Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1214/13.9PBSTB.E1
Relator: MARIA DE FÁTIMA BERNARDES
Descritores: BURLA
FALSIFICAÇÃO DE DOCUMENTO
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Data do Acordão: 03/26/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: RECURSO PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Sumário:
I- Estando a convicção firmada pelo Tribunal a quo devidamente fundamentada e o juízo da valoração da prova estribado em razões objetivas e em consonância às regras da experiência comum e da normalidade da vida, impõe-se manter inalterada a matéria de facto dada como assente.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção Criminal, do Tribunal da Relação de Évora:

Neste processo comum, com intervenção do Tribunal Singular, n.º 1214/13.9PBSTB, do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal – Juízo Local Criminal de Setúbal, foi submetido a julgamento o arguido MM, melhor identificado nos autos, acusado da prática, em autoria material e em concurso real de dois crimes de burla, p. e p. pelo artigo 217º, n.º 1, do Código Penal e de cinco crimes de falsificação de documento p. e p. pelo artigo 256º, n.º 1, alíneas b), d) e e), com referência ao artigo 255º, al. a), ambos do Código Penal.

Realizado o julgamento, foi proferida sentença, em 10/10/2018, depositada nessa mesma data, com o seguinte dispositivo:

«(…) o Tribunal decide julgar a acusação provada e consequentemente:
A. Condena o arguido MM pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de burla do artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão;

B. Condena o arguido MM pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de falsificação do artigo 256.º, n.º 1, alíneas b), d) e e), do Código Penal, com referência ao artigo 255.º, alínea a), do mesmo diploma legal, na pena de 8 (oito) meses de prisão;

C. Cumula juridicamente as penas identificadas em A. e B. e condena o arguido MM na pena única de 1 (um) ano e 5 (cinco) meses de prisão;

D. Suspende a execução da pena única mencionada em C. pelo período de 1 (um) ano e 5 (cinco) meses de prisão, determinando que a mesma seja acompanhada de regime de prova e subordina a suspensão ao dever de o arguido entregar a quantia de € 89,98 (oitenta e nove euros e noventa e oito cêntimos) a AJ e a quantia de € 143,11 (cento e quarenta e três euros e onze cêntimos), fixada enquanto indemnização em F., à assistente «Nowo Communications, S.A.» (anteriormente designada «Cabovisão – Televisão Por Cabo, S.A.»), tudo durante o período da suspensão, fazendo prova dessas entregas nos autos;

E. Condena o arguido nos encargos processuais, fixando a taxa de justiça no montante correspondente a duas unidades de conta;

Mais decide o Tribunal julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização cível e, consequentemente:

F. Condena o demandado MM a pagar à demandante «Nowo Communications, S.A.» (anteriormente designada «Cabovisão – Televisão Por Cabo, S.A.») o montante de € 143,11 (cento e quarenta e três euros e onze cêntimos), acrescido de juros de mora à taxa legal a que se refere o artigo 559.º do Código Civil desde a data de notificação daquele pedido (12.7.2017) até efectivo e integral pagamento;

G. Absolve o demandado MM do demais peticionado pela demandante «Nowo Communications, S.A.»;

H. Condena demandante e demandado nas custas cíveis, na proporção do correspondente decaimento.
(…).»
Inconformado com o assim decidido, recorreu o arguido para este Tribunal da Relação, extraindo da motivação de recurso apresentada as conclusões que seguidamente se transcrevem (corrigindo-se os erros ortográficos detetados):

1. No apuramento da factualidade, o Tribunal a quo formou a sua convicção com base na valoração conjunta e crítica da prova produzida em sede de julgamento e concluiu pela condenação do ora recorrente pela prática como autor material na forma consumada de um crime de burla p.p. pelo artigo 217º n.º 1 do Código Penal na pena de a ano e dois meses de prisão e um crime de falsificação p.p. pelo artigo 256º n.º 1 al. b), d), e e) do Código penal com referencia ao artigo 255ºº, alínea a) do mesmo diploma legal, na pena de 8 meses de prisão.

2. Em cumulo, condenou o recorrente na pena única de 1 ano e 5 meses de prisão, suspensa pelo mesmo período, sujeita a regime de prova e condicionada ao dever de entregar a quantia de € 89,98 a AJ e a quantia de € 143,11 á Assistente NOWO COMUNICATIONS, S.A, durante o período da suspensão, devendo fazer prova dessas entregas nos autos, assim como nos encargos e custas judiciais.

3. No que tange ao pedido de indemnização cível apresentado pela NOWO COMUNICATIONS,S.A, julgou-o o tribunal a quo o pedido parcialmente procedente, condenando o demandado a entregar á demandante o montante de € 143,11 acrescido de juros de mora á taxa legal a que se refere o artigo 559º do Código civil, contados desde da notificação daquele pedido (12-7-2017) até integral e efectivo pagamento, assim como nas custas cíveis, na proporção do correspondente decaimento.

4. O recorrente não se conforma com a Douta Sentença proferida, apresentando o presente recurso que é de DIREITO.

5. O Recorrente insurge-se porque com tal decisão, o Tribunal a quo violou os Artigos 217º n.º 1 e 256º n.º 1 al. b), d), e e) do Código Penal, assim como os Artigo 543º do Código Civil.

6. A Douta Sentença recorrida, deu por provado, determinados pontos da factualidade que se contesta, POR TOTAL FALTA DE PROVA.

7. Designadamente, a factualidade previstas nos Pontos 1 a 28 da Sentença recorrida.

8. Na sua douta fundamentação, o Meritíssimo Julgador dando cumprimento ao teor constante no disposto no Artigo 374º n.º 2 do C.P.P, indicou as provas que serviram para formar a sua convicção.

9. Salientou que o Recorrente prestou declarações, tendo negado a prática dos crimes que lhe são imputados, assim como a apropriação, manuseamento ou adulteração das facturas descritas na Acusação.

10. MM assumiu, ser único titular do cartão pré-pago e conta bancaria identificados nos autos, por si utilizado no âmbito da sua actividade profissional enquanto “ técnico de informático “ para efeito de recebimento dos valores de alguns clientes por transferência bancária, esclarecendo ainda que os elementos de identificação desse cartão e conta bancária eram do conhecimento também, de terceiros com quem estabelecia contactos de compra e venda de componentes de computadores através de sites de venda na internet.

11. Acrescentou, que no período em que foram realizados os pagamentos para essa conta, passou por um momento de profunda conturbação (aborto da sua mulher cf. gravações em cd), era também um período de férias e confessou que foi por isso que não prestou atenção devida aos movimentos da mesma.

12. O recorrente tem por habilitação o 9º ano de escolaridade e não sendo “engenheiro informático ou mesmo autentico Técnico “, antes um curioso, ganhava a vida realizando pequenas reparações, substituições de componentes de computadores, limpezas, eliminação de vírus entre outras tarefas, que em nada se assemelham á reparações de software ou programações.

13. Os pagamentos dos seus clientes pelos seus serviços rondavam valores próximos dos montantes das aludidas facturas, razão pela qual, o saldo máximo dessa conta rondaria os € 127,59 e os créditos objecto do presente processo, não lhe mereceram especial atenção.

14. Na falta de produção de prova directa em audiência de julgamento quanto á autoria da falsificação e burla, o recorrente não se conforma que o JULGADOR tenha assentido a sua condenação na PROVA INDIDIRECTA, em vez de o absolver.

15. O que constitui uma violação grave, injusta e ilegal aos normativos legais do nosso Ordenamento Jurídico, designadamente o 128º do C.P.P.

16. Na falta de prova directa, entendeu o Tribunal a quo, erradamente, socorreu-se de presunções naturais conjugadas com as regras da experiência extraídas de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido.

17. Decidir em face da chamada prova indiciária é sempre discutível quando se põe em crise o JUÍZO DE CERTEZA que deve prevalecer em qualquer condenação.

18. No presente processo, esse juízo de certeza tinha e podia ter sido obtido com um mero exame pericial aos documentos falsificados, que não foi requerido oportunamente nem pelo Ministério Publico, nem pela Assistente.

19. Na falta deste juízo pericial e científico essencial á produção de prova, entendeu o Julgador substituir-se às leis da ciência recorrendo ao seu raciocínio e intuição logica, o que para o recorrente representa grave ilegalidade e arbitrariedade do Julgador.

20. Assentar a sentença numa prova indirecta, significa extrair de um único facto indiciário, outros relacionados ou conjugados por uma qualquer linha de raciocínio logica ajustadas às regras da experiencia.

21. Essa apreciação tem de ser necessariamente rigorosa, exigente, intocável e irrepreensível seja á luz das regras da experiência comum, seja á luz das regras da ciência.

22. Salvo o devido respeito e que é muito, a apreciação do Meritíssimo julgador regista incongruências que evidenciam antes arbitrariedade e desconhecimento.

23. Resulta da Douta Sentença que, o ÚNICO facto plenamente provado, que foi, aliás confessado pelo próprio recorrente nas suas declarações é que, este é o único titular da conta bancaria n.º 049.10.675446-5, da Caixa Geral Económica Montepio geral relacionada com o cartão pré-pago n.º 4698.4800.9921.3178, onde foram creditados os valores fraccionados das facturas objecto dos presentes autos, no valor total de € 233,09, num período concreto compreendido entre 22 de Julho a 1 de Setembro de 2013.

24. Este é o facto a partir do qual o meritíssimo Julgador desenvolveu as suas ilações e presunções logicas ajustadas supostamente às regras da experiência comum, para extrair sem qualquer margem para dúvidas, a conclusão da autoria dos crimes de falsificação e burla.

25. Este raciocínio logico e prova indirecta, no presente processo, por si só mostra-se INSUFICIENTE.

26. A este respeito, registe-se o Douto Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Guimarães em 22-10-2013 que correu termos sob o processo n.º 570/11.8 PCBRG.G1, que considerou a existência “de impressão digital do arguido” num fragmento de vidro de uma montra de um estabelecimento comercial, insuficiente para provar a sua participação num furto.

27. No processo supra identificado, a impressão digital de um arguido que é ÚNICA e de credibilidade inquestionável, não foi considerada prova suficiente para o condenar pelo crime de furto num estabelecimento comercial, por não ter sido produzida prova (directa) de quem o tivesse visto a furtar o quer que seja.

28. No presente processo, o recorrente insurge-se porque considera que o facto de ser titular da identificada conta bancaria, para a qual os lesados creditaram os valores correspondentes á prestação de serviços da actual MEO e NOWO é SEGURAMENTE UM FACTO POR SI SÓ INSUFICIENTE PARA PROVAR A SUA AUTORIA NA PRATICA DOS CRIMES DE FALSIFICAÇÃO E BURLA.

29. Desde logo porque como resultou provado, da conjugação das declarações prestadas pelas testemunhas em audiência de julgamento e da observação das facturas objecto dos presentes autos que, MM é pessoa manifestamente estranha á relação existente às operadoras de telecomunicações, aos lesados que não apresentaram queixa por violação de correspondência ou danos nas respectivas caixas do correio, que confirmaram que receberam as facturas pelo correio sendo que os respectivos envelopes também não foram violados e os documentos pareciam em tudo idênticos aos originais, motivo pelo qual, jamais suspeitaram de qualquer manipulação das mesmas.

30. O Recorrente, também nunca teve qualquer ligação com a empresa contratada (logica TI Portugal) encarregue da expedição das facturas emitidas pela Cabovisão, nem com os CTT Portugal como igualmente todos os lesados nunca tinham sido clientes do recorrente.

31. MM, não tinha qualquer conhecimento privilegiado que lhe desse acesso aos contratos de prestações de serviços com as operadoras, desconhecendo por isso, o modo de pagamento de cada lesado, sendo certo que a regularização da prestação de serviços pode ser realizada por via de pagamento multibanco ou directamente em qualquer loja da operadora em dinheiro ou em agentes.

32. Todos os lesados que prestaram depoimentos foram absolutamente esclarecedores, no que tange a suposta “autenticidade“ da factura que receberam á pagamento, com caracteres idênticos á todas as facturas, seja no tipo de letra ou tamanho e a impressão do envelope da factura adulterada,
também era idêntica.

33. Todas as facturas manipuladas foram curiosamente adulteradas apenas no que respeita á entidade e referência de pagamento, sem qualquer alteração do respectivo valor é excepção de uma factura cujo valor foi alterado de € 64,83 para € 64,72, sendo absolutamente imperceptível para o cidadão comum, por que motivo o recorrente iria manipular o valor da factura por uma diferença tão insignificante de €0,11 (onze cêntimos)

34. Todas as facturas alteradas foram recepcionadas pelos lesados num determinado período de tempo bem definido, não havendo notícia de manipulações da mesma natureza por parte dos lesados, das empresas operadoras ou de terceiros contra o arguido.

35. A testemunha FC, supervisora de facturação da empresa NOWO, explicou que o processo de emissão e envio da facturação para os clientes é gerado automaticamente pelo sistema informático da empresa que as envia por via informática para a empresa que as imprime e reencaminha para os CTT., sendo, na sua percepção este procedimento inviolável manualmente.

36. Ora o recorrente, tem apenas o 9º ano de escolaridade, dedicando-se a pequenas reparações de computadores, sem formação académica ou técnica que o habilita-se a violar qualquer sistema de software para aceder à facturação dos lesados e alterar-lhe estritamente os elementos de identificação de entidade e referência de pagamento.

37. Não foi encontrado motivo credível para justificar a manipulação de uma das facturas com uma diferença de valores de € 0,11 da factura original.

38. Atenta a observação das facturas manipuladas em comparação com as reais e recorrendo ao depoimento testemunhal, o tribunal a quo, não conseguiu descortinar em que circunstância de tempo, lugar e modo terá supostamente MM manuseado as facturas.

39. Não sabe o tribunal, não sabem as operadoras, os lesados, nem sabe o recorrente.

40. No registo criminal do Recorrente, não consta a condenação ou pendência de quaisquer processos de falsificação.

41. Finalmente, não pode o recorrente deixar de salientar uma injustificável INCUNGRUÊNCIA DE RACUSSINIO LÓGICO DO JULGADOR com às regras DA EXPERIÊNCIA segunda a qual, no ponto 3.3.3 da douta Sentença recorrida, o tribunal a quo concluiu que no que respeita á forma de execução, a sua ilicitude foi MODERADA por ser rebuscada a respeita da fase inicial do iter criminis e acaba por ser desleixada na fase final, não olvidando que o enriquecimento obtido pelo arguido era depositado em conta bancária por si titulada, permitindo a sua fácil identificação e do valor indevidamente apropriado ser manifestamente modesto, através de uma acção típica que se desenvolveu através de 5 actos.

42. Salvo o devido respeito, a ilação do Julgador na busca da prova indirecta “cai por terra” no que respeita ao MODO DE EXECUÇÃO do agente: ao bem que considera a sua actuação no acesso e adulteração das facturas de tal modo engenhosa e eficaz que não deixou “rasto ou indício probatório”, ou bem que se considera a sua actuação desleixada, rudimentar precisamente, por ter usado um modo através do qual é com elevadíssima facilidade que se chega á sua autoria pela titularidade da sua conta bancaria.

43. A Sentença, revela fragilidade e evidência confusão, já que não se define a actuação de agente de forma coerente e logica fase às regras da experiência e quotidiano.

44. O recurso á prova indirecta para sustentar a condenação do recorrente, não se mostra absolutamente credível e isenta de dúvidas.

45. Estando em causa no presente processo, a falsificação e adulteração de documentos, impunha-se ao julgador a quo, em vez de recorrer exclusivamente ao seu livre arbítrio e convicções lógicas, socorrer-se antes, a PERICIAS TECNICAS para obter uma prova VÁLIDA, CREDIVEL E INSUSPCTIVEL DE SER DISCUTIDA sobre o modo de actuação e autoria dos crimes.

46. Salvo o devido respeito e que é muito, como é sabido e do senso comum, Julgador tem conhecimentos gerais medianos do uso de tecnologia informática e não estará na condição mais favorável para proferir juízos de avaliação técnica sobre a adulteração das facturas uma vez que, é consensual que nenhum dos lesados nem as operadoras foram suficientemente capazes de apurar como terão sidos manipuladas as ditas facturas e por quem.

47. O tribunal a quo não apresentou um raciocínio lógico, pelo método indutivo através do qual chegou a uma conclusão, firme, segura e sólida de outro facto.

48. A fundamentação da Douta Sentença Recorrida, não permitiu que se ultrapassasse do estado de ignorância sobre a existência de um facto para o estado de certeza, ultrapassando o estado de dúvida e probabilidade.

49. No caso em apreço, para se passar para um estado de certeza, o Julgador que não é perito em informática, tinha necessária e obrigatoriamente de ter ao seu alcance um relatório que confirmasse de acordo com as leis da ciência informática que as facturas objecto do presente processo foram manipuladas, como, quando e por quem.

50. Não podia o tribunal a quo, com recurso exclusivo ao seu raciocínio logico cujas incoerências foram demostradas, concluir pela condenação em vez da absolvição.

51. Considera o recorrente que no caso em apreço, a convicção do julgador tinha de basear num juízo pericial de certeza, inalcançável pela sua habilitação mediana em informática,

52. O Julgador também não motivou a sua decisão num determinado “caso semelhante com idêntico comportamento humano” ou “facto histórico” com base no qual este pudesse extrair com plena certeza e não mera possibilidade mais ou menos ampla, contrariamente ao recorrente que indicou uma Douta Decisão proferida pelo Tribunal da relação de Guimarães em sentido contrário.

53. Em matérias que impliquem especiais competências técnicas científicas ou artísticas, e que se fundamentam naquelas leis, é evidente que a margem de probabilidade será proporcional á certeza da afirmação científica.

54. Ora com o devido respeito, entende o recorrente que o tribunal “construiu um castelo de argumentação lógica, contraditória, que não está sustentado em bases sólidas harmoniosas e seguras.

55. Em conclusão, advoga o recorrente que a douta decisão recorrida mostra-se ilegal, por não ter sido produzida prova SUFICIENTE QUE SUSTENTE QUALQUER CONDENAÇÃO DO RECORRENTE, consequentemente, a Douta Sentença recorrida, deve ser revogada e substituída por outra que absolva o Recorrente.

56. O tribunal a quo, desrespeitou os Artigos 217º n.º 1 e 256º n.º 1 al. b), d), e e) do Código Penal, assim como os Artigo 543º do Código Civil.

57. Nesta conformidade, dando provimento ao presente Recurso, deve a Douta Acusação Publica e pedido de indemnização cível, serem antes julgados improcedentes por não provados, absolvendo-se o Recorrente.»

O recurso foi regularmente admitido.

O Ministério Público, junto da 1ª Instância, apresentou resposta ao recurso, nos termos constantes de fls. 610 a 614, pronunciando-se no sentido de que deverá negar-se provimento ao recurso e, em consequência, ser integralmente confirmada a sentença recorrida, formulando, para tanto, as seguintes conclusões:

1. Para além da indicação dos meios de prova que alicerçaram a convicção do Tribunal, o Mmo. Juiz “a quo” procedeu com pormenor ao seu exame crítico, por forma a tornar bem compreensível o processo lógico-racional que conduziu a essa convicção.

2. A prova produzida em julgamento foi valorada positivamente pelo Tribunal recorrido, no âmbito da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova, no sentido de que o arguido praticou os factos dados como provados.

3. Não se compreendendo a invocada necessidade de realização de perícia informática ou qualquer outra.

4. Pelo que nenhum reparo nos merece a sentença recorrida, a qual, deverá, ser mantida nos seus exactos termos.

Em face do exposto, deverá negar-se provimento ao recurso, e, em consequência, ser integralmente confirmada a decisão recorrida.

V. Exas., porém, com mais elevada prudência, decidirão, como for de JUSTIÇA!

Neste Tribunal, a Exmª. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso e mantida, nos seus precisos termos, a sentença recorrida, aderindo aos fundamentos aduzidos pelo Ministério Público junto da 1ª Instância, na resposta ao recurso.

Foi cumprido o disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, tendo o arguido/recorrente apresentado resposta, a fls. 628 a 635, reiterando as conclusões formuladas na motivação de recurso e concluindo nos mesmos termos.

Efetuado exame preliminar e colhidos os vistos, vieram os autos à conferência, cumprindo agora apreciar e decidir.

2 – FUNDAMENTAÇÃO
2.1. Delimitação do objeto do recurso

O Tribunal da Relação tem poderes de cognição de facto e de direito (cfr. artº. 428º do C.P.P.).
As conclusões da motivação recursiva balizam ou delimitam o respetivo objeto do recurso (cfr. artºs. 402º, 403º e 412º, todos do C.P.P.), delas se devendo extrair as questões a decidir em cada caso.

Tal não impede o conhecimento, também oficioso, dos vícios enumerados nas als. a), b) e c), do nº. 2 do artigo 410º do C.P.P., mas tão somente quando os mesmos resultem do texto da decisão recorrida por si só ou em sua conjugação com as regras da experiência comum (cfr. Ac. do STJ nº. 7/95 – in DR I-Série, de 28/12/1995, ainda hoje atual), bem como das nulidades principais, como tal tipificadas por lei.

No caso vertente, tendo presentes as considerações que se deixam enunciadas e atentas as conclusões extraídas pelo arguido/recorrente da motivação de recurso apresentada a única questão suscitada é a da impugnação da matéria de facto dada como provada nos pontos 1 a 28.

Importa ter presente o teor da sentença recorrida, na parte que releva para a apreciação da questão suscitada e que se passa a transcrever:

2.2. Da sentença recorrida:
«(…)
II. Fundamentação de Facto
2.1. Factos provados
Com relevância para a decisão a proferir resultaram provados os seguintes factos:

Da acusação
NUIPC 1214/13.9PBSTB
1. Em circunstâncias de tempo, modo e lugar não concretamente apurados, mas em data anterior a 13 de Agosto de 2013, MM, na execução de um plano destinado a obter benefícios patrimoniais indevidos, por si concebido, conseguiu ter acesso à factura com o n.º A536772247, emitida pela PT Comunicações, S. A. (actualmente, MEO), referente a serviços prestados por esta empresa a AJ, a qual continha os dados para pagamento via multibanco - entidade: “21159”, referência: “214660539” e valor: “89,98 €”.

2. De seguida, MM alterou os dados que constavam da factura referentes ao pagamento e inseriu os dados correspondentes a uma conta bancária da sua titularidade, quantia que seria creditada através do cartão pré-pago n.º 4698.4800.9921.3178, igualmente da sua titularidade, como entidade: “21312”, e como referência: “992131788”, e a enviou, por carta, para AJ.

3. No dia 13 de Agosto de 2013, pelas 18h50, na Rua…, Pinhal Novo, AJ procedeu ao pagamento da referida factura, que recebeu, convicto, erradamente, que era verdadeira e que tal valor daria entrada numa conta bancária da PT Comunicações, S. A., para pagamento dos serviços prestados por esta empresa, dos quais beneficiava.

4. Em data não concretamente apurada, AJ recebeu, por correio, a correspondente factura verdadeira, emitida pela PT Comunicações, S. A., o que fez com que se deslocasse a um posto de atendimento desta empresa e, consequentemente, se apercebesse do engano que lhe foi causado.

NUIPC 4185/13.8TASTB:
5. A assistente Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A. subcontratou com a empresa CGITI Portugal, S. A. (anteriormente denominada LogicaTI Portugal, S. A.), tendo esta ficado encarregue da expedição das facturas emitidas por aquela, para os respectivos clientes, de entre os quais MCC, FC, DN e VC.

6. Em circunstâncias de tempo, modo e lugar não concretamente apurados, mas em data anterior a 22 de Julho de 2013, MM, na execução de um plano destinado a obter benefícios patrimoniais indevidos, por si concebido, conseguiu ter acesso à factura com o n.º F07026858, emitida pela assistente Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A., referente a serviços prestados por esta empresa a MCC, a qual continha os dados para pagamento via multibanco - entidade: “20936”, referência: “607026858” e valor: “38,98 €”.

7. De seguida, MM alterou os dados que constavam da factura referentes ao pagamento e inseriu os dados correspondentes a uma conta bancária da sua titularidade, quantia que seria creditada através do cartão pré-pago n.º 4698.4800.9921.3178, igualmente da sua titularidade, como entidade: “21312”, e como referência: “992131788”, e a enviou, por carta, para MCC.

8. No dia 22 de Julho de 2013, pelas 12h07, numa agência bancária da Caixa Geral de Depósitos, em local não concretamente apurado, MCC procedeu ao pagamento da referida factura, que recebeu, convicta, erradamente, que era verdadeira e que tal valor daria entrada numa conta bancária da Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A., para pagamento dos serviços prestados por esta empresa, dos quais beneficiava.

9. No dia 1 de Agosto de 2013, a assistente Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A. enviou para MCC, por correio, uma carta de aviso de suspensão de serviços, por falta de pagamento, o que fez com que esta se deslocasse a uma loja desta empresa, e, consequentemente, se apercebesse do engano que lhe foi causado.

10. Em circunstâncias de tempo, modo e lugar não concretamente apurados, mas em data anterior a 1 de Agosto de 2013, MM, na execução do mesmo plano destinado a obter benefícios patrimoniais indevidos, por si concebido, conseguiu ter acesso à factura com o n.º F07026868, emitida pela Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A., referente a serviços prestados por esta empresa a FC, a qual continha os dados para pagamento via multibanco - entidade: “20936”, referência: “607026868” e valor: “41,80 €”.

11. De seguida, MM alterou os dados que constavam da factura referentes ao pagamento e inseriu os mesmos dados correspondentes a uma conta bancária da sua titularidade, quantia que seria creditada através do cartão pré-pago n.º 4698.4800.9921.3178, igualmente da sua titularidade, como entidade: “21312”, e como referência: “992131788”, e a enviou, por carta, para FC.

12. No dia 1 de Agosto de 2013, em local não concretamente apurado, FC procedeu ao pagamento da referida factura, que recebeu, convicto, erradamente, que era verdadeira e que tal valor daria entrada numa conta bancária da Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A., para pagamento dos serviços prestados por esta empresa, dos quais beneficiava.

13. No mesmo dia 1 de Agosto de 2013, a assistente Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A. enviou para FC, por correio, uma carta de aviso de suspensão de serviços, por falta de pagamento, e contactou-o telefonicamente, o que fez com que se apercebessem do engano que foi causado àquele.

14. Em circunstâncias de tempo, modo e lugar não concretamente apurados, mas em data anterior a 20 de Agosto de 2013, MM, na execução do mesmo plano destinado a obter benefícios patrimoniais indevidos, por si concebido, conseguiu ter acesso à factura com o n.º F08018049, emitida pela assistente Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A., referente a serviços prestados por esta empresa a DN, a qual continha os dados para pagamento via multibanco - entidade: “20936”, referência: “608018049” e valor: “32,84 €”.

15. De seguida, MM alterou os dados que constavam da factura referentes ao pagamento e inseriu os dados correspondentes a uma conta bancária da sua titularidade, quantia que seria creditada através do cartão pré-pago n.º 4698.4800.9921.3178, igualmente da sua titularidade, como entidade: “21312”, e como referência: “992131788”, e a enviou, por carta, para DN.

16. No dia 20 de Agosto de 2013, pelas 18h09, em local não concretamente apurado, DN procedeu ao pagamento da referida factura, que recebeu, convicto, erradamente, que era verdadeira e que tal valor daria entrada numa conta bancária da Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A., para pagamento dos serviços prestados por esta empresa, dos quais beneficiava.

17. A assistente Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A. enviou para DN, uma mensagem (sms), informando-o que a mensalidade de Agosto de 2013 se encontrava em dívida, o que fez com que este se deslocasse a uma loja desta empresa, e, consequentemente, se apercebesse do engano que lhe foi causado.

18. Em circunstâncias de tempo, modo e lugar não concretamente apurados, mas em data anterior a 26 de Agosto de 2013, MM, na execução do mesmo plano destinado a obter benefícios patrimoniais indevidos, por si concebido, conseguiu ter acesso à factura com o n.º F08189861, emitida pela assistente Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A., referente a serviços prestados por esta empresa a VC, a qual continha os dados para pagamento via multibanco - entidade: “20936”, referência: “608189861” e valor: “64,72 €”.

19. De seguida, MM alterou os dados que constavam da factura referentes ao pagamento e inseriu os dados correspondentes a uma conta bancária da sua titularidade, quantia que seria creditada através do cartão pré-pago n.º 4698.4800.9921.3178, igualmente da sua titularidade, como entidade: “21312”, e como referência: “992131788”, e a enviou, por carta, para VC.

20. No dia 26 de Agosto de 2013, em local não concretamente apurado, VC procedeu ao pagamento parcial da referida factura, no montante de 29,49 €, factura que recebeu, convicta, erradamente, que era verdadeira e que tal valor daria entrada numa conta bancária da Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A., para pagamento dos serviços prestados por esta empresa, dos quais beneficiava.

21. No dia 1 de Setembro de 2013, a assistente Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A. enviou para VC, uma carta de aviso de suspensão de serviços, informando-a que a mensalidade de Agosto de 2013 se encontrava em dívida.

22. Os referidos valores de 89,98 €, 38,98 €, 41,80 €, 32,84 € e 29,49 €, num total de 233,09 €, foram, na realidade, transferidos para a conta bancária n.º 049.-----, titulada por MM, na Caixa Económica Montepio Geral, quantia creditada através do cartão pré-pago n.º 4698.4800.9921.3178, da titularidade do mesmo, quantia que fez sua.

23. MM bem sabia que AJ havia contratado a prestação de serviços com a PT Comunicações, S. A., e que MCC FC, DN e VC haviam contratado a prestação de serviços com a assistente Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A..

24. MM quis obter um benefício patrimonial, o que conseguiu, fazendo crer a AJ, MCC, FC, DN e VC que as facturas com os n.ºs A536772247, emitida pela PT Comunicações, S. A. (actualmente, MEO), e F07026858, F07026868, F08018049 e F08189861, emitidas pela assistente Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A., respectivamente, por si previamente alteradas e enviadas por correio, eram facturas verdadeiras, enganando-os de forma a determiná-los a efectuar os pagamentos das referidas quantias, das quais MM pretendeu apropriar-se, causando um prejuízo de igual valor, prejuízo, quanto aos quatro últimos, assumido pela assistente Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A..

25. MM alterou as facturas emitidas pela PT Comunicações, S.A. (actualmente, MEO) e pela assistente Cabovisão – Televisão por Cabo, S. A., acima referidas, introduzindo dados referentes ao pagamento das mesmas, e utilizou-as, bem sabendo serem viciadas, com a intenção de obter para si um benefício que sabia ser ilegítimo, decorrente do pagamento das mesmas pelos clientes das referidas empresas, quantias que seriam creditadas, como foram, na sua conta bancária, e não nas contas bancárias das empresas prestadoras dos serviços.

26. MM sabia que as suas condutas abalavam a fé pública e confiança que tais facturas merecem, e, que desse modo, causava prejuízo às empresas prestadoras de serviços e/ ou aos clientes das mesmas.

27. MM agiu sempre de modo livre, deliberado e consciente, sendo conhecedor da ilicitude da sua conduta, e tinha a liberdade necessária para se determinar segundo essa avaliação.

Mais resultou demonstrado com relevância que:

28. O arguido detém o certificado de registo criminal n.º 082035-E, tendo sido condenado:

i. Pela prática de factos que consubstanciam um crime de condução sem habilitação do artigo 3.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3.1., cometidos em 3.3.2011, na pena de 65 dias de multa à taxa diária de € 5, por sentença proferida pelo 2.º Juízo Criminal do Tribunal de Família e Menores e Comarca do Barreiro em 3.3.2011 e transitada em julgado em 24.3.2011 (processo n.º ---/11.1PBBRR);

ii. Pela prática de factos que consubstanciam um crime de burla do artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal, cometidos em 17.5.2011, na pena de 100 dias de multa à taxa diária de € 5,50, por sentença do 3.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Coimbra proferida em 5.6.2012 e transitada em julgado em 12.6.2012 (processo n.º ---/11.8JACBR);

iii. Pela prática de factos que consubstanciam um crime de condução sem habilitação do artigo 3.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3.1., cometidos em 26.11.2012, na pena de três meses de prisão substituída pela prestação de 90 horas de trabalho, por sentença proferida pelo 2.º Juízo Criminal do Tribunal de Família e Menores e Comarca do Barreiro em 17.12.2012 e transitada em julgado em 21.1.2013 (processo n.º ---/12.6PBBRR);

iv. Pela prática de factos que consubstanciam um crime de burla do artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal, cometidos em 2011, na pena de 170 dias de multa à taxa diária de € 5, por sentença do 1.º Juízo do Tribunal Judicial de Valongo proferida em 22.1.2013 e transitada em julgado em 13.3.2013 (processo n.º ---/11.0GBVLG);

v. Pela prática de factos que consubstanciam um crime de burla do artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal, cometidos em Fevereiro de 2011, na pena de 140 dias de multa à taxa diária de € 6, por sentença do 1.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Matosinhos proferida em 23.1.2013 e transitada em julgado em 4.3.2013 (processo n.º ---/11.4PHMTS);

vi. Pela prática de factos que consubstanciam um crime de burla do artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal, cometidos em 26.10.2012, na pena de 250 dias de multa à taxa diária de € 5, por sentença do Juízo Local Criminal do Barreiro – Juiz 1 proferida em 9.4.2014 e transitada em julgado em 7.7.2017 (processo n.º ----/12.9GAMTA);

vii. Pela prática de factos que consubstanciam um crime de burla do artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal, cometidos em 24.11.2010, na pena de 260 dias de multa à taxa diária de € 5, por sentença do Juízo Local Criminal de Vila Franca de Xira – Juiz 2, proferida em 12.12.2004 e transitada em julgado em 7.7.2017 (processo n.º ---/10.8PBVFX);

viii. Pela prática de factos que consubstanciam um crime de burla do artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal, cometidos em 25.10.2012, na pena de 4 meses de prisão suspensa na execução pelo período de 1 ano, por sentença do Juízo Local Criminal do Barreiro – Juiz 1, proferida em 18.2.2015 e transitada em julgado em 7.7.2017 (processo n.º ---/12.5GAMTA);

ix. Pela prática de factos que consubstanciam dois crimes de burla do artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal, cometidos em 16.10.2012, em duas penas parcelares de seis meses de prisão e na pena única de 8 meses de prisão suspensa na execução pelo período de 1 um ano, condicionada ao dever de proceder ao pagamento da indemnização devida, por sentença do Juízo Local Criminal de Mafra, proferida em 16.3.2015 e transitada em julgado em 23.10.2017 (processo n.º ----/10.8PBVFX);

x. Pela prática de factos que consubstanciam dois crimes de burla informática e nas comunicações do artigo 221.º do Código Penal, cometidos em 8.3.2014, na pena única de 5 meses de prisão suspensa na execução pelo período de um ano, com a condição de indemnizar os ofendidos, por sentença do Juízo de Competência Genérica de São João da Madeira – Juiz 1, proferida em 22.11.2017 e transitada em julgado em 4.1.2018 (processo n.º ---/14.7JAPRT);

xi. Pela prática de factos que consubstanciam um crime de burla do artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal, cometidos em 13.6.2014, na pena de 10 meses de prisão, por sentença do Juízo Local Criminal de Vila do Conde – Juiz 1, proferida em 21.12.2017 e transitada em julgado em 2.2.2018 (processo n.º ---/14.0PAVPVZ);

xii. Pela prática de factos que consubstanciam um crime de burla do artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal, cometidos em 21.9.2012, na pena de 250 dias de multa à taxa diária de € 5, por sentença do Juízo Local Criminal de Felgueiras, proferida em 18.12.2013 e transitada em julgado em 15.2.2018 (processo n.º ---/12.5GBFLG);

xiii. Pela prática de factos que consubstanciam um crime de burla do artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal, cometidos em 25.11.2011, na pena de 300 dias de multa à taxa diária de € 5, por sentença do Juízo Local Criminal de Vila do Conde – Juiz 1, proferida em 7.2.2018 e transitada em julgado em 9.3.2018 (processo n.º ----/11.4PAPVZ);

xiv. Pela prática de factos que consubstanciam um crime de burla do artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal, cometidos em Novembro de 2013, na pena de 9 meses de prisão substituída por 320 dias de multa à taxa diária de € 5, por sentença do Juízo Local Criminal de Matosinhos – Juiz 1, proferida em 19.2.2018 e transitada em julgado em 21.3.2018 (processo n.º ---/13.9GBMTS);

xv. Pela prática de factos que consubstanciam um crime de burla do artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal, cometidos em 5.12.2014, na pena de 7 meses de prisão, por sentença do Juízo Local Criminal de Sintra – Juiz 1, proferida em 20.3.2018 e transitada em julgado em 30.4.2018 (processo n.º --/15.4PCSNT);

xvi. Pela prática de factos que consubstanciam um crime de burla do artigo 217.º, n.º 1, do Código Penal, cometidos em 19.2.2011, na pena de 200 dias de multa à taxa diária de € 5, por sentença do Juízo Local Criminal do Seixal – Juiz 1, proferida em 6.4.2018 e transitada em julgado em 7.5.2018 (processo n.º ---/11.5PBCTB);

xvii. Pela prática de factos que consubstanciam um crime de furto do artigo 203.º do Código Penal, um crime de burla informática e nas comunicações do artigo 221.º do mesmo diploma e um crime de acesso ilegítimo do artigo 6.º, n.º 1, da Lei n.º 109/09, de 15.9., cometidos em 23.11.2013, na pena de 4 anos de prisão suspensa na execução por igual período, por acórdão do Juízo Central Criminal de Santarém – Juiz 2, proferido em 10.4.2018 e transitado em julgado em 10.5.2018 (---/13.1PBSTR).

29. O arguido encontra-se em situação de reclusão há cerca de 1 ano e 4 meses.

30. No estabelecimento prisional resulta inscrito no curso de animação sociocultural, tendo pedido colocação laboral.

31. Quando for colocado em liberdade pretende residir com a sua mulher e com os seus pais.

32. Exercia, previamente à reclusão, a profissão de técnico informático por conta própria, auferindo a esse título, mensalmente e em média, a quantia de € 300 a € 400.

33. Enquanto habilitações literárias tem o 9.º ano de escolaridade.

Do pedido de indemnização cível
34. O referido de 5. a 21. foi do conhecimento dos familiares dos clientes aí mencionados.
*
2.2. Factos não provados
Com relevância para a decisão a proferir ficaram por demonstrar os seguintes factos:
Da acusação
A. O pagamento referido em 3. ocorreu na Rua…., Pinhal Novo.
B. O referido em 4. ocorreu no dia 4 de Setembro de 2013.
C. A deslocação referida em 9. aconteceu no dia 18 de Agosto de 2013.
D. O contacto telefónico referido em 13. ocorreu no dia 24 de Agosto de 2013.
E. A sms identificada em 17. foi enviada em 30 de Agosto de 2013.
F. A deslocação referida em 17. aconteceu em 30 de Agosto de 2013.
G. Por referência ao descrito em 18., o valor inscrito na factura fosse de € 64,83.
H. Por referência ao descrito em 21., VC contactou a empresa no dia 20 de Setembro de 2013, e, consequentemente, apercebeu-se do engano que lhe foi causado.

Do pedido de indemnização cível
I. Mercê do referido em 34. a assistente viu-se privada de angariar outros clientes que poderiam ter consigo contratado.

J. O referido de 5. a 21. aconteceu em meios de cariz mais rural e industrial, circulando na boca do povo, tendo considerável propagação, afectando assim a actividade da Assistente.

*
2.3. Motivação de Facto
Conforme resulta do artigo 374.º, n.º 2, do Código Processo Penal, na sentença deve o julgador explicitar, ainda que concisamente, os motivos fundamentadores da decisão, indicando e apreciando criticamente, para tanto, as provas que serviram para formar a respectiva convicção, sendo certo que, segundo o artigo 127.º do mesmo diploma legal, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e da livre convicção, não significando isso, todavia, um juízo arbitrário e/ou meramente subjectivo acerca da prova produzida.

No caso vertente cumpre salientar que o arguido prestou declarações, sendo que negou a autoria dos factos narrados na acusação. Com efeito, o arguido infirmou ter manipulado quaisquer facturas atinentes a serviços prestados pelas operadoras de telecomunicações mencionadas naquela peça processual, não se tendo apropriado de quaisquer valores que a estas fossem destinados, mormente por via de pagamento de facturas enviadas aos correspondentes clientes.

O arguido assumiu, porém, que o cartão pré-pago e conta bancária identificados na acusação eram da sua titularidade, sendo que asseverou que era a única pessoa com acesso à referida conta, mas dando conta que não tomava atenção aos movimentos da mesma, mormente por estar a passar um momento pessoal de alguma conturbação, referindo, assim, desconhecer se efectivamente os montantes mencionados no libelo acusatório ingressaram por qualquer via na sobredita conta de que era titular.

As declarações do arguido, impõe-se desde já consignar, não resultaram verosímeis. Na verdade, é de reter, em consonância com as regras da experiência comum, que quem é titular de uma conta bancária tem a preocupação de aferir do seu saldo e dos movimentos que lhe respeitam com alguma regularidade, sendo certo que os factos narrados na acusação se reportam, em suma, ao Verão de 2013, tendo decorrido mais de cinco anos desde a sua prática, daí que se afira por congruente com aquelas máximas que o arguido, desde então, já tivesse consultado os extractos atinentes à conta em apreço, ainda que tenha referido que a encerrou no ano de 2014. Mas se refere que a encerrou no ano de 2014, ainda se afere com maior grau de certeza que tivesse consultado o correspondente saldo e movimentos previamente a proceder de tal forma. Note-se, aliás, que é de ter em atenção que o arguido referiu que utilizava a entidade e referência associados ao cartão pré-pago e à conta bancária para receber quantias atinentes aos trabalhos que efectuava junto de clientes, daí que se afira ainda por mais intensa a preocupação de aferir com regularidade dos movimentos atinentes a essa conta, mormente os aí registados a crédito. Essa necessidade ainda será maior se se considerar que a conta bancária titulada pelo arguido registou um saldo máximo de € 127,59 – quantia assaz modesta – conforme se colhe da análise do extracto de fls. 75-76 dos autos. De resto, da análise do mencionado extracto afere-se que foram creditados na conta da titularidade do arguido os montantes discriminados na acusação, não se olvidando a equivalência das quantias e a data dos movimentos em apreço.

Assim, face ao que se vem dizendo, importa reter que as declarações do arguido, de per se, não se afiguram credíveis, não só porque o seu conteúdo se afere, nos moldes assinalados, por inverosímil, mas também se se considerar que foram prestadas de forma pouco espontânea, isto é, já após produzida toda a prova.

Prosseguindo e como já resulta evidenciado pelo rol dos factos provados e não provados, o Tribunal adquiriu a convicção de que os factos ocorreram nos moldes assinalados na acusação, cabendo explicitar o porquê desta asserção.
Procedendo, assim, à explicitação da mencionada conclusão, é de reconhecer, num primeiro momento, que não foi produzida prova directa da intervenção do arguido, isto é, nenhuma das testemunhas inquiridas em contexto de audiência de discussão e julgamento revelaram sequer conhecer o arguido, não tendo atestado qualquer intervenção da sua parte.

A circunstância de não se ter produzido prova directa da intervenção do arguido não significa, sem mais, que os factos narrados na acusação sejam insusceptíveis de prova, sendo de salientar que a prova indirecta é também ela própria valorável, cumprindo ter em mente neste conspecto o princípio contido no artigo 125.º do Código de Processo Penal segundo o qual «são admissíveis as provas que não forem proibidas por lei». Obviamente é exigível ao julgador que sempre valore a prova de forma não arbitrária, ou seja, também a prova indirecta é de ser valorada em consonância com um padrão de normalidade, por referências às regras da experiência e da lógica, sempre de forma a afastar a existência de dúvidas, as quais verificando-se determinam a não prova do facto invocado. Conforme se estribou no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 4.3.2009, «(…) para além da prova directa do facto, a apreciação do tribunal pode assentar em prova indirecta ou indiciária, a qual se faz valer através de presunções. No recurso a presunções simples ou naturais (art. 349º do Cód. Civil), parte-se de um facto conhecido (base da presunção), para concluir presuntivamente pela existência de um facto desconhecido (facto presumido), servindo-se para o efeito dos conhecimentos e das regras da experiência da vida, dos juízos correntes de probabilidade, e dos princípios da lógica».

Entendemos, pois, que sendo a actividade jurisdicional direccionada para o apuramento da verdade material não pode ficar contida aos meios de prova directo, devendo estender-se igualmente aos meios de prova indirecta com vista a atingir tal desiderato, desde que essa actividade se paute e contenha sempre, conforme vínhamos referindo, em concordâncias com as regras da lógica e da experiência aplicadas segundo o prisma da análise do caso concreto.

Volvendo ao caso concreto, importa reter que resultou demonstrado que AJ era cliente da empresa de telecomunicações denominada «PT Comunicações, S.A.» (hoje denominada “Meo”) e, por seu turno, MCC, FC, DN e VC eram clientes da operadora «Cabovisão», ora assistente e com a actual denominação de “Nowo”, sendo que o eram a respeito do contexto de tempo narrado no libelo acusatório. Com efeito, é de reter que todos – com excepção de VC – foram inquiridos em sede de audiência de discussão e julgamento, confirmando o circunstancialismo ora em menção, sendo que a respeito da última pessoa ora identificada é de reter que o contrato de prestação de serviços de telecomunicações que se lhe refere e que a vincula à segunda operadora resulta junto a fls. 54-56 dos autos (apenso A).

Prosseguindo, é de reter que por referência às sobreditas relações contratuais foram sendo emitidas facturas pelas supramencionadas operadoras de telecomunicações, entre as quais aquelas a que se faz alusão no libelo acusatório. Mais concretamente, a factura de fls. 9/15 (emitida pela operadora «PT Comunicações, S.A.», emitida em nome de AJ, sendo respeitante ao mês de Julho de 2013 e à quantia de € 89,98, contendo, para pagamento, a entidade 21159 e a referência 214 660 539, sendo que a fls. 10 conata uma factura em tudo idêntica, mas que contém enquanto entidade de pagamento “21312” e referência “992 131 788”. Somente a factura de fls. 9, também constante de fls. 15 corresponde à que foi emitida pela operadora em referência, não se olvidando a informação de fls. 14 prestada por essa empresa e, por outro lado, se se considerar que a entidade e referência de pagamento “21312” e “992 131 788”, respeitam a cartão e conta bancária tituladas pelo arguido, conforme consta assinalado pelas informações da SIBS de fls. 18 (fls. 87 do apenso «A») e da instituição bancária Montepio de fls. 22-23, 45-48, 74-76 e 116-118, sendo tal informação reiterada a fls. 101-104 do apenso «A», cabendo ter em mente que o arguido é pessoa manifestamente estranha à relação existente entre a operadora de telecomunicações a que ora se faz menção e ao seu cliente AJ, pelo que estranha à execução dessa relação e, mais concretamente, aos pagamentos efectuados no seu âmbito também o é aquele cartão e aquela conta.

Note-se, ademais, que a testemunha AJ, para além de ter asseverado a relação contratual com a empresa «PT comunicações», igualmente atestou ter recebido em sua casa, via correio a factura que consta de fls. 10, tendo então procedido ao pagamento da quantia aí mencionada através de uma máquina multibanco (não mencionado, porém que o tenha feito na Rua…, Pinhal Novo, daí a não prova deste segmento da acusação), introduzindo, para o efeito, a referência e entidade que aí resulta inscrita, relatando que posteriormente foi confrontado pela operadora com a referida falta de pagamento, tendo-se dirigido aos serviços da mesma, aduzindo ainda que acabou por proceder ao pagamento da mesma factura uma segunda vez, sendo que o pagamento respeitante à referência e entidade inscritas a fls. 10 resultam certificados através do talão de multibanco de fls. 11. De resto, neste âmbito só ficou por demonstrar que a factura efectivamente emitida pela «PT Comunicações» tenha sido recebida no dia 4.9.2013 por AJ, pois que pese embora se extraia do seu depoimento que acabou por pagá-la, não concretizou o momento em que recebeu a factura verdadeira para tal efeito.

Do que se vem dizendo importa reter que a factura efectivamente emitida pela operadora “PT Comunicações, S.A.” não chegou, num primeiro momento, ao seu cliente AJ, tendo chegado ao seu poder, mediante via postal, uma factura em tudo igual àquela, exceptuando a referência e entidade para pagamento do valor nela exarado, conforme resulta do confronto de fls. 9/15 e de fls. 10. Ora, essa entidade e referência são atinentes a cartão pré-pago e conta bancária titulados pelo arguido, o que significa que o mesmo – que reconheceu ser o único titular da conta e a única pessoa com acesso efectivo à mesma – foi beneficiário do pagamento em referência, pagamento que não lhe era devido porquanto pessoa estranha à relação cliente – operadora de telecomunicações.

Ora, sendo o arguido o beneficiário do sobredito pagamento, tendo-o sido porquanto foi aposta uma entidade/referência de pagamento que lhe respeita numa factura em tudo idêntica à realmente emitida pela operadora de telecomunicações, então é de concluir que, previamente ao pagamento realizado em 13.8.2013 (v., novamente, o talão de fls. 11), o arguido logrou ter acesso a essa factura real, ali fez inscrever aquela entidade/referência que não era a inicialmente aí exarada e fez chegar essa factura para o cliente da operadora, tudo em consonância com as regras da experiência, cabendo, aliás, explicitar que não é credível que um terceiro que não o arguido se apoderasse da referida factura e que sequentemente a adulterasse a respeito da forma de pagamento de molde a beneficiar exclusivamente o arguido, mormente sem o conhecimento deste.

Importa, pois, sintetizar que o arguido foi o beneficiário do pagamento que foi feito a respeito de uma factura cuja versão real contemplava uma forma de pagamento diversa da que foi feita constar na factura que chegou ao poder do cliente e, por isso, tendo mente as máximas da experiência, é de concluir que o arguido procedeu da forma narrada na acusação.

O que se vem de referir a respeito do cliente da operadora «PT Comunicações» é, mutatis mutandis, aplicável aos clientes da assistente, referindo-nos a MCC, FC, DN e VC, pois que também a este respeito a actuação do arguido é em tudo similar.

Explicitando, é de reter que a respeito da cliente MCC foi emitida pela então «Cabovisão, S.A.» a factura que consta de fls. 15-16 (apenso A), da qual constava como entidade de pagamento 20936 e 607 026 858 enquanto referência de pagamento, acontecendo que a factura que chegou efectivamente àquela, constante de fls. 25-27 (apenso A) e em tudo idêntica àqueloutra, continha a entidade 21312 e a referência 992 131 788, recordando-se que estas respeitam a cartão e conta bancária atinentes ao arguidos, conforme informação bancária já identificada supra, acontecendo que o pagamento por banda da cliente acabou por ser realizado a respeito desta última entidade e referência, conforme, aliás, surge certificado pelo talão de multibanco que consta de fls. 24 (apenso A), sendo que esse pagamento ocorreu em 22.7.2013, tal como também surge atestado em tal documento, cumprindo ainda ter em atenção que a cliente ora em menção depôs em audiência de discussão e julgamento e asseverou ter procedido a tal pagamento, tendo posteriormente recebido uma carta segundo a qual o valor constante da factura resulta ainda em dívida, a qual, aliás, consta de fls. 14 dos autos (apenso A), razão pela qual se dirigiu a uma loja da sobredita operadora, apercebendo-se então do engano, cabendo, todavia, ter em consideração que não concretizou em que data realizou essa deslocação, daí a não demonstração desse pequeno segmento da acusação.

Mais uma vez resulta que foi emitida uma factura pela operadora com uma entidade e referência aí apostas em consonância com a sua pretensão, mas que tal factura não chegou, no que a tais inscrições respeita, ao poder do cliente, antes acontecendo que este ingressou na detenção de uma factura contendo referência e entidade para pagamento atinentes ao arguido, acabando a sobredita cliente por realizar o pagamento em 22.7.2013 em consonância com estes últimos elementos. Daqui decorre que o arguido – uma vez mais considerando as regras da experiência comum e tendo em mente que foi ele o beneficiário do pagamento de um serviço que não lhe respeitava – obteve, ainda previamente a 22.7.2013, a factura original (i.e., a efectivamente emitida em concordância com a vontade da operadora de telecomunicações) e, sequentemente, introduziu-lhe uma entidade e referência diferentes das que aí tinham sido inscritas inicialmente.

O que se sucedeu a respeito de MCC, igualmente ocorreu a respeito dos clientes FC e DN, não se deixando de ter em mente que os originais das facturas que respeitam aos serviços que lhe foram prestados constam, respectivamente, de fls. 31-32 e de fls. 39-40, acontecendo, tal como relataram em audiência de discussão e julgamento com distanciamento e, por isso, com credibilidade, que as facturas que lhes chegaram através do correio são aquelas que constam, também respectivamente, de fls. 38 e 48, nas quais já surge a entidade e referência atinentes ao cartão e conta atinentes ao arguido, acabando por realizar os correspondentes pagamentos a respeito desta última entidade/referência, beneficiando assim o arguido ao invés da operadora que lhes prestava serviços de telecomunicações, acontecendo que as entidades/referências efectivamente atinentes a tal operadora correspondiam a 20936/607026868 e 20936/608018049.

Note-se, ainda, que a factualidade inscrita em 13. resulta asseverada pela missiva que consta de fls. 30 (apenso A) e, bem assim, do depoimento de FC, o qual referiu que a operadora de telecomunicações o contactou telefonicamente dando conta da falta de pagamento, dilucidando então o ocorrido, importando, todavia, salientar que o depoente não identificou a data precisa em que o telefonema ocorreu.

Por seu turno, o depoente DN asseverou que foi alertado para a falta de pagamento da factura (nos moldes efectivamente emitidos pela assistente) mediante sms, o qual foi reiterado, dirigindo-se então à loja da assistente, apercebendo-se do engano, cabendo, porém, consignar que não atestou a data de recebimento daquelas mensagens escritas e da ida a tal local.

Relativamente à cliente da assistente de nome VC, cumpre salientar que a prova documental também atesta uma situação similar às acima mencionadas. Com efeito, afere-se que a factura original resulta a junta a fls. 52-53 (apenso A), tendo aposta a entidade/referência para pagamento 20936/608189861, acontecendo que a fls.65 (apenso A) resulta junta uma factura em tudo idêntica àquela, mas constando da mesma, como entidade/referência pagamento, os sobreditos dados atinentes ao cartão e conta bancária atinentes ao arguido, sendo certo que a mencionada cliente acabou por proceder ao pagamento da quantia parcial de € 29,48 em 26.8.2013 a respeito desta última entidade/referência, beneficiando assim o arguido e não a operadora de serviços de telecomunicações que figura nos autos enquanto assistente, tal como resulta do talão de pagamento de fls. 66 (apenso A). Note-se, todavia, que a factura tem inscrita a quantia de € 64,72 e não de € 64,83, daí a precisão que se operou neste tocante nos factos provados e não provados.

Relativamente à factualidade inscrita em 21., é de reter que a mesma resulta sedimentada atento o teor da missiva que consta de fls. 51 (apenso A), não resultando demonstrado, porém, que VC tivesse contactado a assistente em 20.9.2013, pois que não foi produzida prova nesse sentido.

Também a respeito de FC, DN e VC, ante o que se vem dizendo, o Tribunal adquiriu convicção concordante com o plasmado na acusação no que se atém à circunstância de o arguido, previamente terem sido recebidas por aqueles, procedeu à alteração das facturas que foram emitidas a respeitos dos serviços de que aqueles eram beneficiários, não se deixando de ter em atenção, novamente, que a sua conta bancária e, por isso, ele próprio, foi beneficiada com os pagamentos efectivados em consonância com a entidade/referência alterada.

Adicionalmente, o Tribunal teve em ainda em atenção o depoimento da testemunha FMC, supervisora de facturação da assistente, a qual atestou que as facturas atinentes à sua entidade empregadora são geradas automaticamente pelo sistema informático, sendo a entidade sempre a mesma e respeitante à assistente e a referência gerada aleatoriamente e sendo relativa ao cliente. Ademais, atestou que as facturas geradas eram reencaminhadas, ainda em suporte digital, para a empresa “LogicaTI”, a qual procedia à sua impressão e expedição por via postal para o cliente, daí a demonstração da factualidade inscrita em 5..

Prosseguindo, é ainda de reter que a testemunha ora em menção asseverou que os ficheiros encaminhadas para a sobredita empresa não eram alterados por esta, somente procedendo à sua impressão. Note-se, aliás, que a assistente procedeu à junção de segunda vias das facturas originais (às quais, de resto, se tem vindo aludir supra), o que significa que o suporte digital não foi objecto de adulteração, pois que se o tivesse sido aquela junção tornar-se-ia inviável. Essa alteração, reitera-se, também não conseguida no âmbito da actividade desenvolvida pela CGITI”, pois que a depoente em referência atestou que as segundas vias eram então objecto de impressão também por tal empresa, a qual, sequentemente, as entregava à assistente. Por outro lado, é também de ter em mente a informação que consta de fls. 134 (apenso A), prestada pela “CGITI” (anterior “LogicaTI”), da qual se extrai que o arguido não foi funcionário de tal empresa.

Da análise conjugada do referido nos dois parágrafos antecedentes, cumpre, pois, concluir que, por um lado, a alteração das facturas no que respeita à entidade/referência não ocorreu durante o processo de emissão digital ainda no seio da estrutura da assistente, e, por outro, também não aconteceu durante o procedimento de emissão física (isto é, impressão), concluindo-se, pois, que o arguido teve acesso às facturas originais já após a sua emissão (quer digital, quer física, o que se enfatiza), daí a demonstração da versão mencionada na acusação a este respeito, ainda que não se tenha logrado apurar como tal acesso efectivamente ocorreu.

Adicionalmente, o Tribunal considerou ainda os depoimentos das testemunhas CR, As e DP, funcionários da assistente, os quais relataram e asseveraram as deslocações dos clientes da sua entidade empregadora às lojas onde prestavam funções, insurgindo-se, dando conta que já haviam procedido ao pagamento dos valores titulados pelas facturas.

De resto, foi com fundamento nos depoimentos inscritos no parágrafo antecedente, conjugados com os depoimentos dos clientes da assistente, que o Tribunal considerou demonstrada a factualidade inscrita em 34. do elenco da factualidade demonstrada. Cumpre, todavia, assinalar que os factos não ocorreram, contrariamente ao afirmado no pedido de indemnização cível, em meio rural/industrial e, por outro lado, nenhuma prova foi realizada no sentido de a assistente ter deixado de angariar novos clientes mercê da actuação do arguido.

Prosseguindo, é de ter em mente que na acusação se alude à circunstância de o arguido ter delineado um mesmo plano com vista à obtenção de benefícios patrimoniais indevidos, tendo-o executado por diversos actos, importa consignar que se considera tal circunstância como demonstrada. Por um lado, conforme já se fundamentou supra, as quantias inscritas nas facturas destinavam-se às operadoras de telecomunicações, obtendo o arguido um benefício patrimonial ao qual era efectivamente estranho e, por outro, afigura-se que o arguido actuou num contexto temporal muito delimitado (cerca de um mês) e de forma idêntica, isto é, mediante manipulação das facturas, fazendo constar delas sempre a mesma entidade e referência associadas a um cartão e conta bancária por si tituladas, daí que se considere que efectivamente ainda actuou na execução do mesmo plano.

No que concerne à circunstância de a assistente ter assumido o prejuízo decorrente do pagamento das facturas ter sido realizado ao arguido, o Tribunal, para além de considerar o teor da prova testemunhas neste âmbito e, mais concretamente, que os sobreditos clientes deixaram de receber avisos para pagamento das quantias já mencionadas supra, teve ainda em atenção o teor de fls. 279, 281, 283 e 285.

Relativamente à factualidade respeitante ao elemento objectivo e à consciência da ilicitude, o Tribunal considerou demonstrada tendo em atenção a apreciação da restante factualidade provada (i.e., a que se atém ao elemento objectivo) em consonância com as regras da experiência comum.

As condições pessoais atinentes ao arguido resultaram demonstradas tendo em mente as suas próprias declarações, as quais, a esta parte e ante o respectivo teor, foram verosímeis.

No que tange às condenações já sofridas pelo arguido, o Tribunal considerou o certificado de registo criminal que lhe respeita e que consta de fls. 529-541.
(…).»

2.3. Apreciação do recurso
Da impugnação da matéria de facto dada como provada, nos pontos 1 a 28

Alega o arguido/recorrente que ocorre uma total ausência de prova que permita dar como provados os factos que impugna e, concretamente, que haja praticado esses factos, sustentando que a prova indireta em que o Tribunal a quo se baseou não permite sustentar o juízo de certeza necessário para que aqueles factos pudessem ser dados como provados, para além da dúvida razoável.

Antes de apreciar a concreta questão enunciada, importa tecer algumas considerações teóricas a propósito da impugnação da matéria de facto, em sede recursiva:

Assim:
O recorrente que pretenda impugnar a matéria de facto, pode fazê-lo por duas vias, sendo uma delas, de âmbito mais restrito, invocando os vícios previstos no artigo 410º, nº 2, do C.P.P. (a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão; c) O erro notório na apreciação da prova) e a outra através da impugnação ampla da matéria de facto, a que se refere o artigo 412º, nºs 3, 4 e 6, do C.P.P.

Conforme vem sendo afirmado pela jurisprudência dos nossos Tribunais Superiores, no caso da invocação dos vícios decisórios previstos no artigo 410º, nº. 2 e, tal como decorre do mesmo preceito, tais vícios têm que resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum, não sendo admissível o recurso a elementos estranhos à decisão recorrida, para fundamentar a impugnação, ainda que constem dos autos e mesmo que tenham resultado do próprio julgamento.

Na situação da impugnação ampla da matéria de facto, invocando o recorrente o erro de julgamento por incorreta valoração da prova «a apreciação não se restringe ao texto da decisão, alargando-se à análise do que se contém e pode extrair da prova (documentada/gravada) produzida em audiência, mas sempre dentro dos limites fornecidos pelo recorrente no estrito cumprimento do ónus de especificação imposto pelos nºs 3 e 4 do art. 412º do C.P. Penal. (cfr., entre outros, Ac. da R.L. de 08/10/2015, proferido no proc. 220/15.3PBAMD.L1-9 e Ac. da R.P. de 30/09/2015, proc. 1223/14.0JAPRT, ambos acessíveis no endereço www.dgsi.pt).

Para cumprimento do aludido ónus de especificação, previsto no nº 3 do artigo 412º do C.P.P., o recorrente deve indicar:

a) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida; e
c) quando for caso disso, as provas que devem ser renovadas [quando for caso disso].

Tratando-se de provas gravadas, de harmonia com o disposto no nº. 4 do artigo 412º, do C.P.P., as duas últimas especificações são feitas por referência ao consignado na ata, nos termos do disposto no nº. 3 do artigo 364º, com a indicação concreta das passagens em que se funda a impugnação.

Neste domínio, o Tribunal da Relação só pode alterar a decisão de facto proferida pela 1ª instância se concluir no sentido de que as concretas provas especificadas pelo recorrente impõem decisão diversa da recorrida e não apenas se a permitirem.

A decisão do recurso sobre a matéria de facto não pode ignorar, antes tem de respeitar o princípio da livre apreciação da prova do julgador, estabelecido no artigo 127º do Código de Processo Penal, de acordo com a qual a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente, e a sua relação com os princípios da imediação e a oralidade.

Tal regra, como decorre do citado normativo, comporta algumas “exceções”, que se prendem com aspetos particulares das declarações do arguido, da prova testemunhal, e da prova pericial e documental.

A propósito da livre apreciação da prova, entende o Prof. Germano Marques da Silva, in Curso de Processo Penal, II, Lisboa, Verbo, 1993, pág. 111, que a mesma deve ser entendida como “valoração racional e crítica, de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos, que permita objetivar a apreciação, requisito necessário para uma efetiva motivação da decisão”.

Esta valoração da prova, que vai ser obrigatoriamente expressa na fundamentação da sentença (artigos 374º, nº. 2, do C.P.P. e 205º, nº. 1, da CRP), é importante porque constituiu “um verdadeiro factor de legitimação do poder jurisdicional, contribuindo para a congruência entre o exercício desse poder e a base sobre a qual repousa: o dever de dizer o direito no caso concreto (iuris dicere). E, nessa medida, é a garantia de espeito pelos princípios da legalidade, da independência do juiz e da imparcialidade das suas decisões”. – Ac. do TC nº. 281/2005, DR II Série de 6/7/2005, pág. 9844.

Do exposto decorre, por um lado, uma «intima conexão existente entre o princípio da livre apreciação da prova, o princípio da presunção de inocência, o dever de fundamentação das sentenças, o direito ao recurso, e o direito à tutela efectiva.» – Paulo Saragoça da Matta, A livre apreciação da prova e o dever de fundamentação da sentença, in Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais, Almedina, Junho de 2004, pág. 251.
*
Tendo presentes as considerações que se deixam expendidas e revertendo ao caso dos autos:

O arguido/recorrente impugna matéria de facto dada como provada sob os pontos 1 a 28, manifestando que a prova em que o Tribunal a quo se baseou não permite sustentar o juízo de certeza, para além da dúvida razoável, para que tais factos fossem dados como provados.

Defende que, na ausência de prova pericial que comprove que as faturas em causa foram adulteradas, no referente aos elementos de identificação da entidade e referência de pagamento e não tendo o arguido/recorrente formação académica ou técnica de informática, que o habilitasse a violar qualquer sistema de faturação para aceder às referenciadas faturas e a alterá-las naqueles elementos, nunca poderia o Tribunal a quo concluir, como o fez, que o arguido/recorrente procedeu à respetiva adulteração.

Aduz ainda o recorrente que o único facto que foi dado como provado e que foi confessado pelo arguido (de ser único titular do cartão pré-pago e conta bancaria identificados nos autos, por si utilizado no âmbito da sua actividade profissional enquanto “ técnico de informático “ para efeito de recebimento dos valores de alguns clientes por transferência bancária, esclarecendo ainda que os elementos de identificação desse cartão e conta bancária eram do conhecimento também, de terceiros com quem estabelecia contactos de compra e venda de componentes de computadores através de sites de venda na internet), não permitia extrair as ilações que o Tribunal a quo extraiu, dando como provados os factos impugnados, revelando-se o raciocínio seguido pelo julgador, incongruente e ilógico, contrariando as regras da experiência.

O Ministério Público, em ambas as instâncias pronuncia-se no sentido de que a prova a que o Tribunal a quo atendeu para dar como provados os factos impugnados pelo arguido/recorrente, ainda que indireta, é bastante para que assim decidisse, sendo destituída de fundamento a invocada necessidade de realização de perícia informática ou outra, nenhum reparo merecendo a sentença recorrida.

Vejamos:
Ainda que a impugnação da matéria de facto, nos moldes em que é feita pelo recorrente, criticando a valoração da prova feita pelo Tribunal a quo e contrapondo a apreciação pessoal que faz dessa prova, pudesse, desde logo, até pela inobservância do ónus de especificação previsto na al. b) do nº. 3 do artigo 412º do CPP, levar a que se considerasse infundada a impugnação e a que dela não se tomasse conhecimento, uma vez que o recorrente sustenta que o julgador decidiu contra as normas da lógica e as regras da experiência comum, apreciaremos, nessa vertente, a questão.

Assim:
Lida a motivação de facto exarada na sentença recorrida, que acima se deixou transcrita e que aqui se dá por reproduzida, é ponto assente que não existe prova direta da prática, pelo arguido/recorrente, dos factos que foram dados como provados.

Todavia, como salienta o Ministério Público e o arguido/recorrente também não põe em causa (ainda que invoque que no caso concreto essa prova é insuficiente), a prova da prática pelo agente de factos que constituem crime, não depende da existência de prova direta, nem a convicção do tribunal tem, obrigatoriamente, de se alicerçar nesse tipo de prova, podendo sustentar-se em prova indireta ou indiciária, que conjugada entre si e com as regras da experiência comum e da normalidade da vida, permita extrair ilações, que revelando-se lógicas e conformes àquelas regras, levem a inferir a factualidade imputada.

Como salienta o Cons. José António Henriques dos Santos Cabral, “Prova indiciária e as novas formas de criminalidade”, in Revista Julgar, nº. 17 - 2012, Coimbra Editora, página 13: «Na prova indiciária, mais do que em qualquer outra, intervêm a inteligência e a lógica do juiz. A prova indiciária pressupõe um facto, demonstrado através de uma prova directa, ao qual se associa uma regra da ciência, uma máxima da experiência ou uma regra de sentido comum. Este facto indiciante permite a elaboração de um facto-consequência em virtude de uma ligação racional e lógica (v.g., a prova directa – impressão digital – colocada no objecto furtado permite presumir que o seu autor está relacionado com o furto; da mesma forma, o sémen do suspeito na vítima de violação).»

Referindo-se às condições que devem estar presentes na prova indiciária (relativas aos factos indiciadores; à combinação ou síntese dos indícios; à combinação das inferências indiciárias; e à conclusão das mesmas) e respetivo desenrolar, escreve o mesmo autor, in ob. cit., páginas 31 e 32:
«(…)

4) Quando não se fundamentem em leis naturais que não admitem excepção, os indícios devem ser vários.

Todavia, a exigência formulada por alguns autores no sentido de existência de um determinado número de indícios concordantes não se afigura de todo razoável e antes se reconduz a uma exigência matemática de algo que se situa no domínio da lógica. De concreto pensamos que apenas se pode formular a exigência daquela pluralidade de indícios quando os mesmos considerados isoladamente não permitirem a certeza da inferência.

Porém quando o indício mesmo isolado é veemente, embora único, e eventualmente assente apenas na máxima da experiência o mesmo será suficiente para formar a convicção sobre o facto.

5) Os indícios devem ser concordantes, ou seja, conjugar-se entre si de maneira a produzir um todo coerente e natural, no qual cada facto indiciário tome a sua respectiva colocação quanto ao tempo, ao lugar e às demais circunstâncias
(…)
6) As inferências devem ser convergentes ou seja não podem conduzir a conclusões diversas e a ligação entre o facto base e a consequência que dele se extrai deve ajustar-se às regras da lógica e às máximas da experiência.

7) Por igual forma deve estar afastada a existência de contra indícios pois que tal existência cria uma situação de desarmonia que faz perder a clareza e poder de convicção ao quadro global da prova indiciária.»

O contra-indício destina-se a infirmar a força da presunção produzida e, caso não tenha capacidade para tanto, pela sua pouca credibilidade, mantém-se a presunção que se pretendia elidir.

Verificados os respetivos requisitos, pode-se afirmar que o desenrolar pressupõe três momentos distintos: a demonstração do facto base ou indício que, num segundo momento, faz despoletar no raciocínio do julgador uma regra da experiência, ou da ciência, que permite, num terceiro momento, inferir outro facto que será o facto sob julgamento.»

Assim e como vem decidindo o Supremo Tribunal de Justiça vem decidido, citando-se, a título de exemplo, o Acórdão de 23/11/2006, proc. 06P4096, que «As normas dos artigos 126.º e 127.º do CPP podem ser interpretadas de modo a que possam ser provados factos sem que exista prova direta deles. Basta a prova indireta, conjugada e interpretada no seu todo», interpretação esta que «não ofende quaisquer princípios constitucionais, como o da legalidade ou das garantias de defesa, ou da presunção de inocência e do contraditório, consagrados no artigo 32.º, n.ºs 1, 2 5 e 8 da Constituição da República Portuguesa, desde que haja uma fundamentação crítica dos meios de prova e um grau de recurso em matéria de facto para efetivo controlo da decisão».

Tendo presentes estas considerações, que acolhemos, e revertendo ao caso concreto, na motivação da decisão de facto exarada na sentença recorrida, na parte que aqui nos importa considerar, o tribunal a quo consignou o seguinte:
«(…)
No caso vertente cumpre salientar que o arguido prestou declarações, sendo que negou a autoria dos factos narrados na acusação. Com efeito, o arguido infirmou ter manipulado quaisquer facturas atinentes a serviços prestados pelas operadoras de telecomunicações mencionadas naquela peça processual, não se tendo apropriado de quaisquer valores que a estas fossem destinados, mormente por via de pagamento de facturas enviadas aos correspondentes clientes.

O arguido assumiu, porém, que o cartão pré-pago e conta bancária identificados na acusação eram da sua titularidade, sendo que asseverou que era a única pessoa com acesso à referida conta, mas dando conta que não tomava atenção aos movimentos da mesma, mormente por estar a passar um momento pessoal de alguma conturbação, referindo, assim, desconhecer se efectivamente os montantes mencionados no libelo acusatório ingressaram por qualquer via na sobredita conta de que era titular. (sublinhado nosso)

As declarações do arguido, impõe-se desde já consignar, não resultaram verosímeis. (sublinhado nosso) Na verdade, é de reter, em consonância com as regras da experiência comum, que quem é titular de uma conta bancária tem a preocupação de aferir do seu saldo e dos movimentos que lhe respeitam com alguma regularidade, sendo certo que os factos narrados na acusação se reportam, em suma, ao Verão de 2013, tendo decorrido mais de cinco anos desde a sua prática, daí que se afira por congruente com aquelas máximas que o arguido, desde então, já tivesse consultado os extractos atinentes à conta em apreço, ainda que tenha referido que a encerrou no ano de 2014. Mas se refere que a encerrou no ano de 2014, ainda se afere com maior grau de certeza que tivesse consultado o correspondente saldo e movimentos previamente a proceder de tal forma. Note-se, aliás, que é de ter em atenção que o arguido referiu que utilizava a entidade e referência associados ao cartão pré-pago e à conta bancária para receber quantias atinentes aos trabalhos que efectuava junto de clientes, daí que se afira ainda por mais intensa a preocupação de aferir com regularidade dos movimentos atinentes a essa conta, mormente os aí registados a crédito. Essa necessidade ainda será maior se se considerar que a conta bancária titulada pelo arguido registou um saldo máximo de € 127,59 – quantia assaz modesta – conforme se colhe da análise do extracto de fls. 75-76 dos autos. De resto, da análise do mencionado extracto afere-se que foram creditados na conta da titularidade do arguido os montantes discriminados na acusação, não se olvidando a equivalência das quantias e a data dos movimentos em apreço.

Assim, face ao que se vem dizendo, importa reter que as declarações do arguido, de per se, não se afiguram credíveis, não só porque o seu conteúdo se afere, nos moldes assinalados, por inverosímil, mas também se se considerar que foram prestadas de forma pouco espontânea, isto é, já após produzida toda a prova.

Prosseguindo e como já resulta evidenciado pelo rol dos factos provados e não provados, o Tribunal adquiriu a convicção de que os factos ocorreram nos moldes assinalados na acusação, cabendo explicitar o porquê desta asserção.

Procedendo, assim, à explicitação da mencionada conclusão, é de reconhecer, num primeiro momento, que não foi produzida prova directa da intervenção do arguido, isto é, nenhuma das testemunhas inquiridas em contexto de audiência de discussão e julgamento revelaram sequer conhecer o arguido, não tendo atestado qualquer intervenção da sua parte.

A circunstância de não se ter produzido prova directa da intervenção do arguido não significa, sem mais, que os factos narrados na acusação sejam insusceptíveis de prova, sendo de salientar que a prova indirecta é também ela própria valorável (…).

Volvendo ao caso concreto, importa reter que resultou demonstrado que AJ era cliente da empresa de telecomunicações denominada «PT Comunicações, S.A.» (hoje denominada “Meo”) e, por seu turno, MCC, FC, DN e VC eram clientes da operadora «Cabovisão», ora assistente e com a actual denominação de “Nowo”, sendo que o eram a respeito do contexto de tempo narrado no libelo acusatório. Com efeito, é de reter que todos – com excepção de VC – foram inquiridos em sede de audiência de discussão e julgamento, confirmando o circunstancialismo ora em menção, sendo que a respeito da última pessoa ora identificada é de reter que o contrato de prestação de serviços de telecomunicações que se lhe refere e que a vincula à segunda operadora resulta junto a fls. 54-56 dos autos (apenso A).

Prosseguindo, é de reter que por referência às sobreditas relações contratuais foram sendo emitidas facturas pelas supramencionadas operadoras de telecomunicações, entre as quais aquelas a que se faz alusão no libelo acusatório. Mais concretamente, a factura de fls. 9/15 (emitida pela operadora «PT Comunicações, S.A.», emitida em nome de AJ, sendo respeitante ao mês de Julho de 2013 e à quantia de € 89,98, contendo, para pagamento, a entidade 21159 e a referência 214 660 539, sendo que a fls. 10 conata uma factura em tudo idêntica, mas que contém enquanto entidade de pagamento “21312” e referência “992 131 788”. Somente a factura de fls. 9, também constante de fls. 15 corresponde à que foi emitida pela operadora em referência, não se olvidando a informação de fls. 14 prestada por essa empresa e, por outro lado, se se considerar que a entidade e referência de pagamento “21312” e “992 131 788”, respeitam a cartão e conta bancária tituladas pelo arguido, conforme consta assinalado pelas informações da SIBS de fls. 18 (fls. 87 do apenso «A») e da instituição bancária Montepio de fls. 22-23, 45-48, 74-76 e 116-118, sendo tal informação reiterada a fls. 101-104 do apenso «A», cabendo ter em mente que o arguido é pessoa manifestamente estranha à relação existente entre a operadora de telecomunicações a que ora se faz menção e ao seu cliente AJ, pelo que estranha à execução dessa relação e, mais concretamente, aos pagamentos efectuados no seu âmbito também o é aquele cartão e aquela conta.

Note-se, ademais, que a testemunha AJ, para além de ter asseverado a relação contratual com a empresa «PT comunicações», igualmente atestou ter recebido em sua casa, via correio a factura que consta de fls. 10, tendo então procedido ao pagamento da quantia aí mencionada através de uma máquina multibanco (não mencionado, porém que o tenha feito na Rua…., Pinhal Novo, daí a não prova deste segmento da acusação), introduzindo, para o efeito, a referência e entidade que aí resulta inscrita, relatando que posteriormente foi confrontado pela operadora com a referida falta de pagamento, tendo-se dirigido aos serviços da mesma, aduzindo ainda que acabou por proceder ao pagamento da mesma factura uma segunda vez, sendo que o pagamento respeitante à referência e entidade inscritas a fls. 10 resultam certificados através do talão de multibanco de fls. 11. De resto, neste âmbito só ficou por demonstrar que a factura efectivamente emitida pela «PT Comunicações» tenha sido recebida no dia 4.9.2013 por AJ, pois que pese embora se extraia do seu depoimento que acabou por pagá-la, não concretizou o momento em que recebeu a factura verdadeira para tal efeito.

Do que se vem dizendo importa reter que a factura efectivamente emitida pela operadora “PT Comunicações, S.A.” não chegou, num primeiro momento, ao seu cliente AJ, tendo chegado ao seu poder, mediante via postal, uma factura em tudo igual àquela, exceptuando a referência e entidade para pagamento do valor nela exarado, conforme resulta do confronto de fls. 9/15 e de fls. 10. Ora, essa entidade e referência são atinentes a cartão pré-pago e conta bancária titulados pelo arguido, o que significa que o mesmo – que reconheceu ser o único titular da conta e a única pessoa com acesso efectivo à mesma – foi beneficiário do pagamento em referência, pagamento que não lhe era devido porquanto pessoa estranha à relação cliente – operadora de telecomunicações. (sublinhado nosso)

Ora, sendo o arguido o beneficiário do sobredito pagamento, tendo-o sido porquanto foi aposta uma entidade/referência de pagamento que lhe respeita numa factura em tudo idêntica à realmente emitida pela operadora de telecomunicações, então é de concluir que, previamente ao pagamento realizado em 13.8.2013 (v., novamente, o talão de fls. 11), o arguido logrou ter acesso a essa factura real, ali fez inscrever aquela entidade/referência que não era a inicialmente aí exarada e fez chegar essa factura para o cliente da operadora, tudo em consonância com as regras da experiência, cabendo, aliás, explicitar que não é credível que um terceiro que não o arguido se apoderasse da referida factura e que sequentemente a adulterasse a respeito da forma de pagamento de molde a beneficiar exclusivamente o arguido, mormente sem o conhecimento deste. (sublinhado nosso)

Importa, pois, sintetizar que o arguido foi o beneficiário do pagamento que foi feito a respeito de uma factura cuja versão real contemplava uma forma de pagamento diversa da que foi feita constar na factura que chegou ao poder do cliente e, por isso, tendo mente as máximas da experiência, é de concluir que o arguido procedeu da forma narrada na acusação.

O que se vem de referir a respeito do cliente da operadora «PT Comunicações» é, mutatis mutandis, aplicável aos clientes da assistente, referindo-nos a MCC, FC, DN e VC, pois que também a este respeito a actuação do arguido é em tudo similar.

Explicitando, é de reter que a respeito da cliente MCC foi emitida pela então «Cabovisão, S.A.» a factura que consta de fls. 15-16 (apenso A), da qual constava como entidade de pagamento 20936 e 607 026 858 enquanto referência de pagamento, acontecendo que a factura que chegou efectivamente àquela, constante de fls. 25-27 (apenso A) e em tudo idêntica àqueloutra, continha a entidade 21312 e a referência 992 131 788, recordando-se que estas respeitam a cartão e conta bancária atinentes ao arguido, conforme informação bancária já identificada supra, acontecendo que o pagamento por banda da cliente acabou por ser realizado a respeito desta última entidade e referência, conforme, aliás, surge certificado pelo talão de multibanco que consta de fls. 24 (apenso A), sendo que esse pagamento ocorreu em 22.7.2013, tal como também surge atestado em tal documento, cumprindo ainda ter em atenção que a cliente ora em menção depôs em audiência de discussão e julgamento e asseverou ter procedido a tal pagamento, tendo posteriormente recebido uma carta segundo a qual o valor constante da factura resulta ainda em dívida, a qual, aliás, consta de fls. 14 dos autos (apenso A), razão pela qual se dirigiu a uma loja da sobredita operadora, apercebendo-se então do engano, cabendo, todavia, ter em consideração que não concretizou em que data realizou essa deslocação, daí a não demonstração desse pequeno segmento da acusação.

Mais uma vez resulta que foi emitida uma factura pela operadora com uma entidade e referência aí apostas em consonância com a sua pretensão, mas que tal factura não chegou, no que a tais inscrições respeita, ao poder do cliente, antes acontecendo que este ingressou na detenção de uma factura contendo referência e entidade para pagamento atinentes ao arguido, acabando a sobredita cliente por realizar o pagamento em 22.7.2013 em consonância com estes últimos elementos. Daqui decorre que o arguido – uma vez mais considerando as regras da experiência comum e tendo em mente que foi ele o beneficiário do pagamento de um serviço que não lhe respeitava – obteve, ainda previamente a 22.7.2013, a factura original (i.e., a efectivamente emitida em concordância com a vontade da operadora de telecomunicações) e, sequentemente, introduziu-lhe uma entidade e referência diferentes das que aí tinham sido inscritas inicialmente. (sublinhado nosso)

O que se sucedeu a respeito de MCC, igualmente ocorreu a respeito dos clientes FC e DN, não se deixando de ter em mente que os originais das facturas que respeitam aos serviços que lhe foram prestados constam, respectivamente, de fls. 31-32 e de fls. 39-40, acontecendo, tal como relataram em audiência de discussão e julgamento com distanciamento e, por isso, com credibilidade, que as facturas que lhes chegaram através do correio são aquelas que constam, também respectivamente, de fls. 38 e 48, nas quais já surge a entidade e referência atinentes ao cartão e conta atinentes ao arguido, acabando por realizar os correspondentes pagamentos a respeito desta última entidade/referência, beneficiando assim o arguido ao invés da operadora que lhes prestava serviços de telecomunicações, acontecendo que as entidades/referências efectivamente atinentes a tal operadora correspondiam a 20936/607026868 e 20936/608018049. (sublinhado nosso)

Note-se, ainda, que a factualidade inscrita em 13. resulta asseverada pela missiva que consta de fls. 30 (apenso A) e, bem assim, do depoimento de FC, o qual referiu que a operadora de telecomunicações o contactou telefonicamente dando conta da falta de pagamento, dilucidando então o ocorrido, importando, todavia, salientar que o depoente não identificou a data precisa em que o telefonema ocorreu.

Por seu turno, o depoente DN asseverou que foi alertado para a falta de pagamento da factura (nos moldes efectivamente emitidos pela assistente) mediante sms, o qual foi reiterado, dirigindo-se então à loja da assistente, apercebendo-se do engano, cabendo, porém, consignar que não atestou a data de recebimento daquelas mensagens escritas e da ida a tal local.

Relativamente à cliente da assistente de nome VC, cumpre salientar que a prova documental também atesta uma situação similar às acima mencionadas. Com efeito, afere-se que a factura original resulta a junta a fls. 52-53 (apenso A), tendo aposta a entidade/referência para pagamento 20936/608189861, acontecendo que a fls.65 (apenso A) resulta junta uma factura em tudo idêntica àquela, mas constando da mesma, como entidade/referência pagamento, os sobreditos dados atinentes ao cartão e conta bancária atinentes ao arguido, sendo certo que a mencionada cliente acabou por proceder ao pagamento da quantia parcial de € 29,48 em 26.8.2013 a respeito desta última entidade/referência, beneficiando assim o arguido e não a operadora de serviços de telecomunicações que figura nos autos enquanto assistente, tal como resulta do talão de pagamento de fls. 66 (apenso A). Note-se, todavia, que a factura tem inscrita a quantia de € 64,72 e não de € 64,83, daí a precisão que se operou neste tocante nos factos provados e não provados. (sublinhado nosso)

Relativamente à factualidade inscrita em 21., é de reter que a mesma resulta sedimentada atento o teor da missiva que consta de fls. 51 (apenso A), não resultando demonstrado, porém, que VC tivesse contactado a assistente em 20.9.2013, pois que não foi produzida prova nesse sentido.

Também a respeito de FC, DN e VC, ante o que se vem dizendo, o Tribunal adquiriu convicção concordante com o plasmado na acusação no que se atém à circunstância de o arguido, previamente terem sido recebidas por aqueles, procedeu à alteração das facturas que foram emitidas a respeitos dos serviços de que aqueles eram beneficiários, não se deixando de ter em atenção, novamente, que a sua conta bancária e, por isso, ele próprio, foi beneficiada com os pagamentos efectivados em consonância com a entidade/referência alterada. (sublinhado nosso)

Adicionalmente, o Tribunal teve em ainda em atenção o depoimento da testemunha FMC, supervisora de facturação da assistente, a qual atestou que as facturas atinentes à sua entidade empregadora são geradas automaticamente pelo sistema informático, sendo a entidade sempre a mesma e respeitante à assistente e a referência gerada aleatoriamente e sendo relativa ao cliente. Ademais, atestou que as facturas geradas eram reencaminhadas, ainda em suporte digital, para a empresa “LogicaTI”, a qual procedia à sua impressão e expedição por via postal para o cliente, daí a demonstração da factualidade inscrita em 5..

Prosseguindo, é ainda de reter que a testemunha ora em menção asseverou que os ficheiros encaminhadas para a sobredita empresa não eram alterados por esta, somente procedendo à sua impressão. Note-se, aliás, que a assistente procedeu à junção de segunda vias das facturas originais (às quais, de resto, se tem vindo aludir supra), o que significa que o suporte digital não foi objecto de adulteração, pois que se o tivesse sido aquela junção tornar-se-ia inviável. Essa alteração, reitera-se, também não conseguida no âmbito da actividade desenvolvida pela CGITI”, pois que a depoente em referência atestou que as segundas vias eram então objecto de impressão também por tal empresa, a qual, sequentemente, as entregava à assistente. Por outro lado, é também de ter em mente a informação que consta de fls. 134 (apenso A), prestada pela “CGITI” (anterior “LogicaTI”), da qual se extrai que o arguido não foi funcionário de tal empresa.

Da análise conjugada do referido nos dois parágrafos antecedentes, cumpre, pois, concluir que, por um lado, a alteração das facturas no que respeita à entidade/referência não ocorreu durante o processo de emissão digital ainda no seio da estrutura da assistente, e, por outro, também não aconteceu durante o procedimento de emissão física (isto é, impressão), concluindo-se, pois, que o arguido teve acesso às facturas originais já após a sua emissão (quer digital, quer física, o que se enfatiza), daí a demonstração da versão mencionada na acusação a este respeito, ainda que não se tenha logrado apurar como tal acesso efectivamente ocorreu. (sublinhado nosso)

Adicionalmente, o Tribunal considerou ainda os depoimentos das testemunhas CR, AS e DP, funcionários da assistente, os quais relataram e asseveraram as deslocações dos clientes da sua entidade empregadora às lojas onde prestavam funções, insurgindo-se, dando conta que já haviam procedido ao pagamento dos valores titulados pelas facturas.
(…)
Prosseguindo, é de ter em mente que na acusação se alude à circunstância de o arguido ter delineado um mesmo plano com vista à obtenção de benefícios patrimoniais indevidos, tendo-o executado por diversos actos, importa consignar que se considera tal circunstância como demonstrada. Por um lado, conforme já se fundamentou supra, as quantias inscritas nas facturas destinavam-se às operadoras de telecomunicações, obtendo o arguido um benefício patrimonial ao qual era efectivamente estranho e, por outro, afigura-se que o arguido actuou num contexto temporal muito delimitado (cerca de um mês) e de forma idêntica, isto é, mediante manipulação das facturas, fazendo constar delas sempre a mesma entidade e referência associadas a um cartão e conta bancária por si tituladas, daí que se considere que efectivamente ainda actuou na execução do mesmo plano.
(…)
Relativamente à factualidade respeitante ao elemento objectivo e à consciência da ilicitude, o Tribunal considerou demonstrada tendo em atenção a apreciação da restante factualidade provada (i.e., a que se atém ao elemento objectivo) em consonância com as regras da experiência comum.»

Lida a motivação acabada de transcrever, entendemos que a decisão do tribunal a quo, ao dar como provados os factos impugnados pelo arguido/recorrente mostra-se devidamente fundamentada, decorrendo do raciocínio explanado, que o julgador acolheu uma solução consentânea com as regras da experiência comum, suportada pelas provas que enuncia e a cujo exame crítico procedeu, decidindo de acordo com a sua livre convicção, nos termos do artigo 127º do C.P.P.

Tendo o arguido/recorrente, nas declarações que prestou, na audiência de julgamento, admitido que o cartão pré-pago e a conta bancária identificados nos autos, eram da sua titularidade, assegurando ser ele a única pessoa com acesso à referida conta e não merecendo credibilidade ao Tribunal a quo, pelas razões que explicitou, a versão que o arguido apresentou, de que não tomava atenção aos movimentos dessa conta e que desconhecia que nela tinham sido depositados os valores em causa, respeitantes ao pagamento de faturas originalmente emitidas pelas empresas de telecomunicações referenciadas e a quem eram devidos aqueles valores, considerando o contexto e circunstâncias, designadamente, de tempo, em que os factos ocorrerem, sendo o arguido técnico informático (independentemente da sua maior ou menor preparação ou do seu nível de conhecimentos nesse domínio, não estando demonstrado que fosse básico, como alega o recorrente), entendemos que a ilação extraída pelo Tribunal a quo, de que o arguido/recorrente foi o autor dos factos que deu como provados, designadamente, que procedeu à alteração dos elementos das faturas indicadas, no respeitante à entidade, à referência para pagamento e, num dos casos, também ao respetivo valor, mostra-se lógica, racional e consentânea com as regras da experiência comum.

De salientar os seguintes aspetos:

Primeiro: Como bem se refere na motivação da decisão de facto, não é credível/verosímil que um terceiro, que não o arguido, se apoderasse das referidas faturas e que as adulterasse, nos campos referentes à entidade e referência de pagamento, de modo a beneficiar, exclusivamente, o arguido, mormente sem o conhecimento deste;

Segundo: Contrariamente ao que parece ser entendimento do arguido/recorrente, a prova dos factos de que se trata, designadamente, no referente à alteração dos documentos/faturas nos elementos referentes ao pagamento, não exigia a realização de prova pericial, a tais documentos/faturas, resultando da prova testemunhal produzida que aqueles documentos foram alterados, conforme devidamente explicitado pelo Tribunal a quo, na motivação da decisão de facto;

Terceiro: Inexiste qualquer contraindício ou elemento de prova que leve a equacionar outra hipótese de probabilidade contrária ou alternativa àquela que o Tribunal a quo deu como provada, em termos de poder gerar a dúvida – que teria de ser fundada e razoável –, quanto a ter sido o arguido a praticar os factos dados como provados.

Por todo o exposto, concluímos não existir erro de julgamento, estando a convicção alicerçada pelo Tribunal a quo devidamente fundamentada e o juízo da valoração da prova efetuado mostra-se estribado em razões objetivas e em consonância às regras da experiência comum e da normalidade da vida, não merecendo, por isso, qualquer censura a decisão do tribunal a quo ao dar como provados os factos impugnados pelo recorrente, que, se têm, assim, como definitivamente fixados.

Permanecendo inalterada a matéria de facto dada como provada, mantém-se a condenação do arguido/recorrente, nos termos decididos na sentença recorrida.

O recurso, é, pois, improcedente.

3 – DISPOSITIVO
Nestes termos, em face do exposto, acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal deste Tribunal da Relação de Évora em negar provimento ao recurso e, consequentemente, em confirmar a sentença recorrida.

Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 (três) UC´s (artigo 513º, n.º 1 e 3, do CPP e artigo 8.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais e Tabela III, anexa).

Notifique.

Évora, 26 de março de 2019

MARIA DE FÁTIMA BERNARDES

GILBERTO CUNHA