Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1240/20.1T8EVR.E1
Relator: MOISÉS SILVA
Descritores: PENSÃO DE REFORMA
BANCÁRIO
CONTRIBUIÇÃO PARA A SEGURANÇA SOCIAL
Data do Acordão: 02/10/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
i) a cláusula 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho para o sector bancário e 98.ª do Acordo Coletivo de Trabalho do Montepio devem ser interpretadas no sentido de que os trabalhadores na situação de reforma só têm a obrigação de entregar as quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social referentes ao período de tempo em que exerceram a sua atividade bancária e em que efetuaram descontos para a Segurança Social na sequência da extinção da Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários.
ii) este entendimento não viola o disposto no art.º 63.º n.º 4 da CRP.
Decisão Texto Integral:
Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora

I - RELATÓRIO

Apelante: Caixa Económica Montepio Geral, SA (ré).
Apelado: A.P. (autor).

Tribunal Judicial da Comarca de Évora, Juízo do Trabalho de Évora.

1. O autor intentou ação declarativa de condenação com processo comum emergente de contrato individual de trabalho contra a ré, pedindo que esta seja condenada a:
a) Reconhecer-lhe o direito a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 20,83%, correspondente aos anos de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
b) Pagar-lhe o valor de € 18 407,82, acrescido de juros de mora no montante de € 1 018,90, num valor total global de € 19 426,72, correspondente ao valor excessivo e ilegalmente descontado e respeitante aos meses de novembro de 2016 até à presente data, valor onde se encontram englobados os respetivos subsídios de férias e de Natal, acrescido de juros vencidos até integral pagamento;
c) Aplicar uma regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do CNP a entregar ao Banco, respeitante aos descontos que efetuou para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
d) Pagar-lhe todas as quantias que ilicitamente venha a reter da pensão do CNP pela não aplicação da regra descrita em c), desde a propositura da ação até trânsito em julgado da mesma, acrescidas de juros de mora vincendos, a liquidar em execução de sentença;
e) Suportar as custas processuais.

Alegou, em síntese:
1º A R. é uma instituição de crédito e exerce a atividade bancária.
2º Participou nas negociações e outorgou o ACT para a Caixa Económica Montepio Geral, cuja versão integral se encontra publicada no Boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª Série, n.º 8, de 28.02.2017, pg. 495 e ss., instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que aplicou e aplica aos trabalhadores integrados nos seus quadros ou que deles fizeram parte.
3º O A. encontra-se filiado no Mais Sindicato, que também usou Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, onde figura como o sócio n.º 41926.
4º O A. foi admitido ao serviço do R. em 02.11.1982.
5º Em 03.11.2016 foi informado pelo Centro Nacional de Pensões do deferimento do requerimento de pensão por velhice, que teve o seu início em 21.11.2016 com o valor de € 1 015,29, que corresponde a 24 anos de descontos para a Previdência.
6º A referida pensão foi sendo atualizada, nos termos legais e por cada ano, nos seguintes termos:
a) No ano de 2018 – € 1 030,73;
b) No ano de 2019 – € 1.044,67;
c) No ano de 2020 – € 1 050,8.
7º Na presente data o réu paga uma pensão de reforma 14 vezes por ano, com a pensão base de € 1 550,84, diuturnidades no valor de € 277,60 e complemento no valor de € 367,35.
8º Em julho de 2017 foi notificado pelo réu que os descontos no setor bancário posteriores a janeiro de 2011 reverteriam a favor do Montepio.
9º Tal significa que à pensão de reforma que recebe do Centro Nacional de Pensões o réu deduz o valor de € 576,67, que corresponde a 56% do valor da mesma, quando só teria direito a 20,83%.
10º Isto porque teve uma carreira contributiva com três momentos distintos de descontos, a saber:
a) De 11/1964 a 12/1982 efetuou descontos para a Segurança Social decorrentes da prestação de atividade dependente remunerada a entidade não bancária;
b) De 12/1982 e 12/2010, enquanto trabalhador bancário efetuou os descontos obrigatórios para a Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários (CAFEB) e para o Fundo de Pensões do Banco;
c) A partir de janeiro de 2011, com a entrada em vigor do Decreto-lei n.º 1-A/2011, de 3 de janeiro, que extinguiu CAFEB por integração no Instituto de Segurança Social, IP, passando os seus beneficiários a serem aqui integrados, passou a descontar para a Segurança Social, o que fez até passar à situação de reforma.
11º O réu tem direito a fazer seu o valor resultante da percentagem correspondente aos 6 anos de descontos da integração da CAFEB no ISS, I.P. (2011 a 2016), ou seja, 20,83 %, ou seja, o valor de € 218,88.
12º Assim, de um valor total pago pelo CNP de € 52 655,69, o réu retirou ilicitamente um total € 29 376,00, quando só podia ter deduzido o montante de € 10 968,18, ou seja, o correspondente a 20,83 % da pensão que, em cada momento, lhe foi paga pelo CNP, pelo que deve a diferença, no valor de € 18 407,82, acrescida de juros à taxa legal.
13º Dentro do setor bancário o Banco de Portugal e o BCP aplicam a regra pro rata temporis.
14º A prevalecer o entendimento da entidade patronal, o tempo de trabalho que prestou fora do setor contribuirá para a constituição da pensão do setor, o que viola o artigo 63.º, 4, da Constituição da República Portuguesa, ou seja, o réu beneficiará de um valor desproporcional ao dos anos de desconto para a segurança social dentro do setor e ao seu serviço.
15º Nesses termos, a interpretação que ora se impugna, do Decreto-lei 1-A/2011, de 3 de janeiro, é inconstitucional por violação do artigo 63.º, 4, da Constituição da República Portuguesa.
16º Todo o setor de atividade em causa e afetado pelo referenciado Decreto-lei n.º 1-A/2011, paga a pensão aos trabalhadores tendo em atenção, apenas, o tempo prestado no setor, o que está de acordo com a correta e constitucional interpretação do diploma referenciado.
17º Nesse sentido, a admitir-se possível outra interpretação que não essa, estamos perante uma violação concreta do princípio/direito da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa.
18º E é nestes termos que o Tribunal deve interpretar a cláusula 98.ª do ACT Montepio.
19º Em suma, só a aplicação de um princípio-regra pro rata temporis responde de forma capaz ao vazio legal existente.
Realizada a tentativa de conciliação entre as partes, a mesma frustrou-se.
Citado para o efeito, o réu contestou a ação, pugnando pela sua absolvição de todos os pedidos formulados pelo autor, por considerar que as deduções que fez são lícitas, estando de acordo com a redação da cláusula 136.ª do ACT do Setor Bancário e da cláusula 98.ª do ACT do Montepio.
O réu alegou, em síntese:
1º Com a integração, operada a 1 de janeiro de 2011, dos trabalhadores bancários inscritos na CAFEB no regime geral de segurança social, esses trabalhadores passaram a deter um regime de segurança social complexo no que importa à reforma por invalidez presumível (velhice).
2º Nessa altura, os trabalhadores bancários repartiam-se por 3 grupos distintos:
a) Um primeiro grupo de trabalhadores, o mais numeroso, como era o caso do autor, inscritos na CAFEB, que beneficiavam exclusivamente do regime de segurança social do setor bancário de benefício definido, cujas pensões eram pagas exclusivamente pelos bancos através dos seus fundos de pensões (a CAFEB não pagava pensões mas apenas o abono de família);
b) Um segundo grupo de trabalhadores (como era o caso da generalidade dos trabalhadores do ex-Banco Totta & Açores), não inscritos na CAFEB, que já tinham sido inscritos, por razões históricas, no regime geral de segurança social mas que beneficiavam, complementarmente, do regime de segurança social do setor bancário de benefício definido;
c) Um terceiro grupo, composto pelos trabalhadores admitidos no setor bancário a partir de 3 de março de 2009, comumente designado por “novos bancários” que são, por força do Decreto-Lei n.º 54/2009, de 2 de março, inscritos no regime geral de segurança social, beneficiando complementarmente de um regime de contribuição definida e que ficam excluídos do regime de benefício definido previsto no Acordo Coletivo de Trabalho do setor bancário.
3º Por força do Decreto-Lei n.º 1–A/2011, de 3 de janeiro, os trabalhadores bancários inscritos na CAFEB, como era o caso do autor, foram inscritos no regime geral aplicando-se regras específicas quanto às contribuições: 3% pelos trabalhadores (igual ao que já contribuíam para a CAFEB) e 23,6% pelos bancos (até então os bancos faziam apenas dotações para os fundos de pensões para provisionarem as suas responsabilidades por pensões).
4º Não obstante a integração daqueles trabalhadores no regime geral de segurança social, os bancos continuam a garantir a este universo de trabalhadores, de forma complementar, o regime de reformas que já existia no regime do setor bancário plasmado então nas cláusulas 136.ª e ss do Acordo Coletivo de Trabalho do setor bancário.
5º Note-se que a antiguidade, quer antes de 01.01.2011, quer depois dessa data, continua a ser reconhecida àqueles trabalhadores bancários para efeitos de cálculo dos benefícios de segurança social do regime de previdência bancário, designadamente para efeitos do cálculo das pensões de reforma por invalidez presumível (equivalente à velhice no regime geral) devidas pelos bancos.
6º Porque foram integrados a partir de 01.01.2011no regime geral de segurança social têm direito, pela carreira posterior a essa integração, a um benefício a pagar pelo CNP por esse tempo, havendo, assim, uma sobreposição das carreiras.
7º Pode suceder que o trabalhador tenha também carreira contributiva no regime geral de segurança social antes de ter sido admitido ao serviço do Banco.
8º Nesse caso, a Segurança Social calcula o benefício a pagar pelo CNP considerando toda a carreira contributiva, antes de Banco e ao serviço do Banco, pagando um benefício único.
9º Quando tal sucede, torna-se necessário, naturalmente, cindir aquele benefício pago pelo CNP por forma a apurar a parte da pensão que cabe ao trabalhador (pelo tempo antes de Banco) e a parte da pensão que cabe ao Banco (por tal tempo ter sido contado pelo Banco).
10º Por facilidade de exposição, designaremos esta última parte da pensão do CNP como “pensão de abate”.
11º A discórdia que levou ao presente litígio consiste apenas em saber, como acima se disse, qual a regra para o cálculo da dita “pensão de abate” prevista na antiga cláusula 136.ª do ACT do sector bancário e hoje na cláusula 98.ª do ACT do Banco Montepio, quando a pensão paga pelo CNP considera, além do tempo de Banco, tempo de carreira contributiva anterior àquele.
12º O autor entende que para o apuramento da “pensão de abate” há que aplicar uma “regra de três simples pura”, repartindo o benefício pago pelo CNP exclusivamente em função do tempo, irrelevando por completo as contribuições efetuadas durante esse período de tempo.
13º Para o autor, os anos da sua carreira contributiva no regime geral têm um peso igual, não obstante as remunerações auferidas serem de montantes muito diferentes…
14º O réu defende que, para o cálculo da “pensão de abate” devem apurar-se, isoladamente e com recurso às regras de cálculo do regime geral da segurança social, as duas pensões teóricas (uma pelo tempo antes do Banco e, outra, pelo tempo de Banco) e repartir o benefício do CNP em função do montante de cada uma das pensões teóricas.
15º As cláusulas em preço referem, expressamente, “(…) benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou serviços de segurança social (…)”, não se referindo à parte proporcional, em função exclusivamente do tempo, dos benefícios pagos por outros regimes de segurança social.
16º A interpretação preconizada pelo autor olvida que para o cálculo do beneficio pago pelo CNP concorre, nos termos do disposto no artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, não só o tempo (por via da taxa de formação a pensão) mas também as remunerações (por via da remuneração de referência que é definida no artigo 28.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, pela fórmula TR/(nx14), em que TR representa o total das remunerações anuais revalorizadas de toda a carreira contributiva e n o número de anos civis com registo de remunerações, até ao limite de 40).
17º Em suma: porque a cláusula 136.ª do ACT do Setor Bancário (tal como a cláusula 98.ª do atual ACT do Montepio) se refere expressamente a benefícios decorrentes de contribuições para o regime geral de segurança social e porque o benefício pago pelo regime geral de segurança social (através do CNP) é apurado, além do tempo de carreira contributiva (que determina a taxa de formação da pensão), de acordo com os montantes das contribuições feitas ao longo da carreira contributiva (por via da determinação da remuneração de referência), torna-se imperioso calcular as duas pensões teóricas respeitantes a cada um dos períodos em causa e, em função desses resultados, repartir o benefício pago pelo CNP, sob pena de subversão total da ratio da cláusula em análise,
18º A interpretação dada pelo autor à cláusula 136.ª do ACT do setor bancário e à cláusula 98.ª do atual ACT do Montepio, é, assim, materialmente inconstitucional por violação do artigo 63.º, n.º 4 da Constituição.
19º Para os efeitos da cláusula 136.ª do ACT do setor bancário há que apurar, de acordo com as regras do regime de segurança social do sector bancário, o benefício a pagar pelo réu e deduzir a este o benefício a pagar pelo Centro Nacional de Pensões, apurado de acordo com as regras do regime geral de segurança social.
20º São esses dois benefícios (calculados com as regras próprias de cada um dos regimes, aplicadas em bloco dentro de cada um deles) que, por respeitarem ao mesmo tempo de serviço, podem ser considerados para os efeitos da citada cláusula 136.ª do ACT do setor bancário e da cláusula 98.ª do ACT do banco Montepio, o que o réu fez.
O tribunal recorrido entendeu que existiam nos autos elementos suficientes que permitiam proferir desde logo decisão sobre o mérito da causa (artigo 61.º, 2, do Código do Processo de Trabalho) e conheceu do mérito da causa, com a decisão seguinte:
Pelo exposto e tendo em atenção as disposições legais supracitadas, julgo procedente por provada a ação intentada pelo autor, A.P., contra a ré, Caixa Económica Montepio Geral, SA e, em consequência, condeno a ré:
1º A reconhecer o direito do autor a receber a pensão completa do Centro Nacional de Pensões, deduzida do valor correspondente à percentagem de 20,83%, correspondente aos anos de descontos para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
2º A pagar ao autor o valor de € 18 407,82, acrescido de juros de mora no montante de € 1 018,90, num valor total global de € 19 426,72, correspondente ao valor descontado entre novembro de 2016 e julho de 2020, valor onde se encontram englobados os respetivos subsídios de férias e de Natal, acrescido de juros vencidos até integral pagamento;
3º A aplicar uma regra pro-rata temporis ou regra de três simples pura no apuramento da parte da pensão do CNP a entregar ao Banco, respeitante aos descontos que efetuou para a Segurança Social enquanto trabalhador bancário;
4º Pagar ao autor todas as quantias que tenha retido da pensão do CNP pela não aplicação da regra pro-rata temporis desde a propositura da presente ação e até ao trânsito em julgado da mesma, acrescidas de juros de mora vencidos e vincendos, a liquidar em execução de sentença caso as partes nisso não acordem.
Custas a cargo do réu – artigo 527.º do Código de Processo Civil, aplicável por força do art.º 1.º, 2, a), do Código do Processo de Trabalho.
Valor: € 30 000,01.

2. Inconformada, a R. interpôs recurso de apelação motivado com as conclusões seguintes:
1. A interpretação das cláusulas regulativas de convenção coletiva de trabalho deve fazer-se de acordo com as regras de interpretação da lei, em particular de acordo com o disposto no artigo 9.º do Código Civil, como vem sendo entendimento da Jurisprudência, e como recentemente foi defendido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 1/2019, publicado no Diário da República, 1.ª série, n.º 55, de 19 de março de 2019.
2. Na interpretação da cláusula 136.ª do ACT do setor bancário, deve atender-se aos seus elementos literal, sistemático, histórico e teleológico.
3. No que respeita ao elemento literal, a redação da cláusula 136.ª do ACT do setor bancário (cláusula que veio a ser substituída pela cláusula 98.ª do ACT do Montepio) é clara nos dois aspetos que aqui relevam.
4. Primeiro, que nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por Instituições ou Serviços de Segurança Social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas Instituições ou seus familiares - como sucede com o recorrido, a partir de 1.1.2011, dada a sua integração no regime geral de segurança social por imposição do Decreto-Lei n.º 1-A/2011, de 3 de janeiro -, apenas será garantida, pelas Instituições de Crédito, a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos no ACT – cfr. 2.ª parte do n.º 1 da cláusula 136.ª.
5. Segundo, que o benefício a “abater” é o que decorre de contribuições feitas no período de serviço contado pelo Banco para o cálculo da pensão a pagar por este, pois, como se refere no n.º 2 daquela cláusula estão em causa os benefícios decorrentes de contribuições.
6. A “pensão de abate” é, assim, o benefício do CNP pelo tempo de carreira ao serviço do banco (pensão teórica) que resulta das contribuições feitas no período em apreço, apurado segundo as regras do regime geral da segurança social, que são as regras aplicáveis ao cálculo do benefício a pagar pelo CNP.
7. As cláusulas aludem, literalmente, ao benefício decorrente das contribuições com fundamento na prestação de serviço que seja contado na antiguidade do trabalhador.
8. Acresce ainda que, quando no Acordo Coletivo se pretendeu exprimir o critério pro rata temporis tal foi feito de modo particularmente claro e direto (n.º 3 da cláusula 102.ª) sem qualquer semelhança com a redação da analisada cláusula 98.ª.
9. O elemento sistemático é também conducente ao mesmo resultado interpretativo.
10. A norma em causa insere-se no sistema de previdência e, no caso concreto, na conjugação de dois regimes de reformas, a saber: o regime de segurança social do setor bancário e o regime geral de segurança social.
11. Para isso, por se tratar de um sistema previdencial, remete para as regras de cálculo utilizadas pelo regime geral da segurança social.
12. A fim de as utilizar e não de aproveitar os seus resultados.
13. A inserção sistemática da cláusula 136.ª do ACT do setor bancário impõe a sua interpretação no sentido da aplicação das mesmas regras que servem para o cálculo da pensão do CNP.
14. São essas as regras aplicadas pela recorrente, para apuramento da “pensão de abate”.
15. Este sentido saí reforçado, por um lado, por não haver dúvidas quanto à aplicação das regras de cálculo do regime da segurança social quando não há tempo “extrabanco” e, por outro lado, pela redação da cláusula 98.ª do ACT do Banco Montepio.
16. Naquela cláusula as Partes Outorgantes, acautelando o caso de o trabalhador não requerer a atribuição do benefício do CNP, expressamente previram como seria feito o “abate” daquele benefício à pensão a pagar pelo Banco, remetendo expressamente para as regras do regime geral de segurança social.
17. Caso o trabalhador não requeira o pagamento do benefício do CNP, o Banco estima qual o valor desse benefício e apenas garante o pagamento da diferença entre a pensão prevista do ACT e o benefício do CNP.
18. O que significa que as Partes sempre tiveram presente que o benefício a “abater” é apurado de acordo com as regras aplicáveis ao cálculo desse mesmo benefício e não de acordo com uma qualquer regra de repartição em “três simples” ou pro rata temporis.
19. Ao invés, não há qualquer elemento do sistema que aponte para a interpretação que defende o recorrido, ou seja, não há qualquer norma no sistema em que se insere a cláusula 136.ª do ACT do setor bancário e a cláusula 98.ª que lhe sucedeu, que contenha norma para o cálculo de benefícios de pensão em razão de qualquer critério de pro rata temporis.
20. O montante da pensão do CNP é igual ao produto da remuneração de referência pela taxa global de formação da pensão e pelo fator de sustentabilidade., como resulta do disposto no artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio.
21. E a remuneração de referência é definida no artigo 28.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, pela fórmula TR/(nx14), em que TR representa o total das remunerações anuais revalorizadas de toda a carreira contributiva e n o número de anos civis com registo de remunerações, até ao limite de 40.
22. São estas as regras do sistema a que apela a cláusula 136.ª do ACT do setor bancário e que, com recurso ao elemento sistemático, devem aplicar-se no apuramento da parte da pensão a pagar pelo CNP que há de ser entregue pelo recorrido à recorrente.
23. Por fim, o elemento teleológico é particularmente relevante na tarefa interpretativa, pois a norma da cláusula 136.ª do ACT do setor bancário tem por fim coordenar o percebimento de benefícios por trabalhadores submetidos a diferentes regimes de forma a impedir que, por força co mesmo período contributivo, o trabalhador venha a auferir, de forma cumulada, dois benefícios.
24. Fá-lo, limitando a responsabilidade da instituição bancária, à diferença entre os benefícios devidos por aplicação do IRCT e os benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou serviços de segurança social com fundamento na prestação do serviço no setor bancário.
25. É uma expressão clara do princípio da não acumulação de prestações plasmado no artigo 67.º, n.º 1 da Lei de Bases da Segurança Social (Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro).
26. A não acumulação de prestações não pode alcançar-se com recurso, para a repartição da pensão a pagar pelo CNP, a um critério de “regra de três simples pura”.
27. Tal conclusão ofende diretamente o fim a que se propõe a cláusula 136.ª do ACT do setor bancário e a cláusula 98.ª que lhe sucedeu, que é, precisamente, abater à pensão paga pelo Banco recorrente, a pensão (ou parte de pensão) que for paga ao Recorrido pelo CNP que respeite ao tempo de Banco.
28. O entendimento da recorrente é, de resto, o que conduz a um resultado mais equitativo.
29. É bom notar que a carreira extrabanco pode ser mais favorável ao trabalhador, o que sucede no caso de as remunerações registadas nesse período serem superiores às registadas na carreira ao serviço do Banco.
30. Por isso, acrescenta-se, a este propósito, que o entendimento da recorrente assegura, inclusivamente, que nesses casos, em que a pensão teórica extrabanco seja mais favorável ao pensionista (por as remunerações auferidas nesse período serem superiores), não veja este o seu benefício penalizado.
31. A questão não é meramente teórica, tendo sido objeto do douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 22/11/2017, disponível em www.dgsi.pt
32. Como sucedeu no caso julgado no referido douto Acórdão do Tribunal de Relação de Évora de 22/11/2017, em que estava em causa uma pensão da Caixa Geral de Aposentações e em que o Banco ali réu reconhecera parte da carreira na CGA, verificou-se que as remunerações auferidas pelo trabalhador no período extrabanco eram superiores àquelas que auferira no período que o Banco lhe contara, tendo o tribunal concluído que não era aplicável a regra de pro rata temporis, que aquele Banco aplicara.
33. O Tribunal da Relação de Évora acolheu o entendimento aqui defendido pela recorrente que, naquele caso, era favorável ao pensionista.
34. O elemento teleológico da norma não consente, assim, outra interpretação que não seja a que lhe dá a recorrente.
35. Em suma, para dizer que a interpretação da cláusula 136.ª do ACT do setor bancário e da cláusula 98.ª que lhe sucedeu, com recurso aos elementos de interpretação literal, sistemático e teleológico, conduz ao resultado oposto ao da Sentença recorrida.
36. A interpretação preconizada pela douta Sentença recorrida olvida que para o cálculo do beneficio pago pelo CNP concorre, nos termos do disposto no artigo 26.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, não só o tempo (por via da taxa de formação a pensão) mas também as remunerações (por via da remuneração de referência que é definida no artigo 28.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de maio, pela fórmula TR/(nx14), em que TR representa o total das remunerações anuais revalorizadas de toda a carreira contributiva e n o número de anos civis com registo de remunerações, até ao limite de 40).
37. Em suma: porque a cláusula 136.ª do ACT do setor bancário (tal como a cláusula 98.ª do atual ACT do Montepio) se refere expressamente a benefícios decorrentes de contribuições para o regime geral de segurança social e porque o benefício pago pelo regime geral de segurança social (através do CNP) é apurado considerando, além do tempo de carreira contributiva (que determina a taxa de formação da pensão), os montantes das contribuições feitas ao longo da carreira contributiva (por via da determinação da remuneração de referência), torna-se imperioso calcular as duas pensões teóricas respeitantes a cada um dos períodos em causa e, em função desses resultados, repartir o benefício pago pelo CNP.
38. Entendimento que foi sufragado pelos doutos Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 10/10/2016 e do Tribunal da Relação de Lisboa de 25/09/2017, que se juntaram aos autos.
39. Mais recentemente foi também este o entendimento versado nas três doutas sentenças proferidas pelo Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho do Porto, Juiz 1, de 20/02/2020 e de 01/10/2020, e Juiz 2 de 25/04/2020, já juntas a estes autos.
40. E é também a douta opinião dos SENHORES PROFESSORES DOUTORES BERNARDO LOBO XAVIER e MARIA DO ROSÁRIO PALMA RAMALHO expressa nos doutos Pareceres de Direito juntos aos autos.
41. O entendimento sufragado pelo Recorrido, viola também o disposto no artigo 63.º, n.º 4 da Constituição da República.
42. Ao remeter-se o cálculo da “pensão de abate” para uma “regra de três simples” está o recorrido, inevitavelmente, a transferir para si, como pensionista, parte do benefício que o Banco deve abater à mensalidade que está obrigado a pagar, potenciando, ilegalmente e em afronta àquele comando constitucional, o beneficio que o pensionista teria a receber se isoladamente lhe fosse considerada apenas a carreira contributiva extrabanco.
43. O efeito de tal entendimento é, efetivamente, a violação do preceito constitucional vertido no artigo 63.º, n.º 4 da Constituição da República que determina que “Todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, independentemente do sector de atividade em que tiver sido prestado.”.
44. A interpretação dada pelo recorrido à cláusula 136.ª do ACT do setor bancário e à cláusula 98.ª do atual ACT do Montepio, é, assim, materialmente inconstitucional por violação do artigo 63.º, n.º 4 da Constituição.
45. A douta Sentença recorrida deve, pelos fundamentos expostos, ser revogada, concedendo-se provimento ao recurso e, consequentemente, absolvendo-se a recorrente dos pedidos.
46. Ao decidir como decidiu, violou a douta Sentença recorrida o disposto na cláusula 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho do setor bancário (BTE n.º 3 de 22/01/2011 - Data de Distribuição: 24/01/2011), cláusula que veio a ser substituída, com redação similar, pela cláusula 98.ª do Acordo Coletivo de Trabalho do Montepio, (BTE n.º 8 de 28/02/2017 – Data de Distribuição: 01/03/2017), os artigos 26.º e 28.º do Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de Maio e, bem assim, violou também o disposto no artigo 63.º, n.º 4 da Constituição da República.
Termos em que, concedendo provimento ao recurso e, consequentemente, julgando a ação totalmente improcedente

3. O autor, respondeu e concluiu que a sentença deve ser mantida por ter efetuado correta aplicação do direito aos factos, conforme extensa jurisprudência que cita.

4. O Ministério Público junto deste Tribunal da Relação emitiu parecer no sentido da confirmação da sentença.
O apelado aderiu ao parecer.

5. Dispensados os vistos, por acordo, em conferência, cumpre apreciar e decidir.

6. Objeto do recurso

O objeto do recurso está delimitado pelas conclusões das alegações formuladas, sem prejuízo do que for de conhecimento oficioso.
Questão a decidir:
Interpretação da cláusula 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho do setor bancário e da cláusula 98.ª do Acordo Coletivo de Trabalho do Montepio que a substituiu.

II - FUNDAMENTAÇÃO
A) DE FACTO
A sentença recorrida deu como provados os factos seguintes (não impugnados neste recurso):
1.º A ré é uma instituição de crédito e exerce a atividade bancária (facto notório e provado por acordo – cfr. artigo 114.º da contestação).
2.º Participou nas negociações e outorgou o ACT para a Caixa Económica Montepio Geral, cuja versão integral se encontra publicada no B.T.E., 1.ª Série, n.º 8, de 28/02/2017, pg. 495 e ss., instrumento de regulamentação coletiva de trabalho que aplicou e aplica aos trabalhadores integrados nos seus quadros ou que deles fizeram parte (facto notório e provado por acordo – cfr. artigo 114.º da contestação).
3º O autor encontra-se filiado no Mais Sindicato, que também usou Sindicato dos Bancários do Sul e Ilhas, onde figura como o sócio n.º 41926 (facto provado por acordo – cfr. artigo 114.º da contestação).
4º O autor foi admitido ao serviço da ré em 02.11.1982 (facto notório e provado por acordo – cfr. artigo 114.º da contestação).
5º O autor passou à situação de reforma com efeitos a 20.03.2016 (facto provado por acordo – cfr. artigo 115.º da contestação).
6º O autor foi informado por carta do Centro Nacional de Pensões datada de 03.11.2016 de que o requerimento de pensão oportunamente apresentado foi DEFERIDO, sendo que a pensão por VELHICE tem início em 21.11.2016, sendo o seu valor atual € 1 015,29 Euros (facto provado por acordo – cfr. artigo 114.º da contestação).
7º A referida pensão foi sendo atualizada nos seguintes termos: no ano de 2018 – € 1 030,73; no ano de 2019 – € 1 044,67; no ano de 2020 – € 1 050,81 (facto provado por documentos não impugnados – ofícios da Segurança Social juntos com a petição inicial como documento n.º 4).
8º A pensão atribuída ao autor por velhice, em resultado do referido cálculo é, atualmente, de € 1 050,81 (facto provado por documentos não impugnados – ofícios da Segurança Social juntos com a petição inicial como documento n.º 4).
9º O autor passou à situação de reforma integrado no nível 13 do ACT para o Montepio (facto provado por acordo – cfr. artigo 114.º da contestação).
10º Na presente data a ré entrega ao autor uma pensão de reforma, pagável 14 vezes por ano, com a pensão base de € 1 550,84, diuturnidades no valor de € 277,60 e complemento no valor de € 367,35 (facto provado por acordo – cfr. artigo 114.º da contestação).
11º A ré enviou ao autor a carta datada de 14.07.2017, junta à petição inicial como documento n.º 6 (facto provado por acordo – cfr. artigo 114.º da contestação).
12º Na presente data a ré deduz à pensão de reforma do Centro Nacional de Pensões o valor de € 576,67€, conforme comunicação de setembro de 2017, tendo-o feito retroativamente (facto provado por acordo – cfr. artigo 114.º da contestaçã9)
13º De 11/1964 a 12/1982, o autor efetuou descontos para a Segurança Social decorrentes da prestação de atividade dependente remunerada a entidade não bancária (facto provado por documento não impugnado – ofício da Segurança Social junto com a petição inicial como documento n.º 3).
14º De 12/1982 e 12/2010, o autor, enquanto trabalhador bancário, efetuou os descontos obrigatórios para a Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários (CAFEB) e para o Fundo de Pensões do Banco (facto provado por documento não impugnado – ofício do Montepio junto com a petição inicial como documento n.º 5).
15º A partir de janeiro de 2011 o autor passou a descontar para a Segurança Social, até passar à situação de reforma (facto provado por documento não impugnado – cata do Montepio de 14.07.2017 junta com a petição inicial como documento n.º 6).
Da contestação
16º Em 01.01.2011 os trabalhadores bancários inscritos na CAFEB (Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários) foram integrados no regime geral de segurança social (facto provado por acordo – cfr. artigo 18.º da petição inicial).
17º Não obstante a integração, os bancos continuam a garantir a este universo de trabalhadores, de forma complementar, o regime de reformas que já existia no regime do sector bancário (facto não impugnado).
18º A antiguidade, quer antes de 01.01.2011, quer depois dessa data, continua a ser reconhecida àqueles trabalhadores bancários para efeitos de cálculo dos benefícios de segurança social do regime de previdência bancário, designadamente para efeitos do cálculo das pensões de reforma por invalidez presumível (equivalente à velhice no regime geral) devidas pelos bancos (facto não impugnado).

O direito

O artigo 63.º n.º 4 da Constituição da República Portuguesa preceitua que todo o tempo de trabalho contribui, nos termos da lei, para o cálculo das pensões de velhice e invalidez, independentemente do setor de atividade em que tiver sido prestado.
O artigo 67.º da Lei n.º 4/2007, de 16 de janeiro, que aprovou as bases gerais do sistema de segurança social, prescreve:
1. Salvo disposição legal em contrário, não são cumuláveis entre si as prestações emergentes do mesmo facto, desde que respeitantes ao mesmo interesse protegido.
2. As regras sobre acumulação de prestações pecuniárias emergentes de diferentes eventualidades são reguladas por lei, não podendo, em caso algum, resultar da sua aplicação montante inferior ao da prestação mais elevada nem excesso sobre o valor total.
3. Para efeitos de acumulação de prestações pecuniárias podem ser tomadas em conta prestações concedidas por sistemas de segurança social estrangeiros, sem prejuízo do disposto em instrumentos internacionais aplicáveis.
O art.º 6.º do Decreto-Lei n.º 1-A/2011, de 03.01, prescreve:
1. Para efeitos de preenchimento do prazo de garantia são relevantes os períodos contributivos registados no regime de segurança social substitutivo constante de IRCT vigente no setor, na parte em que não se sobreponham aos do regime geral.

2. Os anos civis com registo de remunerações no âmbito do regime de segurança social substitutivo constantes de IRCT vigente no setor relevam para efeitos do cumprimento das condições de acesso à pensão de velhice antecipada ou bonificada, atribuída ao abrigo do regime de flexibilização da idade de pensão e do regime de antecipação nas situações de desemprego involuntário de longa duração, assim como para determinar o fator de redução ou de bonificação correspondente ao cálculo da carreira contributiva.

O art.º 7.º do mesmo diploma legal prescreve ainda:

1. Nas situações em que seja efetuada a totalização para efeitos de prazo de garantia, previstos no n.º 1 do artigo anterior, são também relevantes para o apuramento da remuneração de referência a ter em conta no cálculo da pensão de velhice a atribuir pelo regime geral as remunerações registadas em nome dos trabalhadores na CAFEB relativas a períodos anteriores à entrada em vigor do presente decreto-lei, revalorizadas nos termos previstos no regime jurídico das pensões do regime geral.
2. Para efeitos do disposto no número anterior, apenas são consideradas as últimas remunerações anuais registadas, necessárias para completar o preenchimento do prazo de garantia.
Por sua vez, as cláusulas 136.ª do ACT para o setor bancário, BTE, 1.ª série, n.º 3, de 22/01/2011 e 98.ª do ACT para a Caixa Económica Montepio Geral, BTE, 1.ª Série, n.º 8, de 28/02/2017, com teor idêntico, prescrevem:
1. As instituições subscritoras garantem os benefícios constantes da presente secção aos trabalhadores referidos no número 3 da cláusula 96.ª, bem como aos demais titulares das pensões e subsídios nela previstos. Porém, nos casos em que benefícios da mesma natureza sejam atribuídos por instituições ou serviços de Segurança Social a trabalhadores que sejam beneficiários dessas instituições ou seus familiares, apenas é garantida pelas instituições subscritoras a diferença entre o valor desses benefícios e o dos previstos nesta secção.
2. Para efeitos da segunda parte do número anterior, apenas são considerados os benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou serviços de Segurança Social com fundamento na prestação de serviço que seja contado na antiguidade do trabalhador nos termos da cláusula 107.ª
3. As instituições adiantarão aos trabalhadores abrangidos pelo regime geral da segurança social as mensalidades a que por este acordo tiverem direito, entregando estes à instituição a totalidade das quantias que receberem dos serviços de segurança social a título de benefícios da mesma natureza.
Em caso idêntico ao destes autos, o Supremo Tribunal de Justiça, no seu acórdão de 22.02.2018[1], firmou a jurisprudência seguinte:
“I - O número 3.º da cláusula n.º 136.ª do Acordo Coletivo de Trabalho para o sector bancário ao referir no seu segundo segmento “entregando estes (os trabalhadores que passem à reforma) à Instituição (de Crédito) a totalidade das quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social a título de benefícios da mesma natureza” pretende significar que os trabalhadores, na situação de reforma, só têm a obrigação de entregar as quantias que receberem dos Serviços de Segurança Social referentes ao período de tempo em que exerceram a sua atividade bancária e que efetuaram descontos para a Segurança Social, na sequência da extinção da Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários.
II - As expressões utilizadas na referida cláusula “a diferença entre o valor desses benefícios” na parte final do n.º 1, “benefícios decorrentes de contribuições para instituições ou Serviços de Segurança Social” no segundo segmento do n.º 2 e “benefícios da mesma natureza” na parte final do n.º 3, referem-se tão só às pensões, não se podendo afirmar que dos respetivos textos resulte um mínimo de correspondência verbal que possa suportar a interpretação no sentido da introdução de um fator de ponderação que tenha a ver com o valor das contribuições efetuadas”.
O mesmo acórdão refere: “porque para o cálculo da pensão relevam a taxa global de formação da pensão (correspondente ao produto de 2% por cada ano civil relevante) e a remuneração de referência (para além do fator de sustentabilidade), afigura-se-nos mais consentâneo com as regras de cálculo que na determinação da parte da pensão da Segurança Social que corresponde apenas ao período de trabalho na banca, ou seja, posterior a janeiro de 2011 se atenda não apenas à percentagem corresponde àquele tempo de trabalho relativamente ao todo (ou seja, aos cinco em dezanove anos e que corresponde à percentagem de 26,31% do total considerado), mas também à relevância das remunerações sobre as quais incidiram as contribuições efetuadas nesse período, atendendo, pois, não apenas ao fator tempo, mas também ao fator remunerações ou contribuições, já que estas são determinadas pelo valor daquelas, correspondendo à aplicação sobre elas da taxa social única”.
Concordamos integralmente com este entendimento, pese embora os doutos pareceres juntos aos autos pela apelante. Para o cálculo da pensão atende-se não só ao tempo mas também às remunerações que geraram as contribuições.
O pensionista não tem direito a acumular duas pensões: a paga pela entidade bancária com base no ACT e a paga pela segurança social calculada tendo em conta os descontos enquanto trabalhador bancário.
O pensionista tem direito a receber a pensão paga pela entidade bancária e a obrigação de entregar a esta a pensão devida pela segurança social, mas apenas relativamente ao período de tempo a partir da extinção da Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários, ou seja, a partir de 01.01.2011.
Salvo o devido respeito, este entendimento não viola o art.º 63.º n.º 4 da CRP.
A pensão do autor foi calculada com base no seu período contributivo do tempo de trabalho prestado. O que está em causa nestes autos é apenas o cálculo do valor da parcela a abater correspondente ao tempo contributivo posterior à integração da CAFEB na Segurança Social.
Ao calcular a pensão o CNP teve por base 24 anos de carreira contributiva, pelo que o réu apenas pode deduzir na pensão que paga ao autor a parte proporcional posterior à integração da CAFEB na Segurança Social[2].
Termos em que improcede a apelação se confirma a sentença recorrida.

III - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes desta Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar a apelação improcedente e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela apelante.
Notifique.
(Acórdão elaborado e integralmente revisto pelo relator).
Évora, 10 de fevereiro de 2022.
Moisés Silva (relator)
Mário Branco Coelho
Paula do Paço
__________________________________________________
[1] Ac. STJ, de 22.02.2018, processo n.º 9637/16.5T8LSB.L1.S1, www.dgsi.pt/jstj e jurisprudência uniforme do Supremo Tribunal de Justiça aí citada.
[2] Neste sentido, Ac. STJ, de 12.07.2018, processo n.º 3312/16.8T8PRT.P1S1, www.dgsi.pt/jstj, e jurisprudência uniforme do STJ aí citada.