Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | JOÃO NUNES | ||
Descritores: | REINTEGRAÇÃO DE TRABALHADOR POSTO DE TRABALHO ABANDONO DE TRABALHO | ||
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Data do Acordão: | 01/07/2016 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | N | ||
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Decisão: | PROCEDENTE | ||
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Sumário: | i. a reintegração do trabalhador no mesmo «posto de trabalho», nos termos previstos no artigo 436.º, n.º 1, alínea b), do Código do Trabalho de 2003, significa que o trabalhador deve ser reintegrado a desempenhar o núcleo essencial das funções que lhe estavam atribuídas antes do despedimento, num determinado local e estabelecimento, e não reintegrado a desempenhar as funções que se integram na sua categorias profissional; ii. são dois os elementos constitutivos da figura jurídica do abandono do trabalho: (a) um elemento objectivo, traduzido na ausência do trabalhador ao serviço, isto é, a não comparência do trabalhador no local e no tempo de trabalho a que está obrigado, e (b) um elemento subjectivo, traduzido na intenção de não retomar o serviço, ou seja, a intenção de não comparência definitiva ao local de trabalho; iii. não se verifica o referido elemento subjectivo e, consequentemente, não se verifica abandono do trabalho, se o trabalhador informou a Ré do motivo da ausência ao serviço – não ter sido reintegrado no seu posto de trabalho – e dessa informação resulta que não há uma intenção de não voltar a retomar o serviço, mas sim uma intenção de que a Ré o reintegre no posto de trabalho que tinha antes do despedimento para, então, retomar o serviço. (Sumário do relator) | ||
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Decisão Texto Integral: | Secção Social do Tribunal da Relação de Évora Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: I. Relatório B…(…) intentou, no extinto Tribunal do Trabalho de Faro, a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra C…(…), pedindo: a) que seja declarado ilícito o despedimento promovida pela Ré, consubstanciado na declaração de abandono de 14 de Julho de 2011, notificada ao Autor em 18 de Julho de 2011; b) a condenação da Ré a reintegrá-lo, sem prejuízo da sua categoria profissional e antiguidade ou, caso opte pela indemnização de antiguidade, no pagamento de uma indemnização que tenha em conta o disposto no n.º 4 do artigo 331.º do Código do Trabalho; c) a condenação da Ré a pagar-lhe as retribuições que deixou de auferir desde o dia 18 de Julho de 2011 até ao trânsito em julgado da sentença, acrescida de juros de mora; d) no pagamento de uma indemnização, a título de danos não patrimoniais, no valor de € 25.000,00. Alegou para o efeito, muito em síntese, que foi admitido ao serviço da Ré em 01-06-1985, e que por comunicação que recebeu em 16-10-2006 esta o despediu com fundamento em justa causa. Impugnou judicialmente tal decisão, e por sentença judicial de 08-01-2008, confirmada por acórdão deste tribunal de 15-02-2011, transitado em julgado, foi o despedimento declarado ilícito e, no que ora importa, decretada a subsistência do vínculo laboral e a Ré condenada a reintegrá-lo no seu posto de trabalho e ao seu serviço, com a categoria, antiguidade e retribuição que teria se não tivesse sido despedido e desde a data da decisão do despedimento. Porém, a Ré não o reintegrou nos termos ordenados – sendo que o colocou noutro local de trabalho, assim como noutras funções –, em razão do que a informou que não iria comparecer no local que lhe foi indicado para o exercício das funções. Na sequência, a Ré informou-o que considerava que tinha abandonado o posto de trabalho e, assim, extinto o contrato de trabalho. Concluiu, por consequência, que a Ré não cumpriu a decisão judicial que determinou a sua (dele, Autor) reintegração, pelo que a não comparecência no local de trabalho não pode ser tida por abandono do serviço, e, subsequentemente, a comunicação da extinção do contrato de trabalho, por abandono deste, consubstancia um despedimento ilícito, por não precedido do respectivo procedimento, com as consequências legais daí decorrentes. E porque o comportamento da Ré lhe criou um ambiente «intimidativo, hostil, degradante, humilhante e desestabilizador», afectando a sua saúde, peticionou uma indemnização a título de danos não patrimoniais.Tendo-se procedido à audiência de partes e não se tendo logrado obter o acordo das mesmas, contestou a Ré, sustentando, muito em resumo, que cumpriu a decisão judicial de reintegração do Autor, tendo-lhe atribuído funções que se integram na sua categoria profissional e que o Autor se recusou a comparecer no local de trabalho que lhe foi indicado, em razão do que considerou extinto o contrato de trabalho, por abandono do trabalho. Concluiu o articulado pugnando pela improcedência da acção e pela condenação do Autor por falta de aviso prévio na denúncia do contrato de trabalho, e ainda por litigância de má fé, por entender que o Autor alterou a verdade dos factos, alegando em juízo uma factualidade que não corresponde à verdade.Respondeu o Autor, a negar a admissibilidade de pedido reconvencional – por, em síntese, não ter sido deduzido expressa e separadamente na contestação –, e a existência de abandono do trabalho, bem como de litigância de má fé. Concluiu pedindo a inadmissibilidade do pedido reconvencional ou, se assim se não entender, a sua improcedência. Foi dispensada a realização da audiência preliminar, proferido despacho saneador stricto sensu, consignada a matéria de facto assente e a base instrutória (fls. 299-317). Na audiência final, realizada em 12-10-2012 foi fixado valor à causa (€ 32.483,80, sendo € 28.870,70 correspondentes ao pedido do Autor e € 3.613,10 correspondentes à reconvenção que já anteriormente havia sido admitida – fls. 342-346). Em 09-11-2012 respondeu-se à matéria de facto, sem reclamação das partes (fls. 347-356) e em 09-08-2013 foi proferida sentença (fls. 357-389), sendo a parte decisória do seguinte teor: «Nos termos expostos, o Tribunal decide: 1 - Julgar a acção totalmente improcedente por não provada, absolvendo-se a Ré «C…, C. R. L» de tudo o contra si peticionado pelo Autor B…; 2 - Julgar a Reconvenção parcialmente procedente por provada, condenando-se o Autor/reconvindo B…a pagar à Ré/reconvinte «C…, C. R. L» o montante de 3.045,92 € (três mil e quarenta e cinco euros e noventa e dois cêntimos); 3 - Absolver o Autor/reconvindo B…do demais contra si peticionado pela Ré/reconvinte «C…, C. R. L»; 4 - Absolver o Autor B…do pedido de litigância de má-fé deduzido pela Ré «C…, C. R. L»; 5 - Condenar o Autor B… no pagamento das custas da acção; 6 - Condenar o Autor/reconvindo B….e a Ré/reconvinte «C…, C. R. L» no pagamento das custas relativas à reconvenção, na proporção do respectivo decaimento, 84,30% e 15,70%, respectivamente. Registe e notifique.». Inconformado com a sentença, o Autor dela interpôs recurso para este tribunal, tendo nas alegações apresentadas formulado as conclusões que, no essencial, se transcrevem: (…). Por sua vez, a Ré contra-alegou a pugnar pela improcedência do recurso, tendo rematado as alegações com as seguintes conclusões: (…). O recurso foi admitido na 1.ª instância, como de apelação, com efeito meramente devolutivo e a subir nos próprios autos. Neste tribunal a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido de que a recorrida não reintegrou o recorrente nos termos que haviam sido ordenados por anterior decisão judicial – uma vez que não respeitou o local de trabalho onde, antes do despedimento, o recorrente exercia funções – e que, por isso, era legítima a recusa do trabalhador em trabalhar no novo lugar que lhe foi atribuído. Consequentemente, rematou, deve o recurso ser julgado procedente, «e a sentença alterada, em conformidade». Ao referido parecer respondeu a recorrida, a manifestar a sua discordância, e a pugnar, mais uma vez, pela improcedência do recurso. Entretanto, em 13-11-2015, procedeu-se à redistribuição dos autos, tendo os mesmos sido distribuídos ao ora relator. Foi elaborado projecto de acórdão, remetido aos exmos. juízes desembargadores adjuntos e, com a anuência dos mesmos, foram dispensados os “vistos” legais. Realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir. II. Objecto do recurso Como é sabido, o objecto dos recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações (cfr. artigo 635.º, n.º 4 e artigo 639.º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Lei n.º 41/2003, de 26 de Junho, aplicável ex vi do artigo 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho), salvo as questões de conhecimento oficioso, que aqui não se detectam. Assim, tendo em conta as conclusões das alegações de recurso do recorrente colocam-se à apreciação do tribunal as seguintes questões essenciais: - saber se a Ré/recorrida procedeu à reintegração do Autor/recorrente nos termos ordenados por anterior decisão judicial; - saber se houve abandono do trabalho por parte do recorrente e, por consequência, se com tal fundamento cessou a relação de trabalho; - em função da resposta dada a tais questões apreciar da existência, ou não, de despedimento ilícito promovido pela Ré, com as consequências daí decorrentes, incluindo quanto à manutenção ou não da condenação do Autor no pedido reconvencional. (…) III. Factos A) A 1.ª instância deu como provada a seguinte factualidade, que se aceita, por não ter sido impugnada pelas partes e por não se vislumbrar fundamento legal para a sua alteração: 1. O Autor celebrou com a Ré um acordo denominado “Contrato de trabalho” e nela foi admitido em 01 de Junho de 1985, auferindo em 2011 a remuneração mensal base de 1.318,96 € (mil trezentos e dezoito euros e noventa e seis cêntimos), diuturnidades no valor de 204,00 € (duzentos e quatro euros) e de valor compensatório 283,59 € (duzentos e oitenta e três euros e cinquenta e nove cêntimos); 2. A Ré instaurou contra o Autor no ano de 2006 um procedimento disciplinar, no qual foi proferida decisão despedindo o Autor com justa causa; 3. O Autor reagiu contra a decisão tomada pela Ré no referido procedimento disciplinar, correndo a competente acção sob o nº 534/06.3 TTFAR no Tribunal do Trabalho de Faro; 4. O Tribunal do Trabalho de Faro no âmbito dos autos nº 534/06.3 TTFAR decidiu: «a) Declaro a nulidade do despedimento do Autor, por ilícito (caducidade do direito da Ré aplicar a sanção de despedimento do Autor), decreto a subsistência do vínculo laboral e condeno a Ré a reintegrá-lo no seu posto de trabalho e ao serviço, com a categoria, antiguidade e retribuição que teria se não tivesse sido despedido e desde a data da decisão do despedimento; b) Condeno a Ré a pagar as retribuições e subsídios do Autor já vencidas desde a data do despedimento (…), acrescidos de juros, vencidos e vincendos, calculados à taxa legal (…); c) Condeno-a ainda a pagar-lhe as prestações pecuniárias vincendas, relativas às retribuições e subsídios que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data da sentença, acrescidas de juros de mora (…)»; d) foi ainda a Ré condenada a pagar ao Autor a quantia de € 5.000,00 a título de reparação dos danos não patrimoniais que lhe causou, acrescida de juros de mora; 5. A Ré, inconformada com o decidido pelo Tribunal do Trabalho de Faro interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Évora, o qual por acórdão de 15 de Fevereiro de 2011 confirmou a decisão da 1ª instância negando provimento ao recurso; 6. A Ré emitiu e remeteu ao Autor o escrito de fls. 59 dos autos, no essencial com o seguinte teor: “…28/04/2011. Assunto: Reintegração de posto de trabalho. Exmo Senhor, Serve a presente para Informar V. Exa que, na sequência do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora, no âmbito do processo judicial que correu termos sob o nº 534/06.3TTFAR, deverá V. Exa apresentar-se ao serviço no próximo dia 31 de Maio de 2011, junto dos recursos humanos da C…, CRL, com vista à reintegração do seu posto de trabalho. Com efeito, após o decidido pelo referido Acórdão, foi deliberado pelo Conselho de Administração no passado dia 28 de Março que V. Exa deverá ser reintegrado na área de Suporte – a qual já se inseria em momento prévio ao processo judicial que teve lugar – exercendo funções nas instalações complementares e contíguas ao balcão de D…, onde também funciona aquele serviço. Aproveitamos a oportunidade para informar V. Exa que a sua reintegração não ocorrerá antes de 31 de Maio próximo por razões que se prendem designadamente, com a cessação de funções de um funcionário que desempenhava funções em regime de prestação de serviços, sendo que até essa data não se verificará qualquer perda de retribuição pelo não exercício efectivo das funções que lhe competem (…)”; 7. O Autor subscreveu e remeteu à Ré o escrito de fls. 140 a 141 dos autos, no essencial com o seguinte teor: “E… 10, de Maio de 2011. Assunto: Reintegração. Retribuições. Indemnização por danos não patrimoniais. Relativamente aos assuntos identificados em epígrafe, venho por este meio comunicar a V. Exas o seguinte: Quanto à reintegração, acuso recepção da carta de V. Exas de 28/04/2011 sendo que procederei em conformidade com o que me foi transmitido, designadamente quanto á data da apresentação. No que respeita às funções a desempenhar, cabe salientar que a sentença proferida no processo judicial em causa, confirmada pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, determinou que fosse reintegrado no meu posto de trabalho, com a categoria, antiguidade e retribuição que teria se não tivesse sido despedido, nesta conformidade, solicito, desde já, que me comuniquem quais as exactas funções me serão atribuídas (…); 8. Por instruções expressas da Ré, o Autor iniciou funções no dia 21 de Junho de 2011, distribuindo a Ré ao Autor as funções de preenchimento do livro selado “Diário, Razão e Balancete” da C… do ano de 2006; 9. À data do despedimento declarado ilícito, primeiro pelo Tribunal do Trabalho de Faro e depois pelo Tribunal da Relação de Évora, o Autor tinha o seu posto de trabalho na sede da C…, em E…; 10. As funções correspondentes à categoria profissional do Autor são, de acordo com o Contrato Colectivo de Trabalho «Técnico de grau IV – É o trabalhador que adapta os seus conhecimentos técnicos à prática quotidiana da instituição e executa ou colabora em estudos e análises de natureza técnica ou cientifica adequados à sua formação académica ou currículo profissional, designadamente o técnico de contas, inscrito na Direcção-Geral dos Impostos, e que, nomeado pela instituição, assuma a responsabilidade pela contabilidade da mesma; exerce as suas funções sobre a orientação e controlo. Pode representar a instituição em assuntos da sua responsabilidade”; 11. O Autor subscreveu e remeteu à Ré, o escrito de fls. 65 a 66 dos autos, no essencial com o seguinte teor: “…Na sequência da vossa comunicação de 28 de Abril de 2011 para que me apresentasse nas instalações complementares contíguas ao balcão de D… onde funciona, alegadamente, o serviço de suporte, compareci no referido local no dia 20 de Junho de 2011, após período de doença. Por instruções expressas, apenas iniciei funções no dia 21 de Junho de 2011, tendo-me sido distribuídas as funções de preenchimento do livro selado “Diário, Razão e Balancete” da C… do ano de 2006. Estas instruções pretendiam dar execução à decisão do Tribunal de Trabalho de Faro proferida no processo nº 534/06.3TTFAR de 7 de Maio de 2008, fls. 286, confirmada pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 15 de Fevereiro de 2011, nos termos da qual essa instituição foi condenada a reintegrar-me no meu posto de trabalho e ao seu serviço com a categoria, antiguidade e retribuição que teria, se não tivesse sido despedido. Contudo, verifica-se que não foi dado cumprimento à decisão judicial, porquanto não foi feita a reintegração no meu posto de trabalho. Quer o local de trabalho, quer as funções que me foram atribuídas não correspondem ao posto de trabalho que me estava atribuído à data do despedimento ilicitamente declarado. Com efeito, o meu posto de trabalho é na sede da Caixa de Crédito Agrícola e as minhas funções não correspondem a uma actividade de preenchimento do livro selado “Diário, Razão e Balancete” da C…do ano de 2006, mas sim de técnico de nível IV da área da contabilidade. Por outro lado, verifica-se que o local de trabalho que me foi indicado não tem quaisquer condições de trabalho, pois para além de não ter telefone, internet ou outro meio de comunicação com o exterior situa-se numa dependência isolada, existindo uma câmara de vídeo apontada para o local onde se encontra a secretária que me foi indicada para realizar a tarefa distribuída. Para além do facto de ter estado ilicitamente ausente da instituição durante vários anos, é-me atribuído um local e funções que não correspondem ao meu posto de trabalho mais grave é que a situação é gravemente atentatória da minha dignidade profissional e pessoal e causa-me graves do foro psicológico. Revelador desta atitude persecutória é o facto de me terem atribuído uma tarefa repetitiva e sem qualquer utilidade. Verifica-se que se está a criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante e destabilizador que se torna insuportável, com graves consequências ao nível psicológico, configurando uma situação de assédio. Esta situação pelos efeitos ao nível psicológico que me causa impede-me de comparecer no local e tempo de trabalho indicado, para realizar as funções que ilicitamente me estão distribuídas. Esta situação ocorreu no passado dia 24 de Junho e mantém-se, sendo que informo da mesma apenas hoje porque o dia 24 de Junho foi feriado na sede da empresa e onde se deveria localizar o meu posto de trabalho. Nestes termos, informo que irei recorrer aos meios judiciais adequados para que seja efectivamente integrado no meu posto de trabalho, bem como a ser ressarcido dos prejuízos, patrimoniais e não patrimoniais, sofridos, embora não compareça no local de trabalho indicado em virtude de a situação me causar uma situação psicológica insuportável. Aguardo por isso nova comunicação que reponha a legalidade e me reintegre efectivamente no meu posto de trabalho (…)”; 12. A Ré subscreveu e remeteu ao Autor o escrito de fls. 67 a 68 dos autos, no essencial com o seguinte teor: “…Assunto: Reintegração de posto de trabalho. 28/06/2011. Exmo Senhor; Na sequência do seu fax de 27 de Junho, cumpre-me informar V. Exa que entendendo estes serviços que aquela comunicação não consubstancia qualquer justificação para o facto de não se apresentar ao trabalho, as suas ausências serão considerada como faltas injustificadas, com todas as consequências legais que daí possam resultar. Com efeito, uma vez mais aproveitamos a oportunidade para informar V. Exa que esta instituição nunca questionou a decisão judicial que determinou a reintegração do seu posto de trabalho, tendo procedido na exacta medida e termos determinados pelo Tribunal. Nesse sentido, foi V. Exa (na qualidade de trabalhador desta instituição) reintegrado com a categoria, antiguidade e retribuição que teria na circunstância de não ter sido despedido. Assim, sendo, muito estranhamos o teor da sua comunicação e das várias “queixas” ali expressas. Com efeito, e na sequência de lhe terem sido transmitidos os trabalhos que, inicialmente lhe cabiam por conta das suas funções, foram-lhe disponibilizados todos os meios necessários para o efeito, no respeito das condições de trabalho que se apresentam compatíveis com a sua categoria, antiguidade e retribuição. Por outro lado, e no que em particular se refere à câmara de videovigilância de que fala na sua comunicação, impõe-se informar que a mesma se encontra naquelas instalações por questões de segurança, já que como V. Exa bem sabe, nas instalações contíguas funciona uma dependência bancária. Alias, com a sua reintegração, foi redirecccionada a orientação da câmara existente na sala onde exerce funções por forma a cobrir, exclusivamente, a área imediatamente a seguir à porta de entrada dessa sala, não visualizando o seu posto de trabalho. Não compreendemos, pois, o que possa contribuir para aquela que refere como sendo “uma situação psicológica insuportável” mais ainda quando V. Exa apenas exerceu funções durante um único dia, na sequência da sua reintegração, aguardamos que se apresente, conforme (entendemos) lhe compete, ao trabalho (…)”; 13. A Ré subscreveu e remeteu ao Autor o escrito de fls. 69 dos autos, no essencial com o seguinte teor: “…Assunto: Reintegração de posto de trabalho. 14/07/2011. Exmo Senhor, Verificámos que a ausência ao serviço por parte de V. Exa se prolonga desde 24 de Junho, até à presente data. Nessa sequência e atento, por um lado, o seu fax de 27 de Junho passado, através do qual manifestou a sua intenção de não retomar o serviço e, por outro lado, ainda, o facto de ter trabalhado apenas um dia na sequência da sua reintegração, consideramos que V. Exa abandonou o seu posto de trabalho, nos termos e com as consequências previstas no artigo 403º, do Código do Trabalho. Nesta sequência, procederemos em conformidade com a denúncia do contrato de trabalho efectuada por V. Exa, na decorrência, como se disse, do abandono do seu posto de trabalho (…)”; 14. O Autor não se apresentou junto dos recursos humanos da C…, no dia 31 de Maio de 2011, tal como determinado pela Ré no escrito referido em 6), tendo apresentado o escrito que faz fls. 62 dos autos, denominado “Atestado Médico”; 15. As instalações disponibilizadas pela Ré ao Autor não dispunham de telefone nem acesso à internet e nas mesmas estava instalada uma câmara de vigilância; 16. O Autor intentou uma providência cautelar de suspensão do despedimento que corre termos no Tribunal do Trabalho de Faro sob o número 494/11.9 TTFAR; 17. No dia 21 de Junho de 2011 (na 1.ª instância refere-se o mês de Julho, mas trata-se de manifesto lapso, face ao mês, Junho, alegado pela Ré no artigo 64.º da contestação, ao documento n.º 2 que juntou e à sequência cronológica dos factos), após solicitação do Autor, a Ré solicitou a comparência de técnicos da empresa F… nas instalações os quais redireccionaram a câmara de vídeo de molde a não abranger a zona da secretária onde o Autor deveria exercer as suas funções; 18. O Autor é filiado no Sindicato …; 19. O serviço de preenchimento dos livros selados já se encontra efectuado através de cadernos com mapas retirados do sistema informático, e no final de cada mês, depois de se considerar encerrado o mês, o sistema dá as situações analíticas e o Diário, razão e Balancete; 20. O preenchimento dos livros selados “Diário, razão e Balancete” apenas deixou de ser obrigatório de 30 de Junho de 2006 em diante; 21. A coordenadora da contabilidade da Ré entregou ao Autor os documentos de suporte de todo o ano de 2006, para preenchimento dos livros selados “Diário, Razão e Balancete”; 22. Os auditores externos (…) tinham alertado a Ré para a necessidade de preencher os livros selados “Diário, Razão Balancete”; 23. A distância entre as cidades de E… onde reside o Autor e a cidade de D…onde se situam as instalações onde a Ré colocou o Autor distam entre si cerca de 23 Kms; 24. Na época balnear verifica-se uma maior afluência de turistas na região do Algarve com aumento de tráfego nas estradas; 25. Resulta da Autorização nº 7241/2001 da Comissão Nacional de Protecção de Dados Para o Tratamento de Dados Pessoais Mediante Videovigilância que faz fls. 149 a 151 que a C… C. R. L. notificou aquela comissão um tratamento de dados pessoais resultante de videovigilância, com a finalidade de protecção de pessoas e bens, a realizar nas suas instalações em D…, sendo o sistema composto por 5 câmaras, colocadas nos seguintes locais: pontos de acesso a partir do exterior/locais de atendimento ao público/área de cofre/zona de ATM s/zonas internas de circulação. Zonas técnicas, autorizando a comissão o tratamento notificado, correspondendo as instalações disponibilizadas pela Ré ao Autor ao número de policia…; 26. A câmara de videovigilância foi instalada naquele local cerca de 3 semanas antes da vinda do Autor; 27. O Autor após ter comparecido no local de trabalho em D… indicado pela Ré para executar as tarefas de preenchimento do livro selado “Diário, Razão e Balancete”, manifestou perante o seu agregado familiar, nomeadamente a filha…que se sentia perseguido, humilhado e insatisfeito com a decisão da Ré; 28. No dia 21 de Junho de 2011 o Autor não fez uma única das tarefas que lhe tinham sido ordenadas pela Ré; 29. Para desempenhar as funções que lhe foram atribuídas pela Ré (preenchimento do livro selado “Diário, razão e Balancete) o Autor não necessitava de usar o telefone ou a internet; 30. A Ré disponibilizou ao Autor o acesso ao telefone junto da dependência bancária contígua às instalações onde se encontrava, sempre que tal se revelasse profissionalmente necessário; 31. A Ré já tinha decidido entregar ao Autor um telemóvel para uso profissional; 32. À esmagadora maioria dos trabalhadores da Ré também não é disponibilizada internet, disponibilizando a Ré aos seus trabalhadores apenas os instrumentos que se mostrem aptos e necessários ao desempenho das funções que lhe são atribuídas; 33. Em momento anterior à reintegração do Autor encontrava-se naquelas instalações um outro trabalhador da Ré, o qual exercia as suas funções nas mesmas condições que foram fornecidas ao Autor; 34. O telemóvel que estava destinado a ser entregue pela Ré ao Autor era o telemóvel que tinha sido anteriormente usado pelo outro trabalhador da Ré que prestara funções naquelas instalações; 35. As instalações indicadas pela Ré para o exercício de funções pelo Autor mostravam-se limpas e asseadas, com todos os meios necessários ao desempenho das suas funções, com uma secretária, uma cadeira, um computador, numa sala arejada, com janela directamente direccionada para a rua, com luz natural; 36. Alguns anos antes de decidida a reintegração do Autor, as instalações da sede da Ré em E…, sofreram obras de remodelação e em virtude dessa remodelação deixaram de ter espaço para outro trabalhador; 37. As instalações disponibilizadas pela Ré ao Autor são contíguas ao balcão da Caixa e na parede que separa as ditas instalações do balcão estão colocadas as máquinas “ATM” e “Balcão 24” e nas instalações do balcão está instalado o cofre forte ao qual se tem acesso se for aberta uma passagem na parede que separa o balcão das instalações disponibilizadas pela Ré ao Autor; 38. Antes do descrito em Q) da matéria assente a câmara de vídeo estava colocada de modo que abrangia o local onde se encontrava a secretária indicada para a realização das tarefas distribuídas ao Autor; 39. A Ré tinha planeado que o Autor frequentasse acções de formação com vista a actualizar conhecimentos. IV. Fundamentação Delimitadas supra, sob o n.º II, as questões essenciais decidendas, é o momento de analisar e decidir, de per si, cada uma delas. 1. Da reintegração do trabalhador Recorde-se que por decisão judicial transitada em julgado foi declarada a «(…) nulidade do despedimento do Autor, por ilícito (caducidade do direito da Ré aplicar a sanção de despedimento do Autor), decreto a subsistência do vínculo laboral e condeno a Ré a reintegrá-lo no seu posto de trabalho e ao serviço, com a categoria, antiguidade e retribuição que teria se não tivesse sido despedido e desde a data da decisão do despedimento». Ou seja, a empregadora/recorrida foi condenada a reintegrar o trabalhador no «posto de trabalho», com a categoria, antiguidade e retribuição que teria se não tivesse sido despedido. A sentença recorrida concluiu que a empregadora cumpriu a reintegração do trabalhador. Para tanto, escreveu-se na mesma: «No caso em apreço o Autor tinha a categoria profissional de Técnico de grau IV, sendo que de acordo com o Contrato Colectivo de Trabalho aplicável “Técnico de Grau IV é o trabalhador que adapta os seus conhecimentos técnicos à prática quotidiana da instituição e executa ou colabora em estudos, projectos e análises de natureza técnica ou cientifica adequados à sua formação académica ou currículo profissional, designadamente o técnico de contas, inscrito na Direcção-Geral de Contribuições e Impostos, e que, nomeado pela instituição, assuma a responsabilidade pela contabilidade da mesma; exerce as suas funções sob orientação e controlo. Pode representar a instituição em assuntos da sua responsabilidade” e a Ré ordenou-lhe que procedesse ao preenchimento do livro selado “Diário razão e Balancete” do primeiro semestre de 2006. O preenchimento dos referidos livros é uma das tarefas incluída no processamento da contabilidade da instituição, pelo que sendo o autor Técnico Oficial de Contas, a nosso ver, a tarefa que lhe foi determinado realizar enquadra-se na sua categoria profissional de Técnico de grau IV. È certo que podemos dizer que trabalhando o autor para a Ré desde 1985, poderia ser incumbido da realização de outras tarefas mais técnicas, mas também não podemos ignorar que o Autor esteve afastado das suas funções desde 2006 pelo que aquela poderia ser uma forma do autor rever conhecimentos e reintegra-se mais facilmente na estrutura da Ré, até porque durante o lapso temporal em que o Autor esteve afastado ocorreram muitas alterações legislativas, nomeadamente ao nível contabilístico. Está também assente que o preenchimento dos livros selados “Diário, Razão e Balancete” apenas deixou de ser obrigatório de 30 de Junho em diante (vide resposta ao artigo 2º da Base Instrutória), pelo que não se pode dizer que a Ré tenha dado ordens ao Autor para realizar uma tarefa sem qualquer efeito prático, para além de que os auditores externos da… tinham alertado a Ré para a necessidade de preencher os livros selados (vide resposta ao artigo 4º da Base Instrutória). Ou seja, no que respeita às funções atribuídas ao Autor, a nosso ver, a Ré não deixou de cumprir o determinado pelo Tribunal, atribuindo ao autor a realização de funções compreendidas na sua categoria profissional de Técnico de grau IV.». E quanto à circunstância de as funções passarem a ser exercidas em D…, quando antes do despedimento eram exercidas em E…, ponderou-se na mesma sentença: «Vejamos agora se a Ré ao ordenar ao autor que prestasse trabalho nas instalações de D…quando o mesmo prestava serviço nas instalações de E… antes do despedimento incumpriu o decidido pelo Tribunal. Da discussão da causa resultou provado que alguns anos antes de decidida a reintegração do Autor as instalações da sede da Ré em E… sofreram obras de remodelação e em virtude dessa remodelação deixaram de ter espaço para outro trabalhador (vide resposta ao artigo 18º da base instrutória), donde se conclui que a Ré não tinha possibilidade de reintegrar o autor no mesmo local onde exercia funções antes do despedimento que depois veio a ser declarado ilícito. Porque assim é, a nosso ver, era legítimo à Ré ordenar que o autor passasse a prestar trabalho nas instalações de D….». O recorrente rebela-se contra tal entendimento, argumentando, no essencial, que foi colocado num posto de trabalho diferente daquele ocupado à data do despedimento, não só por o local de trabalho ser geograficamente diferente daquele ocupado à data do despedimento, mas também por estar em causa o exercício de funções diversas daquelas exercidas à data do despedimento. Vejamos.No âmbito do Regime Jurídico da Cessação do Contrato Individual de Trabalho e da Celebração e Caducidade do Contrato de Trabalho a Termo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27-02 (LCCT), estabelecia o artigo 13.º, n.º 1, alínea b), que sendo o despedimento declarado ilícito, a entidade empregadora será condenada na «[r]eintegração do trabalhador, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade (…)». Escreve Monteiro Fernandes (Direito do trabalho, 11.ª Edição, Almedina, 2002, págs. 548-549), que «(…) a impugnação do despedimento com opção pela reintegração não tem outro sentido senão o de r[e]mover uma causa juridicamente inadequada de interrupção das relações contratuais – isto é, o de repor em funcionamento o mecanismo do contrato. É a tese de Furtado Martins [] que assim nos parece inteiramente de sufragar: «o direito à reintegração» tal como foi consagrado na lei, «apenas» significa a manutenção do vínculo entre as partes». A invalidação do despedimento tem aí o seu corolário: para além da repristinação dos efeitos do contrato, quanto ao período anterior à sentença, a afirmação da sua permanência e, portanto, da continuidade futura desses efeitos []». (…) O empregador não está, em suma, obrigado a «criar» uma função, a «libertar» um posto de trabalho, a «ficcionar» uma utilidade, para preenchimento do dever contratual de ocupação do trabalhador; nem está, tão pouco, adstrito a reservar-lhe em qualquer circunstância o «lugar» ou «cargo» normalmente desempenhado. Está obrigado a ocupá-lo efectivamente, em funções que correspondam à sal categoria e no local habitual, se não existir razão objectiva que o impeça». Nesta linha interpretativa se insere o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12-05-1999 (Recurso n.º 271/98, CJ/STJ 1999, 2.º-255), no qual se afirma que sendo «[a] entidade patronal condenada a reintegrar o trabalhador não fica obrigada a colocá-lo no lugar concreto em que o trabalhador se encontrava»; ou o acórdão do mesmo tribunal de 31-05-2001 (Proc. n.º 382/01, CJ/STJ, 2001, 2.º-289), de acordo com o qual «[a] entidade patronal cumpre a obrigação de reintegrar o trabalhador se o colocar a exercer as funções correspondentes à sua categoria profissional.». Entretanto, o Código do Trabalho de 2003 (aprovado pela Lei n.º 99/2003, de 27-08) estabelece no seu artigo 436.º, n.º 1, alínea b), que sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado «[a] reintegrá-lo no seu posto de trabalho sem prejuízo da sua categoria e antiguidade». À semelhança do regime anterior, Monteiro Fernandes continua a entender que o empregador cumpre a obrigação de reintegrar o trabalhador se o ocupar efectivamente, «(…) em funções que correspondam à sua categoria e no local habitual, se não existir razão objectiva que o impeça» (Direito do Trabalho, 13.ª Edição, Almedina, 2006, pág. 575). No mesmo sentido aponta Pedro Romano Martinez (Direito do Trabalho, 3.ª Edição; Almedina, 2006, pág. 1000), que sustenta que mantendo-se o contrato de trabalho em vigor, o trabalhador ilicitamente despedido tem direito à reintegração na sua categoria e, no período em que esteve afastado na empresa, não perdeu a antiguidade. Porém, para Júlio Vieira Gomes (Direito do Trabalho, Vol. I, Coimbra Editora, Pág. 1019) a reintegração deve fazer-se no mesmo posto de trabalho que o trabalhador tinha antes de ser despedido e não apenas por referência à categoria do trabalhador. Neste mesmo sentido aponta a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, designadamente os acórdãos de 18-01-2006, de 28-01-2012 e de 19-06-2013 (Recursos n.ºs 3223/05, 679/07.2TTMAI-D.P1.S1 e 111/11.7TTPTG.E1.S1, respectivamente, todos disponíveis em www.dgsi.pt). Para tanto, escreveu-se no referido acórdão de 19-06-2013: «Resulta do disposto no artigo 436.º, n.º 1, al. b), do Código do Trabalho de 2003 que «sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado» a reintegrar o trabalhador «no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua antiguidade e categoria», formulação que no Código de Trabalho de 2009, nos termos do seu artigo 389.º, n.º 1, al. b) se refere à «reintegração do trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade». Conforme refere PEDRO FURTADO MARTINS, «a reintegração mais não é do que a declaração judicial de que a relação de trabalho não cessou através do despedimento», pelo que, no entender deste autor, a «reintegração consiste na manutenção ou subsistência do vinculo jurídico entre as partes»[]. O conceito de posto de trabalho, como espaço demarcado e individualizado no contexto da actividade prosseguida pela entidade empregadora, tem implícita uma referência às funções desempenhadas pelo trabalhador, que por sua vez o referenciam a uma determinada categoria profissional e um complexo de direitos e obrigações que é inerente a esta. A caracterização e individualização de um concreto posto de trabalho tem assim como ponto de partida as funções desempenhadas pelo trabalhador para a sua entidade empregadora. A individualização e caracterização das funções desempenhadas à volta de um núcleo que forneça a respectiva identidade está na base da categoria profissional e pode funcionar como critério para a identificação de um concreto posto de trabalho. JOANA NUNES VICENTE, pronunciando-se sobre o preenchimento do conceito de posto de trabalho, para os efeitos do disposto no artigo 132.º do Código do Trabalho de 2003, afirma que «em primeiro lugar, posto de trabalho, dir-se-á o conjunto de funções atribuídas ao trabalhador no seio de uma dada organização do empregador. A expressão não deve ser entendida no sentido meramente formal, como mera job description prevista no contrato, mas antes correspondendo às funções efectivamente exercidas pelo trabalhador numa concreta organização empresarial»[]. A reintegração do trabalhador despedido tem assim como elemento de referência o posto de trabalho que o mesmo desempenhava antes de ter ocorrido o despedimento, o que implica a referência a um concreto local e estabelecimento da empregadora, onde as tarefas do despedido eram desempenhadas.». Já no âmbito do Código do Trabalho de 2009 (aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro), dispõe o artigo 389.º, n.º 1, alínea b) que sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado «[n]a reintegração do trabalhador no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categorias e antiguidade (…)». A substituição da referência à reintegração no «mesmo posto de trabalho», constante do artigo 436.º, n.º 1, alínea b) do anterior Código, pela reintegração «no mesmo estabelecimento», constante do actual Código, é justificada por Pedro Romano Martinez (Código do Trabalho Anotado, 2013, 9.ª Edição, Almedina, pág. 814) por ser «(…) mais consentânea com a realidade empresarial, confere maior autonomia ao empregador condenado a reintegrar o trabalhador». Ou, como escreve Maria do Rosário Palma Ramalho, «[n]este ponto, o CT de 2003 era mais exigente, porque exigia que a reintegração do trabalhador fosse feita no mesmo posto de trabalho (art. 436.º n.º 1 b) deste Código) e não apenas no mesmo estabelecimento. A actual orientação do Código do Trabalho nesta matéria vai ao encontro de alguma jurisprudência, que vem admitindo a reintegração do trabalhador em posto de trabalho diverso mas com conteúdo funcional idêntico e correspondente à categoria que o trabalhador tinha anteriormente (…)» (Direito do Trabalho, Parte II, 3.ª Edição, Almedina, pág. 948, nota 333). Observa Pedro Furtado Martins que «[a] regra de que a lei parte é o contrato manter-se na plenitude dos seus efeitos, tal como decorre da anulação do despedimento. Neste caso o trabalhador tem direito à reintegração «sem prejuízo da sua categoria e antiguidade», isto é, tem direito à manutenção da relação de trabalho, com todas as consequências que daí derivam. (…) Coincidindo a reintegração com a declaração judicial da manutenção ou subsistência da relação de trabalho, a determinação dos efeitos do despedimento ilícito no período de tempo posterior à sentença desloca-se para o plano dos efeitos do próprio contrato. O empregador (tal como o trabalhador) permanecerá obrigado a cumprir as obrigações que para ele decorrem do vínculo jurídico-laboral, ficando investido nas mesmas posições jurídicas ativas e passivas que tinha antes do despedimento.». (Cessação do Contrato de Trabalho, 3.ª Edição, Principia, 2012, págs. 458-459).Feita esta referência, genérica, em torno da reintegração do trabalhador ilicitamente despedido, é altura de regressarmos ao caso em apreço. Resulta da matéria de facto que o Autor, ora recorrente, foi despedido em 2006, o que significa que o despedimento ocorreu na vigência do Código do Trabalho de 2003. No mesmo ano de 2006 o Autor intentou a respectiva acção de impugnação do despedimento, na qual pediu, entre o mais, a sua reintegração na empregadora. A declaração de ilicitude do despedimento determina o retomar dos efeitos do contrato, interrompidos mercê da acção ilícita da empregadora, considerando-se, assim, que o contrato se manteve em vigor por todo o tempo, até ao momento da reintegração, o que significa a reocupação do posto de trabalho de que o trabalhador foi afastado, reintegração que se faz sem prejuízo da categoria e antiguidade. Ora, embora a decisão judicial que declarou a ilicitude do despedimento tenha apenas transitado em julgado em 20011, portanto já na vigência do Código do Trabalho de 2009, por força do disposto no artigo 7.º, n.º 1, da respectiva lei preambular, o mesmo «não se aplica às condições de validade e a efeitos de factos ou situações totalmente passados anteriormente àquele momento». Por isso, tendo em conta que os factos – rectius despedimento do trabalhador e pedido de reintegração – se passaram em data anterior à entrada em vigor do Código do Trabalho de 2009 (que ocorreu em 17 de Fevereiro desse ano), entende-se ser aplicável ao caso o Código do Trabalho de 2003.Como se viu, e se relembra, nos termos do artigo 436.º, n.º 1, alínea b), do referido compêndio legal, sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado a reintegrar o trabalhador «no seu posto de trabalho sem prejuízo da sua categoria e antiguidade». A lei não contém uma definição do que deve entender-se por posto de trabalho. Contudo, a propósito do contrato de trabalho a termo e da referência a posto de trabalho constante do artigo 132.º do Código do Trabalho de 2003, Joana Nunes Vicente entende, conforme transcrição supra que consta do acórdão do STJ de 29-06-2013, que tal conceito corresponde ao «conjunto de funções atribuídas ao trabalhador no seio de uma dada organização do empregador». André Strecht Ribeiro (Contratos a Termo, Evolução até à lei nº 23/2012, de 25 de Junho, Vida Económica, pág. 79) entende que a tónica reside no conjunto de funções efetivamente desempenhadas. No Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 23-04-2007 (Processo 0710664, disponível em www.dgsi.pt) afirmou-se que «quando a lei fala em “posto de trabalho” está a referir-se às funções que o trabalhador exerce e para as quais foi contratado e cuja menção deve constar do contrato de trabalho a termo». Pois bem: aludindo o artigo 436.º, n.º 1, alínea b) a «posto de trabalho», entende-se, tendo presente o disposto no artigo 9.º do Código Civil, que tal não poderá significar tão só a integração do trabalhador na mesma categoria profissional: a expressão em causa, para ter um sentido útil, terá que ser interpretada no sentido de que o trabalhador deve ser integrado a desempenhar o núcleo essencial das funções que lhe estavam atribuídas antes do despedimento, num determinado local e estabelecimento, integradas na organização da empregadora. Isto é, terá que se aferir perante as concretas funções que foram atribuídas ao trabalhador se as mesmas se integram ou não no núcleo essencial das funções que desempenhava antes do despedimento e, assim, se o mesmo foi reintegrado no posto de trabalho, e não apenas apurar se as novas funções se integram ou não na sua categoria profissional. No caso em apreço, resulta no essencial da matéria de facto: - à data do despedimento o Autor tinha o seu posto de trabalho na sede da C…., em E… (n.º 9); - tinha a categoria profissional de «Técnico de Grau IV», cujas funções correspondem, no essencial, ao trabalhador que executa ou colabora em estudos e análises de natureza técnica ou cientifica adequados à sua formação académica ou currículo profissional, designadamente o técnico de contas, inscrito na Direcção-Geral dos Impostos e que, nomeado pela instituição, assume a responsabilidade pela contabilidade da mesma (n.º 10); - com a reintegração do Autor foram-lhe atribuídas as funções de preenchimento do livro selado «Diário, Razão e Balancete» do ano de 2006 da C… (n.º 8); - o preenchimento dos livros selados «Diário, Razão e Balancete» deixou de ser obrigatório de 30 de Junho de 2006 em diante e os auditores externos tinham alertado a Ré para a necessidade de preencher os livros selados «Diário, Razão e Balancete» até essa data (n.ºs 20 e 22). - tais funções passariam a ser executadas em instalações contíguas ao Balcão da Ré, em (localidade) D…, que dista cerca de 23 Km de (localidade) E…, local onde antes do despedimento o Autor desempenhava as funções e onde reside (n.º 23). Da referida matéria de facto não se extrai quais as concretas funções que o Autor desempenhava antes do despedimento; porém, dos autos, designadamente da posição assumida pelas partes nos articulados, um facto se apresenta incontroverso: as funções atribuídas ao Autor na sequência da reintegração por ilicitude do despedimento – preenchimento dos livros selados «Diário, Razão e Balancete» – não eram por ele exercidas anteriormente ao despedimento. Ou seja, embora se admita (e dizemos admita, porque da matéria de facto fixada na 1.ª instância não se retira quais as concretas funções que o Autor desempenhava antes do despedimento, apenas tendo implícito na sentença recorrida que as mesmas se inseriam na categoria profissional do Autor, de «Técnico de Grau IV») que quer as funções desempenhadas antes do despedimento quer as funções atribuídas na sequência da reintegração se insiram na mesma categoria profissional, o certo é que para efeitos de reintegração no posto de trabalho era necessário que o núcleo essencial das funções se mantivesse. E as funções que passaram a ser atribuídas ao Autor eram notoriamente funções de menor relevância, de menor dignidade, funções não prestigiantes para um trabalhador com mais de 20 anos de antiguidade na empresa. Com efeito, tendo o Autor sido admitido ao serviço da Ré em 01 de Junho de 1985 e tendo a qualificação académica de Técnico Oficial de Contas (TOC), não se afigura, ao contrário do que perpassa da fundamentação da sentença recorrida, que essa fosse uma forma de «rever conhecimentos» e de se reintegrar mais facilmente na estrutura da Ré: tendo em conta a antiguidade do Autor e, com ela, a experiência adquirida, não vislumbramos que o preenchimento por si dos livros selados «Diário, Razão e Balancete» constituísse qualquer mais-valia em termos de aquisição ou actualização de conhecimentos, quando, é certo, esse preenchimento até deixou de ser obrigatório a partir de 30 de Junho de 2006. Acresce que o Autor desempenhava anteriormente as funções num determinado local (E…) e após o despedimento passariam a ser desempenhadas em local bem distinto, em D…, a uma distância de cerca de 23 Km. Ora, o afirmar-se no facto n.º 36, tout court, que alguns anos antes de decidida a reintegração, as instalações da sede da Ré, em E…, sofreram obras de remodelação e em virtude dessa remodelação deixaram de ter espaço para outro trabalhador, também não permitem concluir, com segurança, que a Ré não pudesse colocar o Autor no seu “antigo” local de trabalho: por um lado, porque se desconhece em que data foram realizadas as obras e, por isso, se antes ou depois do despedimento – sendo que neste último caso, não podendo a Ré ignorar as consequências que poderiam advir caso fosse declarado ilícito o despedimento, a situação foi directamente por ela criada, por essa via procurando inviabilizar a colocação do Autor no mesmo local de trabalho – e, por outro, porque se desconhece a concreta orgânica do estabelecimento/sede da Ré, maxime a situação laboral dos outros trabalhadores e a sua inserção na organização da Ré. Conclui-se, pois, que por virtude da ilicitude do despedimento estando a Ré obrigada a reintegrar o Autor no seu «posto de trabalho» não cumpriu essa obrigação, ao lhe atribuir tarefas que não se inserem no núcleo essencial das funções que o Autor desempenhava anteriormente ao despedimento, tendo em conta, inclusive, o anterior local de trabalho. 2. Do abandono do trabalho A sentença recorrida afirmou a existência de abandono do trabalho por parte do Autor/recorrente, uma vez que tendo-se apresentado nas instalações contíguas ao balcão de D… no dia 21 de Junho de 2011, e desde então não mais se ter apresentado, apesar da Ré lhe ter transmitido que não considerava justificada as ausências ao trabalho, esse abandono tem-se por verificado. O recorrente discorda de tal entendimento, argumentando, em síntese, que informou a Ré do motivo da ausência, pelo que não se verificam os pressupostos do abandono do trabalho. Vejamos. Tendo a situação de ausência ao trabalho se verificado em Junho-Julho de 2011, importa atender ao que dispõe o Código do Trabalho de 2009. O contrato de trabalho pode cessar por diferentes razões, quer por iniciativa do empregador, quer do trabalhador, nos termos estabelecidos no artigo 340.º do referido compêndio legal. Assim, o contrato pode cessar, nomeadamente, conforme a alínea h) do artigo 340.º, por denúncia pelo trabalhador, mesmo quando esta resulta, tacitamente, do abandono do trabalho, nos termos previstos no artigo 403.º do referido compêndio legal. Dispõe este artigo: «1 – Considera-se abandono do trabalho a ausência do trabalhador do serviço acompanhada de factos que, com toda a probabilidade, revelam a intenção de não o retomar. 2 – Presume-se o abandono do trabalho em caso de ausência do trabalhador do serviço durante, pelo menos, 10 dias úteis seguidos, sem que o empregador seja informado do motivo da ausência. 3 – O abandono do trabalho vale como denúncia do contrato, só podendo ser invocado pelo trabalhador após comunicação ao trabalhador dos factos constitutivos do abandono ou da presunção do mesmo, por carta registada com aviso de recepção para a última morada conhecida deste. 4 – A presunção estabelecida no nº 2 pode ser ilidida pelo trabalhador mediante prova da ocorrência de motivo de força maior impeditivo da comunicação ao empregador da causa da ausência. 5 – Em caso de abandono do trabalho, o trabalhador deve indemnizar o empregador nos termos do artigo 401º.». Do citado artigo decorre que são dois os elementos constitutivos da figura jurídica do abandono do trabalho: (i) um elemento objectivo, traduzido na ausência do trabalhador ao serviço, isto é, a não comparência do trabalhador no local e no tempo de trabalho a que está obrigado, não comparência essa que terá que ser voluntária e injustificada; (ii) um elemento subjectivo, traduzido na intenção de não retomar o serviço, ou seja, a intenção de não comparência definitiva ao local de trabalho [neste sentido, vejam-se entre outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Março de 2008 (Proc. n.º 2715/07), de 29 de Outubro de 2008 (Proc. n.º 2273/08), de 03-06-2009 (Proc. n.º 3696/08) e de 05-12-2012 (Proc. n.º 499/10.7TTFUN.L1.S1) todos disponíveis em www.dgsi.pt]. Esta conclusão (de não retomar o serviço) deverá extrair-se objectivamente, a partir dos factos, não sendo necessário que tenha sido representada pelo respectivo agente. Isto é, a afirmação de que determinados factos revelam com toda a probabilidade a intenção do trabalhador de não retomar o serviço colhe-se através das regras da experiência, de princípios lógicos e com base em factos conhecidos de que o tribunal faz as suas inferências, extrai as suas ilações (artigos 349.º e 351.º do Código Civil). Como se afirmou no referido acórdão do STJ de 03-06-2009, «[p]ara que o facto seja considerado “concludente” da vontade de não retomar o serviço, não se torna necessário – cabe aqui salientá-lo – que o sentido dele extraível haja sido representado pelo respectivo agente: a concludência de um comportamento determina-se “de fora”, objectivamente”, “... não exigindo a consciência subjectiva por parte do seu autor desse seu significado implícito». E do citado n.º 2 do artigo 403.º, resulta que a lei presume que a falta ao trabalho durante, pelo menos, 10 dias úteis seguidos, sem comunicação do motivo de ausência, revela com toda a probabilidade aquele elemento subjectivo, isto é, a intenção de não retomar o serviço. Em tal situação, caberá ao trabalhador ilidir a presunção, nos termos previstos no citado n.º 4 do artigo 403.º, ou seja, provando a ocorrência de motivo de força maior impeditivo da comunicação ao empregador do motivo da ausência. Essa prova não se basta com os factos que motivaram a sua ausência: ele deverá também alegar e provar que, no caso concreto, agiu com a necessária diligência, própria de uma pessoa normal, medianamente prudente, avisado e cuidadoso e que só por razões que lhe não são imputáveis, foi impedido de cumprir aquele seu dever de comunicar o motivo da ausência (neste sentido, ac. do STJ de 05-07-2007, disponível em www.dgsi.pt, sob Proc. 06S4283). No caso em apreciação, extrai-se da matéria de facto, no essencial e a este respeito: - por instruções expressas da Ré o Autor iniciou funções no dia 21 de Junho de 2011 (n.º 8); - entretanto, após esse início de funções, o Autor remeteu à Ré a comunicação cuja cópia consta a fls. 65 e 66, em que, em síntese, afirma que esta não deu cumprimento à decisão judicial quanto à sua (dele, Autor) reintegração no posto de trabalho, uma vez que quer o local quer as funções que lhe foram atribuídas não correspondem ao posto de trabalho que lhe estava atribuído à data do despedimento, e que iria recorrer aos meios judiciais para ser, efectivamente, integrado no posto de trabalho (n.º 11); - em resposta, a Ré remeteu ao Autor uma carta datada de 28-06-2011, cuja cópia consta a fls. 67 e 68 dos autos, em que lhe afirma que a carta por ele anteriormente remetida, a justificar o motivo da não apresentação ao serviço, não configura «qualquer justificação para o facto de não se apresentar ao trabalho, as suas ausências serão considerada[s] como faltas injustificadas, com todas as consequências legais que daí possam resultar» (n.º 12); - e datada de 14-07-2011 a Ré remeteu ao Autor uma carta, por ele recebida e cuja cópia consta a fls. 69 dos autos, em que lhe comunica que se encontra ausente do serviço desde 24 de Junho de 2011, pelo que considera que abandonou o seu posto de trabalho, «nos termos e com as consequências previstas no artigo 403.º, do Código do Trabalho». Perante esta matéria de facto, considerando que o Autor deixou de se apresentar ao serviço a partir de Junho de 2011 (da matéria de facto fixada não resulta expressamente a concreta data em que o Autor deixou de se apresentar ao serviço, mas na fundamentação da sentença recorrida afirma-se que foi a partir de 21 de Junho de 2011) é de concluir que se verifica o elemento objectivo do abandono do trabalho: ausência do trabalhador ao serviço. E quanto ao elemento subjectivo? Recorde-se que este consiste na intenção de não retomar o serviço, de não mais comparecer ao trabalho. Ora, o Autor informou a Ré que se recusava a apresentar ao serviço porque as funções de que havia sido incumbido e o local atribuído para trabalhar não correspondiam à obrigação imposta à Ré de o reintegrar no posto de trabalho. Ou seja, o Autor informou a Ré do motivo da ausência ao serviço: e dessa informação resulta claramente que não há uma intenção de não voltar a retomar o serviço; o que resulta, sim, da informação do Autor é uma intenção de que a Ré o reintegre no posto de trabalho que tinha para, então, retomar o serviço. Temos, pois, por adquirido que não se verificou a intenção do Autor de não mais retomar o trabalho ao serviço da Ré e, por consequência, que não se verifica um dos elementos (o subjectivo) constitutivos do abandono do trabalho. Poder-se-á argumentar que face à recusa do Autor em aceitar as funções que lhe foram atribuídas e no local indicado, tal equivale a uma recusa definitiva em retomar o trabalho. Isto, à semelhança do que se verifica quanto à caducidade do contrato de trabalho por impossibilidade definitiva do trabalhador em prestar o trabalho, em que se tem entendido que essa impossibilidade é definitiva não só se face à evolução normal e previsível se apresenta como irreversível, como também se a impossibilidade vai durar tanto tempo que não é exigível à empresa futura e incerta viabilização da relação contratual. No caso, o trabalhador apresentou-se ao serviço em 21 de Junho de 2011 e nessa data, ou em datas próximas, logo informou a empregadora que não aceitava as funções que lhe foram atribuídas, tendo-se ausentando do serviço. Em 28 de Junho seguinte a Ré informou-o que considerava as faltas injustificadas, o mesmo é dizer que estava ciente do motivo da ausência do Autor; e logo no dia 14 de Julho do mesmo ano comunicou-lhe a cessação do contrato por abandono do trabalho. Face ao litígio entre as partes em torno da efectiva reintegração do Autor entende-se que a não comparência ao serviço por parte do Autor no período indicado não configura uma recusa definitiva em retomar o trabalho: o que existe é uma recursa temporária, tendo em vista a pretendida reintegração nas funções e local que tinha antes do despedimento. Por isso, independentemente de ter havido ou não reintegração no posto de trabalho – já se concluiu supra que não existiu essa reintegração –, não se verificou intenção do Autor de não mais retomar o trabalho e, por consequência, não se verificou abandono do trabalho.3. Das consequências da (in)existência de abandono do trabalho Face à solução alcançada, a comunicação da Ré/recorrida de cessação do contrato por abandono do trabalho configura um despedimento, obviamente ilícito, por não ter sido precedido do respectivo procedimento [artigo 381.º, alínea c) do Código do Trabalho]. Nesta sequência, e tendo em conta o pedido e o objecto do recurso, deve a Ré/recorrente ser condenada a (artigos 389.º e 390.º do Código do Trabalho): i. reintegrar o Autor, sem prejuízo da sua antiguidade e categoria profissional; ii. pagar-lhe as retribuições vencidas e vincendas desde o dia 14 de Agosto de 2011 – considerando que a comunicação de despedimento foi recebida pelo Autor em 18 de Julho de 2011 e a acção foi proposta em 13-09-2011 – até ao trânsito em julgado da presente decisão, deduzido, no entanto e por força da lei, o subsídio de desemprego de que, porventura, haja beneficiado durante aquele período e que a Ré deve entregar à Segurança Social [cfr. artigos 389.º, n.º 1 b) e 390º n.ºs 1 e 2, ambos do Código do Trabalho], relegando-se a liquidação das mencionadas retribuições para incidente próprio dado que, de momento, se desconhecem os valores a deduzir às mesmas nos referidos termos. Anote-se que acolhemos a interpretação no sentido que a imperatividade do regime legal atinente à dedução dos rendimentos de trabalho por actividade iniciada após o despedimento e até ao encerramento da discussão em 1.ª instância [artigo 390.º, n.º 1, alínea a), do Código do trabalho] não dispensa o empregador de alegar e provar que o trabalhador os auferiu; sem essa alegação e prova não é possível operar/determinar a referida dedução; já em relação à dedução do subsídio de desemprego constitui matéria de conhecimento oficioso, já que se trata de uma prestação do Estado, substitutiva da retribuição, que, uma vez recuperada, tem que ser devolvida à Segurança Social, não redundando, por isso, num qualquer benefício para o empregador (cfr. neste sentido, por todos, embora no âmbito do anterior regime legal, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 12-09-2012, Recurso n.º 154/06.2TTMTS.C.P1.S1]. Ora, no caso, não se mostra provado, nem sequer alegado, que o trabalhador tenha auferido rendimentos por actividade iniciada posteriormente ao despedimento e até ao encerramento da discussão em 1.ª instância. Também em relação à não propositura da acção no prazo de 30 dias após o despedimento, tratando-se de um facto objectivo, e competindo ao tribunal a interpretação e aplicação das regras de direito (artigo 5.º, n.º 3, do novo Código de Processo Civil), não poderá deixar de, em conformidade com o que dispõe o artigo 390.º, n.º 2, alínea b), do Código do Trabalho, proceder à dedução das retribuições desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da acção.4. Do pedido reconvencional O Autor foi condenado no pagamento à Ré da quantia de € 3.045,92, por não ter feito cessar o contrato (por abandono do trabalho) com 60 dias de antecedência. Ora, tendo-se concluído que não se verificou a cessação do contrato por abandono do trabalho, falta o pressuposto para condenação (denúncia do contrato sem aviso prévio), pelo que terá, forçosamente, que improceder a reconvenção e, por consequência, é de revogar a referida condenação do Autor.5. Da condenação em custas Vencida no recurso, deverá a Ré/recorrida ser condenada nas custas respectivas (artigo 527.º, do Código de Processo Civil). Em relação às custas da acção na 1.ª instância deverão ser suportadas por ambas as partes na proporção do respetivo decaimento: tendo em conta o valor que foi fixado à acção (€ 28.870,70) e o citério que fundamentou tal fixação (fls. 316), que não vem posto em causa, fixa-se a proporção em 86/100 para o Autor e em 14/100 para a Ré. Em relação às custas da reconvenção na 1.ª instância serão suportadas pela Ré. V. Decisão Face ao exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar procedente o recurso interposto por B… e, em consequência: 1. Revoga-se a sentença recorrida, na parte em que julgou a acção improcedente e absolveu a Ré dos pedidos e, em sua substituição, declara-se ilícito o despedimento promovido pela Ré C…, CRL, consubstanciado na declaração de abandono do trabalho de 14 de Julho de 2011, notificada ao Autor no dia 18 de Julho de 2011, e condena-se a mesma Ré a: i. reintegrar o Autor, sem prejuízo da categoria profissional e antiguidade; ii. pagar ao Autor as retribuições que este deixou de auferir desde o dia 14 de Agosto de 2011 até ao trânsito em julgado da presente decisão, acrescidas de juros de mora até efectivo pagamento, retribuições essas deduzidas, no entanto e por força da lei, do subsídio de desemprego de que, porventura, o Autor haja beneficiado durante aquele período de tempo e que a Ré deve entregar à Segurança Social, relegando-se a liquidação das mencionadas retribuições para incidente próprio, dado que, de momento, se desconhecem os valores a deduzir às mesmas nos referidos termos. 2. Revoga-se a sentença recorrida, na parte em que condenou o Autor a pagar à Ré a quantia de € 3.045,92, dela se absolvendo o Autor. 3. Em tudo o mais, excepto quanto à condenação em custas, mantém-se a sentença recorrida. Quanto às custas, condena-se a Ré/recorrida nas custas do recurso. Em relação às custas da acção na 1.ª instância são suportadas por ambas as partes, na proporção do respectivo decaimento, que se fixa em 86/100 para o Autor e em 14/100 para a Ré. As custas da reconvenção na 1.ª instância são suportadas pela Ré/recorrida. Évora, 07 de Janeiro de 2016. João Nunes (relator) Baptista Coelho (1.º adjunto) José Feteira (2.º adjunto) |