Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
60/23.6SULSB-C.E1
Relator: FERNANDO PINA
Descritores: CIBERCRIME
RECOLHA DE PROVA
PROCEDIMENTO
JUIZ DE INSTRUÇÃO CRIMINAL
Data do Acordão: 05/07/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: I - Após a efetivação da apreensão física dos aparelhos de telemóvel pertencentes aos arguidos, e antes de ser efetuada qualquer pesquisa ao seu conteúdo informático, o processo deve ser remetido ao Juiz de Instrução Criminal para este autorizar a pesquisa e apreensão (com gravação para CD) do correio eletrónico e das comunicações de natureza similar que venham eventualmente a ser encontrados nos aparelhos telefónicos apreendidos.
II - A apreensão física dos referidos aparelhos (mesmo havendo “legitimidade formal” para o efeito, pela existência de prévia autorização ou ordem judicial de apreensão) não legitima, sem mais, a valoração dos elementos probatórios assim conseguidos, sendo também necessário que o Juiz de Instrução Criminal seja a primeira pessoa a tomar conhecimento do conteúdo apreendido.
Decisão Texto Integral:

ACORDAM OS JUÍZES, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA:


I. RELATÓRIO

A –
Nos presentes autos de Processo Comum Colectivo, com o nº 60/23.6SULSB, a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, Juízo de Instrução Criminal de Santarém – Juiz 2, recorre o Ministério Público do despacho proferido em 06-12-2023, pela Mmª Juiz titular dos presentes autos, que declarou que: “só incumbe ao JIC o conhecimento em 1ª mão de correio electrónico e de natureza similar e nada mais, terá que ser apresentado tal conteúdo (e não outro), sem conhecimento do mesmo por quem realizar tal pesquisa/triagem”.

Inconformado com o assim decidido, o Ministério Público interpôs o presente recurso, onde formula as seguintes conclusões (transcrição):
1. No presente inquérito investigam-se factos suscetíveis de consubstanciarem a prática, pelo menos, de um crime de tráfico e outras atividades ilícitas, previsto e punido pelo artigo 21º do DL 15/93, de 22 de Janeiro.
2. Após apreensão dos telemóveis dos arguidos e verificando que não tinha sido realizada qualquer pesquisa informática ou exame ao seu conteúdo, o MP requereu a autorização ao JIC para a pesquisa e apreensão de correio eletrónico nos termos do artigo 17º da Lei 109/2009, tendo a Mm.ª JIC referido que nada determinava uma vez que os telemóveis já tinham sido apreendidos.
3. A Mm.ª JIC não atendeu à diferença existente entre a apreensão de objetos, neste caso, os telemóveis, e a pesquisa para apreensão de dados informáticos, designadamente de correio eletrónico e de natureza similar.
4. A apreensão dos telemóveis aos arguidos equivale, apenas e tão só, à retirada do poder de disponibilidade sobre realidades físicas para a esfera da investigação, sendo que os dados digitais e informáticos não correspondem a realidade física.
5. A apreensão de dados informáticos implica o acesso aos aparelhos apreendidos e ao processamento e gravação do seu conteúdo, para que o seu conteúdo seja disponibilizado em termos inteligíveis.
6. E é apenas nesse momento que ocorre a efetiva compressão do direito à reserva da vida privada, direito constitucional convocado aqui na vertente da inviolabilidade da correspondência, que a lei processual visa salvaguardar com as garantias e formalidades que impõe, designadamente a da reserva judicial no que respeita àquela forma de correspondência eletrónica.
7. Estender a reserva de juiz à apreensão de um aparelho físico (neste caso o telemóvel) sem que haja qualquer pesquisa ou acesso aos dados informáticos que o mesmo contém, é impedir que o MP possa determinar a apreensão de qualquer objeto físico com natureza eletrónica, mesmo que posteriormente não queira proceder ao exame do seu conteúdo.
8. Entendemos, como se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 25/10/2022, quando a pesquisa é desde logo orientada para a apreensão de correio eletrónico e comunicações de natureza similar, deve a mesma ser autorizada previamente pelo juiz de instrução, por forma a que seja controlado previamente o próprio acesso a tais dados ou elementos físicos, de acordo com a previsão do art. 179º do Código de Processo Penal, aplicável por força do disposto no artigo 17º da Lei 109/2009, ali se incluindo a proporcionalidade e a necessidade do determinado.
9. A decisão a tomar não é intempestiva, em face da promoção realizada, porquanto não foi realizada qualquer pesquisa ou acesso aos telemóveis apreendidos, encontrando-se apenas apreendidos os aparelhos físicos.
10. Logo, não tendo a matéria apresentada ao JIC para decisão sido alvo de qualquer despacho de apreciação de mérito pelo JIC, entendemos que não pode o tribunal dizer que nada se determina, sob pena de total omissão de pronúncia.
11. Decidir referindo que “nada se determina” porque os telemóveis já foram apreendidos não é salvo o devido respeito, uma decisão, quando na verdade nunca se pronunciou sobre tal matéria em concreto, em clara violação do disposto nos artigos 17º da Lei 109/2009 e 269º, nº 1 al. d) e 178º do Código Processo Penal.
12. Pelo exposto, deve o despacho proferido em 04 de dezembro de 2023 ser revogado, e substituído por outro que aprecie materialmente a nossa promoção de 04-12-2023, deferindo o requerido.
Vossas Excelências, porém, melhor apreciarão, fazendo, como sempre,
Justiça.


Neste Tribunal da Relação de Évora, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto limitou-se a apor visto nos autos.
Procedeu-se a exame preliminar.
Cumpridos os vistos legais, foi realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

B –
Da promoção que esteve na base do despacho recorrido consta, (transcrição):
“Nos presentes autos foram apreendidos aos arguidos cinco telemóveis – fls. 24, 27 e 46.
Importa verificar o conteúdo dos referidos aparelhos, designadamente o correio eletrónico e comunicações de natureza similar no sentido de aferir se os arguidos mantiveram conversações com fornecedores ou pessoas a quem o produto estupefaciente apreendido se destinava e que possam ser identificados.
Note-se que o crime sob investigação é normalmente praticado com recurso às telecomunicações, sendo que cada vez mais se vê o recurso a formas alternativas de comunicações (nomeadamente o uso de redes sociais como o telegram ou o Whatsapp, Signal, que usam tecnologia de encriptação) como alternativa às chamadas telefónicas e mensagens de SMS, para frustrar o recurso as escutas telefónicas.
As informações que se pretendem obter visam complementar os indícios já recolhidos nos autos quanto à prática pelos arguidos da atividade ilícita de transporte e venda de estupefacientes.
Nos termos do disposto no art. 17° da Lei n° 109/2009, de 15 de Setembro, quando, no decurso de uma pesquisa informática ou outro acesso legítimo a um sistema informático, forem encontrados, armazenados nesse sistema informático ou noutro a que seja permitido o acesso legítimo a partir do primeiro, mensagens de correio electrónico ou registos de comunicações de natureza semelhante, o juiz pode autorizar ou ordenar, por despacho, a apreensão daqueles que se afigurem ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova, aplicando-se correspondentemente o regime da apreensão de correspondência previsto no Código de Processo Penal.
Considerando o supra exposto, e revelando-se de interesse para o prosseguimento da investigação e descoberta da verdade material, nos termos do previsto no artigo 17º da Lei nº 109/2009, de 15 de setembro, e nos artigos 179º e 269º, nº 1, alínea d) do CPP, promovo se autorize a pesquisa para apreensão das mensagens de correio eletrónico ou registos de natureza semelhante que se encontrem nos telemóveis apreendidos, em quaisquer dispositivos de memória a estes ligados (cartões SIM, cartões de memória) e em quaisquer contas (de email, de redes sociais) armazenadas em servidores remotos, cujos dados de acesso estejam registados nesses aparelhos, sem prejuízo de ser observado o disposto no artigo 179º do CPP com extração dos dados sem visualização prévia para apresentação em juízo, a fim de se aferir da sua junção aos autos em concreto”.

O despacho de 06-12-2023, ora recorrido encontra-se fundamentado nos seguintes termos (transcrição):
“Os telemóveis já estão apreendidos, pelo que, não incumbe ao JIC ordenar a sua apreensão ou triagem.
Uma vez que só incumbe ao JIC o conhecimento em 1ª mão de correio electrónico e de natureza similar e nada mais, terá que ser apresentado tal conteúdo (e não outro), sem conhecimento do mesmo por quem realizar tal pesquisa/triagem.
Desta maneira, o JIC quanto à apreensão requerida ou triagem de correio electrónico e similar, nada tem a determinar, devolvendo-se os autos”.

Posteriormente a Exma. Juiz de Instrução Criminal sustentou este seu entendimento nos seguintes termos, (despacho de 06-12-2023), (transcrição):
“Sem prejuízo das motivações de recurso, mantenho o despacho recorrido.
Como se sabe é controvertida a questão de se saber qual é a exacta intervenção do JIC e do M.P., face ao teor do artigo 17º da Lei do Cibercrime.
Perante tais motivações de recurso, salvo o devido respeito, a apreensão física de um suporte electrónico e informático, visando obter meios de prova relevantes, em concreto o acesso a conteúdo digital (não sendo fito de tal apreensão o suporte per si e o destino a dar a esse suporte), implica também e concomitantemente a apreensão do conteúdo digital de tal suporte, sendo que esse conteúdo existe não só no imei (o telemóvel), no cartão SIM inserto em tal imei e também em ambiente digital), ainda que tal apreensão seja meramente provisória e sendo tornada definitiva pela intervenção do Juiz que conhece do conteúdo e determina a sua junção aos autos.
A jurisprudência tem distinguido entre apreensões provisórias dos suportes e conteúdos e definitivas, estas ocorrendo após a apresentação ao juiz e conhecimento deste do conteúdo de correio electrónico.
Mais, o artigo 17º da Lei do Cibercrime não exige que o JIC ordene ou autorização a apreensão de tal conteúdo, antes de o mesmo lhe ser presente.
Ao invés, detectando-se correio electrónico pelos OPC – diz tal artigo -, no âmbito de pesquisa de dados informáticos ou de um acesso legitimo, os mesmos apresentam-no ao JIC que ordena a sua apreensão, após dele tomar conhecimento, dele juntando-o aos autos, se relevante, aplicando-se assim, parcialmente o artigo 179º, nº 3 do CPP.
O acto da apreensão corresponde à determinação do JIC em juntar tal correio electrónico aos autos, se entender o mesmo relevante e após dele tomar conhecimento e tal consubstancia uma apreensão definitiva.
E tal tem a sua justificação.
Situações há em que o JIC não pode ordenar ou autorizar, previamente, a apreensão, pesquisa e triagem de suportes electrónicos e informáticos e seu conteúdo de correio electrónico, mormente nas situações das medidas cautelares ou de polícia ou situações em que ocorre apreensão sem intervenção do Juiz.
A remessa para o artigo 179º do CPP não é total e integral, mas reporta-se ao conhecimento e junção aos autos se relevante o conteúdo.
A violação dos direitos fundamentos, mormente a reserva da vida privada ou o sigilo nas telecomunicações só ocorre com o conhecimento efectivo do conteúdo digital de um suporte electrónico e/ou informático e não com a simples apreensão do seu suporte, triagem de correio electrónico, sem conhecimento e apresentação de tal conteúdo ao JIC, sem conhecimento prévio do seu teor e conteúdo, sendo que a intervenção do JIC tem fundamento na sua posição de garante dos direitos, liberdades e garantias e logo a sua intervenção justifica-se quando as mesmas estão efectivamente em causa.
Desta maneira, não entendo que o JIC tenha que ordenar a apreensão física dos suportes e, depois, conhecido o conteúdo, ordenar a apreensão do conteúdo digital, que entender relevante e tal na resulta do artigo 17º da Lei do Cibercrime.
V. Exas., contudo, farão a costumada Justiça.

II – FUNDAMENTAÇÃO

1 - Âmbito do Recurso

De acordo com o disposto no artigo 412º, do Código de Processo Penal e com a Jurisprudência fixada pelo Acórdão do Plenário da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça nº 7/95, de 19-10-95, publicado no D.R. I-A de 28-12-95 (neste sentido, que constitui jurisprudência dominante, podem consultar-se, entre outros, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de Setembro de 2007, proferido no processo nº 07P2583, acessível em www.dgsi.pt, que se indica pela exposição da evolução legislativa, doutrinária e jurisprudencial nesta matéria) o objecto do recurso define-se pelas conclusões que o recorrente extraiu da respectiva motivação, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, que aqui e pela própria natureza do recurso, não têm aplicação.

Assim, vistas as conclusões do recurso interposto, verificamos que a questão suscitada é a seguinte:
- Competência para a apreensão da correspondência em suporte informático, mormente encontrada em telemóvel já apreendido nos autos.

2 - Apreciando e decidindo:

A questão suscitada nos presentes autos, foi recentemente objecto de Acórdão de Fixação de Jurisprudência – Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de Fixação de Jurisprudência proferido em 11-10-2023 no Processo nº184/12.5TELSB-R.L1-A.S1).
Tendo sido fixada Jurisprudência no sentido:
“Na fase de inquérito, compete ao juiz de instrução ordenar ou autorizar a apreensão de mensagens de correio eletrónico ou de outros registos de comunicações de natureza semelhante, independentemente de se encontrarem abertas (lidas) ou fechadas (não lidas), que se afigurem ser de grande interesse para descoberta da verdade ou para a prova, nos termos do art. 17º, da Lei nº 109/2009, de 15-09 (Lei do Cibercrime)”.

A questão controvertida no presente momento processual, poder-se-á sintetizar em saber se perante um suporte informático que contenha correspondência privada, quem é competente para de uma forma sumária avaliar a mesma e aferir da sua eventual relevância para o inquérito ou da total irrelevância para o mesmo, constituindo apenas conteúdos do foro privado e pessoal, ou não, sem qualquer importância para o objecto dos autos (a triagem da correspondência como é referido no despacho recorrido).
Resulta da Constituição da República Portuguesa, que determinadas intervenções na esfera privada dos cidadãos terão de ser supervisionadas e posteriormente autorizadas pela intervenção de um juiz de instrução criminal, para efeitos de avaliação da necessidade da prática de actos de investigação que sejam passíveis de atingir direitos fundamentais, artigos 20º, nº 1, nº 4 e nº 5, 32º, nº 4 e 202º, nº 2, da Constituição da República Portuguesa.
A tutela jurisdicional efetiva de direitos, liberdades e garantias é uma competência exclusiva do juiz de instrução criminal, não concorrente com quaisquer competências investigatórias do Ministério Público ou dos órgãos de polícia criminal.

Resulta do artigo 17º, da Lei nº 109/2009, de 15 de Setembro, (Lei do Cibercrime) que:
“Quando, no decurso de uma pesquisa informática ou outro acesso legítimo a um sistema informático, forem encontrados, armazenados nesse sistema informático ou noutro a que seja permitido o acesso legítimo a partir do primeiro, mensagens de correio electrónico ou registos de comunicações de natureza semelhante, o juiz pode autorizar ou ordenar, por despacho, a apreensão daqueles que se afigurem ser de grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova, aplicando-se correspondentemente o regime da apreensão de correspondência previsto no Código de Processo Penal”.
Esta legislação especial veio estabelecer disposições penais materiais e processuais relativas ao domínio do cibercrime e da recolha de prova em suporte electrónico – secundarizando o Código de Processo Penal, nomeadamente o regime processual das comunicações telefónicas, previsto nos artigos 187º a 190º do CPP, deixou de ser aplicável, por extensão, às «telecomunicações electrónicas», «crimes informáticos» e «recolha de prova electrónica/informática» e só sendo aplicável a estas matérias o regime geral do Código Penal e do Código de Processo Penal se não contrariar este mesmo regime especial contido na Lei do Cibercrime.
“Para o efeito, é necessário que o Juiz seja a primeira pessoa a tomar conhecimento do conteúdo apreendido, sob pena de a omissão total do exame (enquanto acto processual legalmente obrigatório) configurar uma nulidade prevista no artigo 120º, nº 2, alínea d), do Código de Processo Penal.
E, depois, é necessário que o Juiz considere o respectivo conteúdo como relevante para a descoberta da verdade ou para a prova dos factos investigados. Esta ponderação judicial subsequente é sempre aferida em função do valor daquilo que concretamente tenha sido apreendido – sendo necessário este subsequente juízo de prognose favorável quanto àquilo que efectivamente tenha sido apreendido, para que o Juiz ordene a sua junção aos autos (através de despacho fundamentado e recorrível nos termos dos artigos 16º, nº 3, e 17º da Lei do Cibercrime em conjugação com os artigos 97º, nº 5, e 399º do Código de Processo Penal “ex vi” do artigo 28º da Lei do Cibercrime, e só então ficará legitimada a sua utilização no processo”.(Acórdão da Relação de Lisboa de 11-05-2023, Proc. 215/20.5T9LSb-C.L1-9, in www.dgsi.pt.
Então os Órgãos de Polícia Criminal transmitem a correspondência intacta ao juiz e é este que procede à abertura e primeiro toma conhecimento sumário do seu conteúdo e determina por despacho, a apreensão daqueles que se afigurem ter interesse para a descoberta da verdade ou para a prova, seguindo-se o conhecimento pelo Ministério Público para fundamentada tomada de posição sobre os mesmos e, finalmente, fundamentada e recorrível decisão judicial sobre a concreta admissão e junção aos autos, ou não, como meio de prova.
O juiz durante o inquérito não é um juiz investigador, mas sim um juiz de direitos, liberdades e garantias a quem compete, nomeadamente, autorizar ou ordenar apreensões e a quem compete ser a primeira pessoa a tomar conhecimento da correspondência/correio electrónico/registos de comunicações de natureza semelhante apreendidas.
E, depois dessa primeira tomada de conhecimento pelo Juiz de Instrução, caberá ao Ministério Público (enquanto autoridade judiciária que dirige o inquérito e a respectiva investigação criminal) a competência para tomar conhecimento de todos aqueles meios de prova em suporte electrónico apreendidos.
Para aferir e pronunciar-se, fundamentada e detalhadamente, sobre a concreta relevância probatória, ou não, de todos ou de cada um desses meios probatórios apreendidos em face dos crimes investigação.
Por fim, prolacção de decisão judicial fundamentada e recorrível, sobre a concreta admissão e junção aos autos, ou não, da correspondência apreendida tida como relevante como meio de prova.
Cumprindo-se o determinado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de Fixação de Jurisprudência, proferido em 11-10-2023:
“Na fase de inquérito, compete ao juiz de instrução ordenar ou autorizar a apreensão de mensagens de correio eletrónico ou de outros registos de comunicações de natureza semelhante, independentemente de se encontrarem abertas (lidas) ou fechadas (não lidas), que se afigurem ser de grande interesse para descoberta da verdade ou para a prova, nos termos do art. 17º, da Lei nº 109/2009, de 15-09 (Lei do Cibercrime)”, ou seja, o primeiro contacto com os registos informáticos apreendidos, terá de ser efectuado ainda que sumariamente pelo Juiz de Instrução, como garante dos direitos, liberdades e garantias e só posteriormente pelo titular do inquérito, de onde resulta que quer as mensagens abertas quer as mensagens fechadas, terão em primeiro lugar de ser avaliadas sumariamente na sua relevância probatória pelo Juiz de Instrução.

Atenta a evidente falta de fundamento legal para o despacho recorrido, terá o mesmo de ser revogado e, substituído por outro, que determine os procedimentos adequados para a triagem e eventual apreensão dos conteúdos constantes dos suportes informáticos, com eventual relevância probatória para os factos integrantes do objecto dos autos, nos termos do disposto no artigo 17º, da Lei nº 109/2009, de 15-09 (Lei do Cibercrime), procedendo nesta conformidade o recurso interposto pelo Ministério Público.

Sem custas, atenta a procedência do recurso e por delas estar isento o Ministério Público, artigo 522º, do Código de Processo Penal.

III – DISPOSITIVO

Face ao exposto, acordam os juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em:

- Julgar procedente o recurso interposto pelo Ministério Público e, em consequência, revogar o despacho recorrido que deverá ser substituído por outro, que determine os procedimentos adequados para a triagem e eventual apreensão dos conteúdos constantes dos suportes informáticos, com eventual relevância probatória para os factos integrantes do objecto dos autos, nos termos do disposto no artigo 17º, da Lei nº 109/2009, de 15-09 (Lei do Cibercrime),

Sem custas atenta a procedência do recurso e por delas estar isento o Ministério Público, artigo 522º, do Código de Processo Penal.

Certifica-se, para os efeitos do disposto no artigo 94º, nº 2, do Código do Processo Penal, que o presente Acórdão foi pelo relator elaborado em processador de texto informático, tendo sido integralmente revisto pelos signatários.

Évora, 07-05-2024
Fernando Pina
Carlos de Campos Lobo
Renato Barroso