Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
5159/23.6T8STB.E1
Relator: EMÍLIA RAMOS COSTA
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
DENÚNCIA DO CONTRATO
PRAZO
PROFESSOR
NORMA IMPERATIVA
COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Data do Acordão: 05/22/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE A SENTENÇA RECORRIDA
Área Temática: SOCIAL
Sumário: Sumário elaborado pela relatora (artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil):

I – O art. 400.º, n.º 2, do Código de Trabalho, é uma norma imperativa, que fixa, por um lado, o prazo máximo permitido por lei para a fixação do pré-aviso, e, por outro, as situações em que o prazo normal pode ser alargado até ao referido prazo máximo.


II – Enquanto que o art. 112.º, n.º 1, al. b), ponto i), do Código do Trabalho, quanto ao grau de responsabilidade, exige que o trabalhador ocupe cargo com elevado grau de responsabilidade; o art. 400.º, n.º 2, do mesmo Diploma Legal, limite-se a exigir que o trabalhador ocupe cargo com funções de responsabilidade.


III – A função educativa pressupõe especial preparação e capacidade por parte de quem a exerce, pelo que numa situação em que o critério é apenas o da existência de funções de responsabilidade, não se exigindo sequer elevado grau de responsabilidade, tal função terá de se considerar inserida nesse critério.


IV – A norma prevista no art. 279.º, n.º 1, do Código do Trabalho tem carácter imperativo, proibindo a compensação pela entidade empregadora de créditos que possua sobre o trabalhador durante a pendência do contrato de trabalho, excetuadas as situações previstas no n.º 2 do mesmo artigo.


V – Não estando em causa qualquer das situações previstas no referido n.º 2, compete ao juiz, em face do que resulta dos factos provados, verificar se a compensação efetuada pela entidade empregadora ocorreu durante a vigência do contrato de trabalho ou após a sua cessação, inexistindo qualquer desvalorização na aplicação deste artigo, quer durante o período correspondente ao aviso prévio, em que o contrato de trabalho se mantém em vigor, quer quanto ao último dia de vigência desse mesmo contrato.


VI – O estabelecimento de prazos é um reflexo do princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança.


VII – Os danos não patrimoniais da trabalhadora são ressarcidos se (i) tiver existido um comportamento ilícito e culposo da entidade patronal; (ii) existir danos por parte da trabalhadora; (iii) tais danos, pela sua gravidade, sejam merecedores da tutela do direito (não sendo indemnizáveis meros incómodos); e (iv) exista um nexo causal entre o referido comportamento e os danos sofridos.


VIII – Não tendo resultado provado factos concretos suscetíveis de permitir aferir pela existência de danos e muito menos sobre a gravidade desses danos, o pedido de indemnização por danos não patrimoniais é de improceder.

Decisão Texto Integral: Processo n.º 5159/23.6T8STB.E1

Secção Social do Tribunal da Relação de Évora1





Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:


I – Relatório


AA (Autora) intentou a presente ação declarativa de condenação, emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, contra “BB – Jardins de Infância e Ensino Básico, Lda.” (Ré), solicitando, a final, que a Ré seja condenada a pagar à Autora a quantia de €3.597,94, acrescida de juros de mora vencidos e vincendos até integral pagamento e que se fixam em €126,57, bem como no pagamento de montante indemnizatório a fixar, destinado ao ressarcimento de danos não patrimoniais, que não poderá ser inferior a €2.000,00.


Alegou, em síntese, que, em face de a Autora, que exercia as funções de professora de 1.ª ciclo, ter feito cessar o contrato de trabalho que vigorava com a Ré, dando um pré-aviso de 30 dias, esta não lhe pagou a retribuição do último mês, bem como os demais créditos devidos, invocando o incumprimento pela Autora do pré-aviso de seis meses, razão pela qual lhe descontara a quantia devida.


Alegou, também, que as suas funções não integram o conceito do art. 400.º, n.º 2, do Código do Trabalho, pelo que a Autora cumpriu o pré-aviso a que se encontrava obrigada, acrescendo ainda que a compensação de créditos efetuada pela Ré ocorreu no âmbito de vigência do contrato de trabalho, pelo que se encontra a mesma proibida, nos termos do art. 279.º, n.º 1, do Código do Trabalho.


Alegou ainda que o não pagamento pela Ré da retribuição e demais créditos que lhe eram devidos, impediu-a de honrar os seus compromissos, causando-lhe elevado stress, insónias, desânimo e preocupações, tendo tido necessidade de recorrer à ajuda de familiares.





Realizada a audiência de partes, não foi possível resolver o litígio por acordo.





Citada a Ré, a mesma não apresentou contestação, vindo, posteriormente, requerer que não se considerasse citada, concedendo-lhe um novo prazo para contestar.





Por despacho proferido em 15-05-2024, o tribunal a quo considerou a Ré devidamente citada e na mesma data proferiu sentença, com o seguinte teor decisório:

Por todo o exposto, julgo a acção parcialmente procedente e, em consequência:

a) condeno a R. a pagar à A. a quantia de 705,00 €, acrescida dos juros de mora, à taxa supletiva legal, vencidos desde 01/09/2022 e até efectivo e integral pagamento;

b) absolvo a R. quanto ao mais pedido contra si.

*

Fixo à acção o valor de 5.597,94 €, nos termos do disposto nos arts. 296º; 297º e 306º, do CPC.

*

Custas da acção a cargo de A. e R., na proporção do respectivo decaimento.

*

Notifique e registe.

*

Face ao decidido, dou sem efeito a data de julgamento.

*

Dê baixa.




Inconformada com a sentença, veio a Autora interpor recurso de apelação, terminando com as seguintes conclusões:

A. Deve reconhecer-se que a Recorrente não ocupava, à altura da denúncia do contrato de trabalho dos autos, um cargo com funções de responsabilidade.

B. Termos em que a Recorrente cumpriu integral e irrepreensivelmente o prazo de aviso prévio a que se encontrava adstrita, nos termos do art. 400.º, n.º 1, do CT.

C. Deve a Recorrida, consequentemente, ser condenada ao pagamento da quantia devida e tempestivamente peticionada na petição inicial, nomeadamente os € 3.597,94 (três mil, quinhentos e noventa e sete euros e noventa e quatro cêntimos), acrescidos de juros de mora vencidos e vincendos até ao integral e efectivo pagamento, que, na presente data (18/06/2024), ascendem a € 259,05 (duzentos e cinquenta e nove euros e cinco cêntimos).

Mais,

D. Durante a pendência do contrato de trabalho, o que apenas poderá significar até ao seu último dia de vigência, não pode a entidade empregadora compensar eventuais créditos que detenha, mesmo que licitamente formados, contra o trabalhador.

E. Impondo-se o reconhecimento da inexistência de validade quanto à compensação extrajudicial realizada pela Recorrida, dado ter a mesma tomado lugar na “pendência do contrato” e ser, portanto, contrária ao disposto no n.º 1 do art. 279.º do CT, e, assim, ilícita.

De seguida,

F. Devem os factos articulados pela Autora ser tidos como confessados e provados.

G. Em especial, e sem prejuízo da restante, a factualidade reconduzível aos danos não patrimoniais concreta e tempestivamente alegados.

H. Conforme explanado na petição inicial e dilucidado nas alegações expendidas supra, a quantia em dívida legitimamente reclamada fixa-se nos € 3.597,94 (três mil, quinhentos e noventa e sete euros e noventa e quatro cêntimos).

I. À luz do valor em dívida (ou de qualquer outro), em concordância ao exposto, resulta claro para todo e qualquer cidadão medianamente zeloso e diligente – mais ainda para um julgador experiente e conhecedor da realidade circundante – que da factualidade envolvente emergem prejuízos assinaláveis.

J. Prejuízos relacionados com as dívidas que se viu, assim, impossibilitada de satisfazer por meios próprios e para cujo pagamento se viu a Recorrente forçada a recorrer à ajuda de familiares, bem como, em traços mais amplos, com a aguda degradação do seu estado de saúde psíquica.

K. Devendo arbitrar-se uma indemnização, para compensação dos danos não patrimoniais elencados, nunca inferior a € 2.000,00.

Nestes termos e nos melhores de Direito do suprimento de V. Ex.as, deverá ser concedido provimento ao presente recurso, alterando a Douta Decisão recorrida nos termos propugnados nas presentes alegações.

É o que se pede e se espera deste Tribunal, assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!




A Ré apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção da sentença recorrida.





O tribunal de 1.ª instância admitiu o recurso como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.


Já neste Tribunal, o recurso foi admitido nos seus exatos termos e em cumprimento do disposto no art. 87.º, n.º 3, do Código de Processo do Trabalho, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se no sentido da procedência do recurso quanto à impossibilidade de compensação de créditos por parte da Ré.


Não houve respostas ao parecer.


Após os autos terem ido aos vistos, cumpre agora apreciar e decidir.





II – Objeto do Recurso


Nos termos dos arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis por remissão do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo de Trabalho, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da recorrente, ressalvada a matéria de conhecimento oficioso (art. 662.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).


No caso em apreço, as questões que importa decidir são:


1) Prazo do pré-aviso;


2) Impossibilidade de compensação de créditos na vigência do contrato de trabalho; e


3) Direito a indemnização por danos não patrimoniais.





III – Matéria de Facto


O tribunal a quo considerou confessados os factos alegados pela Autora, em face da não contestação da Ré, tendo transcrito, em sede de Relatório, o teor da petição inicial.





IV – Enquadramento jurídico


1 – Prazo do pré-aviso


Entende a recorrente que não ocupava, à altura da denúncia do contrato de trabalho, um cargo com funções de responsabilidade, pelo que cumpriu integral e irrepreensivelmente o prazo de aviso prévio a que se encontrava adstrita, nos termos do n.º 1 do art. 400.º do Código do Trabalho.


Dispõe o art. 400.º, nºs. 1 e 2, do Código do Trabalho, que:2

1 - O trabalhador pode denunciar o contrato independentemente de justa causa, mediante comunicação ao empregador, por escrito, com a antecedência mínima de 30 ou 60 dias, conforme tenha, respectivamente, até dois anos ou mais de dois anos de antiguidade.

2 - O instrumento de regulamentação colectiva de trabalho e o contrato de trabalho podem aumentar o prazo de aviso prévio até seis meses, relativamente a trabalhador que ocupe cargo de administração ou direcção, ou com funções de representação ou de responsabilidade.

A sentença recorrida fundamentou a existência de um prazo de 6 meses de aviso prévio, nos seguintes termos:

Efectivamente, e como bem refere a A. a R. procedeu, aquando o acerto das contas finais, à dedução do valor correspondente ao pré-aviso não observado pela trabalhadora aquando da denúncia do contrato de trabalho.

Estabelece a Cl.ª 5ª, daquele contrato de trabalho, que ele tem o seu início a 01/09/2020.

Na sua Cl.ª 8ª, as partes fixaram o período experimental de 180 dias, uma vez que a A. “vai exercer cargo de complexidade técnica, elevado grau de responsabilidade e que pressupõe uma especial qualificação”.

Finalmente, as partes acordaram na Cl.ª 9ª que “O prazo de aviso prévio é se seis meses, conforme é o estabelecido no art. 400º do CT”.

[…]3

Conforme se viu, a A. foi contratada para desempenhar as funções de Professora do 1º Ciclo.

Como pretendemos fazer ver à A., é inequívoco para nós que uma professora exerce um cargo de complexidade técnica e de elevado grau de responsabilidade.

Ao que parece a A. não entende assim, na medida em que se julga um trabalhador com responsabilidades normais.

É pena que a mesma se olhe assim, menorizando a sua qualidade. Certamente os seus colegas professores, que dia após dia têm saído para a rua em greves que a todos penalizam, inclusivamente aos próprios que se vêem privados da retribuição daquele dia de luta, não se vêem assim.

Dispõe o art. 112º, do CT, que:

1 - No contrato de trabalho por tempo indeterminado, o período experimental tem a seguinte duração:

a) 90 dias para a generalidade dos trabalhadores;

b) 180 dias para trabalhadores que:

i) Exerçam cargos de complexidade técnica, elevado grau de responsabilidade ou que pressuponham uma especial qualificação;

ii) Desempenhem funções de confiança;

iii) Estejam à procura de primeiro emprego e desempregados de longa duração;

c) 240 dias para trabalhador que exerça cargo de direcção ou quadro superior.

(…)

8 - A antiguidade do trabalhador conta-se desde o início do período experimental.

Conforme ensina MILENA ROUXINOL, “[é] igualmente óbvio que as maiores dificuldades suscitadas pelas alíneas b) e c) do n.º 1 do art. 112º se relacionam com o preenchimento dos conceitos indeterminados a que o legislador recorre nessas disposições.

Por certo caberá à jurisprudência um papel essencial na definição destes conceitos. Diríamos que, enquanto a alínea b) apresenta uma abrangência assinalável, aí podendo integrar-se, dependendo do grau de criatividade, tecnicicidade ou exigência em causa, actividades como a de cozinheiro ou costureiro, mas também a de educador de infância ou a de cuidador de idosos, contabilista, advogado, secretário, etc. (...)”

E de facto, aqueles conceitos não são novos no nosso ordenamento jurídico, tendo surgido pela primeira vez no Decreto-lei n.º 403/91, de 16/10, e tendo sido já sujeitos ao crivo do Tribunal Constitucional, através do seu Acórdão n.º 64/91.

Houve já muita estrada para andar e o caminho foi feito.

Conforme se escreveu no Ac. da Rel. do Porto, de 16/10/2006 (Dr. Manuel Costa):

“Nesta sede, tem sido entendido que o grau de complexidade, de responsabilidade, de qualificação ou de confiança, deve ser acima da média, acima do normal, para que seja aplicável o prazo de 180 dias de período experimental, pois em tais casos o tempo de conhecimento das partes e de adaptação à função e/ou ao posto de trabalho é necessariamente superior, justificando-se destarte a sua duplicação em comparação com a generalidade dos trabalhadores. No entanto, a distância destes casos, relativamente aos trabalhadores em geral, tem de ser significativa, sendo considerados cargos de complexidade técnica, por exemplo, o de um contabilista numa empresa, o de uma educadora de infância num jardim infantil, o de um cozinheiro em restaurante de haute cuisine, sendo tomados também como elementos de distinção a baixa ou elevada retribuição paga ou a formação técnica ou científica do trabalhador corresponder ou não à licenciatura ou outro grau académico superior (Cfr. Júlio Manuel Vieira Gomes, in Do uso e abuso do período experimental, REVISTA DE DIREITO E DE ESTUDOS SOCIAIS, 2000, N.ºs 1 e 2, págs. 37 a 74).”

Como é sabido, numa era regida pela precariedade dos vínculos laborais, a contratação de um trabalhador sem termo – ou seja, com ligação tendencialmente (caso não ocorram vicissitudes) até à idade de reforma do trabalhador - para o exercício das funções de Professor não se compadece com um período experimental curto.

De facto, pela exigência da profissão, quer numa perspectiva técnica, quer numa perspectiva de relacionamento com uma franja da população com especiais necessidades e particularidades, que se traduz, necessariamente, numa responsabilidade acrescida do profissional, com reflexo sobre a empresa que o contrata face aos seus clientes, o prazo de 90 dias (ou seja, 3 meses) é manifestamente insuficiente para que o empregador se consiga aperceber da adequação/aptidão/competência/empenho efectivos daquele trabalhador ao exercício da função de Professor na sua organização.

Justifica-se, assim, que, à semelhança do que sucede com um educador de infância, também o exercício da profissão de Professor de 1º Ciclo revista um grau de complexidade técnica e de elevada responsabilidade que determine a fixação de um período experimental de 180 dias (ou seja, 6 meses).

Esse período não se nos afigura abusivo ou exagerado e está perfeitamente enquadrado com a exigência associada à profissão.

Entendemos, por isso, que a A. foi contratada para o exercício de uma função de responsabilidade.

[…]4

Do cotejo entre o art. 400º, n.º 2, e o art. 112º, n.º 1, b) e c), do CT, verificamos que o legislador agregou na previsão do n.º 2, do art. 400º, quer as situações cobertas pela al. b) quer as situações cobertas pela al. c) do n.º 1, do art. 112º, do CT.

Assim, a lei permite que o IRCT ou o contrato de trabalho prevejam o aumento do prazo de pré-aviso da denúncia até seis meses.

Já vimos que se a A. ocupava um cargo de responsabilidade para efeitos da “extensão” do período experimental, a igual solução temos que chegar agora para efeitos de “extensão” do pré-aviso da denúncia.

E compreende-se que assim seja, pois quanto maior a responsabilidade requerida maior a dificuldade de encontrar um trabalhador que preencha os requisitos para tal e que a possa substituir. E essa procura requer tempo. De igual modo, a transição de trabalhadores na perspectiva dos clientes da R. deve ser realizada de forma harmonizada, tendo em consideração não só os tempos da trabalhadora, como, de igual modo, os tempos dos estudantes que a têm como professora, e os tempos do empregador que se vê na necessidade de realizar todo um processo de recrutamento que, já o dissemos, não se faz do dia para a noite (e se é certo que a denúncia pode ser apresentada no início de uma pausa lectiva; não o é menos que a lei ou o contrato de trabalho não impõem que assim seja, o que acaba por afectar o estabelecimento de ensino e os seus utentes).

Assim, aquele art. 400º, n.º 2, do CT, permite ao IRCT ou ao contrato de trabalho alargar até 6 meses o pré-aviso quanto a trabalhador que ocupe (disjuntiva):

- cargo de administração, ou

- cargo de direcção, ou

- cargo com funções de representação ou

- cargo de responsabilidade.

Ora, já vimos que estamos no âmbito de um contrato de trabalho sem termo com seu início a 01/09/2020.

A A. denunciou o contrato com efeitos a partir de 01/09/2022.

Porém, a A. penas comunicou a sua denúncia à R. por comunicação datada de 01/08/2022 e recebida pela R. a 02/08/2022, cfr. assinatura aposta no rosto do doc. 2.

Assim, a A. respeitando o pré-aviso, apenas poderia considerar findo o contrato de trabalho a partir de 02/02/2023.

A A. deu, assim, um pré-aviso de 1 mês, quando deveria ter observado um pré-aviso de 6 meses.

Por consequência, atenta a violação do pré-aviso acordado entre as partes, e com suporte legal, a A. violou em cinco meses o pré-aviso da denúncia.

A A. auferia, naquela data, a retribuição mensal de 1.100,00 €.

Por conseguinte, nos termos do disposto no art. 401º, do CT, constituiu-se na obrigação de pagar à R. a indemnização de 5.500,00 € (1.100,00 x 5 m).

Em face do exposto, apreciemos.


No caso em apreço, inexiste qualquer dúvida de que, perante o contrato que foi celebrado entre a Autora e a Ré, dado por integralmente reproduzido no art. 1.º da petição inicial, foi acordado que a Autora estaria em período experimental 180 dias, uma vez que iria exercer cargo de complexidade técnica e de elevado grau de responsabilidade, pressupondo as suas funções uma especial qualificação (cláusula 8.ª do contrato). Foi igualmente acordado que, em caso de denúncia do contrato de trabalho pela Autora, o pré-aviso seria de seis meses (cláusula 9.ª).


Resultou também provado que a Autora e a Ré celebraram contrato de trabalho sem termo, que teve início em 01-09-2020, tendo a Autora, a partir dessa data, passado a executar, sob a autoridade e direção da Ré, as funções atinentes à categoria profissional de professora de 1.º ciclo (arts. 1.º e 2.º da petição inicial). Provou-se, de igual modo, que o referido contrato de trabalho cessou, por denúncia da Autora, datada de 01-08-2022 e recebida pela Ré em 02-08-2022, destinada a produzir efeitos a partir de 01-09-2022 (arts. 5.º e 6.º da petição inicial).


Em face destes factos resulta que, perante o acordo constante do contrato de trabalho celebrado entre as partes e a posição assumida pela Autora, aquando da denúncia do contrato de trabalho que apresentou, a questão que importa esclarecer é a de saber se o acordado na cláusula 9.ª do referido contrato de trabalho viola o disposto no n.º 2 do art. 400.º do Código de Trabalho, que é uma norma imperativa. Esta norma fixa, por um lado, o prazo máximo permitido por lei para a fixação do pré-aviso, e, por outro, as situações em que o prazo normal pode ser alargado até ao referido prazo máximo.


O prazo máximo permitido por lei para a fixação do pré-aviso é, então, de seis meses; e é possível fixar um prazo superior ao determinado pelo n.º 1 desse art. 400.º (30 ou 60 dias, dependendo da antiguidade) até ao máximo de seis meses, nos casos em que o trabalhador ocupe cargo:


a) de administração;


b) de direção;


c) com funções de representação;


d) com funções de responsabilidade.


Se relativamente ao que seja um cargo de administração ou de direção ou mesmo com funções de representação não existem grandes dificuldades de interpretação, relativamente a cargos com funções de responsabilidade aumentam as dificuldades interpretativas.


Compete, assim, aos tribunais apurar, dadas as características da situação concreta, se as funções desempenhadas correspondem a um cargo com funções de responsabilidade.


No caso em apreço, é exatamente esta a análise que tem de ser feita, visto que apenas nesta situação podem ser enquadradas as funções de professora de 1.ª ciclo exercidas pela Autora.


A sentença da 1.ª instância equiparou o disposto no art. 400.º, n.º 2, do Código do Trabalho com o disposto no art. 112.º, n.º 1, als. b) e c), do mesmo Diploma Legal.


Acontece, porém, que o legislador optou por uma redação diferente, pelo que se nos afigura estarmos perante situações diversas. E porque apenas o ponto i) da al. b) do n.º 1 do art. 112.º pode relevar para a situação dos autos, apenas esse ponto dessa alínea será alvo da nossa análise.


Assim, enquanto que no art. 400.º, n.º 2, se exige que o trabalhador ocupe cargo com funções de responsabilidade; já o art. 112.º, n.º 1, al. b), ponto i), exige que o trabalhador exerça cargo de complexidade técnica, elevado grau de responsabilidade ou que pressuponha uma especial qualificação. Assinala-se, portanto, que o art. 112.º, quanto ao grau de responsabilidade, impõe uma exigência maior do que a que consta do art. 400.º, n.º 2, visto que no primeiro caso o grau de responsabilidade tem de ser elevado, enquanto que no segundo caso apenas se exige que as funções pressuponham responsabilidade.


Deste modo, exatamente porque as funções de professora de 1.º ciclo, exigem desta, não só o encargo de garantir a segurança das crianças que lhe são confiadas, como, sobretudo, a obrigação de lhes transmitir as bases fundamentais da aprendizagem, de forma a prepará-las para o futuro, a tais funções é inerente um grau evidente de responsabilidade. A função educativa pressupõe especial preparação e capacidade por parte de quem a exerce, pelo que numa situação em que o critério é apenas o da existência de funções de responsabilidade, não se exigindo sequer elevado grau de responsabilidade, tal função terá de se considerar inserida nesse critério.


Diga-se, aliás, que no contrato coletivo de trabalho celebrado entre a Federação Nacional da Educação (FNE) e a Confederação Nacional da Educação e Formação (CNEF), publicado no BTE n.º 17, de 08-05-2022, consta expressamente, no seu art. 51.º-A, quanto à denúncia do contrato de trabalho pelo trabalhador, que se considera que “os docentes exercem cargo de elevado grau de responsabilidade”.


Ainda que tal CCT não seja de aplicar aos presentes autos, dele decorre o entendimento pelos próprios sindicatos dos professores de que a atividade docente pressupõe o exercício de um cargo de elevado grau de responsabilidade, pelo que, por maioria de razão, estamos perante um cargo com funções de responsabilidade.


Nesta medida, não violando o acordado entre as partes na cláusula 9.ª, quanto ao aviso prévio em caso de denúncia, a norma imperativa constante do art. 400.º, n.º 2, do Código do Trabalho, a Autora, ao não ter avisado a Ré com a antecedência mínima de seis meses, incorreu no pagamento previsto no art. 401.º, n.º 1, do Código do Trabalho.


Pelo exposto, improcede a pretensão da recorrente, quanto a esta questão, sendo de manter a sentença recorrida, ainda que com fundamentação parcialmente diversa.


2 – Impossibilidade de compensação de créditos na vigência do contrato de trabalho


Considera a recorrente que a proibição de que a entidade empregadora não pode proceder à compensação extrajudicial durante a vigência do contrato de trabalho, imposta pelo art. 279.º, n.º 1, do Código do Trabalho, abrange o último dia de vigência do contrato de trabalho, pelo que a compensação efetuada é ilegal.


Dispõe o art. 279.º do Código do Trabalho que:

1 - Na pendência de contrato de trabalho, o empregador não pode compensar a retribuição em dívida com crédito que tenha sobre o trabalhador, nem fazer desconto ou dedução no montante daquela.

2 - O disposto no número anterior não se aplica:

a) A desconto a favor do Estado, da segurança social ou outra entidade, ordenado por lei, decisão judicial transitada em julgado ou auto de conciliação, quando o empregador tenha sido notificado da decisão ou do auto;

b) A indemnização devida pelo trabalhador ao empregador, liquidada por decisão judicial transitada em julgado ou auto de conciliação;

c) À sanção pecuniária a que se refere a alínea c) do n.º 1 do artigo 328.º;

d) A amortização de capital ou pagamento de juros de empréstimo concedido pelo empregador ao trabalhador;

e) A preço de refeições no local de trabalho, de utilização de telefone, de fornecimento de géneros, de combustíveis ou materiais, quando solicitados pelo trabalhador, ou outra despesa efectuada pelo empregador por conta do trabalhador com o acordo deste;

f) A abono ou adiantamento por conta da retribuição.

3 - Os descontos a que se refere o número anterior, com excepção do mencionado na alínea a), não podem exceder, no seu conjunto, um sexto da retribuição.

4 - Os preços de refeições ou outros bens fornecidos ao trabalhador por cooperativa de consumo, mediante acordo entre esta e o trabalhador, não estão sujeitos ao limite mencionado no número anterior.

5 - Constitui contra-ordenação muito grave a violação do disposto no n.º 1.

A sentença recorrida fundamentou a razão pela qual considerou ser legal a compensação efetuada, nos seguintes termos:

No caso em análise, aquando da realização do encontro de contas (acerto final), a R. deduziu aos créditos da A. o valor de 5.500,00 €, por conta da falta de pré-aviso, conforme consta do recibo emitido a 31/08/2022.

A inobservância do pré-aviso não impede a extinção do contrato de trabalho na data indicada pelo trabalhador; de igual modo, não torna nula a sua extinção. Apenas atribui ao empregador o direito a uma indemnização, correspondente ao período de pré-aviso violado.

Assim, o contrato de trabalho extinguiu-se no final da jornada de trabalho do 31/08/2022. No dia 01/09/2022, já a A. se estava desvinculada da R.

Ora, o dia 31/08/2022 foi o último dia de trabalho da A.

[…]5

No caso em análise, a R. procedeu àquele acerto de contas no último dia de vigência do contrato de trabalho. E tendo incluído nesse acerto de contas as quantias devidas à A. também por esse último dia de trabalho, só o pode contabilizar tendo por base a sua prestação até ao final do dia. Assim, o acerto de contas reporta-se ao estado da situação entre as partes no momento do fim da jornada de trabalho entre ambas, pois é nesse momento que se tem percepção de tudo o que foi prestado pela A. à R. e do valor que esta terá de pagar àquela pelo trabalho prestado.

A norma prevista no n.º 1, do art. 279º, do CT, tem por base a circunstância de o contrato de trabalho ser um contrato duradouro e da retribuição assumir a natureza de uma prestação alimentar (o trabalhador depende da retribuição para fazer face às suas necessidades e às necessidades dos seus), ou créditos de sobrevivência conforme lhe chama o Ac. da Rel. de Lisboa, de 08/03/2017. De facto, e na grande maioria das vezes, a retribuição do trabalhador é a sua única fonte de rendimento. Por isso, a lei veda ao empregador a possibilidade de efectuar aqueles descontos ou compensações, em ordem a prevenir situações de verdadeira escravatura ou dependência económica acrescida por falta de meios para fazer face àquelas necessidades: o trabalhador continuaria a prestar a sua actividade para o empregador, mas este a pretexto dos seus créditos sobre aquele não lhe pagaria a sua retribuição mensal durante a pendência do contrato de trabalho. A dependência gera dependência, e o trabalhador ver-se-ia sujeito a uma amarra impossível se se desenvencilhar.

Porém, quando cessa o contrato de trabalho aqueles impedimentos deixam de subsistir.

Note-se que não está em causa a existência de um direito de crédito do empregador face ao trabalhador. O que está em causa é apenas a possibilidade de o empregador se poder pagar a si mesmo através da compensação desse crédito na retribuição do trabalhador.

Assim, tendo por certo que a R. tinha o direito àquela quantia de 5.500,00 € (a título de indemnização) que compensou mediante seu “desconto” nos direitos de crédito laborais que a A. tinha sobre si, e sem esquecer que já não existia contrato pendente a partir de 31/08/2022, julgamos que a R. actuou a coberto da lei.

A A. apresenta-nos uma versão que se apega apenas ao teor literal do art. 279º, do CT, e não à sua razão de ser, que conforma a norma que dele se deve extrair.

Para a A., porque aquele desconto foi feito no dia 31/08, e no dia 31/08 o contrato de trabalho ainda se encontrava pendente, o desconto é ilícito.

Ou seja, para A., ao que parece, se a R. tivesse feito o acerto de contas no dia 01/09, e não, como devia e fez, no dia 31/08, já lhe era permitido efectuar aquele desconto, porque nesse dia 01/09, já o contrato de trabalho não se encontrava pendente.

É uma leitura possível, se bem que nos apresente como plástica e artificial, para além de convidar ao incumprimento: ou seja, levar a que os empregadores façam o fecho de contas relativo ao contrato de trabalho não no ultimo dia do contrato, mas no primeiro dia seguinte à sua cessação, como se de um dia para o outro não se mantivessem as mesmas razões que, no dia seguinte, já permitiam a compensação de créditos.

É que:

- por um lado, o empregador tem um efectivo crédito sobre o trabalhador que, por isso, é devedor daquele;

- por outro, o contrato de trabalho efectivamente terminou a partir do final desse dia, pelo que não há perspectiva de continuidade da sua vigência.

Por esta razão, entendemos que tendo a R. efectuado aquele desconto dos 5.500,00 €, nas constas finais, no último dia de vigência do contrato, não sendo por isso expectável para a trabalhadora a sua continuação para além desse dia (até porque foi ela quem decidiu por termo ao contrato de trabalho), a conduta da R. é legalmente admissível.

Desde já consignamos a nossa discordância com este raciocínio.


A norma prevista no art. 279.º, n.º 1, do Código do Trabalho tem carácter imperativo, proibindo a compensação pela entidade empregadora de créditos que possua sobre o trabalhador durante a pendência do contrato de trabalho, excetuadas as situações previstas no n.º 2 do mesmo artigo.


Ora, não estando em causa qualquer das situações previstas no referido n.º 2, compete ao juiz, em face do que resulta dos factos provados, verificar se a compensação efetuada pela entidade empregadora ocorreu durante a vigência do contrato de trabalho ou após a sua cessação, inexistindo qualquer desvalorização na aplicação deste artigo, quer durante o período correspondente ao aviso prévio, em que o contrato de trabalho se mantém em vigor,6 quer quanto ao último dia de vigência desse mesmo contrato.


Todas as normas que estabelecem prazos para o exercício de direitos ou para a sua proibição possuem um último dia e é exatamente até esse dia que os direitos podem ser exercidos ou se encontram proibidos de o ser. O estabelecimento de prazos é um reflexo do princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança, pelo que não se pode entender que, apesar de o prazo ser um, nos termos da lei, no caso x ou y, afinal é menos um dia ou mais um dia.


Assim, a apreciação desta questão depende exclusivamente do que tiver resultado da matéria de facto provado, e se dela tiver resultado que a compensação efetuada pela Ré o foi ainda durante a vigência do contrato de trabalho, tal compensação encontra-se proibida por lei.


Consta da matéria de facto provada que o contrato celebrado entre a Autora e a Ré veio a cessar, por denúncia pela Autora, datada de 01-08-2022 e recebida pela Ré em 02-08-2022, destinada a produzir efeitos a partir de 01-09-2022 (arts. 5.º e 6.º da petição inicial).


Mais se provou que, no dia 31-08-2022, a Ré procedeu ao processamento à Autora do vencimento desse mês, subsídio de refeição e dos créditos decorrentes da cessação, designadamente, dos seguintes montantes ilíquidos:


- Ordenado base - €1.100,00;


- Subsídio de Refeição - €47,70;


- Subsídio de Natal - €733,44;


- Subsídio de Férias - €183,36;


- Subsídio de Férias - €733,44; e


- Férias Não gozadas - €800,00;


Tudo no total de €3.597,94, tendo, simultaneamente, procedido, sem o acordo da Autora, à dedução da quantia de €5.500,00, pelo que não pagou qualquer montante à Autora (arts. 7.º a 15.º da petição inicial).


Ora, em face de tais factos, torna-se evidente que o contrato de trabalho existente entre a Autora e a Ré apenas deixou de produzir efeitos no dia 01-09-2022, encontrando-se, por isso, em vigor, no dia 31-08-2022, data em que a Ré procedeu à compensação dos créditos que detinha sobre a Autora nos créditos que a Autora detinha sobre si, e porque aqueles era superiores a estes, nada pagou à Autora.


A compensação que a Ré efetuou nos créditos laborais da Autora em 31-08-2022, no montante de €3.597,94, é, por isso, ilegal, pelo que deverá a Ré ser condenada a restituir à Autora tal montante, sem prejuízo de fazer valer os seus direitos enquanto credora, que, aliás, são em valor superior a este montante, fora deste processo.


Pelo exposto, procede, nesta parte, a pretensão da recorrente, sendo de revogar a al. a) da parte decisória da sentença recorrida, substituindo-se a mesma pela condenação da Ré a pagar à Autora a quantia de €3.597,94, acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos desde 01-09-2022 e até efetivo e integral pagamento.


3 – Direito a indemnização por danos não patrimoniais


Considera a recorrente que da factualidade que foi dada como provada emergem prejuízos assinaláveis, designadamente, relacionados com as dívidas de que se viu impossibilitada de satisfazer por meios próprios e para cujo pagamento foi forçada a recorrer à ajuda de familiares, bem como em face da degradação do seu estado de saúde psíquica.


Estatui o art. 496.º, n.º 1, do Código Civil, que:

1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.

Conforme bem refere Pires de Lima e Antunes Varela, no Código Civil Anotado:7

O Código Civil aceitou, em termos gerais, a tese da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais, embora limitando-a àqueles que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. A gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada).

Segundo o estatuído pelo Código Civil, no que diz respeito aos danos não patrimoniais, para que tais danos possam ser ressarcidos torna-se imperioso que:


(i) tenha existido um comportamento ilícito e culposo da entidade patronal;


(ii) existam danos por parte da trabalhadora;


(iii) tais danos, pela sua gravidade, sejam merecedores da tutela do direito (não sendo indemnizáveis meros incómodos); e


(iv) exista um nexo causal entre o referido comportamento e os danos sofridos.


Relativamente à concretização do que seja a gravidade do dano, compete ao tribunal efetuar, perante cada caso, essa apreciação.


Como bem analisa Bruno Bom Ferreira no artigo que publicou na Verbo Jurídico, sob o tema A problemática da titularidade da indemnização por danos não patrimoniais em direito civil:

A gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objetivo (essa apreciação deve ter em linha de conta as circunstâncias do caso concreto), devendo abstrair-se dos fatores subjetivos (“de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada”).

Vejamos, então, o caso concreto.


Consta dos arts. 36.º a 39.º da petição inicial, que, em virtude do não pagamento da Ré à Autora da quantia de €3.597,94, esta viu-se confrontada com a circunstância de não ter recebido qualquer montante, contando com esses montantes para fazer face às despesas, tornando impossível honrar os seus compromissos, o que lhe causou elevado “stress” e a forçou a recorrer à ajuda de familiares.


Consta igualmente dos arts. 40.º e 41.º da petição inicial, que, por tudo isso, nos meses que se seguiram a Autora veio a padecer de insónias, fruto do desânimo, preocupação que em si se instalou, tendo visto degradar-se a sua qualidade de vida, bem como da sua família, com consequências nefastas para a sua saúde.


Ora, é manifesto que do que se acabou de descrever não resultam factos concretos suscetíveis de permitir aferir pela existência de danos e muito menos pela existência de danos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.


Na realidade, a Autora invoca a existência de despesas que não conseguiu pagar, mas não elenca uma única despesa, desconhecendo-se, não só que despesas tenham sido essas, como qual tenha sido o seu valor. De igual modo, desconhece-se quais foram os valores que familiares seus lhe emprestaram. O que se mostra alegado não passa, assim, de meras conclusões. Por sua vez, a Autora assenta os danos não patrimoniais que alega ter padecido, isto é, o stress e as insónias, resultantes do desânimo e da preocupação, na circunstância de não ter conseguido pagar as suas dívidas e de ter tido necessidade de pedir ajuda a familiares, ou seja, assenta os alegados danos psicológicos numa realidade fáctica que não provou.


Nesta conformidade, desconhecendo-se quer a existência de danos, quer a sua gravidade, na esteira da sentença recorrida, apenas nos resta concluir pela improcedência, nesta parte, da pretensão da recorrente.








V – Decisão


Pelo exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso parcialmente procedente, e, em consequência, revoga-se a al. a) da parte decisória da sentença recorrida, substituindo-se pela condenação da Ré “BB – Jardins de Infância e Ensino Básico, Lda.” a pagar à Autora AA a quantia de €3.597,94 (três mil, quinhentos e noventa e sete euros e noventa e quatro cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos desde 01-09-2022 e até efetivo e integral pagamento.


No demais, mantém-se a sentença recorrida.


Custas a cargo da recorrente e da recorrida, na proporção do decaimento (art. 527.º, nºs. 1 e 2, do Código de Processo Civil).


Notifique.



Évora, 22 de maio de 2025

Emília Ramos Costa (relatora)

Filipe Aveiro Marques

Paula do Paço

1. Relatora: Emília Ramos Costa; 1.º Adjunto: Filipe Aveiro Marques; 2.ª Adjunta: Paula do Paço.↩︎

2. Faz-se menção à atual redação, uma vez que os nºs. 1 e 2 do art. 400.º do Código do Trabalho não foram alterados pela Lei n.º 13/2023, de 03-04, a qual apenas se limitou a introduzir o n.º 6 nesse artigo.↩︎

3. Reporta-se à reprodução do art. 400.º do Código do Trabalho, que, por já se encontrar reproduzido neste acórdão, se prescinde de transcrever novamente o mesmo.↩︎

4. Reporta-se a nova transcrição do art. 400.º do Código do Trabalho.↩︎

5. Nesta parte da sentença é reproduzido o art. 279.º do Código do Trabalho que já se mostra citado neste acórdão.↩︎

6. Vejam-se os acórdãos, do TRP proferido em 27-02-2023 no âmbito do processo n.º 361/22.0T8AVR.P1; e do TRG proferido em 14-03-2024 no âmbito do processo n.º 5228/22.0T8VNF.G1; consultáveis em www.dgsi.pt.↩︎

7. Vol. I, Almedina, p. 499.↩︎