Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | PAULA DO PAÇO | ||
Descritores: | CONCLUSÕES DE RECURSO CONVITE AO APERFEIÇOAMENTO IMPUGNAÇÃO DA DECISÃO DA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA REJEIÇÃO | ||
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Data do Acordão: | 09/18/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL - CONTRA-ORDENAÇÃO | ||
Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO RECORRIDA | ||
Área Temática: | SOCIAL | ||
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Sumário: | Sumário elaborado pela relatora: I. A impugnação judicial em processo de contraordenação laboral deve ser dirigida ao tribunal competente e deve conter alegações, conclusões e indicação dos meios de prova a produzir. II. O ónus de concluir satisfaz-se pela enunciação abreviada dos fundamentos do recurso no final da impugnação. III. Não constituem conclusões a reprodução praticamente total das alegações do recurso. IV. Tendo a impugnante sido convidada a aperfeiçoar as conclusões que apresentou, sob pena de rejeição da impugnação judicial, e tendo, nas conclusões aperfeiçoadas, voltado a repetir, praticamente, o que consta das alegações e mantido matérias que não foram apresentadas nas alegações, não se pode considerar que a mesma cumpriu o ónus de concluir, tanto mais que na concreta situação dos autos o cumprimento desse ónus não revelava especial complexidade nem se traduzia numa exigência injusta ou excessiva. V. O incumprimento do ónus de concluir, que representa um desrespeito pelas exigências de forma a que deve obedecer a impugnação judicial, tem como consequência a rejeição da impugnação. | ||
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Decisão Texto Integral: | 2175/24.4T8EVR.E1
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora1 I. Relatório AA – Transportes Unipessoal, Lda impugnou judicialmente a decisão da Autoridade Para As Condições de Trabalho (ACT), que lhe aplicou uma coima de € 2754 e a sanção acessória de publicação na página eletrónica da ACT. O Ministério Público apresentou os autos ao juiz, ao abrigo do artigo 37.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro. A Meritíssima Juíza da 1.ª instância proferiu o seguinte despacho: «- Conclusões de recurso - Compulsados os autos, designadamente o recurso interposto, constata-se que as conclusões contidas no mesmo não representam uma súmula das questões colocadas em sede de alegações, destinando-se, ao invés, a repetir tudo aquilo que já antes se deixou expresso nas alegações, por um lado, e, por outro, a aduzir factos a que não se fez referência em sede de alegações. Nesta conformidade, ao abrigo do disposto no art. 417.º, n.º 3, do CPP (aplicável ex art. 60 do RGCOLSS e art. 41.º do RGCO), e com a cominação de não ser o recurso recebido, notifique-se a recorrente para, no prazo de dez dias, juntar aos autos conclusões do recurso interposto devidamente elaboradas nos termos sobreditos e legalmente impostos, ou seja, representando uma súmula dos factos concretamente aludidos em sede de alegações.» Respondendo ao convite, a impugnante apresentou novas conclusões (cf. requerimento com a ref.ª 51149312). Foi, então, proferida a seguinte decisão: « - Rejeição da impugnação judicial - Dispõe o art. 33.º do RPCOLSS: “1 - A impugnação judicial é dirigida ao tribunal de trabalho competente e deve conter alegações, conclusões e indicação dos meios de prova a produzir. 2 - A impugnação judicial é apresentada na autoridade administrativa que tenha proferido a decisão de aplicação da coima, no prazo de 20 dias após a sua notificação.” As conclusões devem representar uma súmula das questões colocadas em sede de alegações. Verificando-se que a impugnação judicial apresentada não continha os requisitos de forma exigido na medida em que as conclusões não representavam uma súmula das questões colocadas em sede de alegações, foi determinado, ao abrigo do disposto no art. 417.º, n.º 3, do CPP (aplicável ex art. 60 do RGCOLSS e art. 41.º do RGCO), a notificação da arguida para, no prazo de dez dias, juntar aos autos conclusões devidamente elaboradas nos termos sobreditos e legalmente impostos, com a cominação de, não o fazendo, não ser o presente recurso de impugnação judicial recebido. Regularmente notificada do despacho a que supra se alude, a arguida veio juntar o requerimento de referência 4262361. Porém, verifica-se, da leitura de tal peça processual, que a arguida se limitou a eliminar a conclusão antes elencada sob o ponto 2., a aglutinar as conclusões antes elencadas sob os pontos 7. e 8. no agora ponto 6)., e a eliminar as conclusões 10. e 13.. Não obstante tal reformulação, verifica-se que as conclusões ora apresentadas não constituem qualquer súmula das questões colocadas em sede de alegações, mas sim, por um lado, mera repetição destas e, por outro lado, abordam questões novas não invocadas em sede de alegações. Com efeito, não aborda a arguida, em sede de alegações, os factos a que se reportam as conclusões 5. e 6., ou seja, a eventual falta de descrição, na decisão administrativa, quer dos critérios adotados para aplicação da coima, quer do elemento subjetivo (dolo ou negligência). Nessa medida, não pode deixar de se considerar que as conclusões ora apresentadas não se consideram devidamente elaboradas enquanto súmula das alegações. Neste mesmo sentido, pode ler-se no acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 28.04.2023, acessível em www.dgsi.pt: “I – O recorrente deve terminar as suas alegações de recurso com conclusões sintéticas (onde indicará os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida). II – Não constituem conclusões a repetição dos argumentos constantes das alegações. III – Tendo a arguida sido convidada a corrigir as conclusões que apresentou como tal sob pena de rejeição do recurso e tendo apresentado novo articulado que reproduz os argumentos constantes das alegações, tendo apenas procedido a uma mera aglutinação do texto das alegações, não pode considerar-se este articulado como contendo conclusões, por não respeitar a forma resumida exigida pela lei. IV – Neste caso o recurso deve ser rejeitado.” E também, neste sentido, lê-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 21-12-2017, igualmente acessível em www.dgsi.pt: “i) Não constituem conclusões a quase repetição dos argumentos constantes das alegações. ii) Tendo a arguida sido convidada a corrigir as conclusões que apresentou como tal sob pena de rejeição do recurso e tendo apresentado novo articulado praticamente igual ao anterior sem sintetização, não pode considerar-se este articulado como sendo conclusões, por não respeitar a forma resumida exigida pela lei. iii) Neste caso o recurso deve ser rejeitado. Com efeito, preceitua o art. 38.º do mesmo diploma legal: “1 - O juiz rejeita, por meio de despacho, a impugnação judicial feita fora do prazo ou sem respeito pelas exigências de forma.” Nesta conformidade, por não respeitar as exigências de forma prescritas pelo art. 33.º do RPCOLSS, há que rejeitar a presente impugnação judicial, o que se decide nos termos do preceituado no art. 38.º do mesmo diploma legal. Nesta conformidade, ao abrigo do disposto nos art. 33.º e 38.º do RGCOLSS rejeita-se a presente impugnação judicial. Custas pela Recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 1 (uma) UC - cf. artigo 94.º, n.º 3 do Decreto-lei n.º 433/82, de 27 de outubro, ex vi artigo 60.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro. Notifique a recorrente, o Ministério Público e a autoridade administrativa da presente decisão. Deposite.» - A impugnante interpôs recurso para esta Relação, extraindo das suas alegações as seguintes conclusões: «1) As conclusões do recurso apresentadas, após o despacho de aperfeiçoamento, representam uma súmula do alegado no processo, respeitando assim o legalmente determinado; 2) O relevante nas conclusões de recurso será a substância em detrimento da forma; 3) Ainda que possa existir uma deficiente sintetização das conclusões apresentadas, o que é determinante é que tal situação nunca representaria a inteligibilidade do recurso e, dessa forma, o que legalmente se pretende com a exigência de formulação de conclusões encontra-se cumprido; 4) O MM Juiz a quo ao decidir como decidiu, não admitindo o recurso apresentado, violou o disposto nos art. 33 e 38 da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro. Nestes termos e no mais de direito deve V. Ex.a considerar procedente o presente recurso, revogando-se o douto despacho em crise, determinando-se o julgamento do recurso de contraordenação apresentado, com o que se fará a devida JUSTIÇA.» - A 1.ª instância admitiu o recurso, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. - O Ministério Público respondeu, propugnando pela improcedência do recurso. - O processo subiu ao Tribunal da Relação e a Exma. Sra. Procuradora-Geral Adjunta emitiu o seu parecer, reiterando a posição manifestada na resposta. A recorrente não respondeu. Colhidos os vistos legais, cumpre, em conferência, apreciar e decidir. * II. Objeto do recurso A questão que importa dilucidar e resolver é a de saber se a impugnação judicial não deveria ter sido rejeitada. * III. Matéria de Facto A matéria de facto a atender é a que consta do relatório supra, para a qual remetemos, sem necessidade da sua repetição, tendo-se ainda em consideração os elementos relevantes que resultem do processo. * IV. Enquadramento jurídico Conforme já referimos a única questão que importa dilucidar e resolver é a de saber se a impugnação judicial não deveria ter sido rejeitada. A 1.ª instância, depois de ter convidado a recorrente a aperfeiçoar as conclusões da impugnação judicial deduzida, e depois do oferecimento de novas conclusões, decidiu, ainda assim, rejeitar a impugnação judicial por entender que a recorrente não observou o ónus de concluir. A recorrente não se conforma com esta decisão e requer que a mesma seja reapreciada por este tribunal superior. Analisemos a questão. De harmonia com o disposto no artigo 32.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, a decisão da autoridade administrativa de aplicação de coima é suscetível de impugnação judicial. Prescreve o artigo 33.º da mesma Lei, o seguinte: 1 - A impugnação judicial é dirigida ao tribunal de trabalho competente e deve conter alegações, conclusões e indicação dos meios de prova a produzir. 2 - A impugnação judicial é apresentada na autoridade administrativa que tenha proferido a decisão de aplicação da coima, no prazo de 20 dias após a sua notificação. Infere-se desta norma que a impugnação judicial deve seguir determinadas exigências de forma, que são as seguintes: (i) deve ser dirigida ao tribunal competente; (ii) deve conter alegações, conclusões e indicação dos meios de prova a produzir. No que respeita ao ónus de concluir, que é o que agora releva, o mesmo satisfaz-se pela enunciação abreviada dos fundamentos do recurso no final da minuta. As conclusões, como a própria palavra indica, são um resumo dos fundamentos por que se pede a alteração ou a anulação da decisão de que se recorre. Daí que, para serem legítimas e razoáveis, as conclusões devem emergir logicamente do arrazoado feito na alegação. As conclusões são as proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação. O ónus da conclusão sintética deve ser apreciado de uma forma ponderada e equilibrada, de modo a que, por um lado, não se seja demasiado formalista em preterição da questão de fundo; mas, por outro lado, deve-se analisar se o princípio da colaboração subjacente a este ónus foi concretizado, de forma a permitir, o exercício do contraditório e a exposição clara das questões submetidas a um 2.º julgamento. No caso que nos ocupa, verificamos que as conclusões que foram inicialmente apresentadas reproduzem, efetivamente, a quase totalidade das alegações, e, para além disso, incorporam novos factos que não foram aduzidos nas alegações, como é referido no despacho de convite ao aperfeiçoamento da impugnação judicial. Com efeito, a nulidade da decisão administrativa por omissão de pronúncia, decorrente da falta de descrição dos critérios adotados para a aplicação da coima, mencionada na conclusão 6), bem como a factualidade referida na conclusão 7), não foram suscitadas nas alegações da impugnação. Por seu turno, as conclusões aperfeiçoadas, posteriormente apresentadas, também não constituem uma súmula das alegações. Aliás, a análise feita pelo tribunal a quo das conclusões aperfeiçoadas é absolutamente precisa e correta: a impugnante limitou-se a eliminar a anterior conclusão 2); a aglutinar as conclusões anteriormente elencadas sob os pontos 7) e 8) no atual ponto 6); e a eliminar as anteriores conclusões 10) e 13). Ademais, mantém-se nas conclusões aperfeiçoadas a alegação dos factos não mencionados nas alegações – cf. conclusões 5) e 6) (primeira parte desta última). Ou seja, a impugnante limitou-se a proceder a uma reformulação das conclusões, mas não teve o cuidado de criar uma verdadeira súmula das alegações, desperdiçando a oportunidade que lhe foi concedida para suprir os vícios detetados nas conclusões (iniciais) da impugnação. Na verdade, continua a repetir, praticamente, o que consta das alegações e introduz, nas conclusões, matérias que não foram apresentadas nas alegações. É, pois, manifesto que a recorrente não procurou, nem inicialmente, nem posteriormente, extrair das alegações qualquer resumo que facilitasse a realização do contraditório e a delimitação do objeto do recurso. E, no caso dos autos, não nos parece que a execução do ónus de concluir revelasse especial dificuldade ou se traduzisse numa exigência injusta ou excessiva. Enfim, o que se conclui é que a recorrente incumpriu, realmente, o ónus de concluir imposto pelo artigo 33.º da Lei n.º 107/2009. Ora, a inobservância das exigências de forma tem como consequência a rejeição da impugnação judicial, de harmonia com o disposto no artigo 38.º da referida Lei. Em síntese, entendemos que o despacho recorrido fez uma correta aplicação da lei, pelo que não nos merece censura. A rejeição da impugnação encontra, pois, fundamento legal, e a recorrente é a única responsável pela mesma. Em face do exposto, resta-nos concluir pela improcedência do recurso, devendo manter-se a decisão recorrida. * V. Decisão Nestes termos, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar o recurso improcedente, e consequentemente, confirmam a decisão recorrida. Custas a cargo da recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 3 UC. -------------------------------------------------------------------------------------------------------- Évora, 18 de setembro de 2025 Paula do Paço Filipe Aveiro Marques Emília Ramos Costa
1. Relatora: Paula do Paço; 1.º Adjunto: Filipe Aveiro Marques; 2.ª Adjunta: Emília Ramos Costa↩︎ |