenação, a execução tem que ser de prestação de facto, para demolir a fração dos exequentes e repor o imóvel como está descrito na memória descritiva e posteriormente entregar tal espaço (quarto, sala, cozinha, instalação sanitária, despensa, corredor distribuição, sacada e terraço c/a área de 75,60 m2, e a área descoberta de 134,60 m2), devendo a acção executiva começar pelas diligencias prévias tendentes à determinação judicial do prazo para a prestação de facto, sob pena de inexequibilidade, cumprindo ao juiz, uma vez realizadas as diligências necessárias à fixação desse prazo, não constando do título executivo o prazo para a prestação e também não consta dos autos que o prazo haja sido fixado judicialmente por Juiz, existindo uma manifesta violação ao disposto no nº 1 do artigo 874º do Código de Processo Civil e a cominação para a violação ao disposto nos artigos 874º e 875º do Código de Processo Civil é a inexequibilidade, não se ajustando o pedido formulado pelos exequentes à finalidade figurada pela lei, sendo evidente o erro na forma do processo. Mais referiu que teve conhecimento que os Exequentes já têm as chaves do imóvel e já o ocuparam, sem que o Executado tivesse oportunidade de se defender ou de ter sido citado para a ação executiva, pelo que o processo executivo deve ser extinto, por o título executivo ser manifestamente inexequível, sendo o Executado dono e legítimo proprietário em causa, e do imóvel sito no piso superior já há largos anos, cujo gozo e fruição se encontram cedidos a terceiros, o que é do conhecimento dos Exequentes. Alegou ainda que intentou uma ação judicial em que pede a nulidade do titulo constitutivo da propriedade horizontal do edifício em causa, que corre termos sob o nº 97/19.0T8VRS, no Juiz ... do Juízo de Competência Genérica Local 3, do Tribunal Judicial da Comarca Local 1, sendo que o Executado foi condenado a demolir uma parede e a entregar uma parte do espaço da sua fracção e para o fazer tem que ter a posse do imóvel, que para repor a situação é preciso demolir o 3º piso e a fracção dos Exequentes, por forma a poder entregar-lhes o terraço de 134,60 metros quadrados, conforme consta da memória descritiva que deu origem ao título de constituição da propriedade horizontal, já que com a ampliação do 2º piso foram construídas outras fracções autónomas, designadamente a que os Exequentes adquiriram e manteve-se a do Executado e no 3º piso foram erigidas mais duas fracções autónomas que são propriedade do executado, e para cumprir a sentença é preciso demolir todo o terceiro piso, violando, sem fundamento e ilegalmente, o direito de propriedade do Executado e para levar a cabo tais intervenções é obrigatório/fundamental que as obras sejam precedidas da emissão da licença camarária de demolição, entregar novo projeto de arquitetura, novos projetos de especialidade (águas, gás, eletricidade, esgotos, ITDE, águas pluviais, acústica, segurança contra incêndios, térmica, entre outros) e só após a aprovação dos projetos é que a Câmara Municipal poderá emitir a licença de demolição e assim iniciar-se o cumprimento da sentença e demolindo a fração dos Exequentes e as frações dos pisos superiores. Acrescentou ainda se pela ação que intentou, o título constitutivo da propriedade horizontal for considerado nulo, torna-se, também por este motivo, impossível de executar a sentença, já que não se pode repor uma coisa à imagem de um título que não existe e estando o edifício conforme com a Câmara Municipal, * Os Exequentes contestaram, pugnando pela exequibilidade da sentença, alegando que o Embargante pretende discutir de novo a causa, que já foi julgada, com decisão transitada, sendo que o Embargante esteve nove meses, após o trânsito em julgado da sentença condenatória, sem dar um único sinal de pretender cumprir voluntariamente a decisão judicial, após uma década de litigância e os ora Embargados, já plenamente convencidos de que o Embargante jamais cumpriria voluntariamente a decisão judicial, avançaram para a execução, o que fizeram legalmente, tendo entrado na posse e propriedade de um espaço que por direito e reconhecimento judicial a eles pertence, competindo-lhes agora, exigir, ou não, ao Embargante, o eventual derrube de parede e consequentes arranjos na fração autónoma, em cumprimento da lei e dos respetivos regulamentos camarários e a tese de demolir o edifício, como expressamente defende o Embargante, assim como a inexequibilidade da douta sentença transitada, constituiriam um claro desvirtuamento da ordem jurídica, um intolerável abuso de direito. Terminam pedindo que seja julgada improcedente a oposição à execução, absolvendo-se os Embargados de todos os pedidos formulados pelo Embargante. * Por requerimento de 20.06.2023 veio o Executado dar nota de que a sentença proferida no âmbito do processo número 97/19.0T8VRS do Juízo de Competência Genérica Local 3, do Tribunal Judicial da Comarca Local 1, em que é pedida a declaração de nulidade do título constitutivo da propriedade horizontal, que havia julgada a ação improcedente, foi anulada por decisão proferida por este Tribunal da Relação e, invocando tal circunstância, requereu a suspensão da instância por causa prejudicial, até que seja proferida decisão no âmbito da ação referida ação. * Realizou-se a audiência prévia, no âmbito da qual foi proferida decisão que indeferiu a requerida suspensão da instância e foi proferido saneador-sentença, que terminou com o seguinte dispositivo: “Nos termos expostos, o Tribunal decide: a) Julgar os embargos de executado totalmente improcedentes por não provados; b) Condenar o Embargante/executado AA no pagamento das custas e demais encargos com o processo, sem prejuízo da protecção jurídica que lhe foi concedida; Registe e notifique, sendo também o (a) senhor (a) Agente de Execução.”. * Inconformado com tais decisões, veio o Embargante interpor das mesmo, recurso de apelação, apresentando as seguintes conclusões: “A. Analisada toda a sentença, verifica-se que existem matérias sobre as quais o Tribunal a quo não se pronunciou e a apreciação de tais questões não ficou prejudicada, vejamos, B. Refere o Tribunal a quo que “acresce que, a nosso ver, a decisão que venha a ser tomada naqueles autos n.º 97/19.0TBVRS em nada contende com o decidido na acção n.º 1074/12.7TBVRS onde foi proferida a sentença que serve de base à execução, já que ainda que seja declarada a nulidade do título constitutivo da propriedade horizontal, com a consequente submissão do prédio em regime de compropriedade, isso não significa que a quota dos Recorridos/embargados não seja preenchida com a área que corresponde à actualmente denominada fracção autónoma designada pela letra 1, e nessa área está englobado o espaço que corresponde ao espaço que actualmente se encontra inscrito na matriz predial urbana como fracção autónoma designada pela letra 2 e que o Embargante/Recorrente foi condenado a entregar aos Recorridos/Embargado.” C. Ora, não se entende a fundamentação do Tribunal a quo, na medida em que a aceitar tal tese, então o Recorrente via a sua propriedade ser esbulhada sem qualquer título válido para tal. D. Logo é claro que a decisão a proferir no processo n.º 97/19.0TBVRS contende directamente com os presentes autos, na medida em que sendo a acção julgada procedente e o título constitutivo for julgado nulo, então o Recorrente e os Recorridas passam a comproprietários do referido e, por conseguinte, não é lícito a ninguém – nem sequer ao Tribunal – impedir o Recorrente do exercício dos seus direitos de comproprietário. E. Pelo que, a ambiguidade da referida decisão é manifesta, já que a solução oferecida não tem qualquer suporte legal. F. A sentença proferida no processo n.º 1074/12.7TBVRS não visa o direito que os Recorridos pretendem efectivar, porque a matéria relativa à compropriedade nunca foi conhecida, motivo pelo qual, o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra no processo n.º 1075/09.2TBCTB.E.C1 e n.º 806/18.8T8GRD-D-C1, citados pelo Tribunal a quo não têm qualquer enquadramento na presente situação de facto e de direito. G. O que significa que, deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que reconheça a existência de causa prejudicial e ordene a suspensão da instância até trânsito em julgado da decisão a tomar no processo n.º 9719.0TBVRS. II – DA NULIDADE H. O Tribunal a quo apenas deu dois factos como provado, ignorando toda a restante matéria alegada pelo Recorrente. I. Quanto à restante matéria, referiu o Tribunal a quo que “Inexistem quaisquer factos não provados, porquanto provaram-se todos os factos alegados pelas partes e com interesse para a decisão da causa; Quanto aos mais alegado pelas partes, trata-se de factos sem relevância para a decisão ou de matéria conclusiva e/ou de direito.” J. Refere o Tribunal a quo que “acresce que, a nosso ver, a decisão que venha a ser tomada naqueles autos n.º 97/19.0TBVRS em nada contende com o decidido na acção n.º 1074/12.7TBVRS onde foi proferida a sentença que serve de base à execução, já que ainda que seja declarada a nulidade do título constitutivo da propriedade horizontal, com a consequente submissão do prédio em regime de compropriedade, isso não significa que a quota dos Recorridos/embargados não seja preenchida com a área que corresponde à actualmente denominada fracção autónoma designada pela letra 1, e nessa área está englobado o espaço que corresponde ao espaço que actualmente se encontra inscrito na matriz predial urbana como fracção autónoma designada pela letra 2 e que o Embargante/Recorrente foi condenado a entregar aos Recorridos/Embargado.” K. Esta é uma diferença total entre um edifício em regime de compropriedade e um em regime de propriedade horizontal, ou seja, reconhece a divergência entre a situação real e a registal do edifício, o que a nosso ver, coloca em causa a certeza da obrigação. L. Matéria esta que o Tribunal a quo estava obrigado a conhecer e preferiu, simplesmente, ignorar tal petição e causa de pedir. M. Não foram especificados os fundamentos dos factos provados ou não provados pelos documentos juntos, não analisou criticamente as provas, não tirou ilações dos factos instrumentais, resultando assim na nulidade da sentença, violando-se, assim, o disposto no n.º 4 do artigo 607.º do CPC. N. Logo, deve a sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que ordene a realização do julgamento e respectiva produção de prova e, após isso, deve o Tribunal a quo conhecer dos fundamentos alegados nos embargos, produzindo a respectiva fundamentação de facto e de direito, nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil. O. Quando o Tribunal a quo afirma, perentoriamente que “a nosso ver, salvo o devido respeito por opinião contrária, não assiste qualquer razão ao Embargante, pretendendo o mesmo voltar a discutir agora nestes embargos de Recorrente as questões que já foram decididas na acção declarativa de condenação pela 1.ª Instância, pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora e pelo Colendo Supremo Tribunal de Justiça.” P. O Venerando Juiz Desembargador Rui Machado e Moura que decidiu analisar os factos e aplicar o direito no processo exactamente igual que correu termos sob o n.º 1446/21.6T8LLE-A.E1, determinou que “assim, da totalidade das 18 fracções autónomas existentes no edifício, todas possuem licença de utilização e foram averbadas junto da Autoridade Tributária e Aduaneira, sendo que 4 delas pertencem ao Recorrente AA e duas delas estão dadas em comodato às aqui embargantes, uma no 2.º piso na posse da Embargante EE e a outra no 3.º Piso na posse da Embargante FF.” Q. Por fim, contrariando o Tribunal a quo decide-se que “com efeito, sendo nulo o título constitutivo da propriedade horizontal e estando demonstrado nestes embargos a impossibilidade de reposição, determina a lei que o prédio fique sujeito ao regime da compropriedade, ou seja, deixamos de falar em fracções autónomas e é determinado o grau de compropriedade em avos. (…) na verdade, o direito substantivo diz-nos que foram realizadas obras de ampliação, legais e autorizadas pela edilidade competente, que até emitiu a licença de utilização para 18 fracções autónomas e não para 14 fracções autónomas logo é impossível a reposição inicial da memória descritiva do título constitutivo da propriedade horizontal do edifício em causa.” R. Assim sendo, contrariamente ao versado na sentença recorrida, não se está a discutir a mesma causa que deu origem ao título executivo, mas sim a impossibilidade de execução da sentença, por diversas razões alegadas e ignoradas pelo Tribunal a quo. S. A primeira é que, para o direito substantivo, não existem fracções autónomas em virtude da nulidade do título constitutivo da propriedade horizontal e, por conseguinte, não é possível executar a entrega de fracções ou de parte delas, sendo por isso inexequível o título executivo. T. De acordo com o decidido pelo Tribunal da Relação de Évora, as referidas fracções autónomas designadas pelas letras 3 e 4 do referido prédio já não existem, porque o prédio já está de facto em compropriedade de acordo com o direito substantivo, logo o próprio título executivo é nulo, por ser impossível de ser Recorrente por ignora que não existem fracções autónomas, pois com bem decidido pelo Tribunal da Relação de Évora o prédio está em compropriedade. U. Em segundo lugar, é impossível executar a sentença porque é impossível repor o edifício conforme a memória descritiva da propriedade horizontal do edifício em causa e, por essa razão, é o título executivo inexequível, o que o Tribunal a quo ignorou sem se pronunciar sobre tal matéria. V. Aliás, quando o Tribunal a quo se refere a fracções autónomas nesta fase apenas pode fazê-lo por ficção, na medida em que, por força da nulidade do título constitutivo (conforme o Tribunal da Relação de Évora considerou) o prédio está submetido ao regime da compropriedade, o que significa que o título executivo é nulo e inexequível nesta parte. W. Ademais, mais grave é quando o Tribunal tem conhecimento do acórdão supra citado desde 29 de Abril de 2022 e o ignora, o que apenas se pode admitir que tenha sido propositadamente, colocando em causa a própria imparcialidade do tribunal a quo, uma vez que o acórdão citado diz respeito a uma realidade de facto exatamente igual à discutida nos presentes autos, pois diz respeito a uma fracção no mesmo prédio, no mesmo piso e em iguais circunstâncias (fracções essas pertença do Recorrente, tanto as dos presentes autos como a do acórdão citado). X. Ao ignorar propositadamente este acórdão emite uma sentença em profunda contradição com uma decisão de um tribunal hierarquicamente superior ao tribunal a quo, isto é, em profundo desrespeito do tribunal ad quem sem invocar qualquer motivo digno de se considerar para ignorar tal facto. Y. O que põe, sem mais, em causa a imparcialidade do tribunal a quo. Z. Por fim, não se pode entregar uma coisa que não existe e que é impossível de obter. AA. O Tribunal a quo recusou-se também a que a prova fosse produzida e que demonstrará claramente que a sentença recorrida ofende o direito. BB. Aqui chegados, temos uma decisão do Tribunal da Relação de Évora transitada em julgado, onde decide de parte da matéria de facto e temos uma decisão da 1.ª instância sobre idêntica matéria em sentido contrário. CC. O Tribunal a quo ignora que o titulo executivo parte de um pressuposto inexistente que é a existência de uma propriedade horizontal, quando resulta claro dos autos e do aresto supra citado que o prédio está em compropriedade, uma vez que a realidade de facto do prédio não tem qualquer correspondência com a propriedade horizontal registada, pelo que há uma nulidade da propriedade horizontal, motivo pelo qual qualquer remessa para qualquer propriedade horizontal tal como o tribunal a quo é mera ficção, pois as mesmas inexistem juridicamente. DD. Aliás, o que teria sido visto facilmente pelo tribunal a quo, ou pelo tribunal que emitiu uma sentença impossível de executar, caso se deslocassem ao prédio e nesse momento tomariam conhecimento da aberração jurídica que é sentença dada à execução ou a sentença recorrida. EE. Assim sendo só anulando a presente sentença in totum se poderá a começar a fazer alguma justiça. FF. Face ao exposto, não existe outra solução senão julgar o presente recurso procedente, por provado, revogando a sentença recorrida por estar em posição com um Acórdão do Tribunal da Relação de Évora sobre a mesma matéria e ordenar a prolação do despacho saneador, com indicação dos temas da prova e objecto do litígio e a consequente tramitação prevista no Código de Processo Civil. Assim, nestes termos e nos demais de direito que V. Exa., doutamente suprirá deve julgar o presente recurso procedente, por provado, revogando a sentença recorrida, pelo facto de omitir a pronúncia em matérias que lhe foram cometidas, gerando a nulidade da mesma por violação do disposto no n.º 4 do artigo 607.º, n.º 2 do artigo 608.º do Código de Processo Civil conjugado com a alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º do mesmo diploma, para que se faça Justiça!.” * Não foram apresentadas contra-alegações. * II. QUESTÕES A DECIDIR. Sendo o objeto do recurso balizado pelas conclusões do apelante, nos termos preceituados pelos artigos 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC sem prejuízo das questões de que o tribunal «ad quem» possa ou deva conhecer oficiosamente, apenas estando este tribunal adstrito à apreciação das questões suscitadas que sejam relevantes para conhecimento do objeto do recurso, importa apreciar e decidir, - se deve ser determinada a suspensão da instância; - se a sentença enferma das nulidades que lhe vêm imputadas, - da exequibilidade da sentença dada à execução, do acerto do tipo de execução de que os Exequentes lançaram mão e da aptidão da factualidade dada como provada para o conhecimento de mérito no saneador. *** III. FUNDAMENTAÇÃO. III.1. Fundamentação de facto. O Tribunal Recorrido considerou demonstrados os seguintes factos com interesse para a boa decisão da causa: 1. Os exequentes BB e DD, em 31/05/2021, intentaram a execução para entrega de coisa certa contra AA, apresentando como título executivo a sentença, datada de 18/09/2019, proferida no processo nº 1074/12.7TBVRS que correu termos no Juízo Central Cível Local 1-Juiz ..., do Tribunal Judicial da Comarca Local 1, em cujo segmento decisório, consta, além do mais, “V- Decisão. Pelo exposto, ao abrigo dos citados preceitos legais, julgo a acção intentada por BB e DD contra AA procedente, por provada, e em consequência: a) – reconheço os autores como proprietários da fracção autónoma designada pela letra 1, correspondente ao 2º andar direito do prédio urbano sito no Local 4 da Rua 1 com a Rua 2, na freguesia Local 5, concelho Local 3, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ...27..., e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...93, com as características e dimensões referidas na memória descritiva entregue e aprovada pela Câmara Municipal Local 3 aquando da constituição da propriedade horizontal; b) – condeno o réu a entregar aos autores a área dessa fracção autónoma de que dispõe e utiliza como sendo sua, correspondente ao espaço que se encontra inscrito na matriz predial urbana como fracção autónoma designada pela letra 2; c) – condeno o réu a expensas suas proceder à remoção da parede construída para traçar o limite entre a fracção autónoma designada pela letra 1 e o espaço denominado como fracção Letra 2, repondo a fracção autónoma designada pela letra 1 conforme indicado no artº 52º da petição inicial (…)”; 2. No dia 17 de Setembro de 2021 a senhora Agente de Execução procedeu à entrega aos Exequentes, na pessoa do seu Ilustre Mandatário, da área da fracção autónoma designada pela letra 1 que se encontra inscrito na matriz predial urbana como fracção autónoma designada pela letra 2. * III.2.1. Da suspensão por causa prejudicial. Insurge-se o Apelante contra a decisão recorrida no segmento em que indeferiu a suspensão da instância por causa prejudicial. Mas não lhe assiste razão. Vejamos. Dispõe o artigo 272.º, n.º 1, do Código de Processo Civil que o tribunal pode ordenar a suspensão da instância quando a decisão da causa estiver dependente do julgamento de outra já proposta ou quando ocorrer outro motivo justificado. E, nos termos do n.º 2 do artigo 276.º do mesmo diploma, se a decisão da causa prejudicial fizer desaparecer o fundamento ou a razão de ser da causa que estivera suspensa, é esta julgada improcedente. Sem dependência do julgamento de uma causa em relação à decisão de outra não há, pois, de acordo com a definição legal, prejudicialidade, nem, por consequência, motivo para a suspensão da instância. A decisão de suspender a ação dependente tem em vista evitar que, para salvaguarda da unidade do sistema jurídico e da harmonia das decisões judiciais, sejam proferidas decisões contrárias e incompatíveis entre si. Subjacente à suspensão da instância por prejudicialidade estão ainda considerações de racionalidade processual, pois se a decisão de uma das ações retira a razão de ser à outra, não faz sentido desenvolver atividade jurisdicional na ação que resultará prejudicada por tal decisão. O legislador previu, contudo, duas situações em que essa racionalidade não deve relevar: se houver fundadas razões para crer que a causa prejudicial foi intentada unicamente para se obter a suspensão da instância ou, se a causa dependente estiver tão adiantada que os prejuízos da suspensão superem as vantagens da mesma. Exige-se, pois, para declarar a suspensão fundada em prejudicialidade, a comprovação de uma efetiva relação de dependência, de tal modo que a apreciação do litígio esteja efetivamente condicionada pelo que venha a decidir-se na ação prejudicial, a qual constitui, pois, um pressuposto da outra decisão. Como vem sendo entendido de forma praticamente uniforme, a suspensão com fundamento em causa prejudicial não se aplica à execução, pois nesta não há que proferir decisão sobre o fundo da causa, visto que o direito que se pretende efetivar já está declarado; visa dar-se satisfação efetiva a um direito já declarado por sentença ou constante de título com força executiva, pelo que não se verifica o requisito de estar a decisão da causa dependente do julgamento de outra já proposta. A norma prevista no artigo 272º do Código de Processo Civil corresponde ao artigo 284º do Código de Processo Civil de1939 e já então se colocou o problema de saber se a execução podia ou não ser suspensa com fundamento em causa prejudicial pendente, cuja divergência foi dirimida pelo Assento de 24/5/60 (BMJ nº 97, pág.163 ) ao fixar a seguinte jurisprudência – “A execução propriamente dita não pode ser suspensa pelo primeiro fundamento do art. 284 do Código de Processo Civil”, doutrina que, atenta a semelhança dos textos, deve manter-se e considerar-se em vigor[1]. Regressando ao caso dos autos, perante as considerações tecidas, logo tem de concluir-se que não pode proceder a pretendida suspensão da instância executiva. Relativamente à execução uma vez que a suspensão da instância com base na pendência de causa prejudicial não lhe é aplicável, tanto mais que o título dado à execução constitui uma sentença transitada em julgado, decisão que não está, pois, de qualquer modo, dependente do decidido ou a decidir noutra qualquer causa. Em segundo lugar, na ação declarativa que corre termos com o n.º 97/19.0T8VRS peticiona o ora Réu a declaração de nulidade do título constitutivo da propriedade horizontal, com a consequente submissão do prédio ao regime de compropriedade, o que não significa que a quota que os ora Exequentes possuem no prédio venha a ser diversa daquela que lhes foi reconhecida na ação que correu termos com o n.º 1074/12.7TBVRS, na qual foi proferida a decisão dada à execução, e que como foi sublinhado na decisão recorrida, reconheceu aos ora Exequentes o direito de propriedade relativamente à fração “O” do prédio, da mesma fazendo parte área que o ora Réu fez “incluir” na fração denominada “fração Letra 2 que “não tem pois qualquer individualidade enquanto fração autónoma independente nem o R. formulada qualquer pretensão de ver declarado tal direito de propriedade”[2]. Tendo sido reconhecido aos ora Exequentes, por decisão transitada em julgado, que adquiriram a fração real como era realmente constando do título constitutivo ou do registo, com as características físicas de configuração, espaço e dimensões e não quaisquer outras, não se vê como a decisão a proferir na ação 97/19.0T8VRS possa condicionar tal reconhecimento, ou alterar o direito reconhecido, ou ainda inviabilizar a respetiva execução. Falha, pois, o indicado pressuposto do nexo de prejudicialidade. Conclui-se desta forma que Nenhuma ambiguidade se vislumbra na decisão que apreciou o pedido de suspensão, pois ali se expuseram os fundamentos pelos quais se entendeu que a mesma não devia ser determinada, e se concluiu pelo respetivo indeferimento, existindo plena harmonia e clareza entre os fundamentos e a decisão. O que determina a improcedência da apelação neste segmento. * III.2.2. Da nulidade invocada. Assaca o Apelante à sentença recorrida o vício de nulidade por entender que a sentença não se pronunciou relativamente aos factos por si alegados,, não analisou criticamente a prova, nem se analisou a verificação do regime de compropriedade sobre o edifício e a diferença entre a situação real e registal do edifício. Conclui pedindo que seja determinada a realização do julgamento e respetiva produção de prova, produzindo a respetiva fundamentação de facto e de direito. São diversas as questões da nulidade da sentença e a da prematuridade da prolação de sentença em fase de saneador, pelo que começaremos por analisar a invocada nulidade. Como é sabido, as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo deverão ser sempre fundamentadas (n.º 1 do art.º 154.º do Código de Processo Civil) o que, de resto, consubstancia um imperativo constitucional (art.º 205.º n.º 1 da Constituição da República Portuguesa). Assim, as sentenças e os despachos não fundamentados ou em que é omitida pronúncia sobre que questões que devessem ser apreciadas, padecem de nulidade (artigos 613.º n.º 3 e 615.º n.º 1 als. b) e d)). A sentença, como ato jurisdicional, pode atentar contra as regras próprias da sua elaboração e estruturação ou contra o conteúdo e limites do poder à sombra da qual é decretada, e então torna-se passível de nulidade, nos termos do artigo 615º do CPC. A este respeito, estipula-se no apontado normativo, sob a epígrafe de “Causas de nulidade da sentença” que: “1 - É nula a sentença quando: a) (…); b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) (…)” . O vício previsto na alínea b) é um vício formal, em sentido lato, traduzido em error in procedendo ou erro de atividade que afeta a validade da sentença que não se confunde motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afeta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Por seu turno, a nulidade prevista na al. d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC reconduz-se a um vício de conteúdo , ou seja, vício que enferma a própria decisão judicial em si, nos fundamentos, na decisão, ou nos raciocínios lógicos que os ligam, verificando-se quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento e terá de ser aferida, tendo em consideração o disposto no artigo 608.º, n.º 2 do Código de Processo Civil. A causa da nulidade a que se refere este preceito relaciona-se com a inobservância do disposto na segunda parte do referido n.º 2 do artigo 608.º do mesmo diploma e visa sancionar o desrespeito, pelo julgador, do comando contido na parte final deste normativo, nos termos da qual o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, com exceção daquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, não podendo ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras. Resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação não significa considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito, as partes tenham deduzido ou o próprio juiz possa inicialmente ter admitido: por um lado, através da prova, foi feita a triagem entre as soluções que deixaram de poder ser consideradas e aquelas a que a discussão jurídica ficou reduzida ; por outro lado, o juiz não está sujeito às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas (art.º 664.º) e, uma vez motivadamente tomada determinada orientação, as restantes que as partes hajam defendido, nomeadamente nas suas alegações de direito, não têm de ser separadamente analisadas” . In casu, como decorre da decisão recorrida, o Tribunal Recorrido não deixou de enunciar os fundamentos de facto, elencando de forma clara os que considerou provados, com relevância da causa. E não pode validamente pôr-se em dúvida que elencou também os não provados, referindo expressamente que “quanto ao mais alegado pelas partes, tratam-se de factos sem relevância para a decisão ou matéria conclusiva ou de direito”. Decisão que motivou sob o ponto 3. Da sentença. fazendo uma análise crítica da prova documental, esclarecendo as razões pelas quais não considerou provados os factos em questão. Enunciou ainda os fundamentos de direito em que baseou a decisão e entre todos os fundamentos, de facto e de direito e tal decisão, nenhuma contradição se surpreende, antes se verifica total coerência e harmonia entre a fundamentação e a decisão. Verificando-se, pois, que na sentença recorrida constam os factos e as razões de direito em que o tribunal alicerçou a sua decisão e esta é consequência lógica daquela fundamentação, é evidente que aquela peça processual não está inquinada de qualquer nulidade. Apurar se tal decisão está certa ou não, isto é, se o tribunal errou na apreciação da matéria de facto, extraiu da matéria provada todas as consequências que deveria tirar, ou enquadrou adequadamente os factos no quadro jurídico aplicável, ou ainda se decidiu prematuramente, é uma questão de mérito, que não uma questão de nulidade. Não restam dúvidas de que o Apelante não concorda com a fundamentação da sentença nos pontos salientados. Sucede que tal não constitui fundamento de nulidade da sentença, antes se prendendo com o mérito do recurso em apreciação. Desatende-se, pois, a arguição das nulidades em apreço. * III.2.3. Da exequibilidade da sentença dada à execução, do acerto do tipo de execução de que os Exequentes lançaram mão e da aptidão da factualidade dada como provada para o conhecimento de mérito no saneador. O Recorrente entende que é inexigível a obrigação exequenda, por ser impossível de executar a obrigação de entrega que a sentença exequenda reconheceu, que o processo de execução para entrega não é adequado e que os autos devem prosseguir para prova de factos que permanecem controvertidos. Estando em causa o conhecimento imediato do pedido deduzido pelo autor ou pelo réu, em sede de despacho saneador, em razão da viabilidade ou inviabilidade da pretensão daquele, importa não esquecer que, como explica Lebre de Freitas (Código de Processo Civil Anotado, volume 2º, 3ª edição, pág. 659), tal conhecimento é admissível “quando o processo contenha todos os elementos necessários para uma decisão conscienciosa, segundo as várias soluções plausíveis de direito e não apenas tendo em vista a partilhada pelo juiz da causa” e, designadamente, quando dos factos alegados pelo autor (na petição, na eventual réplica e em articulado complementar ou superveniente que porventura tenha tido lugar), determinam a procedência do pedido e os alegados pelo réu, para contrariar a pretensão do autor, não determinam a inviabilidade do mesmo. Em tal situação, é inútil produzir prova sobre os factos alegados, visto que eles nunca serão suficientes para obviar à procedência do pedido. Do mesmo modo, António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa (Código de Processo Civil Anotado, vol. I, 2018, pág. 696-697) explicam que a “antecipação do conhecimento de mérito pressupõe que, independentemente de estar em jogo matéria de direito ou de facto, o estado do processo possibilite tal decisão, sem necessidade de mais provas”, designadamente quando “seja indiferente para qualquer das soluções plausíveis a prova dos factos que permaneçam controvertidos: se, de acordo com as soluções plausíveis da questão de direito, a decisão final de modo algum puder ser afectada com a prova dos factos controvertidos, não existe qualquer interesse na enunciação dos temas da prova e, por isso, nada impede que o juiz profira logo decisão de mérito”. Do mesmo modo “se o conjunto dos factos alegados pelo autor (factos constitutivos) não preenche de modo algum as condições de procedência da acção, torna-se indiferente a sua prova e, por conseguinte, inútil o prosseguimento da acção para audiência final”. E mais explicam que “nem sequer está afastada a possibilidade de apreciação do mérito, apesar da existência de outras soluções plausíveis sustentadas em matéria de facto ainda controvertida, desde que o juiz esteja ciente da segurança da sua decisão, embora neste caso deva avaliar os riscos de uma posterior anulação pela Relação, com fundamento da necessidade de ampliação da matéria de facto (artigo 662º, nº. 2, al. c), in fine)”. * De harmonia com o estabelecido no artigo 10º, ns. 4 e 6 do Código de Processo Civil, «dizem-se ações executivas aquelas em que o autor requer as providências adequadas à realização coativa de uma obrigação que lhe é devida», podendo o seu fim «consistir no pagamento de quantia certa, na entrega de coisa certa ou na prestação de um facto, quer positivo, quer negativo». Objeto da ação executiva é a própria pretensão insatisfeita, sendo sua função ou finalidade a realização coativa de uma prestação patrimonial de pagamento de quantia pecuniária, de entrega de coisa ou de facto positivo ou negativo, fungível ou infungível, efetivando-se deste modo o direito violado. Diferentemente do que acontece com a ação declarativa, a ação executiva não se destina a discutir e definir direitos, mas, antes, a executar um direito ou interesse legalmente protegido já definido, pelo que necessário se torna que a obrigação devida ao credor tenha que estar apresentada com a necessária segurança no título que a funda, quer no que toca aos seus sujeitos, quer na sua existência e conteúdo, devendo ainda revelar-se com clareza, seja pela sua constituição, seja pelo seu reconhecimento. Nos termos do n.º 5 do artigo 10.º do Código de Processo Civil, toda a execução tem por base um título, pelo qual se determinam o fim e os limites da ação executiva. O título executivo, para além de determinar o fim da execução, que pode consistir no pagamento de quantia certa, na entrega de coisa certa ou na prestação de um facto, quer positivo, quer negativo (n.º 6 do artigo 10.º citado), define os limites objetivos (montante da quantia, identidade da coisa, especificação do facto) e os limites subjetivos (identidade das partes) em que se irá desenvolver a ação executiva. Quando o título executivo esteja em falta (artigo 726.º, n.º 2, al. a), do CPC), consequência será a extinção superveniente de execução (artigos 732º, n.º 4 e 734.º, n.º 1, do CPC). Como se refere no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 01 de julho de 2021[3]: “podemos, assim, concluir que o título executivo realiza uma tripla função. Por um lado, delimita o fim da execução, isto é determina, em função da obrigação que ele encerra, se a ação executiva tem por finalidade o pagamento de quantia certa, a entrega de coisa certa ou a prestação de facto. Por outro lado, estabelece os limites da execução, ou seja, o credor não pode pedir mais do que aquilo que o título executivo lhe dá. E também delimita subjetivamente a execução.” Ora, entre os títulos que podem servir de base à execução encontram-se as sentenças condenatórias [artigo 703.º, n.º 1, alínea a), do Código de Processo Civil]. É conhecida a larga controvérsia que a expressão destacada tem suscitado na doutrina e jurisprudência portuguesas. A expressão “sentenças condenatórias” constante do atual artigo 703º, n.º 1, al. a) CPC, bem como do artigo 46º/1 al a) do anterior CPC, veio substituir a expressão usada no artigo 46º do CPC 39, “sentenças de condenação”, sendo que, com essa alteração, visou-se esclarecer que a exequibilidade das sentenças não se reporta somente àquelas proferidas nas ações de condenação, mas igualmente àquelas proferidas nas ações de simples apreciação ou nas ações constitutivas (então referidas, respetivamente, nas als. a) e c) do nº. 2 do citado artigo 4º do CPC61, hoje als. a) e c) do nº. 3 do artigo 10º do CPC), no segmento condenatório, como sucede, nomeadamente, no que concerne a custas, a multas ou indemnização por litigância de má fé, a sentenças homologatórias. Entendemos que na expressão “sentenças condenatórias”, de que fala o artigo 703º, nº 1 al a), do CPC, estão incluídas todas aquelas sentenças que, de forma expressa ou implícita, impõem a alguém determinada responsabilidade ou cumprimento de uma obrigação, ou seja, a sentença, para ser exequível, não tem que, necessariamente, condenar expressamente no cumprimento de uma obrigação bastando que essa obrigação dela inequivocamente emirja, pois que tal entendimento, não se mostrando rejeitado na lei processual, se mostra mais conforme com as novas conceções do processo civil, cada vez mais despegadas dos vícios do formalismo e conceitualismo, visando acima de tudo pôr o processo ao serviço da justiça material, com economia máxima de meios e de tempo[4]. Também no Acórdão de 28.06.2023 desta Secção proferido no âmbito do apenso “B” (recurso de apelação em separado) destes autos, e que aqui seguimos de perto, se entendeu a tal propósito: “Este preceito deve ser interpretado no sentido de que a sentença condenatória que constitui título executivo é qualquer decisão judicial proferida no decurso de processo que contenha, no seu dispositivo, pelo menos um segmento de condenação. Referem a este propósito Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Sousa[1]: «Numa primeira leitura, a expressão “sentenças condenatórias” apenas abarcaria as decisões de mérito, total ou parcialmente favoráveis ao autor (ou ao reconvinte), proferidas no âmbito de ações declarativas de condenação definidas pelo art. 10º, n°3, al. b). Todavia, uma análise mais profunda do preceito, também na sua vertente histórica e racional, permite a inclusão de quaisquer outras decisões que tenham um carácter injuntivo ou das quais resulte alguma imposição a que o réu (ou reconvindo) fique adstrito. Aliás, raramente as ações declarativas se apresentam com um figurino exclusivamente condenatório, tendo frequentemente associadas outras pretensões, em acumulação real ou aparente (…). Também se inserem no mesmo segmento normativo as decisões que, independentemente da natureza da ação e do verdadeiro objeto do processo, imponham ao destinatário uma obrigação (em geral de natureza pecuniária), o mesmo sucedendo com os despachos judiciais e as decisões arbitrais, conforme estabelece o art. 705° (…). A doutrina e a jurisprudência maioritárias vêm assumindo a exequibilidade das sentenças constitutivas de que resulte implicitamente a imposição de uma obrigação. Assim o defendiam Alberto dos Reis (CPC anot., vol. I, p. 152 e Processo de Execução, vol. I, p. 128) e Anselmo de Castro, para quem a sentença podia constituir título suficiente para iniciar o processo executivo para entrega de coisa certa, desde que desde que contivesse implícita tal obrigação, nomeadamente nos casos de ação de preferência ou de ação de divisão de coisa comum (Direito Processual Civil Declaratório, vol. I, pp. 112 e 113 e Ação Executiva, p. 16). No mesmo sentido Lopes Cardoso, defendendo que bastava que ficasse declarada ou constituída a obrigação para ser viável a instauração de processo de execução (Manual da Ação Executiva, p. 43). Também Teixeira de Sousa defende a exequibilidade das sentenças constitutivas que “contenham de forma implícita um dever de cumprimento”, o que, em seu entender, se verifica quando o pedido de condenação, “se tivesse sido cumulado com o pedido de mera apreciação ou constitutivo”, formasse com este uma “cumulação aparente”, por se referir à mesma realidade económica (Ação Executiva Singular, p. 73). Outrossim Abrantes Geraldes, em “Títulos executivos”, Themis nº 7, pp. 56-60. O mesmo caminho vem trilhando a jurisprudência: cf. STJ 18-3-97, CJ, t I, p. 160, segundo o qual "a sentença proferida em ação de preferência, apesar de constitutiva, constitui titulo executivo para obter a entrega de coisa certa"; no mesmo sentido STJ 8-1-15, I17-B/1999, STJ 27-5-99 99B269, RG 11-2-21, 26/18 e RP 13-5-99, CJ, t. I11, p. 187.» Foi nesta base, aliás, que no acórdão do STJ de 13.05.2021[2], se decidiu atribuir força executiva a sentença proferida em ação de impugnação pauliana, e no recente acórdão desta Relação de 11.05.2023[3] e no acórdão da Relação do Porto de 10.03.2022[4], a sentença homologatória da partilha em processo de inventário. Assim também se decidiu no acórdão da Relação de Guimarães de 30.03.2023[5], em cujo sumário se consignou: «I - O preceito contido na alínea a) do 703º do C.P.Civil de 2013 (“sentenças condenatórias”) deve ser interpretado no sentido de que a sentença condenatória que constitui título executivo é qualquer decisão judicial proferida no decurso de processo que contenha, no decisório, pelo menos um segmento de condenação. II – Por isso, constituem título executivo as decisões que, independentemente da natureza e do objeto da acção, imponham ao destinatário visado o cumprimento de uma obrigação.» * Feitas estas considerações, importa ter em conta que o título executivo que serve de base à presente execução é a sentença, transitada em julgado, que reconhecendo o direito de propriedade que os ali Autores invocavam, condenou o aí Réu a: - a entregar aos autores a área dessa fracção autónoma de que dispõe e utiliza como sendo sua, correspondente ao espaço que se encontra inscrito na matriz predial urbana como fracção autónoma designada pela letra 2; - a a expensas suas proceder à remoção da parede construída para traçar o limite entre a fracção autónoma designada pela letra 1 e o espaço denominado como fracção Letra 2, repondo a fracção autónoma designada pela letra 1 conforme indicado no artº 52º da petição inicial (…)”. É em face do referido título, da natureza da prestação tal como consta do mesmo, que deve aferir-se se a execução para entrega de coisa certa é o processo de execução adequado, conforme referido no citado artigo 10º. Estamos, assim, perante uma sentença condenatória, transitada em julgado, que constitui título executivo, nos termos das disposições conjugadas o disposto no artigo 10º, n.º 5, 703º, nº 1, al. a) e 704º, nº 1, todos do Código de Processo Civil, que consubstancia um caso julgado que se tem de respeitar. Constituindo a sentença, nos termos do disposto no artigo 621º do Código de Processo Civil, caso julgado nos limites e termos em que julga, é esta decisão judicial que contém e define a obrigação exequenda, pelo que é em função da natureza dos elementos essenciais desta obrigação, tal como consta do título executivo, que se delimita o fim da execução e, por conseguinte, a própria espécie de ação executiva. Basta atentar no segmento condenatório constante da alínea b), para facilmente se concluir que a obrigação principal que dele resulta é a “obrigação de entrega da área da fração pertencente aos Exequentes que o Executado mantinha na sua posse. E se é certo resultar ainda do segmento decisório constante da alínea c) da sentença que o Réu (ora executado) está também obrigado à reposição da fração no estado anterior, seguro é também que o facto de ali se afirmar que a dita fração deve ser entregue com a prévia reposição do estado antecedente às obras que o Réu realizou, ocupando parte da área da fração “o”, tal não transmuta, por si só, a prestação de dare em prestação de facere, já que a referida reposição não reveste autonomia em relação à prestação de entrega da coisa[5]. Efetivamente, como refere Lebre de Freitas (in “Ação Executiva depois da reforma da reforma”, 5ª ed. Coimbra Editora 2009, pág. 367) “o qualificativo certa em a ver com o pressuposto processual da certeza da prestação, pelo que não obsta à execução a necessidade de se proceder à individualização (ou concretização) das unidades que serão objeto da prestação a efetuar (…). Sempre, portanto, que o título configure uma obrigação de prestação de coisa, deverá usar-se o processo de execução para entrega de coisa certa, anda que esta já não exista, seja objeto de um direito incompatível com o do exequente ou não venha a ser encontrada, casos estes em que tem lugar a subsequente conversão da execução para entrega de coisa certa em execução para pagamento de quantia certa.” Se, com a entrega da coisa por via coerciva, a prestação for satisfeita com atraso ou com a coisa em estado diferente do devido, assistirá então ao credor o direito a ser indemnizado, cumulativamente, pelo prejuízo sofrido mediante aplicação subsidiária, com as necessárias aplicações, do disposto no artigos 867º, do CPC. E que a prestação não é impossível, comprova-o a circunstância de a entrega ter sido já efetuada. Às demais objeções colocadas pelo ora Apelante, respondem a própria decisão dada à execução e o Acórdão desta Relação que sobre a mesma versou. Ali se ponderaram todas as vicissitudes relativas às obras realizadas, o alvará de licença de utilização n.º 119/2002 obtido na sequência das mesmas e se enfrentou a questão da seguinte forma: “No caso em discussão, demonstrou-se que os autores são proprietários de uma fração autónoma, designada pela letra 1, correspondente ao 2º andar direito, do prédio urbano, constituído em propriedade horizontal, sito em Local 5, no Local 4 da Rua 1 com a Rua 2, descrito na Conservatória do Registo Predial Local 3, sob a ficha nº...27. (…) Mais resulta assente que, após aprovação da Câmara Municipal Local 3, foi outorgado título constitutivo da propriedade horizontal, constando da respetiva memória descritiva que a fração designada pela letra 1, corresponde ao 2º andar direito, destinado a habitação, com quarto, sala, cozinha, instalação sanitária, despensa, corredor distribuição, sacada e terraço, com a área coberta de 75,60m2 e área descoberta de 134,60m2- cfr. doc. de fls.47/49. Mostra-se, ainda, provado que o réu AA e o anterior réu GG apresentaram junto da Câmara Municipal Local 3 pedido de alteração da memória descritiva do prédio urbano, para ampliação da construção existente para mais dois fogos e duas arrecadações, pedido que foi deferido, por despacho de 26.01.2000, emitindo-se o alvará de licença de construção nº...0, datado de 20.03.2000- cfr. doc. de fls.85. E por despacho de 27.06.2002 foi autorizada a utilização da ampliação de construção desses dois fogos e duas arrecadações, emitindo-se o alvará de licença de utilização nº119/2002, datado de 13.09.2002- cfr.doc. de fls.88. Após efetuadas obras pelos réus no prédio urbano, foi alterada a estrutura interna, passando a existir, em vez de 14 frações, 18 espaços individualizados correspondentes a frações, e a fração autónoma, designada pela letra 1, adquirida pelos autores, foi dividida e parte da respetiva área deu lugar ao espaço que foi inscrito na matriz predial no ano de 2004 como fracção autónoma designada pela letra 1, correspondente ao 2º andar, letra 5, composto por quarto, sala, cozinha, instalação sanitária, corredor de distribuição e sacadas, com área bruta de 62,10m2 e área bruta dependente de 8,460m2, cujo titular do rendimento é o réu AA- cfr. doc. de fls. 297vº/298 e 101/102. As mencionadas alterações físicas efetuadas pelos réus não constam de alteração do título constitutivo da propriedade horizontal, a efetuar através de escritura pública, denotando a posição dos autores oposição a qualquer modificação desse título. Por outro lado, a nova realidade que as partes não discutem existir no mencionado prédio urbano também não se mostra refletida no registo predial, sendo certo que o réu não invoca qualquer título aquisitivo do direito de propriedade sobre a identificada fracção autónoma designada pela letra 1, não possuindo a sua inscrição matricial a virtualidade que pretende. Como já se referiu, na propriedade horizontal o direito de propriedade exclusiva só se pode exercer sobre as frações autónomas, tal como estão individualizadas no título constitutivo. E assim será até que esse título seja objeto de modificação (art.º 1419.º, n.º 1 do Código Civil). Assim, seguindo de perto o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 20.10.2011, acessível in www.dgsi.pt., diremos que a modificação do título constitutivo da propriedade horizontal apenas pode ser efetuada de acordo com o preceituado naquele normativo e nunca através de decisão judicial (vide, ainda, o Acórdão daquele Tribunal de 29.06.2010, proferido no Agravo nº46/10). Na verdade, a constituição de propriedade horizontal por parte de decisão do Tribunal, como flui do art.º 1417.º do Código Civil, só é admissível em ação de divisão de coisa comum ou em processo de inventário, a requerimento de consorte, e, mesmo assim, desde que sejam unidades independentes, distintas e isoladas entre si, com saída própria para uma parte comum do prédio ou para a via pública. Essa situação, de resto, seria de todo inviável aqui, porque a presente Acão, seria além do mais formalmente inadequada para a alteração do título constitutivo, porque não obedece sequer a essas formas de processo (ação de divisão de coisa comum e inventário). E se só nesse condicionalismo pode o Tribunal constituir a propriedade horizontal, as mesmas considerações e requisitos de substância e de forma se devem exigir para se proceder à sua alteração (vide, neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 13.12.2007, acessível in www.dgsi.pt, no qual se refere que “na propriedade horizontal (…) o direito de propriedade exclusiva só se pode exercer sobre frações autónomas, perfeitamente individualizadas no título constitutivo e não sobre partes delas”.). Esta insusceptibilidade de aquisição, fora do quadro legal apontado, verifica-se tanto quanto a partes de frações autónomas, como quanto a partes das “partes comuns”, seja por usucapião ou por qualquer outro modo de aquisição do direito de propriedade (vide, neste sentido, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 11.06.2007 e do Supremo Tribunal de Justiça de 06.12.2018, acessíveis in www.dgsi.pt). Defende o réu que a Câmara Municipal Local 3 autorizou a alteração efetuada e que podia alterar o título constitutivo da propriedade horizontal porque era o único proprietário do prédio urbano. É hoje pacífico que aos requisitos civis, plasmados no Código Civil, acrescem requisitos administrativos, impostos pelo Regime Jurídico da Urbanização e Edificação, “decorrentes de exigências múltiplas – segurança, salubridade, arquitetónica, estética, urbanística – que têm de ser respeitadas por condicionarem a construção de edifícios e sua utilização” (vide Carvalho Fernandes, in “Lições de Direitos Reais”, p. 372). Na verdade, além da certificação pela Câmara Municipal de que o edifício satisfaz os requisitos legais para a sua constituição em propriedade horizontal, estão sujeitas a autorização administrativa a utilização dos edifícios e suas frações, bem como as alterações da utilização dos mesmos (art.º 4.º, n.º 4 do RJUE), podendo ela, no caso de constituída a propriedade horizontal, ter por objeto o edifício na sua totalidade ou cada uma das suas frações autónomas (art.º 66.º, n.º 1 desse diploma). Destina-se essa autorização “a verificar a conformidade da obra concluída com o projeto aprovado e com as condições de licenciamento ou da comunicação prévia” e quando não haja lugar a realização de obras “a verificar a conformidade do uso previsto com as normas legais e regulamentares aplicáveis e a idoneidade do edifício ou sua fração autónoma para o fim pretendido” (art.º 62.º, nºs 1 e 2 do mesmo diploma). A falta destes, como dos primeiros dos requisitos apontados, importa a nulidade do título constitutivo da propriedade horizontal, como parece resultar dos nºs 1 e 2 do art.º 1416.º do Código Civil. Sucede, porém, que o deferimento do pedido de alteração (por ampliação com dois novos fogos e 2 arrecadações) formulado junto da Câmara Municipal não basta para que possa ser alterado o título constitutivo da propriedade horizontal. Na verdade, pese embora o réu fosse o único proprietário e, como tal, tivesse legitimidade para apresentar o pedido de alteração, necessário seria que existisse alteração do título constitutivo da propriedade horizontal a efetuar através de escritura pública (art.º 1419.º, n.º 1 do Código Civil). Em consequência, e tal como se concluiu no citado aresto, não poderá operar a modificação efetuada pelo réu, a qual não foi acompanhada da apontada alteração do título constitutivo, à qual agora se opõem os autores (e a autora do processo n.º980/12.3TBVRS), nem o Tribunal poderá reconhecê-la, “na medida em que esse objetivo é legalmente impossível, o Tribunal não pode determinar a alteração do título constitutivo da propriedade horizontal sem o acordo prévio de todos os condóminos, a que acresce a exigência de documento comprovativo emitido pela Câmara Municipal em que essa alteração está de acordo com as leis e regulamentos”. Assim sendo, não possui o espaço ocupado pelo réu qualquer individualidade, não podendo ser reconhecido enquanto fração autónoma independente como pretende, logo, não pode ser objeto de direito de propriedade da sua parte. Aliás, é notório que o réu não invoca qualquer modo de aquisição do direito de propriedade sobre essa fração autónoma, sempre se dizendo que, tratando-se de fração autónoma de edifício constituído em regime de propriedade horizontal, verifica-se a insusceptibilidade de aquisição do direito de propriedade sobre parte de uma fração autónoma.(…) Ou seja, não são as obras realizadas pelo réu, ou a respetiva aprovação camarária, que possui a virtualidade de alterar o título constitutivo da propriedade horizontal. Logo, reconhecendo-se os autores como exclusivos titulares do direito de propriedade sobre a fração autónoma, designada pela letra 1, a qual é parcialmente ocupada pelo réu sem que para tanto possua título que o legitime, necessariamente terá de proceder a sua pretensão.” (destacado nosso). Não se compreende, pois, a alusão do Apelante a uma situação de compropriedade. Existe um prédio constituído em propriedade horizontal e o direito de propriedade dos ora Exequentes sobre a fração “O” que adquiriram com a área e a composição que consta do título constitutivo, anterior às obras efetuadas pelo Executado, que não adquiriu qualquer fração, porquanto não se mostra individualizada. Não podendo voltar a discutir-se as questões ali dirimidas, dir-se-á que dúvidas não podem validamente colocar-se acerca suficiência dos factos constante do elenco dos provados para decisão - a obrigação de entrega validamente constituída, por um lado, e a falta de direito do ora Executado a deduzir oposição à mesma fundada na propriedade da denominada “fração Letra 2, que não tem “qualquer individualidade enquanto fração” que dos mesmos decorrem autorizam a decisão sem necessidade de produção de qualquer prova para concluir pela improcedência da oposição, que se funda em objeções já apreciadas na decisão dada à execução por decisão transitada em julgado. A decisão proferida no apenso A não tem qualquer relevância para o caso, porquanto se refere a um despacho de indeferimento liminar de embargos de terceiro, que foi revogado, tendo sido determinado o prosseguimento dos autos, que vieram a terminar com nova decisão de improcedência, já transitada em julgado. Improcedem, pois, todas as conclusões de recurso. * Resta concluir. Tendo a sentença dada à execução força executiva para a entrega determinada e sendo possível a obrigação, como se viu, nenhuma censura merece a decisão recorrida que julgou no saneador, a oposição por embargos improcedente. * IV. Decisão. Em face do exposto, acordam em julgar a apelação improcedente, por não provada e, em consequência, em manter a decisão recorrida. Custas pelo Apelante. Registe e notifique. * Évora, 05-12-2024 Ana Pessoa Sónia Moura Elisabete Valente __________________________________________________ [1] Cf. Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, 2ª ed., pág. 281/282, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, Código de Processo Civil Anotado, 2018, Vol. I, pg. 315. |