Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
356/25.2T8STR-B.E1
Relator: ANABELA RAIMUNDO FIALHO
Descritores: DECLARAÇÃO DE INSOLVÊNCIA
FACTOS-ÍNDICE
PRESUNÇÃO DE INSUFICIÊNCIA ECONÓMICA
ÓNUS DA PROVA
Data do Acordão: 10/02/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I – As circunstâncias elencadas nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 20.º do CIRE constituem factos que indiciam a situação de insolvência do devedor, nos termos descritos no n.º 1 do artigo 3.º do referido Código.
II – Verificada a situação prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º e não tendo a devedora demonstrado a respetiva solvência, há que declarar a insolvência, ainda que o valor da sua dívida seja inferior ao que foi determinado na respetiva sentença.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 356/25.2T8STR-B.E1

Tribunal a quo
Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, Juízo de Comércio de Santarém-Juiz1
Recorrente: (…), Lda. (Requerida)
Recorrido: (…) (Requerente)
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Relatora: Anabela Raimundo Fialho
1º Adjunto: Mário João Canelas Brás
2ª Adjunta: Isabel Maria Socorro de Matos Peixoto Imaginário
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Sumário: (…)
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Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:

1. RELATÓRIO
(…), portador do CC n.º (…), emitido pela República Portuguesa e válido até 20.02.2030, contribuinte n.º (…), residente em Rua (…), n.º 3, R/c Esq., 2680 – 274 (…), na qualidade de credor, instaurou processo especial de insolvência contra (…), Lda., pessoa coletiva n.º (…), com sede na Rua (…), Lote 8, 1º-Esq., (…).
Alegou, em síntese, ter trabalhado para a Requerida até 8 de fevereiro de 2024, inclusive, e que aquela não lhe pagou quantias devidas pela relação contratual, num total de € 11.777,98. Alegou ainda que a Requerida alienou o seu património a favor da sociedade “(…), Cargo, Lda.”, cujos sócio e gerentes são filhos do seu legal representante.
Citada, a Requerida deduziu oposição.
Foi proferida sentença, na qual se declarou a insolvência da Requerida, decidindo-se nos seguintes termos:
Julgo procedente a presente ação especial de insolvência e, em consequência, declaro a insolvência de (…), Lda., pessoa coletiva n.º (…), com sede na Rua (…), Lote 8, 1º-Esq., (…).
Consequentemente:
1. Fixo a residência ao gerente da insolvente, (…), na Rua (…), Lote 8, 1º-Esq., (…).
2. Nomeio, por sorteio, como Administrador da Insolvência o sr. Dr. (…), com escritório na Rua (…), n.º 33, Santa Maria da Feira – artigos 36.º, alínea d), 52.º, n.º 1, do CIRE.
3. Oportunamente e perante a dimensão da massa Insolvente a apurar, se decidirá da nomeação ou não de comissão de credores – artigo 66.º, n.º 2, do CIRE.
4. Declaro aberto o incidente de qualificação com caráter pleno – artigo 36.º, n.º 1, alínea i), do CIRE.
5. Determino que a Insolvente entregue imediatamente ao Administrador de Insolvência os documentos referidos no artigo 24.º que ainda não constam dos autos – artigo 36.º, alínea f), do CIRE..
6. Decreto a apreensão, para imediata entrega ao Administrador de Insolvência, de todos os elementos da contabilidade da Insolvente e de todos os bens, ainda que penhorados, arrestados ou por qualquer outra forma apreendidos ou detidos – artigo 36.º, alínea g), do CIRE.
7. Fixo em 30 dias o prazo para reclamação de créditos, nos termos do artigo 36.º, alínea j), do CIRE.
8. Advertem-se os credores de que devem comunicar prontamente ao sr. Administrador de Insolvência as garantias reais de que beneficiam – artigo 36.º, alínea l), do CIRE.
9. Advertem-se os devedores da Insolvente de que as prestações a que estejam obrigados devem ser feitas ao Administrador de Insolvência e não à própria Insolvente – artigo 36.º, alínea m), do CIRE.
10. Não se designa dia para realização da Assembleia de Apreciação do Relatório a que alude o artigo 156.º do CIRE, dada a previsível composição da massa insolvente.
11. Nos termos do n.º 5 do artigo 36.º do CIRE e uma vez que não se designa data para a realização da assembleia de apreciação do relatório:
a) Caso não venha a ser designada data para a realização da assembleia de apreciação do relatório, entre 45 e 60 dias contados da presente decisão, deverá o Administrador de Insolvência apresentar relatório sobre as diligências realizadas e o resultado das mesmas.
b) Os credores poderão pronunciar-se quanto ao relatório apresentado pelo Administrador da Insolvência no prazo de 15 dias contados da respetiva junção.
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Todos os prazos previstos no CIRE que têm como referência a data da realização da assembleia de apreciação do relatório são, nestes autos e caso não venha a ser designada data para realização de assembleia de apreciação do relatório, contados com referência ao 45º dia subsequente à data da prolação desta sentença.
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Dê publicidade à presente sentença, mais se providenciando pelo seu respetivo registo e pelo cumprimento do disposto no artigo 38.º, n.º 6, do CIRE.
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Notifique a presente sentença nos termos e para efeitos do artigo 37.º do CIRE.
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Cite os credores nos termos do artigo 37.º, n.º 3, 5 e 7, do CIRE.
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Remeta certidão à Conservatória do Registo Comercial competente, no prazo de 5 dias, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 38.º, n.º 2, alínea b) e n.º 5 do CIRE e artigos 9.º, alíneas i) e l), do CRC.
Após trânsito em julgado desta sentença remeta nova certidão com nota de trânsito.
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Avoco todos os processos de execução fiscal pendentes contra a insolvente a fim de serem apensados ao presente processo (artigo 180.º, n.º 2 e 4, do CPT).
Comunique a presente sentença à Autoridade Tributária e Aduaneira, ao Serviço de Finanças competente e ao IGFSS.
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Comunique a presente decisão ao Fundo de Garantia Salarial, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 37.º do CIRE.
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Ordeno a apensação de todos os processos referidos no artigo 85.º, n.º 2, do CIRE.
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Custas pela Massa Insolvente, nos termos do disposto no artigo 304.º do CIRE.
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Registe e notifique.
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Notifique o Administrador de Insolvência nomeada para vir aos autos, no prazo de 10 dias, indicar o seu n.º de contribuinte fiscal e o regime de tributação a que está sujeito para efeitos de ulterior processamento de remuneração.
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Atento que não resulta dos autos a existência de liquidez da massa insolvente, pague ao administrador da insolvência, logo que este manifeste a aceitação, as quantias
legalmente devidas a título de remuneração e provisão para despesas a adiantar pelo IGFEJ – artigo 60.º, n.º 1, do CIRE”.

Inconformada, a Requerida interpôs recurso desta decisão, pugnando pela respetiva revogação, terminando as alegações com a formulação das seguintes conclusões, que se transcrevem:
“(I) O objeto do presente recurso é a decisão proferida pelo Tribunal a quo, que julgou procedente o processo de insolvência de pessoa coletiva proposta pelo Recorrido, em virtude da qual se declarou a Recorrente insolvente, porquanto se considerou provado que a Recorrente deve ao Recorrido o montante de € 11.777,98, a título de créditos laborais, de acordo com a factualidade apurada, e ainda que poderá vir a ser condenada ao pagamento do valor de € 18.972,59 respeitante a créditos laborais no âmbito do processo com o n.º 1185/24.6T8TMR, a correr os seus termos no Juízo do Trabalho de Tomar.
(II) O fundamento da decisão é, em suma, o de que tais factos permitem considerar que o incumprimento da obrigação perante o Recorrido revela a impossibilidade da recorrente satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações. Considerando, em consequência, que se encontra verificado o facto presuntivo da situação de insolvência, previsto no citado artigo 20.º, n.º 1, alínea b), do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa, impondo-se declarar a insolvência da Recorrente.
(III) A Recorrente impugna a matéria de facto, concluindo que deverão ser dados como não provados os seguintes factos ou parte deles, constantes do elenco dos factos provados, na medida em que a prova constante do processo não permite retirar a conclusão retirada pelo Tribunal a quo, sendo, aliás, contrária à mesma, no que respeita aos factos: 9, 11, 21, 25, 26, 28, 31, 32, 33 e 34.
(IV) Da impugnação da matéria de facto resulta que o valor apurado pelo Tribunal de 1ª instância a título de créditos laborais devidos pela Recorrente em relação ao Recorrente se encontra errado, sendo, na verdade, menor, porquanto existem vários valores que têm de ser subtraídos, na medida em que não correspondem a dias de trabalho efetivo, valores devidos ou valores não liquidados.
(V) Em consequência, o juízo de valor que deve ser feito, nos termos do artigo 20.º, n.º 1, alínea b), do CIRE, terá de ser refeito e reanalisado se efetivamente se pode concluir que a Recorrente não tem condições para continuar a cumprir com as suas obrigações.
(VI) A Recorrente não incumpriu com as suas obrigações – porquanto nenhum crédito havia sido reclamado ou se encontra reconhecido – em termos tais que permita concluir pela sua situação de penúria.
(VII) A Recorrente demonstrou ter capacidade para cumprir com as suas obrigações, o que fez, desde logo, através da demonstração da inexistência de incumprimento perante a Autoridade Tributária ou a Segurança Social.
(VIII) Em conclusão, a Recorrente não se encontra numa situação de insolvência, na medida em que não se pode considerar verificado o facto índice constante do artigo 20.º, n.º 1, alínea d), do CIRE, devendo a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância ser revogada”.
O Recorrente não apresentou contra-alegações.
O recurso foi admitido.
1.1. Questões a decidir
Considerando as conclusões do recurso, as quais delimitam o seu objeto nos termos do disposto nos artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do CPC, sem prejuízo da apreciação de eventuais questões de conhecimento oficioso, são as seguintes as questões a decidir:
1.1.1. Deve proceder, no todo ou em parte, a impugnação da matéria de facto?
1.1.2. Em caso afirmativo e face à matéria de facto assente, deve ou não ser decretada a insolvência da Apelante?

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. Fundamentação de facto
2.1.1. Factos considerados provados na decisão recorrida:
1. A Requerida é uma sociedade comercial por quotas que tem por objeto “Transportes rodoviários de mercadorias, nacionais e internacional. Importação, exportação, comércio e distribuição de grande variedade de produtos nomeadamente, produtos alimentares, vestuário, mobiliário, artigos para o lar, eletrodomésticos, informáticos, produtos de beleza”.
2. Em 2 de Setembro de 2019, mediante contrato de trabalho a termo certo, a Requerida admitiu o Requerente para, sob a sua autoridade e direção, prestar trabalho com a categoria profissional de motorista de pesados.
3. O que o Requerente fez, de acordo com as ordens e instruções da R., até 8 de Fevereiro de 2024, conduzindo os veículos pesados de mercadorias que eram propriedade da Requerida e nos quais transportava mercadorias por conta e no interesse desta.
4. O Requerente, no exercício das suas funções e por ordem da Requerida, realizava o denominado “serviço internacional”, transportando mercadorias maioritariamente para a França, Alemanha e Espanha.
5. No decorrer das viagens que o Requerente realizava, sob autoridade e direção da Requerida, estava obrigado a recolher e/ou entregar mercadorias em clientes desta, tendo o dever de supervisionar as cargas e/ou descargas da mercadoria que transportava.
6. Assim, numa viagem com destino àqueles países o Requerente efetuava, regra geral, cargas e descargas nos países por onde passava (nomeadamente Espanha e França) bem como no país de destino; o mesmo sucedia no regresso.
7. Cada viagem, dependendo do país de destino e do número de cargas e descargas de mercadorias que o autor realizava, demorava entre 7 a 8 dias.
8. Por vezes acontecia que o autor prestasse trabalho aos sábados, domingos e feriados.
9. No ano de 2019 a R. não pagou ao A. o subsídio nocturno no subsídio de férias, no valor de € 21,00.
10. Em 2020 o A. tinha direito a receber da R. o valor mensal de € 135,00 a título de ajuda de custo TIR, sendo que a R. apenas pagou ao A. a quantia mensal de € 130,00.
11. Em 2020 a R. não pagou ao A. o subsídio nocturno no subsídio de férias, no valor de € 70,00.
12. Em 2021 o A. tinha direito a receber da R. o valor mensal de € 135,00 a título de ajuda de custo TIR, sendo que a R. apenas pagou ao A. a quantia mensal de € 130,00.
13. Em 2021 a R. não pagou ao A. o subsídio nocturno no subsídio de férias, no valor de € 73,31.
14. Em 2022 a R. não pagou ao A. o subsídio nocturno no subsídio de férias, no valor de € 83,77.
15. Em Agosto de 2022, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 6, 13, 20, 21 e 27, que correspondiam a Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 272,00.
16. Em Setembro de 2022, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 17, 18 e 24, que correspondiam a Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este, pelo que lhe deve a quantia de € 166,98.
17. Em Outubro de 2022, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 5, 8, 9, 15, 23 e 29, que correspondiam a Feriado, Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 333,96.
18. Em Novembro de 2022, por ordem e determinação da R., o A. Esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 12, 13 e 26, que correspondiam a Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 166,98.
19. Em Dezembro de 2022, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 1, 3, 8, 17 e 18, que correspondiam a Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 278,30.
20. Em Janeiro de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 7, 14, 21, 22, 28 e 29, que correspondiam a Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 360,00.
21. Em Fevereiro de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 11, 18 e 21, que correspondiam a Feriado do dia de Carnaval, Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 180,00.
22. Em Março de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 4, 5, 11 e 25, que correspondiam a Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 240,00.
23. Em Abril de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 15, 16, 22 e 25, que correspondiam a Feriado, Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 240,00.
24. Em Maio de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 6, 7, 13, 14, 27 e 28, que correspondiam a Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 360,00.
25. Em Junho de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e/ou realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 3, 4, 8, 17 e 18, que correspondiam a Feriado, Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 300,00.
26. Em Julho de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 1, 2, 8, 9, 22, 23, 29 e 30, que correspondiam a Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 480,00.
27. Em 2023 a R. não pagou ao A. o subsídio nocturno e a remuneração da cláusula 46.º no subsídio de férias, no valor de € 104,11.
28. Em Agosto de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 5, 6, 15, 19 e 20, que correspondiam a Feriado, Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 280,00.
29. Em Setembro de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 16 e 17, que correspondiam a Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 120,00.
30. Em Outubro de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 5, 7, 8, 21, 22, 28 e 29, que correspondiam a Feriado, Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 420,00.
31. Em Novembro de 2023, por ordem e determinação da R., o A. Esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 16 e 17, que correspondiam a Feriado, Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 300,00.
32. Em Dezembro de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 1, 2 e 3, que correspondiam a Feriado, Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 180,00.
33. Em Janeiro de 2024, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 6, 7, 13, 20 e 21, que correspondiam a Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 322,50.
34. Em Fevereiro de 2024, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 3 e 4, que correspondiam a Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 129,00.
35. Em 8 de Fevereiro de 2024, e na sequência do que supra vem descrito, o A. deixou de prestar trabalho para a R..
36. Durante a relação laboral a R. nunca ministrou formação ao A. nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 130.º e seguintes do Código do Trabalho.
37. No mês de Fevereiro de 2024 a R. não pagou ao A. a remuneração pelo trabalho prestado e demais prestações devidas, no valor global de € 5.543,88.
38. Em Fevereiro de 2024 a Ré trabalhava com 4 camiões e era proprietária de 1 imóvel, local onde o autor se dirigia para ir buscar e deixar o veiculo que conduzia, constituindo o imóvel o local onde sairiam a maioria dos camiões incluindo os conduzidos pelo autor.
39. O imóvel referido em 38 situa-se em (…) e é composto por um armazém destinado a oficina e logradouro, com a área total de 1732,4m2, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo (…) e descrito na Conservatória do Registo Predial de Benavente sob o n.º (…).
40. A R. alienou o imóvel de que era proprietária em (…) à sociedade (…), Cargo, Lda. pelo preço de € 82.000,00 em 30-08-2024.
41. A sociedade (…), Cargo, Lda. tem como únicos sócios e gerentes (…) e (…), filhos do legal representante da aqui R..
42. Actualmente a R. não desenvolve qualquer atividade comercial.
43. O montante indicado em 40 foi utilizado para amortizar o empréstimo contraído para adquirir o imóvel e bem assim um empréstimo pessoal contraído para proceder a um pagamento relacionado com um acidente de trabalho.
44. O valor patrimonial do imóvel referido em 39 é de € 82.589,30.
45. No âmbito do processo 1697/22.6T8STR que correu termos nos Serviços do MP – Procuradoria do Juízo do Trabalho de Santarém, em 18-05-2023 a Ré foi condenada a pagar a (…) a quantia de € 16.995,80 e a quantia de € 8.563,95 o que fez em 24-07-2023.
46. Encontra-se pendente o processo com o n.º 1185/24.6T8TMR, a correr os seus termos no Juízo do Trabalho de Tomar, em que (…) peticiona o pagamento pela R. do pagamento de € 18.972,59 respeitante a créditos laborais, cuja petição inicial deu entrada em 02-08-2024”.

2.1.2. A decisão recorrida não considerou provados os seguintes factos:
a) A alienação do imóvel foi realizada em conluio entre o legal representante da R. e os filhos deste com vista a ocultar património que constitui garantia de satisfação dos credores, designadamente do crédito do aqui A.
b) Os legais representantes da sociedade (…), Cargo, Lda. sabiam que o aqui A. pretendia reclamar os seus créditos laborais ou não teria pedido os seus dados de cartão de condutor.
c) O Autor pediu a rescisão do contrato de trabalho em 23-11-2024 com efeitos a 09-02-2024”.

2.2. Objeto do recurso
2.2.1. Impugnação da decisão da matéria de facto
O artigo 607.º, n.º 5, do Código de Processo Civil (doravante, CPC) prevê que o Tribunal aprecia livremente as provas e fixa a matéria de facto em conformidade com a convicção que haja firmado acerca de cada facto controvertido, salvo se a lei exigir para a existência ou prova do facto jurídico qualquer formalidade especial, caso em que esta não pode ser dispensada.
Neste momento processual, há que considerar ainda o artigo 662.º do CPC, cujo n.º 1 prevê que “A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
A este propósito e para o que abaixo se decidirá, ter-se-á ainda em conta o que consta do sumário do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 7/09/2017 (Processo n.º 959/09.2TVLSB.L1.S1, relator Tomé Gomes), por elucidativo:
1. É hoje jurisprudência corrente, mormente do STJ, que a reapreciação, por parte do tribunal da 2.ª instância, da decisão de facto impugnada não se deve limitar à verificação da existência de erro notório, mas implica uma reapreciação do julgado sobre os pontos impugnados, em termos de formação, pelo tribunal de recurso, da sua própria convicção, em resultado do exame das provas produzidas e das que lhe for lícito ainda renovar ou produzir, para só, em face dessa convicção, decidir sobre a verificação ou não do erro invocado, mantendo ou alterando os juízos probatórios em causa.
2. No âmbito dessa apreciação, dispõe o Tribunal da Relação de margem suficiente para, com base na prova produzida, em função do que for alegado pelo impugnante e pela parte contrária, bem como da fundamentação do tribunal da 1.ª instância, ajustar o nível de argumentação probatória de modo a revelar os factores decisivos da reapreciação empreendida.
3. Todavia, a análise crítica da prova a que se refere o n.º 4 do artigo 607.º do CPC, mormente por parte do Tribunal da Relação, não significa que tenham de ser versados ou rebatidos, ponto por ponto, todos os argumentos do impugnante nem que tenha de ser efetuada uma argumentação exaustiva ou de pormenor de todo o material probatório. Afigura-se bastar que dessa análise se destaquem ou especifiquem os fundamentos que foram decisivos para a formação da convicção do tribunal”.

Por outro lado e recorrendo ao escrito por Abrantes Geraldes (in Recursos em Processo Civil, 8ª ed., 2024, págs. 228-9), há que considerar, para o que aqui importa decidir, que, quando uma parte, em sede de recurso, pretenda impugnar a matéria de facto nos termos do artigo 640.º, n.º 1, do CPC, impõe-se-lhe o ónus de:
a) (…) “indicar os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões”;
b) (…) “especificar, na motivação, os meios de prova, constantes do processo ou que nele tenham sido registados, que, no seu entender, determinem uma decisão diversa quanto a cada um dos factos”.
(…)
e) O recorrente deixará expressa, na motivação, a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, tendo em conta a apreciação crítica dos meios de prova produzidos, exigência que vem na linha do reforço do ónus de alegação, por forma a obviar à interposição de recursos de pendor genérico ou inconsequente”.
Tais ónus traduzem, como também refere Abrantes Geraldes, o “princípio da auto-responsabilidade das partes, impedindo que a impugnação da decisão da matéria de facto se transforme numa mera manifestação de inconsequente inconformismo”.
Neste contexto, verificadas as Alegações e Conclusões da Recorrente, conclui-se que as mesmas cumprem minimamente – em termos formais – o que impõe o citado artigo 640.º do CPC.
Assim, pretende a Recorrente a revogação ou alteração dos Factos 9, 11, 21, 25, 26, 28, 31, 32, 33 e 34, considerados provados pelo tribunal a quo.
Vejamos, então.
2.2.1.1. Ponto 9 dos factos provados: No ano de 2019 a R. não pagou ao A. o subsídio nocturno no subsídio de férias, no valor de € 21,00”.
Entende a Recorrente que esta factualidade deve ser retirada dos factos provados e, consequentemente, descontado o valor indicado da alegada dívida ao Requerente, porquanto este apenas foi admitido ao seu serviço no dia 2 de setembro de 2019, pelo que não teria direito ao recebimento do subsídio de férias, mas apenas dos respetivos proporcionais, para além do que dos recibos juntos aos autos não resulta que o pagamento não tenha sido efetuado.
Resulta do recibo de vencimento do Requerente do mês de setembro de 2019 que o mesmo recebeu € 60,90 de subsídio de trabalho nocturno; que em outubro, recebeu € 63,00 e que em dezembro recebeu € 63,00, tendo ainda neste mês recebido € 227,09 de subsídio de férias. No que diz respeito ao valor do vencimento, retira-se dos referidos recibos que o Requerente auferiu € 609,00 no mês de setembro e € 630,00 nos restantes.
A propósito destas questões e ouvida a reprodução da prova gravada, verifica-se que o Requerente prestou declarações vagas, não sabendo exatamente os valores que lhe eram devidos a título de cada uma das componentes do seu vencimento, nem sabendo interpretar os seus recibos de vencimento. Com efeito, declarou, por exemplo, que “vinha tudo em ajudas de custo” ou que os recibos não discriminavam os pagamentos pelo trabalho realizado em sábados, domingos e feriados – o que não corresponde à verdade, já que essa componente do vencimento encontra-se identificada por referência à cláusula correspondente do Contrato Colectivo de Trabalho estabelecido entre a Associação Nacional de Transportes Públicos Rodoviários de Mercadorias – ANTRAM e a Federação dos Sindicatos de Transportes e Comunicações – FECTRANS (publicado no BTE n.º 34, de 15/09/2018 e doravante designado CCT).
No que diz respeito ao facto concreto em apreciação, resulta dos referidos recibos de vencimento que, a partir do mês em que iniciou funções ao serviço da Recorrente, o Requerente recebeu o subsídio por trabalho nocturno em conformidade com o disposto na cláusula 48.º, n.º 3, do CCT, ou seja, em valor correspondente a 10% da remuneração base. De acordo com o n.º 3 desta cláusula, o subsídio em causa é devido por 13 meses.
Ora, conforme resulta do contrato de trabalho junto aos autos e constitui matéria assente, o Requerente iniciou a relação laboral com a Requerido em setembro de 2019, pelo que, nesse ano, tinha direito a receber o proporcional do subsídio de férias e do subsídio por trabalho nocturno.
E, de facto, recebeu.
Com efeito, do recibo de vencimento relativo ao mês de dezembro de 2019, resulta que recebeu € 227,09 a título de subsídio de férias. Ora, sendo, então, o seu vencimento de € 630,00 mensais, o valor proporcional do subsídio de férias seria de € 210,00 (€ 630,00/12 x 4).
Operando o mesmo raciocínio, o subsídio por trabalho nocturno seria de € 21,00, o que somado ao valor atrás indicado, apresenta o total de € 221,00.
Assim, se o Requerente recebeu o valor de € 227,09 a título de subsídio de férias, conclui-se que, efetivamente, o valor em causa foi devidamente pago. Aliás, ainda a este propósito, há que ter presentes as declarações do Requerente, que afirmou que sempre recebeu os valores inscritos nos recibos de vencimento.
Face ao exposto, conclui-se que, neste ponto, assiste razão à Recorrente, devendo, pois, excluir-se o ponto 9 dos factos provados.
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2.2.1.2. Ponto 11 dos factos provados: Em 2020 a R. não pagou ao A. o subsídio nocturno no subsídio de férias, no valor de € 70,00”.
Entende a Recorrente que esta factualidade não deve constar dos factos provados porque não resulta da prova produzida que este pagamento não tenha sido por si efetuado, pelo que deve o valor indicado ser descontado da dívida.
Resulta do recibo de vencimento do Requerente do mês de janeiro de 2020 que o mesmo recebeu € 51,33 de subsídio de trabalho nocturno e que nos meses de fevereiro, maio, junho, julho, agosto, setembro, outubro e dezembro recebeu € 70,00. Relativamente ao subsídio de férias, resulta do recibo de vencimento do mês de julho que lhe foram pagos € 700,00, ou seja, o valor correspondente ao salário mensal que então auferia.
Ora, tendo em conta o que atrás se expôs – aqui inteiramente aplicável – conclui-se que, no ano de 2020, não foi pago ao Requerente o valor correspondente ao 13º mês do subsídio por trabalho nocturno, pelo que o ponto 11 dos factos provados deve manter-se nos seus precisos termos.
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2.2.1.3. Ponto 21 dos factos provados: Em Fevereiro de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 11, 18 e 21, que correspondiam a Feriado do dia de Carnaval, Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 180,00”.
Entende a Recorrente que esta factualidade deve ser alterada, já que da prova produzida não resulta que o Requerente tenha efetuado qualquer hora de trabalho no dia 11 de fevereiro de 2023, pelo que deve ser descontado o valor indicado da alegada dívida ao Requerente.
Prevê a este propósito a cláusula 50ª do CCT, agora na versão constante do BTE n.º 5, de 8/02/2023, no n.º 1, que “O trabalho prestado em dias de descanso semanal, obrigatório ou complementar ou em feriado é pago em dobro do valor dia, independentemente do concreto número de horas de trabalho prestado”, dispondo o n.º 2, por seu turno, que “O pagamento mencionado no número anterior é também devido nos dias em que o trabalhador, quando deslocado fora do país de residência, não tenha prestado qualquer trabalho e tenha realizado apenas descanso diário e/ou semanal.”
Ora, dos registos de condutor juntos aos autos não resulta que o Requerente tenha exercido qualquer função na data em causa – 11 de Fevereiro – ou, sequer, que se encontrasse deslocado fora de Portugal.
Porém, a Recorrente não põe em causa que o Requerente tenha prestado serviço nas restantes datas – 18 e 21 de Fevereiro –, pelo que o valor em dívida deverá ser proporcionalmente alterado/reduzido para € 120,00.
Assim, o ponto 21 dos factos provados deverá ser alterado em conformidade com o exposto, passando a ter a seguinte redação:
Em Fevereiro de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 18 e 21, que correspondiam a Feriado do dia de Carnaval, Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 120,00”.
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2.2.1.4. Ponto 25 dos factos provados: Em Junho de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e/ou realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 3, 4, 8, 17 e 18, que correspondiam a Feriado, Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 300,00”.
Entende a Recorrente que esta factualidade deve ser alterada, já que da prova produzida não resulta que o Requerente tenha efetuado qualquer hora de trabalho nos dias 4 e 18 de Junho de 2023, pelo que deve ser descontado o valor indicado da alegada dívida ao Requerente.
Dos registos de condutor juntos aos autos não resulta que o Requerente tenha exercido qualquer função nas datas em causa – 4 e 18 de Junho – ou, sequer, que se encontrasse deslocado fora de Portugal.
Assim e seguindo o mesmo raciocínio atrás indicado, o valor em dívida deverá ser proporcionalmente alterado/reduzido para € 180,00.
Assim, o ponto 25 dos factos provados deverá ser alterado em conformidade com o exposto, passando a ter a seguinte redação:
Em Junho de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e/ou realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 3, 8 e 17, que correspondiam a Feriado, Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 180,00”.
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2.2.1.5. Ponto 26 dos factos provados: Em Julho de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 1, 2, 8, 9, 22, 23, 29 e 30, que correspondiam a Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 480,00”.
Entende a Recorrente que esta factualidade deve ser alterada, já que da prova produzida não resulta que o Requerente tenha efetuado qualquer hora de trabalho no dia 2 de Julho de 2023, pelo que deve ser descontado o valor indicado da alegada dívida ao Requerente.
Do registo de condutor do Requerente não consta que o mesmo tenha trabalhado no dia 2 de Julho ou, sequer, que se encontrasse deslocado fora de Portugal.
Assim e seguindo o mesmo raciocínio atrás indicado, o valor em dívida deverá ser proporcionalmente alterado/reduzido para € 420,00.
Assim, o ponto 26 dos factos provados deverá ser alterado em conformidade com o exposto, passando a ter a seguinte redação:
Em Julho de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 1,8, 9, 22, 23, 29 e 30, que correspondiam a Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 420,00”.
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2.2.1.6. Ponto 28 dos factos provados: Em Agosto de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 5, 6, 15, 19 e 20, que correspondiam a Feriado, Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 280,00”.
Entende a Recorrente que esta factualidade deve ser alterada, já que da prova produzida não resulta que o Requerente tenha efetuado qualquer hora de trabalho nos dias 5, 6, 19 e 20 de agosto de 2023, pelo que deve ser descontado o valor indicado da alegada dívida ao Requerente.
Do registo de condutor do Requerente não consta que o mesmo tenha trabalhado nas referidas datas. Para além disso, resulta ainda que nos períodos compreendidos entre 3 e 8 e entre 17 e 21 de Agosto, o Requerente permaneceu em Portugal, pelo que não é, sequer, aplicável a essas datas o disposto no nº 2 da cláusula 50º do CCT, acima transcrita.
Assim e seguindo o mesmo raciocínio atrás indicado, o valor em dívida deverá ser proporcionalmente alterado/reduzido para € 56,00.
Assim, o ponto 28 dos factos provados deverá ser alterado em conformidade com o exposto, passando a ter a seguinte redação:
Em Agosto de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta no dia 15 que correspondia a Feriado, não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 56,00”.
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2.2.1.7. Ponto 31 dos factos provados: Em Novembro de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 16 e 17, que correspondiam a Feriado, Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 300,00”.
Entende a Recorrente que esta factualidade deve ser alterada, já que da prova produzida não resulta que o Requerente tenha efetuado qualquer hora de trabalho nos dias 16 e 17 de Novembro de 2023 (os quais nem sequer são feriado, sábado, domingo ou dia de descanso semanal do Requerente), pelo que deve ser descontado o valor indicado da alegada dívida ao Requerente.
Do registo de condutor do Requerente não consta que o mesmo tenha trabalhado nos dias 16 e 17 de Novembro. Acresce que estas datas correspondem, respetivamente, a quinta e sexta-feira, pelo que não havia lugar ao pagamento do valor indicado, devendo, pois, excluir-se o ponto 31 dos factos provados.
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2.2.1.8. Ponto 32 dos factos provados: Em Dezembro de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 1, 2 e 3, que correspondiam a Feriado, Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 180,00”.
Entende a Recorrente que esta factualidade deve ser alterada, já que da prova produzida não resulta que o Requerente tenha efetuado qualquer hora de trabalho no dia 03 de Dezembro de 2023, pelo que deve ser descontado o valor indicado da alegada dívida ao Requerente.
Do registo de condutor do Requerente não consta que o mesmo tenha trabalhado no dia 03 de Dezembro ou, sequer, que se encontrasse deslocado fora de Portugal.
Assim e seguindo o mesmo raciocínio indicado em pontos anteriores, o valor em dívida deverá ser proporcionalmente alterado/reduzido para € 120,00.
Assim, o ponto 32 dos factos provados deverá ser alterado em conformidade com o exposto, passando a ter a seguinte redação:
Em Dezembro de 2023, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 1 e 2, que correspondiam a Feriado, Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 120,00”.
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2.2.1.9. Ponto 33 dos factos provados: Em Janeiro de 2024, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 6, 7, 13, 20 e 21, que correspondiam a Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 322,50”.
Entende a Recorrente que esta factualidade deve ser alterada, já que da prova produzida não resulta que o Requerente tenha efetuado qualquer hora de trabalho nos dias 7 e 21 de Janeiro de 2024, pelo que deve ser descontado o valor indicado da alegada dívida ao Requerente.
Do registo de condutor do Requerente não consta que o mesmo tenha trabalhado nos dias 7 e 21 de Janeiro de 2024 (domingos). Porém, do mesmo registo resulta que saiu de Portugal no dia 2 de Janeiro, que nos dias 4, 5 e 6 trabalhou em França, que nos dias 6 e 8 esteve na Bélgica, que nos dias 8, 9 e 10 esteve em França e que neste último dia passou pelo País Basco e regressou a Portugal.
Ora, tal confirma o declarado pelo Requerente quando, em sede de audiência de julgamento, esclareceu que, em média, estava ausente de Portugal por 7 a 9 dias seguidos (tendo-se dado como provado que tal ausência ocorria por períodos de 7/8 dias). Assim e considerando o previsto no n.º 2 da já citada cláusula 50.º do CCT, conclui-se que o ponto 33 dos factos provados deve manter-se, já que nas referidas datas e ainda que não tenha efetuado nenhuma hora de trabalho, o Requerente encontrava-se deslocado fora de Portugal, logo, era-lhe devida a retribuição correspondente ao trabalho em dias de descanso e feriados.
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2.2.1.10. Ponto 34 dos factos provados: Em Fevereiro de 2024, por ordem e determinação da R., o A. esteve deslocado no estrangeiro e realizou transporte de mercadorias por conta e no interesse desta nos dias 3 e 4, que correspondiam a Sábados e Domingos, dias de descanso semanal do A., não tendo a R. pago ao A. o trabalho prestado por este pelo que lhe deve a quantia de € 129,00”.
Entende a Recorrente que esta factualidade deve ser alterada, já que da prova produzida não resulta que o Requerente tenha efetuado qualquer hora de trabalho no dia 4 de Fevereiro, pelo que deve ser descontado o valor indicado da alegada dívida ao Requerente.
Do registo de condutor do Requerente resulta que o mesmo não trabalhou no dia 4 de Fevereiro, domingo. Porém, resulta do mesmo registo que, no dia 3, saiu de França às 5h01m e chegou ao destino, na Alemanha, às 14h15m, tendo saído deste país no dia 5, pelas 6h30m e chegado ao destino, na França, às 19h15m.
Desta análise e aplicando à mesma o raciocínio atrás exposto, resulta, pois, que o ponto 34 dos factos provados deve manter-se, já que ainda que no dia 4 de Fevereiro o Requerente não tenha efetuado nenhuma hora de trabalho, encontrava-se deslocado fora de Portugal, logo, é-lhe devida a retribuição correspondente ao trabalho em dias de descanso e feriados.

2.2.2 A declaração de insolvência da Recorrente
A Recorrente pôs em causa a decisão que julgou procedente o pedido formulado pelo Requerente e, em consequência, declarou a sua insolvência, como decorrência lógica do facto, alegado, de ser inferior o valor da sua dívida para com aquele.
E, objetivamente, assiste-lhe razão quanto a esta última premissa, já que, por via do que atrás se decidiu quanto à sua reclamação quanto à matéria de facto, é inferior o valor da dívida para com o Requerente: em vez de € 11.777,98, conforme mencionado na sentença em recurso, a Recorrente é devedora de € 10.932,98.
Há, pois, que decidir se tal alteração do valor do crédito do Requerente, para menos, é relevante ao ponto de determinar que outro seja o resultado da ação principal.
E, desde já, se avança que, em nosso entender, tal alteração em nada interfere com a declaração de insolvência ditada pelo tribunal a quo.
Com efeito, entendeu o tribunal a quo que a matéria de facto provada preenche a previsão da alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º do CIRE, lendo-se o seguinte na decisão posta em crise:
Considerando o alegado pela Requerente, cumpre atentar, desde logo, na alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa. Nos termos da alínea b) do citado preceito integra uma situação de insolvência a ‘Falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias
do incumprimento, revele a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações’.
Ora, compulsada a factualidade apurada, verifica-se que a Requerida deve ao Requerente o montante de € 11.777,98. A requerida não exerce qualquer atividade e não
possui qualquer património, podendo ainda vir ter que pagar o montante de € 18.972,59 respeitante a créditos laborais no âmbito do processo com o n.º 1185/24.6T8TMR, a correr os seus termos no Juízo do Trabalho de Tomar.
Tais factos permitem considerar que o incumprimento desta obrigação revela a impossibilidade da Requerida satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações.
Pelo exposto, encontra-se verificado o facto presuntivo da situação de insolvência, previsto no citado artigo 20.º, n.º 1, alínea b), do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, pelo que se impõe declarar que se encontra verificada uma situação de insolvência”.
Assim, considera-se em situação de insolvência, nos termos previstos no n.º 1 do artigo 3.º do CIRE, o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas.
O artigo 20.º, n.º 1, do CIRE, por seu turno, confere a diversos sujeitos, designadamente aos credores, legitimidade para requererem a declaração de insolvência do devedor, desde que se verifique alguma das situações elencadas nas suas diversas alíneas, a saber:
a) Suspensão generalizada do pagamento das obrigações vencidas;
b) Falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações;
c) Fuga do titular da empresa ou dos administradores do devedor ou abandono do local em que a empresa tem a sede ou exerce a sua principal atividade, relacionados com a falta de solvabilidade do devedor e sem designação de substituto idóneo;
d) Dissipação, abandono, liquidação apressada ou ruinosa de bens e constituição fictícia de créditos;
e) Insuficiência de bens penhoráveis para pagamento do crédito do exequente verificada em processo executivo movido contra o devedor;
f) Incumprimento de obrigações previstas em plano de insolvência ou em plano de pagamentos, nas condições previstas na alínea a) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 218.º;
g) Incumprimento generalizado, nos últimos seis meses, de dívidas de algum dos seguintes tipos:
i) Tributárias;
ii) De contribuições e quotizações para a segurança social;
iii) Dívidas emergentes de contrato de trabalho, ou da violação ou cessação deste contrato;
iv) Rendas de qualquer tipo de locação, incluindo financeira, prestações do preço da compra ou de empréstimo garantido pela respetiva hipoteca, relativamente a local em que o devedor realize a sua atividade ou tenha a sua sede ou residência;
h) Sendo o devedor uma das entidades referidas no n.º 2 do artigo 3.º, manifesta superioridade do passivo sobre o ativo segundo o último balanço aprovado, ou atraso superior a nove meses na aprovação e depósito das contas, se a tanto estiver legalmente obrigado.
Dispõe, por outro lado, o artigo 30.º do citado código, no n.º 1, que o devedor pode, no prazo de 10 dias, deduzir oposição, a qual, nos termos do n.º 3, pode basear-se na inexistência do facto em que se fundamenta o pedido formulado ou na inexistência da situação de insolvência, prevendo o n.º 4 que cabe ao devedor provar a sua solvência.
Ora, da análise conjugada das citadas normas resulta que as circunstâncias previstas nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 20.º constituem factos que indiciam a situação de insolvência, nos termos descritos no n.º 1 do artigo 3.º. Tratam-se, pois, de factos-índice ou presuntivos da insolvência, que têm por base regras de experiência da vida, traduzidas na insusceptibilidade de o devedor cumprir as suas obrigações.
Escreve, a este propósito, Catarina Serra (in Lições de Direito da Insolvência, Coimbra, Almedina, 2018, pág. 120) o seguinte: “Tais factos são indícios ou sintomas da situação de insolvência (factos-índice). É através deles que, normalmente, a situação de insolvência se manifesta ou se exterioriza. Por isso, a verificação de qualquer um deles permite presumir a situação de insolvência do devedor e é condição necessária para a iniciativa processual dos responsáveis legais pelas dívidas do devedor, dos credores e do Ministério Público.” Acrescenta a mesma autora (loc. cit.) que “a enumeração é taxativa, o que significa que a verificação de, pelo menos, um deles é condição necessária para a acção dos credores, dos responsáveis legais pelas dívidas do devedor ou do Ministério Público”.
No caso presente, tendo a insolvência sido requerida por um credor, incumbia-lhe o ónus da prova da verificação da previsão de uma das alíneas do n.º 1 do citado artigo 20.º, cabendo à devedora ilidir a presunção daí decorrente, mediante a demonstração da respetiva solvência.
Como se referiu, entendeu o tribunal a quo que a matéria de facto provada permite considerar verificada a previsão da alínea b) do n.º 1 do mencionado artigo 20.º (“Falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações”).
E assiste-lhe razão.
Interpretando o sentido desta alínea b) do artigo 20.º, escreve Luís Menezes Leitão (Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 11.ª edição, Coimbra, Almedina, 2021, pág. 104) que “a alínea b) se refere ao incumprimento de apenas uma ou várias obrigações, do qual se possa, porém, inferir a impossibilidade de o devedor satisfazer a generalidade dos seus compromissos”.
No caso presente, encontra-se demonstrada a titularidade pelo Requerente de um crédito sobre a Recorrente no montante de, pelo menos, € 10.932,98, acrescido de juros.
Trata-se de um crédito decorrente da relação contratual laboral estabelecida entre ambas as partes e reporta-se ao não pagamento de vencimento e complementos do mesmo, vencidos até 08 de Fevereiro de 2024, altura em que cessou aquela relação.
Por outro lado, provou-se que a Recorrente, aquela data proprietária de um imóvel com valor patrimonial que rondava os € 82.000,00, alienou este bem em agosto do mesmo ano (a uma sociedade de que eram sócios e gerentes os filhos do seu representante legal) por aquele valor, que utilizou para o pagamento de créditos. Para além disso, deu-se ainda como provado que, atualmente, não é detentora de património, que não desenvolve qualquer atividade comercial e que se encontra pendente no Tribunal de Trabalho de Tomar uma ação em que poderá vir a ser condenada no pagamento de cerca de € 19.000,00, por créditos laborais.
Ora, constituindo o objeto de atividade da Recorrente, designadamente, o transporte de mercadorias, não sendo detentora de património, encontrando-se inativa e não tendo saldado, até ao momento, a dívida ao Requerente, seu ex-trabalhador (a qual, aliás, não pôs em causa na totalidade), é de presumir que se encontra impossibilitada de satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações, já que, como se escreve na sentença recorrida, “não resulta dos autos a existência de liquidez da massa insolvente”, o que permite considerar preenchida a situação prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º.
Para além disso, cabendo à Recorrente ilidir tal presunção e não tendo demonstrado a respetiva solvência, mostra-se acertada a decisão recorrida, ao declarar a sua insolvência.
Improcede, assim, a apelação, devendo confirmar-se a decisão recorrida.

3. DECISÃO
Nestes termos, acorda-se em julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar a decisão recorrida.
Custas pela Recorrente.
Notifique.
*
Évora, 02 de Outubro de 2025
(Acórdão assinado digitalmente)
Anabela Raimundo Fialho (Relatora)
Mário João Canelas Brás (1º Adjunto)
Isabel de Matos Peixoto Imaginário (2ª Adjunta)