Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
7/16.6GIBJA.E1
Relator: MARIA FERNANDA PALMA
Descritores: PERDA DE OBJECTO DE TERCEIRO RELACIONADO COM O CRIME
VEÍCULO APREENDIDO
TRÁFICO DE DROGA
Data do Acordão: 04/04/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE
Sumário: I – Em matéria de perda de objectos a favor do Estado, o DL n.º 15/93, de 22-01, contém um regime especial em relação ao regime, geral, contido no artigo 178.º, n.º 7, do CPP;
II – Por isso, tendo o arguido sido condenado pela prática de um crime de tráfico de droga, p. e p. pelo artigo 21.º do referido DL, em relação à perda a favor do Estado do veículo aprendido no âmbito do processo deverá aplicar-se o regime previsto neste diploma legal;
III – O referido veículo deve ser declarado a perdido a favor do Estado por se apresentar como essencial para o desenvolvimento da actividade ilícita, face às distâncias entre as localidades envolvidas no tráfico em causa e a inexistência de uma rede de transportes públicos regulares que as una;
IV – A tal não obsta a circunstância do veículo ser propriedade do pai do arguido, tendo em conta que aquele se encontrava apreendido há cerca de 10 meses, pelo que a apreensão não podia ser desconhecida do interessado – na medida em que nesse período se encontrava privado da utilização do veículo – e nada requereu quanto ao exercício dos seus direitos quanto ao veículo, alegando e provando que estava de boa-fé face à sua utilização pelo arguido.
Decisão Texto Integral: Processo nº 7/16.6GIBJA.E1


Acordam, em conferência, os Juízes que constituem a secção criminal do Tribunal da Relação de Évora


No Processo Comum Coletivo nº 7/16.6GIBJA, da Secção Cível e Criminal - J2, da Instância Central de Beja, da Comarca de Beja, por acórdão de 30-11-2016, foi condenado o arguido BB, pela prática, como reincidente, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22/01, na pena de nove anos de prisão.
Mais, foi declarado perdido a favor do estado o veículo automóvel de matrícula …, para além dos demais objetos aludidos na parte decisória do acórdão proferido a fls. 467 a 490 dos autos.

Inconformado com o decidido, recorreu o arguido nos termos da sua motivação constante de fls. 507 a 515, pugnando para que seja condenado, tão só, pela prática de um crime p. e p. pelo artigo 25º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22/01, na pena de quatro anos de prisão, e ainda para que não seja declarado perdido a favor do Estado o veículo automóvel aludido, já que o mesmo é propriedade de seu pai, o qual não tem qualquer relação direta ou indireta com a sua atividade delituosa.
Conclui nos seguintes termos:
1o. - A douta sentença recorrida condenou o Arguido na pena de NOVE ANOS de prisão, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes p° p° pelo Art° 21, n° 1, do D.L. 15/93 e declarado perdi a favor do Estado o veículo matricula …;
2o. - O recurso reporta-se quanto à matéria de facto, quanto à qualificação jurídica do crime praticado pelo Arguido e á medida da pena;
3o. - A matéria de facto dada como provada não nos oferece qualquer juízo de censura de relevo, porque reproduz os factos provados em audiência e recolhida nos autos;
4o. - No entanto, a prova realizada, impunha inevitavelmente uma decisão diversa da ora Recorrida, termos em que o douto acórdão violou, por erro de interpretação o Art° 75 e 71° do CP e os Art° 21° e 25°, ambos do D.L. 15/93;
5o. - Tendo em conta as circunstâncias em que os factos ocorreram, entendemos que dimi­nuem consideravelmente a ilicitude do Arguido;
6o. - O Art° 25° pressupõe por referência ao tipo fundamental, que a ilicitude do facto se mostre “consideravelmente diminuída” em razão de circunstâncias específicas, mas obje­ctivas e factuais, verificadas na acção concreta, nomeadamente os meios utilizados pelo agente, a modalidade ou as circunstâncias da acção, e a qualidade ou a quantidade dos pro­dutos;
7o. - Os critérios de proporcionalidade que devem estar pressupostos na definição das penas constituem, também, um padrão de referência na densificação da noção, com alargados es­paços de indeterminação, de “considerável diminuição de ilicitude”;
8o. - As referências objectivas contidas no tipo para aferir da menor gravidade, situam-se nos meios: na modalidade ou circunstância da acção e na qualidade e quantidade das plantas;
9o. - A quantidade de droga é um dos factores determinantes de aferição da diminuição da ilicitude prevista no art° 25 do citado diploma. Não podemos esquecer o facto do art° 25° ter como fonte o art° 24° do DL. 430/83, sendo certo que o artigo actual é mais amplo e abrangente;
10°. - Na apreciação da quantidade detida deve apoiar-se em módulos do carácter quantita­tivo;
11°. — Como consta da matéria de facto dada como provada, o Recorrente negociou com OITO CONSUMIDORES, a que entregou 27 (VINTE E SETE) doses individuais de he­roína;
12°. - A actividade de venda decorreu durante cerca de SEIS MESES;
13°. - Considerando a quantidade de doses vendidas e período de vendas, temos de concluir que o Recorrente vendeu mensalmente cerca de CINCO DOSES de heroína e que corresponde a cerca de UMA DOSE por semana;
14°. - Por outro lado, a totalidade da heroína vendida ascende a cerca SEIS GRAMAS;
15°. - Em conclusão, as quantidades vendidas, regra geral uma dose de cada vez e a quan­tidade total de droga vendida são diminutas.
16°. - Considerando que o valor de cada dose ascendia a €: 10,00, o valor das vendas tota­lizam €:300,00;
17°. - Para se poder concluir que a ilicitude do facto se encontra consideravelmente diminui da, é certo que não releva unicamente a quantidade, mas ainda a sua qualidade, os meios utilizados, a modalidade e circunstâncias da acção - Ac. STJ-CJ-111-96, pág. 163;
18°. - O que verdadeiramente conta é a situação concreta individualizada, com todas as suas particularidades que varia de caso para caso;
19°. - O Arguido é toxicodependente e não resta qualquer sinal exterior de riqueza, que possa deduzir que o Arguido retirava grande proveito ilícitos da venda de droga;
20°. - No que respeita aos meios utilizados pelo Arguido estes eram escassos, porque as en trega era feitas a pé ou utilizando o veículo do pai do Arguido, não é titular de qualquer veí culo automóvel;
21°. - Sem qualquer margem para dúvida que a inexistência de uma estrutura oreanizativa e/ou a redução do acto ilícito a um único nesócio de rua sem recurso a qualquer técnica ou meio especial, dão uma matriz de simplicidade que, por alguma forma conflui com a gravidade do ílícito;
22°. - Deste modo, tais factos enquadram-se no vulgarmente designado "tráfico de rua”;
23°. - A jurisprudência do STJ dos últimos anos, tem vindo a alargar o campo de aplicação do aludido Art° 25° a tudo quanto seja pequeno tráfico, aos “dealers” ou "‘retalhistas’" de rua, sem ligações a quaisquer redes e quase sempre desprovidos de quaisquer organizações ou de meios logísticos, e sem acesso a grandes ou avultadas quantidades de droga;
24°. - Apesar do Arguido já ter sido alvo de três condenações pela prática de crimes de tráfi co de estupefacientes não impede da aplicação da qualificação mais favorável ao Arguido;
25°. - Pelo facto de já ter sido condenado anteriormente por outros factos da mesma nature­za o Arguido já é penalizado com a REINCIDÊNCIA e por consequência não pode ser du­plamente penalizado;
26°. - Em face do que acima fica exposto e à matéria de facto dada como provado o Aregui. do devia ser condenado pela prática, como reincidente, em autoria material de:
- um crime de tráfico de menor gravidade p. p. pelo Art° 25°, do Dec.Lei N° 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de QUATRO ANOS de prisão;
27°. - Finalmente entendemos que o veículo automóvel matricula … não deverá ser declarado perdido a favor do Estado;
28°. - A perda de objectos que tiverem servido para a prática de infracção relacionada com estupefacientes tem como fundamento a existência ou a preexistência de uma ligação fun­cional e instrumental entre o objecto e a infracção, de sorte que a prática desta tenha sido especificadamente conformada pela utilização do objecto;
29°. -Na especificação de execução dos diversos e amplos casos de factualidade típicas dos crimes ditos de “tráfico de estupefacientes” a possibilidade concreta e determinada, da utilização de certos objectos dependem muito do tipo de actuação que estiver em causa;
30°. - No entanto o Supremo Tribunal tem vindo a remeter para o princípio da proporciona­lidade. A perda do “instrumentum sceleris”, não estando submetida ao principio da culpa, terá de ser equacionada com o princípio da proporcionalidade relativamente á importância do facto - Cfr. Ac. STJ de 27.01.1998;
31°. - O veículo em causa é propriedade do pai do Arguido e aquele não tem qualquer rela­ção directa ou indirecta com a actividade ilícita do filho;
32°. - Deste modo, e fazendo apelo aos princípios da proporcionalidade, adequação e exigibilidade, entendemos que o veículo não deve ser declarado perdido a favor do Estado.

O Ministério Público respondeu, nos termos que constam de fls. 526 a 533 dos autos, concluindo nos seguintes termos:
1. Quanto ao enquadramento jurídico dos factos provados, o Ministério Público entende que a actuação do recorrente foi bem reconduzida ao tipo de tráfico de estupefacientes do artigo 21.°, n.° 1, do Decreto-Lei n.° 15/93, de 22 de Janeiro, mas concede que uma ponderação crite­riosa das circunstâncias atinentes à culpabilidade, à ilicitude e às exigências de prevenção que se destacam no caso concreto possa conduzir à redução da medida concreta da pena de prisão para os 7 (sete) anos e 6 (seis) meses.
2. Quanto à declaração de perda a favor do Estado do veículo Renault 19 com a matrícula …, o Ministério Público entende que o douto acórdão deve ser revogado para que se proceda à audição do respectivo proprietário em conformidade com o disposto no artigo 178.°, n.° 7, do Código de Processo Penal.

Neste Tribunal da Relação de Évora, a Exmª Procuradora-Geral adjunta emitiu o seu parecer, este inteiramente concordante com a posição assumida pelo Ministério Público na 1ª Instância.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir:

Como o âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões formuladas pelos recorrentes nas respectivas motivações de recurso, nos termos preceituados nos artigos 403º, nº 1 e 412º, nº 1, ambos do Código de Processo Penal, podendo o Tribunal de recurso conhecer de quaisquer questões de que pudesse conhecer a decisão recorrida, cumprindo cingir-se, no entanto, ao objecto do recurso, e, ainda, dos vícios referidos no artigo 410º do referido Código de Processo Penal, - v. Ac. do Plenário das Secções Criminais do Supremo Tribunal de Justiça nº 7/95 de 19 de Outubro - vejamos, pois, se assiste razão ao arguido recorrente no que respeita às questões que suscitou nas conclusões do presente recurso, quais sejam:
- A subsunção legal da conduta;
- A medida concreta da pena;
- A declaração de perdimento do veículo a favor do Estado.

Está em causa a seguinte matéria de facto apurada;

Como forma de obter proventos financeiros o arguido BB, que utiliza também a alcunha de "…”, dedicou-se, desde data concretamente não apurada, mas pelo menos desde Janeiro de 2016 até 17 de Junho de 2016, dia em que foi detido, à compra e posterior revenda de produto estupefaciente, nomeadamente de cocaína, heroína e de cannabis, a outros indivíduos consumidores desta substância, o que efectua na localidade de ….
Na concretização de tal propósito, o arguido BB adquiria produtos estupefacientes a pessoa ou pessoas cuja identidade se desconhece, deslocando-se para o efeito, com regularidade à localidade de Sines, ao Bairro da …, no veículo de marca Renault com a matrícula ….
Após, o arguido contactava e era contactado, pessoalmente e através dos seus telemóveis, por consumidores de cocaína, heroína e de cannabis, os quais lhe solicitam a entrega destes produtos em doses individuais, sendo que o arguido acordava com eles o preço e a quantidade do produto, bem como o local da sua entrega, que ocorre nas localidades de …,… e….
Nas combinações prévias efectuadas por contacto telefónico, o arguido utilizava os telemóveis de marca Alcatel, com o IMEI nº … e Sony, com o IMEI nº ...
Ciente da natureza ilícita da sua actividade, quando o arguido estabelecia contactos com consumidores que lhe solicitavam a venda de tais substância, nomeadamente utilizando os aludidos telemóveis, aplicava grande cuidado na linguagem, utilizando palavras e expressões de código, utilizando designadamente a palavra "cervejas” para se referir aos produtos estupefacientes.
O arguido utilizava ainda o veículo automóvel de marca Renault, modelo 19, com a matrícula …, para transportar o produto estupefaciente e se deslocar junto dos consumidores.
De facto, nas circunstâncias descritas e no período supra descrito, além de outros consumidores não identificados, o arguido vendeu/cedeu produtos estupefacientes a:
a) CC, a quem entregou, em pelo menos 3 ocasiões, uma dose de heroína, ao preço de €10,00 a dose, tendo a última venda ocorrido no dia 17 de Abril de 2016, junto ao Barranco do Vale Douro.
b) DD, a quem entregou, em pelo menos 4 ocasiões, um pacote de heroína, ao preço de €10,00 por pacote, tendo a ultima venda ocorrido no dia 19 de Maio de 2016, cerca das llh20m, junto à residência do arguido.
c) EE, a quem entregou, em pelo menos duas ocasiões, localizadas entre Fevereiro e Junho de 2016, pacotes de heroína, ao preço de €10,00 euros por pacote;
d) FF, a quem entregou, em pelo menos duas ocasiões, pacotes de heroína, ao preço de €10,00 por pacote.
e) GG, a quem entregou, em pelo menos quatro ocasiões, localizadas entre Abril e Junho de 2016, pacotes de heroína, ao preço de €10,00 por pacote, tendo a última ocorreu no fim-de-semana de 11 e 12 do mês de Junho de 2016;
f) HH, a quem entregou, Janeiro de 2016 e Maio de 2016, pelo menos um pacote de heroína por mês, ao preço de €10,00 por pacote, fazendo tais entregas junto às piscinas municipais e junto do cemitério de …;
g) II, a quem entregou, em duas ocasiões, localizadas no final do mês de Maio e início do mês de Junho, quatro pacotes de heroína, ao preço de €10,00 por pacote, o que fez sempre junto a umas oliveiras, na localidade de …, em …, destinando-se o produto estupefaciente a ser consumido por JJ, companheiro de II;
h) LL, a quem entregou, pelo menos desde Maio de 2016, por várias vezes, pacotes de heroína, ao preço de €10,00 por pacote.
No exercício de tal actividade, o arguido BB, no dia 17 de Junho de 2016, pelas 11 horas e 35 minutos, na Estrada Municipal 526, km 8,50, tinha na sua posse, no interior do veículo de marca Renault, modelo 19, com a matrícula …:
a) um ovo de plástico, que se encontrava sobre o banco de passageiro da frente do veículo, contendo no seu interior 8 pacotes de reduzidas dimensões de Heroína, com o peso líquido total de l,558gr, com um grau de pureza de 12,3% e correspondia a 1 doses diária individuais, calculadas segundo a Portaria nº 94/96, de 26 de Março.
c) 10 notas de €10,00 e 2 notas de €20,00, no total de €140,00 (cento e quarenta euros), que estavam guardadas no interior da carteira do arguido, quantia que lhe havia sido entregue por diversos consumidores, como preço da venda de produtos estupefacientes.
Neste mesmo dia 17 de Junho de 2016, pelas 12h45, o arguido BB, detinha no interior da sua residência sita na Rua …;
a) No interior do seu quarto:
i) uma faca de pequenas dimensões, de cor cinzenta, habitualmente utilizada pelo arguido para cortar a substância estupefaciente;
ii) um pedaço de Cannabis (resina)/ Haxixe, com o peso líquido de 8,048gr, que estava colocado em cima de uma estante, com um grau de pureza de 18% (THC) e que correspondia a 28 doses diárias individuais, calculadas segundo a Portaria n.2 94/96, de 26 de Março.
b) Na sala;
i) uma balança de cor cinzenta, de marca e modelo "Diamond model 100”, que se encontrava sobre uma mesa;
ii) uma faca de médias dimensões, de cor cinzenta, com vestígios de produto estupefaciente na lâmina;
iii) dois recortes de plástico que se encontravam colocados em cima da mesa da sala;
iv) uma tesoura, utilizada para cortar os recortes de plástico, que se encontrava em cima da mesa da sala;
v) um rolo de plástico e um plástico mais pequeno, que se encontravam em cima do sofá da sala, utilizados para o acondicionamento de estupefacientes;
c) Na cozinha, no interior de um pote de barro localizado junto à chaminé:
i) um saco de plástico contendo Heroína, com o peso líquido de 18,476gr, com um grau de pureza de 8% e correspondia a 14 doses diária individuais, calculadas segundo a Portaria n.9 94/96, de 26 de Março.
ii) um saco de plástico contendo Cocaína (cloridratro), com o peso líquido de 0,645gr, com um grau de pureza de 74,6% e correspondia a 2 doses diárias individuais, calculadas segundo a Portaria nº 94/96, de 26 de Março.
O arguido transportava consigo e detinha na sua posse sem que para tal estivesse autorizado os produtos estupefacientes referidos.
O arguido conhecia a natureza e as características estupefacientes das substâncias que detinha destinando-as, designadamente a heroína, à entrega, a troco de dinheiro e outros valores, a todos os indivíduos que as quisessem adquirir.
O arguido BB conhecia a natureza e as características das substâncias estupefacientes que detinha e cedia a terceiros, sabendo tratar-se de heroína, cocaína e canábis, estando ciente de que a sua aquisição, detenção ou cedência a terceiros lhe estava vedada por lei.
Conhecia ainda os efeitos nefastos na saúde humana dos produtos estupefacientes detidos, vendidos ou de qualquer forma cedidos.
O arguido agiu, assim, deliberada, voluntária, livre, e conscientemente.
Por decisão proferida no âmbito do processo n.9 13/08.4GJBJA do Tribunal Judicial de Ferreira do Alentejo, transitada em julgado no dia 26.10.2009, foi o arguido condenado pela prática, em 17.11.2008, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.9 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 6 anos e 6 meses de prisão.
No âmbito do processo de liberdade condicional n.º 123/11.0TXEVR-B do Tribunal de Execução de Penas de Évora e relativamente à pena em que foi condenado no processo supra referido, foi concedida ao arguido a liberdade condicional entre 12.09.2015, data em que foi libertado e 12.10.2016, data em que terminaria o cumprimento da descrita pena.
A decisão descrita no ponto que antecede impôs ao arguido as seguintes obrigações: "a) Fixar residência, que não poderá alterar por prazo superior a 5 (cinco) dias, sem prévia autorização deste Tribunal de Execução das Penas, na Rua …..
b) Apresentar-se a técnico da Equipa do Baixo Alentejo da Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (sedeada na Rua Eça de Queirós, n° 16, Beja] no prazo de 8 dias contados da sua libertação e, aceitando a tutela daquele, cumprir as ordens e recomendações que lhe vierem a ser transmitidas;
c) Manter bom comportamento moral, social e cívico e dedicar-se ao trabalho ou outra actividade que o técnico dos serviços de reinserção social indique, fazendo-o deforma regular e honesta, sem praticar infracções/crimes;
d) Caso nisso consinta (para o que se deverá colher o seu consentimento expresso), comparecer em consulta de avaliação no Centro de Respostas Integradas (CRI) da sua zona de residência, seguindo eventual o plano psico-terapêutico que lhe vier a ser determinado tendo em vista prevenir recaídas no consumo de estupefacientes;
e) Não acompanhar com pessoas referenciadas pela prática de actos ilícitos (designadamente tráfico e consumo de produtos estupefacientes) e/ou que, de algum modo, possam contribuir para neutralizar os efeitos da ressocialização e de prevenção especial que a liberdade condicional visa salvaguardar."
Além do processo referido, o arguido BB foi ainda condenado:
a - por decisão proferida no âmbito do processo n.º 33/99.8GAFAL (anterior processo comum colectivo nº 85/1999, do Tribunal Judicial de Ferreira do Alentejo, datada de 31.01.2000, pela prática, no dia 9.3.1999, de um crime de tráfico de menor gravidade, previsto e punido pelos artigos 21º, nº 1 e 25º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 18 meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 3 anos, com a obrigação de continuar com o tratamento.
b - por decisão proferida no âmbito do processo n.º 24/03.6TAFAL, do Tribunal Judicial de Ferreira do Alentejo, transitada em julgado no dia 30.10.2003, pela prática, no dia 28.12.2002, de um crime de desobediência qualificada, previsto e punido pelo artigo 348.º, nº 2 do Código Penal, na pena de 120 dias de multa à taxa diária de €3.
c - por decisão proferida no âmbito do processo nº 333/02.1GTBJA, do Juízo do Tribunal Judicial de Beja, transitada em julgado no dia 30.10.2003, pela prática, no dia 27.12.2002, de 4 crimes de desobediência qualificada, previsto e punido pelo artigo 348.º, n.º 2 do Código Penal, na pena parcelar de 3 meses por cada crime e, em cúmulo jurídico, na pena única de 7 meses, suspensa na sua execução pelo período de 2 anos.
d - por decisão proferida no âmbito do processo nº 1/05.2GABJA, do Tribunal Judicial de Ferreira do Alentejo, transitada em julgado no dia 13.03.2006, pela prática, em 22.2.2005, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão.
As condenações sofridas pelo arguido, designadamente nos processo nº 1/05.2GABJA e 13/08.4GIBJA, e o facto de, desde 12 de Setembro de 2015 se encontrar em liberdade condicional, não lhe serviram de suficiente advertência contra o crime, não o determinando a inibir-se de praticar novos crimes, quando devia e podia manter uma conduta lícita.
Mais se provou relativamente ao arguido:
Realizado relatório social pelos serviços da DGRSP, do mesmo consta:
- Dados relevantes do processo de socialização
Natural de …, o desenvolvimento de BB ocorreu em contexto familiar baseado na entreajuda, embora com défice ao nível da supervisão parental.
O seu percurso escolar terá sido marcado pelo insucesso, com desinteresse pelo processo de aprendizagem, o qual viria ainda a ser condicionado pelo contacto com precoce com as drogas. Viria posteriormente e ao longo dos anos a concluir outros graus de ensino, nomeadamente no decurso de cumprimento de penas de prisão, tendo frequentado por último formação para adultos, por módulos, para conclusão do 12º ano que não chegou a completar.
Consumidor de heroína e cocaína desde os 11 anos de idade, fez múltiplas tentativas de tratamento e internamento para desintoxicação e/ou programa em comunidade terapêutica, embora com recaídas frequentes. Também permaneceu integrado em programa de substituição com metadona, que retomou depois de ser preso.
Tem dois filhos, já de maioridade, fruto de relacionamento anterior; tendo ocorrido, contudo, algum afastamento relacional com os mesmos, face aos períodos em que permaneceu preso em cumprimento de pena de prisão. Tendo sido preso pela primeira vez em 1999, conta depois com mais duas penas de prisão cumpridas, sempre associadas ao crime de tráfico de estupefacientes, tendo evidenciado em anteriores momentos dificuldades no cumprimento de medidas probatórias, nomeadamente da liberdade condicional.
A sua vida laboral, caracterizada pela instabilidade, processou-se essencialmente, enquanto trabalhador indiferenciado, nos setores da construção civil, agricultura e com maior incidência como motorista.
II - Condições sociais e pessoais
Anteriormente à sua prisão, BB residia sozinho num anexo à casa dos pais em … e não mantinha qualquer atividade laboral/ocupacional. A vivência familiar era pautada por um distanciamento no relacionamento diário entre os vários elementos.
O arguido mantinha um padrão de consumo de drogas, que relaciona com a instabilidade pessoal que tem vivido nos últimos anos e que tem, na sua perspetiva, potenciado o seu envolvimento em ilícitos. O seu quotidiano era assim centrado no convívio com outros elementos com percursos similares num estilo de vida marcado pela ociosidade.
BB, aparenta ser um indivíduo que genericamente é sociável e respeitador, embora apresentando reincidentemente comportamentos desajustados, que estão sobretudo associados ao consumo abusivo de drogas.
Da informação disponível, resulta que nos seus planos de futuro ou compromissos pessoais e sociais, conta com a ajuda da família aquando da saída em liberdade. Pretende, contudo agora, iniciar processo de recuperação á toxicodependência que possa ter continuidade em meio livre com o internamento e permanência em comunidade terapêutica.
O seu processo de reinserção social, poderá assim estar menos condicionado, caso o arguido prossiga com a intenção em cumprir um programa terapêutico em regime de internamento, uma vez que alternativas socialmente mais adaptadas e fora do meio de residência habitual, poderão impulsionar favoravelmente os seus projetos de vida.
III - Impacto da situação jurídico-penal
Da análise efetuada ao nível do seu percurso de vida anterior, consideramos que o arguido não denota capacidade de avaliação do desvalor das suas condutas criminais, bem como não denota consciência crítica no que concerne ao crime de que está agora acusado. Assume os factos, mas refere simultaneamente que "não vendia droga a jovens", na tentativa de minimizar o impacto do crime, desculpabilizando-se com a sua própria toxicodependência.
Em meio prisional, regista uma adaptação positiva às regras instituídas, tendo-se desvinculado, por ora, do consumo de drogas, encontrando-se integrado no programa de substituição com metadona.
Não mantém qualquer atividade laboral ou formativa, ocupando o tempo a jogar cartas, ouvir música e a ver televisão.
IV - Conclusão
Face ao exposto, afigura-se-nos que não obstante BB, registar em meio prisional, esforços no sentido da sua desvinculação aditiva, mantém-se ainda muito presente ao nível das necessidades de reinserção social e enquanto fatores de risco, o já longo percurso criminal e de toxicodependência, bem como o risco associado ao relacionamento com pares anti-sociais na zona de residência habitual.
Revelando uma atitude pouco crítica relativamente ao seu comportamento anterior e evidenciando ténues sinais de capacidade para a mudança ao nível dos seus hábitos de vida e preocupação na preparação das suas condições de reinserção social, o interesse manifestado pela eventual adesão em meio livre a programa de tratamento em comunidade terapêutica surge nesta fase como único fator de proteção a considerar.
Deste modo e face ás múltiplas necessidades de reinserção, perceciona-se como fundamental que, em meio prisional, o arguido dê inicio à primeira fase do seu processo de autonomização pessoal e económico, nomeadamente com a continuidade de frequência escolar e posteriormente de formação profissional, bem como consolidação da abstinência do consumo de drogas, permitindo que possa organizar de forma estruturada e gradual a sua readaptação ao meio livre, com eventual posterior encaminhamento para comunidade terapêutica".
Além das condenações já referidas, nada mais consta do CRC do arguido.
Não se provou que:
O arguido exercia a actividade de tráfico como forma de prover ao seu sustento e dispor de dinheiro para todas as suas despesas.
O arguido cedeu, em pelo menos 2 ocasiões, heroína de forma gratuita a …;
O arguido vendia estupefacientes desde Outubro de 2015.

Vejamos, então, as questões que se nos suscitam:

Entende o arguido, ora recorrente, que deveria de ter sido condenado, tão só, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade, a que alude o artigo 25º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22/01, na pena de quatro anos de prisão.
A condenação de um agente pela prática deste tipo de crime atenuado de tráfico de estupefacientes, já que o próprio tipo remete para as condutas base a que aludem os artigos 21º e 22 do mesmo Decreto-Lei nº 15/93 de 22/01, influi consideravelmente ao nível da pena a aplicar, diminuindo-a, conforme consta das alíneas a) e b) do mesmo preceito legal.
Assim, para que este benefício seja concedido ao agente, é necessário que:
a - A ilicitude do facto se mostre consideravelmente diminuída, sendo que esta consideração depende, nomeadamente:
- dos meios utilizados;
- da modalidade ou das circunstâncias da acção;
- da qualidade ou da quantidade de plantas, substâncias ou preparações.
No caso em apreço, atenta a matéria de facto apurada, a qual não é posta em causa pelo arguido, ora recorrente, temos que o mesmo se comportou como um vulgar vendedor de “rua” de substâncias estupefacientes.
Com efeito, ao longo de cerca de seis meses, comprou heroína, cocaína e cannabis na zona de Sines, vendendo estes produtos, depois, em doses para consumo individual, nas zonas de …, … e …, a consumidores que o contactavam para esse efeito.
A sua atitude é a típica da venda de drogas aos consumidores, sendo que é através de atuações desta natureza que a droga chega habitualmente aos mesmos, com toda a panóplia de consequências negativas que são conhecidas, quer para os próprios, quer para as respetivas famílias, sem falar em toda a criminalidade conexa.
Daí a extrema gravidade social deste tipo de conduta.
É certo que o arguido vendia de cada vez pequenas doses, quer de heroína, quer de cocaína, quer de cannabis; porém estas doses eram as necessárias para que os respetivos consumidores mantivessem os seus consumos de substâncias estupefacientes.
E não nos restam dúvidas sobre a atuação do arguido, quer atento o encontrado no veículo em que o mesmo se fazia transportar, quer atento o que foi apreendido na sua residência.
Portanto, as quantidades de drogas apreendidas, e as que são descritas como fornecidas, se bem que pequenas, não possuem especial relevância, atento o período temporal em que o arguido as ia fornecendo aos consumidores que o procuravam para a dita aquisição.
A circunstância do arguido se fazer transportar num veículo automóvel também lhe facilitava substancialmente a sua conduta delituosa, atentas as distâncias entre o local de aquisição das drogas e os diversos locais do seu fornecimento aos consumidores.
Haverá que atender, ainda, que só com a utilização de veículo automóvel era possível o dito fornecimento em tempo útil e condizente com as necessidades dos consumidores, porquanto entre as diversas localidades referidas inexistem transportes públicos frequentes.
Além de tudo o mais, também estão em causa fornecimentos aos consumidores de heroína e cocaína, estas ditas drogas “duras”, as quais, para além da dependência psíquica, também causam dependência física, e daí a sua maior perigosidade.
Pelo exposto, entende-se que a ilicitude da conduta do arguido não se mostra consideravelmente diminuída, a daí não se justificar a subsunção da mesma, tão só, à previsão do artigo 25º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22/01.
Por outro lado, estamos perante um reincidente, o que não foi posto em causa pelo mesmo no recurso ora interposto, e assim sendo, como bem diz o acórdão recorrido, a pena a aplicar situa-se entre os 5 anos e 4 meses e os 12 anos de prisão.

O arguido foi condenado em 1ª Instância na pena de nove anos de prisão, pela prática, como reincidente, de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22/01.
Entende o Ministério Público que tal pena deve ser reduzida a sete anos e seis meses de prisão.
Sobre as vantagens e inconvenientes desta pena principal de privação da liberdade pronunciou-se o Professor Figueiredo Dias, in Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, pgs. 112 e 113, nos seguintes termos:
“Vantagens só podem ser divisadas, na verdade, - se abstrairmos de um ponto de vista «metafísico»-retributivo ultrapassado, que encontraria na privação de liberdade o mal por excelência, capaz de compensar o mal do crime – na circunstância de corresponder ainda hoje ao sentimento generalizado da comunidade a convicção de que, ainda em muitos casos criminais, a privação de liberdade é o único meio adequado de estabilização contrafáctica das suas expectativas, abaladas pelo crime, na vigência da norma violada, podendo ao mesmo tempo servir a socialização do transgressor.
Na outra vertente, porém, os inconvenientes da pena privativa da liberdade residem desde logo – e mesmo no que respeita à adequação à culpa – em que a privação da liberdade pode representar (e representará muitas vezes) um peso diferente consoante a personalidade de quem a sofre, sem que essa diferente «sensibilidade à privação da liberdade» possa ser adequadamente levada em conta na medida da pena. Acresce que a tentativa de socialização em que, como vimos, deve traduzir-se a execução da pena é declaradamente contrariada - e, nesta aceção, mais que «compensada» - pela forçosa dissocialização derivada do corte das relações familiares e profissionais do condenado, do efeito da infâmia social que inevitavelmente se liga à entrada na prisão e ainda, na maioria dos casos, da inserção daquele na subcultura prisional, em sim mesma criminógena. E a estes inconvenientes se ligam ainda, num plano diferente, os altíssimos – e às vezes insuportáveis – custos financeiros públicos do sistema. Todo este conjunto de inconvenientes vincula estritamente os legisladores e os aplicadores a usarem da pena privativa de liberdade apenas como extrema ratio da política criminal.”
Muito embora o lapso de tempo entretanto decorrido, o juízo exposto, na sua essência, não perdeu a sua atualidade, concordando-se com o teor do mesmo.
No caso em apreço, é manifesto que a advertência da anterior condenação pela prática de crime de idêntica natureza não surtiu o seu efeito desejado, já que o arguido voltou a delinquir.
Acresce, que o arguido não possui qualquer atividade laboral ou formativa, não cumprindo, portanto, as obrigações decorrentes da liberdade condicional de que gozava.
Por outro lado, também é um consumidor de substâncias estupefacientes, consumo com o qual se debate desde tenra idade.
Assim, se por um lado a sua culpa se afigura diminuída, dado o normal amolecimento da sua vontade, por outro, aparece agravada, já que nos encontramos perante um indivíduo mais vulnerável socialmente.
No entanto, qualquer pena de prisão, obedecendo, como é devido, aos critérios constantes dos artigos 40º e 71º do Código Penal, não deve ser de tal forma elevada que cause no visado e na sociedade em geral um sentimento de revolta, pela dureza e desumanidade que eventualmente apresente.
Como tal, no caso em apreço, temos por adequado baixar a pena aplicada ao arguido, fixando-a em oito anos de prisão.

No que respeita à declaração de perdimento a favor do Estado do veículo automóvel com a matrícula …, considera-se o seguinte:
Atento o disposto no artigo 35º do Decreto-Lei nº 15/93, de 2/01, “São declarados perdidos a favor do Estado os objetos que tiverem servido ou estivessem destinados a servir para a prática de uma infração prevista no presente diploma ou que por esta tiverem sido produzidos”.
Por outro lado, tratando-se de um veículo automóvel, o qual poderá ser utilizado como vulgar meio de transporte, em qualquer situação, portanto, num meio completamente alheio ao do tráfico de droga, exige-se para a sua declaração de perdimento a favor do Estado que este tenha sido utilizado no dito tráfico de droga de uma forma muito próxima e de molde a facilitá-lo, isto é, que se apresente como um meio essencial a prossecução desse mesmo tráfico.
No caso em apreço, e pelo que ficou dito, dadas as distâncias entre as localidades envolvidas no tráfico em causa, e dada a inexistência de uma rede de transportes públicos regulares que as una, o veículo automóvel apresentou-se como essencial para que fosse levada a bom porto esta atividade ilícita.
E assim sendo, mostra-se plenamente justificada a sua declaração de perdimento a favor do Estado.
Porém, como o alega o recorrente, e consta do auto de apreensão do veículo a fls. 88 a 90, o mesmo é pertença do pai do arguido, o qual não terá qualquer relação com a atividade delituosa do seu filho.
Ora, genericamente, o artigo 178º, nº 7, do Código de Processo Penal, estabelece que: “Se os objetos apreendidos forem suscetíveis de ser declarados perdidos a favor do Estado e não pertencerem ao arguido, a autoridade judiciária ordena a presença do interessado e ouve-o”, sendo que prescinde da presença do mesmo quando esta não for possível”.
A lei pretende evitar que alguém, sem mais, se veja privado do seu património, sem possibilidade de reagir.
Porém, neste caso concreto, a apreensão ocorreu já em 17-06-2016, portanto, há quase dez meses, pelo que a mesma não pode ser desconhecida do interessado.
O citado artigo 178º aplicar-se-á à generalidade das situações, como já se referiu.
Porém, e independentemente de anterior posição tomada nesta mesma Relação, entende-se que relativamente a determinados objetos apreendidos em processo penal a lei estabelece um regime especial, como o ensina Maia Gonçalves in Código de Processo Penal, 10ª edição, fls. 390 e 393, onde se refere “Quanto a apreensão de drogas regula hoje o Dec-Lei nº 15/93, de 22/01, que revogou a regulamentação anterior, (...). Aquele diploma preceitua nos artigos 35º a 39º sobre perda de substâncias e objetos, bens transformados, convertidos ou misturados, lucros ou benefícios, e respetivo destino.”
Ora, o artigo 36º -A do citado Decreto-Lei nº 15/93, de 22/01, estabelece os trâmites de um incidente autuado por apenso, da iniciativa do terceiro de boa-fé, no qual este pode fazer valer no processo os seus direitos relativamente a bens apreendidos, alegando e provando essa mesma boa-fé.
Temos, assim, uma lei especial a regular estes casos concretos, esta distinta da lei geral contida no citado artigo 178º, nº 7, do Código de Processo Penal.
E não se pode dizer que os direitos de terceiros não são devidamente acautelados, pois que estes não podem deixar de ter conhecimento da apreensão dos seus bens, já que se vêm privados da sua utilização.
Acresce, que todas as atuações no teatro do tráfico de drogas adquirem contornos muito específicos, os quais justificam plenamente a aplicação de normas especiais, sobre pena da lei geral não surtir o efeito desejado no seu combate.
Assim sendo, e como o dono de veículo apreendido nada veio requerer, mantém-se a declaração de perdimento do mesmo.

Assim, e pelo exposto, acordam os Juízes que constituem a secção criminal do Tribunal da Relação de Évora, em conceder parcial provimento ao recurso, fixando a pena aplicada ao arguido em oito anos de prisão, e mantendo, quanto ao mais, o acórdão recorrido.
Sem tributação.

Évora, 04 de Abril de 2017
Maria Fernanda Palma (relatora)
Maria Isabel Duarte