Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
952/22.0T8OLH.E1
Relator: ANTÓNIO FERNANDO MARQUES DA SILVA
Descritores: CONCLUSÕES
FACTOS
IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DE FACTO
DEMARCAÇÃO
Data do Acordão: 11/27/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO RECORRIDA
Área Temática: CÍVEL
Sumário: Sumário (da responsabilidade do relator - art. 663º n.º7 do CPC):

- a afirmação «O tanque que se situa junto ao limite nascente do prédio (…), encontra-se totalmente no interior do referido prédio» não tem natureza exclusivamente conclusiva ou valorativa, devendo valer como descrição de facto.


- na impugnação da decisão sobre a matéria de facto cabe ao impugnante indicar os meios de prova que impõem decisão diversa, pelo que, quando os meios de prova que o impugnante indica não sustentam a sua pretensão, tal pretensão decai, não cabendo ao tribunal de recurso avaliar todos os meios de prova produzidos para aferir a regularidade probatória do facto impugnado.

Decisão Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relação de Évora

I. AA e BB intentaram a presente acção contra CC, por si e na qualidade de cabeça-de-casal e herdeira na herança indivisa por óbito de DD, e contra os restantes herdeiros daquela herança, EE, FF e GG, e ainda HH e II, menores representados pela sua mãe, CC.


Formularam os seguintes pedidos:


«a)- Reconhecer que os AA. e os RR são proprietários do prédios rústicos inscritos na matriz sob os artigos 151 e 150 da secção “BC” da União de Freguesias de ..., concelho de ..., respectivamente, pelo que são partes legitimas na presente acção.;


b)- Concorrer para a demarcação das estremas do seu prédio com o prédio dos autores;


c) – Reconhecer que o prédio dos AA é demarcado de acordo com o definido no mapa cadastral (Direcção Geral do Território) e no levantamento topográfico anexado pelos AA;


d) – Reconhecer que o tanque e a arvore/alfarrobeira que a primeira R. deitou a baixo faz, e fazia, parte do prédio dos AA.;


c) - Restituir aos autores a área ocupada abusivamente.


d)- Condenar os RR. a abster-se de aceder ao prédio dos AA.».


Alegaram para tanto, no essencial, que:


- os AA. e os RR. são titulares de prédios confinantes, demarcados por marcos.


- a primeira R., alegando que a linha divisória não está correcta, começou a reclamar mais área para si.


- a partir dos limites do prédio dos AA., faz dele parte um tanque, que se situa no limite nascente desse prédio, local onde os prédios estavam separados por um valado.


- a sul desse tanque, no prédio dos AA, encontrava-se uma alfarrobeira.


- a primeira R. e o seu marido começaram a afirmar que o tanque e a alfarrobeira eram seus, e derrubaram a alfarrobeira e parte do valado.


GG apresentou contestação, com dedução de pretensão reconvencional. Tendo impugnado a versão dos AA. e alegado, em síntese, que efectuou levantamento topográfico a partir das coordenadas dos marcos e pontos de estrema, deduziu, com base nessa alegação, os seguintes pedidos reconvencionais:


«a) Os Autores/Reconvindos condenados a reconhecer que as parcelas 1 e 2 com a área total de 0,184000 ha faz parte do prédio rústico com artigo matricial 150, da seção BC, da união das freguesias de ..., concelho de ...;


b) Os Autores/Reconvindos condenados a reconhecer que o Réu é dono e legitimo proprietário, em comum e sem determinação de parte ou direito, das parcelas 1 e 2 com a área total de 0,184000 ha;


c) Os Autores/Reconvindos condenados a abster-se de praticar qualquer ato que impeça ou diminua o direito de propriedade do Réu/Reconvinte sobre as parcelas 1 e 2 com a área total de 0,184000 ha faz parte do prédio rústico com artigo matricial 150, da seção BC, da união das freguesias de ..., concelho de ....».


II apresentou contestação com dedução de pretensão reconvencional, em termos análogos aos de GG, formulando os seguintes pedidos reconvencionais:


«a) Os Autores/Reconvindos condenados a reconhecer que as parcelas 1 e 2 com a área total de 0,184000 ha faz parte do prédio rústico com artigo matricial 150, da seção BC, da união das freguesias de ..., concelho de ...;


b) Os Autores/Reconvindos condenados a reconhecer que o Réu é dono e legitimo proprietário, em comum e sem determinação de parte ou direito, das parcelas 1 e 2 com a área total de 0,184000 ha;


c) Os Autores/Reconvindos condenados a abster-se de praticar qualquer ato que impeça ou diminua o direito de propriedade do Réu/Reconvinte sobre as parcelas 1 e 2 com a área total de 0,184000 ha faz parte do prédio rústico com artigo matricial 150, da seção BC, da união das freguesias de ..., concelho de ....».


HH também apresentou contestação, com dedução de pretensão reconvencional, impugnando a versão dos AA. e invocando levantamento topográfico para sustentar os seguintes pedidos:


«Que declare, outrossim, a reconvenção procedente e em consequência os AA. condenados a reconhecer que as parcelas 1 e 2 com a área total de 0,184000 ha faz parte do prédio rústico com artigo matricial 150, da seção BC, da união das freguesias de ..., concelho de ...;


C. Os Autores condenados a reconhecer que o Réu é dono e legitimo proprietário, em comum e sem determinação de parte ou direito, das parcelas 1 e 2 com a área total de 0,184000 ha;


D. Os Autores condenados a abster-se de praticar qualquer ato que impeça ou diminua o direito de propriedade do Réu/Reconvinte sobre as parcelas 1 e 2 com a área total de 0,184000 ha faz parte do prédio rústico com artigo matricial 150, da seção BC, da união das freguesias de ..., concelho de ....».


CC apresentou igualmente contestação, com dedução de pretensão reconvencional, remetendo para a contestação apresentada por II e formulando os seguintes pedidos:


«... serem os AA. condenados:


i. a reconhecer que as parcelas 1 e 2 com a área total de 0,184000ha fazem parte do prédio rústico com artigo matricial 150, da seção BC, da união das freguesias de ..., concelho de ...;


ii. a reconhecer que a R. é dona e legitima proprietária, em comum e sem determinação de parte ou direito das parcelas 1 e 2 referidas em b)-i.;


iii. a absterem-se de praticar qualquer ato que impeça ou diminua o direito de propriedade da R. sobre o prédio rústico identificado em b)-i..».


Foi realizada a audiência prévia, na qual foram admitidos os pedidos reconvencionais, efectuado o saneamento da causa, a identificação do objecto do litígio e a enunciação dos temas da prova.


Realizada a audiência de julgamento, foi depois julgada habilitada JJ como adquirente do prédio que os AA. indicam, intervindo esta nos autos em substituição dos AA. originais.


Após, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:


«a) Condenam-se os Réus a reconhecer que a A./Adquirente Habilitada e os RR. são proprietários dos prédios rústicos inscritos na matriz sob os artigos 151 e 150 da secção “BC” da União de Freguesias de ..., concelho de ...;


b) Decide-se que a demarcação do limite nascente do prédio da A./Adquirente inscrito na matriz sob o artigo 151 e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 8729 e a delimitação do limite poente do prédio dos RR. inscrito na matriz sob o artigo 150 e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 1241, se faz através de uma linha divisória que resulta da união dos pontos de estrema identificados na planta cadastral da Direcção Geral do Território, designados por “Marco 1”, sito na extremidade Norte, e “Marco 2”, sito na extremidade Sul, com as coordenadas M 28995.9/P -288763.3 e M 28996.6/P -2887923, contornando o tanque aí existente, na sua totalidade, pelo seu lado poente.


c) Condenam-se os RR. a reconhecer a demarcação referida em b).


d) Condenam-se os RR. a reconhecer que o tanque faz parte do prédio da A./Adquirente Habilitada.


e) Condenam-se os RR. a abster-se de aceder ao prédio da A./Adquirente habilitada.


2 - Julgam-se as reconvenções deduzidas improcedentes por não provadas.


Custas da acção pela A./Adquirente Habilitada e pelos RR., na proporão de 1/6 para a primeira e 5/6 para os segundos (art. 527º, nºs 1 a 3 do C.P.C.).».


Desta decisão interpôs CC recurso, formulando as seguintes conclusões:


A) O escrito em 14. dos factos provados constitui uma conclusão, não assente em quaisquer outros factos provados, não constituindo assim uma síntese dos mesmos, e que, por outro lado, só por si determina a sorte da ação sob o ponto de vista jurídico. Por consequência, o constante do ponto 14. da matéria de facto provada deve ser eliminado ou ter-se por não escrito.


B) Sendo eliminado o que consta em 14. dos factos provados, não se prova qualquer facto essencial à procedência da ação, cujo ónus competia aos AA., o que necessariamente determina a improcedência da ação.


C) Mas mesmo que, por hipótese, não se considere como antecede, ainda assim entende a Recorrente que o que consta em 14. dos factos provados, não pode ser dado como provado, porquanto a prova produzida não foi suficiente para tal.


D) O Tribunal a quo descurou um facto essencial que consta dos autos e que é o facto de entre o prédio da A. (identificado em 1. dos factos provados) e o prédio dos RR. (identificado em 4. dos factos provados), nomeadamente no local do tanque em causa nestes autos, ter sido colocada uma vedação pelos ante proprietários e possuidores do prédio da A., e que é plenamente assinalada nas Imagens 1, 3, 4, 6, 7, 8 e 9 bem como da imagem que constitui o Anexo I com a designação PLANTA TOPOGRÁFICA CARACTERIZADORA DA REALIDADE EXISTENTE do relatório pericial junto aos autos em 20.05.2024.


E) O posicionamento desta vedação é claro e passa uma mensagem clara: a vedação contorna o tanque, excluindo este da área do prédio identificado em 1. dos factos provados (prédio dos AA.) que a vedação delimita, integrando por consequência o tanque no prédio adjacente, no caso no prédio identificado em 4. dos factos provados (prédio dos RR.).


F) Esta ação das anteriores proprietárias do prédio identificado em 1. dos factos provados, não pode deixar de ser tida em conta, de forma concludente, como claramente demonstrativa da intenção daquelas de não considerarem o tanque como parte integrante do seu prédio.


G) Face à ação concludente das anteriores proprietárias do prédio identificado em 1. dos factos provados, não pode resultar determinante para a decisão da causa as conclusões do já aludido relatório pericial nem a conclusão contida no esclarecimento prestado por escrito e junto aos autos em 11.06.2024, atentos os esclarecimentos por este prestados em audiência.


H) No que tange ao valor probatório resultante dos depoimentos as testemunhas KK, cunhada da Recorrente e LL, prima do falecido marido da Recorrente, face à ação concludente das filhas do tio HH supra referida e à realidade implantada no terreno, e na ausência de títulos que definam a situação no terreno (como é reconhecido na douta sentença), é indiferente à Recorrente o que aquelas tenham declarado, sem esquecer que a testemunha KK está de relações cortadas com a aqui Recorrente há pelo menos 22 anos.


I) Inegável é, que, a realidade fala por si, pois foram as próprias filhas do tio HH e anteriores proprietárias do prédio identificado em 1. dos factos provados que voluntariamente colocaram a vedação existente a poente do tanque, sendo por essa vedação que se fixa o limite do prédio dos AA..


J) Acresce que, dois marcos não têm necessariamente de ser ligados por uma linha reta ou quase reta se houver outros elementos de ligação entre eles não lineares, como seja um muro ou uma vedação com linhas quebradas. O que é, este último, o existente no local.


K) Em face de tudo o exposto, não parece à Recorrente de aceitar o recurso do Tribunal a quo aos elementos cadastrais constantes do facto provado 13. para julgar procedente a ação, como o fez,


L) Atenta a realidade existente e consolidada no local, o recurso pelo Tribunal aos elementos cadastrais constantes do facto provado 13. representa o recurso e aceitação como meio de prova determinante da decisão os elementos mais falíveis constantes dos autos.


M) Termos em que, também por este motivo ação deveria ter sido julgada improcedente por não provada.


Não foi apresentada resposta.


II. O objecto do recurso determina-se pelas conclusões da alegação do recorrente (art. 635º n.º4 e 639º n.º1 do CPC), «só se devendo tomar conhecimento das questões que tenham sido suscitadas nas alegações e levadas às conclusões, a não ser que ocorra questão de apreciação oficiosa».


Assim, importa:


- avaliar se a matéria descrita em 14 dos factos provados tem natureza conclusiva, devendo ser eliminada.


- subsidiariamente, verificar se tal facto deve ser dado como não provado.


- avaliar os reflexos da pretendida modificação da decisão sobre a matéria de facto no mérito da acção.


III. Foram considerados provados os seguintes factos [1]:


1. AA e BB adquiriram, em 28/12/2010, prédio misto sito no ..., freguesia de ..., concelho de ..., inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 151, secção BC da referida freguesia, e a parte urbana sob o artigo 1998, e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o número 8729, aquisição que foi registada a seu favor na mesma data, conforme documentos juntos com a p.i. sob o nºs 1 e 2, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.


2. Por contrato de compra e venda e mútuo com hipoteca celebrado em 31/10/2023, MM e NN adquiriram aos referidos AA e BB o prédio referido em 1), conforme documento junto no Apenso A sob o nº 1, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.


3. Por contrato de compra e venda celebrado em 31/10/2024, JJ adquiriram aos referidos MM e NN o prédio referido em 1), conforme documento junto no Apenso A sob o nº 2, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.


4. Por escritura pública de compra e venda, realizada em 08/01/2016, DD, comprou o prédio rústico, sito em ..., freguesia de ..., concelho de ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº 1241/19861231 (...), inscrito na matriz sob o artigo 150 da seção BC, composto de cultura arvense, alfarrobeiras, amendoeiras e oliveiras, conforme documentos juntos com a contestação do Réu GG sob o nºs 3, 4, e 5 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.


5. Na caderneta predial rústica do prédio rústico referido em 4), inscrito na matriz em 1989, com a área total de 0,184000ha, com as parcelas 1 e 2 com cultura arvense, alfarrobeiras, amendoeiras, leitos de curso de água e oliveiras, a titularidade está inscrita em nome do cabeça de casal da herança indivisa de DD, conforme documento junto com a contestação do Réu GG sob o nº 6, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.


6. O prédio rústico referido em 4) tem a área global de 1850m2.


7. Por escritura pública de compra e venda, realizada em 15/07/2016, DD, comprou o prédio rústico, sito em ..., freguesia de ..., concelho de ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº 1462/19930520 (...), inscrito na matriz sob o artigo 152 da seção BC, composto de horta, aquisição que foi registada a seu favor 19/07/2016, conforme documentos juntos com a contestação do Réu GG sob o nºs 7, 8, e 9 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.


8. Na caderneta predial rústica do prédio rústico referido em 7), inscrito na matriz em 1989, com a área total de 0,116000ha, com a parcela com horta de classe 2ª, a titularidade está inscrita em nome do cabeça de casal da herança indivisa de DD, conforme documento junto com a contestação do Réu GG sob o nº 8, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.


9. O prédio rústico referido em 7) é composto por horta da classe 2ª com a área de 0,116000ha.


10. DD faleceu em .../.../2019, no estado de casado com CC em segundas núpcias e primeira delas e sob o regime de comunhão de adquiridos, tendo deixado como seus únicos e universais herdeiros, o cônjuge sobrevivo, CC, e seus filhos EE, FF, HH, II e GG, conforme documento junto com a contestação do Réu GG sob o nº 2, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.


11. O prédio referido em 1) confronta a nascente com o prédio referido em 4) e com o prédio inscrito na matriz predial rústica sob o nº 152, e a sul e poente com o prédio referido em 7).


12. E tem a área de 1205m2.


13. No prédio referido em 1), na sua confrontação nascente com o prédio referido em 4), encontram-se identificados na planta cadastral da Direcção Geral do Território, como pontos de estrema, os sinais designados por “Marco 1”, sito na extremidade Norte, e “Marco 2”, sito na extremidade Sul, com as coordenadas M 28995.9/P -288763.3 e M 28996.6/P -2887923, respectivamente, conforme documento junto aos autos com a p.i. sob o nº 9, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.


14. O tanque que se situa junto ao limite nascente do prédio referido em 1), encontra-se totalmente no interior do referido prédio.


E foram tidos por não provados os seguintes factos:


a) A sul do tanque referido em 14) dos factos provados, encontrava-se uma enorme alfarrobeira que a 1ª Ré mandou derrubar.


b) No limite nascente do prédio referido em 1) dos factos provados, este prédio está separado do prédio referido em 4) por um valado altíssimo com pedras enormes.


c) A 1ª Ré arrancou parte do valado referido em b).


d) O prédio referido em 4) dos factos provados confronta a Norte com OO, a Sul com ribeiro, a nascente com PP e Poente com QQ.


e) O prédio referido em 4) dos factos provados é composto por duas parcelas: Parcela 1 composto por cultura arvense e Parcela 2 composto por alfarrobeiras, amendoeiras, cultura arvense, leitos de curso de água e oliveiras.


IV.1. A recorrente começa por impugnar o facto descrito em 14 por não ser um facto, mas uma conclusão, a qual encerra em si a sorte da acção, pelo que não pode constar da matéria de facto provada.


A matéria em causa tem a seguinte redacção:


14. O tanque que se situa junto ao limite nascente do prédio referido em 1), encontra-se totalmente no interior do referido prédio.


2. Como deriva do próprio Ac. do STJ que a recorrente cita (de 20.04.2022, proc. 15/12 [2]), tem sido progressivamente acolhida uma maior abertura à consideração de dados de facto descritos em termos conclusivos na fundamentação de facto da sentença. Trata-se de movimento progressista que atende, de um lado, à dificuldade em distinguir facto, juízo valorativo e direito (ou mesmo à artificialidade, em certa medida, da distinção), e, de outro lado, à necessidade de superar um rigorismo excessivo na descrição factual que se não ajusta à natureza e fim do processo, moldado e orientado por exigências de justiça material em relação às quais o estrito rigor descritivo pode surgir como formalmente obstaculizador.


Não significa isto que, como aquele Ac. do STJ também nota, se devam admitir formulações estritamente valorativas ou jurídicas, sem limitações. De um lado, a distinção entre facto e direito continua a ser prevista na lei processual (art. 607º n.º3 do CPC) e é inerente à aplicação da lei, pois a hipótese da norma supõe, para desencadear a sua aplicação, uma realidade factual a apurar e descrever, e que não pode ser substituída por meras valorações (mormente quando estas reproduzem a previsão legal ou quando contêm logo em si o efeito jurídico visado pela norma). Se a norma funciona em função de factos, então são estes que devem ser descritos, não devendo ser substituídos por formulações exclusivamente conclusivas ou pelos conceitos ou juízos puramente valorativos que a norma usa para descrever, em termos gerais e abstractos, a situação concreta a que se pretende aplicar. De outro lado, as afirmações estritamente conclusivas, ainda que não jurídicas, não podem ser admitidas quando não permitam apreender as específicas circunstâncias concretas da situação em avaliação, ou seja, quando não seja possível apreender a realidade ou ocorrência empírica que se pretende conter na expressão conclusiva ou genérica. Pois nesse caso a aplicação da norma não se baseia na realidade, mas numa abstracção [3].


Inexiste regime legal expresso sobre o tema. A sua regulação deriva apenas dos princípios subjacentes ao regime processual e da necessária distinção entre a realidade a avaliar e a determinação do sentido jurídico dessa avaliação (distinção contida naquele art. 607º n.º3 do CPC). Por isso que inexista uma noção acabada de «facto conclusivo inadmissível» [4]. Pode, na sequência do exposto, aceitar-se, de um lado, que o «facto» será conclusivamente inadmissível quando encerre uma valoração estritamente jurídica, e valoração que é determinante na resolução jurídica da causa. Já não assim quando se trate de valoração jurídica que tem um significado corrente, precipitado na experiência comum, apelando a um dado de facto reconhecível (tendo assim, para além do seu sentido jurídico, uma expressa significação na «esfera do profano» [5]), e desde que essa valoração não envolva, no caso, uma directa resolução do problema jurídico que o mérito da causa coloca (é o caso da menção à propriedade ou ao arrendamento). E tal «facto» será igualmente inadmissível quando, embora sem teor jurídico, envolva uma abstracção ou uma descrição demasiado ampla, que torne indefinível ou fluida a realidade que pretende retractar, com prejuízo para a aplicação do direito (que passa a ser feita em função de uma menção genérica indefinida e não de harmonia, como deveria, com a concreta e real situação em análise). Inversamente, já será admissível o recurso «a formulações de pendor mais genérico, mas que permitam uma correta e inteligível compreensão da realidade que o tribunal conseguiu isolar» [6].


3. Atendendo, neste quadro, ao facto 14, a primeira constatação que ressalta é que aquele facto não contém nenhuma valoração jurídica: não envolve qualificações normativas da realidade que supõe, nem afirma direitos ou sujeições jurídicas. A descrição situa-se fora do domínio do jurídico.


Quanto ao seu valor descritivo, a menção tem ainda suficiente concretização prática, permitindo apreender o sentido da realidade que se quer transmitir: que o tanque está junto a um dos limites do prédio, mas todo dentro desse prédio, ou seja, aquém daquele limite do prédio (e, inversamente, que o limite do prédio está assim além do tanque). Não envolve o facto, assim, uma generalização ou abstracção que torne indefinida a realidade retractada, substituindo tal realidade por uma mera qualificação ou abstracção. Ao invés, mostra-se suficientemente concreto e directamente apreensível o seu conteúdo real ou ontológico. Aliás, a formulação do facto não diverge muito da afirmação directa de que o limite do prédio se situa em certo ponto (ou, no caso, no limite exterior do tanque, por exemplo). Descrições factuais estas que são frequentes e correntes em acções deste género, justamente por constituírem matéria de facto, concreta e não tingida por considerações jurídicas. O máximo que se pode dizer é que a descrição envolve uma avaliação de facto ou um juízo avaliativo de facto: em vez de afirmar directamente que o limite do prédio se situa após o tanque, descreve-se a situação, ainda factual, que se retira dessa delimitação, ou seja, que o tanque se situa no interior do prédio da recorrida. Mas, insiste-se, aqui vai ainda contida uma asserção factual, não estando em causa um puro juízo qualificativo ou valorativo, nem uma directa resposta a questão jurídica pendente (ponto este que melhor se esclarece infra).


Pode, pois, aceitar-se que a afirmação não assenta num juízo meramente jurídico ou estritamente valorativo, cuja realidade subjacente não é aflorada ou explicitada. Ao invés, apela a um dado ou suporte factual concreto (a posição de certa realidade - o tanque - face a outra realidade - o limite do prédio), e é «perfeitamente perceptível pela generalidade das pessoas, enquanto realidade de facto apreensível». Neste sentido, traduz-se ainda numa proposição descritiva de certo estado de coisas. Sendo que, como deriva do Ac. do STJ de 14.07.2021 [proc. 19035/17.8T8PRT.P1], a descrição é válida enquanto descrição factual se, não obstante ter uma componente conclusiva, ainda assim tiver um substrato de facto relevante. E isso ocorre no caso, como se procurou demonstrar. Ao que acresce que os próprios factos não são inertes nem passivos, envolvendo valorações, e que todos os factos são factos jurídicos, sendo irrealista buscar um facto puro. Assim, admitindo que «a patologia da sentença neste segmento apenas se verificará, em linhas gerais, quando seja abertamente assumida como “matéria de facto provada” pura e inequívoca matéria de direito» [7], o que não ocorre, terá que aceitar-se a regularidade da descrição factual em causa.


Apelando ainda a um critério adiantado por T. de Sousa (embora para efeito de avaliação da competência do STJ) [8], podia dizer-se que «a matéria de facto respeita à averiguação dos factos e o resultado dessa actividade exprime-se numa afirmação susceptível de ser considerada verdadeira ou falsa (…); – a matéria de direito refere-se à aplicação das normas jurídicas aos factos e o resultado dessa actividade pode ser avaliado segundo um critério de correcção ou de justificação» [9]. O que, aplicado ao caso, levaria a considerar que estaríamos perante matéria de facto pois, de um lado, se trata de afirmação susceptível de ser tida por provada ou não provada, e, de outro lado, a afirmação não traduz o resultado da aplicação de norma jurídica, aplicação essa susceptível de ser tida por acertada ou não.


4. A recorrente invoca duas razões para qualificar este facto 14 como uma mera conclusão.


De um lado, afirma que a afirmação não deriva dos demais factos provados, não é deles síntese, e por isso é mera conclusão. Já se deixou revelado porque se considera que a descrição tem suficiente substrato factual, não sendo uma conclusão. Acresce que a asserção que a recorrente sustenta não é exacta, pois o apuramento do facto baseia-se em meios de prova (e no convencimento do juiz que nestes assenta) e não em outros factos provados ou descritos [10]. A afirmação poderia valer para afirmações genéricas, sem suficiente concretização, que podem ser esclarecidas ou concretizadas por outros factos provados. Mas não é esse o caso.


De outro lado, sustenta que aquele facto 14 constitui uma conclusão porque só por si determina a sorte da acção sob o ponto de vista jurídico. A afirmação, nos termos amplos afirmados, assenta num equívoco. São os factos que determinam a sorte jurídica das acções, pois são eles que determinam a aplicação, ou não, das regras jurídicas pertinentes. Pelo que a afirmação, nos termos amplos indicados, não é rigorosa [por exemplo, se, na venda de um diamante, se discute vício do negócio por não se tratar de um diamante, a natureza da pedra é matéria de facto e esta (ser diamante ou não) vai definir o destino da acção]. O que se pretende dizer, quando se refere que os factos não podem conter a solução jurídica da causa, é que os factos não podem, eles mesmos, constituir essa solução. Ou seja, que a solução jurídica não pode ser descrita nos factos, o que ocorre quando os factos prescindem da norma por a incorporarem na sua «descrição» (por nesta descrição se incluir o sentido jurídico, normativo, da questão). Assim, por exemplo, quando, discutindo-se se está em causa um contrato de comodato ou de arrendamento, nos factos tidos por provados se descreve que se trata de um contrato de arrendamento; ou, discutindo-se se a prestação realizada corresponde a um integral cumprimento da obrigação, se diz que esta obrigação está cumprida; de modo análogo, também quando, sendo controvertida a propriedade sobre o bem, esta vem directamente afirmada nos factos tidos por provados (dizendo-se que o autor é proprietário do bem). Não é esse, notoriamente, o caso dos autos. Acresce que, estando em causa um problema de delimitação entre prédios, estes limites podem ser directamente fixados pelos factos provados, quando se apurem e descrevam directamente tais limites dos prédios. É esta situação corrente [11], sem que essa descrição seja caracterizada como uma afirmação jurídica (ou conclusiva), por resolver a sorte da acção. Justamente porque a afirmação directa do limite não envolve a solução de uma questão jurídica, mas apenas a determinação factual de um pressuposto de tal questão jurídica (e de uma das formas por que essa questão se pode resolver – v. art. 1354º n.º1, in fine, do CC). O que sucede na demarcação é que o mérito da causa é, quando se apuram directamente os limites dos prédios, definido por tais factos (por tais limites). Mas isso não converte esses factos em proposições normativas ou conclusivas. Trata-se de mero efeito da natureza e sentido do objectivo visado na acção, que pode ser definido directamente a partir de factos provados. A esta luz se deve atender ao critério do Ac. do STJ que a recorrente invoca, a propósito do juízo de valor sobre a realidade factual, no sentido de que o facto 14 não contém a solução da questão de direito, mas apenas que de tal facto deriva essa solução, no sentido exacto de que são os factos que determinam a aplicação do direito e assim a solução da causa.


Aliás, a solução jurídica, no caso, nem vem exclusivamente assente em tal facto, mas em tal facto em articulação com os dados cadastrais, como deriva da fundamentação da sentença (que articula os factos 13 e 14 na definição da solução alcançada).


Improcede, pois, esta pretensão.


5. Em segunda linha, ou subsidiariamente, a recorrente entende que o facto 14 deve ser tido por não provado.


Trata-se, pois, de impugnação de facto sujeita ao regime do art. 640º n.º1 e 2 do CPC, cujos requisitos a recorrente cumpriu formalmente, considerando que:


i. indica o concreto ponto de facto (facto 14) que considera incorrectamente julgado (art. 640º n.º1 al. a) do CPC), indicação que também consta, como devia, das conclusões.


ii. indica os concretos meios probatórios (perícia e esclarecimentos do perito), constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (art. 640º n.º1 al. b) do CPC).


iii. indica a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas (art. 640º n.º1 al. c) do CPC) - afirmando que o facto não pode ser dado como provado, o que equivale a sustentar que deve ser tido por não provado.


iv. indicou, estando em causa prova gravada (declarações do perito), com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso (art. 640º n.º2 al. a) do CPC) - tendo ainda reproduzido essas declarações.


6. Esta impugnação vem sustentada essencialmente numa circunstância de facto que, no entendimento da recorrente, impediria que se desse como provado o que consta de 14 dos factos provados. Circunstância esta que, por si, tornaria irrelevantes os depoimentos das testemunhas KK e RR, e que também teria efeitos sobre a valoração dos elementos decorrentes do cadastro.


Aquela circunstância de facto analisar-se-ia na existência de uma vedação que separa o tanque do prédio da recorrida, vedação esta colocada pelos ante proprietários e possuidores do prédio da recorrida.


A existência da vedação é probatoriamente alcançada a partir da perícia realizada (e das plantes nela contidas), que a indicam. Já a autoria da instalação da vedação, e o momento dessa instalação, que a recorrente também invoca, permanecem por revelar, pois não derivam daquela perícia nem das declarações do perito, sendo estes os únicos meios de prova que a recorrente invoca, não indicando, pois, qualquer outro meio de prova que revele aqueles dados.


O que significa que tais elementos permanecem, face à impugnação realizada, indeterminados, ou não revelados.


Ora, a mera existência da vedação é insuficiente para contrariar aquele facto 14. Pois, de um lado, tal vedação, ignorando-se as condições da sua implementação (quando, por quem, com que finalidade, e, sobretudo, qual a razão para a colocação da vedação naqueles termos), nada garante, por si, quanto à delimitação dos prédios. De outro lado, porque existem outros meios de prova que sustentaram a decisão e que a recorrente não discute (dois depoimentos testemunhais), tendo antes assumido que a situação da vedação tornaria irrelevantes esses meios de prova - o que não ocorre. Aliás, atendendo à fundamentação da sentença, daqueles depoimentos até poderia advir um enquadramento da vedação que excluía o valor que a recorrente lhe atribui [12].


Pese embora o tribunal de recurso possa, em sede de impugnação da decisão sobre a matéria de facto, formar uma convicção própria, assente em juízo probatório autónomo, que pode opor à convicção do tribunal recorrido, persistem diferenciações entre os dois planos em que aquele tribunal e o tribunal recorrido intervêm, reveladas desde logo pela falta de imediação do tribunal de recurso, pela impossibilidade de uma racionalização da decisão do tribunal recorrido que seja absoluta (intervindo sempre na decisão condições legitimamente atendíveis, mas que não são perfeitamente reveladas na fundamentação), ou pela circunstância de o tribunal de recurso não realizar um novo julgamento. Tal diferenciação tem tradução no art. 640º n.º1 al. b) do CPC quando exige ao recorrente a indicação dos meios de prova que imponham, e não apenas permitam, decisão diversa da recorrida. Deste modo, impõe-se ao recorrente um ónus de demonstração cabal, do qual aquele se desempenha indicando as provas que não apenas sustentam como impõem a sua pretensão. A modificação do julgamento de facto há-de assentar em prova que suporte de forma segura ou necessária (imponha) julgamento de facto diverso, e não apenas que o permita ou possibilite, só daquele modo se revelando o erro de julgamento do tribunal recorrido que pode ser corrigido [nesse sentido, se afirma que se deve evitar «a introdução de alterações quando, fazendo atuar o princípio da livre apreciação das provas, não seja possível concluir, com a necessária segurança, pela existência de erro de apreciação» - A. Geraldes, Recursos em Processo Civil, Almedina 2022, pág. 397; ou que a Relação só pode alterar a decisão sobre a matéria de facto quando a reapreciação da prova «a leve seguramente a um resultado diverso» - L. Freitas, A. Ribeiro Mendes e I. Alexandre, CPC Anotado, vol. 3º, Almedina 2022, pág. 170; v. ainda Acs. do TRC proc. 793/07.4TBAND.C1 de 21.03.2013 ou do TRE proc. 129/21.7T8SLV.E1 de 11.01.2024, em 3w.dgsi.pt; e é nesta linha que T. de Sousa afirma que a Relação pode utilizar um critério de razoabilidade ou de aceitabilidade da decisão impugnada como limite à alteração da decisão (in anotação de 18.05.2017 no Blog do IPPC)].


Ora, o exposto revela que os meios de prova invocados pelo recorrente não chegam para abalar o juízo decisório da decisão não demonstrando o necessário erro de julgamento do tribunal recorrido.


O tribunal pode ou deve, é certo, apelar a toda a prova na avaliação da impugnação que lhe cabe realizar. Mas isso impõe-se perante a impugnação cabal, consistente e concludente. Já não lhe cabe suprir a insuficiência da impugnação pela investigação oficiosa dos meios de prova disponíveis, e de todos esses meios de prova: tal equivalia à negação do regime legal, quer quando colocava o tribunal de recurso perante a necessidade de proceder a uma avaliação global da prova perante a impugnação insuficiente, procedendo a uma investigação probatória que o regime exclui, quer quando derrogava o regime do referido art. 640º n.º1 al. b) do CPC e o referido ónus de demonstração cabal que impõe ao impugnante.


Assim, como não cabe ao tribunal realizar um novo julgamento (atendendo a toda a prova produzida para avaliar o facto), cabendo antes ao recorrente indicar a prova relevante para sustentar a sua impugnação, e em termos que imponham decisão diversa, tem que se concluir pela insuficiência da impugnação (já que os meios de prova indicados pela recorrente não impõem a decisão diversa que propugna).


7. Em termos de avaliação jurídica, a recorrente sustenta que, afastado o facto 14, os elementos cadastrais não seriam suficientes para definir os limites nos termos declarados pela decisão impugnada, sustentando que a acção deveria ser julgada improcedente.


Ora, mantendo-se o facto 14, e sendo a linha delimitadora dos prédios marcada em função também daquele facto, decai a pretensão da recorrente (que supunha a insubsistência daquele facto). Embora ainda se note que a fragilidade que aponta aos elementos cadastrais não é assim tão significativa, pois:


- a antiguidade dos dados cadastrais até lhes pode dar valor acrescido, por revelar uma realidade antiga e duradoura. E a sua alteração não é, como referido, algo que o processo (ou a impugnação realizada) revele.


- se é certo que dois marcos não têm que ser, em tese, ligados por uma recta, também é certo que quando se colocam dois marcos de forma seguida, é porque, em princípio, estão justamente a assinalar os extremos de uma linha recta - de outro modo, os marcos perdiam grande parte do seu valor por não definirem a linha que os une, permanecendo indefinida a delimitação que os marcos visam realizar. Só assim não seria se existissem entre eles outros elementos delimitadores.


Sendo que, de qualquer modo e como a decisão recorrida assinala, este tipo de acção não pode nunca terminar com a sua improcedência (o que equivalia a deixar indeterminados os limites dos prédios, solução inadmissível), havendo, no limite, que operar a repartição da área duvidosa, por força do art. 1354º n.º2 do CC.


8. Decaindo, suporta a recorrente as custas do recurso (art. 527º n.º1 e 2 do CPC), embora sem prejuízo do decidido em sede de apoio judiciário.


V. Pelo exposto, julga-se improcedente o recurso.


Custas pela recorrente.


Notifique-se.


Datado e assinado electronicamente.


Redigido sem apelo ao Acordo Ortográfico (ressalvando-se os elementos reproduzidos a partir de peças processuais, nos quais se manteve a redacção original).


António Fernando Marques da Silva – relator


Filipe Aveiro Marques - adjunto


Sónia Moura - adjunta

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1. Em reprodução literal (mas sem negrito ou itálico, onde aplicável).↩︎

2. Disponível em 3w.dgsi.pt, tal como os demais acórdãos citados a seguir no texto.↩︎

3. Por exemplo, afirmar que o público reconhece alguém como filho de outrem constitui uma afirmação conclusiva e não um facto (como nota Paula Costa e Silva, Saneamento e condenação no novo processo civil, Aspectos do novo processo civil, Lex 1997, pág. 232). Não permite saber em que consiste aquele reconhecimento: é um juízo sobre factos que não revela a realidade subjacente (os factos que justificam o juízo); nesse sentido, substitui a realidade a avaliar por um juízo qualificativo e por isso repugna utilizar como matéria de facto.↩︎

4. Expressão usada pelo seu sentido descritivo, aceitando-se, como mal menor, a sua falta de rigor.↩︎

5. Mesmo numa visão tradicional, admite-se que «são de equiparar aos factos os juízos que contenham a subsunção a um conceito jurídico geralmente conhecido» - Anselmo de Castro, Direito processual civil, III, Almedina 1982, pág. 269, secundado por G. Canotilho e Vassalo de Abreu, Enfiteuse sem extinção (...), RLJ140/236.↩︎

6. A. Geraldes, Recursos em processo civil, Almedina 2024, pág. 422.↩︎

7. A. Geraldes, ob. cit., pág. 355.↩︎

8. Este professor assume, no tema da delimitação facto/direito no julgamento de facto, uma posição bastante liberal, recusando a existência de «factos conclusivos», o que, aplicado ao caso, redundaria na imediata rejeição da posição do recorrente (v., sobre o seu pensamento quanto à matéria, a anotação ao art. 410º do CPC no Blog do IPPC, para além de vários textos publicados nesse Blog).↩︎

9. Estudos sobre o novo processo civil, Lex, 1997, pág. 422, em posição análoga à constante de C. Mendes/T. de Sousa, Manual de processo civil, vol. II, AAFDL 2022, pág. 191.↩︎

10. Eventual excepção seria a descrição de factos instrumentais, em certas condições (quando visam revelar facto principal não descrito, a ser admissível), que aqui não relevam.↩︎

11. A título meramente exemplificativo, ver Ac. do TRG proc. 841/13 de 13.06.2019, do TRC proc. 1193/21 de 07.05.2024, ou do TRL proc. 4678/14 de 10.05.2018.↩︎

12. Notando-se que, partindo apenas do teor da fundamentação da sentença, eventual erro do ante possuidor quanto ao limite não equivale à fixação do limite, e que outros dados, até mais antigos (colocação de marcos), indicam a fixação de limites diversos dos que derivam da vedação.↩︎