Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1199/18.5T8BJA-A.E1
Relator: MÁRIO BRANCO COELHO
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
REVISÃO DA INCAPACIDADE
PROVA PERICIAL
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
FORÇA VINCULATIVA
FIXAÇÃO DA INCAPACIDADE
Data do Acordão: 07/10/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA A SENTENÇA RECORRIDA
Área Temática: SOCIAL
Sumário: Sumário:
1. O incidente de revisão de incapacidade pode ser accionado pelo responsável pelo pagamento da prestação, mas este deve alegar e provar uma melhoria da lesão ou da doença que deu origem à lesão, de modo a poder obter a redução ou extinção da prestação anteriormente fixada.
2. Está em causa um facto novo, modificativo da capacidade de trabalho ou de ganho, e daí que importe averiguar se esse novo facto efectivamente ocorreu e em que medida.
3. A prova realizada neste tipo de incidentes é essencialmente pericial (perícia médica singular ou por junta médica), tanto mais que estão em apreciação factos para os quais são necessários conhecimentos especiais, nomeadamente de carácter médico, que os julgadores não possuem.
4. Porém, o juiz não fica limitado ao parecer médico, podendo efectuar quaisquer diligências que se mostrem necessárias, e visto que o incidente corre no apenso para fixação da incapacidade, deve ponderar todo o manancial probatório já aí recolhido.
5. Não pode ser retirada a IPATH anteriormente arbitrada, se não estiver demonstrado que ocorreu uma efectiva melhoria da situação de facto que anteriormente determinou a atribuição daquela incapacidade.
6. Nomeadamente, tendo sido anteriormente apurado que o sinistrado estava incapacitado para a sua profissão habitual de motorista de pesados, não se pode concluir que readquiriu a capacidade necessária ao desempenho dessa profissão, se apenas está demonstrado que, após a alta, conduziu veículos ligeiros, durante um determinado período, e continua mesmo assim a apresentar limitações nessas novas funções.
Decisão Texto Integral:





Acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:

No Juízo do Trabalho de Beja, foi participado acidente de trabalho ocorrido em 13.12.2017 a AA, quando exercia as funções de motorista de pesados e distribuidor, por conta e sob a direcção de Transportes (…), Lda., estando parte da retribuição transferida para Generali Seguros, S.A..
A sentença decidiu fixar ao sinistrado uma IPP de 5,94%, desde a data da alta (25.06.2018), com IPATH.
Interposto recurso, esta Relação de Évora, por Acórdão de 30.06.2021, transitado em julgado, decidiu confirmar a sentença.

Em 29.04.2024, a Seguradora requereu a revisão da incapacidade, alegando que o sinistrado sofreu melhorias no seu estado de saúde e pode desempenhar a sua actividade profissional de motorista de pesados.
No exame médico singular, o perito médico declarou que o sinistrado mantinha a mesma situação clínica e a mesma incapacidade.
A Seguradora requereu a realização de junta médica, e do respectivo auto de exame consta o seguinte:
“A junta médica após consulta dos Autos e observação do examinando, responde aos quesitos por unanimidade:
Masculino, 61 anos motorista de pesados, após a alta conduziu carrinhas ligeiras e actualmente no desemprego desde Março de 2022. Dia 13-11-2017 tratado cirurgicamente e teve alta em 25-06-2018 com IPP de 5,94%, tem queixas de dores no tornozelo associadas à cicatriz bimaleolar do tornozelo direito, nesta data já não tem rigidez das mobilidades, pelo que não se pode dar a desvalorização por rigidez do tornozelo, sem dor á palpação. (…) Queixa-se de dificuldade em pressionar com o pé direito o acelerador e a embraiagem.”

Os quesitos formulados e a respectiva resposta pelos peritos médicos é a seguinte:
1.º Quais as sequelas que o sinistrado actualmente apresenta, em consequência do acidente ocorrido em 12/11/2017?
“1 - Tem duas cicatrizes no tornozelo direito, nesta data já não tem a rigidez das mobilidades do tornozelo, observadas nas anteriores avaliações por exames singulares e por junta médica.”
2.º Registou-se, desde a data da avaliação médico-legal realizada nos autos principais, uma melhoria das sequelas resultantes do acidente?
“2 - Sim.”
3.º Qual o grau de incapacidade (IPP) de que sofre o sinistrado actualmente?
“3 - IPP de 1,5%.”
4.º A alteração da IPP é resultado de melhoria das sequelas?
“4 - Sim. Melhorou a mobilidade do tornozelo e objectiva-se cicatrizes dolorosas.”
5.º Actualmente o sinistrado encontra-se capaz para o desempenho da actividade profissional que exercia na data do acidente, ainda que afectado pelas sequelas de que é portador, ou mantém-se em situação de IPATH?
6.º Caso o sinistrado esteja capaz para o desempenho da actividade profissional que exercia na data do acidente, ainda que afectado pelas sequelas de que é portador, a alteração dessa situação é resultado de melhoria das sequelas?
“5 e 6– Tendo em conta as sequelas actualmente observadas e em consonância com a resposta dada na junta médica de Fls. 124 e 125. As sequelas são apenas limitativas da profissão que desempenhava anteriormente na medida da sua IPP.”

A junta médica de fs. 124-125 é a que foi realizada na fase inicial do processo, em 04.02.2020, na qual os peritos médicos declararam que “as sequelas são apenas limitativas da profissão que desempenhava anteriormente”, não estando incapacitado para o trabalho habitual.
No entanto, face às conclusões constantes do parecer técnico solicitado ao IEFP, a sentença proferida na fase inicial e o Acórdão desta Relação de 30.06.2021 concluíram que o sinistrado se encontrava incapacitado para o seu trabalho habitual de motorista de pesados.
Nestas decisões, consta do elenco de factos provados, para além do mais, o seguinte:
“19. As funções que o autor exercia à data do acidente, enquanto motorista de veículos pesados de mercadorias, exigem subida e descida frequente da cabine (que dista cerca de 1 metro do chão); força ao nível do tronco, membros inferiores e superiores para subir e descer da caixa do veículo pesado e transportar a carga; força dinâmica ao nível dos membros inferiores para accionar os pedais do veículo pesado e agilidade motora para manobrar porta-paletes.
20. O Autor não consegue, com carácter diário, subir e descer do camião pesado, carregar no acelerador do camião pesado e movimentar cargas superiores a 30 kg.
21. Actualmente e após o acidente, o Autor conduz apenas veículos ligeiros de mercadorias e movimenta cargas leves.
(…)
23. Como resultado do acidente o autor padece de sequelas de rigidez dos movimentos do tornozelo direito, sequelas que o afectam de uma IPP de 5,94%, com IPATH, desde a data da alta clinica [decisão do apenso de fixação de incapacidade].”
Tendo sido impugnados os pontos 20 e 23 deste elenco fáctico, o Acórdão de 30.06.2021 decidiu confirmá-los, sob a seguinte fundamentação:
“Desde há muito que esta Secção Social vem entendendo, pacificamente, que a prova pericial é livremente apreciada pelo Tribunal e que não existe qualquer impedimento a que seja atribuída, justificadamente, maior força probatória a outros meios de prova carreados para os autos, nomeadamente ao parecer do IEFP .
Tal entendimento foi confirmado pelo recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Junho de 2021, proferido no processo n.º 3004/16.8T8FAR.E1.S1.
No vertente caso, é certo que a junta médica, unanimemente, considerou que as sequelas decorrentes do acidente apenas limitavam o exercício da profissão anteriormente desempenhada pelo sinistrado.
Para fundamentar esta opinião dos peritos, os mesmos tiveram em consideração, como decorre do auto de junta médica, as afirmações do sinistrado (“trabalho no mesmo local com serviços ligeiros”), as lesões/sequelas identificadas («Entorse grave da tibiotársica direita, com lesão de ligamento colateral, sendo sujeito a cirurgia, tendo ficado com sequelas de rigidez dos movimentos do tornozelo»), bem como a resposta que deram aos quesitos 2 e 3 em que afirmaram que o sinistrado consegue subir e descer de um veículo pesado de mercadorias e consegue carregar no acelerador de tal tipo de veículo.
Porém, no parecer técnico elaborado pelo IEFP, ao abrigo do artigo 21.º da Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro (LAT), concluiu-se que as limitações funcionais ao nível do membro inferior direito do sinistrado dificilmente são compatíveis com a actividade de condução de veículos pesados de mercadoria, em condições de segurança para si e para terceiros, assim como para a operação de um porta-paletes.
Mais se referiu que o desempenho da actividade exercida pelo trabalhador à data do acidente (motorista de pesados e distribuidor) implica mobilização, destreza e força dinâmica dos membros inferiores, bem como coordenação motora coxa-perna-pé e pé-pé. Explicou-se que tais exigências são necessárias para o controlo persistente e alternado na pressão dos pedais do travão e do acelerador, inerentes à condução em estrada e às manobras de parqueamento de um veículo pesado de mercadorias, assim como para subir e descer para a cabine e compartimento de carga do veículo e manobrar um porta-paletes.
Este parecer contém uma análise do posto de trabalho do sinistrado bem fundamentada e muito completa, e uma ponderação cuidadosa entre as sequelas e limitações físicas do sinistrado e as exigências do posto de trabalho que o mesmo ocupava aquando da verificação do acidente.
Acresce que consta da ficha de aptidão para o trabalho, junta pelo empregador, que o mesmo foi considerado “apto condicionalmente”, constando das observações que «deve evitar esforços físicos extremados a moderados, tais como carregar ou levantar pesos, de forma repetitiva e/ou prolongada. Deve evitar ortostatismo e trabalho sentado por períodos prolongados.»
Ora, conjugando os mencionados meios probatórios, dos mesmos não resultam divergências quanto à existência de sequelas funcionalmente limitadoras, ao nível do membro inferior direito do sinistrado.
Contudo, os peritos médicos não revelaram possuir um conhecimento profundo das concretas funções do posto de trabalho que o sinistrado tinha à data do acidente.
Já no relatório elaborado pelo IEFP procedeu-se a uma exaustiva análise do posto de trabalho e concluiu-se que as limitações físicas de que o sinistrado padece comprometem, com carácter permanente e absoluto, o exercício da sua profissão habitual.
Não poderia o tribunal a quo desprezar este importante meio probatório produzido (corroborado pela “ficha de aptidão para o trabalho”), que se sobrepõe à frágil perícia por junta médica, no que respeita à questão de saber se o sinistrado está ou não afectado de IPATH.
O parecer do IEFP constitui um meio probatório qualitativamente superior quanto a tal matéria.
Pelo exposto, entendemos que existe suporte probatório consistente para ter sido julgada provada a materialidade descrita nos pontos 20 e 23 dos factos assentes.”

A primeira instância decidiu julgar procedente o incidente de revisão de incapacidade, fixando ao sinistrado uma IPP de 1,5%, a partir da data de entrada do incidente.
Daí o recurso do sinistrado, patrocinado pelo Ministério Público, que conclui:
1. O sinistrado não se conforma com a sentença do presente incidente que decidiu fixar a sua incapacidade em 1,5% de IPP (que considera o factor de bonificação de 1,5) a partir da data da entrada do incidente de revisão (29/04/2024) omitindo a IPATH fixada.
2. Com efeito, nos autos com o n.º 1199/18.5T8BJA foi atribuída ao sinistrado uma incapacidade de 5,94% (IPP), desde a data da alta (25.06.2018), com IPATH, por sentença transitada em julgado e confirmada pelo TRE.
3. Tal decisão assentou nas exigências da profissão de motorista de um pesado de mercadorias, tendo o Tribunal formado a sua convicção no relatório do IEFP e que mereceu credibilidade em face das regras de experiência de vida.
4. Sucede que a Junta Médica a que o ora sinistrado foi submetido, reconheceu melhorias, atribuindo-lhe uma IPP de 1,5%, mas omitindo a IPATH, admitindo que as sequelas são limitativas da profissão que desempenhava, na medida da sua IPP, colocando em causa o teor da sentença proferida nos autos já transitada em julgado, que foi confirmada pelo Tribunal da Relação de Évora (1199/18.5T8BJA.E1), as quais reconhecem que o sinistrado está afectado por IPATH.
5. A douta sentença ora recorrida não ponderou o teor do relatório do IEFP, no qual se relata que as limitações do sinistrado se afiguram dificilmente compatíveis com a condução de veículos pesados de mercadorias e ignorou a que a Junta Médica não fundamentou como é que o sinistrado poderia voltar a desempenhar aquelas funções.
6. Na verdade, o sinistrado/Recorrente não sente melhorias, sentindo-se incapaz de voltar às suas funções.
7. A IPP de 5,94 % com IPATH fixada ao sinistrado nos autos principais resultou, ao abrigo do princípio da livre apreciação da prova, da conjugação de toda a prova produzida, onde se inclui o parecer do IEFP, cremos que a douta sentença ora proferida mal andou ao alterar a IPP e a IPATH fixada ao sinistrado tendo por base, apenas, a nova junta médica efectuada.
8. Pelo exposto, verifica-se omissão de pronúncia quanto aos motivos de ser retirada ao sinistrado a IPATH que lhe foi fixada por sentença transitada em julgado, o que configura nulidade, nos termos do art. 615.º, n.º1, als. d) do CPC.
9. Nulidade que expressamente se vem arguir, nos termos do disposto no art. 77.º do Cód. Proc. Trabalho e cuja declaração se requer, com as legais consequências.
10. Em consequência deve ser revogada a sentença proferida.

A Seguradora sustenta a manutenção do julgado.
Cumpre-nos decidir.
Os factos a ponderar na decisão do recurso são os constantes do relatório.

APLICANDO O DIREITO
Da revisão da incapacidade
De acordo com o art. 70.º n.º 1 da LAT – Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro – a prestação pode ser alterada ou extinta, quando se verifique uma modificação na capacidade de trabalho ou de ganho do sinistrado proveniente de agravamento, recidiva, recaída ou melhoria da lesão ou doença que deu origem à reparação, ou de intervenção clínica ou aplicação de ajudas técnicas e outros dispositivos técnicos de compensação das limitações funcionais ou ainda de reabilitação e reintegração profissional e readaptação ao trabalho.
Pode a revisão ser requerida pelo sinistrado ou pela responsável pelo pagamento da prestação (n.º 2), mas, no que a esta respeita, deve alegar e provar uma melhoria da lesão ou da doença que deu origem à lesão, de modo a poder obter a redução ou extinção da prestação anteriormente fixada.
Está em causa um facto novo, modificativo da capacidade de trabalho ou de ganho, e daí que importe averiguar se esse novo facto efectivamente ocorreu e em que medida.
Face ao art. 145.º do Código de Processo do Trabalho, a prova realizada neste tipo de incidentes é essencialmente pericial (perícia médica singular ou por junta médica), tanto mais que estão em apreciação factos para os quais são necessários conhecimentos especiais, nomeadamente de carácter médico, que os julgadores não possuem. Porém, “apesar de a resposta do perito assentar, por via de regra, em conhecimentos especiais que os julgadores não possuem, é ao tribunal, de harmonia com o prudente critério dos juízes, que se reconhece o poder de decidir sobre a realidade do facto a que a perícia se refere. Parte-se do princípio de que aos juízes não é inacessível controlo do raciocínio que conduz o perito à formulação do seu lado e de que lhes é de igual modo possível optar por um dos laudos ou afastar-se mesmo de todos eles, no caso frequente de divergência entre os peritos.”[1]
No âmbito do incidente, o juiz não fica limitado ao parecer médico, podendo efectuar quaisquer diligências que se mostrem necessárias – art. 145.º n.º 6 do Código de Processo do Trabalho – e visto que o incidente corre no apenso para fixação da incapacidade, pondera igualmente todo o manancial probatório já aí recolhido.
No caso, no incidente de revisão revelou-se a mesma tensão que já havia ocorrido aquando da fixação inicial da incapacidade – os peritos médicos continuam a entender que o sinistrado não está incapacitado para o seu trabalho habitual de motorista de pesados, como já haviam declarado anteriormente, mas nada de novo apresentam para contrariar a matéria de facto apurada nos pontos 19, 20 e 21 do Acórdão desta Relação de 30.06.2021, relativa à descrição das funções do sinistrado como motorista de pesados e distribuidor – subida e descida frequente da cabine (que dista cerca de 1 metro do chão); força ao nível do tronco, membros inferiores e superiores para subir e descer da caixa do veículo pesado e transportar a carga; força dinâmica ao nível dos membros inferiores para accionar os pedais do veículo pesado e agilidade motora para manobrar porta-paletes; impossibilidade de, com carácter diário, subir e descer do camião pesado, carregar no acelerador do camião pesado e movimentar cargas superiores a 30 kg; e após o acidente, o sinistrado apenas conduzir veículos ligeiros de mercadorias e movimentar cargas leves.
Na junta médica, os peritos afirmam que o sinistrado “após a alta conduziu carrinhas ligeiras e actualmente no desemprego desde Março de 2022” – ou seja, não conduziu pesados até Março de 2022, e essa era a sua profissão à data do acidente – e declaram que “tem queixas de dores no tornozelo associadas à cicatriz bimaleolar do tornozelo direito, nesta data já não tem rigidez das mobilidades”, “melhorou a mobilidade do tornozelo e objectiva-se cicatrizes dolorosas”, e “queixa-se de dificuldade em pressionar com o pé direito o acelerador e a embraiagem.”
Ponderando que o sinistrado não conduziu mais pesados – até Março de 2022 não o fez, depois dessa data ficou desempregado – as dores no tornozelo e a dificuldade constatada em pressionar com o pé direito o acelerador e a embraiagem revelam-se na condução de veículos ligeiros.
Tudo isto significa que o sinistrado revela limitações, desde logo, na condução de veículos ligeiros, e nada demonstra que tenha menores limitações da condução de veículos pesados e na distribuição de cargas superiores a 30 kg, tendo readquirido a capacidade de realizar essas funções.
A experiência comum não comprova que seja menos exigente fisicamente a condução de pesados que a de ligeiros, e certo é que o Acórdão desta Relação de 30.06.2021 considerou provado que o sinistrado estava impossibilitado de “com carácter diário, subir e descer do camião pesado, carregar no acelerador do camião pesado e movimentar cargas superiores a 30 kg”.
Tudo para concluir que os factos apurados pelos peritos médicos não demonstram que o sinistrado tenha readquirido a capacidade física necessária ao desempenho da profissão que desempenhava à data do acidente, de motorista de pesados e distribuidor, e ponderando o dever de livre apreciação da prova pericial – já declarado no Acórdão desta Relação de 30.06.2021 – somos a constatar que não está demonstrada a melhoria do sinistrado apta à retoma da sua profissão habitual à data do acidente, pelo que devemos acompanhar o parecer do perito médico singular, ao declarar que o sinistrado mantinha a mesma situação clínica e a mesma incapacidade (tanto mais que o tribunal não está obrigado a optar necessariamente pelo parecer formulado em junta médica, em detrimento do parecer médico singular, e muito menos quando verifica que aquele se fundou em factos não demonstrados nos autos).
Como tal, o incidente deve improceder.

Para terminar, o argumento do sinistrado, de nulidade da sentença por omissão de pronúncia quanto aos motivos de ser retirada a IPATH, não tem aqui cabimento: a pronúncia foi exercida, o que ocorre é mero erro de direito, mas essa é questão distinta.

DECISÃO
Destarte, concede-se provimento ao recurso, revoga-se a sentença recorrida e julga-se o pedido de revisão improcedente.
Valor do incidente: € 8.628,06 x 11,006 = € 94.960,43.
Custas pela Seguradora, na proporção da retribuição que lhe foi transferida (76,04%).

Évora, 10 de Julho de 2025

Mário Branco Coelho (relator)
Paula do Paço
Emília Ramos Costa



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[1] Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, in Manual de Processo Civil, 2.ª ed., 1985, pág. 583.