Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
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| Relator: | MANUEL BARGADO | ||
| Descritores: | SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA FALECIMENTO DE PARTE HABILITAÇÃO DE HERDEIROS CITAÇÃO FALTA DE CITAÇÃO | ||
| Data do Acordão: | 04/28/2022 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Sumário: | I - Notificada a decisão que considere habilitado o sucessor da pessoa falecida, ou extinta, cessa de imediato a causa da suspensão por força do preceituado no art. 276, nº 1, al. a), do CPC. II - Em tal caso não é exigível qualquer intervenção posterior do Juiz a declarar finda a suspensão da instância. III - Impondo o artigo 189º do CPC ao réu que intervier no processo o ónus de arguir logo a falta da sua citação, da interpretação literal do preceito decorre que, não tendo a ré invocado a falta da sua citação aquando da junção aos autos da procuração forense, incumpriu tal ónus, em consequência do que é de considerar sanado o vício. IV – O artigo 189º do CPC deve, porém, ser objeto de uma interpretação atualista face à tramitação eletrónica do processo, pois resulta da Portaria 280/2013, de 26.08 que a junção da procuração é condição de acesso ao processo eletrónico, pelo que a expressão “logo” prevista no referido normativo, não pode ser simultânea a essa junção. V – Ainda que se conclua que a nulidade da citação dos executados não ficou sanada em virtude da não arguição imediata da falta da citação aquando da junção pelos executados da procuração forense, sempre haverá que considerar suprida a nulidade por falta da respetiva arguição no prazo geral de 10 dias previsto no artigo 149º, nº 1, do CPC, contado desde a junção aos autos de tal procuração. VI – Em qualquer caso, é irrelevante a arguida falta de citação, pois os executados/recorrentes foram citados onde efetivamente tinham de ser, ou seja, no apenso de habilitação, sabendo-se que o habilitado apenas vai ocupar a posição do falecido, exercendo os direitos e cumprindo as obrigações que a este competiam, estando sujeito à sua anterior atuação processual, devendo aceitar a tramitação no estado em que a encontrar e apenas impulsionando para o futuro e dentro destes limites, o processo. (Sumário pelo Relator) | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO No Juízo de Execução de Loulé – Juiz 2, em execução com processo comum para pagamento de quantia certa, instaurada por Intrum Portugal, Unipessoal, Lda. contra H.S.V.B.M.C. e H.F.S.M.C., vieram os habilitados/executados J.L.B.M.C. e J.P.B.M.C., por requerimento de 02.12.2021, arguir a sua falta de citação, requerendo que seja declarada a nulidade de todos os atos praticados no processo sem a sua prévia citação. Alegam, em síntese, que foram citados no incidente de habilitação de herdeiros, mas nunca foram citados para deduzir oposição à execução e à penhora. Sobre este requerimento recaiu despacho a indeferir o requerido, com fundamento em suprimento da nulidade de falta de citação. Inconformados, os executados interpuseram recurso daquele despacho, pugnando pela respetiva revogação e consideração como tempestiva e procedente a arguição da nulidade da sua citação, finalizando a respetiva alegação com as conclusões que a seguir se transcrevem: « I – Compulsados os autos, alcança-se com inequívoca clareza que, transitada em julgado a sentença datada de 20.02.2020, proferida no apenso A atinente ao incidente de Habilitação, por morte de H.F.S.M.C., ao arrepio do aí determinado, nunca os autos foram conclusos ao Meretissimo Juiz a quo, e, em conformidade nunca foi determinada a cessação da suspensão nos termos do artigo 276º, nº 1, al. a) do CPC, daí que a tramitação subsequente dos autos ofende o disposto nos artigos 620º e segs. do CPC. II – Portanto, dúvidas não restam, que os autos, por força da douta sentença de habilitação de 20.02.2020, proferida no Apenso A., estão suspensos e assim devem considerar-se e manter-se, enquanto os autos não foram conclusos para que seja determinada a cessação da suspensão, conforme determinado, expressa e inequivocamente, o que importa a conclusão que a arguição da nulidade da citação e dos atos posteriores é tempestiva, ainda que se aceite, sem conceder, a posição perfilhada no despacho recorrido. III – A posição adotada no despacho recorrido, constitui uma posição, senão isolada, pelo menos minoritária, que aliás, prescinde da realidade imposta pelos presentes autos e pela tramitação electrónica da ação executiva. (cf. entre outros os acórdãos desta Relação de 03-11-2016 (relator: Tomé de Carvalho), proferido no processo n.º 1573/10.5TBLLE-C.E1, e de 22-10-2020 (relator: Manuel Bargado), proferido no processo n.º 926/19.8T8STB.E1, os acórdãos da Relação de Lisboa de 06-07-2017 (relator: António Santos), proferido no processo n.º 21296/12.0YYLSB-A.L1-6, e de 05-11-2019 (relatora: Maria da Conceição Saavedra), proferido no processo n.º 66733/05.5YYLSB-C.L1-7, os acórdãos da Relação de Guimarães de 29-06-2017 (relator: Jorge Teixeira), proferido no processo n.º 1762/16.9T8VNF-I.G1, e de 23-01-2020 (relatora: Fernanda Proença Fernandes), proferido no processo n.º 17/19,1T8PVL.G1, e o acórdão da Relação de Coimbra de 24-04-2018 (relator: Isaías Pádua), proferido no processo n.º 608 /10.6TBSRT-B.C1, todos publicados em www.dgsi.pt. IV – Da tramitação do processo, decorre com meridiana clareza que, várias foram as vezes que, quer através do acesso via Citius, quer presencialmente, na seção de execução, os Mandatários dos Executados tentaram a consulta dos autos, tendo obtido, reiteradamente, a resposta que enquanto não estivesse assegurada a citação dos executados, os autos estariam indisponíveis para consulta, aliás, o Mandatário dos Executados, tentou desbloquear a consulta do processo ou pelo menos confirmar as razões que lhe eram comunicadas na Seção, tendo apresentado reclamação no Apoio Citius, tendo, em resposta, recebido, o email de 26.05.2021, donde depreendeu que estavam em curso diligências de citação dos executados, o que face aos incidentes de habilitação não seria de descartar. V – Sem fundamento credível o Tribunal entendeu que os Executados, nos diversos requerimentos apresentados, nunca arguiram a nulidade decorrente da falta de citação, não se preocupando, sequer, de perceber o que de errado ocorreu na tramitação processual, se falta de citação, se irregularidade de citação, omitindo decisão ou pronúncia quanto ao requerido pelos Executados, em evidente atropelo ao princípio da cooperação previsto no artigo 7º nº 1 do CPC, no seu requerimento de 08.10.2020, que, aliás, qualifica, ainda que erradamente, como primeira intervenção no processo, e fazendo, tábua razão das inúmeras deslocações À Seção de processos. VI – O sentido de intervenção no processo a que alude o artigo 189.º do Código de Processo Civil, para efeitos de sanação da nulidade da citação, tem que ser interpretado no sentido de uma atuação efetiva da parte no processo, através da prática de ato ou de atos que lhe permitam ter um conhecimento pleno do mesmo, ou seja, a junção de procuração forense é, necessariamente, um ato prévio à consulta eletrónica do processo, que não configura uma verdadeira intervenção processual VII – Nos presentes autos, os Executados, dentro do prazo de 10 dias prescrito no art. 149º do CPC, tendo em vista a arguição da falta e/ou irregularidade da sua citação, pediram os esclarecimentos pertinentes e suspensão dos prazos em curso, pedido esse a que o Tribunal omitiu pronúncia e nem sequer identifica no despacho recorrido VIII – Desta forma, ao entender de outro modo, indeferindo a pretensão dos Executados por considerar sanada a nulidades, com fundamento na falta de citação, o Tribunal a quo fez uma incorreta aplicação do direito, tendo violado o que dispõem os artigos 189.º do Código de Processo Civil, 27.º da Portaria 280/2013, de 26 de Agosto, bem como os princípios constitucionais contemplados nos artigos 2.º e 20.º da Constituição da República Portuguesa – princípio da tutela da confiança, que decorre do princípio do Estado de Direito Democrático e princípio da tutela jurisdicional efetiva e de acesso aos tribunais.» A exequente contra-alegou, defendendo a manutenção da decisão recorrida. Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir. II – ÂMBITO DO RECURSO Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso (arts. 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), a questão essencial a decidir consubstancia-se em saber se está ou não sanada a alegada falta de citação dos executados/recorrentes. III – FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS Embora sem os discriminar separadamente, a decisão recorrida fundamentou-se nos seguintes factos: 1 - Os executados/recorrentes foram citados no apenso A (incidente de habilitação de herdeiros) tendo, por requerimento apresentado neste processo em 08.10.2020, constituído advogado nos autos. 2 - Posteriormente, por requerimento apresentado em 05.03.2021 os executados alegaram a impossibilidade de consulta do processo eletrónico. 3 – Por requerimento apresentado em 20.04.2021 reclamaram do ato do agente de execução, onde foi determinada a modalidade de venda e valor base do bem e por requerimento dessa mesma data, alegaram de novo a impossibilidade de consulta do processo eletrónico. 4 - Em todos os referidos requerimentos, nunca os executados arguiram a sua falta de citação, nem quando reclamaram do ato do agente de execução. Além destes factos, importa ainda considerar os seguintes: 5 – A primitiva executada H.S.V.B.M.C. e os ora recorrentes foram, por sentença de 20.02.2020, habilitados a prosseguir a execução no lugar do falecido H.F.S.M.C. (cfr. apenso A). 6 – Os ora recorrentes foram, por sentença de 03.03.2021, habilitados a prosseguir a execução no lugar da executada H.S.V.B.M.C., entretanto falecida (cfr. apenso B). 7 – Os recorrentes, que já haviam sido citados no apenso de habilitação A, foram notificados para contestar no apenso de habilitação B. 8 – A primitiva executada H.S.V.B.M.C., foi citada em 27.02.2019 para, no prazo de 20 (vinte dias): a. Pagar a quantia em dívida, juros e custas; ou querendo, b. Deduzir oposição à execução através de embargos de executado; e/ou c. Deduzir oposição à penhora. O DIREITO Ponderou-se na decisão recorrida que «os executados tiveram a primeira intervenção no processo em 08.10.2021 ao constituir advogado (no sentido que a junção aos autos, pelo réu, de procuração a mandatário judicial constitui uma intervenção no processo para efeitos de sanação da nulidade decorrente da falta de citação, (…), seguida de outras intervenções em 05.03.2021 e 20.04.2021, nunca arguindo a falta de citação quando nada impedia que o fizessem se assim o entendessem», julgando-se desse modo improcedente a arguida falta de citação dos executados. Nas respetivas conclusões suscitam os recorrentes o seguinte: - mantém-se a suspensão da instância executiva, por não ter sido proferido despacho judicial a declarar a cessação da suspensão, o que importa a conclusão que a arguição da nulidade da citação e dos atos posteriores é tempestiva (conclusões I e II); - a posição adotada no despacho recorrido, constitui uma posição, senão isolada, pelo menos minoritária, que não teve em conta a tramitação eletrónica da ação executiva (conclusão III); - insucesso na tentativa, quer através do acesso via Citius, quer presencialmente, na seção de execução, de consulta dos autos, o que foi relatado ao tribunal que, a esse propósito omitiu pronúncia, mostrando-se assim violado o princípio da cooperação previsto no artigo 7º nº 1 do CPC (conclusões IV, V e VII); - a junção de procuração forense é um ato prévio à consulta eletrónica do processo, que não configura uma verdadeira intervenção processual para efeitos de arguição da nulidade de falta de citação, mostrando-se violados os artigos 189º do CPC e 27º da Portaria 280/2013, de 26 de agosto, bem como os princípios constitucionais contemplados nos artigos 2.º e 20.º da Constituição da República Portuguesa – princípio da tutela da confiança, que decorre do princípio do Estado de Direito Democrático e princípio da tutela jurisdicional efetiva e de acesso aos tribunais (conclusões VI e VIII). Relativamente à questão da suspensão da instância, não pode ser acolhida a argumentação dos recorrentes. Estabelece o art. 269º, nº 1, al. a), do CPC, que a instância se suspende com o falecimento de alguma das partes. Nesta circunstância, junto ao processo documento que prove tal facto, suspende-se imediatamente a instância, por força do disposto no art. 270º, nº 1, do CPC. Quer isto dizer que enquanto durar a suspensão só podem praticar-se validamente os atos urgentes destinados a evitar dano irreparável, não correndo os prazos judiciais enquanto decorrer a suspensão (art. 275º do CPC). E por imperativo legal a suspensão da instância só cessa «quando for notificada a decisão que considere habilitado o sucessor da pessoa falecida ou extinta» (art. 276, nº 1, al. a), do CPC). Ora, in casu, foi proferida sentença de habilitação de herdeiros pelo Tribunal a quo, da qual os recorrentes foram devidamente notificados. Ou seja, foi a parte devidamente «notificada da decisão que considere habilitado o sucessor da pessoa falecida» nos precisos termos do citado normativo. Destarte, cumprido o referido imperativo legal – com a notificação da sentença de habilitação de herdeiros – a conclusão que se impõe extrair é a de que cessou a suspensão da instância. E cessou automaticamente com aquela notificação, feita à parte processual, da sentença de habilitação de herdeiros. Na verdade, depois desse ato de notificação, a lei não exige qualquer intervenção do juiz a declarar finda a suspensão, nem tão pouco exige que se proceda a nova notificação às partes a “lembrar-lhes” o fim da suspensão da instância. O que bem se compreende, pois como bem se evidencia no Acórdão da Relação de Lisboa de 02.04.2009[1], «porque estando as partes representadas por mandatários judiciais se entende, e bem, que estes são conhecedores da lei, quer substantiva, quer adjectiva, quer ainda das restantes normas que integram o ordenamento jurídico português e, por conseguinte, da respectiva tramitação processual subsequente. Por outro lado, porque vigorando no âmbito do processo civil os princípios da economia e celeridade processual, bem como o princípio da cooperação, que visam, em conjunto, evitar a prática de actos inúteis para que, com brevidade e eficácia, se obtenha a justa composição do litígio, não faria muito sentido que se exigisse do Juiz a prática de actos que a própria lei dispensa.» Assim, sem necessidade de outros considerandos, só resta concluir que não foi cometida qualquer omissão de formalidade que importe a nulidade dos atos processuais praticados e que permitisse concluir pela tempestividade da arguição da falta da citação. Quanto à alegada posição minoritária adotada na decisão recorrida e ao facto de a junção de procuração ser um ato prévio à consulta eletrónica do processo, que não configura uma verdadeira intervenção processual, bem como ao não acesso ao processo, há que ter em consideração, antes de mais, a seguinte factualidade: - Os executados/recorrentes foram citados no apenso A (incidente de habilitação de herdeiros) tendo, por requerimento apresentado neste processo em 08.10.2020, constituído advogado nos autos. - Posteriormente, por requerimento apresentado em 05.03.2021 os executados alegaram a impossibilidade de consulta do processo eletrónico. - Por requerimento apresentado em 20.04.2021 reclamaram do ato do agente de execução, onde foi determinada a modalidade de venda e valor base do bem e por requerimento dessa mesma data, alegaram de novo a impossibilidade de consulta do processo eletrónico. - Em todos os referidos requerimentos, nunca os executados arguiram a sua falta de citação, nem quando reclamaram do ato do agente de execução. Dúvidas não há de que a junção de procuração outorgada pelos recorrentes a advogados configura um ato de intervenção no processo, o qual pressupõe que aqueles têm conhecimento da existência dos autos, sendo certo que tal intervenção não foi acompanhada pela invocação da falta da sua citação, pelo que cumpre aferir se deverá considerar-se sanada a nulidade em causa. Impondo o artigo 189º do CPC ao réu que intervier no processo o ónus de arguir logo a falta da sua citação, da interpretação literal do preceito decorre que, não tendo a ré invocado a falta da sua citação aquando da junção aos autos da procuração forense, incumpriu tal ónus, em consequência do que é de considerar sanado o vício. Alguma jurisprudência recente tem defendido uma interpretação atualista do mencionado preceito, face à tramitação eletrónica do processo, por se entender que resulta da Portaria n.º 280/2013, de 26.08, que a junção da procuração é condição de acesso ao processo eletrónico e que tal acesso é que permitirá ao réu tomar conhecimento da respetiva tramitação, bem como da eventual falta da sua citação, o que impede se considerem reunidas condições que permitam a arguição do vício em simultâneo com a junção da procuração, conforme decorre da interpretação literal do mencionado preceito. Neste sentido, a título exemplificativo, pode citar-se o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24.11.2020[2]. com o seguinte sumário: «I - A nulidade decorrente da falta de citação deve ser arguida no próprio acto que constitua a sua primeira intervenção no processo, sob pena de sanação nos termos do art. 189.º do CPC. II - A intervenção do réu no processo, relevante para os fins do art. 189.º do CPC, pressupõe o conhecimento, ou a possibilidade de conhecimento, da pendência do processo, bastando para tal a junção de procuração a mandatário judicial, pois tal acto permite presumir que o réu conhece o processo e prescindiu conscientemente de arguir a falta de citação. III - No caso dos autos, com a junção da procuração e acesso electrónico aos autos o executado tomou conhecimento de que ainda não tinha sido citado, assim como passou a ter conhecimento de todos os elementos do processo. IV - Defendemos uma interpretação actualista do art. 189.º do CPC face à tramitação electrónica do processo. Com efeito, resulta da Portaria 280/2013 de 26-08 que a junção da procuração é condição de acesso ao processo electrónico. De modo que a expressão “logo” prevista no art. 189.º do CPC não pode ser simultânea a essa junção. (…).»[3] Ora, no caso em apreço, a tomada de posição quanto à referida questão não assume relevo autónomo, uma vez que, ainda que se conclua que a nulidade não ficou sanada em virtude da não arguição imediata da falta da citação aquando da junção pelos executados da procuração forense, sempre haverá que considerar suprida a nulidade por falta da respetiva arguição no prazo geral de 10 dias previsto no artigo 149º, nº 1, do CPC, contado desde a junção aos autos de tal procuração. Tendo a junção das procurações aos autos ocorrido a 08.10.2020, data a partir da qual passaram os executados a ter acesso eletrónico ao processo, através dos mandatários judiciais que constituíram, o prazo de 10 dias, fixado no mencionado artigo 149º, nº 1, terminou a 19.10.2020, sem que tenha a nulidade sido invocada pelos executados, que a suscitaram pela primeira vez no requerimento que apresentaram em 02.12.2021, isto é, mais de um ano depois. É certo que o executado J.L.B.M.C. deu conta nos autos, na mesma data em que juntou a procuração (08.10.2020), que em deslocação ao Tribunal o seu mandatário foi informado que o processo não estava acessível para consulta, porquanto os autos não continham prova da sua citação para os termos do processo. Ora, uma vez que a consulta eletrónica não é a única via de aceder ao processo, uma vez que as partes têm o direito de examinar e consultar o processo na secretaria, de obter cópias e certidões de quaisquer peças nele incorporadas e igual direito tem qualquer pessoa capaz de exercer o mandato judicial ou que revele interesse atendível (artigo 163º, nº 2, do CPC), nada impedia que os recorrentes tivessem conhecimento de toda a tramitação do processo executivo. E, seja como for, o certo é que por requerimento apresentado em 20.04.2021, os executados reclamaram do ato do agente de execução, onde foi determinada a modalidade de venda e valor base do bem, sem terem arguido a sua falta de citação. Ademais, sempre se dirá que é de todo irrelevante a arguida falta de citação, pois os executados/recorrentes foram citados onde efetivamente tinham de ser, ou seja, no apenso A de habilitação, sabendo-se que o habilitado apenas vai ocupar a posição do falecido, exercendo os direitos e cumprindo as obrigações que a este competiam, estando sujeito à sua anterior atuação processual, devendo aceitar a tramitação no estado em que a encontrar e apenas impulsionando para o futuro e dentro destes limites, o processo[4]. Ora, tendo a primitiva executada sido já citada na execução, é evidente que não havia lugar à citação dos habilitados/executados. Por último, a solução acolhida na decisão recorrida, ao invés do que sustentam os recorrentes, não afronta «os princípios constitucionais contemplados nos artigos 2.º e 20.º da Constituição da República Portuguesa – princípio da tutela da confiança, que decorre do princípio do Estado de Direito Democrático e princípio da tutela jurisdicional efetiva e do acesso aos tribunais», uma vez que o legislador dispõe de ampla margem de liberdade na concreta modelação do processo, não estando vedada a imposição de ónus processuais às partes, desde que os regimes adjetivos que consagre se revelem funcionalmente adequados e não envolvam a criação de obstáculos que dificultem arbitrariamente ou de forma desproporcionada, o direito de acesso aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efetiva[5], e a sanação da nulidade decorrente da falta de citação não suscita, a nosso ver, tais reservas uma vez que a preclusão processual (sanação da nulidade) depende de ato cujo domínio é inteiramente da parte que pode intervir no processo, ou não, conforme lhe parecer mais adequado à defesa dos seus interesses, ou seja, retardar a sua intervenção por forma a fazê-la coincidir com a arguição da nulidade[6]. Por conseguinte, improcedem as conclusões das alegações dos executados, não se mostrando violadas as normas invocadas ou quaisquer outras. Vencidos no recurso, suportarão os executados/recorrentes as respetivas custas – artigo 527º, nºs 1 e 2, do CPC. IV – DECISÃO Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida. Custas pelos recorrentes. * __________________________________________________Évora, 28 de abril de 2022 (Acórdão assinado digitalmente no Citius) Manuel Bargado (relator) Francisco Xavier (1º adjunto) Maria João Sousa e Faro (2º adjunto) [1] Proc. 242-D/2001.L1-8, in www.dgsi.pt. [2] Proferido na revista n.º 2087/17.8T8OAZ-A.P1.S1 - 6.ª Secção, disponível in www.stj.pt. [3] No mesmo sentido decidiram, entre outros, os acórdãos desta Relação de 03.11.2016 (proc. 1573/10.5TBLLE-C.E1 e de 22.10.2020 (proc. 926/19.8T8STB.E1), relatado pelo ora relator, os acórdãos da Relação de Lisboa de 06.07.2017 (proc. 21296/12.0YYLSB-A.L1-6), e de 05.11.2019 (proc. 66733/05.5YYLSB-C.L1-7), os acórdãos da Relação de Guimarães de 29.06.2017 (proc. 1762/16.9T8VNF-I.G1), e de 23.01.2020 (proc. 17/19.1T8PVL.G1), e o acórdão da Relação de Coimbra de 24.04.2018 (proc. 608 /10.6TBSRT-B.C1), todos disponíveis in www.dgsi.pt. [4] Cfr. Acórdão da Relação de Lisboa de 06.02.2007, proc. 9198/2006-1, in www.dgsi.pt. [5] Cfr. Lopes do Rego, Comentários ao Código de Processo Civil, Vol. I, 2ª ed., p. 21. [6] Cfr. Acórdão desta Relação de 30.06.2021, proc. 1044/17.9T8ENT-A.E1, in www.dgsi.pt. |