Acordam, em conferência, na 2.ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
I.
No processo de recurso de contraordenação n.º 619/22.9T8SLV do Juízo de Competência Genérica de Silves, Comarca de Faro, foi proferida sentença que, apreciando impugnação judicial da decisão administrativa proferida pela Secretaria Geral do Ministério da Administração Interna em 2 de Fevereiro de 2022, na qual D..., Lda., foi condenada pela prática de 1 (uma) contraordenação grave, prevista e punida pelos artigos 8.º n.º 7 e 59.º, n.ºs 2, al. b), 4, al. b) e 8 da Lei n.º 34/13, de 16 de maio e na al. c) do parágrafo 3.1., do n.º 3 do anexo I da Portaria n.º 273/2013, de 20 de Agosto na coima no montante de €7.500,00, decidiu julgar aquele recurso de impugnação judicial parcialmente procedente e, em consequência, mantendo a condenação aplicada à recorrente, aplicou, todavia e em substituição da coima anteriormente aplicada no montante de €7.500,00 (sete mil e quinhentos euros), a sanção de admoestação,
Inconformado com esta decisão, veio o M.º P.º interpor recurso da mesma, invocando, como QUESTÃO PRÉVIA, fazê-lo ao abrigo dos art.ºs 73º n.º 2 e 74º n,º 1 a 4 do RGCO pois a jurisprudência está longe de se encontrar uniformizada, relativamente à questão em análise (da admissibilidade ou não da admoestação no caso de contraordenações classificadas como graves ou muito graves) e quanto à formalidade (escrita ou oral) da admoestação e, quanto ao recurso da decisão propriamente dito, com os fundamentos constantes da respectiva motivação que aqui se dá por reproduzida e as seguintes conclusões:
“1. O Ministério Público não concorda com a substituição da coima aplicada à Recorrente pela sanção de admoestação, por duas linhas de razão:
a. inadmissibilidade da aplicação da admoestação em contra-ordenação considerada como grave;
b. formalidade da aplicação da admoestação (escrita).
2. Foi a Recorrente condenada por uma contra-ordenação que a própria formulação legal do preceito tipificador da conduta, classifica como grave (art.º 8º nº 7 e 59º nº 2 al. b), 4º al. b) e 8 da Lei nº 34/13 de 16 de Maio e na al. c) do parágrafo 3.1 do nº 3 do anexo I da Portaria nº 273/2013 de 20 de Agosto).
3. Esta classificação legal da contra-ordenação em causa afasta desde logo a possibilidade da aplicação da medida de admoestação, prevista no artigo 51º, do Regime Geral das Contra-Ordenações, pois que objectiva e expressamente, trata-se de uma contra-ordenação com gravidade. (neste sentido, entre outros o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 08-03-2018; Processo nº 2551/17.9T8ENT.E1; Relator, Dr. Gomes de Sousa, disponível em www.dgsi.pt; Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça nº 6/2018, publicado no D.R nº 219/2018, Série I de 14 de Novembro de 2018; o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 17 de Setembro de 2014, Processo nº 656/13.4TBPNF.P2; Relator Dra. Elsa Paixão; disponível em www.dgsi.pt”.
4. No fundo, a admoestação trata-se de uma alternativa para os casos de pouca relevância do ilícito criminal e da culpa do agente, isto é, para contraordenações leves ou simples, ou seja, quando quer a gravidade do ilícito quer a culpa sejam reduzidos (cfr: PAULO PINTO de ALBUQUERQUE, Comentário do Regime Geral das Contra-Ordenações, p. 222 e ss. e SIMAS SANTOS e LOPES DE SOUSA, Contra- Ordenações, Anotações ao Regime Geral, 2011, p. 394).
5. Entendeu o tribunal a quo que: “(…) em nosso entendimento, que, não obstante a integração dum tipo legal de ilícito contra-ordenacional definido em abstracto como sendo grave, as circunstâncias do caso concreto podem apontar em concreto para uma diminuta ilicitude e gravidade. (…).
6. Na verdade, para a aplicação da admoestação terão de verificar-se no caso concreto, dois requisitos legais, a pouca relevância do ilícito e a diminuta culpa do agente, cumulativamente e não em alternativa um do outro. E, se neste caso concreto, resultaram provados factos relevantes relativos à menor culpa do arguido/recorrente, como sejam actuação ser qualificada como negligente, a ausência de antecedentes contra-ordenacionais, contudo, foi a Recorrente condenada por uma contra-ordenação que a própria formulação legal do preceito tipificador da conduta, classifica como grave.
7. Ora, por si só, esta classificação legal da contra-ordenação em causa afasta desde logo a possibilidade da aplicação da medida de admoestação, prevista no artigo 51º, do Regime Geral das Contra-Ordenações, pois que objectiva e expressamente, trata-se de uma contra-ordenação com gravidade.
8. Sempre se dirá que a circunstância de o tribunal a quo ter considerado a conduta negligente isso apenas faz cair a culpa de “muito grave” para “menos grave”, mas não é considerada por si só diminuta ou reduzida.
9. Ora, no caso em apreço, preenchidos que se encontram os elementos objectivos e subjectivos do tipo e uma vez que estamos perante uma contra-ordenação tipificada como grave, inadmissível será de aplicar a sanção de admoestação, pelo que deverá ser revogada a decisão de substituição que ora se recorre, e substituída por outra que mantenha a decisão anteriormente proferida pela autoridade administrativa.
10. Pelo exposto, violou o tribunal a quo o art.º 51º nº 1 do RGCO e (art.º 8º nº 7 e 59º nº 2 al. b), 4º al. b) e 8 da Lei nº 34/13 de 16 de Maio e na al. c) do parágrafo 3.1 do nº 3 do anexo I da Portaria nº 273/2013 de 20 de Agosto).
11. Ademais, sempre se dirá que, mesmo que se considerasse a admissibilidade da aplicação da sanção de admoestação no caso em apreço, a mesma deveria ser proferida oralmente e não por escrito.
12. De facto, resulta do artº 51º, nº 2 do RGCO que: “A admoestação é proferida por escrito (…)”, porém, tal só ocorre quando a admoestação é aplicada pela autoridade administrativa, uma vez que, quando a admoestação ocorre em fase judicial, se aplicará, a nosso ver, o disposto no artº 60º, nº 4 do C.P., por via do disposto no artº 32º da RGCO. Neste sentido, vd. Manuel Simas Santos e Jorge Lopes de Sousa, in Contra-Ordenações – Anotações ao Regime Geral, 2002, pp. 316 e 317, em anotação ao referido artº 51º.
13. A decisão proferida por escrito é nula por vício de forma, devendo ser substituída por outra que preveja o cumprimento cabal da admoestação (censura solene oral).
14. Pelo exposto, o tribunal a quo violou as seguintes disposições legais: 60º, nº 2 do CP, 32º do RGCO e 497 º do CPP.”
Termina no sentido de a sentença do tribunal ser revogada.
A este recurso veio responder a arguida pessoa colectiva, concluindo nessa resposta:
“1 – À recorrente não assiste qualquer razão quer de facto quer de direito;
2 – Pelo Tribunal “a quo” foi feita uma correcta apreciação dos factos e uma digna aplicação do Direito;
3 – A gravidade da contra-ordenação afere-se pelo grau de ilicitude, bem assim como às consequências ou inexistência delas considerando os factos em causa.
4 – Está provado que:
a) No dia 5 de Dezembro de 2018, no Posto de Combustível Intermarché, sito na Rua ..., em ..., propriedade da Recorrente, encontrava-se em funcionamento o sistema de videovigilância, não estando o horário sincronizado com a hora legal e real, marcando no respectivo monitor 12:25h, quando eram 11:01.
b) A recorrente, enquanto proprietária do estabelecimento referido no ponto n.º 1, era conhecedora da obrigatoriedade da sincronização dos servidores do sistema de videovigilância, referido no mesmo facto, com a hora legal portuguesa, pelo que ao não promover por tal sincronização, i.e., não se certificando que o horário do referido sistema de videovigilância estava sincronizado com a hora legal e real, sem ter representado tal possibilidade, não agiu com o cuidado e diligência a que se encontrava obrigada, que lhe era exigível e de que era capaz.
c) A recorrente agiu de forma livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei contraordenacional.
5 – Considerou o Tribunal que a medida da coima fixada pela entidade administrativa se tem como adequada às circunstâncias do caso concreto, se atendermos ao desfasamento do horário marcado no sistema de videovigilância [12h25m] e a hora legal e real [11h01m] e que não se apurou qualquer ao benefício económico ilegítimo por si retirado com prática da contraordenação em causa nos autos.
6 – Atendeu à gravidade da infração, não se tendo apurado que, no caso concreto, a prática da contraordenação imputada à ora recorrida causou quaisquer danos patrimoniais ou não patrimoniais a terceiros ou os prejudicou de qualquer forma e ainda à sua culpa, que se afigura como negligente, na forma inconsciente;
7 - O Tribunal “a quo” aplicou uma admoestação e no nosso entendimento fê-lo de forma correta, sem que a decisão mereça qualquer reparo, porquanto o disposto no artigo 51º do RGCO no seu nº 1 dispõe que: “Quando a reduzida gravidade da infração e da culpa do agente o justifique, pode a entidade competente limitar-se a proferir uma admoestação e no seu nº 2 a admoestação é proferida por escrito, não podendo o facto voltar a ser apreciado como contra-ordenação”;
8 – Tal como consta da douta decisão proferida pelo Tribunal “a quo” “apesar do artigo 51º do Regime Geral das Contra-ordenações referir «entidade competente», a jurisprudência tem entendido que é possível a aplicação da admoestação já em fase jurisdicional, funcionando como verdadeira pena de substituição da coima aplicada, da mesma forma que a admoestação penal (cf. Artigo 60º do Código Penal) é uma pena de substituição da multa [neste sentido vejam-se os Acórdãos do Tribunal da Relação de 27/02/2013, relator: José Eduardo Martins; de 27/06/2012 relator: Paulo Guerra; e de 10/03/2010 relator: Mouraz Lopes, todos disponíveis em www.dgsi.pt]
9 – Por tudo o que foi alegado, a decisão recorrida não merece qualquer censura e deverá, assim, ser mantida na íntegra.
10 – E, consequentemente, deverá ser julgado improcedente o recurso interposto pela recorrente, confirmando-se a sentença recorrida.”
Aquele recurso veio a ser admitido “ao abrigo do disposto nos artigos 73º n.º 2 e 74º do Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro e dos artigos 399º e 401º nº 1 al. a) do Código de Processo Penal” por despacho de 20.09.2022.
Nesta Relação, pelo Exmo. PGA foi emitido parecer em que, manifestando concordância com as perspetivas jurídicas e conclusões apresentadas no recurso, propugna a procedência do recurso.
Dado cumprimento ao disposto no art.º 417º n.º 2 CPP, não houve respostas ao mesmo parecer.
II.
Colhidos os vistos legais, procedeu-se a conferência pelo que cumpre agora apreciar e decidir.
Como acima se mencionou o recurso mostra-se interposto e admitido “ao abrigo do disposto nos artigos 73º n.º 2 e 74º do Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro e dos artigos 399º e 401º nº 1 al. a) do Código de Processo Penal”.
O artigo 73º do RGCO, aprovado pelo Decreto Lei 433/82, sob a epígrafe de “decisões judiciais que admitem recurso”, procede a uma enumeração exaustiva sobre a questão.
No n.º 1, dispõe-se que: se pode recorrer para a Relação, da sentença ou do despacho judicial proferidos, nos termos do artigo 64º, quando:
a) for aplicada ao arguido coima superior a €249,40;
b) a condenação do arguido abranger sanções acessórias;
c) o arguido for absolvido ou o processo arquivado em casos em que a autoridade administrativa tenha aplicado uma coima superior a € 249,40 ou em que tal coima tenha sido reclamada pelo MP;
d) a impugnação judicial for rejeitada;
e) o tribunal decidir através de despacho não obstante o recorrente se ter oposto a tal.
Assim temos que, do âmbito do artigo 73º n.º 1, excluída a situação dos despachos proferidos ao abrigo do artigo 64º, apenas é permitido recorrer da sentença. E não de qualquer sentença. Apenas, nos casos previstos nas várias alíneas do referido n.º 1 do artigo 73.º.
Por sua vez, o n.º 2 do artigo 73º, refere-se, também exclusivamente, a sentenças, naturalmente de entre as não previstas no n.º 1, alargando a possibilidade de recurso das decisões finais “quando tal se afigure manifestamente necessário à melhoria do direito ou à promoção da uniformidade da jurisprudência.”
Apesar de expressamente invocado tal dispositivo no despacho de admissão do recurso, ao invés do que sucede no processo penal, art.º 399º CPPenal, em que por princípio todas as decisões são recorríveis, com excepção dos casos previstos no artigo 400º, a regra, em matéria de contraordenações, é a da irrecorribilidade. As excepções serão os casos previstos no artigo 73º.
Esta limitação do direito ao recurso, para o Tribunal da Relação, das decisões judiciais proferidas no processo de contraordenação justifica-se atenta a natureza do ilícito de mera ordenação social e das sanções que lhe correspondem – coimas, que têm carácter meramente económico-administrativo.
Por outro lado, nos processos em que se apreciam crimes em que os bens jurídicos violados apresentam um mínimo ético, o ilícito de mera ordenação social é eticamente neutro ou indiferente.
Daí que o art.º 74º RGC disponha,
- No seu n.º 2 que, nos casos previstos no n.º 2 do artigo 73.º o requerimento deve seguir junto ao recurso, antecedendo-o e,
- O n.º 3 que, nestes casos a decisão sobre o requerimento constitui questão prévia, que será resolvida por despacho fundamentado do tribunal, equivalendo o seu indeferimento à retirada do recurso.
Pelo princípio da preclusão e da autossuficiência, será, então, neste requerimento, também ele prévio ao recurso, que o recorrente terá que alegar os factos demonstrativos da manifesta necessidade de melhorar a aplicação do direito - ou, de promover a uniformidade da jurisprudência - expondo logo toda a fundamentação.
Será necessário enunciar as razões de tal entendimento, cuja demonstração melhor se fará, contudo, em sede de motivação do recurso.
Não se pode confundir, por um lado, a natureza e o objectivo da motivação do recurso com a questão prévia da sua admissão - no caso, com fundamento na promoção da melhoria da aplicação do direito.
Valendo-nos, nesta parte, da alegação desenvolvida pelo recorrente, ali se encontram apresentadas as duas questões sobre as quais a “melhoria do direito” se mostra necessária: i) a (in)admissibilidade da aplicação da admoestação em contraordenações consideradas como graves e muito graves e ii) formalidade da aplicação da admoestação (escrita ou oral).
Mostra-se ainda nessa parte invocado o fundamento da necessidade dessa melhoria: por relação à primeira das questões, a existência de decisões jurisprudenciais, de que a própria sentença faz eco, apresentando soluções contraditórias quanto à possibilidade de aplicação da sanção de admoestação a contraordenações que não sejam catalogadas como leves e, quanto à segunda, que a jurisprudência tem posições diferentes, existindo decisões que defendem que no processo contraordenacional a admoestação é proferida por escrito e não oralmente como sucede no processo penal.
Analisada esta fundamentação somos do entendimento de que a admissibilidade do recurso com a finalidade apontada pelo recorrente, como sendo com vista à melhoria do direto, se mostra justificada, nada obstando, portanto, ao respectivo conhecimento, o que se declara.
Quanto ao recurso propriamente dito, cujo âmbito é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar, conforme jurisprudência uniforme do STJ (cfr. Ac. STJ de 28.04.99, CJ/STJ, ano de 1999, p. 196 e jurisprudência ali citada), sem prejuízo das de conhecimento oficioso, designadamente os vícios indicados no art.º 410º nº 2 do C.P.P. (cfr. Ac. STJ para fixação de jurisprudência nº 7/95, de 19/10/95, publicado no DR, série I-A de 28/12/95), face às conclusões da motivação do recurso, as questões suscitadas são:
- A inadmissibilidade da aplicação da admoestação em contraordenações consideradas como graves e muito graves.
- Formalidade da aplicação da sanção de admoestação (escrita ou oral).
Na sentença recorrida consta:
“Factos Provados.
…
1. No dia 5 de Dezembro de 2018, no Posto de Combustível Intermaché, sito na Rua ..., em ..., propriedade da Recorrente, encontrava-se em funcionamento o sistema de videovigilância, não estando o horário sincronizado com a hora legal e real, marcando no respectivo monitor 12:25h, quando eram 11:01.
2. A recorrente, enquanto proprietária do estabelecimento referido no ponto n.º 1, era conhecedora da obrigatoriedade da sincronização dos servidores do sistema de videovigilância, referido no mesmo facto, com a hora legal portuguesa, pelo que ao não promover por tal sincronização, i.e., não se certificando que o horário do referido sistema de videovigilância estava sincronizado com a hora legal e real, sem ter representado tal possibilidade, não agiu com o cuidado e diligência a que se encontrava obrigada, que lhe era exigível e de que era capaz.
3. A recorrente agiu de forma livre e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e punida por lei contraordenacional.
*
B- Factos não Provados.
Não ficaram por provar quaisquer factos para a decisão da causa, com relevância para a decisão a proferir.
*
Consigna-se que não foi considerada matéria constante da decisão administrativa e da impugnação judicial de cariz normativo ou de carácter conclusivo, a que não é lícito atender no âmbito da matéria de facto, e, bem assim, a factualidade desprovida de interesse e relevância para a decisão da causa.
*
C - Motivação da decisão de facto.
Assim a convicção sobre os factos provados formou-se com base na documentação constante dos autos e do processo administrativo de contra-ordenação, designadamente do teor da decisão administrativa, das fotografias e dos documentos juntos aos autos.
Mais se considerou, de igual forma, a posição manifestada pela recorrente nos autos, mormente na sua impugnação judicial, no âmbito da qual não impugnou a factualidade supra descrita, não a colocando em causa e limitando-se a invocar essencialmente questões de natureza formal e de direito.”
Não se mostram questionados no recurso aqueles factos nem a respectiva integração jurídica - 1 (uma) contraordenação grave, prevista e punida pelos artigos 8.º, n.º 7 e 59.º, n.ºs 2, al. c), 4, al. b) e 8 da Lei n.º 34/13, de 16 de maio e na al. c) do parágrafo 3.1., do n.º 3 do anexo I da Portaria n.º 273/2013, de 20 de agosto -, nem o quantum da coima aplicada – seja na decisão administrativa seja nesta sentença ora recorrida, mas tão somente a aplicação, em substituição da coima então fixada confirmada no montante de €7.500,00 -, mas tão somente a substituição da coima pela sanção de admoestação, sendo este aspecto que o recorrente M.º P.º considera inadmissível.
Aquela opção de substituição teve por base a seguinte argumentação, depois de concluir que “Diante do exposto, considera o Tribunal que deve a recorrente ser condenada pela prática de 1 (uma) contraordenação grave, prevista e punida pelos artigos 8.º, n.º 7 e 59.º, n.ºs 2, al. c), 4, al. b) e 8 da Lei n.º 34/13, de 16 de maio e na al. c) do parágrafo 3.1., do n.º 3 do anexo I da Portaria n.º 273/2013, de 20 de agosto, na coima de €7.500,00 [sete mil e quinhentos euros], conforme decidido pela entidade administrativa, sem prejuízo da referida coima ser substituída pela sanção de admoestação ou atenuada especialmente, caso se verifiquem os respetivos pressupostos.”, continuou.
“Da aplicação da admoestação
Estipula o artigo 51.º do Regime Geral das Contraordenações que «1 - Quando a reduzida gravidade da infracção e da culpa do agente o justifique, pode a entidade competente limitar-se a proferir uma admoestação. 2 - A admoestação é proferida por escrito, não podendo o facto voltar a ser apreciado como contra-ordenação.».
A referida norma tem aplicação à contraordenação aplicada à recorrente, atento o disposto no artigo 62.º da Lei n.º 34/2013, de 16 de maio.
Apesar do artigo 51.º do Regime Geral das Contra-Ordenações referir «entidade competente», a jurisprudência tem entendido que é possível a aplicação da admoestação já em fase jurisdicional, funcionando como verdadeira pena de substituição da coima aplicada, da mesma forma que a admoestação penal (cf. artigo 60.º do Código Penal) é uma pena de substituição da multa [neste sentido, vejam-se os Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 27/02/2013, relator: José Eduardo Martins; de 27/06/2012, relator: Paulo Guerra; e de 10/03/2010, relator: Mouraz Lopes, todos disponíveis em www.dgsi.pt].
Por sua vez, a expressão «culpa reduzida», utilizada igualmente no artigo 51.º do Regime Geral das ContraOrdenações, tem levado os tribunais superiores a entender, em determinados diplomas legislativos que preveem contraordenações específicas, que a admoestação não terá aplicação em caso de contraordenações classificadas como graves ou muito graves, mas apenas para as que a lei classifique como leves [veja-se a título exemplificativo o A.U.J. do S.T.J. n.º 6/2018, publicado em Diário da República n.º 219/2018, Série I de 14 de novembro de 2018], sendo de lembrar que, no caso concreto, a contraordenação praticada pela recorrente se tem como grave.
Assim, e como se disse, alguns tribunais superiores têm entendido que a referência à «gravidade da infração» que é feita pelo artigo 51.º do Regime Geral das Contraordenações limita a aplicação da admoestação, no máximo, às contraordenações graves, e mesmo aqui só a título excecional – ao passo que alguma jurisprudência, mais restritiva, até limita a admoestação apenas às contraordenações leves.
A gravidade da contraordenação mede-se pela sua ilicitude: e os graus de ilicitude seriam neste entendimento concedidos pela lei, quando classifica as contraordenações como leves, graves, e muito graves [neste sentido, veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 08/03/2018, relator: Gomes de Sousa e o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 10/07/2019, relatora: Rita Romeira, ambos disponíveis em www.dgsi.pt].
Outra orientação jurisprudencial tem entendido, porém, que a pena de admoestação é sempre aplicável, independentemente da classificação da contraordenação como leve, grave, ou muito grave, desde que se verifiquem circunstâncias que reduzam significativamente a culpa ou a ilicitude do facto [neste sentido, veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 29/12/2017, relator: João Pedro Nunes Maldonado, e os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo datados de 19/06/2019 [relatora: Dulce Neto] e de 10/10/2018 [relator: Francisco Rothes], todos disponíveis em www.dgsi.pt].
Esta jurisprudência, preconiza que se a intenção legislativa fosse a de excluir as contraordenações graves ou muito graves do âmbito de aplicação da admoestação, o texto legal seria necessariamente mais específico nesse sentido.
Por outro lado, a jurisprudência contrária, também supracitada, entende que se o legislador optou por classificar a contraordenação como grave, ou muito grave, não pode ser o julgador a substituir-se ao legislador.
O Tribunal considera que é de acolher o segundo entendimento jurisprudencial apontado – ou seja, de que é irrelevante a classificação da contraordenação como leve, grave ou muito grave para fins do artigo 51.º do Regime Geral das Contraordenações, devendo a respetiva ponderação ser feita caso a caso, avaliando-se do grau de ilicitude concreto e atendendo à culpa do arguido, às suas circunstâncias concretas, às consequências do ilícito e ao eventual benefício económico que este tenha obtido.
O texto legal necessitaria de ser mais específico, prevendo expressamente a exclusão das contraordenações graves e muito graves do âmbito da pena de admoestação; a classificação da contraordenação como grave ou muito grave tem já encerrada em si um juízo de ilicitude, que, no entanto, se reporta à abstração – à importância dos bens jurídicos tutelados e à seriedade em abstrato da prática da infração.
E ficaria por analisar as circunstâncias concretas do caso – sendo que a pena de admoestação nunca é de aplicação automática e depende sempre da avaliação casuística do comportamento do agente e da gravidade da infração; mesmo numa contraordenação grave, não são sempre as mesmas as circunstâncias do agente, nem as consequências do ilícito.
Por outro lado, certos diplomas legais fazem de imediato esta distinção, afastando a possibilidade de admoestação a contraordenações graves e muito graves – veja-se por exemplo o artigo 48.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, o qual limita a possibilidade de admoestação às contraordenações punidas naquele diploma como leves.
O próprio Código Penal, quando prevê a possibilidade de admoestação, estabelece um limite de dias de multa (240 dias – cf. artigo 60.º, n.º 1 do Código Penal), o que não sucede com o Regime Geral das Contraordenações; de resto, a pena de admoestação pode ser sempre aplicada desde que tenha existido reparação e as exigências de prevenção se encontrem salvaguardadas (cf. art. 60.º, n.º 2 do Código Penal), independentemente da gravidade em abstrato do ilícito – ou seja, a aplicação da admoestação deve partir sempre de uma análise concreta do caso, independentemente da moldura abstrata do crime, desde que a pena concreta não exceda 240 dias de multa.
A classificação das contraordenações em graus de gravidade relaciona-se, muitas vezes, apenas com o regime de eventuais sanções acessórias ou então com a ordenação ou classificação mais eficiente das coimas aplicáveis a contraordenações consoante sejam leves, graves ou muito graves – não podendo servir para afastar a análise casuística da gravidade da infração e da culpa do agente – sendo que, com um entendimento contrário, perder-se-ia a noção de proporcionalidade e de adequação da sanção à conduta do agente.
Ademais, não descura o Tribunal a jurisprudência fixada, na medida em que o A.U.J. supracitado tem a sua aplicação limitada às contraordenações previstas no Decreto-Lei n.º 78/2004 de 03 de abril, e não a todas as contraordenações em geral.
Aliás, é de citar o voto de vencido do conselheiro Santos Cabral proferido naquela decisão, segundo o qual «é a qualificação de uma conduta concreta como penalmente ilícita que significa que ela é, de uma perspectiva tanto objectiva, como subjectiva, desconforme com o ordenamento jurídico-penal e que este lhe liga, por conseguinte, um juízo negativo de valor (de desvalor). A função que a categoria da ilicitude cumpre no sistema do facto punível é, em suma, definir - não em abstracto, mas em concreto, isto é, relativamente a singulares comportamentos - o âmbito do penalmente proibido e dá-lo a conhecer aos destinatários potenciais das suas normas, motivando por esta forma tais destinatários a comportamentos de acordo com o ordenamento jurídico-penal. Só a partir daqui ganha o tipo o seu verdadeiro significado e a ilicitude se apresenta como o verdadeiro fundamento do tipo. (…) Significa o exposto, em nosso entendimento, que, não obstante a integração dum tipo legal de ilícito contra-ordenacional definido em abstracto como sendo grave, as circunstâncias do caso concreto podem apontar em concreto para uma diminuta ilicitude e gravidade. A integração dum tipo de ilícito contra-ordenacional, reputado como grave em abstracto pela norma, assume uma natureza indiciária dessa mesma gravidade a qual não é necessariamente coincidente com as concretas circunstâncias sujeitas a julgamento.».
Diante do supra exposto, e mesmo tendo a recorrente praticado uma contraordenação grave prevista na Lei n.º 34/2013, de 16 de maio, considera o Tribunal que, no caso concreto, e tendo por referência a factualidade dada como provada, pode ser aqui aplicada à recorrente a sanção de admoestação, senão vejamos.
Atendendo ao lapso de tempo já decorrido desde a prática dos factos (quase quatro anos) e ponderando todas as circunstâncias fácticas que, numa imagem global, diminuem consideravelmente a ilicitude dos factos, nomeadamente não há notícia de que depois da prática dos factos em causa nos autos a Recorrente tenha praticado quaisquer outros de igual natureza [ou similar], o que demonstra que a mesma vem pautando a sua «vida comercial» em conformidade com o direito e as regras legalmente impostas no que a este respeito concerne.
Por outro lado, é ainda de atender que não se provou a obtenção de qualquer benefício económico da recorrente com a prática da contraordenação em causa nos autos.
Por fim, e a este propósito, é ainda de frisar que a culpa da recorrente é reduzida, pois que atuou com a modalidade menos grave da negligência – i.e. com negligência inconsciente, e a infração, ainda que classificada pela lei como grave, não teve quaisquer consequências para terceiros [pois que, apesar da censurabilidade da conduta, a mesma não acarretou quaisquer danos para terceiros de natureza patrimonial ou não patrimonial, nem se provou que prejudicou qualquer pessoa], sendo que não se provou que existiram quaisquer captações de imagens que importasse salvaguardar ou prestar.
Desta forma, se por um lado estariam reunidos todos os pressupostos para a aplicação de uma coima, como aplicou o S.G.M.A.I., por outro lado, como apela a recorrente torna-se plausível ponderar a aplicação de uma admoestação, nos termos do artigo 51.º do Regime Geral das Contraordenações, pois que as necessidades de prevenção especial, no caso concreto, são baixas, atenta a ausência de registo de antecedentes contraordenacionais por parte da recorrente e que a mesma atuou com uma culpa leve.
A isto acresce que aplicação da admoestação não coloca em causa as necessidades de prevenção geral que se fazem sentir no caso [que são médias], pois que, como se disse, da atuação da recorrente não resultaram quaisquer consequências para terceiros – sendo que a admoestação representa uma censura suficiente do facto e é uma garantia para a comunidade da validade e vigência da norma violada.
Neste circunstancialismo globalmente ponderado, o Tribunal formula um juízo de adequação e suficiência pela aplicação da admoestação em substituição da coima.
Com tal advertência e perante a conduta adotada até então, vislumbra-se poder ser suficiente, a que a recorrente não volte a prevaricar, sabendo, desde já, que incorrendo novamente na prática desta contraordenação não beneficiará, com certeza, de tal sanção substitutiva da coima.
Neste sentido, entende o Tribunal adequado a aplicação da sanção substitutiva de admoestação, em conformidade com o disposto no artigo 51.º do Regime Geral das Contraordenações aplicável ex vi do artigo 62.º da Lei n.º 34/2013, de 16 de maio.”
A citação supra merece-nos uma primeira nota ou observação, dirigida ao primeiro dos parágrafos citados, que parece transmitir a ideia de que a decisão administrativa já admitia a substituição da coima aplicada quando ali se menciona “sem prejuízo da referida coima ser substituída pela sanção de admoestação ou atenuada especialmente, caso se verifiquem os respetivos pressupostos”, o que não corresponde à verdade nem sequer constava da pretensão da arguida quando a impugnou judicialmente pois pretendia apenas uma atenuação especial da coima – vide pág. 2 da sentença.
A segunda nota que se nos impõe fazer é relativa à invocação do regime penal relativo aplicação da pena de admoestação que não tem qualquer relevância para o regime punitivo dos ilícitos de mera contraordenação social atenta a especificidade destes - com menor ressonância ética - nem se mostrando aquela argumentação relevante mesmo que com base num voto de vencido lavrado no AFJ 6/2008 a que a sentença faz apelo e que, no essencial da argumentação desenvolvida no referido voto de vencido, assenta na alegação de que a integração dum tipo de ilícito contraordenacional, reputado como grave em abstracto pela norma, assume uma natureza indiciária dessa mesma gravidade a qual não é necessariamente coincidente com as concretas circunstâncias sujeitas a julgamento.
Sendo certa essa afirmação, em nosso entendimento e divergindo daquele voto, se a integração dum tipo de ilícito contraordenacional, reputado como grave em abstracto pela norma, assume uma natureza indiciária dessa mesma gravidade a qual não é necessariamente coincidente com as concretas circunstâncias sujeitas a julgamento e, se as circunstâncias do caso concreto podem apontar em concreto para uma diminuta ilicitude e gravidade, então a valoração destas últimas poderá – deverá, atrevemo-nos a dizer - ser atendida dentro da moldura sancionatória que cabe ao ilícito sem necessariamente cair numa punição diversa ou substitutiva como foi o caso.
Apesar de o referido aresto unificador da jurisprudência ter sido tirado no quadro de contraordenações em matéria de ambiente, não podemos deixar de fazer apelo ao argumento ali esgrimido de que “Porém, não se pode considerar que, atento o caso concreto, a ilicitude da conduta diminua de gravidade, depois de o legislador a ter classificado como sendo uma contraordenação grave, porque portadora de uma ilicitude considerada grave. Na verdade, sempre que o legislador, de forma geral e abstrata, classifica a infração como sendo grave, não poderá o julgador modificar a lei atribuindo menor gravidade àquela ilicitude. Por isto, não pode deixar de se entender que a classificação legal de uma contraordenação como grave afasta logo a possibilidade de o julgador considerar que aquela mesma contraordenação grave afinal é de “reduzida gravidade”.
O legislador, ao classificar as contraordenações como graves, muito graves ou leves pretendeu assegurar o princípio da proporcionalidade entre as infrações e as sanções previstas. Este princípio não é assegurado sempre que atenta a gravidade da infração se decide pela aplicação de uma sanção que pressupõe a reduzida gravidade daquela.”
Assim sendo, face à catalogação como sendo “grave” a contraordenação em questão imputada à recorrida arguida feita pelo legislador no quadro regulatório com que somos confrontados no caso de que nos ocupamos, a Lei 34/2103 de 16 de Maio, seguindo a jurisprudência maioritária que se mostra invocada pelo recorrente, somos de concluir que a sanção decretada na sentença recorrida não pode subsistir, impondo-se a revogação da mesma e mantendo a condenação decretada pela autoridade administrativa – de resto “mantida” na sentença – na coima de €7.500,00 (sete mil e quinhentos euros).
Procede, assim, o recurso nesta parte.
Quanto à segunda das questões suscitadas - Formalidade da aplicação da sanção de admoestação (escrita ou oral) – e que o recorrente M.º P.º entende ser de estabelecer como sendo oral, parece-nos que a questão se mostra esvaziada de conteúdo.
Numa primeira abordagem podemos dizer que a questão em si não se mostra já relevante uma vez que, pelo que se mostra inserido na sentença recorrida - “Após trânsito em julgado da presente decisão, abra conclusão, a fim de ser proferida a admoestação por escrito, nos termos do disposto no artigo 51.º n.º 2 Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro.” (destaque nosso) -, só no futuro, no momento imediatamente anterior ao da efectiva aplicação, se poderia questionar da respectiva conformidade e, mais relevante, com a decretada revogação daquela sanção a efectiva execução se mostra impossível.
De qualquer modo, numa perspectiva de análise da questão dentro do quadro de recurso admissível, como o foi, para “melhoria do direito” podemos dizer que o quadro legal que definiu a contraordenação com que somos confrontados no caso estabelece a apontada forma de execução.
Porém, tal como se constata do art.º 51º n.º 2 RGCO aquela sanção “é proferida por escrito”, como claramente se mostra também afirmado na decisão recorrida no excerto acima citado, não sendo feita qualquer distinção dessa forma de execução em função da entidade que decreta essa concreta sanção.
Se bem entendemos a argumentação do recorrente, a sua pretensão de ver consignada a forma oral de aplicação da sanção decorre, primeiramente da qualidade judicial do órgão que, no caso, a aplicou e, depois, do regime processual penal estabelecido no art.º 497º CPP quando nos seus n.ºs 1 e 2 refere “A admoestação é proferida…” (destaque nosso) e no n.º 3 “… de forma que esta não se confunda com a alocução referida no n.º 2 do art.º 375º”
Para esta discussão importa convocar a argumentação desenvolvida no acórdão da Relação de Lisboa de 10-02-2004. Relator Pulido Garcia, disponível em www.dgsi.pt: “É que, além da letra do citado artº 51º permitir essa interpretação, face, nomeadamente, ao disposto no nº 2, do artº 41º, do D.L. nº 433/82 («No processo de aplicação da coima e das sanções acessórias, as autoridades administrativas gozam dos mesmos direitos e estão submetidas aos mesmos deveres das entidades competentes para o processo criminal, sempre que o contrário não resulte do presente diploma»), todas as normas reguladoras da audiência de julgamento das contraordenações em 1ª instância são de difícil adequação ao exigido pelo artº 60º, nº 4, do C.P..
Desde logo porque, nos termos do artº 66º, do D.L. nº 433/82, de 27/10, no processo contra-ordenacional, «Salvo disposição em contrário, a audiência em 1ª instância obedece às normas relativas ao processamento das transgressões e contravenções, ...», e «A pena de admoestação não pode ser aplicada como punição pela prática de transgressões» (Ac. da Rel. de Lisboa de 16-11-1988, Col. de Jur., 1988, 5, 140).
Por outro lado, nos termos do artº 67º, nº 1, do D.L. nº 433/82, de 27/10, no processo contraordenacional, «O arguido não é obrigado a comparecer à audiência, salvo se o juiz considerar a sua presença como necessária ao esclarecimento dos factos», o que se não compagina com a necessidade de comparência do arguido para ser admoestado, nos termos do disposto nos artºs 60º, nº 4 do C.P. e 497º, do C.P.P..
Por isso se nos afigura claro que, nos próprios termos dos artºs 32º e 41º, do D.L. nº 433/82, de 27/10, o disposto nos artºs 60º, nº 4 do C.P. e 497º, do C.P.P., não é aplicável na fase judicial do processo contraordenacional, porque não se coaduna com as especiais normas que, quanto à sanção de admoestação e sua forma escrita de ser proferida, se mostram previstas naquele D.L. nº 433/82.
Flui do expendido que, também para nós, porque o estatuído no artº 51º, do D.L. 433/82, de 27/10, tem aplicação em qualquer fase do processo contraordenacional, nomeadamente na judicial, o determinado nos artºs 60º, nº 4 do CP e 497º, do CPP, não é aplicável, nos próprios termos do disposto nos artºs 32º e 41º, da LQCO, na fase judicial do processo contra-ordenacional.”
Qualquer interpretação que apontasse a limitação da execução da admoestação na forma escrita à fase administrativa do processo contraordenacional representaria uma intolerável limitação ao âmbito de conhecimento que se mostra atribuído ao juiz no art.º 64º n.ºs 3 e 4 RGCO com a excepção consignada no art.º 72-A do mesmo Regime.
Por tudo isto entendemos que a execução da sanção de admoestação prevista no art.º 51º RGCO deve seguir a forma escrita, independentemente da natureza administrativa ou judicial da entidade que a aplica.
III.
Em face do exposto, acordam os Juízes que compõem a 2ª Subsecção Criminal deste tribunal em conceder parcial provimento ao recurso interposto pelo M.º P.º e, consequentemente:
- Revogar a sentença recorrida quanto à aplicação da sanção substitutiva de admoestação e decorrente execucão;
- Confirmar a mesma sentença no demais.
Sem custas.
Elaborado e integralmente revisto pelo primeiro signatário.
Évora, 15 de Dezembro de 2022.
João Carrola (relator)
Maria Leonor Esteves
Gomes de Sousa