Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
| ||
Relator: | PAULA DO PAÇO | ||
Descritores: | ACIDENTE DE TRABALHO POSTO DE TRABALHO INCAPACIDADE PERMANENTE ABSOLUTA PARA O TRABALHO HABITUAL INSUFICIÊNCIA PARA A DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO ANULAÇÃO DA DECISÃO | ||
![]() | ![]() | ||
Data do Acordão: | 07/13/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
![]() | ![]() | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário: | I- A Instrução Geral n.º 13 da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais (Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23 de outubro), prescreve que para «permitir o maior rigor na avaliação das incapacidades resultantes de acidente de trabalho e doença profissional, a garantia dos direitos das vítimas e a apreciação jurisdicional, o processo constituído para esse efeito deve conter obrigatoriamente os seguintes elementos: a) Inquérito profissional, nomeadamente para efeito de história profissional; b) Análise do posto de trabalho, com caracterização dos riscos profissionais e sua quantificação, sempre que tecnicamente possível (para concretizar e quantificar o agente causal de AT ou DP); c) História clínica, com referência obrigatória aos antecedentes médico-cirúrgicos relevantes; d) Exames complementares de diagnóstico apropriados.» II- O inquérito descritivo da história profissional e a análise do posto de trabalho, são elementos relevantes quando importa avaliar se o sinistrado está ou afetado ou não de IPATH. III- Tendo estas diligências sido omitidas e verificando-se uma insuficiência dos meios probatórios produzidos nos autos quanto à atribuição ou não de IPATH, justifica-se a anulação da decisão recorrida. (Sumário elaborado pela Relatora) | ||
![]() | ![]() | ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] I. Relatório No âmbito da presente ação especial emergente de acidente de trabalho em que é sinistrado P… e entidade responsável Fidelidade – Companhia de Seguros, S.A., o sinistrado veio requerer, em 24-06-2021, a revisão da sua incapacidade, alegando, para tanto e resumidamente, que a sua situação clínica se agravou a ponto de ter sido declarado definitivamente inapto para o serviço de voo (profissão habitual), por junta médica de medicina aeronáutica. Juntou, entre outros documentos, o relatório emitido pelo especialista em medicina laboral e pericial, Dr. D…, que, em 07-06-2021, considerou que o sinistrado se encontrava em situação de IPATH e a “Ficha de aptidão para o trabalho”, da qual consta “inapto definitivamente”. Por determinação da 1.ª instância, a UCS – Unidade de Cuidados Integrados de Saúde, S.A., apresentou cópia do relatório de “Avaliação de Aptidão Para o Voo”, datado de 14-06-2021, realizado por dois médicos que entenderam que o sinistrado estava definitivamente inapto para o exercício do seu trabalho habitual como tripulante de avião. Tendo o sinistrado sido submetido a exame de revisão, em 28-09-2021, o perito do Gabinete Médico-Legal e Forense manteve a IPP de 10% anteriormente atribuída, mas considerou o sinistrado afetado de IPATH. Na sequência, a seguradora veio requerer a realização de exame por junta médica, tendo, para o efeito, apresentado quesitos. Devidamente notificado do requerimento da seguradora, o sinistrado veio apresentar, igualmente, quesitos para o exame pericial, e requereu a notificação da TAP – AIR PORTUGAL, S.A. para informar se as funções exercidas pelo sinistrado poderiam ser exercidas em terra. A 1.ª instância deferiu a requerida notificação da TAP e designou data para a realização da junta médica, formulando os quesitos a que deveriam responder os peritos, e que foram alvo de parcial reclamação apresentada pelo sinistrado, que foi indeferida. Em 15-11-2021, a TAP veio prestar informações sobre o descritivo funcional da categoria profissional do sinistrado e esclarecer que as funções inerentes têm de ser exclusivamente desempenhadas no avião, não podendo ser exercidas em terra. Mais informou que o sinistrado cessou, em 13-07-2021, por acordo, o contrato de trabalho que mantinha com a TAP. Em 16-11-2021, a junta médica observou o sinistrado e requereu elementos que julgou necessários. Após junção dos referidos elementos aos autos, em 15-02-2022, a junta médica voltou a reunir e respondeu aos quesitos, embora sem unanimidade. A maioria dos peritos (peritos do tribunal e da seguradora) entendeu que o sinistrado se encontra afetado de uma IPP de 7%, sem IPATH. O perito do sinistrado (Dr. D…) considerou que o sinistrado está afetado de uma IPP de 10%, com IPATH. O sinistrado insurgiu-se contra as respostas dadas aos quesitos pela maioria dos peritos e pediu esclarecimentos. Mais requereu que fosse solicitado ao IEFP um parecer sobre o posto de trabalho. Após ter sido assegurado o contraditório, em 14-03-2022, a 1.ª instância proferiu o seguinte despacho: «Por requerimento de 24/06/2021, veio o sinistrado requerer a revisão da incapacidade de que é portador desde 2012, alegando, além do mais que, durante os últimos 2/3 anos o sentiu que a sua capacidade de resistência ao esforço foi diminuindo e a dor foi aumentando, que presentemente existe uma dor constante, verificando a quase impossibilidade para “pinçar” com segurança, utilizando o dedo polegar e o dedo indicador, pelo que consultou um perito médico da especialidade de avaliação do dano, que lhe efetuou competente exame médico completo e elaborou o respetivo relatório. Nessa sequencia solicitou nova consulta na UCS, com médico especialista em medicina aeronáutica que, em função da lesão e das sequelas suscitou a marcação de Junta Médica de Medicina Aeronáutica, para avaliar a capacidade do sinistrado para o Voo (que é a sua profissão habitual), que no dia 14/06/2021, decretou a inaptidão definitiva para o serviço de voo (profissão Habitual). Realizado exame médico pelo perito do Gabinete Médico Legal de Setúbal em 28/09/2021, o sinistrado apresentava cicatrizes operatórias do polegar, rigidez acentuada na metacarpofalângica de D1 e rigidez da interfalângica de D1, tendo o perito mantido a IPP de 10%, atribuindo IPATH desde 14/06/2021, data da junta médica de medicina aeronáutica. Em sede de junta médica, realizada em 16/11/2021, pelos peritos médicos foi exarado em auto que o sinistrado apresentava ligeira limitação da mobilidade osteoarticular das articulações metacarpofalângica e interfalângica do 1.º dedo da mão direita que lhe limitam a completa oponência do mesmo polegar, mantendo-se a funcionalidade da mão. E, verificando-se que o sinistrado manteve entre 2012 e 2021 o desempenho da atividade como comissário de bordo, entretanto promovido a chefe de cabine, foi determinado que se solicitasse todas as fichas de aptidão dos serviços de medicina do trabalho desde a data da alta até à cessação do contrato, e todo o processo que levou à realização da Junta médica de Medicina Aeronáutica que o considerou inapto definitivamente para o trabalho habitual. Em cumprimento do determinado, em 30/12/2021 veio a TAP juntar as fichas de aptidão referentes às consultas de medicina do trabalho realizadas pelo sinistrado em 14/06/2021, 25/01/2021, 21/10/2019, 24/10/2017, 25/06/2014, 01/12/2013, 14/12/2012 e 03/05/2012, das quais resulta que o sinistrado desde a alta do acidente e até 14/06/2021 foi sempre considerado apto para o trabalho, sem quaisquer restrições ou recomendações. Em 04/01/2022, veio a Unidade de Cuidados de Saúde da TAP, juntar aos autos a ficha de aptidão para o voo do sinistrado, datada de 14/06/2021, da qual se extrai que “procedeu-se à avaliação clínica e documental do dossier do Chefe de Cabine, tendo-se concluído existirem elementos suficientes para parecer definitivo sobre a capacidade para o trabalho. (…) Teve alta da seguradora a 14-12-2012, com atribuição do IPP de 10% pelo Tribunal do Trabalho. Fez consulta de regresso de doença na Medicina do Trabalho, tendo retomado a atividade laboral, considerando a sua grande motivação para o regresso ao trabalho apesar da limitação funcional e utilização com maior frequência do membro superior esquerdo, para complementar a mão direita. Atualmente, para além da limitação já referida apresenta também queixas dolorosas, o que motivou a avaliação da capacidade para o voo. Segundo o parecer do Dr. D… (Medicina Laboral e Pericial) que se anexa (anexo I), o Chefe de Cabine apresenta agravamento da situação clínica com rigidez ao nível da articulação interfalângica do polegar da mão direita, pelo que considera ser impeditivo para o desempenho das sua tarefas habituais inerentes à sua profissão. Atendendo à incapacidade já atribuída, à sintomatologia dolorosa e à limitação funcional, que o impede de realizar as atividades habituais da sua profissão como tripulante de avião, foi considerado inapto definitivamente para o seu trabalho habitual.” Em sede de junta médica de 15/02/2012, o Diretor do Gabinete Médico Legal de Setúbal e a Dra. C… (que não obstante representasse a seguradora, além de Licenciada em Medicina, é Mestre em Medicina Legal e Ciências Forenses, pela Universidade de Coimbra, Pós-graduada em Medicina Legal, Social e do Trabalho, possui o Curso Superior de Medicina Legal e a pós-graduação em Avaliação do Dano Corporal Pós-Traumático) após analisarem a informação obtida junto da TAP e da respetiva Unidade de Saúde e terem reobservado o sinistrado que, segundo os mesmos, mantinha ligeira limitação da mobilidade osteoarticular das articulações metacarpofalângica e interfalângica do 1.º dedo da mão direita que lhe limitam a completa oponência do mesmo polegar, mantendo-se a funcionalidade da mão, responderam aos quesitos formulados pelo Tribunal da seguinte forma: 1 – Houve agravamento clínico das sequelas decorrentes das lesões sofridas no acidente ocorrido em 15 de Junho de 2012? Em caso afirmativo, em que consiste esse agravamento? Não. 2 – Qual o enquadramento tabelar e valoração, em termos de IPP, da situação sequelar atualmente observada? Capítulo I, ponto 8.4.1 alínea c). 3 – Sendo “Comissário/assistente de bordo (CAB)” o tripulante, que colabora diretamente com o chefe de cabina, por forma que seja prestada assistência aos passageiros e à tripulação, assegurando o cumprimento das normas de segurança, a fim de lhes garantir conforto e segurança durante o voo, segundo as normas e rotinas estabelecidas e tendo responsabilidade inerente ao exercício das funções de CAB abrange ainda: a) A verificação dos itens de segurança, de acordo com a respetiva check-list, bem como o cumprimento dos procedimentos de segurança respeitantes ao avião e aos seus ocupantes, com vista a assegurar o salvamento destes em caso de emergência; b) É responsável, perante o chefe de cabina, pelo cumprimento da check-list pre-flight; c) Nas escalas sem representação da empresa, quando necessário, colabora com o chefe de cabina nas diligências adequadas ao alojamento e à alimentação convenientes dos passageiros e tripulantes; d) É diretamente responsável perante o chefe de cabina pelo serviço executado”. O quadro sequelar atual é impeditivo do exercício das funções de comissário/assistente de bordo? Em caso afirmativo, quais os movimentos e/ou ações que o sinistrado não pode realizar e que são impeditivas do seu trabalho habitual? Não 4 – Quais as funções que o Sinistrado pode continuar a executar? Todas na medida da IPP atribuída. 5 – Em função das lesões emergentes do acidente e do seu eventual agravamento, bem como da decisão autoridade aeronáutica civil aquando da avaliação da sua capacidade para o exercício da sua profissão habitual, é reconvertível no posto de trabalho, ainda que em terra? Prejudicado pela resposta aos quesitos anteriores. Dada a palavra ao perito do sinistrado o mesmo respondeu aos quesitos da seguinte forma: 1 – Houve agravamento clínico das sequelas decorrentes das lesões sofridas no acidente ocorrido em 15 de Junho de 2012? Em caso afirmativo, em que consiste esse agravamento? Sim, houve agravamento, de acordo com o exame médico do Dr. J…, a folhas 33 a 34 dos autos. O sinistrado mantém dores e rigidez da MCF e da IF do polegar e não consegue fazer oponência do polegar à polpa digital dos outros dedos e às respetivas MF dos respetivos dedos. 2 – Qual o enquadramento tabelar e valoração, em termos de IPP, da situação sequelar atualmente observada? Como afixado pelo Dr. J… a folhas 32 a 34 dos autos, Capítulo I, ponto 8.4.1 alínea c), 10% com IPATH, com a ressalva de que o quociente deve ser bonificado pelo fator 1.5 pela alínea a) do n.º 5 das Instruções gerais da TNI (coeficiente global a atribuir 15%). 3 – Sendo “Comissário/assistente de bordo (CAB)” o tripulante, que colabora diretamente com o chefe de cabina, por forma que seja prestada assistência aos passageiros e à tripulação, assegurando o cumprimento das normas de segurança, a fim de lhes garantir conforto e segurança durante o voo, segundo as normas e rotinas estabelecidas e tendo responsabilidade inerente ao exercício das funções de CAB abrange ainda: a) A verificação dos itens de segurança, de acordo com a respetiva check-list, bem como o cumprimento dos procedimentos de segurança respeitantes ao avião e aos seus ocupantes, com vista a assegurar o salvamento destes em caso de emergência; b) É responsável, perante o chefe de cabina, pelo cumprimento da check-list pre-flight; c) Nas escalas sem representação da empresa, quando necessário, colabora com o chefe de cabina nas diligências adequadas ao alojamento e à alimentação convenientes dos passageiros e tripulantes; d) É diretamente responsável perante o chefe de cabina pelo serviço executado”. O quadro sequelar atual é impeditivo do exercício das funções de comissário/assistente de bordo? Em caso afirmativo, quais os movimentos e/ou ações que o sinistrado não pode realizar e que são impeditivas do seu trabalho habitual? Do ponto de vista estritamente médico, prejudicado pela resposta ao quesito anterior. As tarefas exercidas pelo sinistrado enquanto comissário de avaliação civil resumem-se a: - Funções de assistência ao passageiro; funções de segurança do voo e funções de segurança e emergência, sendo de salientar a importância das duas últimas, o quesito em questão parece-se, no entanto alheio, à natureza desta Junta Médica. 4 – Quais as funções que o Sinistrado pode continuar a executar? Prejudicado pela resposta dada aos quesitos 2 e 3. A resposta é que não pode continuar a exercer nenhumas tarefas e encontra-se inapto definitivamente para o voo, de acordo com o exposto a fls. 52 e 53 dos autos. Solicita-se para melhor esclarecimento, estudo do posto de trabalho pelo Departamento de Ergonomia da Faculdade de Motricidade Humana na Cruz Quebrada. 5 – Em função das lesões emergentes do acidente e do seu eventual agravamento, bem como da decisão autoridade aeronáutica civil aquando da avaliação da sua capacidade para o exercício da sua profissão habitual, é reconvertível no posto de trabalho, ainda que em terra? Prejudicado pela resposta aos quesitos 2,3 e 4. O sinistrado, não é, portanto, reconvertível no posto de trabalho, atendendo, a que a sua preparação Técnico-profissional especializada é de Tripulante de cabine e não de terra. Notificado do auto de junta médica, veio o sinistrado requerer que se solicite ao IEFP um parecer sobre o posto de trabalho, previsto no art. 13.º, alínea b) das Condições Gerais da TNI, para se permitir, com maior rigor, a avaliação das incapacidades resultantes do A.T. e, segundo nos parece, que os peritos do Tribunal e da Seguradora respondam de forma fundamentada o quesito 5 formulado, sem se refugiarem na obscuridade do termo prejudicado violando, de forma grosseira, a decisão da autoridade nacional da aviação civil (ANAC) que aplica as normas e os Regulamentos da União Europeia. Apreciando e decidindo: Não sabendo o tribunal a que decisão da ANAC se refere o sinistrado, tal como lhe foi, pela signatária, transmitido em sede de junta médica, resulta evidente da documentação junta pela TAP e pelos respetivos serviços clínicos que, contrariamente ao que pretende fazer crer a este Tribunal, foi o sinistrado, que despoletou todo o processo que levou à atribuição de inaptidão definitiva para o serviço de voo. Com efeito, tendo sido sujeito a 5 exames médicos (14/12/2012, 01/12/2013,25/06/2014, 24/10/2017, 21/10/2019 e 25/01/2021) após a atribuição da IPP de 10% o sinistrado foi sempre considerado apto para o trabalho habitual, sem quaisquer limitações, até que em 14/06/2021 (menos de 5 meses após ter sido considerado apto), com base no parecer do Dr. D… (Especialista em medicina do trabalho, Pós-graduado em medicina legal, Pós-graduado em medicina desportiva, Pós-graduado em medicina do trabalho, Pós-graduado em medicina legal, social e do trabalho, Pós-graduado em avaliação do dano corporal pós- traumático), segundo o qual existe um agravamento da situação clínica com rigidez ao nível da articulação interfalângica e metacarpofalângica do polegar da mão direita, é considerado inapto definitivamente para o trabalho habitual.. Não havendo outros elementos no processo além do parecer e da opinião do seu perito médico, cumpre esclarecer que o Dr. J… não concluiu pelo agravamento das sequelas que o sinistrado apresenta, sendo as mesmas coincidentes com as que descreveu no auto de exame singular que realizou ao sinistrado a 30/04/2013 (fls. 45-48 dos autos principais), e manteve o grau de desvalorização em 10%, atribuído IPATH com base na decisão da UCS – Unidade de Cuidados Integrados de Saúde, S.A. (empresa de serviços de saúde do Grupo TAP). Destarte, tendo o sinistrado sido observado na nossa presença, de acordo com a legis artis, considerando que os peritos do Tribunal e da Seguradora responderam de forma isenta, cabal e esclarecedora aos quesitos formulados pelo Tribunal, não se revela necessária a realização de outros exames, nem do parecer do IEFP ou Departamento de Ergonomia da Faculdade de Motricidade Humana, cujo estudo do posto de trabalho se revela inócuo face descritivo funcional da categoria profissional no AE TAP, para que seja proferida decisão. Termos em que se indefere o requerido. Notifique. * Uma vez que, me suscita dúvidas o parecer emitido pelo Dr. D… e a decisão da UCS – Unidade de Cuidados Integrados de Saúde, S.A. quanto inaptidão definitiva do sinistrado para o serviço de voo, remeta certidão do auto de exame de fls. 45-48, do auto de tentativa de conciliação de fls. 53-55, do despacho de fls. 69, do auto de exame de 16/11/2011, dos ofícios de 30/12/2021, 04/01/2022, e dos autos de junta médica de 16/11/2021 e de 15/02/2022 e remeta à ANAC - Autoridade Nacional da Aviação Civil (Rua B, Edifício 4 - Aeroporto Humberto Delgado, 1749-034 Lisboa, ao Instituto Nacional de Medicina Legal e Ciências Forenses (Polo das Ciências de Saúde (Polo III), Azinhaga de Santa Comba, 3000-548 Coimbra) e à Ordem dos Médicos (Av. Almirante Gago Coutinho, 151, 1749–084 Lisboa), para os fins tidos por convenientes.» Em 08-04-2022, foi proferida decisão final do incidente de revisão. Consta desta decisão: «Apreciando e decidindo: Face aos elementos dos autos e considerando o disposto na Tabela Nacional de Incapacidades, não se vislumbra existir fundamento para divergir do parecer maioritário dos peritos médicos do Tribunal e da Seguradora. Com efeito, considerando que, contrariamente ao entendimento do Perito Médico do Sinistrado, o exame objetivo a que foi sujeito, em 16/11/2021 e em 15/02/2022) não sustenta a existência de um agravamento das sequelas que o sinistrado apresentava em (rigidez acentuada na metacarpofalângica de D1 e rigidez da interfalângica de D1), mas uma melhoria dessa rigidez mostra-se correto o enquadramento no ponto 8.4.1 alínea C) do Capítulo I da Tabela Nacional de Incapacidades (TNI). Por outro lado, face à extensão das atuais sequelas, mormente à manutenção da função inerente ou imprescindível ao desempenho do posto de trabalho que o sinistrado ocupava com caracter permanente (Chefe de Cabine) e considerando os coeficientes mínimo e máximo aplicáveis, julga-se adequado aquele que foi arbitrado, bem como a não atribuição de IPATH. Isto porque, não havendo agravamento, mas melhoria, da situação clínica do sinistrado, que entre 2012 e 2021 manteve o desempenho da atividade como comissário de bordo, entretanto promovido a chefe de cabine, conforme fichas de aptidão dos serviços de medicina do trabalho datadas de 14/12/2012, 01/12/2013, 25/06/2014, 24/10/2017, 21/10/2019 e 25/01/2021, consultado o processo que levou a Medicina Aeronáutica a considera-lo inapto definitivamente para o trabalho habitual dali se retira que tal decisão assentou apenas no parecer do Dr. D…, perito médico do sinistrado que, em clara oposição ao exame objetivo realizado na Junta Médica, concluía pela existência de um agravamento da situação clínica impeditivo para o desempenho das sua tarefas habituais inerentes à sua profissão. Não sustentando o exame objetivo qualquer agravamento, mas sim uma redução da rigidez da articulação metacarpo-falângica que, sendo merecedora de uma desvalorização, justifica a atribuição de uma IPP de 7%, inferior à inicialmente atribuída, cumpre referir que, contrariamente ao alegado, o sinistrado não foi sujeito a Junta Médica de Medicina Aeronáutica, mas a exame de avaliação de aptidão para o voo cuja decisão, não sendo vinculativa para este Tribunal, pode ser revertida mediante nova apreciação dessa aptidão, inclusive a requerimento do aqui requerente. Assim, nos termos do art. 145.º, n.º 5, do Código de Processo do Trabalho, atendendo a que houve melhoria da situação clínica do sinistrado, fixo a IPP de que padece o sinistrado em 7% a partir de 24 de Junho de 2021 e, consequentemente, reduzo a pensão a cargo da seguradora para €2.533,96 (dois mil quinhentos e cinquenta e três euros e noventa e seis cêntimos), ou seja €51.713,46 x 70% x 7%. Considerando que a pensão inicial foi objeto de remição parcial, apenas é devida ao sinistrado a pensão anual e vitalícia de €1.824,02 (mil oitocentos e vinte e quatro euros e dois cêntimos), que por força das atualizações anuais a que foi sujeita entre 01/01/2013 e 01/01/222 ascende a €2.020,19 (dois mil e vinte euros e dezanove cêntimos), valor inferior a 6 RMM à data da alta e do pedido de revisão (€485/€655) sendo obrigatoriamente remível, nos termos do 75.º da Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro. Custas pelo sinistrado, fixando-se ao incidente o valor de €29.624,07 (vinte e nove mil, seiscentos e vinte e quatro euros e sete cêntimos). Registe e notifique. * Oportunamente, proceda ao cálculo do capital de remição – art. 149.º, n.º 3.º do Código de Processo do Trabalho.»Inconformado, veio o sinistrado interpor recurso para esta Relação, rematando as suas alegações com as conclusões que, seguidamente, se transcrevem: «Primeira: O presente recurso vem interposto da sentença de fls., que atribuiu ao Sinistrado um grau de incapacidade (IPP) de 7% desconsiderando a questão do agravamento da lesão e a atribuição de IPATH, uma vez que o Sinistrado, em função do resultado da Junta Aeromédica de Avaliação da Capacidade para o Voo, decretou a INAPTIDÃO ABSOLUTA E DEFINITIVA DO TRIPULANTE (ora Sinistrado) PARA O SERVIÇO DE VOO, O QUE CONSUBSTANCIA UMA NÃO RECONVERSÃO NO POSTO HABITUAL DE TRABALHO. Segunda: DOS FACTOS: Não causou qualquer surpresa a decisão do tribunal “a quo” que seguiu na esteira da argumentação da Entidade Responsável quando permitiu que quesitos de natureza jurídica/laboral fossem incluídos na Junta Médica, por si requerida, repisando os mesmos doestos e os mesmos absurdos, em flagrante violação da legislação internacional e comunitária. (fls. 35 a 37) Terceira: O recorrente nas suas alegações, seguira de muito perto o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 13/07/2020 – Proc.º 597/17.6T8CSC.L1, no que tange sobretudo à questão da Incapacidade Permanente e Absoluta para o Trabalho Habitual (IPATH), e que o Mandatário do Sinistrado, interveio. Vejamos: Quarta: O Sinistrado celebrou com a TAP PORTUGAL S.A., um contrato de trabalho com a categoria profissional de Tripulante de Cabine, para prestar a sua atividade profissional, por conta e ordem da sua Entidade Empregadora, e para exercer as funções de Comissário de Bordo nos aviões da empresa. Quinta: A Entidade Patronal do Sinistrado, celebrou com a Fidelidade – Companhia de Seguros S.A. (ao tempo denominada Império- Bonança S.A.) e ao abrigo do disposto no n.º 1 do art.º 79.º da Lei dos Acidentes de Trabalho, um contrato de seguros de acidentes de trabalho, com a Apólice n.º AT32061919. Sexta: No dia 15/06/2021, cerca das 00H00, o Sinistrado, no decurso do voo Lisboa/São Paulo, durante o serviço de cabine, e para o qual tinha sido nomeado pela Entidade patronal, foi vítima de um acidente de trabalho, o qual consistiu no seguinte: Quando se encontrava a prestar serviço a bordo, sofreu um entalão no dedo polegar direito, ficando com o dedo preso entre dois trolleys. Sétima: Tendo resultado um forte impacto no polegar e no punho que lhe provocaram dores imediatas, com notória impossibilidade de movimentar a mão direita e/ou segurar quaisquer objetos. Oitava: De regresso a Lisboa efetuou a respetiva participação do acidente de trabalho, foi observado primeiramente pelos serviços da UCS e encaminhado para os serviços médicos da Seguradora. Nona: Após vários exames médicos a E.R. decidiu efetuar uma cirurgia devido às lesões ligamentares, nomeadamente ligamentoplastia metacarpofalangica (cujo documento comprovativo se encontra junto aos autos como Doc. 4). Décima: O Sinistrado, foi novamente intervencionado cirurgicamente, em função da rigidez, para libertação das aderências tendinosas dos flexores do dedo (capsulotomia e libertação das aderências do aparelho extensor digital), e cujo comprovativo se encontra junto aos autos como Doc. 5. Décima-Primeira: O Sinistrado fez tratamento pós-operatório, contudo sem conseguir melhorar gradualmente e, conforme Doc. 6 junto aos presentes autos, tendo-lhe sido atribuída uma IPP de 0,8%. Porém, conforme acordo alcançado na tentativa de conciliação foi atribuída ao sinistrado uma IPP de 10%, tendo posteriormente sido o acordo homologado por sentença (Docs. A e B) que se anexam, por não constarem nem do processo físico nem do processo eletrónico. Décima-Segunda: Manifestamente limitado, mas com capacidade para executar algumas das funções principais (com exceção da garantia de segurança da aeronave e dos passageiros, em caso de acidente, evacuação) o Sinistrado voltou a exercer a sua atividade, após consulta com os médicos da UCS. Décima-Terceira: Durante os últimos 2/3 anos (desde 2019 a 2021) o Sinistrado sentiu a sua capacidade de resistência ao esforço diminuir e bem assim a dor aumentar. Décima-Quarta: O Sinistrado, em função das lesões e das sequelas da lesão (que persistem) contactou os serviços médicos da sua Entidade Patronal, dando conta da sua lesão, das suas dores e tendo cada vez mais dificuldades em poder cumprir as suas funções a bordo (incapacidade para abrir e fechar a porta do avião, transportar trolleys muito pesados, incapacidade para ativar e buscar, transportar e manusear as pesadíssimas garrafas de oxigénio quando devam ser ministradas a passageiros, total incapacidade para utilizar os extintores para ataque a fogos e sobretudo utilizar equipamentos de proteção, em caso de fogos nas WC). Também não sentia capacidade para executar manobras de salvamento em caso de salvamento e evacuações. Décima-Quinta: Perante este cenário, o sinistrado consultou um perito médico da especialidade de avaliação do dano que fez um exame completo tendo elaborado o respetivo relatório que se encontra junto aos autos como Doc. 1 da P.I.. Décima-Sexta: Assim e porque as dores persistissem o Sinistrado voltou a contactar a UCS, cujos médicos, após consulta, marcaram junta médica de avaliação da sua capacidade para o voo, tendo sido em 14/06/2021, o Sinistrado presente à citada Junta Médica, que decretou a sua INAPTIDÃO DEFINITIVA PARA O SERVIÇO DE VOO, cuja cópia se encontra junto aos autos como Ref.ª 5987236 de 21/09/2021. Décima-Sétima: Após a declaração da Inaptidão para o serviço de voo, o Sinistrado foi observado pelo Médico do Trabalho que lhe decretou a Incapacidade Permanente para o seu trabalho habitual (Doc. 2 da P.I.), e bem assim esta Inaptidão foi comunicada à Entidade Patronal, que notificou o Sinistrado para os termos e efeitos do disposto na cláusula 19.º do AE TAP/SNPVAC (Regulamento de Reformas, Remunerações e Garantias Sociais) Doc. 3 da P.I. (opção do Sinistrado, para no prazo de 60 dias, para ocupação por serviço em terra ou reforma, se for caso disso). Décima-Oitava: Perante a inação da E.R., apresentou a P.I. dos presentes autos a 24/06/2021, tendo os autos prosseguido a sua tramitação normal. Foi então o Sinistrado presente, na data de 28/09/2021 a Exame Médico de avaliação do dano, cujo relatório se encontra junto aos autos com a Ref.ª 6044570 e entrada no tribunal a 18/10/2021, tendo atribuído ao Sinistrado a IPP de 10% com IPATH, contendo o lapso da omissão do fator de bonificação (não reconversão do posto habitual de trabalho – art.º 5 das cláusulas contratuais gerais da TNI). Décima-Nona: DA INCOERÊNCIA E DEFICIÊNCIA DA DECISÃO: A decisão sob escrutínio não se limitou a seguir a posição da maioria da Junta Médica, mas exerceu pressão sobre o Perito Médico do Sinistrado, como adiante se demonstrará. Vigésima: Na sequência da Junta Médica de 15/02/2022 (de fls.), e das respostas aos quesitos elencados, verificou-se que, parte dos quesitos não tinham sido respondidos ou tinham sido respondidos sem qualquer fundamentação, refugiando-se os Senhores Peritos Médicos da maioria, em respostas, cruciais (quesito 5.º) numa muito conveniente resposta: “PREJUDICADO”. Vigésima-Primeira: O Sinistrado apresentou requerimento (fls. 43) para que o quesito 3.º fosse retirado da apreciação da Junta Médica, por verter sobre questões de Direito. O tribunal, recusou tal pretensão, (ref.ª 93508708, de 10/12/2021), mantendo o quesito n.º 3. Vigésima-Segunda: E a resposta da maioria da Junta Médica correspondeu a um “seco NÃO”, sem mais justificações, tendo merecido da parte do Sinistrado um pedido de esclarecimentos, sobre este e os outros quesitos com respostas monossilábicas. Vigésima-Terceira: E no que tange ao pedido de esclarecimentos apresentado pelo Sinistrado (fls. 71 a 72), a M.ª Juíza, respondeu que quer o Sr. Perito do Tribunal, quer a Sra. Perita da Seguradora responderam de forma isenta, cabal e esclarecedora, não se revela necessária o parecer do IEFP desvalorizando, desta forma, a intervenção de um organismo publico, isento e equidistante das partes, perante, e sustentado pela disposição legal que consta dos art.ºs 8 a 13 da Instruções Gerais da TNI. Vigésima-Quarta: Aliás, isto mesmo é o que consta do Ac. TRL de 04/12/2019 – Proc.º 2923/16.6 quando sustenta que: (…) A Junta Médica deverá responder fundamentadamente aos quesitos formulados e habilitar a uma decisão justa e conscienciosa.(…), sendo que o Ac. TRE de 23/04/2020 – Proc.º 789/17, vai mais longe, quando considera que: (…) é manifestamente insuficiente por não esclarecer quais as funções inerentes à atividade que o sinistrado praticava à data do acidente.(…). Vigésima-Quinta: Mas mais, pretende construir uma versão assente na intimidação ao Sr. Perito Médico do Sinistrado, quer durante a realização da Junta Médica, quer desvalorizando o seu parecer clinico da avaliação do dano corporal, atacando a decisão da Junta Médica de Medicina Aeronautica, (que tem a sua avaliação baseada nas melhores praticas da medicina aeronáutica) desvalorizando-a (não vincula este tribunal), quer ainda extraindo certidões, ainda antes da decisão final, notificando quer a Ordem dos Médicos, quer o Instituto de Medicina Legal, quer a ANAC, para se pronunciarem em conformidade. E com que propósito? Vigésima-Sexta: DO DIREITO: A sentença ora sob escrutínio, não fundamentou a sua decisão como era seu dever, art.º 154.º do NCPC, como é ainda contraditória. Além de que, viola um conjunto de normas e legislações, desrespeitando normas internacionais sobre a aviação civil, e bem assim determinações constitucionais, como sejam o art.º 8.º da CRP, quando dispõe que “as normas constantes das convenções internacionais, vigoram na ordem interna portuguesa enquanto vincularem internacionalmente o Estado Português; e bem assim, “as disposições e tratados que regem a União Europeia e as normas emanadas das suas instituições são aplicáveis na ordem interna.” Vigésima-Sétima: No domínio da legislação europeia foi criado o Regulamento 216/2008 do Parlamento e da Comissão, de 20 de Fevereiro de 2008 que, no que tange, relativamente às regras comuns no domínio da aviação civil (na esteira da Convenção de Chicago e do seu Anexo I), criou a Agência Europeia para a Segurança na Aviação Civil, a qual determina, nos seus considerandos: Considerando 1 – Deverá garantir-se, em permanência, na aviação civil, um nível de proteção elevado e uniforme dos cidadãos europeus, através da aprovação de normas de segurança comuns e de medidas que assegurem que as pessoas, os produtos e as organizações obedeçam na Comunidade a essas normas. Estabelecendo o art.º 11.º do Regulamento que: Art.º 11º: - Os Estados Membros devem reconhecer, sem qualquer exigência ou avaliações técnicas suplementares, os certificados emitidos nos termos do presente Regulamento. Vigésima-Oitava: Neste sentido, o Decreto-Lei n.º 250/2003 havia determinado que, o então INAC (ora ANAC) era a entidade competente para certificar as entidades especializadas em medicina aeronáutica, que emitam certificados médicos de aptidão do pessoal aeronáutico, bem como esse mesmo pessoal quanto às suas qualificações e proficiências e aptidão físicas e mental. Nesse sentido, o art.º 2.º do Diploma qualifica algumas entidades e suas competências, nomeadamente: AMC - Centro de Medicina Aeronáutica; AME – Examinador Médico Autorizado; MAS – Direção de Medicina Aeronáutica. Mais referindo o Art.º 19.º n.º1 b) do citado Diploma, no que tange à certificação das AMC e AME, que estão certificados como AMC com as atribuições e competências conferidas no presente diploma: O AMC a funcionar nas instalações dos serviços de saúde da UCS – Cuidados Integrados de Saúde S.A.. Vigésima-Nona: Por isso não corresponde à verdade a conclusão que a douta sentença extrai de que o Sinistrado não foi sujeito a Junta Médica de Medicina Aeronáutica, mas a um “mero” exame de avaliação da aptidão para o voo. Nada mais errado. Trigésima: Primeiro porque, em termos de definições de competências como descrito, as Juntas Médicas de Medicina Aeronáutica só podem ter lugar, perante uma AMC – Centro de Medicina Aeronáutica e não outro, depois, estas Junta Médicas são constituídas por um conjunto de Médicos com a especialidade em Medicina Aeronáutica. Depois porque, as avaliações da capacidade para o voo (avaliações médicas) são efetuadas nos AMC, consequentemente são uma e a mesma coisa e não duas referências distintas. Trigésima-Primeira: Por isso, quando o Sinistrado, depois de consultas prévias com especialistas de medicina aeronáutica, foi presente a Junta de Medicina Aeronáutica, foi a AMC quem lhe atribuiu a INAPTIDÃO ABSOLUTA E DEFINITIVA PARA O SEU TRABALHO HABITUAL (que é o voo), com os poderes conferidos pelo ANAC, e tramitados através dos Regulamentos Comunitários (Ref.ª 5987236 de 21/09/2021 dos autos). Trigésima-Segunda: E na sequência da Inaptidão atribuída, foi notificada a Entidade Patronal do resultado da Junta de Medicina Aeronáutica, a qual notificou o Sinistrado da mesma inaptidão definitiva (para aplicação da cláusula 19.ª do Regulamento de Remunerações, Reformas e Garantias Sociais, constante do AE TAP/SNPVAC – BTE n.º 8 de 2006), e bem assim notificou também a ANAC, para abater no sistema informático da ANAC, o Certificado de Tripulante, obrigatório para o exercício da profissão nos termos do Regulamento (EU) 2018/1139 do Parlamento Europeu e do Conselho, subparte ARA.CC.100 – Procedimentos Aplicáveis aos certificados de tripulantes de cabine (juntos aos autos, como Doc.3 da P.I. e Ref.ª 40324124 de 02/11/2021. Trigésima-Terceira: Ora, a colocação à disposição do Sinistrado, em conformidade com o disposto na cláusula 19.ª de optar, em 60 dias, por um serviço em terra compatível com as suas habilitações profissionais e em alternativa a reforma (se for caso disso), mais não é do que o reconhecimento pela empregadora da impossibilidade de continuar a ocupar o trabalhador em funções próprias da respetiva profissão e da obrigação de o reconverter profissionalmente na sua profissão habitual. Trigésima-Quarta: Como é consabido, existem instrumentos normativos que impõem que os tripulantes de cabine seja submetidos a exames de aptidão médica periódicos, para poderem exercer as funções de segurança que lhes são atribuídas. É o caso do Regulamento (CE) 216/2008 do Parlamento Europeu e do Conselho, nos termos de cujo art.º 7 b) ii) do Anexo IV, estabelece que, os tripulantes de cabine devem ser periodicamente avaliados em termos de aptidão médica para exercerem, sem falhas, as funções de segurança que lhes forem atribuídas. A conformidade deve ser demonstrada mediante uma avaliação adequada baseada nas melhores práticas da medicina aeronáutica. E nos termos da alínea g) do mesmo art.º 7.º, os membros da tripulação não devem desempenhar as suas tarefas a bordo da aeronave quando não estiverem fisicamente aptos devido a ferimentos, fadiga, doença ou outra causa semelhante. Trigésima-Quinta: A subparte C do Anexo IV do Regulamento (EU) n.º 1178/2011 de 3/11, da Comissão, dispondo sobre requisitos relativos à aptidão médica da tripulação de cabine, determina que os mesmos só exercerão as funções e responsabilidades previstas pelas regras de segurança da aviação civil se satisfizerem os requisitos previstos naquela parte, entre os quais se conta, no que toca ao conteúdo da avaliação aeromédica, exame clinico dos sistemas musculo-esquelético (Med. C.025 a. 2 iii). E de acordo com a MED.C.020, os tripulantes de cabine não devem ter qualquer: a) Anormalidade, congénita ou adquirida; b) Doença, ou deficiência, ativa latente, aguda ou crónica; c) Ferimento, lesão ou sequela de uma operação; d) Efeito direto ou secundário de qualquer medicação terapêutica ou de diagnostico ou preventiva, prescrita ou não por médico, que esteja a tomar ou que implique algum grau de incapacidade funcional que possa causar incapacidade ou inaptidão para exercer as suas funções e responsabilidades de segurança. Trigésima-Sexta: Ora, tendo o Sinistrado sofrido a lesão em consequência do acidente a o agravamento das sequelas, verificadas em sede de Junta de Medicina Aeronáutica e em Exame Médico Singular, prévio à JM, pouco se entende, como pode a decisão manifestar-se da maneira como o faz, uma vez que o Sinistrado ficou Inapto para o voo, foi retirado do serviço de voo, e não pode exercer o seu trabalho habitual. Trigésima-Sétima: Ainda por cima quando a maioria da JM lhe atribuiu uma IPP de 7%, o que determina, pelo exposto e pelas regras da aviação civil, que o mesmo não foi reconvertido no seu posto de trabalho, o que nos termos do art.º 5.º a) das Instruções Gerais da TNI, sempre o fator de bonificação aplicável seria de 1.5, pelo que a IPP sempre seria de 10,5% (vide Ac. STJ de 30/06/2014 (Uniformização de Jurisprudência). Ao verificar esta IPP a decisão da JM colou o Sinistrado como abrangido pela impossibilidade de exercer funções relacionadas disposto no art.º 11.º da Regulamento (EU) 1178/2001, e ainda com o disposto no DL 144/2013 sob a epígrafe “Deveres da Tripulação”. Já quanto à matéria da IPATH, a questão é mais complexa, e aqui, acompanhamos quase literalmente o Ac. TRL de 13/07/2020 – Proc.º 597/17.6T8CSC.L1, e da qual o Mandatário foi parte interveniente: Os Senhores Peritos Médicos do Tribunal e da Seguradora, em esclarecimentos prestados pela M.ª Juiz, (fls. 75 a 78), nada disseram nem nada esclareceram. Trigésima-Oitava: Deste modo duas questões se podem e devem colocar: “Ou o trabalhador pode exercer o seu trabalho habitual, com as limitações que tem agora e que anteriormente não o impediam disso, ou não pode (e neste caso padece de IPATH). De outro modo, ainda se poderá questionar, em face dos exames de medicina aeronáutica realizados, se o resultado da perícia aeronáutica é vinculativo mormente quando atribui uma IPATH ao trabalhador. Porque se o for, se atribuir esta incapacidade definitiva ao trabalhador, em termos tais que, nem o empregador o pode manter nem o trabalhador pode prestar a sua atividade no espaço aéreo sujeito às mesmas regras e princípios (o que atenta o âmbito comunitário dos regulamentos e as convenções internacionais, é suscetível de abranger uma fatia mais significativa do espaço aéreo mundial) não é relevante a opinião da junta nos autos, pois que para todos os efeitos, o trabalhador é tido como incapacitado. Pois bem. Dispõe o art.º 2.º al. ff) do Decreto Lei 139/2004, de 5 de Junho, que Relativamente à organização do tempo de trabalho do pessoal móvel da aviação civil, a Comunidade Europeia adotou a Diretiva n.º 2000/79/CE, do Conselho, de 27 de Novembro, com o objetivo de dar aplicação ao Acordo Europeu sobre a Organização do Tempo de Trabalho do Pessoal Móvel da Aviação Civil, celebrado em 22 de Março de 2000 entre as organizações patronais e sindicais do sector da aviação civil (do preambulo) que constitui “ff) – Tripulação de Cabine – conjunto de tripulantes que não fazendo parte da tripulação técnica, são nomeados pelo operador para executar, nomeadamente, tarefas de assistência e segurança dos passageiros”. Por seu turno, o art.º 3 n.º 1 estipula que: “o tripulante não pode iniciar um serviço de voo, nem o operador lho pode exigir, quando se encontre em condições físicas, psíquicas ou outras que não permitam ou não garantam adequada execução das funções a bordo”. E o art.º 7.º n.º 1 que “o operador deve estabelecer um programa de segurança e proteção da saúde adequada à natureza do trabalho exercido pelo pessoal móvel da aviação civil, nos termos da legislação relativa à saúde, higiene e segurança”; e o n.º 3 refere que “O programa de segurança e de proteção da saúde pelo operador deve ser aprovado pelo INAC”. (…) Os deveres da tripulação nesta área são gravosos, dispondo os n.ºs 1 e 2 do art.º 20 do Decreto Lei 144/2013, de 2/4 sob a epígrafe: “Deveres da Tripulação” que 1. Compete aos membros da tripulação de aeronaves matriculadas em Portugal exercer, de forma adequada, as funções relacionadas com a segurança da aeronave e dos seus ocupantes; 2. Os membros da tripulação de aeronaves a operar em espaço aéreo sob jurisdição nacional, não podem executar as suas funções numa aeronave, nas seguintes situações: a – Sob influência de qualquer substancia que possa afetar as suas faculdades e colocar em risco a segurança do voo; b – Na sequência de um mergulho de profundidade, exceto quando tenha passado um período de 24 horas; c) – Na sequência de uma dádiva de sangue, exceto quando tenha passado 24 horas; d) – Quando tenha conhecimento ou suspeite que está a sofrer de fadiga ou se sinta incapaz para continuar colocando em risco a segurança do voo; e) – Quando tenha ingerido álcool dentro de oito horas anteriores ao início do período de serviço de voo; f) – Quando tenha um nível de álcool no sangue superior a 0,2 g/l. Mas indubitavelmente tal obrigação – realização de exames médicos por tripulação de cabine – resulta do art.º 11.º do Regulamento (EU) N.º 1178/2011 da Comissão. Sendo assim, é forçoso concluir que, determinando os exames de aeromedicina a inaptidão do trabalhador para exercer as funções de tripulante de cabine, ele está necessariamente inapto para o seu trabalho habitual, não podendo sequer a empregadora, mesmo que o quisesse, mantê-lo naquelas funções (convergindo, por todos, decidiu esta Relação, em Acórdão de 7.3.18 ” 1 – Não só quando o Sinistrado não pode executar nenhuma das tarefas que anteriormente desempenhava no seu posto de trabalho é que se está perante IPATH; 2 - Se o sinistrado deixou de poder executar todas as anteriores tarefas ou, pelo menos, o seu conjunto fundamental, a incapacidade para o trabalho habitual é considerada total. Trigésima-Nona: O Sinistrado, em função da sua lesão e do agravamento da mesma e das sequelas, com o polegar ereto não consegue prensar, agarrar, dobrar e pinçar, estando muito limitado nos seus movimentos e não conseguindo executar as funções inerentes ao seu posto de trabalho, como muito bem observou a avaliação da Junta de Medicina Aeromédica, não conseguindo desempenhar, sem falhas, as funções de segurança que lhe são atribuídas, mormente nos incidentes e evacuações sem colocar em perigo a segurança dos passageiros e da aeronave. Quadragésima: A decisão, ora sob escrutínio é manifestamente ilegal, contraditória e infundada, violando as mais elementares normas das leis internacionais e comunitárias, e desrespeitando o disposto nas leis portuguesas, profusamente identificadas e bem assim a Constituição da República Portuguesa, pese embora, como reconhece não vislumbrar fundamento para divergir da maioria da Junta Médica (cujas respostas significativas são: Não; Sim e Prejudicado), desvaloriza a Junta de Medicina Aeronáutica (que se deixou influenciar pelo Parecer do Dr. D…), não reconhecendo que a decisão AMC (junta de Medicina Aeronáutica) nem admitindo sequer, que tal decisão seja vinculativa para o Juízo do Trabalho de Setúbal, contrariando a profusa jurisprudência dos tribunais superiores e das normas para a aviação civil. Quadragésima-Primeira: No que tange à bonificação de 1.5, é pacifico que a atribuição do IPATH, não exclui este benefício. Com efeito a atribuição da bonificação pressupõe a perda ou diminuição da função inerente ou imprescindível ao desempenho do posto de trabalho, que o Sinistrado ocupava com carácter permanente, e se não for reconvertível em relação ao seu posto de trabalho ou em alternativa tiver mais de 50 anos. Deverá pois, acrescer ao IPP atribuído a bonificação de 1.5, conforme art.º 5.º a) das Instruções Gerais da TNI (vide Ac. STJ de 29/3/12). AO DECIDIR COMO DECIDIU, o Tribunal “a quo” contrariou a sedimentada jurisprudência quer do Supremo Tribunal de Justiça, quer do Tribunal da Relação de Lisboa e outras Relações, e ainda a Legislação Comunitária, no que tange à apreciação das condições e capacidades para o desempenho dos tripulantes de cabine para o serviço de voo na aviação comercial, e ainda a situação de não reconvertibilidade para o trabalho habitual, em função do acidente de trabalho, de que o Sinistrado foi vítima, e da subsequente recaída, com sequelas incapacitantes, e que abaixo se identificam, desde logo: - Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 28/01/2015, no âmbito do Proc.º 28/12.8TTCBR.C1.S1, relator, Conselheiro Leones Dantas; - Acórdão Uniformizador 10/2014 de 28/05/2014; - Acórdão do TRL de 13/07/2020, P.º 597/17.6T8CSC.L1, Relator Desembargador Sérgio Almeida; - Acórdão do TRL de 07/03/2018 – P.º 1445/14.4, Desembargador Duro Mateus Cardoso; - Acórdão do TRL de 15/06/2016 – P.º 719/12.3TTLSB.l2, Desembargadora Maria João Romba; - Regulamento (EU) 216/2008 do Parlamento e da Comissão (Anexo IV); - Regulamento (EU) 1178/2011 da Comissão de 03.Nov.2011; - Decreto-Lei n.º 139/2004 de 05 de Junho (art.º 2.º al. ff); art.º 3.º n.º 1 e art.º 7.º; - Decreto-Lei n.º 250/2003, de 11 de Outubro; - Decreto-Lei n.º 44/2013, de 02/04 (art.º 20.º )[2] - E bem assim, violou, nomeadamente: Art.º 5.º a) das Instruções Gerais da TNI (DL n.º 352/2007 de 23/10); Art.º 6.º e 8.º do Código Civil; Art.º 154.º do NCPC, ex-vi do art.º 8.º do C.C. Art.º 8.º da CRP. TERMOS EM QUE deve ser concedido provimento ao presente recurso de apelação e decretar-se a anulação da sentença e substituí-la por outra que decrete a fixação do grau de incapacidade (IPP) de 7%, acrescido do fator de bonificação de 1.5, tudo perfazendo 10,5%, com IPATH em virtude da Inaptidão para o Serviço de Voo (que é a sua profissão habitual) verificada pela ANAC – Autoridade Nacional da Aviação Civil, através do AMC – Centro de Medicina Aeromédica, a funcionar nas instalações da UCS, S.A. e, conforme determinado pela Agência Europeia para a Segurança na Aviação Civil (AESAC). Deve, ainda ser decretado o pagamento de Juros de mora à taxa legal em vigor, desde a data da interposição dos autos até efetivo e integral pagamento, e ainda decretar-se o pagamento das custas a cargo da Entidade Responsável, fazendo-se deste modo a JUSTIÇA, que se exige, que se deseja, e que todos têm direito.» Contra-alegou a seguradora, propugnando pela improcedência do recurso. A 1.ª instância admitiu o recurso, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. O processo subiu à Relação e foi dado cumprimento ao disposto no n.º 3 do artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho. A Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer favorável à confirmação da decisão recorrida. O recorrente respondeu. Mantido o recurso, foram dispensados os vistos legais, com a anuência dos Exmos. Adjuntos. Cumpre apreciar e decidir. * II. Objeto do RecursoÉ consabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da recorrente, com a ressalva da matéria de conhecimento oficioso (artigos 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicáveis por remissão do artigo 87.º n.º 1 do Código de Processo do Trabalho). Em função destas premissas, importa analisar e decidir: 1.ª Aparente arguição da nulidade da sentença. 2.ª Se deve ser atribuída IPATH ao sinistrado. 3.ª Se deve ser aplicado o fator de bonificação 1,5. * III. Matéria de FactoA matéria de facto a atender é a que consta do relatório supra, para o qual remetemos, sem necessidade da sua repetição, bem como os demais elementos que constam dos autos que se mostrem relevantes. * IV. Aparente arguição da nulidade da sentençaNa conclusão vigésima-sexta, o recorrente refere: «A sentença ora sob escrutínio, não fundamentou a sua decisão como era seu dever, art.º 154.º do NCPC, como é ainda contraditória.» Ainda que não o diga expressamente, através da sua declaração, o recorrente parece tentar introduzir no debate duas causas de nulidade da sentença – artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e c) do Código de Processo Civil, aplicável por força da remissão prevista no artigo 77.º do Código de Trabalho. Por conseguinte, apreciaremos a questão. Prescreve a alínea b) do n.º 1 do mencionado artigo 615.º que a sentença é nula quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão. Em relação à falta de fundamentação que constitui causa de nulidade da sentença, ensina-nos Alberto dos Reis[3]: «Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afeta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto. Se a sentença especificar os fundamentos de direito, mas não especificar os fundamentos de facto, ou vice-versa, verifica-se a nulidade (…)». O mesmo entendimento tem sido defendido por doutrina mais recente. Escreve Lebre de Freitas[4], que «há nulidade quando falte em absoluto indicação dos fundamentos de facto da decisão ou a indicação dos fundamentos de direito da decisão, não a constituindo a mera deficiência de fundamentação». Por sua vez, Teixeira de Sousa[5], afirma que «esta causa de nulidade verifica-se quando o tribunal julga procedente ou improcedente um pedido (e, por isso, não comete, nesse âmbito, qualquer omissão de pronúncia), mas não especifica quais os fundamentos de facto ou de direito que foram relevantes para essa decisão. Nesta hipótese, o tribunal viola o dever de motivação ou fundamentação das decisões judiciais (…)». No mesmo sentido, escreve Rodrigues Bastos[6], que «a falta de motivação a que alude a alínea b) do n.º 1 é a total omissão dos fundamentos de facto ou dos fundamentos de direito em que assenta a decisão; uma especificação dessa matéria apenas incompleta ou deficiente não afeta o valor legal da sentença». Ao nível jurisprudencial, desde há muito que os tribunais superiores, pacificamente, tem considerado que a nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil, apenas se verifica quando haja falta absoluta de fundamentos e não quando a fundamentação se mostra deficiente, errada ou incompleta[7]. Perfilhando este tribunal o entendimento doutrinal e jurisprudencial mencionado, desde já se adianta que a decisão proferida não se encontra atingida pelo alegado vício da nulidade, uma vez que o tribunal de 1.ª instância observou o dever de fundamentação que se lhe impunha no âmbito do processo. Também não vislumbramos que a decisão recorrida contenha qualquer contradição que integre a causa de nulidade prevista na alínea na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º. O raciocínio seguido revela-se coerentemente lógico e a decisão proferida está em harmonia com o mesmo. Em suma, não se verifica qualquer uma das causas de nulidade da sentença mencionadas pelo recorrente. * V. Enquadramento jurídicoA segunda questão que importa dilucidar e resolver é a de saber se há fundamento para considerar que o recorrente está afetado de IPATH. A importância da questão a dirimir leva a que uma decisão, positiva ou negativa, só deva ser tomada se o processo reunir elementos probatórios suficientes para que seja proferido um juízo consciencioso e seguro sobre a matéria. Vejamos quais os elementos que constam dos autos que relevam para a apreciação da questão: a) O recorrente, em 15-06-2012, sofreu um acidente de trabalho, que lhe provocou lesões que determinaram que ficasse afetado de uma IPP de 10%, desde 14-12-2012 (data da alta). b) O acidente consistiu num entalão entre dois troleys, tendo o recorrente magoado o polegar direito. Na sequência, sofreu lesão traumática ligamentar do referido polegar, apresentando sequelas de rigidez acentuada do mesmo. c) A lesão/sequela foi enquadrada no Capítulo I, 8.4.1 c) da TNI (Decreto-Lei n.º 352/2007, de 23/10). d) Entre a data da alta e 25-01-2021, o recorrente foi sujeito a consultas de medicina do trabalho, tendo sido, sempre, considerado apto para o trabalho, sem quaisquer restrições ou recomendações. e) Em 07-06-2021, o Dr. D… emitiu um relatório médico do qual consta um resumo do histórico do acidente e do processo judicial, seguido da seguinte apreciação técnica: «Nesta data o sinistrado apresenta agravamento da sua situação clínica com rigidez e dores ao nível da articulação interfalângica e metacarpofalângica do polegar da mão direita, impeditivo do desempenho da maioria das suas tarefas habituais inerentes à sua profissão, pelo que se mostra em situação de IPATH.» f) Em 14-06-2021, a UCS – Unidade de Cuidados Integrados de Saúde, situada no Aeroporto de Lisboa, procedeu à avaliação da aptidão para o exercício da profissão e capacidade para o voo, relativamente ao recorrente, tendo concluído: «Segundo o parecer do Dr. D… (Medicina Laboral e Pericial) que se anexa (anexo I), o Chefe de Cabine apresenta agravamento da situação clínica com rigidez ao nível da articulação interfalângica do polegar da mão direita, pelo que considera ser impeditivo para o desempenho das suas tarefas habituais inerentes à sua profissão. Atendendo à incapacidade já atribuída, à sintomatologia dolorosa e limitação funcional, que o impede de realizar as atividades habituais da sua profissão como tripulante de avião, foi considerado inapto definitivamente para o seu trabalho habitual» g) Na mesma data foi emitida “Ficha de aptidão para o trabalho”, tendo o médico considerado o recorrente definitivamente inapto. h) Em 28-09-2021, o recorrente foi submetido a exame de revisão. Este exame baseou-se na observação do recorrente, no parecer dos serviços clínicos de UCS e na “Ficha de aptidão para o trabalho, conforme do mesmo consta. O perito médico considerou que o recorrente apresentava «rigidez acentuada na MF de DI e rigidez de IF de DI». Manteve o enquadramento das lesões na TNI, bem como o grau de 10% de IPP e concluiu que ao recorrente deve ser atribuída IPATH, desde 14-06-2021. i) Foi realizado exame por junta médica, mas não houve unanimidade no laudo. A maioria dos peritos entendeu que o recorrente apresenta limitação muito discreta da articulação metacárpica falângica do polegar direito, com amplitudes funcionalmente irrelevantes. Mantêm o enquadramento anterior na TNI, mas reduzem o grau de incapacidade para 7%. Ao quesito que apresentava as funções que constam do descritivo funcional da categoria “Comissário/assistente de bordo (CAB)”, indicado pela TAP, e interrogava sobre se o quadro sequelar atual seria impeditivo do exercício de tais funções e da realização do trabalho habitual, a maioria dos peritos respondeu negativamente, esclarecendo que o recorrente poderia continuar a exercer todas as funções na medida da IPP atribuída. Já o perito do sinistrado (Dr. D…), manteve o grau de IPP de 10% resultante do enquadramento na TNI e sustentou que o recorrente não pode continuar a exercer nenhuma das tarefas inerentes ao seu posto de trabalho habitual, pelo que lhe deve ser atribuída IPATH. j) O trabalho habitual do recorrente que deve ser considerado é o de “Chefe de Cabine” (tripulante de bordo), pois eram essas as funções que o mesmo exercia em 14-06-2021. Resulta dos elementos referidos que o que sabemos sobre o trabalho habitual exercido pelo recorrente se resume ao descritivo funcional da categoria profissional que a TAP informou nos autos. Nada mais! O próprio quesito 3.º, que tanta polémica tem gerado nos autos, foi formulado tendo por base esse mesmo descritivo funcional. Temos peritos médicos que consideram que as sequelas do acidente determinam IPATH e outros que consideram que não. Ora, os elementos apurados afiguram-se-nos insuficientes para que possa ser tomada uma decisão conscienciosa e segura sobre a questão sub judice. É certo que a prova pericial está sujeita à livre apreciação do julgador - artigos 389.º do Código Civil e 489.º do Código de Processo Civil – porém, sendo um leigo nas matérias apreciadas, deverá o juiz assegurar-se que reuniu no processo todos os elementos necessários para proferir decisão firme e justa, o que no caso dos autos não se nos afigura que tenha ocorrido. Aliás, de acordo com a Instrução Geral n.º 13 da TNI, para «permitir o maior rigor na avaliação das incapacidades resultantes de acidente de trabalho e doença profissional, a garantia dos direitos das vítimas e a apreciação jurisdicional, o processo constituído para esse efeito deve conter obrigatoriamente os seguintes elementos: a) Inquérito profissional, nomeadamente para efeito de história profissional; b) Análise do posto de trabalho, com caracterização dos riscos profissionais e sua quantificação, sempre que tecnicamente possível (para concretizar e quantificar o agente causal de AT ou DP); c) História clínica, com referência obrigatória aos antecedentes médico-cirúrgicos relevantes; d) Exames complementares de diagnóstico apropriados.» Ora, nos presentes autos falta o inquérito descritivo da história profissional do recorrente, bem como a análise do posto de trabalho, sendo certo que estes elementos são relevantes quando importa avaliar se o recorrente está afetado ou não de IPATH. É que não deixa de ser estranho que nenhum dos peritos se tenha pronunciado pelo agravamento do grau de IPP (e repare-se que o enquadramento na TNI permitia que o grau de IPP pudesse ir até 12%), o recorrente tenha sido sempre considerado apto para o trabalho habitual desde 14-12-2012 (data da alta) até 25-01-2021, no âmbito das diversas consultas de medicina do trabalho a que foi submetido, e, em 14-06-2021 (4 meses após a última consulta) seja considerado definitivamente inapto para o trabalho. É importante que se compreenda a história profissional do recorrente, as concretas funções que exercia, e em que medida as sequelas de que padece afetam absolutamente todas, a maioria ou algumas (neste caso, quais) destas funções, bem como a razão, se for o caso, porque não afetaram até 25-01-2021, pelo menos. Em suma, entendemos que se verifica uma situação de insuficiência dos meios de prova, mostrando-se necessário completar a prova produzida, com a realização de inquérito descritivo da história profissional do sinistrado, da análise do posto de trabalho, e posterior apresentação da informação obtida para avaliação por nova junta médica. O exposto não prejudica, naturalmente, a determinação de outros meios de prova que possam vir a ser considerados importantes e necessários, pela 1.ª instância. Destarte, entendemos que a decisão recorrida deve ser anulada, ao abrigo do artigo 662.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Civil, para que, antes de ser formulado um juízo sobre a atribuição ou não de IPATH, se proceda à obtenção dos meios de prova indicados e, eventualmente, outros meios probatórios que o tribunal de 1.ª instância considere necessários, para que a decisão final que se venha a assumir seja fundada em dados objetivos consistentes. Na sequência do decidido, fica prejudicado o restante conhecimento do recurso. * VI. DecisãoNestes termos, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso procedente e, em consequência, anulam a decisão recorrida, para que sejam solicitados o inquérito descritivo da história profissional do sinistrado e a análise do posto de trabalho, que deverão ser, posteriormente, apresentados perante nova junta médica que avaliará se o sinistrado está ou não afetada de IPATH, sem prejuízo da produção de outros meios probatórios que o tribunal de 1.ª instância considere necessários, sendo posteriormente proferida nova decisão. Custas pela parte vencida a final. Notifique. Évora, 13 de julho de 2022 Paula do Paço (Relatora) Emília Ramos Costa (1.ª Adjunta) Moisés Silva (2.º Adjunto) __________________________________________________ [1] Relatora: Paula do Paço; 1.º Adjunto: Emília Ramos Costa; 2.ª Adjunto: Moisés Silva [2] E não DL 144/2013, como por mero lapso se publicou no texto do Acórdão; [3] In Código de Processo Civil anotado, Vol. V, pág.140. [4] In Código de Processo Civil, pág.297. [5] In Estudos sobre Processo Civil, pág. 221. [6] In Notas ao Código de Processo Civil, III, pág. 194. [7] Neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 08-04-1975, BMJ 246.º, pág. 131; o Acórdão da Relação de Lisboa, de 10-03-1980, BMJ 300º, pág. 438; o Acórdão da Relação do Porto de 08-07-1982, BMJ 319.º, pág. 343; e o Acórdão da Relação de Coimbra de 06-11-2012, P. 983/11.5TBPBL.C1 e o Acórdão da Relação de Évora de 20-12-2012, P. 5313/11.3YYLSB-A.E1, ambos acessíveis em www.dgsi.pt. |