Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
12/12.1YREVR
Relator: MARIA FERNANDA PALMA
Descritores: DADOS DE TRÁFEGO
AUTORIZAÇÃO JUDICIAL
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE
Data do Acordão: 06/05/2012
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NÃO PROVIDO
Sumário:
1. Estando em causa investigação por crime de difamação através da internet, não é admissível o acesso a dados de tráfego, por via de autorização judicial, dado que tal ilícito não consta, nem do catálogo previsto no art. 187.º do CPP, nem da definição de crime grave do art. 2.º, n.º 1, alínea g), da Lei n.º 32/2008, de 17.07.
2. O princípio da legalidade obsta a que, para esse efeito, se equipare ao crime de injúria incluído nesse catálogo.
Decisão Texto Integral:
Processo nº 12/12.1YREVR

Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a secção criminal do Tribunal da Relação de Évora

Nos presentes autos de inquérito que com o nº 26/11.9TAPSR, correm seus termos junto do Tribunal Judicial da Comarca de Ponte de Sôr, a título de acto Jurisdicional e após requerimento formulado pelo Ministério Público, a Mmª Juiz proferiu o seguinte despacho, este datado de 15-12-2011:
“Nos presentes autos de inquérito, veio o Ministério Público, ao abrigo do disposto nos artigos 187.º, nº1, alínea a), 189.º, nºs 1 e 2 e 269.º, nº1, alínea e), todas as disposições legais do Código de Processo Penal, por reputar indispensável para a descoberta da verdade dos factos denunciados, requerer que se oficie ao operador de
Internet.Pt que forneça todos os dados do utilizador de IP 188.80.239.206, entre as 10h43m54s e as 10h4521s (GTM) do dia 21 de Janeiro de 2011.
Cumpre apreciar e decidir do requerido.
Em fase de inquérito, cabe exclusivamente ao juiz de instrução criminal, nos termos do disposto no artigo 269.º, nº 1, alínea e) do Código de Processo Penal (para o que ora importa considerar) ordenar ou autorizar “ a intercepção, gravação ou registo de conversações ou comunicações nos termos dos artigos 187.º e 189.º.”
Perante esta disposição legal, importa aferir qual o tratamento jurídico a dar ao pedido formulados, reportando ao tipo de dados requeridos, o que impele à convocação, para o efeito, do regime jurídico plasmado na Lei nº 41/2004, de 18 de Agosto.
Da análise da supra referida Lei e na esteira do que tem sido aventado pela jurisprudência (salienta-se, a titulo de exemplo o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 06.12.2006 e os acórdãos da Relação de Lisboa de 23.06.2004 e 15.05.2003 - este último, não obstante proferido em data anterior à data de entrada em vigor da Lei ora em análise, mantém a sua actualidade e pertinência - todos disponíveis para consulta em www.dgsi.pt) há que distinguir, no que aos serviços de telecomunicações diz respeito, três tipos de dados: dados de base, dados de tráfego e dados de conteúdo.
Os dados de base respeitam à identificação dos emissores ou destinatários das comunicações, evidenciando, assim, a mera conexão a uma rede pública de telecomunicações, não sendo os mesmos susceptíveis de revelarem ou identificarem uma comunicação. São, assim, prévios e instrumentais de qualquer comunicação. A título de exemplo indicam-se o número, a identificação e a morada do utilizador do serviço.
Os dados de tráfego estão definidos no art. 2.º n.º 1 alínea d) da aludida lei, como sendo os dados funcionais necessários ao estabelecimento de uma ligação ou comunicação e gerados pela utilização da rede (como exemplo, a localização do utilizador, localização do destinatário, duração da utilização, data e hora, frequência).
Por seu turno, os dados de conteúdo são, como o próprio nome indica, os que respeitam ao próprio conteúdo da mensagem transmitida. Esta específica distinção foi igualmente dissecada e acolhida nos Pareceres do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República n.ºs 16/94 e 21/2000 in www.dgsi.pt, este último transformado na Directiva n.º 5/2000, publicada no DR, II Série, de 28.08.2000.
Atentos os direitos fundamentais constitucionalmente consagrados nos artigos 26.º, n.º1 e 34.º, n.ºs 1 e 4 da Constituição da República Portuguesa e que estão na base da protecção das telecomunicações, os dados que impliquem o acesso a elementos da própria comunicação estão sujeitos ao regime ínsito no artigo 189.º, nº2 do Código de Processo Penal. Falamos, assim, da obtenção e junção aos autos de dados de localização celular ou de registos de realização de conversações ou comunicações.
Consequentemente, encontram-se estes dois últimos tipo de dados expressamente abrangidos na previsão da alínea e) do n.º 1 do artigo 269.º do Código de Processo Penal, não se suscitando dúvidas quanto à sua inclusão no sigilo das telecomunicações, à sua recondução ao regime das intercepções telefónicas e à necessidade de autorização de divulgação de tais dados mediante prévio despacho judicial.
Aqui chegados, atento o requerido pelo Ministério Público, consideramos, salvo melhor entendimento, que o seu pedido de informações se reconduz, entre o mais, à noção supra explanada de dados de tráfego.
Nestes termos, consideramos que o pedido de tais informações se enquadra nas funções exclusivamente cometidas ao juiz de instrução criminal, em sede de inquérito, tais como definidas pelos artigos 268.º, nº 1, alíneas a) a f) e 269.º, ambas as disposições do Código de Processo Penal.
Cumpre aferir se estão reunidos todos os requisitos que a lei consagra para que tal autorização seja concedida, sendo que desde já avançamos entender em sentido negativo.
Ainda que possamos entender que a diligência requeridas se revela oportuna e necessária, considerando o crime em investigação – um crime de difamação através da Internet – constata-se não ser admissível a autorização, nos termos do disposto no artigo 187.º, nº 1 do Código de Processo Penal, na medida crime em investigação se não encontra compreendido no catálogo plasmado no supra referido artigo 187.º, nº 1 e o mesmo efectua um elenco taxativo que não admite qualquer interpretação extensiva.
Nestes termos, por inverificação da subsunção do peticionado ao disposto no artigo 187.º, nº 1, do Código de Processo Penal indefiro o requerido.”

Inconformado com o decidido, recorreu o Ministério Público, nos termos da sua motivação constante de fls. 12 a 17 dos presentes autos de recurso em separado, concluindo nos seguintes termos:
1. Por decisão de fls. 167 a 169, proferida pela Mmª. Juíza de Instrução Criminal junto do Tribunal Judicial de Ponte de Sôr foi indeferida a promoção do Ministério Público de solicitar ao operador de telecomunicações os elementos atinentes aos dados de tráfego relativos ao mail “zepaduardo20201@hotmail.com”.
2.Nos presentes autos investiga-se a prática de um crime de difamação previsto e punido pelo artigos 180º, nº 1 do Código Penal.
3. Torna-se imprescindível para a investigação criminal obter junto do fornecedor das comunicações electrónicas nacionais a identificação (nome, morada, contacto telefónico) do utilizador em que se encontrava registado o IP 188.80.239.206, entre as 10h43m54s e 10h45m21s (GMT), do dia 21 de Janeiro de 2011, o qual tratando-se de um IP dinâmico exige a obtenção e análise das horas e pontos de acesso, sendo que sem tais elementos não será possível avançar com a investigação nos presentes autos.
4. Entendeu a Mm. Juíza de Instrução Criminal que estando sujeita a sua obtenção às regras dos crimes de catálogo previstos no artigo 187º, nº 1, do CPP, aplicável ex vi por força do artigo 189º do CPP, no presente caso fica vedado o acesso a tais dados em razão de os factos em causa nos autos não serem susceptíveis de integrar nenhum dos crimes ai previstos, nem crime punível com pena de prisão que seja superior, no seu máximo, a 3 anos.
4.Salvo o devido respeito, que é muito, não podemos concordar com tal entendimento da Mm.ª Juíza de Instrução Criminal, nomeadamente de exclusão dos crimes de catálogo referidos no artigo 187º do CPP o crime de difamação previsto no artigo 180.º do Código Penal.
5. Como refere o douto Acórdão do Tribunal da relação de Guimarães, “o argumento é exactamente o da equiparação do crime de difamação ao crime de injúria (crê-se, aliás, que quando o legislador se refere a injúria o faz em sentido literal de desonra e não com o sentido jurídico-penal), sob pena de, doutra forma, como se diz naquela douta peça, a prática dum crime de injúrias por via telemática só seria possível aquando duma videoconferência, situação completamente restritiva e injustificada quando num qualquer crime de difamação em causa estão precisamente os mesmos bens jurídicos que no crime de injúrias”.
6. Ao fazer referência ao crime de injúrias o legislador quis também ai englobar o crime de difamação pois este tem subjacente o mesmo bem jurídico – honra e consideração.
7. A decisão da Mm. Juíza de Instrução Criminal violou o disposto nos arts. 26º, nº. 1 da C.R.P. e artigos 187º a 190º, 268º e 269º do Código de Processo Penal e 2º da Lei n.º 41/2004, de 18 de Agosto.
Nestes termos, e noutros que V. Exas. doutamente suprirão, deverá ser dado provimento ao recurso ora apresentado, devendo a decisão proferida pela Mm.ª Juíza de Instrução Criminal ser revogada e substituída por outra que ordene à Portugal Telecom o fornecimento dos elementos pretendidos pelo Ministério Público, com o que se fará justiça.

Neste Tribunal da Relação de Évora, a Exmª Procuradora-Geral Ajunta emitiu o seu parecer, cujo teor se passa a transcrever, dado o seu relevante contributo jurídico para a decisão do objecto do recurso:

“O Ministério Público veio interpor recurso do despacho judicial proferido a 15 de Dezembro de 2011, nos autos de inquérito n.° 26/11.9TAPSR, dos serviços do Ministério Público de Ponte de Sôr, que indeferiu o seu requerimento no sentido de ser ordenado ao provedor de serviço da Internet PT.com que fornecesse os dados do utilizador do IP 188.80.239.206, entre as 10h43m54s e 10h54m21s (GMT), do dia 21 de Janeiro de 2011, por ter considerado que, ainda que se entendesse que a diligência requerida se revelava oportuna e necessária, considerando o crime em investigação - um crime de difamação através da Internet -, não era admissível a autorização da divulgação dos dados solicitados, nos termos do art. 187°, n.° 1, do CPP, na medida em que o crime em investigação se não encontra compreendido no catálogo plasmado no referido preceito legal, e este efectuar um elenco taxativo que não admite qualquer interpretação extensiva.
Defende, no entanto, o recorrente que o legislador, ao fazer referência, no art. 187°, n.° 1, alínea e), do CPP, ao crime de injúria, quis também aí englobar o crime de difamação, pois este tem subjacente o mesmo bem jurídico - honra e consideração.
No presente recurso suscitam-se assim duas questões:
- A primeira é saber-se se a recolha de prova pretendida pelo Ministério no inquérito recai no âmbito de aplicação do art. 187°, n.° 1, do CPP, só sendo assim admissível se se verificarem os requisitos previstos neste preceito legal e se for ordenada pelo juiz de instrução, por força do disposto no art. 269°, n.° 1, al. e), do CPP;
- A segunda é saber-se se, neste caso, se verificam os requisitos previstos neste preceito legal, mormente se é possível a interpretação extensiva defendida pelo recorrente e considerar-se que a alínea e), ao fazer referência ao crime de injúria, também abarca o crime de difamação.
Relativamente à primeira questão, afigura-se-nos que a resposta só pode ser afirmativa.
Aliás, o recorrente também não impugna o despacho recorrido na parte em que considerou, atento o requerido pelo Ministério Público, que o seu pedido de informações se reconduzia à noção de dados de tráfego.
Sobre esta questão, rege, actualmente, a Lei n.° 109/2009, de 15 de Setembro, cujo objecto, conforme estipula o art. Io, é estabelecer "as disposições penais materiais e processuais, bem como as disposições relativas à cooperação internacional em matéria penal, relativas ao domínio do cibercrime e da recolha de prova em suporte electrónico, transpondo para a ordem jurídica interna a Decisão Quadro n.°2005/222/JAI, do Conselho, de 24 de Fevereiro, relativa a ataques contra sistemas de informação, e adaptando o direito interno à Convenção sobre Cibercrime do Conselho da Europa."
O art. 2o, al. c), deste diploma legal define como "«Dados de tráfego», os dados informáticos relacionados com uma comunicação efectuada por meio de um sistema informático, gerados por este sistema como elemento de uma cadeia de comunicação, indicando a origem da comunicação, o destino, o trajecto, a hora, a data, o tamanho, a duração ou o tipo do serviço subjacente”, incluindo-se assim nesta definição as informações pretendidas pelo Ministério Público que visam a identificação de IP dinâmico, sendo necessária, para se apurar a identidade do seu titular, conforme informa a PT, no ofício de que se encontra cópia a fls. 3, "a análise do rasto da comunicação electrónica, ou seja não basta o IP só por si, mas sim a data e hora de ligação do mesmo à internet, isto é, a comunicação concretamente efectuada".
Ora, o art. 14° deste diploma legal, que prevê que, quando no decurso do processo se tome necessário à descoberta da verdade obter dados informáticos específicos e determinados, armazenados num determinado sistema informático, a autoridade judiciária competente ordene a quem tenha a disponibilidade ou controlo desses dados que os comunique ao processo, sob pena de punição por desobediência, permitindo assim que essa ordem seja dada pelo Ministério Público, na fase inquérito, exclui, no entanto, no n.° 4, dessa informação os dados de tráfego, quando refere que pode ser ordenado a fornecedores de serviços "que comuniquem ao processo dados relativos aos seus clientes ou assinantes, neles se incluindo qualquer informação diferente dos dados relativos ao tráfego ou ao conteúdo”.
Assim, a obtenção de dados de tráfego tem de obedecer ao disposto no art. 18o do citado diploma legal que rege a intercepção de comunicações.
A alínea b) do n.° 1 deste preceito legal prevê que "É admissível o recurso à intercepção de comunicações em processo relativos a crimes: Cometidos por meio de um sistema informático ou em relação aos quais seja necessário proceder à recolha de prova em suporte electrónico, quando tais crimes se encontrem previstos no artigo 187.° do Código de Processo Penal."
E o n.° 2 deste preceito legal determina que "A intercepção e o registo de transmissões de dados informáticos só podem ser autorizados durante o inquérito, se houver razões para crer que a diligência é indispensável para a descoberta da verdade ou que a prova seria, de outra forma, impossível ou muito difícil de obter, por despacho fundamentado do juiz de instrução e mediante requerimento do Ministério Público."
Por seu lado, o n.° 3 deste preceito legal prevê que "A intercepção pode destinar-se ao registo de dados relativos ao conteúdo das comunicações ou visar apenas a recolha e registo de dados de tráfego" e o n.° 4 determina que "Em tudo o que não for contrariado pelo presente artigo, à intercepção e registo de transmissões de dados informáticos é aplicável o regime da intercepção e gravação de conversações ou comunicações telefónicas constante dos artigos 187°, 188.° e 190. ° do Código de Processo Penal. "
Afigura-se-nos assim que, após a entrada em vigor da Lei n.° 109/2009, de 15 de Setembro, não restam dúvidas que as informações que o Ministério Público pretende que a PT dê, que visam a obtenção de dados de tráfego, têm de obedecer aos requisitos previstos no art. 187° do CPP, aplicável por força do disposto no art. 18° daquele diploma legal, só sendo assim admissível a recolha de tais informações se o crime em investigação for um dos crimes previstos no n.° 1 deste preceito legal.
Aliás, antes da vigência deste diploma legal, o Parecer n.° 21/2000, de 16 de Junho de 2000, da Procuradoria-Geral da República, obrigatório para o Ministério Público, por força da Directiva n.° 5/2000, publicada no D.R. - II Série, n.° 198, de 28-08-2000, tinha formulado a seguinte 2a conclusão:
«Na fase de inquérito, tais elementos de informação, quando atinentes a dados de tráfego ou a dados de conteúdo, apenas poderão ser fornecidos às autoridades judiciárias, pelos operadores de telecomunicações, nos termos e pelo modo em que a lei de processo penal permite a intercepção das comunicações, dependendo de ordem ou autorização do juiz de instrução [artigos 187.°, 190.° e 269.°, n.° 1, alínea c), do Código de Processo Penal]».
Importa agora, uma vez que o despacho recorrido reconheceu que a informação pretendida pelo Ministério Público se revelava oportuna e necessária, determinar se o crime de difamação em investigação nos presentes autos se pode enquadrar na previsão da alínea e) do n.° do art. 187° do Cód. Proc. Penal, como defende o digno recorrente.
Ora, salvo o devido respeito por opinião contrária, afigura-se-nos que não.
Efectivamente, pese embora a pertinência dos argumentos explanados no acórdão da Relação de Guimarães de 12-04-2010, Proc. 1341/08.4TAVCT, citado pelo recorrente, tem sido entendimento unânime, quer da doutrina, quer da jurisprudência, que o n.° 1 do art. 187° do CPP estabelece um catálogo fechado de crimes em que é admissível a intercepção telefónica como meio de obtenção de prova, tendo por fonte o disposto no art. 34°, n.° 4 da Constituição da República, que proíbe a ingerência das autoridades públicas nas telecomunicações, salvo os casos previstos na lei em matéria de processo criminal.
Com efeito, conforme refere o Prof. Costa Andrade, "Sobre as Proibições de Prova em Processo Penal", Coimbra Editora, págs. 289 e seg., "As escutas telefónicas hão-de estar preordenadas à perseguição de um dos chamados crimes do catálogo, isto é, uma das infracções previstas no § 100a) da StPO alemã ou no n.° 1 do artigo 187.° do nosso CPP. Trata-se de uma enumeração taxativa e fechada através da qual tanto o legislador alemão como o português procuraram plasmar e dar expressão positivada ao juízo de proporcionalidade."
Assim, salvo o devido respeito, a al. e) do n.° 1 do art. 187° do CPP não consente a interpretação extensiva defendida pelo recorrente, por forma a incluir na sua previsão o crime de difamação, porque a isso obsta o princípio da legalidade.
Na verdade, como é do entendimento geral, a interpretação extensiva "pode ser amplamente utilizada no Direito Processual Penal, excepto quanto às normas restritivas de direitos subjectivos, ou que tenham natureza excecional.
Assim, colidindo a intercepção de comunicações com a inviolabilidade dos meios de comunicação privada consagrada no art. 34°, n.° 1, da Constituição da República, só sendo a mesma permitida, nos termos do n.° 4 da citada norma constitucional, nos casos expressamente previstos na lei de processo criminal, e não constando o crime de difamação do elenco dos crimes que admitem a recolha de prova através da intercepção de comunicações, estatuído no n.° do art. 187° do CPP, afigura-se-nos não ser admissível, através de uma interpretação extensiva, alargar-se tal elenco, por forma a incluir-se no mesmo aquele crime.
Por outro lado, também não se integrando o crime de difamação na definição de crime grave plasmada no art. 2o, n.° 1, al. g), da Lei n.° 32/2008, de 17 de Julho, cujo art. 9o regula a transmissão de dados no âmbito da investigação deste tipo de crimes, somos de opinião que não é admissível, face à nossa lei de processo criminal, a recolha de dados pretendida pelo recorrente.”.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir:

Com efeito, o Ministério Público pretendia que fosse ordenado ao provedor do Serviço de Internet PT, com. que fornecesse os dados do utilizador do IP 188.80.239.206, entre as 10h43m54s e 10h54m21s (GMT), do dia 21 de Janeiro de 2011, o que foi indeferido por ter sido considerado que, ainda que a diligência requerida se revelasse oportuna e necessária, considerando o crime em investigação - um crime de difamação através da Internet -, não era admissível a autorização da divulgação dos dados solicitados, nos termos do art. 187°, n.° 1, do CPP, na medida em que o crime em investigação se não encontra compreendido no catálogo plasmado no referido preceito legal, e este efectuar um elenco taxativo que não admite qualquer interpretação extensiva.
Ora, concordando com os motivos expostos, tanto no despacho recorrido, como no douto parecer que antecede, entende-se não constando o crime de difamação do elenco dos crimes que admitem a recolha de prova através da intercepção de comunicações, estatuído no n.° do art. 187° do CPP, afigura-se-nos não ser admissível, através de uma interpretação extensiva, alargar-se tal elenco, por forma a incluir-se no mesmo aquele crime.
Por outro lado, e conforme também consta do douto parecer que antecede, também não se integrando o crime de difamação na definição de crime grave plasmada no art. 2o, n.° 1, al. g), da Lei n.° 32/2008, de 17 de Julho, cujo art. 9o regula a transmissão de dados no âmbito da investigação deste tipo de crimes.
Como tal, face à nossa lei não é admissível, a recolha de dados pretendida pelo recorrente.
Assim, bem andou o Tribunal a quo ao decidir da forma por que o fez.

Assim, e pelo exposto, acordam os Juízes que constituem a secção criminal do Tribunal da relação de Évora, em negar provimento ao recurso, mantendo, na íntegra, o despacho reorrido.
Sem tributação.

Évora, 05.06.2012

Maria Fernanda Pereira Palma
Maria Isabel Alves Duarte