Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | TOMÉ DE CARVALHO | ||
Descritores: | REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS VIOLÊNCIA DOMÉSTICA | ||
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Data do Acordão: | 04/01/2019 | ||
Votação: | DECISÃO SINGULAR | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | O superior interesse da criança surge como um objectivo a prosseguir por todos quantos possam contribuir para o desenvolvimento harmonioso da criança e a ele se mostram adstritos com particular acuidade os pais e o Estado, os primeiros no desenvolvimento do seu papel liderante na condução, sustento e educação dos menores e o segundo que deve contribuir para a efectiva concretização dos seus direitos. (Sumário do Relator) | ||
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Decisão Texto Integral: | Processo nº 155/18.8T8BJA-E.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Beja – Juízo de Família e Menores de Beja – J1 * Recurso com efeito e regime de subida adequados. * Decisão nos termos dos artigos 652º, nº 1, al. c) e 656º do Código de Processo Civil: * I – Relatório: Nos presentes autos de Regulação das Responsabilidades Parentais de (…), em que é requerente o Ministério Público e requeridos os progenitores (…) e (…), o pai não se conformou com a decisão provisória proferida no processo. * No âmbito deste processo foi designada data para a conferência de pais, onde não foi possível a obtenção de acordo, uma vez que ambos os progenitores pretendiam a guarda do filho. * Foi fixado um regime provisório. * Os autos prosseguiram para audição técnica especializada e, após a realização desta, foi designada nova conferência de pais. Mais uma vez, não foi possível obter o acordo dos progenitores. * Nessa sequência, foi alterada a decisão provisória, a qual passou a ter o seguinte conteúdo: · O menor mantém-se confiado provisoriamente à guarda e cuidados da mãe, sendo as responsabilidades parentais, nas questões de particular importância, exercidas por ambos os progenitores, incumbindo à mãe as questões relacionadas com a saúde e educação. · O pai pagará a título de pensão de alimentos a favor do filho (…) a quantia de 120,00 euros mensais. A pensão de alimentos deverá ser paga por transferência bancária, depósito em conta ou vale postal, até ao dia 8 do mês a que respeite. · O pai poderá estar e conviver com o menor, todos os fins-de-semana, à excepção do primeiro de cada mês que caberá à mãe. i) Para o efeito o pai irá buscar o filho à localidade onde a mãe reside, devendo a entrega ser feita no Posto Territorial da GNR de Oliveira do Hospital, e na presença de um militar daquela força policial, às sextas-feiras, pelas 18h. ii) Caberá à mãe ir buscar o filho à localidade onde o pai reside, devendo a entrega ser feita na PSP de Odivelas, e na presença de um elemento daquela força policial, aos Domingos, pelas 18h. * Inconformado com tal decisão, o recorrente apresentou recurso de apelação e as alegações continham as seguintes conclusões, as quais são manifestamente desproporcionadas à extensão e complexidade da causa e à respectiva relação com o corpo das alegações [1] [2] [3]: «A. Na sequência de decisão proferida pelo Tribunal “a quo” em 09/10/2018 foi fixado regime de responsabilidades parentais sem qualquer fundamentação, pelo que recorreu o pai para o Tribunal da Relação de Évora. B. Tal recurso mereceu provimento pelo Tribunal “ad quem”, que decidiu anular a decisão recorrida, decretando dever ser a mesma substituída por outra, devidamente fundamentada. C. Contudo, a nova decisão da primeira instância, proferida a 04/02/2019 foi, salvo melhor entendimento, desde logo insuficientemente fundamentada, embora ligeiramente mais que a anterior. D. Mas, em matéria de facto, continua a não assentar matéria que justifique aceitar a deslocalização da mãe para um local tão distante e – do ponto de vista dos autos – tão desconhecido como é o caso de Oliveira do Hospital. E. Porquê Oliveira do Hospital? F. Que condições ali existem para acolher esta criança que, sequestrada pela sua mãe, é transportada para tão longe? G. Apenas por conformismo e por – com todo o respeito – alguma inércia dando cobertura a uma situação ilegal, desde o início, aceitando, conformando-se – por pura permissividade – sem qualquer base silogística ou raciocínio judiciário – o que estava incorreto. H. Foi aceite a unilateral mudança de residência da criança mediante simples despacho, sem fundamentação legal. I. A progenitora decidiu sobre a mudança de residência do menor, geograficamente significante, sem qualquer consentimento do pai ou do Tribunal. J. À revelia da lei e dos direitos da criança e do pai. Baseada na sua soberana vontade. K. Limitou-se a comunicar ao Tribunal, embora estivesse sujeita a medida provisória, a sua decisão, ao desabrigo de qualquer despacho judicial. L. Assim surge validado o comportamento da mãe que deslocaliza a criança, decretando o Tribunal a quo a fixação de residência da criança em condições absolutamente desconhecidas do Tribunal recorrido. M. Tomada pois, com base em erro de julgamento, na medida em que o Tribunal “a quo” apreciou de forma deficiente, decidindo em sentido contrário àquele que a factualidade provada faria presumir. N. A decisão assentou num evidente erro na apreciação dos elementos e em pressupostos de facto que não correspondem à verdade. O. Ora, decidiu o douto Tribunal manter a decisão tomada anteriormente, permanecendo a criança a residir com a mãe. P. Constam, não só dos autos como da factualidade indiciada, que o ambiente normal e centro de vida da criança é em Loures. Q. Inexiste a mínima referência às condições existentes para esta criança em Oliveira do Hospital. R. Em Loures tinha o (…) a sua casa, raízes, memórias e a sua família mais próxima, como sendo designadamente, o pai, os irmãos e os avós paternos, e onde residiu até 7/11/2017, momento em que a mãe, por sua única vontade e de forma injustificada, decidiu deslocalizá-lo para Beja – o que resulta da factualidade assente. S. Resulta também que, após ter saído de casa, a mãe privou (injustificadamente) a criança de convívios com o pai durante seis meses! T. Mais, após a autonomização da casa abrigo, a mãe deslocalizou a criança para Oliveira do Hospital, com base na sua vontade soberana de mãe, sem conhecimento ou consentimento do pai, nem do Tribunal, ao qual se limitou a informar, posteriormente. U. Ignorando o regime de regulação das responsabilidades parentais existente, em grave incumprimento do mesmo. V. E o Tribunal a “a quo”, nada opôs à deslocação da criança, não tomou qualquer decisão, dando por omissão aceitação e conformismo quanto a aceitar o reprovável e ilegal comportamento da mãe e, em decisão proferida em 09/10/2018, fixa a residência da criança com a mãe. W. Sem fundamento de facto ou de direito corroborou e validou a posição adoptada pela mãe, legitimando uma conduta ilegal e gravemente atentatória dos interesses da criança. X. Decisão que o Tribunal entendeu manter na decisão ora recorrida, com o mesmo erro de julgamento, designadamente por ignorar parte da prova produzida nos autos, e por errar na apreciação da parte remanescente. Y. Na verdade, ante toda a prova produzida e factualidade vertida no despacho, a decisão devia ter sido outra completamente diferente da proferida, o que sempre constituirá nulidade da decisão. Z. O pai alegou e comprovou que sobre a progenitora foram apresentados procedimentos criminais pelo progenitor onde aquela incorre na prática dos crimes de violência doméstica e maus tratos sobre a criança e subtração do menor e, bem ainda, evidente alienação parental em relação ao pai. AA. Encontra-se adquirida factualidade de violência doméstica – psicológica, emocional relativamente à progenitora maus tratos psicológicos em relação à privação de convívios, com associação a problemas do foro psicológicos documentados. BB. Contudo, o Tribunal “a quo” fez tábua rasa da alegação e provas oferecidas pelo pai, e considerou que “é manifesta o litígio entre os progenitores”, nivelando e tomando por igual, aquilo que nos autos se apura ser completamente diferente nas posições de um e de outro. CC. A mãe dissimuladamente conseguiu subtrair a criança ao convívio do pai, mediante um expediente inteligente, e que decidiu egoisticamente sem pré-aviso, com base em acusações falsas, que alega mas não prova, ora veja-se alegações n.º 74 a 78. DD. Pelo contrário, o pai não conflitua com a mãe, nunca demonstrou animosidade nem litígio, nem toma o filho como “objecto de guerrilha”, o que seria de todo o modo impossível, pois recorde-se, este pai esteve mais de seis meses sem ver nem ouvir a criança. EE. Limitou-se, isso sim, a tentar evitar pelas vias legais e adequadas, em estrito cumprimento da lei, que a criança ficasse privada de convívios, “para que não se perca o vínculo que existe entre pai e filho”, consoante requerimento ditado para a acta em 15/02/2018. FF. Os comportamentos são completamente diferentes pois o progenitor prejudicado pediu a reposição dos convívios da criança para reduzir o impacto da separação no menino e a progenitora afasta a criança, destruindo vínculos e memórias. GG. Contudo, o Tribunal “a quo” tomou por boa a alegação da mãe, sem provas e assente em factos que não correspondem à verdade, o que resulta claramente da decisão recorrida ao considerar liminarmente – ainda que sem provas – que “a separação dos requeridos foi motivada por questões relacionadas com violência doméstica”. HH. E com base em pressupostos errados, em elementos que apreciou de forma insuficiente e deficiente, não foram tidos em conta questões essenciais, como fosse aferir, em fase de instrução (ao abrigo do art.º 21.º RGPTC), se o comportamento da recorrida é tendencialmente perigoso e possivelmente concretizador de manipulação dos sentimentos do menor de modo a promover a alienação parental do recorrente. II. Nos processos de jurisdição voluntária, o Tribunal pode investigar livremente os factos, recolher as provas, ordenar os inquéritos e recolher as informações, servindo-se dos meios de prova que considere convenientes, e por outro lado deve o julgador aceitar os pedidos de a realização de prova necessária, sendo que, não o fazendo preterido fica o disposto no art. 205.º da CRP. JJ. Para além de que não respeitou os princípios orientadores do RGPTC constam do artigo 4º daquele diploma, o qual nos remete para o artigo 3º, n.º 2, alínea f), da LPCJP – o que é ilegal. KK. Com as condutas adoptadas desrespeitou ainda de forma gravosa o preceituado nos artigos 36.º/6 e 205.º, todos da CRP, art.º 1906.º, 1882.º e 1887.º, todos do Código Civil e, acatando tal atitude, o Tribunal recorrido demitiu-se de exercer a sua função e demonstra-se complacente com o comportamento reprovável da progenitora. LL. Sobretudo, porque habita esta criança supostamente em Oliveira do Hospital, em local completamente desconhecido, desconhecendo-se também quais as condições, designadamente de habitabilidade, socio-económicas e familiares em que vive. MM. Desconhece-se, porque o Tribunal não indagou. Pois preferiu ignorar, e decidir com base numa consideração abstracta, com base em pressupostos errados e falsos, que tomou por assentes. NN. Mais, os factos indiciados foram – salvo melhor entendimento – incorretamente valorados, na medida em que não existe nos presentes autos, qualquer justificação ou referência mínima que seja desfavorável relativamente aos procedimentos, práticas, competências parentais ou vínculo positivo afectivo entre a criança e o seu pai, consoante alegado supra, em alegação n.º 109 a 117. OO. Pelo contrário, resultou provado que o pai é preocupado, cuidador, afetuoso, cumpridor, que gosta do filho e que este gosta do pai, existindo entre eles forte vínculo e afetividade. PP. E que existem ainda, fortes ligações a afetividade entre a criança e os restantes familiares, designadamente irmãos e avós paternos. QQ. Que o seio de vida normal do (…), onde nasceu, viveu, tem casa e família alargada, é em Loures, e ainda assim, decide o Tribunal “a quo” manter a criança deslocalizada, longe do pai, da família paterna e do ambiente onde nasceu. RR. O Tribunal “a quo”, embora haja considerada provada a factualidade supra descrita, na formação da sua convicção, o Tribunal não a considerou devidamente – ou fê-lo de forma insuficiente e deficiente, pois decidiu em sentido inverso – mantendo o filho afastado do pai. SS. Entende o Tribunal que deve “acima de tudo assegurar-se a manutenção da estabilidade emocional e afectiva do filho, sendo o critério adoptado o da relevância da continuidade das relações da criança”. TT. Mas não tem esse mesmo critério em conta quando mantém uma criança tão pequena deslocalizada, longe do seu ambiente e das suas relações familiares, sujeita a viagens intermináveis de ida e volta (aproximadamente 550 km), para poder estar um fim de semana com aqueles que ama. UU. O que em nada contribui para a “estabilidade emocional e afectiva da criança”, nem para a “continuidade das relações” da mesma. Pugna o douto Tribunal por um entendimento que não segue! VV. Por aplicação do referido critério, e bem assim, de toda a factualidade assente e supra descrita, ao decidir como decidiu na decisão ora recorrida, agiu o Tribunal “a quo” com erro de julgamento, na medida em que não valorou, ou valorou de forma insuficiente e deficiente, a prova produzida, e decidiu contraditoriamente aos factos que deu por assentes. WW. Existindo erro de julgamento, e contradição entre os fundamentos e a decisão, deve a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra com fundamento ainda no disposto na alínea c) do nº 2 do artigo 662º do C.P.C., por violação, entre outros do disposto no nº 1, nº 5 e nº 7 do artigo 1906º, do Código Civil, bem como do art. 615.º, n.º 1, alínea c), do CPC. Nestes termos e no mais de direito que V. Exa., Venerando Desembargador Relator doutamente suprirá, deve o presente recurso merecer provimento, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-se por outro que respeite as especificidades do presente caso e atribua a residência do menor (…) com o seu pai ora requerente/recorrente, e família deste, assegurando-se um regime de convívio alargado com a progenitora». * A recorrida contra-alegou manifestando posição no sentido da não alteração da decisão. * O Ministério Público pronunciou-se no sentido da manutenção da decisão recorrida. * Admitido o recurso, foram observados os vistos legais. * II – Objecto do recurso: É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do tribunal ad quem (artigo 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do NCPC), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608º, nº 2, ex vi do artigo 663º, nº 2, do NCPC). Analisadas as alegações de recurso o thema decidendum está circunscrito à apreciação da existência de: a) nulidade prevista na al. c) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil e da necessidade de anulação da decisão facto. b) erro no que concerne à fixação do regime provisório da regulamentação das responsabilidades parentais do menor. * III – Dos factos apurados: Com interesse para a decisão da regulação do exercício das responsabilidades parentais, consideram-se provados os seguintes factos: 1) Os requeridos contraíram casamento, sem convenção antenupcial, em 17/07/2015. 2) Os requeridos viviam na casa de morada de família na Rua (…), Lote 18, 4.º andar direito, em (…). 3) O menor (…) nasceu em 06/05/2016, na freguesia e município de Loures e é filho dos requeridos. 4) Os presentes autos deram entrada em 13/11/2017 no Tribunal de Família e Menores de Loures, sendo o menor (…), nascido em 6 de Maio de 2016, representado pelo Ministério Público. 5) Foi realizada conferência de pais, onde foram tomadas declarações a ambos. 6) Os autos prosseguiram, tendo sido proferida decisão de incompetência territorial pelo Tribunal de Loures e os mesmos remetidos ao Juízo de Família e Menores de Beja, em virtude de se ter considerado que a criança desde 8 de Novembro de 2017 tinha residência na casa abrigo onde a mãe se encontrava acolhida. 7) Foi novamente marcada conferência de pais, tendo sido concomitantemente solicitada informação sobre os processos-crime pendentes entre os progenitores. 8) Os requeridos encontram-se separados desde data não concretamente apurada, mas situada no passado mês de Novembro de 2017. 9) A separação dos requeridos foi motivada por questões relacionadas com violência doméstica, cujos factos se encontram em investigação e outros a aguardar a fase de instrução. 10) Na sequência dos factos que motivaram a separação a progenitora foi acolhida numa casa abrigo, onde se viveu até Outubro de 2018, com o filho menor do casal. 11) Desde a data da separação e até 23 de Maio de 2018 o progenitor não teve qualquer contacto com o filho. 12) Na Conferência de Pais realizada a 9 de Maio de 2018 não foi possível obter o acordo dos progenitores. * 13) Por despacho de 10 de Maio de 2018 foi fixado regime provisório de regulação das responsabilidades parentais onde se decidiu que: «Em conformidade com todo o exposto, ao abrigo das citadas disposições normativas, fixo o regime provisório do exercício das responsabilidades parentais relativo ao menor (…) nos seguintes termos: 1.º O menor fica confiado provisoriamente à guarda e cuidados da mãe, sendo as responsabilidades parentais, nas questões de particular importância, exercidas por ambos os progenitores, incumbindo à mãe as questões relacionadas com a saúde, educação; 2.º O pai poderá estar e conviver com o menor, um dia por semana, em local e horário a definir pela EMAT, em visitas supervisionadas, de modo a permitir ao Tribunal a recolha de elementos com vista ao ampliamento dos contactos; O regime de convívios assim definido vigorará durante dois meses, devendo ser remetidas aos autos, de forma expedita (e-mail), informações quinzenais, que de forma sucinta relatem o decorrer dos convívios. O cumprimento deste regime de vistas contará com a colaboração da EMAT e da Casa Abrigo onde a progenitora se encontra acolhida. * O regime provisório será alterado antes do trânsito em julgado da sentença, em face das informações e elementos entretanto obtidos, e em face de eventuais situações de incumprimento, se tal for necessário para salvaguarda dos interesses do menor, advertindo-se uma vez mais e expressamente ambos os progenitores de que o normal funcionamento deste regime será considerado para a determinação da guarda definitiva, designadamente para aferir qual dos progenitores conseguirá manter uma relação de proximidade do filho com eles, promovendo e aceitando acordos ou tomando decisões que favoreçam amplas oportunidades de contacto com ambos e com os ascendentes ou família alargada e de partilha de responsabilidade entre eles». * 14) A supervisão/monitorização das visitas iniciou-se dia 23/05/2018 tendo o progenitor cumprido, na íntegra, os dias/horários previamente agendados. 15) Na primeira visita que ocorreu em 23 de Maio de 2018, e depois de seis meses de separação, o (…), após um momento inicial de apreensão, rapidamente se ambientou ao progenitor e ao espaço onde decorreram as visitas. 16) O (...) deu resposta positiva às brincadeiras desenvolvidas pelo pai e não revelou qualquer tensão. 17) Pontualmente a criança perguntava pela mãe, mas rapidamente retomava as brincadeiras. 18) A avó paterna compareceu posteriormente, tendo o (…) reagido bem à sua presença. 19) Na segunda visita em 30 de Maio 2018, o progenitor e a avó paterna compareceram à hora marcada tendo o menor interagido uma vez mais positivamente com ambos. O progenitor manteve sempre uma postura calma e trocou beijinhos com o filho. 20) Na segunda visita, o (…) revelou uma comunicação mais fluída com o pai. 21) Na terceira visita, em 6 de Junho de 2018, compareceu o pai, com os avós paternos, tendo o menor reagido positivamente às brincadeiras. 22) Na quarta visita, em 13 de Junho de 2018, compareceram o pai e a avó paterna, tendo sido observado um ambiente saudável e afectivo, com troca de beijinhos. Algumas vezes o menor perguntou pela mãe, mas continuava a brincar sem choros. 23) Na quinta visita, em 19 de Junho de 2018, compareceu o pai, a avó paterna e o irmão (…), tendo o (…) reagido, uma vez mais, positivamente e sem revelar qualquer comportamento negativo. 24) Em todas as visitas o pai trouxe lanche e produtos de higiene (sem que tal lhe tivesse sido solicitado) para o filho, por forma a responder a eventuais necessidades. 25) Na visita de 29 de Junho de 2018 compareceram o pai, a avó paterna, e o irmão (…), e o (…) mostrou-se muito receptivo à presença dos familiares com quem brincou, sem quaisquer constrangimentos. 26) Na visita de 4 de Julho de 2018 estiveram presentes o pai, os avós paternos, e o irmão (…), e uma vez mais manteve-se o padrão comportamental/relacional, salientando-se que o (…) está mais expressivo na fala e na interacção com os membros da família. 27) Na visita de 10 de Julho de 2018 estiveram presentes o pai, a avó paterna e o irmão (…), continuando a observar-se espontaneidade na relação/interacção entre a criança e o pai e entre os restantes familiares presentes. 28) Ao longo do processo avaliativo nunca foram observados quaisquer constrangimentos no que se refere aos contactos presenciais entre o (…) e o pai e restantes familiares que estiveram presentes. 29) O (…) é uma criança muito sociável, empática e de fácil trato no contacto com os adultos. 30) No decorrer das visitas, nunca o (…) mostrou sinais de rejeição à presença do pai, dos avós ou do irmão (…). 31) Por vezes o (…) perguntava pela mãe, mas depressa se concentrava em dar seguimento às brincadeiras, sem zangas ou choros. 32) Foi sempre o pai que deu lanche ao filho e que lhe mudou a fralda. 33) Verificou-se existirem consistentes laços afectivos entre a criança e os elementos da família paterna que compareceram nas visitas, sem necessidade de supervisionamento das visitas. 34) A progenitora viveu em contexto institucional (casa abrigo) juntamente com o filho, durante onze meses, não tendo sido reportado quer pela casa abrigo, quer pelo equipamento escolar frequentado pela criança, quaisquer fragilidades pessoais e/ou parentais que de alguma forma pudessem comprometer o desenvolvimento/crescimento integral da criança. 35) Existe uma sólida relação afectiva, de proximidade e cumplicidade entre mãe e filho, e vice-versa. 36) A progenitora preocupa-se em satisfazer, diariamente, as necessidades básicas materiais, afectivas e de conforto do (…). 37) Existem manifestações de afecto constantes entre mãe e filho. 38) A progenitora sabe gerir o quotidiano do filho, apresenta um discurso adequado e atende às prioridades da criança. 39) A progenitora beneficia de acompanhamento psicoterapêutico que se iniciou por sinalização da Equipa de Prevenção da Violência em Adultos, na sequência de suposta violência doméstica por ela experienciada. 40) A progenitora ausentou-se da casa abrigo, iniciando o processo de autonomização, estabelecendo residência em Oliveira do Hospital, desde o dia 9 de Outubro de 2018. * IV – Fundamentação: 4.1 – Nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão: É nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou quando ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que a torne ininteligível (artigo 615º, nº 1, al. c), do Código de Processo Civil). A este propósito, Alberto dos Reis refere «dois tipos de sentença viciada: a sentença injusta e a sentença nula. A primeira enferma de erro de julgamento; a segunda enferma de erro de actividade (erro de construção ou formação»[4]. Entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica: se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correcta, a nulidade verifica-se. A oposição entre os fundamentos e a decisão tem o seu correspondente na contradição entre o pedido e a causa de pedir, geradora de ineptidão da petição inicial[5]. Na concepção de Antunes Varela «não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro de construção do silogismo judiciário»[6]. A nossa lei impõe que o silogismo da decisão se ache correctamente estruturado por forma a que a conclusão extraída corresponda às premissas de que ele emerge e a desconformidade não está no conteúdo destas mas no processo lógico desenvolvido. E essa oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta, pois quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento. Se, ao invés, ocorrer a assinalada desconformidade, a decisão é nula por contradição entre a fundamentação lavrada e o segmento decisório[7] [8]. Está sedimentada na doutrina e na jurisprudência a ideia de que esta nulidade se verifica quando existe um vício real no raciocínio do julgador, na medida em que a fundamentação aponta num sentido e a decisão segue direcção distinta. Em síntese, a nulidade da sentença, por oposição entre os fundamentos e a decisão, só acontece quando aqueles conduzirem a uma decisão diferente. Analisada a estrutura da decisão e as conexões existentes entre os motivos de facto e de direito a que faz apelo e o veredicto final verifica-se que existe uma lógica na arquitectura da sentença e, dessa forma, a invocada nulidade não se verifica. Aliás, no conjunto de factos, considerações e conclusões tiradas pelo recorrente parece incontroverso que o mesmo não coloca em causa o erro de construção do silogismo judiciário mas antes se dirige claramente à injustiça do decidido, embora tenha invocado a aludida nulidade. Se a interpretação e a relevância que a sentença deu a certos factos e se a conclusão que deles se extraiu foram, ou não, as mais correctas, é questão que tem a ver com o mérito da decisão e com um eventual erro de julgamento, mas que não está associada à construção lógica da sentença, a qual se mostra correctamente formulada. Assim sendo, também carece de fundamento a arguição efectuada ao abrigo do disposto na alínea c) do nº 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil. * 4.2 – Nulidade por falta de elementos da decisão de facto: Em associação com esta nulidade, o recorrente pretende ainda anular a decisão proferida na 1.ª instância, por não constarem do processo todos os elementos que permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto ou por se reputar deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto. E não assiste aqui de novo razão ao recorrente. Com efeito, estamos perante uma decisão provisória e a mesma não tem o grau de exigência de apuramento fáctico proposto pelo recorrente. Na decisão provisória visa-se a antecipada protecção e efectivação dos direitos do menor. Esta decisão é de natureza provisória e cautelar, «mas a sua emissão não está, de modo algum, dependente da formulação de um juízo prévio de oportunidade e conveniência (…) cabendo ao juiz nas circunstâncias aí enunciadas e socorrendo-se dos elementos que disponha, independentemente da sua exuberância ou exiguidade, proferir decisão provisória sobre o pedido de regulação do exercício das responsabilidades parentais»[9]. Na interpretação prevalecente do artigo 38º do Regime Geral do Processo Tutelar Civil, os Tribunais Superiores apontam que o julgador não tem de aguardar por quaisquer diligências de prova nem pela audição dos técnicos especializados, pois trata-se de uma decisão que visa proteger os interesses do menor e que deve ser orientada por critérios de razoabilidade, bom senso, prudência e moderação[10]. Trata-se de um juízo meramente perfunctório, transitório e temporário[11], sendo que, no itinerário procedimental estabelecido na lei, antecede a fase de produção de prova provisionada no artigo 39º do Regime Geral do Processo Tutelar Civil. Apenas nos termos posteriores à fase de audição técnica especializada e mediação, é que o julgador, confrontado com a ausência de acordo, uma vez realizadas todas as diligências probatórias consideradas necessárias à concreta determinação da solução, formula um juízo completo, aprofundado e finalizado relativo às razões de facto e de direito, que justificam a regulamentação do exercício das responsabilidades parentais. A audição técnica especializada serve o duplo propósito de enriquecer e agilizar a instrução, trazendo ao Tribunal a avaliação diagnóstica das competências parentais e potenciando a disponibilidade das partes para o acordo de regulação do exercício das responsabilidades parentais que melhor salvaguarde o interesse da criança. Decorrida esta diligência, inicia-se a fase de julgamento com a inerente produção de prova. Da leitura do processo resulta que os pressupostos fácticos da decisão estão suficientemente discriminados, assentam nos elementos probatórios obtidos até ao momento e o juízo prudencial provisório formulado é compatível com esse acervo revelado nos autos. A decisão provisória não comporta um nível de exigência de fundamentação idêntico ao das decisões definitivas sobre o fundo da causa[12]. Tendo em atenção a dinâmica processual evolutiva, a natureza do processo e as regras e os princípios orientadores do processo tutelar cível, ponderando igualmente a natureza do conflito e a avaliação preliminar das competências parentais, a decisão mostra-se suficientemente fundamentada de facto. E daqui decorre inevitavelmente que não existe a necessidade de ordenar a anulação da decisão em ordem a promover a modificabilidade da decisão de facto nos termos estabelecidos pela al. c) do nº 2 do artigo 662º do Código de Processo Civil. * 4.3 – Do erro na aplicação do direito (do pedido de entrega do menor ao recorrente): Em sede de responsabilidades parentais, o superior interesse da criança surge como um objectivo a prosseguir por todos quantos possam contribuir para o desenvolvimento harmonioso da criança e a ele se mostram adstritos com particular acuidade os pais e o Estado, os primeiros no desenvolvimento do seu papel liderante na condução, sustento e educação dos menores e o segundo que deve contribuir para a efectiva concretização dos seus direitos. Neste enquadramento é de atender ao conteúdo das responsabilidades parentais, fixado no artigo 1878º do Código Civil. Nos termos deste dispositivo compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover ao seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens. A função motriz das responsabilidades parentais assenta actualmente na ideia do cuidado paternal[13] e este conceito de responsabilidades parentais é fortemente inspirado no conceito resultante da Recomendação n.º R (84) sobre as Responsabilidades Parentais, aprovada pelo Comité de Ministros do Conselho da Europa, em 28 de Setembro de 1984, que se apoia em estudos elaborados sobre a evolução da realidade social e jurídica dos diferentes Estados Europeus. Nesta recomendação emitida a propósito das responsabilidades parentais, estas emergem como «o conjunto dos poderes e deveres destinados a assegurar o bem-estar moral e material do filho, designadamente tomando conta da sua pessoa, mantendo relações pessoais com ele, assegurando a sua educação, o seu sustento, a sua representação legal e a administração dos seus bens»[14]. As responsabilidades parentais surgem-nos como uma situação jurídica complexa, onde avultam poderes e deveres de natureza funcional e daí resulta que as mesmas não sejam entendidas como «um conjunto de faculdades de conteúdo egoísta e exercício livre, mas de faculdades de conteúdo altruísta, que devem ser exercidas primariamente no interesse do menor (e não dos pais), de exercício vinculado»[15]. Este conjunto de vinculações refere-se quer à pessoa, quer aos bens dos filhos. O objectivo do processo de regulação das responsabilidades parentais é a fixação do regime de exercício das funções parentais por ambos os progenitores, em resultado da dissolução (ou, eventualmente, da própria não constituição) da estrutura familiar. Usualmente este processo abrange três questões fundamentais que se prendem com a guarda dos filhos, o direito de visita e a obrigação de alimentos, sendo certo que, no presente caso, a questão está basicamente centrada na decisão do primeiro ponto. * No âmbito da regulação do exercício das responsabilidades parentais é obrigatória a decisão provisória, nos casos de inexistência de acordo entre progenitores de menor, face à disciplina consagrada no artigo 38º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível. A lápis grosso, o recorrente afirma que o seu núcleo familiar tem melhores condições e aptidões para garantir a guarda da criança, que a mãe do David demonstra incapacidade para assegurar a segurança, o bem-estar e os cuidados básicos do filho do extinto casal e que a decisão desta de mudar de domicílio corresponde a uma violação grave dos deveres que lhes estão cometidos por lei e por vinculação jurisdicional prévia. Porém, tal como assinala a decisão de Primeira Instância «nos autos não existem elementos que sustentem a alegada incapacidade da progenitora em satisfazer as necessidades básicas do filho», «nem tão pouco existem elementos que façam recear pela segurança ou pela estabilidade emocional do (…)». É transparente que o quadro conflitual existente é impeditivo de uma guarda conjunta, a que, por maioria de razão, acresce a inadequação prática decorrente do contexto geográfico distinto em que se localizam o pai e a mãe do (…). E a prevalência de sinais de vontade egoísta dos progenitores, além de potenciar um agravamento do quadro de animosidade existente, pode ter repercussões «no estado psíquico do filho, tanto mais que irá crescendo num ambiente de conflito aberto», tal como assinala a Primeira Instância. E, por se tratar de uma realidade evidente, ambos os pais teriam necessariamente de ter consciência de que a ruptura do casal parental é susceptível de causar um sofrimento afectivo na criança e que a intensidade dos conflitos parentais constitui um factor de risco preponderante no aparecimento de perturbações psíquicas na criança, durante e depois da separação da família conjugal[16]. E ambos estão aqui vinculados a perceber que a ruptura conjugal não significa uma descontinuação das relações parentais e a aprender que a felicidade e o desenvolvimento integral do filho passa pela adopção de comportamentos que minorem os efeitos dessa cessação de coabitação. E não se trata aqui de uma decisão motivada pela existência de um quadro de convivência marital quebrada por questões relacionadas com a alegada violência doméstica. É curioso que, apesar de tal fenómeno ter sido negado pelo recorrente, de forma ambígua e contraditória, o mesmo acaba por chamar à colação a violência doméstica com o anúncio de participações criminais apresentadas por si contra a mãe do menor com base nesse objecto. Porém, da leitura da decisão provisória não resulta que a guarda da criança tenha sido fundamentada com base nessa suspeita. No argumentário constam ainda os incómodos causados ao menor com as viagens necessárias para realizar os convívios de fim de semana. Porém, ainda que a guarda fosse provisoriamente concedida ao recorrente, os convocados custos associados ao direito de visita manter-se-iam e não seriam substancialmente diversos se a mãe se mantivesse na zona de Beja. Com efeito, agora em sentido contrário, o menor (…) teria de realizar o mesmo percurso para contactar com o progenitor não guardião. Mais, tendo em atenção o momento em que o menor foi levado de Loures, não se pode afirmar sem reservas que o (…) tem o centro de vida estabilizado na zona da residência do pai. E, por isso, estas razões nunca seriam decisivas para alterar o regime provisório fixado. Também é seguro que a requerida abandonou o contexto institucional onde se encontrava com o seu filho menor. Porém, ainda que, em abstracto, se possa censurar a mãe por ter alterado a sua residência de forma unilateral, sem qualquer comunicação prévia ou autorização do Tribunal – que na actualidade não dispõe de elementos que permitam realizar o escrutínio das razões subjacentes à referida deslocalização –, aquilo que deve imperar é a salvaguarda do interesse do menor e não a protecção das conveniências dos pais, seja de um, seja do outro. Como já se respiga daquilo que foi acima dito, o superior interesse da criança deve estar sempre presente em cada caso concreto e, com ele, pretende-se assegurar um desenvolvimento harmonioso da criança ou jovem, tendo em conta as suas necessidades, bem como a capacidade dos pais para as satisfazer e ainda os valores dominantes no meio envolvente[17]. Ao contrário do afirmado nas alegações de recurso, o despacho impugnado contém elementos que permitem decifrar quais são as reais actuais necessidades do menor, embora esta afirmação seja de natureza perfunctória e sumária por se estar perante uma decisão com conteúdo meramente provisório[18]. Na verdade, tendo em atenção a idade do menor e o contexto referencial expresso nos factos apurados, é indiscutível que a ideia matriz intransponível nesta fase dos autos é a de «assegurar-se a manutenção da estabilidade emocional e afectiva do filho, sendo o critério adoptado o da relevância da continuidade das relações da criança». Aliás, a matéria vertida nos pontos 34)[19], 35)[20], 36)[21], 37)[22] e 38)[23] dos factos provados dá total conforto ao Tribunal da Relação na forma como o Juízo de Família e Menores de Beja realizou o raciocínio subjacente à entrega provisória do (…) à mãe. No fio-de-prumo, com a equidistância que o deve caracterizar, o Ministério Público propõe a manutenção da decisão, ao evidenciar que a decisão provisória «revela-se muito sensata, mantendo a residência da criança de tenra idade junto da mãe, optando pelo que é certo em vez de arriscar pelo incerto». E nesta realidade dinâmica, de momento, na avaliação do Tribunal da Relação de Évora, o superior interesse do menor é continuar a viver na companhia da mãe, sem prejuízo daquilo que vier a ser decidido posteriormente. Na verdade, como também ficou exarado na decisão sob impugnação, as razões apontadas pelos progenitores para alcançarem a guarda definitiva do menor serão oportunamente consideradas pelo Tribunal, após a realização das diligências instrutórias que se mostrem adequados à justa composição do litígio e na sequência da obtenção dos pertinentes relatórios sociais, se for caso disso. Não existe qualquer outro fundamento recurso com idoneidade e força bastante para invalidar o acto postulativo recorrido. Como síntese final, pela falta de elementos objectivos que permitam invalidar o juízo feito pela Primeira Instância, a que se associa de forma preponderante a actual situação do menor, neste processo dinâmico e evolutivo em que se traduz o superior interesse do menor, mantém-se o decidido pelo Juízo de Família e Menores do Tribunal Judicial da Comarca de Beja, julgando-se, como tal, improcedente o recurso. * V – Sumário: 1. As responsabilidades parentais correspondem ao conjunto dos poderes e deveres destinados a assegurar o bem-estar moral e material do filho, designadamente tomando conta da sua pessoa, mantendo relações pessoais com ele, assegurando a sua educação, o seu sustento, a sua representação legal e a administração dos seus bens. 2. O superior interesse da criança surge como um objectivo a prosseguir por todos quantos possam contribuir para o desenvolvimento harmonioso da criança e a ele se mostram adstritos com particular acuidade os pais e o Estado, os primeiros no desenvolvimento do seu papel liderante na condução, sustento e educação dos menores e o segundo que deve contribuir para a efectivação concretização dos seus direitos. 3. O escopo fundamental da actividade do tribunal deve ser o de conseguir a melhor solução possível face às circunstâncias concretas do caso, procurando assegurar o mínimo de desestabilização e descontinuidade da vida do menor. 4. A decisão provisória não comporta um nível de exigência de fundamentação idêntico ao das decisões definitivas sobre o fundo da causa. 5. Trata-se de um juízo meramente perfunctório, transitório e temporário, que, no itinerário procedimental estabelecido na lei, antecede a fase de produção de prova provisionada no artigo 39º do Regime Geral do Processo Tutelar Civil. * VI – Decisão: Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar improcedente o recurso interposto, confirmando-se a decisão recorrida. Custa a cargo do recorrente, atento o disposto no artigo 527º do Código de Processo Civil. Notifique. * (acto processado e revisto pelo signatário nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 138º, nº 5, do Código de Processo Civil). * Évora, 01/04/2019 José Manuel Galo Tomé de Carvalho __________________________________________________ [1] Como se afirma no Acórdão do Tribunal Constitucional nº 137/97, de 11/03/1997, processo nº 28/95, in www.tribunalconstitucional.pt «a concisão das conclusões, enquanto valor, não pode deixar de ser compreendida como uma forma de estruturação lógica do procedimento na fase de recurso e não como um entrave burocrático à realização da justiça». [2] A este propósito, de acordo com o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18/06/2013, in www.dgsi.pt «o recorrente deve terminar as suas alegações de recurso com conclusões sintéticas (onde indicará os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida)». [3] O Tribunal ad quem não determinou que fossem sintetizadas, no prazo de cinco dias, sob pena de se não conhecer do recurso, na parte afectada ex vi no nº 2 do artigo 639º do Código de Processo Civil, dado que, infelizmente, por norma, a aplicação prática desta norma apenas tem efeitos dilatórios no regular andamento dos recursos. [4] Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, Coimbra, 1984, pág. 122. [5] Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, Coimbra Editora, Coimbra, 2001, pág. 670. [6] Antunes Varela, Miguel Bezerra, Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, pág. 686. [7] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16/02/2005, in www.dgsi.pt. [8] No mesmo sentido, Acórdão da Relação de Lisboa de 09/07/2014, in www.dgsi.pt. [9] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04/10/2018, in www.dgsi.pt. [10] No acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 12/01/2017 ficou consignado que «o art.º 38º impõe que o juiz decida provisoriamente sobre o pedido, em função dos elementos já obtidos, não tendo que aguardar por quaisquer outras diligências de prova, nem pela audição de técnicos especializados, sem prejuízo de, posteriormente, ainda antes da decisão final, logo que ouvidos esses técnicos ou produzida mais prova, poder ser alterado o inicialmente decidido, como previsto no art.º 28º, nº 2, “a fortiori”. Tratando-se de uma decisão provisória, fundada nos poucos elementos até essa data recolhidos, normalmente apenas nas declarações dos progenitores, o julgador deve nortear-se por princípios de razoabilidade, actuando com bom senso, prudência e moderação, protegendo os interesses dos menores e só depois os dos progenitores e evitando que a decisão agudize o conflito e assim impeça um acordo, que ainda poderá vir a ser obtido na segunda fase da conferência (Cfr. art.º 39º, nº 1, do RGPTC)». [11] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 20/02/2017, in www.dgsi.pt. [12] Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 12/07/2017, publicado em www.dgsi.pt. [13] Diogo Leite de Campos, Lições de Direito da Família e das Sucessões, 2ª edição, Coimbra, Almedina, 1997, págs. 370; António H. L. Farinha e Conceição Lavadinho, Mediação Familiar e Responsabilidades Parentais, Coimbra, Almedina, págs. 47, António H.L. Farinha, Relação entre os Processos Judiciais, Infância e Juventude, nº 2/99, Abril - Junho, 1999, pág. 69, e Maria Clara Sottomayor, Regulação do Exercício do Poder Parental nos Casos de Divórcio, 4ª edição, revista, aumentada e actualizada, Coimbra, Almedina, 2002, pág. 15. [14] O Princípio 2 do Anexo à Recomendação nº R (84) 4 estabelece que «qualquer decisão da autoridade competente relativa à atribuição das responsabilidades parentais ou ao modo como essas responsabilidades são exercidas, deve basear-se, antes de mais, no interesse dos filhos». [15] Castro Mendes, Direito da Família, AAFDL, 1978-1979, pág. 243. [16] Gérard Poussin e Élisabeth Martin-Lebrun, Os Filhos do Divórcio, Psicologia da separação parental, págs. 173 e 180 a 184. [17] Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 07/04/2011, in www.dgsi.pt. [18] Artigo 28º (Decisões provisórias e cautelares): 1 - Em qualquer estado da causa e sempre que o entenda conveniente, a requerimento ou oficiosamente, o tribunal pode decidir provisoriamente questões que devam ser apreciadas a final, bem como ordenar as diligências que se tornem indispensáveis para assegurar a execução efectiva da decisão. 2 - Podem também ser provisoriamente alteradas as decisões já tomadas a título definitivo. 3 - Para efeitos do disposto no presente artigo, o tribunal procede às averiguações sumárias que tiver por convenientes. 4 - O tribunal ouve as partes, excepto quando a audiência puser em risco sério o fim ou a eficácia da providência. 5 - Quando as partes não tiverem sido ouvidas antes do decretamento da providência, é-lhes lícito, em alternativa, na sequência da notificação da decisão que a decretou: a) Recorrer, nos termos gerais, quando entenda que, face aos elementos apurados, ela não devia ter sido deferida; b) Deduzir oposição, quando pretenda alegar factos ou produzir meios de prova não tidos em conta pelo tribunal e que possam afastar os fundamentos da providência ou determinem a sua redução. [19] (34) A progenitora viveu em contexto institucional (casa abrigo) juntamente com o filho, durante onze meses, não tendo sido reportado quer pela casa abrigo, quer pelo equipamento escolar frequentado pela criança, quaisquer fragilidades pessoais e/ou parentais que de alguma forma pudessem comprometer o desenvolvimento/crescimento integral da criança. [20] (35) Existe uma sólida relação afectiva, de proximidade e cumplicidade entre mãe e filho, e vice-versa. [21] (36) A progenitora preocupa-se em satisfazer, diariamente, as necessidades básicas materiais, afectivas e de conforto do (…). [22] (37) Existem manifestações de afecto constantes entre mãe e filho. [23] (38) A progenitora sabe gerir o quotidiano do filho, apresenta um discurso adequado e atende às prioridades da criança. |