Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
| ||
Relator: | RUI MACHADO E MOURA | ||
Descritores: | CLIENTELA DISTRIBUIÇÃO INDEMNIZAÇÃO CIVIL RESOLUÇÃO | ||
![]() | ![]() | ||
Data do Acordão: | 12/19/2019 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
![]() | ![]() | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | - A prova testemunhal é, consabidamente, um elemento de prova a apreciar livremente pelo tribunal, nos termos do disposto no art. 607º, nº 5, do C.P.C. e, por isso, a prova produzida deverá ser avaliada no seu todo, daí resultando a convicção formada pelo Julgador “a quo”. - Com efeito, não se pode deixar de reconhecer que a lei atribui a posição de primazia na valoração da prova (documental e testemunhal) ao Julgador “a quo” – e não às partes – que, repete-se, a aprecia livremente segundo a sua prudente convicção, uma vez que os meios de prova em causa nestes autos são de livre apreciação (cfr. citado art. 607º, nº 5). - Por isso, a apreciação do Julgador “a quo” surge-nos como claramente sufragável, com iniludível assento na prova produzida e em que declaradamente se alicerçou, nada justificando a alteração da factualidade apurada nos autos. - Era à A. que competia, não só alegar, mas também provar, os factos demonstrativos de que a R. tinha incumprido o contrato celebrado entre as partes e, por via disso, a resolução operada por esta era ilícita, sujeitando-se a R. a pagar à A. uma indemnização de clientela e uma indemnização por danos patrimoniais, a título de lucros cessantes e danos emergentes – cfr. art. 342º, nº 1, do Cód. Civil – prova essa que a A., indubitavelmente, veio a fazer nos autos, pelo que forçoso é concluir que o pleito tenha de ser decidido contra a parte que não cumpriu esse ónus relativamente a factos (impeditivos ou extintivos), indispensáveis à sua pretensão – cfr. nº 2 do citado art. 342º – ou seja, “in casu”, a R., ora apelante. (Sumário do Relator) | ||
![]() | ![]() | ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | P. 348/16.2T8EVR.E1 Acordam no Tribunal da Relação de Évora: Massa Insolvente de (…) – Comércio de Produtos Alimentares, Farmacêuticos e Afins, S.A. intentou a presente acção declarativa comum contra (…), S.A., na qual peticionou que seja declarada ilícita a resolução efectuada pela R. do contrato de distribuição, com exclusividade, de produtos de perfumaria, celebrado entre ambas, em Outubro de 2009, ou, caso assim não se entenda, que qualifique a mesma como denúncia ilícita por falta de pré-aviso e, consequentemente, condene a R. no pagamento de indemnização por lucros cessantes no valor de € 219.865,20, considerando verificar-se uma resolução ilícita, ou, subsidiariamente, € 27.483,15, caso se qualifique o ato como denúncia sem pré-aviso. Mais peticionou, a A. que o Tribunal condene a R. no pagamento da indemnização de clientela, no valor de € 109.932,60 e, ainda, no pagamento de indemnização por danos emergentes, no valor de € 20.922,56 e eventual valor que acresça, a liquidar em execução de sentença. Devidamente citada para o efeito veio a R., por sua vez, apresentar contestação, pugnando pela improcedência da acção, por considerar válidos os fundamentos invocados para a resolução contratual e, bem assim, deduzir pedido reconvencional, pedindo a condenação da A. no pagamento da quantia total de € 63.534,36. Por sua vez, a A. replicou, alegando não dever à R. o valor por esta peticionado, pugnando pela improcedência parcial do pedido reconvencional. De seguida veio a ser realizada uma audiência prévia, na qual foi lavrado despacho saneador, indicado o objecto do litígio e fixados os temas de prova. Posteriormente, realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais, tendo sido proferida sentença que julgou a acção e reconvenção parcialmente procedentes, por parcialmente provadas e, em consequência: A) Declarou ilícita a resolução contratual levada a cabo pela sociedade “(…), S.A.” junto da sociedade “(…) – Comércio de Produtos Alimentares, Farmacêuticos e Afins, S.A.” no dia 16 de Março de 2015; B) Condenou a sociedade “(…), S.A.” no pagamento à “Massa insolvente de (...) – Comércio de Produtos Alimentares, Farmacêuticos e Afins, S.A., da quantia de € 47.500.00 (quarenta e sete mil e quinhentos euros), a título de indemnização de clientela; C) Condenou a sociedade “(…), S.A.” no pagamento à “Massa insolvente de (…) – Comércio de Produtos Alimentares, Farmacêuticos e Afins, S.A., a título de danos patrimoniais – lucros cessantes – de uma indemnização correspondente ao lucro líquido que esta deixou de auferir nas vendas dos produtos da Ré aos seus clientes no período de dois anos, a apurar em sede de liquidação de sentença; D) Condenou a sociedade “(…), S.A.” no pagamento à “Massa insolvente de (…) – Comércio de Produtos Alimentares, Farmacêuticos e Afins, S.A., a título de danos patrimoniais – danos emergentes – da quantia de € 20.922,56; E) Absolveu a sociedade “(…), S.A.” do mais peticionado pela “Massa insolvente de (…) – Comércio de Produtos Alimentares, Farmacêuticos e Afins, S.A.”; F) Condenou a “Massa Insolvente de (…) – Comércio de Produtos Alimentares, Farmacêuticos e Afins, S.A.” no pagamento à R./reconvinte, a título de danos patrimoniais, da quantia de € 13.534,36. G) Absolveu a “Massa Insolvente de (…) – Comércio de Produtos Alimentares, Farmacêuticos e Afins, S.A.” do mais peticionado pela sociedade “(…), S.A.” a título reconvencional. Inconformada com tal decisão dela apelou a R., tendo apresentado para o efeito as suas alegações de recurso e terminando as mesmas com as seguintes conclusões: 1- IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO: A) Foram indevidamente considerados provados os Factos 13º, 22º, 37º, 47º, 48º, 50º, 51º, 54º e 56º, os quais deveriam ter sido considerados não provados. Quanto ao Facto 13) “Desde o início do acordo descrito em 7, 8 e 9 a sociedade “(…)” angariou para distribuição dos produtos de perfumaria da sociedade “(…)” os clientes melhor identificados a fls. 31, 32 e 33”. B) O Mmº Juiz a quo fundamentou a sua resposta nos depoimentos de (…) e (…) que, no entanto, não fizeram a prova pretendida e em contrapartida ignorou totalmente os depoimentos de (…) e de (…), apesar de credíveis e esclarecedores. A testemunha … (Ficheiro 20180621 112059 a 00:04.59), da longa lista de clientes constante de fls. 31, 32 e 33, apenas identificou três clientes que teriam sido angariados pela A., e mesmo esses, apenas depois da Ilustre Mandatária da A. lhe ter indicado expressamente os respectivos nomes, assim conduzindo a testemunha à resposta pretendida. C) A testemunha … (Ficheiro 20180621 134559) admitiu que havia muitos clientes no mercado que eram comuns (clientes da anterior distribuidora … e clientes da Apelada) e que tinham produtos da R. Apelante (…) assim reconhecendo que tais produtos da R. Apelante já eram distribuídos em Portugal pela anterior distribuidora (…). D) A mesma testemunha … (Ficheiro 20180621 134559 a 00:18:00) esclareceu que a necessidade de negociar contratos novos foi ditada pela vontade da Apelante em ter um contrato diferente com melhores condições contratuais do que a anterior distribuidora … (e não na necessidade de iniciar actividade com esse cliente). E) À pergunta sobre quais os clientes verdadeiramente novos onde a Apelante (…) não estava antes e onde os produtos foram colocados pela Apelada (…), respondeu a testemunha (Ficheiro 20180621 134559 aos 00:19:50) que os maiores tinham sido (…) e o (…). Depois havia outros mais pequenos, mas que não se recordava. F) Em contrapartida, a testemunha … (Ficheiro 20181018.173958 aos 00:01.28) afirmou categoriamente que a Apelada não tinha tido de efectuar os procedimentos normais de angariação de clientes pois a generalidade dos clientes já vinha do distribuidor anterior (…) e a testemunha … (Ficheiro 20180628 162322 aos 00:03.52) afirmou que o único cliente novo angariado pela Apelada de que se lembrava era o (…). G) Ou seja, a prova testemunhal foi no sentido de apenas alguns clientes foram angariados pela Apelada e que a grande maioria dos clientes já vinha da anterior distribuidora, facto que, aliás, é reforçado pelos Factos Provados nºs 2º, 4º, 5º, 6º e 59º, ou seja, que a R. já distribuía os seus produtos em Portugal desde há mais de 18 anos (F.P. 2º) entre 2002 e 2009 essa distribuição foi realizada por outra sociedade – … (F.P. 3º) que foi declarada insolvente em 2009 (F.P. 5º) e que dessa sociedade insolvente transitaram para a A. alguns funcionários, entre eles, … (F.P. 59º), por tudo o exposto, deveria ter sido considerado não provado o Facto 13 da douta sentença. Quanto ao Facto 22), o “rating” da sociedade “(…)” junto da sociedade “(…)” aumentou no ano de 2015. H) O Mmº Juiz fundamenta esta resposta nos depoimentos de (…) e de (…) que, no entanto, não fizeram tal prova. I) Quanto à testemunha (…), a única referencia a esta matéria, consta do Ficheiro 0180621 134559 aos 00:40:53) onde relata um telefonema que fizera para a … de Portugal (mas quem concedia o crédito era a … França), no entanto, tratou-se de uma mera resposta de carácter genérico fornecida por quem não teria legitimidade para apreciar e decidir a questão em concreto. J) Esta resposta da testemunha (…) seria sempre manifestamente insuficiente para o Tribunal “a quo” ter considerado provado que o “rating” da Apelada subiu em 2015, tanto mais que a restante testemunha indicada pelo Mmº Juiz como fundamento para a resposta de “provado” a esta matéria – … (Ficheiro 20181018.144531 aos 00.19.26) – fez prova credível e fundamentada de que o seguro de crédito foi recusado em Março de 2015 pela (…) e, portanto, conclui-se que o rating não subiu. K) Pelo e-mail junto aos autos a fls. 411, que não foi impugnado, ficou reforçada a prova de que a (…) tinha recusado o seguro de crédito em 28.01.2015 o que também prova que o rating não tinha subido em 2015, pois a atribuição do seguro de crédito estava directamente subordinada aos resultados da empresa, como referiu a testemunha … (cfr. Ficheiro 20180710 111452 aos 00:37:12). Quanto ao Facto 37), “A sociedade (…) recusou a proposta constante de 36) uma vez que a encomenda em questão se destinava ao dia de São Valentim, 14 de Fevereiro de 2015.” L) Deveria ter ficado não provado o segundo segmento deste ponto a partir de “... uma vez que ...”. O Mmº Juiz fundamentou a resposta a esta matéria unicamente no depoimento da testemunha (…), no entanto resultou do seu depoimento que afinal a encomenda de Fevereiro não se destinava apenas ao Dia dos Namorados e que não foi a perda de interesse na encomenda que esteve por detrás da decisão de não pagamento pelo que este facto 37º deveria ter ficado provado apenas quanto à 1ª parte, ou seja, ao segmento “A sociedade (…) recusou a proposta constante de 36º). M) Vejamos cronologicamente o depoimento da testemunha … (Ficheiro 20180621.134559): Ao 00h43m afirmou que tinham reforçado a encomenda de Janeiro já a contar com o Dia dos Namorados que se celebra a 14 de Fevereiro (donde se conclui que a encomenda de Fevereiro não se destinaria apenas a esse dia, mas também ao mês seguinte); Aos 01h14m – afirmou que a (…), ao final do dia, depois da reunião em Lisboa desse mesmo dia 13 de Fevereiro respondeu que o (…) tinha recuado e tinha voltado a aceitar para a encomenda de Fevereiro que fosse paga 50%, adiantamente, e 50% a 60 dias (portanto, na véspera do dia dos namorados ainda a Apelada tinha interesse na encomenda); e finalmente aos 01h17m – afirmou que apesar do dia dos namorados ser no dia seguinte, no dia 13 de Fevereiro ainda lhe interessava a encomenda de Fevereiro para colocar nas lojas do (…) a partir de Março. Quanto ao Facto 48), “Em consequência do descrito em 11) a sociedade (…) sofreu penalizações por não entregas concretamente da “(…)” referente ao 2º trimestre 2015, no valor total de € 7.364,01, correspondendo aos produtos da ré o valor de € 176,16; da (…), no valor de € 8.070,00, no que diz respeito aos produtos da R (2015)”. N) Não deveria ter ficado provado que a A. sofreu as referidas penalizações pois não ficou feita a prova de que a Apelada tenha pago tais valores e a A. não juntou os recibos nem cópia dos meios de pagamento, nem sequer as contas-correntes entre ambas as sociedades e mais ainda, não ficou provado o nexo de causalidade entre o descrito no 11º F.P. e as referidas penalizações. O) Quanto à (…), a Apelada confessou que do total da factura que é de € 15.760,08, apenas € 176,16 se reportam a produtos da Ré e quanto à (…), a Apelada admitiu no art. 42º da p.i. que dum total de cerca de € 15.000,00 apenas € 8.070,00 correspondiam a penalização relativa a produtos da Apelante, ou seja, P) A Apelada confessou que a grande maioria das penalizações referem-se a outros produtos e outros fornecedores (que não a Apelante) o que indica claramente que a causa das penalizações impostas pela (…) e (…) estará em motivos imputáveis à própria Apelada. Q) Não ficou feita a prova de que tenha sido a actuação da Apelante descrita 11º F.P. da douta sentença a provocar as penalizações da (…) e da (…) referidas no Facto 48) que assim sendo, deveria ter sido considerado não provado. Quanto ao Facto 50), No ano de 2015, a sociedade (…) suportou o pagamento de € 86.751,00 acrescido de IVA por não ter adequado as projecções de venda por falta de pré-aviso. R) A A. não juntou os respectivos recibos nem sequer as cópias dos meios de pagamento nem as contas-correntes entre as duas sociedades, não tendo feito prova desse pagamento, aqui se reproduzindo tudo o que a este propósito se escreveu relativamente ao Facto 48º F.P. O ónus do pagamento cabia à Apelada pelo que também este Facto 50 deveria ter ficado não provado. Quanto ao Facto 51), “Considerando a margem da sociedade (…), o dano sofrido pela sociedade (…) foi de € 10.306,00 (11,88% x € 86.751,00) acrescido de Iva, num total de € 12.676,40”. S) Esta matéria não pode considerar-se provada porque para além de não ter ficado provado o pagamento de € 86.751,00, não ficou feita a prova de que “a margem da R.” fosse de 11,88%, além de que não ficou provado o nexo de causalidade entre o comportamento da Apelante e essa penalização. E, por tudo o supra exposto, deveria a matéria do Facto 50) ter ficado não provada. T) O IVA correspondente aos € 10.306,00 (€ 2.370,40) não pode constituir prejuízo para a Apelada, pois é um imposto dedutível e a Apelada, mesmo que tenha pago a penalização, certamente recuperou esse IVA ao abrigo das regras do CIVA. Quanto ao Facto 54), “… captando ainda como novos clientes em produtos da R. o “(…)”, “(…)”, “(…)”, “(…)” e “(…)”. U) Esta parte do ponto 54º deveria ter ficado não provado, aqui se dando por reproduzido tudo o que se alegou nas Conclusões B a G relativamente ao 13º F.P. Quanto ao Facto 56), “No dia 16 de Março de 2015 encontrava-se já negociada e acordada pela sociedade (…) a entrada dos produtos de perfumaria da R em 58 novas lojas do (…), onde actualmente se encontram à venda, através do novo distribuidor (…)”. V) Não ficou feita qualquer prova testemunhal ou documental quanto ao segundo segmento deste ponto 56º dos F.P. (onde actualmente se encontram à venda através do novo distribuidor …) que deveria ter ficado não provado. W) Foram indevidamente considerados Não Provados os seguintes factos (que deveriam ter ficado provados): X) - a) Os 130 clientes constantes na lista de fls. 31 a 33, mais de 99% eram já clientes da sociedade “(…)” em data anterior a 2009, através da anterior distribuidora. Y) Este facto deveria ter ficado provado, aqui se dando por reproduzidas as conclusões D) F e G). Acresce que como resulta dos pontos 1, 3 e 6 do relatório pericial, o primeiro ano (2010) foi o melhor ano dos cinco anos da relação comercial entre Apelante e Apelada o que só foi possível e se compreende porque a Apelada “herdou” a clientela e o negócio que lhe veio da distribuidora anterior, a (…). Z) - b) O rating junto da (…) era condição/pressuposto do vencimento das facturas a 150 dias. AA) Esta matéria deveria ter ficado provada através dos quatro e-mails de 2009 e 2010 que não foram impugnados e que foram apresentados pela testemunha (…) em cumprimento do douto despacho de 10.07.2018. BB) O Tribunal a quo elencou como factos provados novos (não constavam nos Temas da Prova) apenas os dois primeiros emails de 14.10.2009 e de 9.11.2009 (63ºe 64º dos FP) mas incompreensivelmente ignorou os dois emails restantes, sendo que se trata de documentos cujo conteúdo é de enorme relevância para a decisão da causa e permitem aferir com segurança a cronologia dos factos em que pelo email de 4.05.2010 em que a Apelante solicitou à Apelada que enviasse à (…) o balanço 2009/2010; e em que pelo email de 5.5.2010, em que a própria Apelada envia à supra mencionada (…) o balanço e outros elementos contabilísticos do fecho do ano de 2009. CC) Esta troca de correspondência entre a Apelante e a Apelada e seguidamente entre a Apelada e a (…) constituem prova inequívoca dos seguintes factos: que logo desde 2010 a Apelante exigiu a garantia de seguro de crédito da (…) como condição para o prazo de 150 dias de pagamento; e que a (…) não concedia o seguro de crédito sem fazer a avaliação (rating) da situação financeira da Apelada. DD) Pois dependia diretamente dessa avaliação (rating) pela (…) o montante total da garantia concedida, o que implicava que a conta-corrente entre as duas sociedades não podia exceder tal limite da garantia o que por sua vez tinha repercussões no prazo de pagamento das facturas, conforme ficou provado pela testemunha (…) ao longo do seu depoimento e foi sabiamente sintetizado pelo próprio Juiz “a quo” em instâncias (Ficheiro 20180710 111452). EE) O depoimento de … (Ficheiro 20181018 102924 aos 00.24.37) confirmou também que a Apelante apenas concedia crédito a 150 dias caso existisse um seguro de crédito e que sem a (…), a Apelante exigia pagamentos antecipados. FF) c) - Em 5.3.2015 a sociedade (…) solicitou pela última vez seguro de crédito à (…) para os débitos da sociedade (…), no entanto foi recusado face à cada vez maior fragilidade financeira desta. GG) Esta matéria também deveria ter sido considerada provada pois ficou sobejamente provada pelo depoimento de (…) e é importante para aferir a boa fé negocial da Apelante e as diligências por si encetadas no sentido de manter a relação contratual com a Apelada (Ficheiro 20181018.144531 aos 00:19:26) DA MATÉRIA DE FACTO QUE TAMBÉM DEVERIA TER SIDO CONSIDERADA NA DECISÃO DE MÉRITO: HH) - a) O Tribunal a quo considerou provado que “Em Outubro de 2014, o seguro de crédito concedido pela sociedade (…) para as compras de produtos de perfumaria pela sociedade (…) à sociedade (…) ascendeu a € 200.000,00” (Ponto 24º dos F.P.) e fundamentou a resposta a este facto no depoimento da testemunha (…), no entanto, o depoimento desta testemunha foi que em Outubro de 2015 o seguro de crédito que vinha de trás e que tinha sido de duzentos mil euros, passou a zero euros (Ficheiro 20181018 102924 aos 01:03:17). II) Deveria, pois, o Mmº Juiz ter igualmente considerado fixado que “A partir de finais de Outubro de 2014, o seguro de crédito concedido pela sociedade (…) para as compras de produtos de perfumaria pela sociedade (…) à sociedade (…) passou de duzentos mil euros para zero euros”, sendo esta matéria de facto de extrema relevância para a descoberta da verdade material. JJ) - b) Também o douto tribunal deveria ter tido em consideração os contatos entre as partes do dia 04.03.2015 para aferir o comportamento da Apelante e as tentativas feitas por esta para evitar a ruptura contratual com a Apelada que foram referidas pela testemunha (…) que com conhecimento directo sobre os factos, relatou (Ficheiro: 20181018 144531 aos 00:42:29) que em 04.03.2015 a Apelante fez nova tentativa de manter o contrato com a Apelada, reiterando as condições de colaboração para o futuro e insistindo com o pagamento da factura que já estava vencida desde o dia 22 anterior; mas que ainda no dia 04.03.2015 a Apelada respondeu e em vez de aceitar as condições, propôs outras condições totalmente diferentes e nada disse quanto ao pagamento da factura já vencida forçando um braço de ferro que a Apelante não aceitou; a mesma testemunha (…) afirmou repetidamente ao tribunal que caso a Apelada tivesse pago nessa altura (início de Março de 2015) as faturas em dívida, a R. teria mantido o vínculo de distribuição com a Apelada. KK) Estes factos são de inegável interesse para apreciação do mérito da causa porquanto permitem avaliar o comportamento negocial da Apelante e o incumprimento da Apelada como motivo para a degradação das relações comerciais e perda de confiança pela Apelante. 2 - IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE DIREITO: LL) A Apelante não se conforma com o entendimento do douto Tribunal “a quo” que considerou ter-se verificado um incumprimento contratual do contrato por parte da Apelante em virtude desta ter unilateralmente imposto alterações contratuais à Apelada e consequentemente considerou ilícita a resolução contratual da iniciativa da Apelante. MM) As alterações impostas pela Apelante à Apelada consistiram unicamente na redução do prazo de pagamento das facturas. NN) A referida alteração teve justificação válida no facto de se ter alterado substancialmente a situação económica da Apelada com risco para a Apelante de perda da garantia geral das obrigações (art. 601º CPC). OO) Repare-se que a Apelante tinha promovido um despedimento colectivo em Julho de 2014 (23º FP) com fundamento em motivos de mercado e estruturais, ter apresentado prejuízos avultados em dois anos consecutivos, o acesso ao crédito bancário ter- se tornado mais precário, com risco de corte generalizado de financiamento e estar em risco o incumprimento do art. 35º do CSC, entre outros fundamentos constantes de fls. 245 a 249. PP) A seguradora de crédito (…) avaliando negativamente a solvabilidade da Apelada, diminuiu o rating desta em 2013 e 2014 (20º FP) e a partir de Outubro de 2014 deixou de garantir o pagamento das facturas emitidas pela Apelante à Apelada. QQ) Foi apenas em virtude da alteração da situação económica da Apelada e da consequente perda de garantia do seguro de crédito que a Apelante comunicou à Apelada novas condições de pagamento das suas facturas, o que é legítimo e corresponde às práticas comerciais comuns. RR) A Apelante tinha um justo receio de que a degradação da situação económica da Apelada viesse a culminar num não cumprimento da contraprestação (pagamento das suas facturas), situação que já tinha ocorrido com a insolvência da anterior distribuidora (3º e 4º F.P.) receio esse que era, aliás, fundamentado face à entretanto declarada insolvência da Apelada (65º F.P.). SS) O comportamento da Apelante está legitimado, quer pela prática comercial, quer pelo disposto nos artigos 429º e 780º do Código Civil. TT) A A. aceitou expressa e tacitamente a alteração das condições de pagamento das facturas de Outubro, Novembro e Dezembro de 2014, (cfr. arts. 25º, 26º, 27º, 28º dos F.P.) mas já não cumpriu quanto à factura de Janeiro (em que pagou 50% adiantado e nunca pagou os restantes 50% que foram aliás incluídos na condenação reconvencional) nem cumpriu quanto à factura de Fevereiro, além de que nunca pagou a factura de Setembro anterior (44º dos F.P.). UU) À data da encomenda de Fevereiro de 2015 , o crédito da Apelante sobre a Apelada era de € 62.364,58 (44º F.P.) a que se somaria o valor da encomenda de Fevereiro, elevando o risco de cobrança para valores que a Apelante considerou inaceitáveis face à inexistência de seguro de crédito da (…) pelo que quanto a essa encomenda, a apelada por email de 6.2.2014 recusou enviar os produtos sem pagamento antecipado (32ºFP) mas na semana seguinte recuou nessa exigência e exigiu pagamento antecipado de apenas 50% e o restante a 60 dias (36º FP), proposta que a A. não aceitou (37º FP). VV) A recusa da Apelada em pagar os 50% adiantados da encomenda de Fevereiro (condição que tinha previamente aceite – 31º F.P.) é ilegítima. WW) Os fundamentos invocados para esse não pagamento (perda de interesse porque a encomenda se destinava ao dia dos namorados que se celebra a 14 de Fevereiro) não são válidos considerando que a testemunha (…) afirmou que a encomenda de Janeiro anterior já tinha previsto um reforço de produtos para o dia dos namorados e que os produtos da encomenda de Fevereiro seriam destinados a fornecer em Março as novas lojas (…). XX) Ao recusar avançar com a encomenda de Fevereiro, a A. incumpriu a obrigação de encomenda mensal (9º FP) tanto mais que a Apelada reconheceu que essa encomenda não se destinava apenas ao Dia dos Namorados. YY) Não houve pois qualquer incumprimento contratual por parte da R. que se limitou a alterar os prazos de pagamento como forma de reagir à redução da garantia geral das obrigações decorrente da degradação da situação económica da A., o que é legítimo e normal nas práticas comerciais. ZZ) Não tem aplicação ao caso dos autos o instituto da excepção de não cumprimento previsto no art. 428º CC porque: i) as novas condições de pagamento tinham sido aceites pela A.; ii) as duas facturas em dívida reportavam-se à encomenda de Natal e à encomenda de Janeiro e portanto produtos já entregues pela R. à A., e tinham data de vencimento posterior ao tal Dia dos Namorados (14.2.2015); iii) foi dada a possibilidade à A. de avançar com a encomenda de Fevereiro nas condições que tinha aceite (36º FP), proposta que a A. recusou (F.P. 37º) apesar de estar obrigada a fazer encomendas com periodicidade mensal. AAA) A R. comunicou à A. por escrito a resolução do contrato e indicou os fundamentos da causa justa dessa resolução, tendo ficado provados nos autos a sua verificação: -a perda da garantia especial do seguro de crédito COFACE (cuja existência desde o início do contrato ficou provada pelos docs. de 2009 e 2010 a fls. 677) e que garantia o pagamento da facturação emitida à A. (arts. 19º e 20º dos FP). - a falta de pagamento da factura (…) vencida em 22 Fevereiro 2015 (44º e 46º F.P.). - a recusa da A. em realizar pré-pagamento da facturação (34º e 36º F.P.). - a perda de confiança e degradação das relações comerciais (email de 06.02.2015 – fls. 395) consubstanciada pela postura da A. nos contactos posteriores a 13.02.2015 e na falta de pagamento das facturas entretanto vencidas. BBB) Repare-se que quando o contrato foi resolvido pela Apelante, as facturas embora vencidas não tinham sido pagas (nem nunca o foram) e a Apelada não tinha feito mais encomendas quando é certo que deveria pelo menos ter feito uma encomenda em Fevereiro e outra em Março. CCC) A comunicação escrita de 15.03.2015 enviada pela R. à A. consubstancia uma resolução com justa causa lícita e devidamente fundamentada, no entanto, mesmo que assim não fosse, tal comunicação seria válida e equivaleria sempre como denúncia do contrato. DDD) Era aliás uma denúncia já expectável pois pelo email de 03.7.2014 (24º dos F.P.) comunicou à A. que tinha tomado a decisão de continuar com a R. desde que fossem cumpridas três determinadas condições ali elencadas, das quais duas não chegaram a verificar-se: i) pagamento de todas as facturas pendentes em momento anterior ao envio da encomenda de Natal (25º dos F.P. – apenas pagou metade da conta-corrente); ii) atingir os 200.000,00 euros anuais em 2014 (40º dos F.P. – o volume anual de compras da A. à R. em 2014 cifrou-se em apenas € 194.401,00 não tendo portanto atingido os € 200.000,00). O contrato não tinha prazo fixo (10º F.P.) ou seja, foi celebrado por tempo indeterminado pelo que qualquer das partes podia livre e discricionariamente pôr-lhe termo mediante comunicação à outra parte, ao abrigo do disposto no art. 28º do D.L. 178/86. Quanto à indemnização por clientela: EEE) A A. não alegou factos nem provou a prática de tarefas e/ou de prestação de serviços idênticos às obrigações que recaem sobre o agente e que tivessem sido de especial relevância para a atracção de clientela, bem pelo contrário pois foi perdendo sucessivamente clientes, veja-se que em 2011 eram 98 os clientes que compravam produtos da R.; em 2012, eram 90 clientes; em 2013, eram 84 clientes; e em 2012 eram apenas 64 clientes (art. 43º F.P.). FFF) Acresce que não ficaram provados os requisitos cumulativos do art. 33º do D.L. 178/86 para o direito à indemnização de clientela, sendo certo que cabia ao concessionário o ónus dessa prova. GGG) A R. impugnou a resposta de provado ao art. 13º FP, no entanto, mesmo que não seja deferida essa impugnação, ficou provada uma constante e progressiva diminuição do número de clientes (eram 98 em 2011, 90 em 2012, 84 em 2013 e 64 em 2014 (43º FP) pelo que em termos globais, embora possa ter angariado alguns clientes novos, a Apelada não aumentou o número de clientes. HHH) A Apelada também não logrou provar o “aumento substancial do volume de negócios com a clientela já existente” bem pelo contrário, visto que: está provado que a Apelante distribui os seus produtos em Portugal há mais de 18 anos (F.P. nº1) ; que a Apelada foi a sua distribuidora apenas nos últimos cinco anos, de Outubro de 2009 a Março de 2015 (F.P. nºs 7 e 11) ; que durante esses anos de contrato, o volume anual de compras da Apelada à Apelante diminuiu em vez de aumentar (cfr. os respectivos valores no 40º F.P.); e finalmente que no mesmo período, o volume de vendas da Apelada em produtos da Apelante decresceu sempre ao longo dos cinco anos (cfr. os respectivos valores no nº 41º FP) III) Ou seja, a Apelada não aumentou o número de clientes nem aumentou o volume de negócios com os clientes já existentes pelo que não se encontra preenchido o primeiro dos requisitos cumulativos essenciais ao direito à indemnização por clientela. JJJ) Também não se verificou o segundo dos requisitos previstos no art 33º porquanto resultou provado (47º dos F.P.) que a mudança de distribuidor (da Apelada para o distribuidor seguinte “… – Global …”) implicou uma quase interrupção nas vendas dos 4 meses seguintes, ou seja, houve todo um trabalho de recuperação de clientes que teve de ser feito pelo novo distribuidor e que demorou todo esse tempo, com a perda de rendimento da distribuição em Portugal pela concedente. KKK) Ao ter ficado provado que houve 4 meses de quase interrupção de vendas depois do termo do contrato da Apelada (47º F.P.), não pode considerar-se preenchido o 2º pressuposto cumulativo do direito à indemnização por clientela. LLL) Quanto ao terceiro requisito (previsto na al. c) do artigo 33º do Regime de Agência), não tendo a A. alegado nem provado qualquer facto sobre tal matéria, também se entende que não ficou preenchido. MMM) No caso dos autos é manifesta a menos-valia que resultou da actuação da Apelada conforme resultou provado pela acentuada perda de clientes e diminuição de vendas durante os cinco anos de contrato, acrescida das perdas durante cerca de seis meses (nenhum encomenda realizada nos meses de Fevereiro e Março de 2015 acrescida de quatro meses de interrupção de vendas até à colocação dos produtos na rede de comercialização em Portugal). NNN) A indemnização de clientela reside na dependência técnica e económica que o concessionário apresente face ao principal e que, após a cessação do contrato, o coloca numa posição de especial fragilidade, ora nada a tal respeito ficou provado nos autos, senão vejamos: - a actividade da A. não se resumia à venda dos produtos de perfumaria da R. (6º F.P) - os contratos celebrados entre a A. e as superfícies incluíam outros produtos de outros fornecedores (14º, 15º, 16º e 17º F.P.) - não foi alegado nem provado que ao perder a distribuição dos produtos da Apelante, a Apelada perdesse irremediavelmente os clientes pelo carácter insubstituível dos produtos. - não foi alegado nem ficou provado que a Apelada no termo do contrato com a Apelante não pudesse continuar a venda de produtos de perfumaria similares e concorrentes aos da Apelante (aliás, no 52º F.P. ficou a constar a possibilidade de substituição dos produtos … por outros sucedâneos). OOO) A indemnização por clientela deve ser fixada em termos equitativos, com os limites impostos pelo regime dos arts. 33º e 34º do D.L. 178/86 e implica a ponderação segundo critérios e juízos de equidade, da globalidade das circunstâncias e dos factores de ordem quantitativa e qualitativa. PPP) Ao fixar a indemnização em € 47.500,00 (valor muito próximo do lucro anual médio de € 48.960,00 e, portanto, do máximo permitido pela lei) o Mmº Juiz não teve em consideração a menos valia trazida pela A. ao negócio da R. (provada pelos 40º, 41º, 42º e 43º dos F.P.) nem os factos provados elencados em CCCC) dos quais resulta que a actividade comercial da A. não estava na total dependência do contrato celebrado com a R., existindo muito mais para além deste. QQQ) O montante indemnizatório fixado pelo tribunal a quo – € 47.500,00, a ser devido, é claramente excessivo e desproporcional à intenção compensatória que norteia a indemnização de clientela e que cai numa clara intenção ressarcitória (o que vai além da própria lei). Da indemnização nos termos gerais: RRR) contrário do entendimento do douto tribunal “a quo”, considera-se que a conduta da Ré e as consequências da mesma na esfera jurídica da Apelada, não justificam uma indemnização com base no interesse contratual positivo e que o mesmo gera claramente um desequilíbrio e um benefício injustificado para a Apelada. SSS) A Autora, ora Apelada, não fez qualquer prova dos factos necessários para a indemnização pelo dano positivo sendo certo que não alegou sequer o carácter insubstituível dos produtos da R. nem a impossibilidade de fornecimento de outros produtos sucedâneos nem sequer a dificuldade em encontrar outro concedente que não a R. TTT) O contrato celebrado entre as partes não tinha prazo fixo (cfr. nº 10 dos F.A.) ou seja, era de duração indeterminada e como tal, poderia ser validamente denunciado com uma antecedência de apenas três meses, nos termos do art. 28º do D.L. 178/86 de 03 de Julho, com a redacção do D.L.118/93, de 03 de Abril, pelo que nunca a Apelada poderia ter uma expectativa de duração do contrato por mais dois anos, expectativa essa que aliás não provou. UUU) A denúncia era previsível e já se tinha aliás pré-anunciado pelo email de 24 de Julho de 2014 (ponto 39 dos F.P.) e com o agravamento das relações comerciais entre as partes e o “braço de ferro” criado a partir de Janeiro de 2015 com a recusa da Apelada em cumprir o pré-pagamento parcial das facturas e o pagamento das facturas entretanto vencidas em 22 de Fevereiro (Factos nº 32, 33, 34, 44, e 46) era totalmente previsível que o contrato não durasse mais tempo pelo que também por essa razão nunca teria a A. direito à indemnização pelos lucros cessantes. VVV) A douta decisão recorrida, com o devido respeito e salvo melhor opinião, fez errada aplicação do disposto nos arts. 516º, nº 6 e 461º, nº 2, do CPC; 429º, 780º, 428º, todos do Código Civil e arts. 30º, 33º e 24º do Decreto-Lei 178/86, de 03/07. WWW) Fundamento específico da recorribilidade – decisão proferida em acção com valor superior à alçada da 1ª instância, sendo decisão que põe termo à causa e que é desfavorável à R. Reconvinte e ora Apelante. XXX) Nestes termos e nos demais de Direito que Vossas Exas. doutamente se dignarão suprir, deverão as presentes alegações ser julgadas procedentes e consequentemente ser proferido douto Acórdão que concedendo provimento ao recurso e revogue a douta sentença recorrida na parte em que julgou parcialmente procedente os pedidos da A., substituindo-a por Acórdão que julgue os pedidos da Apelada totalmente improcedentes e não provados, deles absolvendo a Apelante. YYY) Assim fazendo esse Venerando Tribunal, como é seu timbre, a habitual Justiça. Pela A. foram apresentadas contra-alegações de recurso, nas quais pugna pela manutenção da decisão recorrida. Atenta a não complexidade das questões a dirimir foram dispensados os vistos aos Ex.mos Juízes Adjuntos. Cumpre apreciar e decidir: Como se sabe, é pelas conclusões com que a recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art. 639º, nº 1, do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem [1] [2]. Efectivamente, muito embora, na falta de especificação logo no requerimento de interposição, o recurso abranja tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável à recorrente (art. 635º, nº 3, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (nº 4 do mesmo art. 635º) [3] [4]. Por isso, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação da recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso. No caso em apreço emerge das conclusões da alegação de recurso apresentadas pela R., ora apelante, que o objecto do mesmo está circunscrito à apreciação das seguintes questões: 1º) Saber se foi incorrectamente valorada pelo tribunal “a quo” a prova (testemunhal e documental) carreada para os autos, devendo, por isso, ser alterada a factualidade dada como provada e não provada; 2º) Saber se devem ser considerados inteiramente válidos e eficazes os fundamentos invocados pela R. para a resolução do contrato celebrado entre as partes e, por via disso, a A. não terá direito a qualquer indemnização por tal resolução contratual. Antes de apreciar as questões supra enunciadas importa ter presente qual a factualidade apurada na 1ª instância que, de imediato, passamos a transcrever: 1) A sociedade “(…), S.A., doravante “(…)”, com sede em 6, Rue (…), Paris, França, tem por objecto comercial a produção e comercialização de produtos de perfumaria. 2) A sociedade “(…)” distribui os seus produtos de perfumaria em Portugal há mais de 18 anos (cfr. fls. 326 a 328). 3) Entre os anos de 2002 a 2009, a aquisição, promoção e distribuição em Portugal de produtos de perfumaria da sociedade “(…)” foi realizada, com exclusividade, pela sociedade “(…), S.A.”, doravante “(…)” (cfr. fls. 326 a 328). 4) A sociedade “(…)” foi absorvida por um grupo empresarial “(…), SGPS” e, posteriormente (em 2009), foi declarada insolvente (cfr. fls. 326 a 328). 5) Com a insolvência da sociedade “(…)” a sociedade “(…)” teve de procurar um novo distribuidor em Portugal, tendo a escolha recaído sobre a sociedade “(…) – Comércio de Produtos Alimentares, Farmacêuticos e Afins, S.A.”, doravante “(…)”, para onde transitaram alguns funcionários da “(…)” (cfr. fls. 326 a 328). 6) A sociedade “(…)”, com sede no Parque Industrial de (…), Lote 41, em (…), Portugal, tem por objecto comercial a importação, exportação, representação, distribuição e comércio por grosso de produtos alimentares, farmacêuticos e cosméticos, perfumes, produtos de higiene, drogaria e bijutaria. 7) No âmbito das respectivas actividades comerciais, a sociedade “(…)” e a sociedade “(…)”, acordaram verbalmente, em Outubro de 2009, no fornecimento, por parte desta sociedade, de produtos de perfumaria à sociedade “(…)”, a qual, em nome e por conta própria, os adquiria, promovia e distribuiria em Portugal com exclusividade (fls. 326 a 328). 8) No âmbito do acordo referido em 7), cabia à sociedade “(…)” assegurar o transporte dos produtos de perfumaria que vendia à sociedade “(…)” até à sede desta, à qual, por sua vez, cabia pagar o respectivo preço (cfr. fls. 326 a 328). 9) Como condições contratuais, acordaram as sociedades “(…)” e “(…)” a exclusividade na distribuição por esta sociedade, a obrigação de realizar pelo menos uma encomenda mensal e o prazo de pagamento de 150 (cento e cinquenta dias) a contar da data da emissão das respectivas factura. 10) A relação contratual entre as sociedades “(…)” e “(…)” não tinha prazo fixo e renovou-se sucessivamente até ao dia 16 de Março de 2015 (cfr. fls. 326 a 328). 11) No dia 16 de Março de 2015, a sociedade “(…)” comunicou por escrito, via email, à sociedade “(…)”, a cessação imediata do acordo descrito em 7), 8) e 9), com os seguintes fundamentos: 1) Perda de garantia (crédito “…”); 2) Falta de pagamento da factura n.º (…), vencida a 22 de Fevereiro; 3) Recusa da sociedade “(…)”, em realizar o pré-pagamento das facturas; e 4) Perda de confiança e degradação das relações comerciais (cfr. fls. 326 e 327, em parte). 12) Em resposta ao constante de 11), a sociedade “(…)” remeteu à sociedade “(…)”, através de advogado, carta registada, com aviso de recepção, datada de 24 de Março de 2015 e recebida pela sociedade “(…)” no dia 30.03.2015, na qual, além do mais, comunicou que considerava ilegal a cessação unilateral do acordo descrito em 7), 8) e 9), por infundada e violadora do prazo de pré-aviso adequado imposto por lei, bem como dos princípios da boa-fé e das regras da concorrência (cfr. fls. 326 a 328). 13) Desde o início do acordo descrito em 7), 8) e 9), a sociedade “(…)” angariou, para distribuição dos produtos de perfumaria da sociedade “(…)”, os clientes melhor identificados a fls. 31, 32 e 33, cujo conteúdo se dá por reproduzido. 14) Em 15 de Abril de 2014, a sociedade “(…)” celebrou, por tempo indeterminado, com a sociedade “(…) Portugal (…), S.A.”, doravante “(…)” um contrato de fornecimento de produtos do seu comércio, entre os quais se encontravam os produtos de perfumaria da sociedade “(…)”. 15) Em 3 de Março de 2014, a sociedade “(…)” celebrou, pelo prazo inicial de 1 (um) ano, automaticamente renovável, com a sociedade “(…), Hipermercados, S.A.”, um contrato de fornecimento de produtos do seu comércio, entre os quais se encontravam os produtos de perfumaria da sociedade “(…)”. 16) Em 24 de Setembro de 2014, a sociedade “(…)” celebrou, pelo prazo inicial de 1 (um) ano, com o grupo empresarial “Os (…)”, um acordo de parceria comercial, relativo ao fornecimento de produtos do seu comércio, entre os quais se encontravam os produtos de perfumaria da sociedade “(…)”. 17) Em 16 de Fevereiro de 2015, a sociedade “(…)” celebrou, pelo prazo de 1 (um) ano, automaticamente renovável, com a sociedade “(…) – Aquisição e fornecimento de bens e serviços CRL” (Supermercados …), um contrato de fornecimento de produtos do seu comércio, entre os quais se encontravam os produtos de perfumaria da sociedade “(…)”. 18) No âmbito da relação contratual estabelecida entre as partes, a sociedade “(…)” efectuou diversas encomendas de produtos de perfumaria à sociedade “(…)”, que esta facturou com vencimento a 150 (cento e cinquenta) dias (cfr. fls. 326 a 328). 19) Para efeitos de seguro de crédito das facturas a pagar pela sociedade “(…)”, a sociedade “(…)” contratou a sociedade “(…) – (…) Française d’Assurance pour le Commerce Extérieur”, doravante “(…)”, com sede em França (cfr. fls. 326 a 328). 20) A sociedade “(…)” foi avaliando o grau de solvabilidade da sociedade “(…)” para efeito de concessão de seguro de crédito, tendo, nos anos de 2013 a 2014, diminuído o rating da mesma (cfr. fls. 326 a 328). 21) Em Outubro de 2014 o seguro de crédito concedido pela “(…)” para as compras de produtos de perfumaria pela sociedade “(…)” à sociedade “(…)” ascendeu a € 200.000,00 (duzentos mil euros). 22) O “rating” da sociedade “(…)” junto da sociedade “(…)” aumentou no ano de 2015. 23) Em Julho de 2014, pela sociedade “(…)” foi promovido um despedimento colectivo, pelos fundamentos constantes de fls. 245 a 249, cujo conteúdo se dá por reproduzido, suprimindo 11 postos de trabalho. 24) No dia 3 de Julho de 2014, a sociedade “(…)” comunicou por escrito à sociedade “(…)”, via email, que tomou a decisão de continuar com a mesma, desde que fossem cumpridas as seguintes condições: a) o pagamento de todas as facturas pendentes em momento anterior ao envio da encomenda de Natal; b) realizar outra reunião antes do final do ano para preparar o ano de 2015; c) aumentar o volume de negócios e atingir os € 200.000,00 (duzentos mil euros) em 2014. 25) Por necessitar dos fornecimentos da sociedade “(…)” para cumprir compromissos assumidos com os seus clientes e demonstrar a sua capacidade financeira junto desta, a sociedade “(…)” cedeu a algumas das suas exigências, tendo procedido, no dia 22 de Agosto de 2014, ao pagamento antecipado do montante correspondente a metade da conta corrente, € 12.500,00 (doze mil e quinhentos euros) – (cfr. fls. 326 a 328, em parte). 26) Além disso, em Outubro e Dezembro de 2014, a sociedade “(…)” aceitou efectuar o pré-pagamento de 50% das encomendas, sendo que a de Dezembro veio depois a ser cancelada (cfr. fls. 326 a 328). 27) E, em Novembro de 2014, a sociedade “(…)” efectuou o pré-pagamento integral de duas facturas, no valor de € 22.179,40 (vinte e dois mil, cento e setenta e nove euros e quarenta cêntimos) e € 20.639,18 (vinte mil, seiscentos e trinta e nove euros e dezoito cêntimos) – (cfr. fls. 326 a 328). 28) Quanto à encomenda de Janeiro – factura n.º (…) – a sociedade “(…)” aceitou efectuar o pré-pagamento de 50% e o remanescente a 60 dias, conforme acordado telefonicamente entre o administrador desta sociedade (…), e o seu director financeiro, (…), por um lado, e a representante da sociedade “(…)”, (…), por outro (cfr. fls. 326 e 328). 29) Após a realização da encomenda de Janeiro, a sociedade “(…)” exigiu o pagamento a 40 dias, data coincidente com a do vencimento da factura (…), no valor de € 55.000,00 (cinquenta e cinco mil euros). 30) A sociedade “(…)” aceitou efectuar o pagamento da encomenda de Janeiro a 40 dias, tendo disso informado a sociedade “(…)” em telefonema de 9 de Janeiro de 2015 (cfr. fls. 326 a 328). 31) Em relação à encomenda de Fevereiro de 2015, a sociedade “(…)” aceitou pagar antecipadamente 50% e o remanescente a 60 dias, conforme solicitado pela sociedade “(…)” (cfr. fls. 326 a 328). 32) Em 06 de Fevereiro, já após a realização da encomenda de Fevereiro, a sociedade “(…)” exigiu à sociedade “(…)” o seu pagamento antecipado, sob pena de não envio dos produtos. 33) A sociedade “(…)” recusou a imposição descrita em 32), por entender não se coadunar com o acordo estabelecido anteriormente. 34) A sociedade “(…)” não efectuou qualquer pagamento antecipado e a sociedade “(…)” recusou-se a enviar a encomenda de Fevereiro, o que levou uma ruptura de stocks e à decisão de não pagamento da factura n.º (…) e do remanescente da factura n.º (…). 35) Não obstante, no dia 13 de Fevereiro de 2015, a representante da sociedade “(…)”, (…), reuniu com os representantes da sociedade “(…)”, tendo referido que estava muito satisfeita com o desempenho desta sociedade, propondo inclusivamente o lançamento de novos produtos. 36) Nesse mesmo dia, 13 de Fevereiro de 2015, a representante da sociedade “(…)”, (…), comunicou, por escrito, via email, a (…), legal representante da sociedade “(…)”, que as condições de pagamento acordadas previamente se mantinham: pagamento antecipado de 50% e o remanescente a sessenta dias, aceitando dar seguimento à encomenda de Fevereiro nessas condições (cfr. fls. 326 a 328). 37) A sociedade “(…)” recusou a proposta constante de 36) uma vez que a encomenda em questão se destinava ao dia de São Valentim, 14 de Fevereiro de 2015. 38) Em 12 de Fevereiro 2015, (…), na qualidade de representante da sociedade “(…)” visitou o grupo “(…)”, cliente da sociedade “(…)”, sem a informar. 39) Em momento anterior ao referido em 11), a sociedade “(…)” comunicou por escrito datado de 13 de Março de 2015 a clientes da “(…)”, como o grupo “(…)” e “(…)”, a alteração do seu distribuidor, com efeitos a partir de 1 de Abril de 2015, passando a distribuição da sua marca no mercado português a ser efectuada pela sociedade “(…) – Global (…)”. 40) O volume total anual de compras da sociedade “(…)” à “(…)”, entre os anos de 2010 a 2015, foi o seguinte: 2010: € 242.302,00; 2011: € 284.507,00; 2012: € 268.220,00; 2013: € 178.266,00; 2014: € 194.401,00; e 2015: € 13.743,00. 41) O volume total anual de vendas da “(…)” em produtos da sociedade “(…)”, entre os anos de 2010 a 2015, foi o seguinte: 2010: € 865.482,00; 2011: € 740.224,00; 2012: € 692.727,00; 2013: € 623.018,00; 2014: € 520.652,00; e 2015: € 153.221,00. 42) A margem média anual de lucro líquido de vendas da “(…)” em produtos da sociedade “(…)”, entre os anos de 2010 a 2014, foi de € 48.960,00 (quarenta e oito mil e novecentos e sessenta euros). 43) O número de clientes da sociedade “(…)” de produtos da sociedade “(…)” foi o seguinte: 2011: 98; 2012: 90; 2013: 84; e 2014: 64; 44) Em 17 de Fevereiro de 2015 encontrava-se pendente para pagamento, pela sociedade “(…)” à sociedade “(…)”, o montante total de € 62.364,58 (sessenta e dois mil, trezentos e sessenta e quatro euros e cinquenta e oito cêntimos), correspondente aos seguintes movimentos: € 55.033,58 (cinquenta e cinco mil e trinta e três euros e cinquenta e oito cêntimos) relativos à factura n.º (…), de 25.09.2014 e € 7.331,00 (sete mil trezentos e trinta e um euros) relativos a parte da factura n.º (…), de 15.01.2015. 45) Eliminado (cfr. despacho do M.mo Juiz “a quo”, datado de 14/3/2019). 46) Relativamente à quantia descrita em 44), a sociedade “(…)” acionou o seguro de crédito junto da “(…)”, tendo recebido desta a quantia de € 48.830,22 (quarenta e oito mil, oitocentos e trinta euros e vinte e dois cêntimos). 47) A sociedade “(…)” transmitiu para a sociedade “(…) – Global (…)” os clientes que antes adquiriam os seus produtos à sociedade “(…)”, tendo a mudança de distribuidor implicado uma quase interrupção nas vendas nos meses de Março, Abril, Maio e Junho de 2015 (cfr. fls. 326 a 328). 48) Em consequência do descrito em 11) a sociedade “(…)” sofreu penalizações, por não entregas, concretamente: da “(…)” referente ao 2.º trimestre 2015, no valor total de € 7.364,01 correspondendo aos produtos da Ré o valor de € 176,16; da (…), no valor de € 8.070,00 no que diz respeito aos produtos da Ré (2015). 49) No início de cada ano, a sociedade “(…)” tem de efectuar um pagamento não reembolsável à (…) por acções promocionais, sendo tal valor fixado em função das projecções de venda de cada produto. 50) No ano de 2015, a sociedade “(…)” suportou o pagamento de € 86.751,00, acrescido de IVA, por não ter adequado as projecções de venda, por falta de pré-aviso. 51) Considerando a margem da sociedade “(…)”, o dano sofrido pela sociedade “(…)” foi de € 10.306,00 (11,88% de € 86.751,00), acrescido de IVA, no total de € 12.676,40 (doze mil, seiscentos e setenta e seis euros e quarenta cêntimos). 52) A falta de pré-aviso impossibilitou que a sociedade “(…)” pudesse diligenciar por negociar a substituição dos produtos da “(…)” por outros sucedâneos, com vantagem para o novo distribuidor da Ré, ascendendo tais danos a € 20.922,56. 53) Alguns dos clientes da sociedade “(…)” em produtos da “(…)”, já adquiriam produtos desta, em data anterior a Outubro de 2009, através da distribuidora “(…)”. 54) Com a insolvência da sociedade “(…)”, a sociedade “(…)” deixou de vender os seus produtos no mercado português por alguns meses, tendo a sociedade “(…)”, após Outubro de 2009, de recuperar todos os antigos clientes de produtos daquela sociedade, mediante de novas negociações e novos contratos, captando, ainda, como novos clientes em produtos da Ré, o “(…)”, “(…)”, (…)”, “(…)” e “(…)”. 55) Entre os anos de 2011 e 2014, os clientes da sociedade “(…)” em produtos da sociedade “(…)” foram os descritos a fls. 467 e 468, cujo conteúdo se dá por reproduzido. 56) No dia 16 de Março de 2015 encontrava-se já negociada e acordada pela sociedade “(…)” a entrada dos produtos de perfumaria da Ré em 58 novas lojas do “(…)”, onde actualmente se encontram à venda, através do novo distribuidor, sociedade “(…)”. 57) Nos finais de Janeiro, inícios de Fevereiro de 2015, a sociedade “(…)” contactou a sociedade “(…)” para que esta assumisse a qualidade de distribuidora dos seus produtos no mercado português. 58) A sociedade “(…)” é gerida por (…). 59) (…) foi funcionário da sociedade “(…)” até ao ano de 2009, altura em que passou a ser consultor da sociedade “(…)”. 60) (…) intermediou, juntamente com (…), a entrada da sociedade “(…)” no portfólio da sociedade “(…)”. 61) No início de 2011 (…) passou a exercer as funções de Director Comercial da sociedade “(…)”, cessando as suas funções em 31.08.2014, na sequência de despedimento colectivo. 62) (…) exigiu à sociedade “(…)” que informasse o mercado da entrada da sua sociedade como distribuidora no mercado português, o que justificou a remessa aos seus clientes do documento de fls. 189. 63) No dia 14.10.2019 a sociedade “(…)” remeteu à sociedade “(…)” o email junto a fls. 676, cujo conteúdo se dá por reproduzido. 64) No dia 9.11.2019 a sociedade “(…)” remeteu à sociedade “(…)” o email junto a fls. 677, cujo conteúdo se dá por reproduzido. 65) Por decisão proferida no dia 27.08.2018 no âmbito do processo n.º 1207/18.0T8MMN, do Juízo de Competência Genérica de Montemor-o-Novo, foi declarada a insolvência da “(…) – Comércio de Produtos Alimentares, Farmacêuticos e Afins, S.A.”. Apreciando, de imediato, a primeira questão suscitada pela R., ora apelante – saber se foi incorrectamente valorada pelo tribunal “a quo” a prova (testemunhal e documental) carreada para os autos, devendo, por isso, ser alterada a factualidade dada como provada e não provada – importa referir a tal propósito que a sindicância da matéria de facto só pode ser exercida pelo Tribunal da Relação nos termos referidos no art. 662º do C.P.C.. Por isso, atento o disposto no nº 1 da referida disposição legal a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa, sendo de salientar que, nesta matéria, o legislador não se contentou com uma mera faculdade – como, por exemplo, “podiam dar lugar”, em vez de “impunham” – mas antes consagrando um verdadeiro imperativo! A R. sustenta aquela a sua pretensão, de alteração da factualidade dada como provada e não provada, tendo por base os depoimentos das testemunhas inquiridas em audiência de julgamento, bem como em diversos documentos juntos aos autos e no relatório pericial de fls. 457 e segs. Por sua vez, o art. 640º do C.P.C. especifica ou concretiza quais os ónus que incumbem ao recorrente quando pretender impugnar a matéria de facto, sendo que, no caso dos presentes autos, houve gravação dos depoimentos testemunhais prestados e, por isso, a recorrente podia impugnar, com base neles, a decisão da matéria de facto, seguindo, naturalmente, as regras impostas pelo citado art. 640º. Todavia, não obstante afirmar-se que o registo de prova produzido em audiência tem por fim assegurar um verdadeiro e efectivo 2º grau de jurisdição na apreciação da matéria de facto, a realidade, como todos sabemos é bem diferente, já que “nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência, visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta de recurso”[5]. A recorrente põe em causa a objectividade de apreciação dos factos materiais que a Mma. Juiz “a quo” manteve como razão da sua convicção/decisão, designadamente os depoimentos das testemunhas ouvidas em audiência de julgamento, não obstante o princípio da livre apreciação da prova pelo julgador, consignado expressamente na lei – cfr. art. 607º, nº 5, do C.P.C.. Ora, ao tribunal de 2ª instância não é lícito, de todo, subverter o principio da livre apreciação da prova devendo, tão só, circunscrever-se a apurar da razoabilidade da convicção probatória do primeiro grau dessa mesma jurisdição, face aos elementos que agora lhe são apresentados nos autos e, a partir deles, procurar saber se a convicção expressa pelo tribunal de 1ª instância tem suporte razoável naquilo que a prova testemunhal escrita e em outros elementos objectivos neles constantes, pode exibir perante si, sendo certo, que se impõe ao julgador que indique “os fundamentos suficientes para que, através da regras de ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade d(aquel)a convicção sobre o julgamento de facto como provado ou não provado”[6]. Assim, a constatação de erro de julgamento no âmbito da matéria de facto, impõe que se tenha chegado à conclusão que a formação da decisão devia ter sido em sentido inverso daquele em que se julgou, emergindo “de um juízo conclusivo de desconformidade inelutável e objectivamente injustificável entre, de um lado, o sentido em que o julgador se pronunciou sobre a realidade de um facto relevante e, de outro lado, a própria natureza das coisas”[7]. Em suma, o que a lei visa ao permitir às partes e ao facultar-lhes a possibilidade processual de impugnação da decisão relativa à matéria de facto, no segmento que vimos a analisar, é a correcção, pelo Tribunal “ad quem”, do erro de julgamento quanto a um determinado ponto de facto, por a prova produzida, como expressamente nos diz a lei, impor decisão diversa à encontrada pelo Tribunal “a quo”. Aliás, atentos os meios técnicos em que são documentados os depoimentos prestados em julgamento, não poderia o legislador ter outro desiderato, ao facultar às partes a impugnação da decisão relativa à matéria de facto, do que restringir essa impugnação aos erros de julgamento. Na verdade, do teatro do julgamento, o Tribunal “ad quem” apenas tem acesso à sua versão radiofónica, o que não lhe permite uma avaliação cabal do desempenho dos diversos actores, dado que, como sabemos, a expressão corporal desses actores é importante, não só por si, mas na interligação com os restantes actores processuais, para a avaliação do seu desempenho no âmbito dos poderes de livre apreciação destes meios de prova pelo Tribunal “a quo”. E, como sabemos, cada vez mais, os Srs. Juízes da 1ª Instância, evidenciam a importância da análise comportamental dos depoentes e da sua interligação com os restantes actores processuais, para avaliarem a relevância de um determinado depoimento, no âmbito do cômputo geral da apreciação dos meios de prova produzidos. Ora, a percepção desta face de um depoimento, muitas das vezes tão importante para a sua valorização, está vedada ao Tribunal “ad quem”, que não tem acesso, de todo, à visualização dos depoimentos produzidos, o que vem reforçar a tese restritiva que vimos equacionando quanto ao âmbito e limites da impugnação da decisão relativa à matéria de facto. Concluindo, a impugnação da decisão relativa à matéria de facto, apenas deve proceder, quando o recorrente demonstrar, com evidência, através de um juízo crítico sobre todas as provas produzidas sobre um determinado ponto de facto, que esses meios de prova impunham, de forma clara, uma decisão diversa sobre determinado ponto de facto, patenteando assim o erro de julgamento do Tribunal “a quo” sobre essa concreta matéria. Ora, no caso em apreço, a matéria de facto dada como provada e não provada mostra-se fundamentada, de forma exaustiva, na sentença recorrida, com a indicação dos vários depoimentos testemunhais, bem como da prova documental e pericial relevante para tal. Da análise global e integral dos depoimentos de todas as testemunhas inquiridas, após audição das respetivas gravações, conexionados com a análise crítica da prova efectuada com base nos documentos juntos aos autos e no relatório pericial (fls. 457 e segs.), entendemos que tais elementos probatórios não consentem as pretendidas modificações, pois, deles não se pode retirar a conclusão de ter havido erro de julgamento, por parte do Julgador a quo, erro esse traduzido na desconformidade inexorável e flagrante entre os elementos probatórios e a decisão. E, quando esses elementos são de carácter testemunhal, deve dar-se posição de primazia, relativamente à apreciação da credibilidade dos depoimentos e dos outros elementos probatórios, ao Julgador a quo, que deteve a possibilidade de ouvir, perante si, os relatos das pessoas inquiridas, de confrontar os seus depoimentos com os outros elementos documentais existentes nos autos, isto não obstante a valoração diferente que possa ser dada aos mesmos por terceiros – nomeadamente pela R., aqui recorrente – que lhe possibilita chegar a conclusões divergentes das do Julgador “a quo”. Não podemos olvidar o que é dito por quem, em sede de audiência de julgamento, analisou criticamente as provas segundo o seu prudente e livre arbítrio, conforme a lei lhe faculta, sendo que, o Mmº Juiz “a quo” que presidiu ao julgamento se mostrou interventivo no decorrer da audiência, procurando esclarecer-se acerca do conteúdo de cada um dos depoimentos testemunhais, não deixando que as instâncias se tornassem repetitivas e que as perguntas não incidissem sobre factos que as mesmas tivessem tido conhecimento (directo ou indirecto) procurando aferir da sua razão de ciência, com vista à valoração das respectivos depoimentos, em conjugação com a restante prova (documental e pericial) carreada para os autos. Com efeito, não será demais repetir que, na sustentação sobre a matéria de facto dada como provada e não provada o Mmº Juiz “a quo” mostrou-se convincente quanto à certeza da sua decisão e porque, em sua convicção, era de dar credibilidade aos depoimentos prestados por algumas das testemunhas inquiridas em audiência de julgamento e ainda aos documentos juntos aos autos e ao relatório pericial de fls. 457 e seguintes, no sentido, aliás, em que foi consignado na respectiva motivação da sentença recorrida (cfr. fls. 840 a 843). Por isso, dos elementos probatórios documentais, pericial e testemunhais que nos foi dado apreciar, desde já diremos que não obstante as objecções levantadas pela recorrente, não podemos deixar de corroborar a motivação expressa pelo Julgador “a quo”, em que analisou criticamente os elementos probatórios supra referidos, concluindo por firmar a sua convicção, que, quanto a nós, se mostra correcta, ajustada e adequada ao caso concreto em discussão. Aliás, sempre se dirá que, após a audição da gravação dos depoimentos das testemunhas inquiridas em julgamento, e tendo em conta o teor dos documentos juntos aos autos e do relatório pericial de fls. 457 e segs., é nosso entendimento não assistir razão à recorrente, pois torna-se evidente que o juízo formulado pelo Julgador “a quo” é o que se mostra mais consentâneo com a realidade, pelo que a análise crítica da prova que foi efetuada por aquele merece a nossa plena e total concordância. Assim, no que concerne ao ponto 13 dos factos provados, que a R. pretende que obtenha resposta negativa, importa salientar que tal factualidade foi expressamente referida pelas testemunhas … (director financeiro da A.) e … (gerente da A.), os quais com clareza, isenção e objectividade, demonstrando total credibilidade nos seus depoimentos, afirmaram que foi a A. que angariou todos os seus clientes. Isto porque a anterior distribuidora da R. havia sido declarada insolvente, tendo perdido todos os clientes e, por isso, nos meses seguintes, a R. não teve distribuidor em Portugal, tendo sido interrompido o fornecimento dos seus produtos. Deste modo, resulta claro que todos os anteriores clientes foram perdidos, tendo a A. a difícil missão de os ter recuperado um a um, o que conseguiu, além de ter angariado clientes novos como o (…) e o (…). Aliás, a lista de clientes que a testemunha (…) referiu e apresentou em tribunal é sensivelmente idêntica aquela que consta de fls. 31 a 33, pelo que se mantem a resposta dada ao ponto 13 dos factos provados. Quanto ao ponto 22 dos factos provados, apenas se dirá que a R. não indica, em concreto, qual a resposta que entende que devia ser dada ao mesmo, incumprindo, assim, o disposto na alínea c) do nº 1 do art. 640º do C.P.C. o que acarreta a rejeição do recurso nesta parte. Todavia, sempre se dirá que tal factualidade é inócua e irrelevante para o caso em apreço, uma vez que não ficou provado nos autos que o seguro de crédito acordado entre as partes fosse um requisito imprescindível para o contrato entre ambas celebrado. Relativamente ao ponto 37 dos factos provados, que a R. pretende que obtenha resposta negativa quanto à sua 2ª parte (no trecho: “uma vez que a encomenda em questão se destinava ao dia de S. Valentim, 14 de Fevereiro de 2015”), a testemunha … (gerente da A.) afirmou convictamente que havia perda de interesse na encomenda, em virtude da impossibilidade de assumir os compromissos do dia de S. Valentim (14 de Fevereiro), pois a entrega dos produtos não tinha sido feita até ao dia 6 de Fevereiro. Assim, naquela data (13 de Fevereiro) a encomenda já só podia interessar à A., desde que fosse permitido refazer e corrigir a mesma com outros produtos, pelo que é de manter a resposta dada ao ponto 37 dos factos provados. No que respeita ao ponto 47 dos factos provados, que a R. pretende que obtenha resposta negativa quanto à sua 1ª parte (no trecho: “a sociedade … transmitiu para a sociedade … os clientes que antes adquiriam os seus produtos à sociedade …”), resulta dos depoimentos de … (director financeiro da A.) e de … (gerente da A.) que, em síntese, afirmaram que todos os clientes em mercado nacional foram angariados pela A., sendo que a R. continua a trabalhar com eles através de outro distribuidor (a …), tendo sido corroborado, também, pelo depoimento prestado pela testemunha … (consultor da A.). Assim, resulta claro que deve ser mantida a resposta dada ao ponto 47 dos factos provados. Quanto ao ponto 48 dos factos provados, que a R. pretende obtenha resposta negativa, apenas se dirá que tal factualidade foi confirmada pelos depoimentos das testemunhas já acima mencionadas, (…), (…) e (…), que referiram que há uma penalização nos contratos por não entrega de mercadoria, um percentual sobre a encomenda ou os produtos que estão em falta, sendo certo que aquilo que aqui está em causa é apenas a prova da aplicação de penalizações e já não o seu pagamento. Nestes termos, é de manter a resposta dada ao ponto 48 dos factos provados. Em relação aos pontos 50 e 51 dos factos provados, que a R. pretende que obtenham respostas negativas, importa dizer que essa factualidade veio a ser inteiramente confirmada pelos depoimentos das testemunhas (…) e (…), acima referidas, que, sem margem para dúvidas e de uma forma convincente esclareceram como eram efectuados tais pagamentos e que constam, aliás, da documentação contabilística da A. Por isso, devem ser mantidas as respostas dadas aos pontos 50 e 51 dos factos provados. No que tange ao ponto 54 dos factos provados, que a R. pretende que obtenha resposta negativa quanto à sua parte final (no trecho: “captando ainda, como novos clientes em produtos da Ré, o …, …, …, … e …”), haverá que salientar, mais uma vez, o depoimento seguro e convincente da testemunha … (gerente da A.), o qual afirmou que (antes da A. ser distribuidora da R.), havia clientes onde a R. não estava, como o (…) e o (…), clientes importantes, e ainda clientes mais pequenos, loja a loja, como (…) e (…), todos angariados pela A. Assim sendo, é de manter a resposta dada ao ponto 54 dos factos provados. Relativamente ao ponto 56 dos factos provados, que a R. pretende que obtenha resposta negativa quanto à sua parte final (no trecho: “onde actualmente se encontram à venda, através do novo distribuidor …”), importa chamar à colação, uma vez mais, os depoimentos das testemunhas já supra identificadas, (…), (…) e (…), os quais confirmaram já ter observado, actualmente, nas lojas do (…), a venda dos produtos de perfumaria da R., os quais aí serão distribuídos, necessariamente, pelo novo distribuidor da R. (a …). Por isso, também aqui, será de manter a resposta dada ao ponto 56 dos factos provados. No que respeita aos factos dados como “não provados”, pretende a R. que seja dado como provado o seguinte facto: - Os 130 clientes constantes da lista de fls. 31 a 33, mais de 95% eram já clientes da sociedade (…) em data anterior a 2009, através da anterior distribuidora. Ora, a propósito de tal factualidade importa ter presente que foi mantido o ponto 13 dos factos provados, impugnado expressamente pela R., no qual é afirmado exactamente o contrário daquilo que consta do facto supra transcrito, ou seja, que foi a A. que angariou todos os seus clientes. Com efeito, o facto acima transcrito não foi comprovado por qualquer documento, nem houve qualquer testemunha que fizesse tal afirmação, pelo que o mesmo não pode, de todo, ser dado como provado. Além disso, também dos factos dados como “não provados”, pretende a R. que seja dado como provado mais o seguinte facto: - O rating junto da (…) era condição/pressuposto do vencimento das facturas a 150 dias. Sobre esta factualidade foram inquiridas as testemunhas (…) e (…), já acima identificadas, respectivamente director financeiro e gerente da A., os quais afirmaram, de forma totalmente convincente e peremptória, que jamais o alegado rating junto da (…) fosse um requisito indispensável para o prazo de vencimento acordado para o pagamento das facturas a 150 dias. Aliás, também o depoimento da testemunha … (funcionária da R.), a respeito de tal matéria, ou seja, sobre o contrato em causa nestes autos, não foi claro, denotando cansaço e o seu depoimento foi assaz inseguro, confuso e até impreciso, rematando sempre com a estratégia seguida em geral pela sociedade R. e não sobre este caso em concreto. Por outro lado, os emails mencionados pela R. apenas provam que foi solicitada a remessa dos elementos contabilísticos da A. para efeito do seguro de crédito e que os mesmos foram remetidos, sendo certo que solicitar a avaliação financeira de uma empresa e o seu rating não equivale – de todo – a fazer depender o prazo de vencimento das facturas da existência ou inexistência de rating. Assim sendo, resulta claro que o facto acima transcrito não foi comprovado por qualquer documento, nem houve qualquer testemunha que fizesse tal afirmação, pelo que o mesmo não pode, também, ser dado como provado. Finalmente, no que tange aos factos dados como “não provados”, pretende ainda a R. que seja dado como provado mais o seguinte facto: - Em 5/3/2015 a sociedade (…) solicitou pela última vez seguro de crédito à (…) para os débitos da sociedade (…), no entanto foi recusado face à cada vez maior fragilidade financeira desta. Em relação a esta factualidade os depoimentos das testemunhas (…) e (…) foram contraditórios entre si (sendo o desta última assaz hesitante e inseguro), pois o primeiro afirmou que o rating da A. ia aumentar em Março de 2015 – o que resulta confirmado no ponto 22 dos factos provados – enquanto a segunda veio dizer que o crédito foi recusado. No entanto, não será demais aqui repetir que, não estando provado que o seguro de crédito era requisito indispensável ao contrato celebrado entre as partes, a (eventual) recusa de crédito pela (…) é um facto inócuo e irrelevante para estes autos, pelo que o facto supra transcrito também não poderá ser dado como provado. Por outro lado, vem ainda a R. sustentar que sejam aditados factos novos, alegados pelas partes nos articulados (não elencados nos factos “não provados”), aditamento a ser efectuado aos factos dados como provados na sentença recorrida. Assim, o primeiro facto a aditar seria o seguinte: - A partir de finais de Outubro de 2014 o seguro de crédito concedido pela sociedade (…) para as compras de produtos de perfumaria pela sociedade (…) à sociedade (…) passou de duzentos mil euros para zero euros. No que respeita a este facto apenas se reafirma tudo aquilo que já foi dito quanto ao facto anterior supra descrito (o qual a R. pretendia que passasse de “não provado” para “provado”). Com efeito, além dos depoimentos das testemunhas (…) e (…) terem sido contraditórios entre si, a verdade é que, não estando provado que o seguro de crédito era um dos pressupostos contratuais, o valor do crédito a suportar pela (…) é um facto irrelevante para os presentes autos. Por isso, tal facto não pode ser aditado aos factos provados constantes da sentença recorrida. Vem a R. solicitar, também, que seja aditado um facto novo à factualidade apurada na sentença recorrida, que é o seguinte: - O teor de dois e-mails remetidos pela R. à A. que foram trazidos aos autos pela testemunha (…). Todavia, os emails em causa apenas provam que foram solicitados e remetidos elementos contabilísticos da A. para a (…), em 2009, quando da celebração do contrato entre A. e R., tendo sido feito um seguro de crédito com a (…), a qual avaliava a saúde financeira da A., sendo certo que, como já anteriormente foi afirmado, tal facto, relativos ao seguro de crédito (que não era um requisito indispensável ao contrato celebrado entre as partes), é inteiramente inócuo para a decisão a proferir nestes autos. Assim, pelas razões acima expostas, o facto supra transcrito não deve ser aditado aos factos provados constantes da sentença recorrida. Por último, com base em dois emails de 4/3/2015 – juntos pela R. com as suas alegações de recurso – pretende esta que sejam aditados 2 factos novos à factualidade apurada na sentença recorrida, a saber: - Existiram diversas tentativas da R. em obter o pagamento das facturas e a quebra de confiança verificada ocorreu com a falta de pagamento da A. - Caso a A. tivesse pago as facturas em dívida à R., em Março de 2015 – factura do Natal e 50% da factura de Janeiro – a R. manteria o vínculo de distribuição com a A. Ora, a este respeito apenas se dirá que os dois emails em causa foram mandados desentranhar dos autos, por não se verificarem os requisitos a que alude o art. 651º, nº 1, do CPC, por despacho proferido pelo aqui relator em 25/9/2019, já devidamente transitado em julgado. Deste modo, a factualidade acima descrita não se poderá basear em prova documental que, nem sequer, consta actualmente dos presentes autos. Além disso, não resultou provado que a A., em algum momento, tivesse ultrapassado o prazo de 150 dias (contratualizado entre as partes) para pagamento das facturas à R. Finalmente, no que tange ao último dos 2 factos supra transcritos (relativo à manutenção do vínculo de distribuição pela R) importa salientar que o mesmo está em total contradição com o ponto 57 dos factos provados, o qual – de todo – não foi impugnado pela R. pela presente via recursiva. Na verdade, se a R. já estava em negociações com o novo distribuidor (para substituir a A.), em inícios de Fevereiro de 2015, é total inverosímil que a R. ainda quisesse manter o vínculo com A. em Março de 2015 (ou seja, um mês depois…), se esta lhe viesse a pagar as facturas em dívida (factura do Natal e 50% da factura de Janeiro). Por isso, atentos os fundamentos supra referidos, os dois factos acima transcritos não devem ser aditados aos factos provados constantes da sentença recorrida. Assim sendo, forçoso é concluir que, após a audição das gravações relativas aos depoimentos testemunhais prestados em julgamento, nada nos permite afastar a convicção criada no espirito do julgador do tribunal recorrido, convicção essa que não é merecedora de qualquer reparo, porque perfeitamente adequada à prova produzida, corroborando-se, por inteiro, a fundamentação efetuada pelo Mmº Juiz “a quo” na decisão sobre a matéria de facto – para quem teve, aliás, o privilégio da imediação (o que, repete-se, não se verifica, de todo, neste Tribunal Superior) – não relevando, de todo, a apreciação crítica da prova que nos é dada pela recorrente. Por outro lado, devemos ter em consideração que não se pode deixar de reconhecer que a lei atribui a posição de primazia na valoração da prova ao Julgador “a quo” – e não às partes – que a aprecia livremente segundo a sua prudente convicção, uma vez que os meios de prova em causa nestes autos são, todos eles, de livre apreciação (cfr. art. 607º, nº 5, do C.P.C.) – sublinhado nosso. Por último, importa aqui repetir – uma vez mais – que só perante uma situação de flagrante desconformidade entre os elementos de prova e a decisão é que haverá erro de julgamento, situação essa que não ocorre quando estamos na presença de elementos de prova contraditórios, pois nesse caso entendemos dever prevalecer a resposta dada pelo tribunal “a quo”, por estarmos no domínio e âmbito da convicção e da liberdade de julgamento (cfr. art. 607º, nº 4, do C.P.C.) que não compete a este tribunal “ad quem” sindicar, a não ser que efetivamente a desconformidade entre os elementos de prova e a decisão a que se chegou, seja manifesta, o que, como vimos, não veio – de todo em todo – a suceder “in casu”. Em suma, diremos que estando a factualidade apurada e não apurada, devidamente fundamentada, não se revelando arbitrária nem discricionária, estando, quanto a nós, em conformidade com o que resulta da prova registada em áudio, conjugada com a prova documental carreada para os autos, entendemos não proceder, de todo, a qualquer modificação da factualidade que vem dada como provada e não provada, tal como era pretendido pela R., aqui recorrente. Deste modo, pelas razões e fundamentos acima explanados, forçoso é concluir que improcede totalmente esta primeira questão suscitada pela R., ora apelante, mantendo-se integralmente toda a factualidade que veio a ser apurada no tribunal “a quo” – e que consta da sentença recorrida – a qual, aliás, se mostra transcrita supra (cfr. fls. 21 a 30 deste aresto). Analisando agora a segunda questão levantada pela R., ora apelante – saber se devem ser considerados inteiramente válidos e eficazes os fundamentos por aquela invocados para a resolução do contrato celebrado entre as partes e, por via disso, a A. não terá direito a qualquer indemnização por tal resolução contratual – haverá, desde já, que dizer a tal respeito que, da factualidade apurada nos autos, resulta que entre as partes foi celebrado um contrato de concessão comercial. Ora, como é sabido, «o contrato de concessão comercial não beneficia de um regime jurídico próprio»[9]. «É, nessa medida, um contrato legalmente atípico, pese embora a tipicidade social de que goza». O que põe imediatamente o problema de saber qual o regime jurídico que se lhe deve aplicar. «Como qualquer contrato, é de atender, antes de mais, às próprias cláusulas acordadas pelos contraentes, desde que lícitas»[10] [11]. «Serão também de ter em conta, designadamente, os princípios e as regras gerais do direito dos contratos e do negócio jurídico (sobre a capacidade dos sujeitos, a declaração negocial sem anomalias, a idoneidade do objecto, etc.), o regime das cláusulas contratuais gerais (se o contrato tiver sido concluído através de cláusulas desta índole) e (sendo caso disso) a legislação de defesa da concorrência»[12] [inicialmente o Decreto-Lei nº 422/83, de 3 de Dezembro, e, actualmente, o Decreto-Lei nº 371/93, de 29 de Outubro, que revogou o primeiro; do mesmo modo, haverá que tomar em conta, neste âmbito, a legislação comunitária, quer os arts. 85º e 86º do Tratado de Roma, quer os vários Regulamentos existentes neste domínio]. Finalmente, «é metodologicamente correcto, perante um contrato legalmente atípico, atender às regras dos contratos mais próximos, às regras daqueles contratos que tenham a sua disciplina fixada na lei e possam aplicar-se ao contrato de concessão por analogia»[13]. Nesta sede, tanto a doutrina nacional, como a jurisprudência vêm entendendo, consensualmente, «ser o contrato de agência aquele cujo regime se mostra mais vocacionado, à partida, para se aplicar ao contrato de concessão»[14]. De resto, «é significativo que o Preâmbulo do Decreto-Lei nº 178/86 [de 3 de Julho, que fixou o regime jurídico do contrato de agência] dê expressamente conta da posição que põe em relevo “a necessidade de se lhe aplicar, por analogia – quando e na medida em que se verifique –, o regime da agência, sobretudo em matéria de cessação do contrato”»[15]. Sabendo-se que, nos termos do art. 24º do cit. DL. nº 178/86, “o contrato de agência pode cessar por: a) Acordo das partes; b) Caducidade; c) Denúncia; d) Resolução”, esta regra vale, com toda a naturalidade, para qualquer contrato de distribuição e, portanto, também para o contrato de concessão comercial[16] (como o dos autos). Ora, segundo a mais qualificada doutrina – representada, entre nós, por António Pinto Monteiro –, «esta indemnização poderá ainda beneficiar outros sujeitos, como os concessionários e os franquiados, sempre que a analogia se verifique»[19]. «É que os contratos de concessão e de franquia envolvem, frequentemente, como sabemos, uma actividade e um conjunto de tarefas similares às da agência, estando os contraentes unidos, de modo idêntico, por relações de estabilidade e de colaboração e comungando de um objectivo comum»[20]. Porém, as normas do contrato de agência não se aplicam, indiscriminada ou automaticamente, ao contrato de concessão, só se lhe devendo aplicar quando e na medida em que a analogia se verifique. De modo que, como, no contrato de concessão, há elementos cuja intensidade é muito variável, a indemnização de clientela pode justificar-se nuns casos e noutros não[21]. «Tudo passa, assim, num primeiro momento, por averiguar, em cada caso concreto, se o distribuidor, pese embora juridicamente actue por conta própria, desempenhou funções, cumpriu tarefas e prestou serviços semelhantes aos de um agente, em termos de ele próprio considerar-se, pela actividade que exerceu, como um relevante factor de atracção da clientela»[22]. «A sua (maior ou menor) integração na rede do concedente ou do franquiador, as obrigações (mais ou menos extensas, mais ou menos intensas) que assume em ordem à prossecução e defesa dos interesses deste, os deveres de informação a seu cargo e de respeito pelas instruções que dele recebe, o tipo de bens distribuídos, etc., serão, para este efeito, elementos importantes a considerar»[23]. «Se, ponderados todos esses factores, for de concluir, no caso concreto, pela equiparação de determinado concessionário ou franquiado, atenta a actividade exercida, a um agente, estarão removidas as primeiras dificuldades à aplicação analógica do regime da agência – e, portanto, à atribuição aos primeiros da indemnização de clientela que a lei prevê a favor do agente»[24]. «Há que averiguar, porém, num segundo momento, se a norma que se convoca é adequada ou se ajusta ao contrato de concessão»[25]. «Em primeiro lugar, há que ver se a clientela foi angariada pelo agente ou se houve um aumento substancial do volume de negócios; em segundo lugar, importa apurar se e em que medida, no futuro, o principal irá beneficiar dessa clientela ou dessa actividade do agente»[26]. É que, enquanto, no contrato de agência, quem contrata com os clientes é o principal (não o agente) ou é o agente mas por conta e em nome do principal (art. 2º do cit. DL. nº 178/86), diversamente, no contrato de concessão, é o concessionário quem celebra os contratos com os clientes e fá-lo em seu nome e por sua conta. Daí que, enquanto no primeiro caso, cessando o contrato, a clientela fica automaticamente ao dispor do principal; já no segundo caso, tal não sucede, não tendo o concedente meios jurídicos de vir a aproveitar-se dos clientes após a cessação do contrato, por isso que eles seriam clientes do concessionário, e não do concedente. Eis por que – segundo Pinto Monteiro[27] – a jurisprudência alemã exige que o contrato vincule o concessionário a transferir a clientela para o concedente. «Mas este requisito tem-se vindo a esbater bastante, dando-o a jurisprudência por verificado se, no decurso do contrato, o concedente tiver acesso aos dados da clientela em poder do concessionário através do cumprimento, por este último, de deveres contratuais com esse alcance, em termos tais que a clientela fique acessível ao concedente quando findar a relação deste com o concessionário». Ora – sempre segundo Pinto Monteiro[28] -, o destino da clientela após o termo do contrato constitui, efectivamente, «um aspecto fundamental a ter em conta, pois não é razoável compensar o agente/distribuidor pelo que fez no passado senão na medida em que se preveja que isso virá a repercutir-se directamente, no futuro, em benefício do principal/concedente/franquiador». «Mas para que essa preocupação seja respeitada e este requisito legal cumprido bastará que, no termo do contrato, o concedente ou o franquiador tenham efectivo acesso à clientela angariada pelo distribuidor, sem que isso deva resultar de uma qualquer obrigação prevista no contrato»[29]. Em conclusão: «Parece, em suma, dentro do duplo condicionalismo analisado, que será de atribuir ao concessionário e ao franquiado a indemnização de clientela prevista no art. 33º do Decreto-Lei nº 178/86, por aplicação analógica desta norma»[30]. Assim sendo, os requisitos positivos, a provar pelo agente, de que depende a atribuição ao mesmo da chamada indemnização de clientela estão consagrados nas alíneas a), b) e c) do nº 1 do art. 33º do cit. DL. nº 178/86 e devem verificar-se cumulativamente. Há, depois, requisitos negativos, que obstam ao pagamento da indemnização de clientela, e cuja prova incumbe ao principal, os quais constam do nº 3 do mesmo preceito. Contudo, há, desde logo, um pressuposto inicial a ter em consideração: a indemnização de clientela pressupõe a cessação da vigência do contrato. De facto, o nº 1 do cit. art. 33º é muito claro no segmento em que preceitua expressamente que: “o agente tem direito, após a cessação do contrato, a uma indemnização de clientela, desde que sejam preenchidos, cumulativamente, os requisitos seguintes (…)”. À cabeça desses requisitos positivos de que depende a atribuição ao agente da indemnização de clientela figura, em primeiro lugar, o de que o agente tenha angariado novos clientes para a outra parte ou aumentado substancialmente o volume de negócios com a clientela já existente (cfr. a al. a) do nº 1 do cit. art. 33º). «Naturalmente que não é qualquer acréscimo de clientela ou qualquer benefício que daí resulte para o principal que justificará a atribuição ao agente de uma “indemnização” de clientela; terá de se tratar de um acréscimo e de um benefício de proporções minimamente relevantes para o efeito: um acréscimo “substancial” do volume de negócios do principal (cfr. al. a)), donde resulte para este um benefício “considerável” (cfr. al. b))»[31]. «Em ambos os casos [angariação de novos clientes para a outra parte ou aumento substancial do volume de negócios com a clientela já existente] existe normalmente um aumento real do volume de negócios da empresa, já que o agente ou angaria novos clientes ou convence os existentes a celebrar novos contratos, sendo este benefício económico auferido pelo principal um dos requisitos da indemnização de clientela»[32]. Precisamente por isso a jurisprudência portuguesa tem considerado suficiente, para a atribuição da indemnização de clientela, a demonstração desse aumento do volume de negócios desencadeado pelo agente, sem exigir a prova concreta da via por que o mesmo foi alcançado[33]. «Parece, no entanto, que o [mero] facto de terem sido angariados novos clientes preenche este requisito de atribuição da indemnização de clientela, mesmo que ele não tenha representado um aumento efectivo do volume de negócios do principal»[34] [35]. Segundo António Pinto Monteiro[36], mesmo que o agente se tenha limitado a manter o nível da clientela, se isso se ficar a dever a um seu trabalho altamente meritório, numa conjuntura desfavorável, talvez se deva entender que o requisito em questão se acha preenchido, ainda que a título excepcional, «em conformidade com a ratio desta medida e da própria norma que a consagra». De todo o modo, «pressuposto é, no entanto, que a clientela seja adquirida em resultado da prestação do agente, ou seja, que exista um nexo causal entre a sua prestação e a aquisição da clientela pelo principal»[37]. Já «não é, porém, exigido que a causalidade seja directa, admitindo-se que a prestação do agente concorra para a aquisição simultaneamente com outros factores»[38]. «Assim, mesmo em relação a marcas, que tenham especial força atractiva junto dos clientes, a existência de alguma concausalidade do contributo do agente em relação à aquisição da clientela pode levar a considerar que esta foi por ele obtida»[39]. Relativamente ao aumento substancial do volume de negócios com a clientela já existente, «a doutrina tem entendido que este aumento tanto pode ser quantitativo como qualitativo, dado que tanto existe um benefício para o principal no caso em que o cliente passa a comprar mais produtos como no caso em que passa a adquirir produtos de melhor qualidade»[40]. Já no que concerne ao vocábulo “substancial”, «consiste este num conceito vago e indeterminado, ainda que tenha sido entendido que o aumento de volume de negócios deva ser de tal ordem que se possa equiparar à aquisição de novos clientes»[41]. «Em qualquer caso, tem-se considerado que o aumento do volume de negócios deve resultar da actividade do agente, já que se ele tiver por base uma circunstância a ele exterior, como o aumento do preço dos produtos ou a desvalorização monetária, não fica esse requisito preenchido»[42]. «Inversamente, não deixará de existir indemnização de clientela, se por actuação do agente o volume de negócios se mantém estável ou sofre uma redução menor do que a esperada, apesar de uma acentuada quebra no preço dos produtos»[43]. «Para apurar se ocorreu um aumento do volume de negócios durante a vida da relação de agência, há que comparar, fundamentalmente, a situação apresentada pelo valor das transacções com o mercado confiado ao agente no momento da celebração do contrato e no momento em que este vem a cessar»[44]. «Ao avaliar a dimensão do acréscimo importa, assim, essencialmente, considerar o seu significado em relação à cifra global do volume de negócios – isto é, averiguar em que percentagem foi aumentado, no mercado atribuído ao agente, o valor que as transacções apresentavam no início do contrato»[45]. O outro pressuposto da indemnização de clientela é – como se sabe – a existência de um benefício considerável para a outra parte, após a cessação do contrato, da actividade desenvolvida pelo agente (cfr. a al. b) do cit. art. 33º do DL. nº 178/86). «Por benefício dever-se-á entender toda e qualquer vantagem com relevo económico, todo e qualquer ganho que o aumento de procura suscitado pela actuação do agente seja apto a proporcionar ao principal»[46]. «De entre os benefícios mais frequentemente mencionados, destaca-se a possibilidade de o principal continuar a auferir réditos provenientes das futuras transacções com os clientes que o agente angariou»[47]. «Mas as vantagens a auferir pelo principal não têm forçosamente que se traduzir na percepção de uma quantia em dinheiro (…); basta que consubstanciem um ganho ou benefício economicamente relevante»[48]. Assim ocorre, nomeadamente, nos «casos em que o principal consegue garantir, no quadro de um acordo de cooperação entre empresas, uma determinada “quota de escoamento”, que é calculada precisamente em função da corrente de procura que se lhe dirige e para cujo caudal o agente contribuiu»[49]. Por outro lado, «também é possível que o ganho que ao principal faculta o aumento de procura suscitado pela actividade do agente se venha a consubstanciar numa “poupança de despesas”, ou melhor, na obtenção de condições mais favoráveis – leia-se, mais lucrativas – na distribuição ou comercialização dos seus produtos»[50]. Em todo o caso, «trata-se de um pressuposto essencial, já que o fundamento da indemnização de clientela é o facto de a actividade do agente, embora enquadrada numa relação contratual duradoura, poder ter efeitos benéficos para a outra parte após a extinção dessa relação, justificando assim a compensação ao agente»[51]. «Se o principal não continua a obter benefícios após a extinção do contrato, naturalmente que não se justifica atribuir indemnização de clientela ao agente»[52]. Todavia, segundo o entendimento generalizado da doutrina, «não se mostra necessário que [os benefícios a auferir pelo principal] tenham já ocorrido, bastando que, de acordo com um juízo de prognose, seja bastante provável que eles se venham a verificar, isto é, que a clientela angariada pelo agente constitua, em si mesma, uma chance para o principal»[53] [54]. «Essa prognose não é, no entanto, difícil de estabelecer, já que os contratos intermediados normalmente se traduzem num benefício efectivo para o principal, permitindo-lhe obter um lucro líquido dessa relação, o qual é considerado como benefício»[55]. É certo que «não basta para o preenchimento deste requisito qualquer benefício, exigindo-se especificamente um benefício considerável, o que implica que o ganho do principal tenha que revestir alguma dimensão»[56]. «Essa dimensão é determinada por comparação da extensão e duração dos negócios angariados pelo agente com outros negócios do principal em que ele não tenha tido intervenção»[57]. «Não é, no entanto, relevante o resultado final da exploração do principal, uma vez que ele pode ter prejuízos globais com o negócio, mas beneficiar especificamente da actividade do agente»[58]. «Por outro lado, não se exige que seja o próprio principal a explorar directamente o mercado, podendo conseguir esses benefícios através de outro agente, de um concessionário, de uma filial, etc.»[59]. «O que interessa é que o principal fique em condições de continuar a usufruir da actividade do agente, ainda que só indirectamente, através de outro intermediário – excepto se provar que deixa em absoluto de poder aproveitar-se de tal clientela, por ter cessado a sua actividade ou mudado de ramo»[60]. É claro, porém, que «o benefício para o principal deixará de se verificar a partir do momento em que este perca os clientes, sendo que essa perda pode mesmo ser causada pelo agente, se este se mantiver, após o contrato, em concorrência com o principal e proceder ao desvio dos clientes que anteriormente tinha angariado»[61] [62]. Consequentemente, «não basta propriamente a existência de uma chance de o principal vir a beneficiar do aumento de procura suscitado pelo agente para preencher o requisito da alínea b), uma vez que se admite que o principal venha alegar o não aproveitamento dessa existente possibilidade para se eximir ao pagamento da indemnização de clientela, ainda que certa doutrina apenas aceite que atinja tal desiderato caso a sua atitude se perfile como razoável à luz de uma lógica empresarial»[63]. «A questão transita, assim, para a distribuição do onus probandi: o agente é que não tem mais a provar do que a existência de uma chance de vantagens para o principal – o que (…) se infere geralmente da demonstração do acréscimo de procura – isto é, alicerçar um juízo de prognose favorável à obtenção de proveitos»[64]. «O principal, por seu turno, poderá contestar a subsistência dessa chance, ou seja, provar que apesar de o agente haver aumentado a clientela em vida do contrato, não é verdade que dela lhe seja possível vir a aproveitar-se no futuro, ou então demonstrar que, permanecendo tal possibilidade no seu horizonte, não a vai aproveitar e, eventualmente, que esse seu comportamento se justifica em termos económico-empresariais»[65]. «Por outras palavras, cabe ao agente provar que o principal pode vir a extrair benefícios do acréscimo de procura; cabe ao principal provar que não pode ou que (justificadamente) não vai extrair daí qualquer benefício – em síntese, infirmar a prognose sustentada pelo agente»[66]. Por fim exige a alínea c) do nº 1 do cit. artigo 33º do Decreto-Lei nº 178/86, como pressuposto da indemnização de clientela, que o agente deixe de receber qualquer retribuição pelos contratos negociados ou concluídos, após a cessação do contrato, com os clientes referidos na alínea a). Segundo Pinto Monteiro[67], «pretende a lei, fundamentalmente, evitar acumulações, deixando de justificar-se a compensação devida ao agente, a título de indemnização de clientela, caso o principal, por exemplo, haja acordado continuar a pagar-lhe, após o termo do contrato, uma certa quantia pelas operações negociais que leve a efeito com os clientes por ele angariados», isto porque, «a existir um acordo deste ou de outro tipo, a compensação devida ao agente verificar-se-á por via convencional». «Por outras palavras, ao mesmo tempo que se reconhece (implicitamente) às partes a faculdade de convencionarem, entre si, o montante e o modo de pagamento da indemnização de clientela - posto que o façam “em termos razoáveis”, e sem procurar ocultar uma renúncia antecipada a semelhante indemnização - esclarece-se que o agente não poderá pretender, além da quantia estipulada, a soma que derivaria da aplicação dos artigos 33º e 34º, uma vez que tal conduziria a duplicar o pagamento da indemnização de clientela»[68]. Na mesma linha, Luís Menezes Leitão[69] observa que «esta disposição explica-se pelo facto de que, a ser atribuída ao agente direito à comissão por estes contratos, este adquiriria uma indemnização de clientela que acresceria a essa comissão, extravasando esta assim das suas funções de indemnização». Por outro lado é defensável que – como foi entendido no Ac. desta Relação de 9/7/1998 (publicado in Col. de Jur., 1998, tomo III, pp. 92-96) – relativamente ao contrato de concessão comercial, não é sequer de exigir o preenchimento do requisito da cit. al. c) do nº 1 do art. 33º do DL. nº 178/86, «já que esta [alínea] reporta-se à retribuição do agente e, no contrato de concessão comercial, o concessionário, negociando por conta própria, não tem outra compensação que não seja o lucro ganho nas respectivas operações comerciais». Ora, voltando agora ao caso em apreço, é patente que ficou provada diversa factualidade nos autos para que haja lugar à atribuição à A. da indemnização de clientela legalmente prevista a favor do agente, por aplicação analógica do já citado art. 33º do D.L. nº 178/86. Neste sentido, não podemos deixar de corroborar, integralmente, aquilo que foi afirmado pelo Julgador “a quo” na decisão recorrida e que passamos, de seguida, a transcrever: - (…) Resultou provado que a Autora angariou novos clientes para a Ré, pois que não só recuperou os clientes que esta que tinha perdido em consequência da insolvência da anterior distribuidora – “(…)” –, estando provado que, durante alguns meses, deixou de vender os seus produtos em território nacional (o que obrigou a novas negociações e novos contratos), como captou clientes que nunca tinam vendido produtos da Ré, como são exemplo o “(…)”, “(…)”, “(…)”, “(…)” e “(…)”. |