Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
| Processo: |
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| Relator: | FILIPE AVEIRO MARQUES | ||
| Descritores: | NOTIFICAÇÃO DECISÃO DA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA IRREGULARIDADE SANAÇÃO FUNDAMENTAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS RECURSO DE CONTRA-ORDENAÇÃO ERRO NOTÓRIO NA APRECIAÇÃO DA PROVA SANÇÃO ACESSÓRIA | ||
| Data do Acordão: | 04/09/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | RECURSO PENAL - CONTRA-ORDENAÇÃO | ||
| Decisão: | CONFIRMADA A DECISÃO RECORRIDA | ||
| Área Temática: | SOCIAL | ||
| Sumário: | Sumário: 1. A falha da notificação integral da decisão administrativa de aplicação de coima configura uma irregularidade da notificação (cf. artigo 123.º do Código de Processo Penal), que poderá inquinar o restante procedimento. 2. Tendo, no entanto, sido oficiosamente reparada a falha pela autoridade administrativa no momento em que dela tomou conhecimento ao determinar uma nova notificação e que, desta vez, foi recebida sem que fosse invocada qualquer outra irregularidade ou falha, deve considerar-se sanado o vício. 3. Fica cumprido o dever de fundamentação, tal como previsto no artigo 39.º, n.º 4, da Lei 107/2009, aplicável ao caso, quando na sentença se remete para os factos dados como provados pela autoridade administrativa, após análise crítica da prova dos autos e apresentada em audiência e ainda se acrescentam ao elenco dos factos provados os que haviam sido alegados na impugnação judicial. 4. O erro notório na apreciação da prova, como os restantes vícios do n.º 2, do artigo 410.º CPP, deve resultar do texto da decisão recorrida, sem influência de elementos exteriores àquela, a não ser as regras da experiência comum. 5. No recurso deverá o recorrente indicar especificamente o facto ou factos dados como provados ou não provados que contrariam, com toda a evidência, na perspectiva de uma pessoa de formação média, a lógica e as regras da experiência, não bastando uma mera discordância quanto à análise crítica da prova que foi feita pelo tribunal a quo para que se possa afirmar a existência de erro notório na apreciação da prova. 6. Para a aplicação de qualquer sanção acessória, importa atentar na verificação do pressuposto específico da cada uma, sendo ainda necessário que se verifiquem os pressupostos gerais de aplicação da sanção acessória em apreciação. | ||
| Decisão Texto Integral: | Recurso Penal n.º 3955/22.0T8STB.E1 (Secção Social) Relator: Filipe Aveiro Marques 1.º Adjunto: Mário Branco Coelho 2.ª Adjunta: Paula do Paço * *** * Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO: I.A. AA impugnou judicialmente a decisão proferida pelo INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL – Centro Distrital da Segurança Social de Setúbal, no âmbito do processo contraordenacional n.º 201....044, que lhe aplicou coima de 20.000,00€ pela prática de uma contraordenação muito grave, prevista e punida nos termos dos artigos 11.º, 39.º-B, alínea a) e 39º.-E, alínea a), do Decreto-Lei n.º 64/2007, de 14 de Março. Após julgamento foi proferida sentença pelo Juízo do Trabalho de Setúbal - Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal, que manteve a decisão da autoridade administrativa. I.B. A arguida veio recorrer dessa sentença e apresentou motivação que termina com as seguintes: “CONCLUSÕES I. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julga inverificada a nulidade da notificação levada a cabo pela ISS, IP bem como determina a aplicação da sanção acessória de encerramento de estabelecimento prevista no artigo 39.º - H do DL 64/2007. II. A Arguida invocou – e demonstrou - a nulidade da notificação levada a cabo pelo ISS, IP e, por mera cautela de patrocínio, alegou o que entendeu por conveniente quanto à sanção acessória aplicada, tendo em conta que a mesma não é de aplicação obrigatória. III. O douto tribunal a quo considera que a Arguida se conformou com a prática da infracção e com a condenação na coima de € 20.000,00. IV. Conclusão esta, manifestamente errada, porque a Arguida não pode conformar-se com uma decisão cujo teor integral desconhece e, consequentemente, com a respectiva coima, porque a decisão lhe foi notificada com uma página completa em falta. V. Tanto não se conformou que invocou a sua nulidade e, por mera cautela, exerceu a defesa possível face à alegada nulidade da notificação da decisão da entidade administrativa. VI. Donde, demonstrado que foi que a decisão administrativa em apreço não foi integralmente comunicada à Arguida, tendo sido omitida parte relevante da fundamentação da decisão, mal andou o douto tribunal a quo ao não ter apreciado tal nulidade em momento anterior à marcação do julgamento e mal andou ao julgar inverificada a arguida nulidade VII. Termos em que a douta sentença deve ser revogada, julgando-se verificada a nulidade da notificação da decisão da Segurança Social por omissão de parte substancial do teor da mesma, concretamente a página 2 de 3 páginas, conforme documento junto aos autos. VIII. O douto tribunal a quo, em sede de fundamentação, começa por referir o disposto no artigo 39.º, n.º 4 da Lei n.º 107/2009 de 14/09 e afirma que “(…) a recorrente não trouxe qualquer elemento probatório adicional, diverso daqueles que já se encontravam no processo que foram considerados pelo ISS.” IX. Refere, ainda, o douto tribunal a quo que as testemunhas arroladas pela recorrente não exerciam funções à data da visita inspectiva pelo que nada sabem do que sucedia, então. X. Porém, o douto tribunal a quo não decidiu por remissão para a fundamentação, de facto e de Direito, da decisão administrativa condenatória, antes proferiu decisão própria, nomeadamente ao afirmar que “(…) resulta ainda como provado que, após a data da visita inspectiva (…)”, e dissertando sobre a demais factualidade alegada pela Recorrente – sem que tal factualidade seja julgada provada ou não provada –, pronunciando-se sobre a culpa e até sobre questões que não foram alegadas pelo ISS, IP na sua decisão nem pela recorrente. XI. Com efeito, na página 20, § 4.º da douta sentença recorrida afirma o douto tribunal a quo “(…) não podemos deixar de notar que a arguida só consegue praticar os preços que pratica porque a sua actividade não está conforme a lei e os encargos associados ao cumprimento da mesma.” sem que tais preços sejam mencionados na matéria de facto provada, bem como quais os valores de mercado praticados por quem suporta os encargos decorrentes da titularidade de uma licença provisória ou de um alvará ou quais os encargos associados ao cumprimento da lei que a Arguida não suporta e qual a sua relação com os preços praticados pela Arguida e os preços praticados por entidades titulares de alvará ou licença provisória. XII. Assim, da douta sentença posta em crise, tinham de constar, obrigatoriamente, os factos provados e não provados. XIII. Ao não elencar os factos provados e não provados, designadamente os alegados pela Arguida e susceptíveis de influenciar na apreciação da culpa e da ilicitude da conduta, o douto tribunal a quo violou o disposto no artigo 374.º, n.º 2 do CPP, aplicável ex vi do disposto no artigo 41.º do RGCO aplicável ex vi do artigo 60.º da Lei 107/2009 de 14.09. XIV. Termos em que a douta sentença recorrida é nula. XV. A douta sentença posta em crise padece de erro notório na apreciação da prova. XVI. O douto tribunal a quo afirma que a Arguida nunca solicitou o licenciamento da actividade de apoio social a idosos que exerce. XVII. Tal afirmação resulta contrariada por prova documental junta pela Arguida com a sua impugnação, nomeadamente o Parecer da Autoridade Nacional de Protecção Civil emitido em nome de BB, proprietária do imóvel onde funciona o estabelecimento de apoio a idosos gerido pela Arguida, e datado de 8 de Agosto de 2016, portanto emitido em momento anterior à decisão da autoridade administrativa. XVIII. Assim como a conclusão, constante da fundamentação da douta sentença, de que o estabelecimento não possuía instalações adequadas é contrariado pelo Parecer Técnico AS-175-2015, emitido pelo ISS, IP em Agosto de 2015 e junto pela Arguida – referência citius 6794179 – do qual consta, em conclusão, que o estabelecimento observava as condições técnicas legalmente estabelecidas para a instalação e funcionamento da resposta social em causa. XIX. Os referidos documentos atestam que, em momento muito anterior à acção inspectiva de que se ocupam os presentes autos, a Arguida se encontrava a realizar todas as diligências necessárias à obtenção do Alvará de funcionamento ou, pelo menos, da Licença de Utilização Temporária. XX. Os sobreditos documentos não foram impugnados pelo que o douto tribunal a quo estava obrigado ao seu exame e apreciação, porquanto são relevantes para a descoberta da verdade e boa decisão da causa, o que não sucedeu. XXI. Além do mais, as testemunhas inquiridas, CC e DD, cujos depoimentos se encontram gravados no sistema Habilus e aqui se dão por reproduzidos na íntegra atenta a exiguidade dos mesmos, desde o minuto zero até final, depuseram sobre toda a matéria vertida na impugnação judicial da recorrente, desde a origem desta actividade, à caracterização geográfica e demográfica da zona onde o estabelecimento se encontra inserido, às instalações, aos cuidados prestados aos idosos, à personalidade e motivações da Arguida. XXII. Nenhum facto, de entre os alegados pela Recorrente e referidos pelas testemunhas foi dado como provado ou não provado, nem foi apreciada a sua relevância para a qualificação da conduta da arguida a título de dolo ou negligência nem para o grau de ilicitude na prática da contra-ordenação. XXIII. A douta sentença recorrida padece, assim, de erro notório na apreciação da prova. XXIV. Não pode o douto tribunal a quo fazer afirmações como as que constam da douta sentença recorrida: “(…): de boas intenções está o inferno cheio.” Porquanto a mesma se afigura descabida e reveladora de desconsideração para com a pessoa da Arguida, a quem assiste o direito de defesa nos termos que entender mais adequados. XXV. A intenção constitui um processo mental, interno que pode revelar-se, ou não, através de factos objectivos julgados provados; logo, ainda que se prove a intenção na prática de determinada conduta ao tribunal apenas cabe ajuizar das consequências jurídicas da intenção revelada pelos factos provados mas não efectuar juízos ou censuras morais, como sucede na presente sentença, da qual não constam, sequer, os factos provados e não provados. XXVI. Sem prejuízo da nulidade invocada supra, o douto tribunal a quo deu como provado que a Arguida não só efectuou melhorias nas instalações como se encontra a diligenciar, junto da Câmara Municipal de Local 1, pela alteração da licença de utilização do imóvel para serviços, o que constitui condição essencial para que a Arguida possa requerer o Alvará de Funcionamento para até 14 idosos. XXVII. A Arguida não defende – nem nunca defendeu – que o estabelecimento deve funcionar sem licenciamento. XXVIII. O que a Arguida defende é que, reunindo o estabelecimento todas – ou a maioria - as condições técnicas para poder funcionar, o encerramento constitui sanção desproporcional e socialmente potenciadora do recurso a lares sem condições e com deficiências graves de funcionamento. XXIX. O que se pedia – e pede - é que fosse revogada a decisão da autoridade administrativa e concedido prazo adequado à Arguida para finalizar o processo de alteração da licença de utilização junto do Município de Local 1 e, logo que esse processo finalizasse, requerer o Alvará. XXX. E com o necessário e imprescindível acompanhamento do ISS, IP por forma a garantir a integral adequação das instalações e a qualidade do serviço prestado aos idosos. XXXI. Chamamos à colação a Recomendação do Provedor de Justiça n.º 002/A/2005, no Processo R-3381/03 (UP) e dirigida ao Presidente do Conselho Directivo do Instituto de Segurança Social, IP, a propósito de lares ilegais, disponível em www.provedor-jus.pt/recomendacoes-e-outrasdecisoes, que se dá por reproduzida. XXXII. Ora, no caso vertente, e atendendo ao teor da decisão condenatória da autoridade administrativa, verifica-se que, em 2018, era imputado ao estabelecimento da Arguida uma “desadequação das instalações do estabelecimento” e a “inadequação das condições de funcionamento do estabelecimento”, sem que tais expressões tenham sido suficientemente concretizadas. XXXIII. A decisão administrativa condenatória refere, efectivamente, a falta de licenças, de documentos administrativos cuja obtenção é obrigatória e atestam a conformidade do estabelecimento. XXXIV. Porém, não invoca, em concreto, nenhum facto que permita concluir que a falta desses documentos administrativos implicasse que o estabelecimento não cumprisse as normas legais em matéria de higiene, salubridade, segurança, bem-estar e, consequentemente que os idosos estivessem em perigo. XXXV. A Provedoria de Justiça, na Recomendação supra indicada, entendeu – e muito bem – a realidade de alguns lares ilegais no nosso País que reúnem as condições mínimas para funcionamento mas carecem de apoio para implementar todos os requisitos necessários e, em especial, carecem de apoio no decorrer do processo administrativo de obtenção da licença. XXXVI. O legislador também estava ciente desta realidade. XXXVII. A interpretação da norma constante do artigo 39.º - H, n.º 1, alínea d) do DL 64/2007 permite reconstruir o pensamento do legislador. XXXVIII. Se o legislador entendesse que a falta de alvará de funcionamento ou autorização provisória tinha como única consequência o encerramento do estabelecimento não teria previsto a mera possibilidade aplicação dessa sanção. XXXIX. Ao prever que, cumulativamente com as coimas previstas, “podem” ser aplicadas, além do mais, a sanção acessória de encerramento do estabelecimento, o legislador entendeu que, não obstante a ausência de licença de funcionamento, se o estabelecimento inspeccionado reunir condições para o efeito, deve ser promovido o seu licenciamento, necessariamente com a orientação do ISS, IP relativamente às questões técnicas que careçam ser aperfeiçoadas ou implementadas com vista ao licenciamento. XL. A lei deve ser interpretada e aplicada “cum grano salis” e com uma génese humanista, diferenciadora do bem e do mal, do possível e do impossível, adequando-se a cada momento histórico e a cada caso concreto, desde que o texto da lei tenham um mínimo de correspondência verbal com a interpretação que dela se faz. XLI. O legislador foi sensível à realidade do envelhecimento da população portuguesa e às dificuldades com que pessoas colectivas e singulares, de boa índole, podem enfrentar na legalização de uma resposta social de apoio a idosos. XLII. Razão pela qual o julgador deve ser, também, sensível a essa realidade e apurar se, no caso concreto, o encerramento é a solução adequada atendendo à (in)existência de maus tratos, condições logísticas totalmente (in)adequadas e consequente objectivo de lucro fácil, evidenciado pela ausência de um mínimo de condições dignas para acolhimento de um ser humano em processo de envelhecimento. XLIII. Não sendo esse o caso, o julgador deve dar preferência à possibilidade de legalização do estabelecimento, fixando, em face das circunstâncias, um prazo adequado para o efeito e o acompanhamento obrigatório pelos serviços competentes do ISS, IP a fim de garantir a qualidade de vida dos idosos até à conclusão do processo de licenciamento. XLIV. Pelo que, e atendendo à prova documental junta com a impugnação, em especial os documentos 3 a 24, se pugna pela revogação da decisão recorrida, proferindo-se acórdão que fixe um prazo adequado à obtenção da licença de funcionamento, considerando a necessária precedência da alteração da licença de utilização do imóvel pelo Município de Local 1, com o acompanhamento dos serviços competentes do ISS, IP a fim de identificarem as questões técnicas a melhorar ou implementar com vista à emissão da referida licença. Termos em que o presente recurso deve ser julgado procedente, com as legais consequências, como é de Justiça!” I.C. O Tribunal a quo pronunciou-se no sentido de não se verificar a apontada nulidade da sentença e admitiu o recurso. O Ministério Público junto do Tribunal a quo respondeu às alegações defendendo a improcedência do recurso. I.D. Neste Tribunal, o Ministério Público emitiu parecer no sentido de que a nulidade da notificação seja procedente e que daí se retire todas as consequências. Não houve resposta. Após os vistos, cumpre decidir. *** II. QUESTÕES A DECIDIR: O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões que o recorrente extrai da respetiva motivação, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso, conforme o disposto nas disposições conjugadas dos artigos 403.º e 412.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Penal, aplicáveis por força do artigo 41.º do Regime anexo ao Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro (RGCO) e artigos 50.º, n.º 4 e 60.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro. Assim, as questões a analisar são as seguintes: a. Eventual nulidade por falta de notificação integral da decisão administrativa; b. Eventual nulidade da sentença; c. Existência de erro notório na apreciação da prova; d. Existência de errada apreciação de direito, nomeadamente ao nível da aplicação da sanção acessória. *** III. FUNDAMENTAÇÃO: III.A. Questão prévia sobre notificação da decisão da autoridade administrativa: Invoca a recorrente que a decisão da autoridade administrativa lhe foi notificada com uma página em falta, não se conformou com tal nulidade e exerceu a defesa possível e que mal andou o Tribunal em não ter apreciado tal nulidade em momento anterior à marcação do julgamento e mal andou em julgar não verificada tal nulidade, pelo que se deve revogar a sentença “por nulidade da notificação da decisão da Segurança Social” (conclusões I a VII). A questão foi expressamente conhecida na sentença recorrida nos seguintes termos: “I. Arguiu a arguida a nulidade da notificação, pois a notificação remetida à mandatária esta estava incompleta. O que é certo é que a arguida reagiu contra aquela decisão, no que respeita à questão que a opôs ao ISS, IP. Note-se que a arguida conformou-se com a prática da infracção e com a condenação na coima de 20.000,00 €. Só entende exagerada a aplicação da sanção acessória. Ora, a este respeito a arguida e a sua Ilustres Defensora demonstraram ter conhecimento do ali decidido e dos elementos relevantes para essa decisão, tomando posição definida. Julgamos, por isso, que aquele vício se mostra sanado, pelo que inexiste uma nulidade que importe a anulação dos actos posteriores à notificação. II. Face ao exposto, julgo inverificada a arguida nulidade”. O Ministério Público junto do Tribunal a quo entendeu que não se verifica a apontada nulidade, já que a autoridade administrativa reconheceu que, por manifesto lapso dos serviços, a decisão não foi integralmente remetida à arguida, encontrando-se em falta o teor da decisão que aplicou a sanção acessória de encerramento, tendo tal autoridade administrativa procedido a nova notificação com cópia integral da decisão condenatória proferida no processo de contraordenação, nos termos do artigo 8.º, n.º 1 e artigo 25.º da Lei 107/2009, de 14 de Setembro. Tal notificação acautelou o prazo a que alude o artigo 33.º, n.º 2 da Lei 107/2009, de 14 de Setembro, permitindo a arguida realizar nova impugnação, contendo novos aspetos que pretendesse sindicar. Já neste Tribunal o Ministério Público foi de parecer que, faltando uma folha à decisão que foi notificada à arguida, temos necessariamente que concluir que há uma parte da decisão que nunca foi do seu conhecimento. Consequentemente, quando a arguida se defendeu fê-lo por razões de cautela e não lhe foi possível contradizer (por os desconhecer) todos e cada um dos argumentos da autoridade administrativa, pelo que essa defesa, necessariamente imperfeita, não pode sanar qualquer vício. Para conhecimento da questão em análise importa ter presente os seguintes factos que se retiram da leitura do processado: 1. No dia 29/03/2018, pelas 14 horas, uma equipa inspectiva constituída por dois inspectores da Segurança Social realizaram uma averiguação num estabelecimento de apoio a idosos. 2. Dessa visita resultou um relatório que, face aos factos apurados, concluiu pela instauração de processo de contraordenação “por funcionamento de estabelecimento ilegal de ERPI, sem possuir licença de funcionamento ou autorização provisória de funcionamento e sanção acessória de encerramento”. 3. Por carta registada com aviso de recepção de 31/08/2020 a arguida foi notificada para contestar os factos ou para, até à decisão, proceder ao pagamento voluntário da coima a liquidar pelo mínimo. 4. Por email de 2/10/2020, enviado pela Ilustre mandatária da arguida (que nessa mesma ocasião juntou procuração forense), foi requerido o deferimento do pagamento da coima em 60 prestações de 333,33€ cada, acrescendo à primeira o valor das custas. 5. Por despacho da instrutora do processo administrativo comunicado à Ilustre advogada por ofício de 21/12/2021 foi comunicado que a possibilidade do pagamento em prestações apenas está prevista para os casos de pagamento da coima após decisão. 6. Em 21/12/2021 é proferida decisão de aplicação de coima e sanção acessória de encerramento do estabelecimento. 7. Por ofício de 25/01/2022 foi notificada à Ilustre advogada a decisão final de aplicação de coima e sanção acessória, que foi recebida a 31/01/2022. 8. Por ofício de 29/01/2022 foi notificada a decisão à arguida. 9. Por via postal registada em 21/02/2022, através da sua Ilustre advogada, a arguida apresentou impugnação judicial junto do Centro Distrital de Local 2 da Segurança Social e, juntando cópia da notificação que foi dirigida à Ilustre advogada onde faltava uma folha, além do mais, invocou a nulidade da notificação da decisão. 10. Com data de 25/02/2022 (registado com aviso de recepção) foi expedido ofício (fls. 95 dos autos) dirigido à Ilustre advogada subscritora da impugnação judicial e acompanhado de cópia da decisão com o seguinte teor: “Acusada a receção da impugnação judicial apresentada por V. Exa., nos termos das disposições conjugadas dos artigos 32.º a 35.º e 25.º, todos da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto e pela Lei n.º 55/2017, de 17 de julho, e compulsado o seu teor foi possível verificar que, de facto, o teor da decisão que aplicou a sanção acessória de encerramento não foi, por manifesto lapso destes serviços, remetido integralmente à arguida, juntamente com o parecer onde recaiu a decisão condenatória prolatada pela Exma. Sra. Diretora do Centro Distrital de Segurança Social de Local 2, pois que se encontrava em falta a página 2 de 3, factologia ocorrida aquando da impressão em documento fotocopiado. Sem embargo do supradito e notado lapso poder, eventualmente, consubstanciar uma irregularidade, sem conceder e à cautela pelo presente se efetua nova notificação por forma a suprir o aspeto em causa, o qual, contudo, novamente sem conceder, quanto muito apenas afetaria o aspeto inerente à sanção acessória, plasmado em documento autónomo, pois que a parte concernente à coima, essa está vertida em documento integralmente enviado à arguida, num total de 5 páginas. Destarte, pelo presente fica V. Exa. notificada, nos termos do artigo 8.9, n.2 1, e para efeitos do disposto no artigo 25.º, ambos da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, na sua redação atual, da decisão condenatória proferida no âmbito do processo de contraordenação melhor identificado em epígrafe, cuja cópia integral se anexa ao presente ofício, dele fazendo parte integrante. A notificação ora expedida, atento o facto de ser efetuada na pendência de impugnação judicial, acautelará o prazo a que alude o n.º 2 do artigo 33.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, podendo V. Exa. "limitar-se" a replicar a argumentação expendida na impugnação judicial ou invocar quaisquer outros aspetos que almeje sindicar naquela sede”. 11. Com data de 7/04/2022 foi expedido ofício (fls. 100) registado com aviso de recepção dirigido à Ilustre advogada subscritora da impugnação com o seguinte teor: “Dado não ter sido recebido o aviso de receção relativo ao envio da decisão do processo de contraordenação acima mencionado, nem qualquer resposta por parte de V. Exa, fica. de novo, notificada da decisão condenatória proferida no âmbito do mesmo. Acusada a receção da impugnação judicial apresentada por V. Exa. nos termos das disposições conjugadas dos artigos 32° a 35°, todos da Lei n° 10712009. de 14 de setembro. com as alterações introduzidas pela Lei n° 6372013, de 27 de agosto e pela Lei n° 55/2017, de 17 de julho, e compulsado o seu teor foi possível verificar que, de facto, o teor da decisão que aplicou a sanção acessória de encerramento não foi, por manifesto lapso destes serviços. remetido integralmente à arguida, juntamente com o parecer onde recaiu a decisão condenatória prolatada pela Exma. Sra. Diretora do Centro Distrital de Segurança Social de Local 2, pois que se encontrava em falta a página 2 de 3, factologia ocorrida aquando da impressão em documento fotocopiado. Sem embargo do supradito e notado lapso poder, eventualmente. consubstanciar uma irregularidade, sem conceder e à cautela pelo presente se efetua nova notificação por forma a suprir o aspeto em causa, o qual, contudo, novamente sem conceder, quanto muito afetaria o aspeto inerente à sanção acessória, plasmado em documento autónomo. pois que a parte concernente à coima. essa está vertida em documento integralmente enviado à arguida, num total de 5 páginas. Destarte, pelo presente fica V. Exa notificada, nos termos do artigo 8.º, n.º 1, e para efeitos do disposto no artigo 25.º, ambos da Lei n° 107/2009, de 14 de setembro, na sua redação atual, da decisão condenatória proferida no âmbito do processo de contraordenação melhor identificado em epígrafe, cuja cópia integral se anexa ao presente ofício, dele fazendo parte integrante. A notificação ora expedida, atento o facto de ser efetuada na pendência de impugnação judicial, acautelará o prazo a que alude o n.º 2 do artigo 33.º da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, podendo V. Exa “limitar-se" a replicar a argumentação expendida na impugnação ou invocar quaisquer outros aspetos que almeje sindicar naquela sede.” 12. Esse ofício foi recebido pela Ilustre mandatária da arguida no dia 12/04/2022. 13. Nada mais tendo sido requerido, foram os autos remetidos ao Ministério Público junto do Tribunal a quo por ofício de 17/05/2022. O que se verifica, por isso, é que nenhuma nulidade existe ou foi assacada à decisão administrativa. Apenas se invocou, na impugnação judicial apresentada, não uma falta de notificação, mas uma falha na integral notificação dessa decisão. A falha da notificação integral também não configura uma nulidade que seja, como tal, tipificada na lei (cf. artigos 118.º a 120.º do Código de Processo Penal). Essa falha configura uma irregularidade da notificação (cf. artigo 123.º do Código de Processo Penal), que poderia naturalmente inquinar o restante procedimento. Mas esse vício foi oficiosamente reparado pela autoridade administrativa no momento em que dele tomou conhecimento ao determinar uma nova notificação (e que, desta vez, foi recebida sem que fosse invocada qualquer outra irregularidade ou falha). Só pode, por isso, considerar-se que a apontada irregularidade foi reparada (com a repetição da notificação) e, por isso, não subiste. A arguida optou, perante essa nova notificação, por deixar intocada a impugnação antes apresentada, mas isso não acarreta qualquer vício do processo já que lhe foi dada oportunidade de apresentar, em prazo, nova defesa. Improcede, por isso, essa parte do recurso. * III.B. Nulidade da sentença recorrida: Invoca a arguida/recorrente (conclusões VIII a XIV) que a sentença proferida pelo Tribunal a quo é nula. Em suma, diz que da mesma tinham de constar os factos provados e não provados (cf. artigo 374.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, aplicável por força do que se estabelece nos artigos 41.º RGCO e 60.º da Lei 107/2009). O Ministério Público junto do Tribunal a quo defendeu que, no caso concreto não se vislumbra vício de nulidade, já que a sentença remete para a decisão administrativa, nos termos do disposto no artigo 39.º, n.º 4 da Lei n.º 107/2009, de 14 de Setembro. Na verdade, no regime aplicável ao caso dos autos insere-se uma norma especial (artigo 39.º, n.º 4, da referida Lei 107/2009) que afasta a aplicação do regime geral do artigo 374.º do Código de Processo Penal. Ali se dispõe que: “O juiz fundamenta a sua decisão, tanto no que respeita aos factos como no que respeita ao direito aplicado e às circunstâncias que determinaram a medida da sanção, podendo basear-se em mera declaração de concordância com a decisão condenatória da autoridade administrativa”. Ora, como se decidiu no Acórdão do Tribunal de Relação de Évora de 11/05/2023 (processo n.º 1351/22.9T8TMR.E1[1]): “De acordo com o n.º 4 do aludido artigo, o juiz fundamenta a sua decisão (sentença ou despacho judicial), tanto no que respeita aos factos como no que respeita ao direito aplicável e às circunstâncias que determinaram a medida da sanção, podendo basear-se em mera declaração de concordância com a decisão condenatória da autoridade administrativa. Decorre desta norma uma evidente intenção do legislador de simplificar a decisão judicial, ao ponto de permitir que a mesma consista numa mera declaração de concordância com a decisão condenatória da autoridade administrativa. Todavia, sempre terá de ser cumprido o dever de fundamentação da decisão, em matéria de facto e de direito” No caso dos autos, o Tribunal a quo não se limitou a uma mera declaração de concordância com a decisão da autoridade administrativa. Além de remeter para os factos dados como provados pela autoridade administrativa (e que, ainda assim, elencou em síntese), fê-lo após análise crítica da prova dos autos e apresentada em audiência. Acresce que deu como provados factos que haviam sido alegados na impugnação judicial e relativos ao ocorrido após a visita inspectiva (nos últimos parágrafos da página 15 da sentença). De resto, fundamentou de direito a integração dos elementos objectivos e subjectivo da infracção e a aplicação da coima e sanção acessória (desde pág. 16 até pág. 21). O dever de fundamentação previsto no n.º 4, do artigo 39.º, da citada Lei n.º 107/2009, foi integral e devidamente cumprido. Por conseguinte, improcede a invocada nulidade da decisão recorrida. * III.C Fundamentação de facto: III.C.1 Factos provados: Na decisão da autoridade administrativa, para a qual remeteu a sentença recorrida, constam os seguintes factos provados: 1. A arguida AA mantinha em funcionamento em 29/03/2018, uma ERPI denominada “Casa de Repouso EE”, sita na Rua ..., Local 3, sem que, para o efeito, dispusesse da devida licença ou sequer autorização provisória de funcionamento. 2. O estabelecimento em causa, à data da visita inspetiva realizada na data acima referida, acolhia 15 utentes de ambos os sexos, cujas identificações, datas de nascimento e mensalidades cobradas constam da listagem constante nos autos, para a qual remetemos e damos por reproduzida para os devidos efeitos legais. 3. As mensalidades cobradas situavam-se nos €400,00 (quatrocentos euros). 4. A arguida atuou de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que a sua conduta era proibida e censurável, e de que, para iniciar a atividade e manter em funcionamento uma ERPI, necessitava de, previamente, obter a respetiva licença. 5. Ademais verificou-se: a. As instalações do equipamento em questão não dispunham de licença de utilização para o desenvolvimento da atividade em causa, emitida pela Autarquia Local, parecer da Autoridade Nacional de Proteção Civil e auto higio-sanitário emitido pela Autoridade de Saúde. b. Não existiam a área funcional de direção e serviços técnico/administrativos. c. A cozinha não estava organizada por zonas distintas, de acordo com as exigências legais: de higienização dos manipuladores de alimentos, de preparação de alimentos e confeção de alimentos, bem como destinadas à lavagem de loiça e de utensílios de cozinha (também designada por copa suja) e à distribuição das refeições (também designada por copa limpa). d. A lavandaria dispunha de espaço exíguo, de cariz doméstico, sem que existisse a divisão entre zonas (entrada de sujos, saída de limpos), rouparia e maquinaria adequada. e. Na área do alojamento não estava assegurada a percentagem mínima de 20% de quartos individuais. f. No que concerne ao pessoal do estabelecimento, encontravam-se em falta o Diretor Técnico e um ajudante de cozinha, atendendo ao número de residentes no mesmo. 6. O Núcleo de Respostas Sociais do Centro Distrital de Segurança Social de Local 2 informou-nos que até 02/12/2021 não existia nota de qualquer diligência efetuada pela arguida em apreço com o objetivo de proceder ao licenciamento da atividade em causa. 7. Da consulta à base de dados das Finanças, resulta ainda provado que, no ano de 2020, a arguida regista um total de rendimentos no valor de €93.150,00 e um total de rendimentos líquidos de €19.691,16. A sentença recorrida considerou, ainda e expressamente, os seguintes factos como provados: 8. AA, no dia 29/03/2018, mantinha em funcionamento uma estrutura residencial para pessoas idosas, denominada “Casa de Repouso EE”, sita na Rua ..., Local 3, sem que, para o efeito, dispusesse da devida licença ou sequer autorização provisória de funcionamento. 9. A arguida atuou livre e voluntariamente, com consciência de que, para manter em funcionamento a Estrutura Residencial para Pessoas Idosas, necessitava de obter a respetivas licenças e de que as condições de instalação e funcionamento eram inadequadas 10. As instalações do estabelecimento não dispunham de licença de utilização para o desenvolvimento da atividade em causa, emitida pela Autarquia Local, parecer da Autoridade Nacional de Proteção Civil, nem auto higio-sanitário emitido pela Autoridade de Saúde. 11. Inexistia número de pessoal necessário (incluindo diretor técnico e ajudante de cozinha), suscetível de se saldar na falta de promoção/supervisão de ações tendentes à manutenção das capacidades físicas e psíquicas dos residentes na ERPI e, em consequência, no respetivo processo de envelhecimento ativo. 12. Após a data da visita inspectiva: a. A cozinha é, agora, de aço inoxidável e contém todas as zonas delimitadas; a despensa foi remodelada e reorganizada, existindo uma zona de frio separada, assim como já existe a copa limpa e a copa suja; a lavandaria conta com duas zonas distintas (uma de sujos e outra de limpos), devidamente organizadas; o gabinete médico já tem lavatório com água corrente; foi criada uma zona de recepção adequada, bem como gabinete da direcção e serviços técnicos/administrativos; o edifício já conta com plano de evacuação e saída/porta específica para o efeito. b. A arguida está a desenvolver diligências junto da Câmara Municipal de Local 1 com o objectivo de obter a alteração da licença de utilização do imóvel para serviços. * III.C.2. Erro notório da apreciação da prova: Invoca a arguida/recorrente (conclusões XV a XXIII) que a sentença padece de erro notório na apreciação da prova. O Ministério Público junto do Tribunal a quo defendeu que aquilo que o recorrente identifica como deficiente apreciação da prova é a mera desconformidade entre a apreciação da prova que o próprio faz e aquela que foi feita pelo tribunal, ao abrigo da sua livre convicção. Apreciando. Nos termos previstos pelo artigo 51.º, n.º 1, da citada Lei n.º 107/2009, o Tribunal da Relação, enquanto tribunal de segunda instância, apenas conhece da matéria de direito, pelo que se mostra vedada, no âmbito deste recurso, qualquer reapreciação da prova produzida nos autos. A única intervenção possível do Tribunal da Relação em sede de matéria de facto é a que resulta do preceituado no artigo 410.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, que aponta vícios que são de conhecimento oficioso. Dispõe-se nesse artigo que: “2 - Mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum: a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada; b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão; c) Erro notório na apreciação da prova.” Como se extrai da jurisprudência constante e uniforme dos Tribunais Superiores, (ver Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 11/12/1996, processo n.º 96P1188[2] e, dessa mesma data de 11/12/1996, processo n.º 048697[3] e, mais recente, de 17/12/2024, processo n.º 68/21.6GHSTC.S1[4]) a característica comum a todos os vícios previstos nesse n.º 2, do artigo 410.º, do Código de Processo Penal, é que devem resultar do texto da decisão recorrida, sem influência de elementos exteriores àquela, a não ser as regras da experiência comum (sem que dessa interpretação resulte qualquer diminuição das garantias de defesa, conforme decidido no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 573/98[5]). Nas palavras do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27/02/2025 (processo n.º 78/22.6GDVVD.G1.S1[6]): “O vício do erro notório na apreciação da prova, a que se reporta a alínea c), do n.º2, do artigo 410.º, verifica-se quando um homem médio, perante o teor da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se apercebe de que o tribunal, na análise da prova, violou as regras da experiência ou de que efetuou uma apreciação manifestamente incorreta, desadequada, baseada em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios, verificando-se, igualmente, este vício quando se violam as regras sobre prova vinculada ou das leges artis. O requisito da notoriedade afere-se, como se referiu, pela circunstância de não passar o erro despercebido ao cidadão comum, ao homem médio - ou, talvez melhor dito (se partirmos de um critério menos restritivo, na senda do entendimento do Conselheiro José de Sousa Brito, na declaração de voto no Acórdão n.º 322/93, in www.tribunalconstitucional.pt, ou do entendimento do Acórdão do S.T.J. de 30 de Janeiro de 2002, Proc. n.º 3264/01 - 3.ª Secção, sumariado em SASTJ), ao juiz “normal”, dotado da cultura e experiência que são supostas existir em quem exerce a função de julgar, desde que seja segura a verificação da sua existência -, devido à sua forma grosseira, ostensiva ou evidente, consistindo, basicamente, em decidir-se contra o que se provou ou não provou ou dar-se como provado o que não pode ter acontecido”. Segundo o decidido no citado Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17/12/2024 (processo n.º 68/21.6GHSTC.S1) o erro notório “verifica-se, pois, quando do texto da decisão recorrida se dá por provado ou não provado, um facto que contraria com toda a evidência, na perspectiva de um homem de formação média, toda a lógica e as mais elementares regras da experiência comum”. Sendo que, citando Germano Marques da Silva, explica que as regras da experiência comum “são noções ou juízos que refletem a reiteração de acontecimentos semelhantes e que autorizam a convicção de que se assim costuma ser também deve ser ou é muito provável que o seja em igualdade de circunstâncias”. Mas, de forma mais relevante ainda, decidiu-se nesse Acórdão de 17/12/2024 que: “No recurso deverá o recorrente indicar especificamente o facto ou factos dados como provados ou não provados que contrariam com toda a evidência, na perspectiva de um homem de formação média a lógica e as regras da experiência”. Ora, no caso concreto, a arguida/recorrente não indica que algum facto que resultou provado (designadamente o único a que especificadamente se refere – na sua conclusão XVI), contrarie toda a evidência ou seja manifestamente errado. Na verdade, para fundar a sua pretensão recorre à argumentação de que os documentos juntos e os depoimentos gravados levariam a solução contrária. Bem se vê, por isso, que a arguida/recorrente se limitou a exprimir as razões pelas quais, na sua visão e em face da prova produzida, outra deveria ser a decisão sobre a matéria de facto. No entanto, não basta uma mera discordância quanto à análise crítica da prova que foi feita pelo tribunal a quo (como é natural que exista em processos de natureza antagónica), pois tal geraria que o recurso sobre a matéria de facto fosse sempre admissível (o que, como se começou por dizer, não ocorre). Percorrendo, ainda assim, toda a sentença recorrida não se vislumbra existir qualquer elemento indiciador da existência de tal erro notório. Os factos dados como provados são conciliáveis entre si, bem como com toda a motivação da convicção apresentada, assente numa valoração e apreciação crítica que foi feita da prova, pelo que não se retira do texto da decisão recorrida qualquer falha grosseira perceptível para um cidadão comum. A livre valoração da prova, que o tribunal fez ao abrigo do artigo 127.º do Código de Processo Penal, não se inclui no erro notório da apreciação da prova. Improcede, por isso, o recurso nesta parte. * III.D. Qualificação jurídica: O Decreto-Lei n.º 64/2007, de 14 de Março, criou o regime jurídico de instalação, funcionamento e fiscalização dos estabelecimentos de apoio social geridos por entidades privadas. Ora, “consideram-se de apoio social os estabelecimentos em que sejam prestados serviços de apoio às pessoas e às famílias, independentemente de estes serem prestados em equipamentos ou a partir de estruturas prestadoras de serviços que prossigam os objetivos do sistema de ação social” (cf. artigo 3.º). Entre os serviços de apoio às pessoas e famílias contam‑se “no âmbito do apoio a pessoas idosas: centro de convívio, centro de dia, centro de noite, estruturas residenciais para pessoas idosas” (cf. artigo 4.º, n.º 1, alínea b) do indicado diploma). Na sua redacção vigente à data dos factos (29/03/2018) dispunha o artigo 11.º desse diploma (na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 33/2014, de 4 de Março) que: “1 - Os estabelecimentos abrangidos pelo presente decreto-lei só podem iniciar a actividade após a concessão da respectiva licença de funcionamento, sem prejuízo do disposto nos artigos 37.º e 38.º 2 - A instrução do processo e a decisão do pedido de licença de funcionamento são da competência do Instituto da Segurança Social, I. P.”. Actualmente, após alterações pelo Decreto-Lei n.º 126-A/2021, de 31 de Dezembro (em vigor a partir de 10/01/2022) e Decreto-Lei n.º 136/2023, de 29 de Dezembro (em vigor a partir de 30/01/2023), a redacção desse artigo 11.º passou a ser a seguinte: “1 - A abertura e funcionamento de um estabelecimento depende do cumprimento das condições de funcionamento específicas aplicáveis a cada resposta social, estabelecidas na legislação em vigor. 2 - Os estabelecimentos abrangidos pelo presente decreto-lei só podem iniciar a atividade após realização da comunicação prévia, sem prejuízo do disposto nos artigos 37.º e 38.º 3 - Compete ao ISS, I. P., acompanhar o início e o funcionamento dos estabelecimentos de apoio social. 4 - Os equipamentos sociais financiados no âmbito dos PRR e PARES podem entrar em funcionamento com a emissão da autorização de utilização e consideram-se concluídos designadamente para celebração de acordos de cooperação.” As alterações feitas ao regime referido (sobretudo com o Decreto-Lei n.º 126‑A/2021, de 31 de Dezembro, que visou simplificar o processo de licenciamento destes equipamentos de apoio social) não permitiram, nunca, a abertura e funcionamento de estabelecimentos como aquele que está em causa nos autos (estrutura residencial para pessoas idosas ou ERPI) sem qualquer tipo de licenciamento ou comunicação prévia. E a abertura de um estabelecimento desse tipo sem licenciamento ou sem autorização provisória de funcionamento constitui uma contra‑ordenação muito grave, conforme resulta do artigo 39.º-B, alínea a), do referido regime aprovado pelo Decreto‑Lei n.º 64/2007 (na redacção vigente à data dos factos, tal que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 33/2014), que dispunha que: “Constituem infrações muito graves: a) A abertura ou o funcionamento de estabelecimento que não se encontre licenciado nem disponha de autorização provisória de funcionamento válida;” Com o Decreto-Lei n.º 126-A/2021, de 31 de Dezembro, a redacção passou a ser a actual: “Constituem infrações muito graves: a) A abertura ou o funcionamento de estabelecimento que não se encontre licenciado ou não disponha de autorização de funcionamento válida;” A ligeira alteração de redacção em nada altera a conclusão de que o simples funcionamento de um estabelecimento, como o que está em causa nos autos, sem autorização ou licença preenche os elementos objectivos da infracção em causa, tal como considerado na sentença recorrida. Por outro lado, em face dos factos provados, resulta que a arguida actuou com dolo directo (ponto 2 dos factos provados), pelo que está preenchido o elemento subjectivo da infracção. Estando preenchidos os elementos objectivos e subjectivos da infracção, não merece censura a sentença recorrida que manteve a condenação pela contra-ordenação em causa nos autos. * III.E Medida da coima e sanção acessória: Nos termos do artigo 39.º-E, alínea a), do referido Regime aprovado pelo Decreto‑Lei n.º 64/2007 (na redacção vigente à data dos factos, tal que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 33/2014): “Às infrações previstas nos artigos 39.º-B a 39.º-D são aplicáveis as seguintes coimas: a) Entre 20 000,00 EUR e 40 000,00 EUR, para a infração muito grave referida na alínea a) do artigo 39.º-B;” Essa alínea não sofreu alterações. Assim, quanto à medida da coima, atendendo a que foi fixada pelo limite mínimo, nada há a apontar à sentença recorrida. Nos termos do artigo 39.º-H do referido Regime aprovado pelo Decreto‑Lei n.º 64/2007 (na redacção vigente à data dos factos, tal que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 33/2014 e que não sofreu alterações): “1 - Cumulativamente com as coimas previstas pela prática de infrações muito graves e graves, podem ser aplicadas ao infrator as seguintes sanções acessórias: a) Interdição temporária do exercício, direto ou indireto, de atividades de apoio social em quaisquer estabelecimentos de apoio social; b) Inibição temporária do exercício da profissão ou da atividade a que a contraordenação respeita; c) Privação do direito a subsídio ou benefício outorgado por entidades ou serviços públicos, nacionais ou comunitários, no âmbito do exercício da atividade de prestação de serviços e dos estabelecimentos de apoio social; d) Encerramento do estabelecimento e suspensão da licença ou da autorização provisória de funcionamento; e) Publicação, a expensas do infrator, em locais idóneos para o cumprimento das finalidades de prevenção geral do sistema jurídico, da condenação aplicada pela prática da contraordenação. 2 - No caso de ser aplicada a sanção prevista na alínea c) do número anterior, deve a autoridade administrativa comunicá-la, de imediato, à entidade que atribuiu o benefício ou subsídio com vista à suspensão das restantes parcelas dos mesmos. 3 - As sanções referidas nas alíneas a) e b) do n.º 1 têm a duração máxima de três anos a contar da data da decisão condenatória definitiva. 4 - A publicidade da condenação referida na alínea e) do n.º 1 consiste na publicação de um extrato, do qual consta a caracterização da infração, a norma violada, a identificação do infrator e a sanção aplicada.” Como se decidiu no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 09/03/2020 (processo n.º 1991/19.3T8PNF.P1[7]) “para a aplicação de qualquer sanção acessória das legalmente previstas, não basta a verificação do pressuposto específico da cada uma, sendo ainda necessário que, no concreto caso, se verifiquem também os pressupostos gerais de aplicação da sanção acessória em apreciação, como a “gravidade da infracção” (censurabilidade do facto) e a “culpa do agente” (censurabilidade do agente), atento o disposto no citado artigo 21.°, n.° 1, do DL n.º 433/82, de 27.10”. Nessa parte, a sentença recorrida tem a seguinte fundamentação: “Conforme se vê aplicação da sanção acessória não é automática “podendo ser aplicada”. Porém, é bom de ver que não existindo licença ou, sequer, autorização provisória, aquela ERPI não devia, de todo, estar em actividade. De facto, a conduta da arguida é gravíssima. Essa gravidade, apesar do tempo já decorrido, não foi ainda por si intuída, pois não fez cessar de moto próprio a infracção, continuando mesmo na data da impugnação a sua actividade sem as ditas licença ou autorização provisória. Aqui, o tempo não atenua a sua responsabilidade, antes a agrava, pois quanto mais for o período da infracção mais ampla é a probabilidade de dano (perigo) para os utentes daquela ERPI que ali foram acolhidos sem que a mesma reunisse as condições para o efeito. E, no fundo, é isto o que interessa. Inexistindo sequer autorização provisória de funcionamento, a arguida não deveria iniciar aquela actividade. E uma vez sujeita a fiscalização, deveria ter cessado a mesma, de imediato. O comportamento posterior no sentido corrigir eventuais deficiências verificadas pelo ISS não afasta aquela conclusão, pois essa actuação foi realizada mantendo o acolhimento daqueles idosos, à margem da lei. Ou seja, a arguida deve cessar aquela actividade de imediato, não tanto por força do da aplicação da sanção acessória, mas mais para fazer cessar o estado de violação da lei (nomeadamente daqueles preceitos contraordenacionais) em que se encontra até à data da impugnação. É a inexistência daquela autorização provisória de funcionamento e licença que ditam, em primeira linha, a impossibilidade legal de continuação daquela exploração com o encerramento da sua actividade, em ordem a fazer cessar uma violação da lei que até hoje se encontra em curso (e que tem por fito acautelar os interesses dos utentes acolhidos por estas “entidades clandestinas” – se a actividade não está licenciada ou autorizada a actividade é marginal/clandestina). A sua conduta é gravíssima. E, pior do que isso, a Recorrente teima em não ver o óbvio, o que só atesta a sua falta de idoneidade para o exercício daquela actividade, pois age à revelia da lei e da apreciação feita pela autoridade administrativa com competência na matéria. Por isso, mal se compreende o pretendido pela recorrente no que tange à não aplicação da sanção acessória, como se a não aplicação desta sanção a autorizasse a laborar sem aquelas licença ou autorização provisória. Aquelas normas não existem para tornar difícil a vida às empresas. Aquelas normas existem, porque os destinatários da actividade dessas empresas são pessoas especialmente vulneráveis, pelo que a actividade em causa não pode ser exercida sem que estejam reunidas um conjunto de condições que a Lei (e não a empresa) reputa como essenciais e necessárias. A arguida, por ter trabalhado como auxiliar numa outra instituição, antes de se lançar neste empreendimento, melhor do que ninguém devia ter consciência disso. O facto de não existirem ERPI naquela área, não a legitimava a agir como agiu. De facto, outros interessados na abertura de um ERPI podem não ter ali iniciado a sua actividade, porque (ao contrário da arguida) adequaram o seu comportamento à lei e, não sendo detentores de licença e ou autorização provisória, entenderam não o fazer antes de conseguir esses elementos. Ao contrário do que alega a Ilustre Mandatária da arguida não se trata aqui de entender que a arguida só vê o lucro, ao invés do bem-estar e da saúde dos idosos que acolhe. Porém, não podemos deixar de notar que a arguida só consegue praticar os preços que pratica porque a sua actividade não está conforme a lei e os encargos associados ao cumprimento da mesma. Mas a violação das regras da concorrência aqui é o que menos importa. De facto, o que aqui releva é que a Lei não põe na mão dos particulares o poder de se auto atribuírem a faculdade de exercer aquela actividade, considerando-se aptos para esse efeito. É de todo censurável que antes de qualquer licença ou autorização provisória alguém se lance naquela actividade porque entende que há necessidades que não estão a ser acauteladas. Como diz o Povo: “de boas intenções está o Inferno cheio”. O tribunal não está, aqui, a apreciar as boas intenções da arguida. O direito penal e o direito de mera ordenação social (enquanto direito penal administrativo) é o direito penal do facto. As exigências de prevenção geral são elevadíssimas, pois não sancionar o comportamento da arguida com aquela sanção acessória é passar a mensagem de que é lícito abrir uma ERPI de forma clandestina e ir trabalhando à margem da lei, pois, enquanto o processo anda e não anda, vai-se tratando o que não se tratou antes do início daquela actividade, e quando se chegar ao momento de decidir, eventualmente, já tudo está ultrapassado, passando-se uma borracha sobre o incumprimento passado. Não pode ser. E no caso, mais assim é, porque nem tudo está ultrapassado, como se disse. E nem se diga que a situação dos utentes está cautelada com seguros. Realmente, esperemos que não ocorra nenhuma tragédia, pois não temos qualquer dúvida que, perante uma situação que causa dano ao idoso, a Companhia de Seguros invocará a clandestinidade da actividade da ERPI para excluir a sua responsabilidade. Por isso, entendo que a condenação da arguida na sanção acessória aplicada é adequada e proporcional a uma infracção que já dura há 11 anos, se considerarmos que a arguida iniciou o seu acolhimento em 2013, conforme referido por sua filha, ou há pelo menos, seis anos, se considerarmos a data da visita inspectiva. De facto, se algo nos merece reparo na actuação do ISS é a circunstância de o mesmo, apesar de verificar a ausência de licença ou autorização provisória para o exercício da actividade daquela ERPI não ter actuado nos termos preconizados no art. 35º, do Decreto-lei n.º 33/2014, promovendo o encerramento administrativo do estabelecimento, antes permitindo a permanência da violação com manutenção dos utentes em risco. Finalmente, o cumprimento imediato da sanção acessória, após o trânsito em julgado, é algo que deve ser acautelado pela arguida em articulação com os familiares dos utentes e com o Instituto de Segurança Social, com vista o seu acolhimento numa outra ERPI ou junto dos familiares.” Perante os factos provados, estão preenchidos os requisitos gerais (gravidade da infracção – abertura de estabelecimento de residência de pessoas idosas e, por isso, normalmente fragilizadas pela idade; culpa da arguida – na vertente de dolo directo) e especiais de aplicação da sanção acessória. A sentença recorrida analisa todos os requisitos legais da sanção acessória em causa e adequa a sua aplicação, com o que se concorda, à circunstância de, passados mais de 6 anos, a arguida continuar a lucrar com a exploração de um estabelecimento a que a lei impõe importantes condicionantes de funcionamento, que ainda não tem licença de funcionamento e que nunca deveria ter sido aberto sem estar acautelada a existência da mesma (ou seja, sem um procedimento que confirme a existência de condições mínimas). Afirma a arguida, mas sem razão, que a decisão administrativa não invoca nenhum facto que permita concluir que a falta de licença implicasse que o estabelecimento não cumpria as normas legais: basta atentar nos factos provados e no anexo à Portaria 67/2012, de 21 de Março. Relembre-se, ainda, que após a visita inspectiva foram feitas obras, mas nem todas as deficiências apontadas na decisão administrativa foram debeladas (ver, além do mais, a questão relativa aos quartos individuais e o ponto 6.3.3 do referido anexo à Portaria citado). Assim, não se vislumbra qualquer razão para se afastar a aplicação da sanção acessória, devendo manter-se integralmente a sentença recorrida. Também nesta parte, por isso, improcede o recurso. * Custas: Vencida no recurso, a recorrente deverá suportar o pagamento das custas do mesmo e, atenta a complexidade que lhe conferiu, deve fixar-se a taxa de justiça em 4 UC – conforme artigos 93.º, n.º 3 do Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro e 8.º, n.ºs 7, 8 e 9 do Regulamento das Custas Processuais e tabela III anexa a este último diploma. *** III. DECISÃO: Em face do exposto, decide-se julgar totalmente improcedente o recurso e, em conformidade, confirma-se a sentença recorrida. Condena-se a ré nas custas do recurso, fixando-se a taxa de justiça em 4 (quatro) Unidades de Conta. Notifique-se. Évora, 9 de Abril de 2025 Filipe Aveiro Marques Mário Branco Coelho Paula do Paço
__________________________________________________ 1. Acessível em https://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/3f837abc177bab93802589c500583659.↩︎ 2. BMJ n.º 462, pág. 207 e sumariado em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/8232068488726623802568fc003b61eb.↩︎ 3. Sumariado em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/0f58b62e5376dc5b802568fc003b841c.↩︎ 4. Acessível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/54511a515891b2c580258bf7005e62cc.↩︎ 5. Acessível em https://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/19980573.html.↩︎ 6. Acessível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/cf37963bddcb7d7280258c45005bd5a3.↩︎ 7. Acessível em https://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/8a5ed3fa40de37ad8025853100393789.↩︎ |