Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
8/14.9TMFAR-C.E1
Relator: FRANCISCO XAVIER
Descritores: REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
INTERESSE DO MENOR
Data do Acordão: 02/08/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário:
I. A decisão do tribunal quanto ao exercício das responsabilidades parentais deve sempre ser norteada pelo interesse da criança e este interesse passa necessariamente pela garantia das condições materiais, sociais, morais e psicológicas, que possibilitem à criança um desenvolvimento afectivo integral, estável e harmonioso, havendo que atender à sua idade, sexo, grau de desenvolvimento, relacionamento com os progenitores, bem como à sua capacidade de adaptação ao ambiente extra familiar.
II. Releva ainda a capacidade dos progenitores na satisfação das necessidades do filho, salientando-se o afecto que nutrem pela criança, a sua dedicação ao bem-estar desta e ainda as condições morais e económicas tendentes a proporcionar um ambiente familiar adequado ao desenvolvimento e crescimento do menor.
III. Tendo sido estabelecido por acordo que o pai passará com o menor 45 dias de férias, nas férias escolares de verão, e que caso o menor manifeste vontade nesse sentido poderá passar dois meses, verificando-se que habitualmente o menor costuma viajar com o pai para a Sérvia onde se encontra a família paterna, e para outros países, e que o menor, que tem 13 anos de idade, denota séria satisfação em viajar com o pai, existindo entre o pai e a criança uma relação afectiva próxima, e não sendo apontado um qualquer facto ou circunstância que justifique a restrição daquele período temporal, é razoável que essas deslocações possam coincidir com o período de 45 dias de férias a que o progenitor tem direito, o que permite um maior período para manutenção da convivência do menor com a família paterna e para viajar com o pai.
Decisão Texto Integral:

Acórdão da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora
I – Relatório
1. O Ministério Público requereu a alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais contra os progenitores AA e BB, relativamente ao menor CC, de forma a ficar estabelecido o direito de o pai poder viajar à Sérvia (país natal do progenitor) com o filho nas férias de verão pelo menos durante um mês.

2. Foi realizada conferência de pais, na qual o pai disse que pretendia passar com o filho 2 meses de férias no estrangeiro, pedindo que tal ficasse regulado para o ano então em curso e para o futuro, ao que a mãe se opôs, mas aceitando que o filho viajasse com o pai para o estrangeiro apenas pelo período de 30 dias, passando o outro mês em Portugal.
Foi então estabelecido provisoriamente que “a progenitora autoriza o progenitor a viajar com a criança em férias ao estrangeiro pelo período de um mês, …” (cf. acta de fls. 20/21).

3. Os progenitores foram notificados para alegar, vindo o pai a pronunciar-se como consta de fls. 23, invocando, além do mais, que desde que nasceu que o menor viaja para o estrangeiro (Sérvia) e passou muito tempo com os avós paternos, tendo já viajado mais de 30 vezes, sendo que nos últimos 3 anos viajou com o pai 2 vezes pelo período de 45 dias e no ano passado [2016] 60 dias durante as férias de verão, sempre respeitando o acordado em 2014 e a vontade do menor.
Acrescentou ainda que em Belgrado o menor tem todas as condições necessárias para passar férias, que ali frequenta campos de férias desportivos e educativos, que também viaja com o menor para outras cidades, visitando a família no campo, e que também aproveita as férias na Sérvia para viajar para países próximos (Hungria, Croácia, Áustria, Alemanha, Suíça, República Checa) por períodos de 7 a 10 dias, sendo que de Portugal também já viajaram para Espanha, França e Inglaterra.
No mais, salienta a vontade que o menor tem de viajar com o pai e a importância de conhecer outros países e culturas e pede que se estabeleça a possibilidade de viajar com o menor em férias pelo período de dois meses.

4. Na vista que teve dos autos, o Ministério Público, considerando que no anterior acordo constava que o menor poderia passar 45 dias de férias ou mesmo dois meses de férias com o progenitor, mas nada se dizia quanto a viagens ao estrangeiro, e que sendo o progenitor de nacionalidade Sérvia queria aproveitar esse tempo para visitar a sua terra e conviver com a família, mas que a progenitora se opõe a que o menor permaneça dois meses no estrangeiro, concluiu que “um mês, em cada ano, é tempo suficiente e razoável para que o progenitor possa viajar ao estrangeiro com o menor, e como tal deve ficar consignado para o futuro, sem prejuízo de permanecer mais tempo se ambos os progenitores assim concordarem”.

5. Após foi proferida sentença, na qual se decidiu aditar ao regime de visitas o seguinte: “O pai poderá viajar com o menor ao estrangeiro pelo período de trinta dias, no período das férias escolares de Verão, devendo avisar a progenitora com dois meses de antecedência, do destino da viagem, datas de início e fim da viagem e contacto telefónico.”

6. Inconformado com esta decisão veio o progenitor interpor recurso, nos termos e com os fundamentos seguintes [segue transcrição das conclusões do recurso]:
1.ª Constitui objecto do presente recurso a decisão proferida nos presentes autos, em que a pedido do Ministério Publico foi alterado o regime de visitas estabelecido entre o menor CC e o pai, ora Recorrente, no sentido de se aditar que o pai poderá viajar com o menor ao estrangeiro pelo período de trinta dias.
2.ª O Recorrente tem direito a passar com o menor no período de férias de Verão 45 dias, que podem acrescer aos sessenta se o menor manifestar esse interesse;
3.ª Tendo o pai aproveitado esse tempo ou parte dele para levar o menor a viajar para o estrangeiro, nomeadamente à Servia, país de origem do pai e onde reside toda a família paterna.
4.ª O menor mostrou satisfação nessas viagens e tem com o pai uma relação próxima.
5.ª Ficou provado nos autos que o menor gostaria de continuar a deslocar-se com o pai para o estrangeiro no Verão, durante esse período de 45 dias a dois meses.
6.ª Não ocorreu qualquer alteração nas circunstâncias, a não ser a vontade da mãe em estabelecer que o menor não poderia viajar para o estrangeiro com o pai mais de trinta dias.
7.ª O Tribunal não invocou qualquer fundamento para essa restrição, que o é, de facto, para os interesses do menor, a não ser em critérios de suficiência e razoabilidade.
8.ª Com fundamento nos interesses do menor, na proximidade de relacionação com o pai, no facto de passar o ano inteiro a conviver com os parentes da mãe, apenas podendo fazê-lo uma vez por ano com os do pai;
9.ª Na importância de conhecer outras culturas para o desenvolvimento intelectual e psíquico do menor e porque não existem alteração nas circunstâncias que justifiquem tal alteração;
10.ª O menor deverá continuar a poder viajar com o pai durante pelo menos 45 dias nas férias do Verão, mediante informação à mãe do local e contacto onde se encontra.
11.ª Aliás, a Requerente não invoca qualquer dificuldade de contacto nem foram apuradas circunstâncias que justificassem qualquer receio para o menor acompanhar o pai nessas viagens.
12.ª Para que ocorra alteração de decisão judicial referente a regulação das responsabilidades parentais, necessário é que ocorram circunstâncias supervenientes que o justifiquem.
13.ª O interesse do menor e a sua idade aconselham a que a possibilidade de viajar com o pai seja fomentada e não restringida, assim como o relacionamento entre ambos.
14.ª “O pai poderá viajar com o menor ao estrangeiro pelo período de 45 dias, no período das férias escolares de Verão, devendo avisar a progenitora, com dois meses de antecedência, do destino da viagem, datas de início e fim da viagem e contacto telefónico.”, esta a redacção a dar ao aditamento a formular no regime de visitas estabelecido, em vez do que foi decidido pelo Tribunal sob recurso.
15.ª A Decisão sob recurso violou, entre outras, as disposições e princípios contidos nos artigos 4º/1c), 5º e 42/1 do RGPTC.

7. Contra-alegou o Ministério Público, pugnando pela confirmação da sentença, nos seguintes termos:
1.ª Na acção de regulação do exercício das responsabilidades parentais n.º 8/14.9TMFAR, 1.º J, em conferência de 15-5-2014, foi acordado (que se mantém) [Juntamos cópia da Ata de 15-5-2014, que fixa este regime do exercício das responsabilidades parentais, que se mantém em vigor, na íntegra e estabelece amplo convívio com o menor, nada justificando que se acresça 30 dias para viagem ao estrangeiro, além dos 30 dias já fixados.]:
a. A criança ficou confiada à guarda da mãe e o “O pai poderá estar e conviver com o menor sempre que quiser;
b. “Pai passará com o menor 45 dias de férias, nas férias escolares de Verão, e caso o menor manifeste vontade nesse sentido, passará dois meses de férias”.
c. O mesmo se passa nas férias de Natal e na Páscoa, em que passará alternadamente com cada um dos progenitores.
2.ª 2. O recorrente trabalha e tem residência permanente em Portugal há vários anos e sempre aqui se quer manter. Inclusivamente, tem cartão de cidadão português.
3.ª 3. No presente incidente foi pedido autorização para viajar ao estrangeiro, durante, pelo menos 30 dias e assim foi decidido (pela sentença recorrida) e aditado ao acordo anterior.
4.ª 4. A viagem ao estrangeiro destina-se a viajar por vários países, além de visitar a família na Sérvia.
5.ª 5. A criança pode e deve contactar com os ascendentes em qualquer altura do ano (por qualquer meio (telefone, skye, ou outro sistema), ou mesmo visita dos familiares a Portugal. Além do mais, no Verão, durante trinta dias, tem ainda mais a possibilidade de os visitar pessoalmente.
6.ª 6. Não existe qualquer impedimento para que a criança conviva com os ascendentes, conf. dispõe o art 1887.º A C Civil.
7.ª 7. Dado o amplo regime de visitas que o pai tem de convívio com a criança, ao longo do ano (“sempre que quiser”) (Conf cópia da ata que se junta) nada justifica que tenha direito ainda a mais 30 dias para viajar ao estrangeiro, além dos 30 dias já fixados.

8. O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.
Cumpre apreciar e decidir.
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II – Objecto do recurso
O objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608º, nº 2, 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil.
Considerando o teor das conclusões apresentadas, a única questão a decidir consiste em saber se deve ser alterado de 30 para 45 dias o período durante o qual o pai poderá deslocar-se para o estrangeiro com o filho.
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III – Fundamentação
A) - Os Factos
Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos:
1. Por decisão proferida em 15/5/2014 no processo de regulação apenso, homologatória de acordo entre os progenitores, foi fixada a residência da criança junto da mãe, competindo a esta o exercício das responsabilidades parentais em relação aos actos da vida corrente da criança e sendo as questões de particular importância decididas conjuntamente por ambos os progenitores.
2. Foi estabelecido um regime de visitas, estipulando-se nomeadamente que:
- O pai passará com o menor 45 dias de férias, nas férias escolares de Verão, e caso o menor manifeste vontade nesse sentido passará 2 meses de férias.
3. O progenitor é natural da Sérvia, onde residem os seus familiares, deslocando-se anualmente àquele país para visitar a família.
4. O menor já viajou por diversas vezes com o pai à Sérvia e a vários outros países da Europa, manifestando notória satisfação em viajar com o pai.
5. O pai e a criança têm uma relação afectiva próxima.
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B) – O Direito
1. No processo principal a que os presentes autos se encontram apensos foi regulado, por acordo homologado por sentença de 15 de Maio de 2014, o exercício das responsabilidades parentais relativas ao menor CC, nascido a 1 de Maio de 2004, filho de AA, ora recorrente, e de BB (cf. ponto 1 dos factos provados e certidão de nascimento de fls. 5).
Do regime estabelecido ficou a constar que “o pai passará com o menor 45 dias de férias, nas férias escolares de Verão, e caso o menor manifeste vontade nesse sentido passará 2 meses de férias”.
Porém, nada tendo sido dito quanto a deslocações para o estrangeiro, em cada ano o pai tinha que solicitar à mãe do menor autorização para essas deslocações.
Para evitar esta situação e porque entretanto a progenitora recusou-se a dar tal autorização, o Ministério Público, em representação do menor, requereu a fixação judicial do direito do progenitor a poder viajar à Sérvia com o jovem nas férias, “pelo menos durante um mês, ou mais se esse for o seu desejo”.
Em sede de conferência de pais não houve acordo dos interessados quanto ao período a fixar e o regime provisório então instituído veio a ser confirmado por sentença, onde se estabeleceu que “[o] pai poderá viajar com o menor ao estrangeiro pelo período de trinta dias, no período das férias escolares de Verão, devendo avisar a progenitora com dois meses de antecedência, do destino da viagem, datas de início e fim da viagem e contacto telefónico.”
Para tanto, fundamentou-se a sentença recorrida no seguinte:
«A alteração da regulação do exercício das responsabilidades parentais está prevista e regulada no art. 42º do RGPTC (aprovado pela Lei nº 141/2015, de 8 de Setembro), correspondente ao anterior (revogado) art. 183º da OTM.
Em matéria de regulação/alteração do exercício das responsabilidades parentais, a decisão do tribunal deve ser sempre norteada pelo interesse da criança, atendendo às circunstâncias concretas do momento em que é proferida.
Tal interesse passa necessariamente pela garantia de condições materiais, sociais, morais e psicológicas que possibilitem à criança/jovem um desenvolvimento afectivo integral, estável e harmonioso.
Para definir o que seja o interesse do menor há que em concreto considerar factores relativos à criança e relativos aos pais.
Há, pois, que atender às necessidades físicas e intelectuais da criança, à sua idade, ao sexo e grau de desenvolvimento físico e psíquico, à continuidade das relações da criança, à adaptação da criança ao ambiente extra familiar de origem (escola, comunidade, amigos, actividades não escolares), assim como os efeitos de uma eventual mudança de residência causadas por uma ruptura com esse ambiente, o seu comportamento social e a preferência por ela manifestada.
Do lado dos pais há que ponderar as capacidades de cada um para satisfazer as necessidades do filho, o tempo disponível para cuidar deles, a saúde física e mental dos pais, o sexo, a continuidade das relações da criança, o afecto que cada um dos pais sente pela criança, o seu estilo de vida e comportamento moral, a sua situação financeira, a sua ocupação profissional, a estabilidade do ambiente que cada um deles pode proporcionar ao filho, e ainda a vontade que cada um manifesta de manter e incentivar a relação dos filhos com o outro progenitor.
Sendo estes os critérios que, em geral, o tribunal deverá considerar para aferir o interesse da criança, há que, em concreto, apurar qual o interesse do menor CC, de 13 anos deidade.
No caso em apreço, as responsabilidades parentais foram reguladas em Maio de 2014, tendo sido fixado um regime de visitas, que se traduziu nomeadamente na passagem do menor com o pai de um período de férias de 45 dias (podendo alargar-se a dois meses, de acordo com a vontade da criança), nas férias escolares de Verão.
Verificamos que o progenitor é natural da Sérvia, onde tem a sua família e que o mesmo pretende viajar com o filho àquele país para visitar os familiares, assim como pretende viajar para outros destinos com o menor, tal como já fez por diversas vezes.
Ouvido o menor, constatamos que o mesmo denota notória satisfação em viajar com o pai, conhecendo vários países da Europa onde o pai já o levou.
Não temos dúvidas sobre os benefícios para o desenvolvimento da criança decorrentes do conhecimento de outros países, povos e culturas.
A questão que se coloca e que urge decidir (já que não se mostra regulado) é se o progenitor poderá/deverá passar com o menor no estrangeiro um período de 30 dias (como já se fixou provisoriamente e como a mãe pretende) ou um período de 60 dias (como o pai reclama).
O Ministério Público, que requereu a presente alteração da regulação, pronuncia-se no sentido de ser fixado o período de 30 dias, considerando que um mês é tempo suficiente e razoável para que o progenitor possa viajar com o filho no estrangeiro (cf. fls. 30).
Acompanhamos a posição sustentada pelo Ministério Público, por se entender que passando o pai 45 dias de férias com o menor, ou 2 meses se o menor nisso manifestar vontade –tal como ficou regulado em 2014 –é razoável que passe 30 dias no estrangeiro, passando em Portugal (onde reside a mãe e a restante família) o restante período de férias, sendo certo que no nosso país também o pai poderá viajar com o filho.
Concluímos que deverá aditar-se ao regime de visitas cláusula estabelecendo a possibilidade de o pai passar com o menor um período de trinta dias no estrangeiro, nas férias escolares de Verão. Os restantes 15 dias (dos 45 dias a que o pai tem direito) serão passados em Portugal.»

2. O progenitor discorda desta decisão, reclamando a fixação de um período de 45 dias, alegando, além do mais, que na decisão recorrida não se invoca qualquer fundamento para a restrição das deslocações do menor com o pai ao estrageiro ao período de 30 dias, a não ser critérios de suficiência e razoabilidade.

3. Concordamos com o enquadramento jurídico efectuado na sentença e com a ponderação dos interesses a sopesar na apreciação da regulação do exercício das responsabilidades parentais ali referidos, e, por isso, não podemos deixar de observar que, em princípio, o período de 30 dias constitui lapso temporal suficiente e razoável para deslocação de um menor em férias ao estrangeiro.
Mas será razoável, nas circunstâncias do caso concreto, em face dos interesses do menor, impor uma tal limitação quando está reconhecido o direito de o pai ter consigo o menor pelo período de 45 dias (podendo ir a até 60 dias se o menor o quiser) nas férias de verão e de este, que já tinha à data da decisão 13 anos, gostar de viajar com o pai como sempre fez, designadamente para a Sérvia onde está a família paterna?
Cremos que não, atendendo às circunstâncias do caso concreto.

3. Na verdade, como se diz na sentença recorrida, a decisão do tribunal deve sempre ser norteada pelo interesse da criança e este interesse passa necessariamente pela garantia das condições materiais, sociais, morais e psicológicas, que possibilitem à criança um desenvolvimento afectivo integral, estável e harmonioso, havendo que atender à idade da criança, sexo, grau de desenvolvimento, relacionamento com os progenitores, bem como a sua capacidade de adaptação ao ambiente extra familiar. Releva ainda a capacidade dos progenitores na satisfação das necessidades do filho, salientando-se o afecto que nutrem pela criança, a sua dedicação ao bem-estar desta e ainda as condições morais e económicas tendentes a proporcionar um ambiente familiar adequado ao desenvolvimento e crescimento do menor.
O que o pai pretende no caso é passar com o menor um período maior junto da família (paterna), que reside no estrangeiro, e com a qual o menor está habituado a conviver durante as férias.
Não se pode afirmar que com a restrição temporal imposta na sentença se esteja a impedir o contacto com a família, nem que a mãe ao não dar o seu acordo para um período mais alargado está a impedir o direito que ao menor assiste de manter os laços familiares paternos, mas no caso não há qualquer fundamento para aquela limitação temporal.
Na verdade, nada é apontado em desabono do progenitor.
Bem pelo contrário, pois os autos evidenciam que o recorrente é um pai presente, preocupado com o bem-estar da criança e empenhado em proporcionar-lhe um desenvolvimento são e harmonioso, daí o pedido para poder passar com o menor 45 dias de férias na sua terra Natal (a Sérvia), para que o menor possa manter o relacionamento com os seus familiares ali residentes e proporcionar-lhe o contacto com outras gentes e culturas com as viagens que efectua.
E tal período não priva o menor de contactar com a família materna, pois vive com a mãe em Portugal durante o resto do ano, e enquanto estiver no estrangeiro sempre poderá com eles contactar, face à panóplia de meios tecnológicos actualmente existentes.
Aliás, não vem sequer invocada qualquer dificuldade de a mãe contactar com o menor quando este se encontra a viajar com o pai.
Sabemos que para a mãe, habituada que está a ter o menor ao seu lado, um só dia que esteja afastada do seu filho será certamente uma eternidade, mas é um sacrifício que julgamos dever ser-lhe exigível em nome do são desenvolvimento do menor.
Relembramos que o menor já tem 13 anos, que sempre teve contactos regulares com a família paterna nas férias, que está habituado a viajar com o pai e “denota séria satisfação em viajar com o pai”, que conhece muitos países da Europa fruto das deslocações feitas com o pai, contactando com outras gentes e culturas, que, como se diz na sentença, constituem benefícios para o seu desenvolvimento.
Se assim é, e não sendo apontado qualquer facto em desabono do pai, designadamente quanto à sua conduta, muito pelo contrário, nem se invocando qualquer impedimento relativo à vida do menor, seja de saúde ou outro, que impeça a sua deslocação para o estrangeiro com o pai durante o pretendido período, e tendo sido acordado que o pai tem, pelo menos, 45 dias das férias escolares com o menor, não vemos razões para restringir esse período aos tais 30 dias.
Obviamente que a mãe terá sempre que saber onde se encontra o menor e poder contactar com este, mas nem sequer consta que tais obstáculos tenham existido no passado.

4. Aliás, com o devido respeito, não se compreende que o Ministério Público tenha requerido inicialmente que o progenitor pudesse viajar para a Sérvia com o jovem nas férias, “pelo menos durante um mês, ou mais se esse fosse o seu desejo”, e agora, sem invocar um qualquer facto concreto, a não ser a falta de acordo da mãe, que já se sabia não existir, entenda que um mês basta para tanto.
E também não se argumente que o pai já tem um regime de visitas alargado durante todo o ano, pois ficou estabelecido que poderá conviver com o menor sempre que quiser, desde que avise a mãe e a avó materna, respeitando o interesse da criança, pois, uma coisa são os contactos regulares do pai com o menor durante o ano, outra, diferente é a vivência resultante do convívio em férias e a manutenção dos contactos com a família paterna.

5. Em suma, tendo sido estabelecido por acordo que o pai passará com o menor 45 dias de férias, nas férias escolares de verão, e que caso o menor manifeste vontade nesse sentido poderá passar dois meses, verificando-se que habitualmente o menor viaja com o pai para a Sérvia onde se encontra a família paterna e que denota séria satisfação em viajar com o pai, existindo entre o pai e a criança uma relação afectiva próxima, e não sendo apontado um qualquer facto ou circunstância que justifique a restrição daquele período temporal, é razoável que essas deslocações possam coincidir com o período de 45 dias de férias a que o progenitor tem direito, o que permite um maior período para manutenção da convivência do menor com a família paterna e para viajar com o pai.
Case se venha a prolongar o período de férias até 60 dias, se esse for o interesse do menor, como está estabelecido, então estes últimos 15 dias deverão ser passados em Portugal.

6. Deste modo, procede a apelação, com a consequente revogação da sentença recorrida, decidindo-se que o pai poderá viajar com o menor ao estrangeiro pelo período de 45 dias, como requer no recurso.

C) – Sumário [artigo 663º, n.º 7, do Código de Processo Civil]
I. A decisão do tribunal quanto ao exercício das responsabilidades parentais deve sempre ser norteada pelo interesse da criança e este interesse passa necessariamente pela garantia das condições materiais, sociais, morais e psicológicas, que possibilitem à criança um desenvolvimento afectivo integral, estável e harmonioso, havendo que atender à sua idade, sexo, grau de desenvolvimento, relacionamento com os progenitores, bem como à sua capacidade de adaptação ao ambiente extra familiar.
II. Releva ainda a capacidade dos progenitores na satisfação das necessidades do filho, salientando-se o afecto que nutrem pela criança, a sua dedicação ao bem-estar desta e ainda as condições morais e económicas tendentes a proporcionar um ambiente familiar adequado ao desenvolvimento e crescimento do menor.
III. Tendo sido estabelecido por acordo que o pai passará com o menor 45 dias de férias, nas férias escolares de verão, e que caso o menor manifeste vontade nesse sentido poderá passar dois meses, verificando-se que habitualmente o menor costuma viajar com o pai para a Sérvia onde se encontra a família paterna, e para outros países, e que o menor, que tem 13 anos de idade, denota séria satisfação em viajar com o pai, existindo entre o pai e a criança uma relação afectiva próxima, e não sendo apontado um qualquer facto ou circunstância que justifique a restrição daquele período temporal, é razoável que essas deslocações possam coincidir com o período de 45 dias de férias a que o progenitor tem direito, o que permite um maior período para manutenção da convivência do menor com a família paterna e para viajar com o pai.
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IV – Decisão
Nestes termos e com tais fundamentos, acordam os juízes deste Tribunal da Relação em julgar procedente a apelação e, em consequência, revogar a sentença recorrida, decidindo-se que o pai poderá viajar com o menor ao estrangeiro pelo período de 45 dias, nas férias escolares de verão, devendo avisar a progenitora, com dois meses de antecedência, do destino da viagem, datas de início e fim da viagem e contacto telefónico.
Sem custas.
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Évora, 8 de Fevereiro de 2018
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(Francisco Xavier)
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(Maria João Sousa e Faro)
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(Florbela Moreira Lança)