Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | MARGARIDA BACELAR | ||
Descritores: | BENS APREENDIDOS LEVANTAMENTO PRAZO PERDA A FAVOR DO ESTADO | ||
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Data do Acordão: | 11/21/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | O Recorrente, privado de liberdade, foi expressamente informado de que poderia credenciar para o levantamento dos bens apreendidos um qualquer funcionário do Estabelecimento Prisional, informação esta que, como facilmente se percebe, lhe permitiria, por interposta pessoa, rececionar os bens e dar-lhes, posteriormente, o destino que bem entendesse. O Recorrente nada fez, deixando esgotar o prazo concedido para o efeito. O seu comportamento negligente, do qual é, aliás, o único e exclusivo responsável veio a determinar a prolação do despacho de perda de tais bens a favor do Estado, em absoluta conformidade com o que se dispõe no nº3 do artº186º do C. P. Penal. Assim, pretender agora a concessão de novo prazo para o levantamento dos bens apreendidos – pretensão que não apresentou sequer na 1ª Instância – mostra-se carecida de fundamento legal. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Criminal da Relação de Évora: No processo nº128/20.0JELSB-G-E1 do Tribunal Judicial da Comarca de …- Juízo Central Criminal de … - Juiz …, o arguido AA interpôs recurso do despacho judicial que ao abrigo do disposto no artigo 186.º, n.º 3 do Código de Processo Penal, declarou perdidos a favor do Estado os objectos constantes de fls. 1918 e cuja entrega não foi reclamada pelo arguido, concluindo as respectivas motivações pela formulação das seguintes conclusões: «1. O arguido foi notificado para proceder ao levantamento dos seus bens no prazo de 60 dias. 2. No entanto, encontra-se privado da sua liberdade. 3. Ora, como é natural, estando privado da sua liberdade, o arguido não consegue – por si – proceder ao levantamento dos bens. 4. In casu, não conseguiu de igual forma diligenciar para que outrem procedesse ao levantamento dos bens que lhe pertencem. 5. Com efeito, o arguido é brasileiro, não conhece ninguém em Portugal fora do Estabelecimento Prisional e todos os seus amigos, conhecidos e familiares estão no Brasil. 6. Por todos estes motivos, e não obstante o seu esforço, não foi possível ao arguido proceder ao levantamento dos referidos bens no prazo concedido, uma vez que não conseguiu o auxílio da sua companheira. 7. O arguido não aufere qualquer remuneração há 3 anos e assim continuará enquanto permanecer em reclusão. 8. Os bens em questão têm algum valor económico e são instrumentos de trabalho que se afiguram essenciais para que o arguido consiga recompor a sua vida quando sair do Estabelecimento Prisional, designadamente, para trabalhar. 9. Bem sabendo que foi ultrapassado o prazo para o levantamento destes bens, salvo melhor opinião, sempre se deverá atender a todas estas circunstâncias aqui narradas. 10.O arguido está verdadeiramente sozinho e estes bens são muito importantes para si. 11.Estando privado da sua liberdade, e estando muito limitado nas comunicações que consegue efetuar através do Estabelecimento Prisional, o arguido não conseguiu cumprir o mesmo, tendo efetivamente tentado fazê-lo até ao último dia. NORMAS VIOLADAS: Art. 186º nº3 do CPP Face a todo o exposto, requer-se a V. Exa. que atendendo a todas as circunstâncias invocadas, conceda um prazo adicional ao arguido para proceder ao levantamento destes bens. O Digno Magistrado do Ministério Público respondeu, concluindo pela improcedência do recurso. Neste Tribunal o Exmo. Procurador-Geral Adjunto teve vista dos autos, emitindo parecer no sentido do não provimento do recurso. O recorrente, notificado nos termos e para os efeitos previstos no art. 417º, nº 2 do CPP, quedou-se pelo silêncio, nada tendo vindo alegar. Colhidos os vistos legais e efectuada a conferência prevista no art.º 419º do C.P.P., cumpre agora apreciar e decidir. *** O OBJECTO DO RECURSO DO ARGUIDO Importa agora curar do mérito do recurso, tendo-se em atenção que é pelas conclusões que o recorrente extrai da sua motivação que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem, sem prejuízo para a apreciação de questões de oficioso conhecimento e de que ainda se possa conhecer - Cfr. o Ac do STJ de 3.2.99 in BMJ 484, pág 271; o Ac do STJ de 25.6.98 in BMJ 478, pág 242; o Ac do STJ de 13.5.98 in BMJ 477, pág 263; SIMAS SANTOS/LEAL HENRIQUES in “Recursos em Processo Penal” cit., págs. 74 e 93, nota 108; GERMANO MARQUES DA SILVA in “Curso de Processo Penal”, vol. III, 2ª ed., 2000, pág. 335; JOSÉ NARCISO DA CUNHA RODRIGUES in “Recursos”, “Jornadas de Direito Processual Penal/O Novo Código de Processo Penal”, 1988, p. 387; e ALBERTO DOS REIS in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V, págs. 362 e 363).«São só as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas conclusões da respectiva motivação que o tribunal “ad quem” tem de apreciar» (GERMANO MARQUES DA SILVA, ibidem). A única questão suscitada pelo Recorrente (nas conclusões da sua motivação) é a seguinte: a) Saber se o despacho recorrido violou o disposto no artigo 186.º, n.º 3 do Código de Processo Penal. *** Apreciando: Na sequência de despacho proferido nos autos, ao abrigo do disposto no artº 186º, nº3 do C.P.P., que fixou ao Recorrente o prazo de 60 dias para proceder ao levantamento de bens apreendidos nos autos, e face ao decurso de tal prazo sem que o Recorrente tenha procedido a tal levantamento, o Mmº Juíz a quo proferiu despacho declarando o perdimento de tais bens a favor do Estado. Inconformado com esta decisão dela interpôs recurso o Recorrente, invocando a sua situação de recluso e evidente falta de liberdade de movimentação, bem como a falta de apoio de terceiras pessoas no exterior, para proceder ao referido levantamento, vindo agora, pela via do recurso interposto, peticionar à Relação a concessão de um novo prazo para proceder ao levantamento dos bens em causa, para si relevantes, até pelo seu valor económico. Resulta dos autos que o Recorrente foi notificado para proceder ao levantamento dos bens em causa – três computadores e um telemóvel – nos seguintes termos: “Para proceder ao levantamento neste Tribunal do(s) objecto(s) abaixo indicado(s), no prazo máximo de 60 dias a contar da presente notificação, com a advertência de que, caso não proceda ao levantamento do(s) referido(s) objecto(s) no prazo indicado, são os mesmos considerados perdidos a favor do Estado – artº 186.º, n.º 3, do C. P. Penal. Os referidos objectos poderão ser levantados por funcionário desse Estabelecimento Prisional credenciado para o efeito”. Como se vê, resulta evidente dos termos da notificação feita, ter sido devidamente acautelada a sua situação de recluso e as óbvias limitações que a mesma impõe, em razão do teor do questionado perdimento de objectos apreendidos. Com efeito, o Recorrente foi expressamente informado de que poderia credenciar para o dito levantamento um qualquer funcionário do Estabelecimento Prisional, informação esta que, como facilmente se percebe, lhe permitiria, por interposta pessoa, recepcionar os bens e dar-lhes, posteriormente, o destino que bem entendesse. Sabemos que o Recorrente nada fez, deixando esgotar o prazo concedido para o efeito. O seu comportamento negligente, do qual é, aliás, o único e exclusivo responsável veio a determinar a prolacção do despacho recorrido, em absoluta conformidade com o que se dispõe no nº3 do artº186º do C. P. Penal. Assim, pretender agora a concessão de novo prazo para o levantamento dos bens apreendidos – pretensão que não apresentou sequer na 1º Instância – mostra-se carecida de fundamento legal. Pelo exposto e sem necessidade de mais considerações por despiciendas, o presente recurso irá improceder. DECISÃO Mantém-se o despacho recorrido, negando-se provimento ao recurso. Fixa-se no mínimo a taxa de justiça devida pelo Recorrente. Évora, 21 / 11 / 2023 |