Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
102/19.0PBSTR.E1
Relator: MARTINHO CARDOSO
Descritores: OMISSÃO DE DILIGÊNCIAS
NULIDADE PROCESSUAL
Data do Acordão: 03/08/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: A nulidade por omissão de diligências probatórias (não realização das diligências necessárias para fazer comparecer uma testemunha e falta de visualização durante a audiência de julgamento das imagens de videovigilância alegadamente contidas num CD) não configura uma nulidade de sentença, mas uma nulidade de procedimento que, por respeitar à aquisição de meios de prova, foi cometida em momento anterior à sentença, tendo de ser arguida até ao termo da produção de prova e antes das alegações orais (artigo 120.º, § 3.º, al. a) CPP).
Decisão Texto Integral:
I
Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:
Nos presentes autos de Processo Comum com intervenção de tribunal singular acima identificados, do Juiz 1 do Juízo Local Criminal de Santarém, em que TUG se constituiu assistente e deduziu pedido cível contra o arguido ZIT, este foi absolvido da prática do crime de ofensa à integridade física simples, p.e p. pelo art.º 143.º, n.º 1, Código Penal, pelo qual vinha acusado, e julgou totalmente improcedente o pedido cível deduzido pelo assistente.
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Inconformado com o assim decidido, o assistente interpôs o presente recurso, apresentando as seguintes conclusões:
A. A notificação enviada à testemunha THE, indicada pelo demandante, para comparecer na audiência de julgamento, foi enviada para morada errada (pois endereçou a carta para […], ao invés de para […]), tendo a carta sido devolvida com a indicação “Endereço inexistente em (…)”.
B. Apenas na data marcada para a audiência de julgamento o demandante tomou conhecimento deste lapso na morada e alertou o tribunal que a morada correcta era em (…), conforme, aliás, havia indicado no seu requerimento.
C. O tribunal ordenou a notificação da testemunha “pelos meios mais expeditos” para comparecer na audiência de julgamento seguinte.
D. Foi então enviado oficio à GNR de (…) para proceder à notificação da testemunha.
E. Aquela notificação mostra-se devolvida (ref 6510196) com a menção "Após diligências efectuadas por esta Guarda, por elementos deste Posto, nomeadamente pelo cabo TOY, junto da morada indicada em dias e horas alternadas, não foi localizada a pessoa em questão, no entanto perguntado na administração do edificio não se obteve qualquer informação acerca da visada tendo sido alegado que não informavam qualquer informação ao abrigo da nova lei de protecção de dados, motivo pelo qual não foi possivel dar cumprimento ao solicitado, pelo que se desconhece o actual paradeiro/morada ou qualquer outro contacto ".
F. Não se enviou nenhuma carta à testemunha.
G. Não foi nunca o demandante questionado sobre se conhecia outra morada da testemunha ou se a conseguia apresentar em tribunal.
H. Na última audiência de julgamento o Mmº Juiz de Direito proferiu o seguinte despacho: “Uma vez que não é conhecido o paradeiro da testemunha arrolada pelo demandante TUG não obstante ter sido tentada a notificação na morada indicada pelo referido demandante, não se divisando outras diligências que possam conduzir à presença da testemunha em audiência, sendo igualmente certo que não existe motivo para se retardar intoleravelmente o andamento da audiência, determina-se o prosseguimento da mesma em face da impossibilidade de notificação da testemunha arrolada pelo demandante”.
I. E assim ficou a testemunha por ouvir sem nunca o demandante que a indicou se ter pronunciado sobre o assunto.
J. Constitui nulidade a omissão de diligências que pudessem considerar-se essenciais à descoberta da
verdade (art. 120 do CPP).
L. Dado que o espaço onde ocorreram os factos estava equipado com vigilância de um circuito fechado de televisão e respectiva gravação de imagens, foram os responsáveis do espaço notificados pela PSP para preservar as imagens a 05/02/2019 (conforme auto de denúncia junto aos autos).
M. A 07/02/2019 Fernando José Martins Ferreira compareceu na esquadra da PSP e, na qualidade de
proprietário do estabelecimento denominado Hotel (…), entregou 1 (um) CD contendo imagens do ilicito criminal (conforme Aditamento n.º 1 ao Auto de Denuncia e Auto de Apreensão n.º 1 juntos aos autos).
N. Tais imagens não foram visualizadas no decorrer da audiência de julgamento.
O. Constitui nulidade a omissão de diligências que pudessem considerar-se essenciais à descoberta da
verdade (art. 120 do CPP).
P. O tribunal a quo considerou não provado que:
1. o arguido desferiu murros em numero indeterminado na face de TUG, que o atingiram nos olhos e nariz.
2. Que como resultado directo da conduta do arguido TUG sofreu as lesões supra referidas.
3. Que o arguido actuou no propósito de atingir TUG na sua integridade fisica e saúde, molestando-o fisicamente, sabendo e querendo, desse modo, causar-lhe lesões, como conseguiu.
Q. Foi produzida prova de que o arguido ZIT tivesse agredido o ora recorrente.
R. Nas suas declarações, gravadas em CD (0:08 a 0:17) , o arguido diz, referindo-se ao ofendido: “ele arrancou para mim, assim que lhe pus os braços ele caiu”(...) “quando foi na confusão ele arrancou para mim”, “ele tratou-me mal”, “chamou-me filho da puta”,”tentei-me defender”, “passado um bocado separaram-nos, um para um lado outro para o outro”.
S. A testemunha FOZ (depoimento gravado em CD – 0:02 a 0:04) que estava presente no dia e hora dos factos, referiu que viu “pessoas a correr em determinada direcção”, “aquilo não era normal”, “santos silva a ser auxiliado por pessoas que estavam ali”, “estava ensanguentado”, “perguntou o que aconteceu e ele disse foi o ZIT”.
T. O aparato descrito quer pelo arguido quer pela testemunha FOZ não se dava se tivesse ocorrido uma simples queda ou escorregadela do ofendido, nem este teria, com uma queda, tamanhas lesões.
U. Deveriam, assim, os factos não provados ter sido dados como provados e o arguido condenado pelo crime de que vinha acusado: ofensas à integridade fisica simples.
V. O tribunal a quo ao dar como não provados os factos 1 a 4 violou, além o principio da livre apreciação da prova, consagrado no art. 127º do CPP.
X. Padece, assim, a sentença dos vícios de erro notório na apreciação da prova.

NESTES TERMOS, e nos melhores de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, deverá a douta sentença ser revogada e substituída por outra que se coadune com a pretensão exposta,
assim se fazendo a costumada JUSTIÇA!
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A Exma. Magistrada do M.º P.º do tribunal recorrido respondeu, concluindo da seguinte forma:
1ª - Vem o demandante recorrer da douta sentença na parte em que julgou improcedente o pedido de indemnização cível apresentado, na sequência da absolvição do arguido ZIT da prática de um crime de ofensa à integridade física, p. e p. pelo artigo 143º, n.º 1 do Código Penal.
2.ª - Atendendo à motivação do recurso apresentada, o recorrente age na qualidade de demandante cível, manifestando, contudo, a sua discordância relativamente aos factos dados como provados na sentença recorrida e que respeitam à sentença penal.
3. ª Alega o recorrente que o tribunal omitiu a realização de diligências essenciais à descoberta da verdade – falta de inquirição da testemunha THE e falta de visualização das imagens de videoviligância apreendidas a fls. 5 dos autos – constituindo tal omissão uma nulidade nos termos do artigo 120º, nº 1 al. d) do Código Processo Penal.
4.ª Ora, atenta a qualidade em que o recorrente interpôs o recurso – demandante cível – afigura-se que tem legitimidade para interpor o presente recurso, mas limitado à parte da decisão contra si proferida - ou seja, da absolvição do pedido cível – não tendo legitimidade para recorrer da decisão no âmbito da matéria penal ou da que tenha consequências penais.
5.ª - Relativamente ao objecto do recurso sempre se dirá que não tem razão o recorrente, pois que, conforme resulta das actas da audiência de julgamento e do expediente de fls. 64 e 82, a testemunha arrolada pelo demandante THE não foi localizada, desconhecendo-se o seu paradeiro, razão pela qual não foi inquirida.
6.ª - Também relativamente à exibição em julgamento das imagens de videovigilância, tal se revelou impossível, pois conforme resulta da informação de fls. 32, o DVD apreendido não continha qualquer gravação, razão pela qual nem sequer o Ministério Público indicou tal prova na acusação; não se verificando, assim, as nulidades invocadas.
7.ª Assim, o Ministério Público carece de legitimidade processual quanto à matéria objecto de recurso – eminentemente cível.
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O arguido não respondeu ao recurso.
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Nesta Relação, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer.
Cumpriu-se o disposto no art.º 417.º, n.º 2, do Código de Processo Penal.
Procedeu-se a exame preliminar.
Colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.
II
Na sentença recorrida e em termos de matéria de facto, consta o seguinte:
-- Factos provados:
1. No dia 05.02.2019, entre a 1h e as1.30h, o ofendido TUG Silva encontrava-se no Hotel (…), sito na Quinta (…) Santarém.
2. Nessas circunstâncias de tempo, modo e lugar, deu-se uma troca de palavras entre o ofendido e o arguido ZIT, motivada pelo atendimento prestado e pela facturação que havia sido apresentada a TUG em dia anterior no restaurante explorado pelo arguido frequentado assiduamente por TUG.
3. TUG foi examinado no Instituto Médico Scalabitano no dia 05/02/2019, pelas 10h e 40 minutos, aonde apresentou equimoses na parte inferior de ambos os olhos e ferida contusa no nariz.
4. Lesões que determinaram a TUG dores e um período de 7 (sete) dias para a cura, todos sem incapacidade para o trabalho.
5. O arguido tem capacidade para se determinar de acordo com as prescrições legais.
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-- Factos não provados:
1. Que acto imediato e sem que nada o fizesse esperar, o arguido desferiu murros em número indeterminado na face de TUG, que o atingiram nos olhos e nariz.
2. Que como resultado directo da conduta do arguido TUG sofreu as lesões supra referidas.
3. Que o arguido actuou no propósito de atingir TUG na sua integridade fisica e saúde, molestando-o fisicamente, sabendo e querendo, desse modo, causar-lhe lesões, como conseguiu.
4. Que o arguido agiu livre, voluntaria e conscientemente, bem sabendo do carácter proibido e criminalmente punível de tal conduta.
5. Que TUG em consequência da conduta do arguido tenha deixado de poder comparecer em meados de Fevereiro de 2019 em Bruxelas numa reunião com a União Europeia a propósito de resolver vários problemas inerentes aos refugiados.
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Fundamentação da decisão de facto:
O tribunal fundou a sua convicção quanto aos factos provados e não provados na análise crítica do conjunto da prova produzida.
Efectivamente não basta a indicação dos meios de prova pré constituídos e produzidos em audiência de julgamento que serviram para fundamentar a sentença.
É ainda necessário um exame crítico desses meios, que servirá para convencer os interessados e a comunidade em geral da correcta aplicação da justiça no caso concreto. Trata-se de significativa alteração do regime do Código de Processo Penal de 1929, e mesmo do que, segundo alguma doutrina, anteriormente, vigorava por alterações introduzidas no C.P.P.
Estes motivos de facto que fundamentam a decisão não são nem os factos provados (thema decidendum), nem os meios de prova (thema probandum), mas os elementos que em razão das regras da experiência ou de critérios lógicos constituem o substrato racional que conduziu a que a convicção do tribunal se formasse em determinado sentido ou valorasse de determinada forma os diversos meios de prova apresentados em audiência.
A fundamentação ou motivação deve ser tal que, intraprocessualmente permita aos sujeitos processuais o exame do processo lógico ou racional que lhe subjaz, conforme impõe o art. 410°, n.°2. Do C. P. P..
E extraprocessualmente a fundamentação deve assegurar, pelo conteúdo, um respeito efectivo pelo princípio da legalidade na sentença e a própria independência e imparcialidade dos juízes, uma vez que os destinatários da decisão não são apenas os sujeitos processuais, mas a própria sociedade.
O tribunal fundou a sua convicção quanto aos factos provados nas declarações do Arguido, na parte em que estas foram coincidentes com os factos provados, tendo o Arguido confirmado os factos provados e negado a prática do crime, afirmando que não agrediu seja porque modo for TUG, conjugadas estas declarações com as declarações da parte civil TUG e o depoimento da testemunha FOZ, que confirmaram os factos provados, que não obstante apresentarem versões dos factos diferentes discrepantes e contraditórias como se abaixo detalhará.
Apesar do Arguido, parte civil e testemunha referida terem produzido declarações em que denotaram contradições e discrepâncias sobre os factos confirmaram os factos provados ouvidas em audiência.
Por essas razões, os factos provados correspondem a um núcleo mínimo sobre os quais, da análise global da prova produzida, foi possível formar um juízo positivo da sua verificação.
O tribunal fundou-se ainda quanto aos factos provados na análise dos documentos juntos – Auto de denúncia, fls. 2 a 3; Elementos clínicos, fls. 28 a 30 e 46; e Fotografias, fls. 45 examinados em audiência de julgamento.
Não se fez prova convincente sobre os factos não provados sobre a realidade dos quais as declarações e o depoimento prestados em audiência de julgamento pelo arguido e TUG e pela testemunha FOZ foram inconclusivos, discrepantes e mesmo contraditórios, não havendo elementos que permitam sustentar a veracidade dos factos não provados, o que não permitiu ao tribunal fundar-se neles para os dar como provados.
Efectivamente o Arguido negou os factos não provados afirmando designadamente, como se disse, que não agrediu TUG seja porque modo for tendo este, que estava embriagado, ao avançar para si para o agredir escorregado e batido com a cara numa parede de pedras salientes existente no local, cuja existência no local é confirmada pela testemunha FOZ.
Por outro TUG, sustentou a veracidade dos factos não provados e a testemunha FOZ depôs no sentido de não ter assistido a como os factos ocorreram tendo apenas observado TUG com lesões na face depois de estas terem ocorrido desconhecendo o que as provocou.
A testemunha VOX não tem conhecimento directo de quaisquer factos dado que não estava no local aonde os mesmo se produziram.
A prova acabada de referir gerou no tribunal um estado de dúvida sobre a ocorrência dos factos não provados e daí necessariamente as respostas negativas quanto mais não seja de harmonia com o princípio "in dUbio pro reo".
III
De acordo com o disposto no art.º 412.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, o objecto do recurso é definido pelas conclusões formuladas pelo recorrente na motivação e é por elas delimitado, sem prejuízo da apreciação dos assuntos de conhecimento oficioso de que ainda se possa conhecer.
De modo que as questões postas ao desembargo desta Relação são as seguintes:
1.ª – Que a sentença recorrida é nula por durante o julgamento o tribunal "a quo" ter omitido diligências essenciais para a descoberta da verdade; e
2.ª – Que foi por ter avaliado mal a prova testemunhal produzida em julgamento que o tribunal "a quo" não deu como provado que o arguido praticou o crime pelo qual vinha acusado.
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Vejamos.
No tocante à 1.ª das questões postas, a de que a sentença recorrida é nula por durante o julgamento o tribunal "a quo" ter omitido diligências essenciais para a descoberta da verdade:
Alega o recorrente que o tribunal omitiu a realização de diligências essenciais à descoberta da verdade – falta de inquirição da testemunha THE e falta de visualização das imagens de videoviligância alegadamente contidas num CD junto aos autos – constituindo tal omissão uma nulidade nos termos do art.º 120.º, n.º 1 al.ª d), do Código Processo Penal.
Quanto à testemunha THE, diz o recorrente nas conclusões de seu recurso que:
A. A notificação enviada à testemunha THE (…) foi enviada para morada errada (…), tendo a carta sido devolvida com a indicação “Endereço inexistente em (…)”.
B. Apenas na data marcada para a audiência de julgamento o demandante tomou conhecimento deste lapso na morada e alertou o tribunal que a morada correcta era em (…), conforme, aliás, havia indicado no seu requerimento.
C. O tribunal ordenou a notificação da testemunha “pelos meios mais expeditos” para comparecer na audiência de julgamento seguinte.
D. Foi então enviado oficio à GNR de (…) para proceder à notificação da testemunha.
E. Aquela notificação mostra-se devolvida (ref 6510196) com a menção "Após diligências efectuadas por esta Guarda (…) junto da morada indicada (…), não foi localizada a pessoa em questão, (…) pelo que se desconhece o actual paradeiro/morada ou qualquer outro contacto ".
F. Não se enviou nenhuma carta à testemunha.
G. Não foi nunca o demandante questionado sobre se conhecia outra morada da testemunha ou se a conseguia apresentar em tribunal.
H. Na última audiência de julgamento o Mmº Juiz de Direito proferiu o seguinte despacho: “Uma vez que não é conhecido o paradeiro da testemunha arrolada pelo demandante TUG não obstante ter sido tentada a notificação na morada indicada pelo referido demandante, não se divisando outras diligências que possam conduzir à presença da testemunha em audiência, sendo igualmente certo que não existe motivo para se retardar intoleravelmente o andamento da audiência, determina-se o prosseguimento da mesma em face da impossibilidade de notificação da testemunha arrolada pelo demandante”.
I. E assim ficou a testemunha por ouvir sem nunca o demandante que a indicou se ter pronunciado sobre o assunto.
Mais invoca o assistente a falta de visualização durante o julgamento das imagens de videoviligância alegadamente contidas num CD junto aos autos.
Estabelece o art.º 120.º, n.º 2 al.ª d), do Código de Processo Penal, citado apenas na parte que agora interessa ao caso:
2 - Constituem nulidades dependentes de arguição, além das que forem cominadas noutras disposições legais:
(…)a omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade.
A nulidade por omissão de diligências não configura uma nulidade de sentença, mas sim uma nulidade de procedimento que, por respeitar à aquisição de meios de prova, foi cometida em momento anterior à sentença, mais precisamente, até ao termo da produção de prova e antes das alegações orais.
Daí que o n.º 3 al.ª a) do mesmo art.º 120.º prescreva que:
3 - As nulidades referidas nos números anteriores devem ser arguidas:
a) Tratando-se de nulidade de acto a que o interessado assista, antes que o acto esteja terminado;
Assim, se a pretensa nulidade por omissão de diligências no sentido de encontrar uma determinada testemunha e de visionar um CD ocorreram numa sessão de julgamento, tal nulidade teria que ser invocada pelo interessado até à fase das alegações.
A sua invocação na actualidade é extemporânea.
De qualquer forma, não vai o recorrente sem que se lhe assinale que o propalado CD afinal …não contém qualquer gravação (cf. fls. 32 dos autos).
Pelo que improcede a objecção aposta pelo recorrente.
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No tocante à 2.ª das questões postas, a de que foi por ter avaliado mal a prova testemunhal produzida em julgamento que o tribunal "a quo" não deu como provado que o arguido praticou o crime pelo qual vinha acusado:
Recorde-se que o tribunal "a quo" fundamentou a sua decisão da matéria de facto do seguinte modo:
(…)
O tribunal fundou a sua convicção quanto aos factos provados nas declarações do Arguido, na parte em que estas foram coincidentes com os factos provados, tendo o Arguido confirmado os factos provados e negado a prática do crime, afirmando que não agrediu seja porque modo for TUG, conjugadas estas declarações com as declarações da parte civil TUG e o depoimento da testemunha FOZ, que confirmaram os factos provados, que não obstante apresentarem versões dos factos diferentes discrepantes e contraditórias como se abaixo detalhará.
Apesar do Arguido parte civil e testemunha referida terem produzido declarações em que denotaram contradições e discrepâncias sobre os factos confirmaram os factos provados ouvidas em audiência.
Por essas razões, os factos provados correspondem a um núcleo mínimo sobre os quais, da análise global da prova produzida, foi possível formar um juízo positivo da sua verificação.
O tribunal fundou-se ainda quanto aos factos provados na análise dos documentos juntos – Auto de denúncia, fls. 2 a 3; Elementos clínicos, fls. 28 a 30 e 46; e Fotografias, fls. 45 examinados em audiência de julgamento.
Não se fez prova convincente sobre os factos não provados sobre a realidade dos quais as declarações e o depoimento prestados em audiência de julgamento pelo arguido e TUG e pela testemunha FOZ foram inconclusivos, discrepantes e mesmo contraditórios, não havendo elementos que permitam sustentar a veracidade dos factos não provados, o que não permitiu ao tribunal fundar-se neles para os dar como provados.
Efectivamente o Arguido negou os factos não provados afirmando designadamente, como se disse, que não agrediu TUG seja porque modo for tendo este, que estava embriagado, ao avançar para si para o agredir escorregado e batido com a cara numa parede de pedras salientes existente no local, cuja existência no local é confirmada pela testemunha FOZ.
Por outro TUG, sustentou a veracidade dos factos não provados e a testemunha FOZ depôs no sentido de não ter assistido a como os factos ocorreram tendo apenas observado TUG com lesões na face depois de estas terem ocorrido desconhecendo o que as provocou.
A testemunha VOX não tem conhecimento directo de quaisquer factos dado que não estava no local aonde os mesmo se produziram.
A prova acabada de referir gerou no tribunal um estado de dúvida sobre a ocorrência dos factos não provados e daí necessariamente as respostas negativas quanto mais não seja de harmonia com o princípio "in dubio pro reo".
Ora tudo visto e ponderado e nos termos do disposto no art.º 425.º, n.º 5, do Código de Processo Penal, nega-se igualmente provimento a esta parte do recurso, nos termos e pelos fundamentos constantes do excerto acabado de transcrever da decisão impugnada, para o qual nos remetemos, ao abrigo da disposição legal citada.
IV
Termos em que se decide negar provimento ao recurso e manter na íntegra a decisão recorrida.
Custas pelo assistente, fixando-se a taxa de justiça, atendendo ao trabalho e complexidade de tratamento das questões suscitadas, em três UC’s (art.º 515, n.º 1 al.ª b), do Código de Processo Penal e 8.º, n.º 9, do RCP e tabela III anexa).

Évora, 8-3-2022
Martinho Cardoso, relator
Maria Leonor Esteves, adjunta