Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
1142/18.1T8PTM.E2
Relator: EMÍLIA RAMOS COSTA
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
FIXAÇÃO DA INCAPACIDADE
PROVA PERICIAL
DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO
NULIDADE DA SENTENÇA
Data do Acordão: 03/16/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
I – Se o relatório pericial da junta médica não esclarece fundadamente, não só todas as limitações de que o Autor padece, como a repercussão dessas limitações na atividade profissional do Autor, concretamente, se determinadas dessas concretas tarefas agravam, ou não, o risco de queda e de dor, pondo em causa a sua segurança, o mesmo é nulo, nos termos do art. 195.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, por violar o disposto na Instrução Geral 8 da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidente de Trabalho e Doença Profissional, constante no Anexo I.
II – Fundando-se os factos dados como provados da sentença recorrida no relatório da junta médica, o qual padece de evidentes deficiências, tais matérias factuais padecem igualmente de deficiências, e inexistindo no processo os elementos de prova necessários para o apuramento desses factos essenciais, tal sentença deve ser anulada, nos termos da al. c) do n.º 2 do art. 662.º do Código de Processo Civil.
III – A invocação de nulidades, no prazo legalmente estatuído, por integrar a normal tramitação da lide, não deve ser taxada como incidente anómalo.
(Sumário elaborado pela Relatora)
Decisão Texto Integral:
Proc. n.º 1142/18.1T8PTM.E2
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1]
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório
A “Fidelidade – Companhia de Seguros, S.A.”[2] veio participar, nos termos do art. 90.º, n.º 1, da Lei n.º 98/2009, de 04-09, de um acidente de trabalho, ocorrido no dia 12-05-2017, pelas 11h30, em Portimão, de que foi vítima AA, com a profissão de técnico de telecomunicações, quando prestava serviço para BB, mediante a retribuição base mensal de €800,00, o subsídio de alimentação mensal de €143,00 e ainda o recebimento mensal de €275,00 a outros títulos, tendo o acidente consistido em “mau jeito”.
Efetuado, em 28-02-2019, o relatório do exame médico ao sinistrado[3], concluiu este que a data da consolidação médico-legal das lesões é fixável em 24-04-2018, que a ITA ocorreu entre 13-05-2017 e 22-03-2018; que sofreu uma ITP de 20% de 23-03-2018 a 24-04-2018; e que a incapacidade permanente parcial é de 4,0000%.
Em 07-05-2019, realizou-se a tentativa de conciliação, estando presentes o sinistrado e a seguradora, não tendo sido possível conciliar as partes.
Os autos prosseguiram, tendo o Autor AA apresentado petição inicial de ação emergente de acidente de trabalho com processo especial, contra a “Fidelidade, S.A.” (Ré), peticionando, a final, que a Ré seja condenada a pagar-lhe:
- pensão anual e vitalícia, anualmente atualizável, calculada a partir do dia seguinte ao da atribuição da alta com ITP- 23-03-2018- com base na Incapacidade que lhe for atribuída em exame pericial por junta médica a realizar nos presentes autos, bem como a remuneração anual auferida pelo Autor à data do acidente, transferida para a Ré;
- os juros de mora vencidos e vincendos, calculada sobre a pensão que lhe vier a ser reconhecida, devidos desde o dia seguinte ao da alta até efetivo e integral pagamento;
- As quantias que o Autor suportou, e terá de suportar, com deslocações obrigatórias, para comparência em atos judiciais e para tratamentos e realização de exames, com base no valor pago pela Ré ao km.
Solicitou ainda o Autor a realização de exame por junta médica, formulando os seguintes quesitos:
1) Qual o tipo de lesões corporais sofridas pelo Sinistrado, na sequência do acidente de trabalho em causa nos autos?
2) Quais as limitações e sequelas, de carácter permanente, que o Sinistrado ficou a padecer, nomeadamente ao nível da dor?
3) Qual a natureza da incapacidade do Sinistrado?
4) Qual o grau de incapacidade do Sinistrado?
5) Quais os períodos de incapacidade do Sinistrado?
6) Tem ou não o Sinistrado dificuldade na mobilidade?
7) Tem ou não o Sinistrado dificuldade em subir postes de telecomunicações e eléctricos, a cerca de 10 metros do solo, com recurso a escada?
8) Tem ou não o Sinistrado dificuldade em descer às caixas de telecomunicações subterrâneas, a cerca de 4 metros do solo, com recurso a escada?
9) Tem ou não o Sinistrado dificuldade em movimentar-se em pavimentos irregulares, nomeadamente terrenos agrícolas, transportando carga pesada?
10) O Sinistrado pode desempenhar as suas funções, em condições de segurança e sem dor?
11) As sequelas permanentes apresentadas pelo Sinistrado evidenciam uma incapacidade permanente absoluta para o seu trabalho habitual??
A Ré “Fidelidade, S.A.” contestou, concluindo, a final, que a ação deve ser julgada improcedente, por não provada, com todas as consequências legais.
Convidado o Autor a aperfeiçoar a sua petição inicial, veio o mesmo proceder a tal aperfeiçoamento.
Proferido despacho saneador, foi fixado o objeto do litígio, bem como os factos assentes, tendo sido enunciados os temas da prova. Foi igualmente admitido o exame por junta médica e solicitado parecer ao IEFP.
Relativamente ao exame por junta médica o tribunal a quo formulou os seguintes quesitos:
1) O autor evidencia sequelas incapacitantes? Quais?
2) As sequelas do autor importam uma I.P.P. de 4%? Ou outra?
3) O A. sofreu incapacidade temporária parcial para o trabalho de 20% desde o dia 23/3/2018 até ao dia 24/4/2018?
4) Ou, em consequência do descrito evento, continuou a sofrer incapacidade temporária absoluta para o trabalho após o período referido em G) até ao presente momento?
5) O autor, como consequência do descrito evento, tem dificuldade em caminhar longos períodos?
6) Caminhar em pisos inclinados e irregulares, nomeadamente subir e descer ladeiras?
7) Subir escadas e escadotes?
8) Fletir as pernas?
9) Ajoelhar-se ou agachar-se?
10) Pegar em pesos?
11) Baixar-se e levantar-se?
12) Pôr-se de cócoras?
13) Permanecer de pé por longos períodos?
14) O autor perdeu força física no joelho direito?
15) Não consegue realizar trabalhos com carga pesada e que impliquem a movimentação do joelho direito e aplicação de força nesse membro?
16) As sequelas importam para o autor a incapacidade absoluta para o trabalho habitual de juntista?
Em 17-06-2020, foi junto parecer do IEFP, no qual foi apresentada a seguinte conclusão:
20. O trabalhador apresenta estar incapacitado para desenvolver as tarefas do seu posto de trabalho, com fundamento, nomeadamente, no seguinte:
20.1. O perfil de requisitos da profissão e do posto de trabalho analisado exige a necessidade de uma íntegra destreza, robustez e agilidade corporal, de modo a poder, nomeadamente, subir e descer escadas extensas, muitas vezes na completa verticalidade, e manter-se em posições de equilíbrio instável com segurança para si próprio e terceiros em torres e postes de telecomunicações. Exige, ainda, uma boa capacidade de locomoção, de modo a deslocar-se, em segurança, em terrenos muitas vezes desnivelados e acidentados, transportando cargas pesadas.
A Ré veio impugnar o parecer efetuado pelo IEFP, tendo o Autor respondido a tal impugnação.
No apenso de fixação da incapacidade para o trabalho[4], foi realizado, em 02-10-2020, o exame por junta médica, constando do respetivo relatório as respostas dadas aos 16 quesitos e sido fixada ao Autor uma IPP de 2%.
Com data de envio da notificação de 02-10-2020, foi notificado ao Autor, na pessoa do seu mandatário, o relatório do exame por junta médica.
No apenso A, em 14-10-2020, foi proferida decisão, na qual foram julgados provados os seguintes factos:
I) O autor evidencia como sequelas ligeira instabilidade anterior e amiotrofia de 1,5 cm.;
J) As sequelas do autor importam uma I.P.P. de 2%;
K) O A. sofreu incapacidade temporária parcial para o trabalho de 20% desde o dia 23/3/2018 até ao dia 24/4/2018;
L) O autor, como consequência do descrito evento, em marchas muito prolongadas sentirá algum desconforto;
M) E dificuldade em caminhar em pisos inclinados e irregulares, nomeadamente subir e descer ladeiras; e,
N) Subir escadas e escadotes;

E foram julgados não provados os seguintes factos:
1) Em consequência do descrito evento, continuou a sofrer incapacidade temporária absoluta para o trabalho após o período referido em G) até ao presente momento;
2) O A. tem dificuldade em fletir as pernas;
3) Ajoelhar-se ou agachar-se;
4) Pegar em pesos;
5) Baixar-se e levantar-se;
6) Pôr-se de cócoras;
7) Permanecer de pé por longos períodos;
8) O autor perdeu força física no joelho direito;
9) Não consegue realizar trabalhos com carga pesada e que impliquem a movimentação do joelho direito e aplicação de força nesse membro; ou que,
10) As sequelas importam para o autor a incapacidade absoluta para o trabalho habitual de juntista.
No apenso A, em 15-10-2020, o Autor AA apresentou requerimento onde solicitou:
- que fosse ordenada a transcrição das respostas apresentadas pelos Senhores Peritos aos Quesitos 1 a 16, sendo, após, concedido novo prazo ao Autor para se pronunciar;
- arguir a nulidade do auto de exame por junta médica, nos termos do art. 195.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, por só ter sido observado por um dos peritos que constituía a referida junta e por as respostas não se encontrarem devidamente fundamentadas,
Por requerimento datado de 26-10-2020, no referido apenso, veio o Autor requerer que a decisão proferida em 15-10-2020 fosse dada sem efeito, por ter violado o princípio do contraditório relativamente ao auto de exame por junta médica.
Nesse apenso, a Ré “Fidelidade – Companhia de Seguros, S.A.” veio responder ao requerimento apresentado em 15-10-2020, solicitando o indeferimento do mesmo.
Por despacho datado de 04-11-2020, no apenso A, o tribunal a quo indeferiu quer a transcrição do auto de junta médica quer a sua nulidade e condenou o Autor em 2 UC´s pelo incidente anómalo.
No referido apenso, o Autor interpôs recurso, ao qual a Ré apresentou contra-alegações, tendo o tribunal a quo, por despacho proferido em 12-01-2021, julgado legalmente inadmissível o recurso, reagindo o Autor apresentando reclamação, tendo o Tribunal da Relação de Évora, por decisão singular, em 31-05-2021, indeferido tal reclamação, mantendo o despacho que não admitiu o recurso.
Realizada a audiência de julgamento, nos autos principais, foi proferida a respetiva sentença, em 11-03-2021 com a seguinte decisão:
Pelo exposto, decido:
a) Condenar a responsável Fidelidade - Companhia de Seguros, S.A., a pagar ao sinistrado AA:
- O capital de remição de € 3.752,69 correspondente a uma pensão anual de €225,02, devida desde o dia 25/4/2018, por uma IPP de 11%;
- A indemnização de € 11 de despesas de transporte; e,
- Os respectivos juros de mora até integral pagamento, à taxa legal que estiver em vigor;
b) Absolver a ré do demais peticionado pelo autor;
c) Condenar a responsável seguradora no pagamento das custas; e,
d) Fixar o valor da acção pelo montante das reservas matemáticas e demais importâncias supra reconhecidas, isto é € 3.763,69 – art.º 120.º, do Código de Processo do Trabalho.
Notifique, sendo a responsável para comprovar o pagamento no processo.
A Ré veio requerer a retificação da parte decisória da sentença por erro de escrita, visto que nela consta que o capital de remição de €3.752,69 corresponde a uma pensão anual com base numa IPP de 11%, quando, na verdade, a IPP subjacente à mesma é de 2%.
Por despacho proferido em 24-05-2021, o tribunal a quo deferiu a solicitada retificação, determinando a correção na parte decisória onde consta “uma IPP de 11%”, devendo passar a constar “uma IPP de 2%”.
Não se conformando com a sentença, veio o Autor interpor recurso de apelação, ao qual a Ré apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso.
Admitido o recurso pelo tribunal de 1.ª instância, veio a ser proferido, em 28-10-2021, acórdão nesta Relação, com o seguinte teor decisório:
Pelo exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora, em julgar o recurso procedente, e, em consequência, revogar o despacho proferido em 04-11-2020 no Apenso A, substituindo-se por outro que determine a nulidade do auto de exame por junta médica por impercetibilidade das respostas dadas aos quesitos 1, 3 e 6, as quais influem na decisão da causa, determinando-se a transcrição, através de processador de texto, das respostas dadas a esses três quesitos e respetiva notificação às partes nos termos do art. 485.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicável atento o disposto no art. 1.º, n.º 2, al. a), do Código de Processo do Trabalho, sendo que tal nulidade determina a nulidade de todo o processado subsequente e desta nulidade dependente, concretamente, da decisão proferida em 14-10-2020 no Apenso A e da sentença proferida em 11-03-2021 no processo principal.
Custas pela Apelada (art. 527.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
Notifique.
Devolvido o processo à 1.ª instância, foi transcrita, através de processador de texto, as respostas dadas aos três quesitos e efetuada a respetiva notificação às partes.
Consignam-se as respostas dadas pela Junta Médica aos quesitos formulados pelo tribunal a quo:
1 - Sim. Ligeira instabilidade anterior e amiotrofia de 1,5 cm.
2 - Não; a IPP é de 2%.
3 - Sim. Presentemente.
4 - Não, a situação consolidou-se em 24-04-2018 e envolveu apenas incapacidade temporária até então.
5 - Admite-se que em marcha muito prolongada e intensa possa existir algum desconforto.
6 - Admite-se alguma dificuldade, face à discreta instabilidade do joelho.
7 - Igual ao quesito anterior.
8 - Não.
9, 10, 11, 12 e 13 - Não, embora se admita a possibilidade de eventualmente surgir algum contexto doloroso.
14 - Não.
15 - Consegue, com as limitações inerentes à IPP fixada.
16 - Não.
O Autor apresentou requerimento, em 10-02-2022, onde solicitou a nulidade do auto de exame por junta médica, nos termos do art. 195.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, por só ter sido observado por um dos peritos que constituía a referida junta e por as respostas não se encontrarem devidamente fundamentadas.
A Ré, em 23-02-2022, veio responder a tal requerimento, pugnando pelo seu indeferimento.
Em 21-03-2022, no Apenso A, o tribunal a quo, proferiu decisão de indeferimento da nulidade do auto de junta médica e considerou provados os seguintes factos:
I) O autor evidencia como sequelas ligeira instabilidade anterior e amiotrofia de 1,5 cm.;
J) As sequelas do autor importam uma I.P.P. de 2%;
K) O A. sofreu incapacidade temporária parcial para o trabalho de 20% desde o dia 23/3/2018 até ao dia 24/4/2018;
L) O autor, como consequência do descrito evento, em marchas muito prolongadas sentirá algum desconforto;
M) E dificuldade em caminhar em pisos inclinados e irregulares, nomeadamente subir e descer ladeiras; e,
N) Subir escadas e escadotes;

E não provados os seguintes factos:
1) Em consequência do descrito evento, continuou a sofrer incapacidade temporária absoluta para o trabalho após o período referido em G) até ao presente momento;
2) O A. tem dificuldade em fletir as pernas;
3) Ajoelhar-se ou agachar-se;
4) Pegar em pesos;
5) Baixar-se e levantar-se;
6) Pôr-se de cócoras;
7) Permanecer de pé por longos períodos;
8) O autor perdeu força física no joelho direito;
9) Não consegue realizar trabalhos com carga pesada e que impliquem a movimentação do joelho direito e aplicação de força nesse membro; ou que,
10) As sequelas importam para o autor a incapacidade absoluta para o trabalho habitual de juntista.
Em 14-05-2022 foi proferida sentença com o seguinte teor decisório:
Pelo exposto, decido:
a) Condenar a responsável Fidelidade - Companhia de Seguros, S.A., a pagar ao sinistrado AA:
- O capital de remição de € 3.752,69 correspondente a uma pensão anual de € 225,02, devida desde o dia 25/4/2018, por uma IPP de 11%;
- A indemnização de € 11 de despesas de transporte; e,
- Os respectivos juros de mora até integral pagamento, à taxa legal que estiver em vigor;
b) Absolver a ré do demais peticionado pelo autor;
c) Condenar a responsável seguradora no pagamento das custas; e,
d) Fixar o valor da acção pelo montante das reservas matemáticas e demais importâncias supra reconhecidas, isto é € 3.763,69 – art.º 120.º, do Código de Processo do Trabalho.
Notifique, sendo a responsável para comprovar o pagamento no processo.
A Ré, em 23-05-2022, veio requerer a retificação da parte decisória da sentença por erro de escrita, visto que nela consta que o capital de remição de €3.752,69 corresponde a uma pensão anual com base numa IPP de 11%, quando, na verdade, a IPP subjacente à mesma é de 2%.
Inconformado com tal sentença, veio o Autor AA interpor recurso, terminando com as seguintes alegações:
1. O presente recurso vem interposto da sentença de fls…, proferida a 14-05-2022, com a referência 89997713, mediante a qual foi decidido condenar a Responsável Fidelidade- Companhia de Seguros, S.A. a pagar ao Sinistrado, ora Recorrente, o capital de remição de 3.752,69€, correspondente a uma pensão anual de 225,02€, devida desde 25-04-2018, por uma IPP de 11%, a indemnização de 11€ de despesas de transporte, e os respectivos juros de mora até integral pagamento, à taxa legal que estiver em vigor, mais decidindo absolver a Ré do demais peticionado pelo Autor e a condenar a Ré no pagamento das custas processuais.
2. Por outro lado, e nos termos do n.º 2 do artigo 140º do Código de Processo de Trabalho, o presente recurso vem também interposto da sentença final proferida, no âmbito do Apenso A, a 21-03-2022, com a referência 89457870, mediante o qual vem indeferida a nulidade do auto de junta médica, arguida pelo Autor Recorrente, e condenado o Autor a suportar duas U.C.’s pelo anómalo incidente, bem como mediante a qual vem o Tribunal A Quo indicar quais os factos provados e não provados considerados no âmbito do referido Apenso A.
3. Em primeiro lugar, verifica-se, da sentença final proferida a 14-05-2022, com a referência 89997713, que não resulta a sentença proferida no âmbito do apenso de fixação de incapacidade- A-, sentença proferida a 21-03-2022, com a referência 89457870, razão pela qual violou o Tribunal A Quo o disposto no artigo 135º do Código de Processo Trabalho, que implica que o Juiz, na sentença final, integre as decisões proferidas no processo principal e no apenso, devendo ser reproduzida a parte decisória.
4. Da análise da sentença final recorrida, proferida no âmbito do processo principal, verifica-se que, na parte relativa à breve apreciação crítica da prova, o Tribunal A Quo refere ter baseado a sua convicção na apreciação conjugada dos seguintes meios de prova: nas declarações prestadas, em sede de audiência de julgamento, pelas testemunhas CC, DD, EE e FF, destacando os depoimentos das testemunhas “que confirmaram as dificuldades do autor em realizar algumas funções próprias do seu posto de trabalho, bem como algumas despesas de deslocação”.
5. Tal alegação não consubstancia, salvo melhor entendimento, qualquer apreciação crítica e completa da prova, violando, assim, o douto Tribunal o disposto no n.º 3 do artigo 607º do Código de Processo Civil, que impõe que seja feita, na fundamentação da sentença, uma análise critica das provas, atendendo a que não é possível compreender, do texto da sentença, que testemunhas confirmaram as dificuldades do autor, que funções próprias do seu posto de trabalho confirmaram as testemunhas ter o Autor dificuldade em realizar e que despesas de deslocação confirmaram as testemunhas, e que testemunhas, ter o Autor realizado.
6. Mais, e no que respeita às despesas de deslocação, não é possível compreender quais as deslocações que foram consideradas pelo Tribunal A Quo a partir do depoimento das testemunhas, atendendo a que as que se encontram provadas (conforme ponto P) são somente as deslocações obrigatórias no âmbito do processo judicial.
7. Assim, da sentença recorrida proferida no âmbito do processo principal, não resulta como suficiente a análise crítica dos meios de prova existentes nos autos e realizada pelo Tribunal A Quo, tendo o Tribunal A Quo se limitado a indicar, e não analisar criticamente, os meios de prova utilizados para basear a decisão de facto tomada, não existindo qualquer correspondência entre os factos provados de I a Q e a prova realizada nos autos e, consequentemente, não sendo possível apreender que meios de prova serviram para fundamentar a prova de determinado facto.
8. A compreensão da decisão tomada pelo Tribunal deve ser clara para todos os intervenientes processuais, bem como inteligível para qualquer cidadão, susceptível de ser conhecida e compreendida pela Comunidade, o que não sucede no presente caso, em violação do disposto no n.º 3 do artigo 607º do Código de Processo Civil.
9. Relativamente aos factos não provados, limita-se o Tribunal a referir não se terem dado como provados quaisquer outros factos “por falta de prova bastante, segura e credível, e se verificarem dúvidas que foram resolvidas conforme o disposto no artigo 414º do Código de Processo Civil.”
10. Assim, por não ter sido realizada qualquer análise crítica da prova produzida, por parte do Tribunal A Quo, considera o Recorrente que a sentença final, proferida no âmbito do processo principal é nula, nos termos da supracitada alínea b) do n.º 1 do artigo 615º do CPT, violando a sentença em causa o disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 607º do Código de Processo Civil.
11. A sentença em causa é, também, nula, nos termos do invocado artigo 615º, n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 77º do Código de Processo de Trabalho, atendendo a que, muito embora tenha a Ré Fidelidade sido condenada ao pagamento da quantia de 11,00€, referente às despesas de deslocação, não é possível percepcionar qual o critério utilizado para alcançar tal quantia de 11,00€, atentas as deslocações que se encontram provadas no ponto P) dos factos provados, não se encontrando a mesma, em consequência, fundamentada de facto nem de direito.
12. Ainda neste sentido, importa referir que existiram outras deslocações no âmbito do processo que não foram consideradas pelo Tribunal A Quo na sentença recorrida, nomeadamente para comparência em julgamento e para exame por junta médica, pelo que, não carecendo tais deslocações de prova, o Tribunal A Quo violou o disposto no artigo 412º do Código de Processo Civil.
13. No que se reporta à questão da Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual, considerou o Tribunal que a questão tinha sido abordada com a excessiva simplicidade, pelo que sempre caberia ao Tribunal A Quo convidar o Sinistrado a aperfeiçoar esses factos que seriam importantes para a decisão final a proferir, sendo que, não o fazendo, violou o douto Tribunal A Quo a alínea b) do n.º 2 e os n.ºs 3 e 4 do artigo 590º do Código de Processo Civil, bem como violou o princípio do inquisitório previsto no artigo 411º do Código de Processo Civil, e, ainda, o disposto no n.º 1 do artigo 526º do Código de Processo Civil.
14. Mais, considera o Tribunal A Quo, que “tão pouco a decisão do seu empregador de o considerar inapto para o trabalho importa a vinculação da seguradora em sede de ressarcimento da incapacidade, além de que aquele é o seu próprio cunhado (e com possíveis conflitos de interesses profissionais, familiares e pessoais)”, sendo certo que tal entendimento contraria os meios de prova constantes dos autos, nomeadamente os Docs. n.ºs 2 e 3 juntos pelo Autor com a petição inicial, que consubstanciam declarações devidamente assinadas pelo Sr. Dr. GG, ..., Médico da Empresa Medisigma- Medicina, Higiene e Segurança no Trabalho, Lda., constando da Declaração ora junta sob o Doc. n.º 3, datada de 09-05-2018, que o Sinistrado se encontra “inapto para o seu posto de trabalho, uma vez que as sequelas do acidente se mostram incompatíveis com o mesmo”.
15. Verifica-se, ainda, do ponto F) dos factos provados, que a Entidade Patronal tinha a responsabilidade civil emergente de acidentes laborais transferida para a Ré Fidelidade- Companhia de Seguros, S.A., por apólice de seguro de acidentes de trabalho, pelo que, ao referir que “tão pouco a decisão do seu empregador de o considerar inapto para o trabalho importa a vinculação da seguradora em sede de ressarcimento da incapacidade”, o Tribunal A Quo violou o disposto no n.º 1 do artigo 79º da Lei n.º 98/2009, de 4 de Setembro.
16. Ora, o Autor encontra-se em situação de incapacidade temporária absoluta desde a data da alta clínica pelos serviços da Ré- 24-04-2018- até à data da decisão por parte do Tribunal, atendendo a que o mesmo, por força da declaração que considerou o Trabalhador inapto para o exercício das funções inerentes ao seu posto de trabalho, esteve absolutamente impedido de prestar trabalho para a sua Entidade Patronal.
17. Relativamente a este ponto, verifica-se que o Tribunal A Quo nada refere quanto às declarações juntas com a petição inicial sob os Docs. n.ºs 2 e 3, nomeadamente quanto à declaração mediante a qual o Sinistrado é considerado inapto para o seu posto de trabalho, limitando-se a considerar como não provado, ao arrepio de tais declarações, conforme ponto 1) dos factos não provados da sentença proferida no Apenso A, a 14-10-2020, com a referência 84893677, que o Sinistrado tenha continuado a sofrer incapacidade temporária absoluta após 22-03-2018 até ao presente.
18. Para além da declaração junta sob o Doc. n.º 3 da petição inicial, acresce o depoimento prestado pela testemunha CC, no âmbito da audiência de julgamento realizado no dia 03-12-2020, com início pelas 10 horas e 12 minutos e termo a 10 horas e 49 minutos, que confirmou que o Sinistrado não pode trabalhar, por se encontrar impedido pela Medicina no Trabalho, descrevendo todo o procedimento da Empresa com esta Entidade, nomeadamente as visitas ao local de trabalho e que, após avaliação clínica do Sinistrado, foi este considerado inapto para executar as tarefas habituais do seu posto de trabalho.
19. Assim, atendendo aos meios probatórios existentes nos autos, nomeadamente a Declaração junta sob o Doc. n.º 3 da petição inicial- Declaração médica que atesta que o Autor não se encontra apto para o exercício das suas funções de juntista até à decisão do Tribunal- e o depoimento prestado pela testemunha CC, deveria o Tribunal ter considerado tal ponto 1) dos factos não provados como facto provado, razão pela qual impugna o Recorrente a decisão relativa à matéria de facto proferida pelo Tribunal A Quo, nomeadamente no ponto 1) dos factos não provados, nos termos do artigo 640º do Código de Processo Civil.
20. Por outro lado, ao não considerar a documentação junta aos autos, nomeadamente a Declaração junta pelo Autor sob o Doc. n.º 3 da petição inicial, violou o Tribunal A Quo o disposto no artigo 413º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi alínea b) do n.º 2 do artigo 1º do Código de Processo Civil.
21. Não obstante o supra exposto, verifica-se que a sentença ora recorrida carece igualmente de fundamentação, não sendo possível apreender quais os fundamentos de facto e de direito que levaram o Tribunal a decidir que o Autor, ora Recorrente, não é portador de uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual, não sendo feita, mais uma vez, qualquer análise crítica da prova existente, violando, assim, a sentença recorrida o disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 607º do Código de Processo Civil, e sendo, em consequência, nula, nos termos da supracitada alínea b) do n.º 1 do artigo 615º do CPT.
22. Resulta, ainda, da sentença recorrida que a pretensão do Autor não se alicerça em factos evidenciados no processo, contudo, tal entendimento não possui qualquer correspondência com a verdade, atendendo a que, resulta dos autos o Parecer n.º 1087/DEM/EM-OC/2020, datado de 17-06- 2020, elaborado pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional, I.P. junto na plataforma citius sob a referência 6900058, datado de 17-06-2020, mediante o qual, após análise das concretas funções desempenhadas pelo Trabalhador e das exigências do posto de trabalho, conclui o Instituto do Emprego e Formação Profissional, I.P. que o Trabalhador “apresenta estar incapacitado para desenvolver as tarefas do seu posto de trabalho”.
23. Ora, tal parecer elaborado pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional, I.P. não é tido em consideração pelo Tribunal A Quo, quer na sentença final proferida no âmbito do processo principal, quer na sentença final proferida no âmbito do apenso para fixação da incapacidade- Apenso A-, não sendo valorada a conclusão do referido Instituto, nem sendo fundamentado qualquer facto que permita perceber porque motivo o Tribunal A Quo não considerou o documento em causa.
24. Assim, e ao não considerar a documentação junta aos autos, nomeadamente o referido Parecer elaborado pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional, I.P. violou o disposto no artigo 413º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi alínea b) do n.º 2 do artigo 1º do Código de Processo Civil.
25. Por outro lado, e ao considerar, na sentença proferida nos autos principais a 11-03-2021, que as sequelas do Sinistrado estão delimitadas funcionalmente à instabilidade do joelho (2%), e que “(…) muito dificilmente poderá ser considerada uma parte indispensável para o exercício dessa profissão, que importa a realização de múltiplas e diversificadas tarefas”, baseou-se o Tribunal A Quo em meras suposições, sendo que, em matéria de juízos técnicos, o Tribunal encontra-se, também, vinculado, sendo que, no mínimo, deve justificar qual a razão de decidir contra um documento que foi elaborado por técnicos- Parecer do Instituto do Emprego e Formação Profissional, I.P.
26. Por outro lado, e atenta a fundamentação supra, vem o Recorrente impugnar a decisão relativa à matéria de facto, nos termos do artigo 640º do Código de Processo Civil, iniciando pelo ponto 10) dos factos não provados da sentença proferida a 14-10-2020, no âmbito do Apenso A, sendo que, por existir meios de prova nos autos, deveria tal facto ter sido considerado provado, nomeadamente o Parecer n.º 1087/DEM/EM-OC/2020, datado de 17-06-2020, elaborado pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional, I.P. junto na plataforma citius sob a referência 6900058, datado de 17-06-2020, os Docs. n.ºs 4, 5, 6, 7 e 9 juntos com a petição inicial, o Doc. n.º 8 junto ao requerimento datado de 03-07-2019, com a referência citius 6063738, e o Doc. n.º 9, junto ao requerimento datado de 03-07-2019, com a referência citius 6063739, e, ainda, o depoimento prestado pelas Testemunhas CC e DD, e as declarações prestadas pelo Sinistrado, em sede de audiência de julgamento.
27. Neste aspecto, limita-se o Tribunal A Quo a referir que dificilmente as sequelas do Sinistrado comportam uma IPATH, entendendo que “(…) nem qualitativamente, nem quantitativamente, se alcança minimamente que uma IPP de 2% com base na instabilidade num joelho importe a incapacidade para o exercício da profissão de juntista”, contudo, o esforço inerente à atribuição ou não ao Sinistrado da referida incapacidade para o Trabalho Habitual passa, maioritariamente, pelas concretas funções desempenhadas pelo Sinistrado no seu posto de trabalho, e não apenas pela percentagem atribuída, a qual, independentemente de ser 2% ou 99%, terá de ser sempre conjugada com as funções desempenhadas pelo Sinistrado, esforço que, salvo melhor entendimento, não é feito pelo Tribunal.
28. A este respeito, pronunciou-se o Tribunal da Relação de Guimarães, por acórdão datado de 24-10-2019, proferido no âmbito do processo n.º 1730/15.8T8VRL.G1, e o Tribunal da Relação do Porto, por acórdão datado de 30-05-2018, proferido no âmbito do processo n.º 2024/15.4T8AVR.P1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt .
29. Mais acresce que, por despacho datado de 14-06-2019, com a referência 81372649, o Mmo. Juiz de Direito A Quo entendeu que “A incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual é uma situação complexa que depende da verificação de múltiplos factos que se desconhecem (…)” e que “A questão das funções concretamente desempenhadas pelo sinistrado não poderá ser resolvida unicamente pelos senhores peritos médicos (que desconhecerão as tarefas concretamente desempenhadas pelo Sinistrado) (…)”.
30. Verifica-se, assim, que o Mmo. Juiz de Direito A Quo considerava pertinente a apresentação de outros meios de prova, para além da requerida junta médica, por considerar que tal decisão- sobre se o Sinistrado padece de incapacidade permanente absoluta- não poderia ser tomada pelos Senhores Peritos, por desconhecerem as funções desempenhadas pelo Sinistrado.
31. Contudo, não é isso que se verifica das sentenças ora recorridas, sendo que, na sentença proferida no âmbito do Apenso A para fixação da incapacidade, decide o Tribunal A Quo julgar como não provado que “10. As sequelas importam para o autor a incapacidade absoluta para o trabalho habitual de juntista”, fundamentando tal decisão de facto somente no laudo unânime apresentado pelos Senhores Peritos, em sede de exame por junta médica.
32. Assim, e ao contrário do que determinava no despacho acima transcrito, o Mmo. Juiz de Direito limitou-se a atender ao parecer dos senhores peritos médicos, os quais, conforme resulta do referido despacho datado de 14-06-2019, desconhecem as tarefas concretamente desempenhadas pelo Sinistrado, pelo que não se compreende como, numa primeira fase, tal meio de prova é insuficiente para apreciar a questão da IPATH, e, numa fase final, é a prova bastante para se considerar que o Sinistrado não padece da referida incapacidade.
33. Por outro lado, e no que respeita aos pontos 2) a 9) dos factos não provados constantes da sentença proferida no âmbito do Apenso A, datada de 21-03-2022, com a referência 89457870, também estes deveriam ter sido considerados como provados, atendendo à existência nos autos de elementos probatórios que impunham uma decisão diversa quanto á matéria de facto em causa, nomeadamente o depoimento da testemunha CC e as declarações prestadas pelo Sinistrado no âmbiro da audiência de julgamento, meios de prova que vieram confirmar a dificuldade do Autor em realizar as tarefas descritas nos pontos 2) a 9) dos factos não provados, referindo que, para além da dificuldade na realização das tarefas, existem tarefas que o mesmo não consegue realizar, nomeadamente a que consta do ponto 3) “Ajoelhar-se ou agachar-se”.
34. Também os pontos T) e U) dos factos não provados se encontram incorretamente julgados, atendendo a que, com base no depoimento da testemunha EE, deveria o Tribunal A Quo ter considerado tais factos- T) e U)- como provados, uma vez que o mesmo confirmou ter referido ao Sinistrado que a Seguradora pagaria as despesas de deslocação, e que nas deslocações em veículo próprio, realizadas pelos Sinistrados, a seguradora paga a despesa de deslocação em transporte próprio em função da distância percorrida.
35. Ademais, da análise da decisão proferida quanto à matéria de facto, verifica-se, também, existir contradição entre a matéria de facto e a fundamentação e decisão dada, a qual implica a nulidade da sentença, ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil, nomeadamente com base nos pontos U) e Q) dos factos não provados, os quais se encontram em contradição com o ponto P) dos factos provados, sendo certo que, não se encontrando provado que a ré assumiria as despesas de transporte em veículo próprio em função da distância percorrida, como poderá a Ré ter sido condenada a pagar ao Autor a quantia de 11,00€, relativamente a despesas que o mesmo suportou, no seu veículo próprio? Porque terá a Ré de pagar os 11,00€ a título de despesas de deslocação se, conforme resulta do ponto Q) dos factos provados, disponibilizou ao Autor transporte de táxi?
II. Da sentença final proferida no âmbito do Apenso A, a 21-03-2022, com a referência 89457870
36. Conforme resulta do artigo 3º da presente peça processual, o presente recurso versa, também, sobre a sentença final proferida, no âmbito do Apenso A, a 21-03-2022, com a referência 89457870, nos termos do n.º 2 do artigo 140º do Código de Processo de Trabalho.
37. Da referida sentença, resulta, em primeiro lugar, a pronúncia do Tribunal A Quo quanto ao requerimento apresentado pelo Sinistrado a 10-02-2022, com a referência 41291169, indeferindo a arguida nulidade do auto de junta médica.
38. Em tal requerimento do Autor, ora Recorrente, invocava este a nulidade do auto de exame por junta médica, atendendo a que o Sinistrado, no âmbito da referida diligência, foi somente examinado por um dos três peritos que compunham a junta médica, não compreendendo o Autor como poderão os mesmos emitir juízos de valor/ pareceres sobre os factos que observam, sem proceder a qualquer examinação e observação do Sinistrado.
39. Por outro lado, e tendo por base o disposto no n.º 8 das Instruções Gerais, do Anexo I, da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidente de Trabalho ou Doença Profissional, que obriga à fundamentação de todas as conclusões tomadas pelos senhores peritos, invocou o Autor Recorrente a falta de fundamentação do auto de exame por junta médica, nos termos do n.º 1 do artigo 195º do Código de Processo Civil. Ademais, foi o Autor condenado em custas pelo incidente anómalo, que fixou em 2 U.C.’s, na sequência da arguição da nulidade do auto de junta médica realizado ao Autor a 02-10-2020.
40. Ora, o recurso ora interposto pelo Sinistrado, versa sobre o despacho que consta da sentença proferida pelo Mmo. Juiz A Quo a 21-03-2022, com a referência 89457870, no âmbito do apenso para fixação da incapacidade para o trabalho, mediante o qual o Tribunal se pronunciou quanto ao requerimento apresentado pelo Autor a 10-02-2022, com a referência 41291169, no qual era arguida a nulidade da diligência de exame por junta médica e do respectivo auto pericial de exame por junta médica.
41. Ora, no despacho ora posto em crise, e quanto à circunstância do Sinistrado, ora Recorrente, ter sido somente examinado por um dos 3 peritos que constituía a junta médica, considera o Tribunal A Quo que, em primeiro lugar, a questão suscitada pelo Autor “continua tão enigmática como a primeira versão apresentada a 15-10-20202”, sendo expectável, segundo o Tribunal A Quo, que o Autor, depois de tomar conhecimento do despacho de 04-11-2020, fosse mais claro e assertivo sobre os fundamentos e alcances da afirmação do Sinistrado, nomeadamente na parte onde refere “somente um dos peritos avaliou o estado do Sinistrado”.
42. Mais, refere o Tribunal A Quo que fica por esclarecer o que os outros dois peritos estavam a fazer na junta, “se é que não o estavam a examinar, mas estavam presentes… E o que é que o sinistrado entende quando afirma que “é necessário que intervenham activamente na diligência e avaliação do Sinistrado”, concluindo que “a afirmação em como o sinistrado foi somente examinado por um dos 3 peritos que constituía a dita junta médica é contrariada pelo teor do próprio auto e aquele não invocou a sua falsidade, determinando a improcedência deste fundamento.
43. Quanto a estes aspectos, esclarece-se, desde já, que o Recorrente refere, no artigo 8º de tal requerimento, que o “Sinistrado somente foi examinado por um dos 3 peritos que constituía a dita junta médica”, mais explicando no artigo 11º que caberia aos Senhores Peritos “procederem à observação objectiva do Sinistrado, de modo a emitir juízo de valor sobre os factos que observam”.
44. Salvo melhor entendimento, em momento algum o Autor pretendeu invocar a falsidade do auto, sendo certo que o auto se encontra, efectivamente, assinado pelos três peritos e que os três estiveram fisicamente presentes na diligência de junta médica.
45. Pretendeu, sim, o Sinistrado invocar a nulidade da diligência em causa, atendendo a que a avaliação técnica que foi feita ao Sinistrado foi equivalente a um exame médico singular, pois somente um dos peritos procedeu à avaliação objectiva do estado clínico do Sinistrado, desvirtuando o sentido da lei.
46. Na verdade, a lei impõe que, no âmbito da fase conciliatória, seja o Sinistrado presente a um perito médico, o qual deve indicar o resultado da sua avaliação clínica, nomeadamente as sequelas e as incapacidades correspondentes, nos termos dos artigos 105º e seguintes do CPT, possibilitando ao Sinistrado que, não se conformando com tal resultado da avaliação clínica do Perito Singular, seja o mesmo presente a uma junta médica, composta por três peritos médicos.
47. A ratio de tal possibilidade, prevista no n.º 2 do artigo 138º do CPT, é a de permitir uma avaliação e decisão mais rigorosa, uma vez que é feita por mais do que um perito, quanto às sequelas e natureza e grau da incapacidade do Sinistrado, não se concebendo que a exigência da junta médica ser composta por três médicos tenha como finalidade que os três médicos apenas estejam presentes na diligência, situação que equivaleria a um exame singular.
48. Ora, se se trata de um exame que é composto por três peritos médicos, é necessário que intervenham activamente na diligência e avaliação do Sinistrado, de modo a formularem um juízo seguro sobre aquilo que percepcionaram, relativamente ao estado clínico do Sinistrado, nomeadamente das sequelas que o mesmo apresenta e correspondente grau de incapacidade.
49. Na verdade, no caso dos autos, quando refere que foi “somente examinado por um dos peritos que constituía a dita junta médica”, pretende chamar a atenção para o facto de somente um dos peritos ter manipulado, apalpado e interagido física e directamente com o Sinistrado, sendo que, muito embora os três peritos tenham estado presentes e assinado o respectivo auto, apenas um se dirigiu ao Sinistrado, mediu o seu joelho e atribuiu um valor, fixado em centímetros, para apurar a sua incapacidade.
50. Não se trata de tentar ensinar os peritos a realizar um exame médico, conforme refere o Tribunal A Quo, mas sim de garantir o cumprimento das disposições legais e dos procedimentos aplicáveis, senão vejamos:
51. A questão primordial em causa nos autos, quanto à fixação da incapacidade atribuída ao Sinistrado, prende-se com a recondução das sequelas do Sinistrado à Tabela Nacional das Incapacidades (doravante TNI), nomeadamente ao “Capítulo I- Aparelho Locomotor”, “12- Joelho”, “12.1.2. Sequelas de Lesões Ligamentares ou Capsulares”, as quais se desdobram em 3 tipos de grau: Grau ligeiro, Grau Moderado ou Grau Grave.
52. Ora, para a ponderação de qual o Capítulo a que se irá reconduzir as sequelas do Sinistrado, importa calcular a amiotrofia que se verifica no joelho, sendo certo que uma maior ou menor amiotrofia irá alterar o grau em que irá enquadrar-se a sequela do Sinistrado, ou até mesmo o tipo de lesão em causa.
53. Na verdade, resulta da sentença ora recorrida que “(…) considerando que a sequela no joelho revela apenas ligeira instabilidade anterior e amiotrofia de 1,5 cm, é de considerar suficientemente justificada a ponderação de 0,02 na referida escala de 0,01 a 0,05”, pelo que os centímetros da amiotrofia são, efectivamente, importantes para enquadrar as sequelas do Sinistrado numa parte da TNI, devendo, assim, tal facto- os centímetros de amiotrofia- ser analisado por cada um dos peritos que, no final, conclui atribuir ao Sinistrado a lesão de grau ligeiro, fixando a incapacidade do mesmo em 2%, sendo, por essa razão, que invoca o Sinistrado a nulidade da referida diligência: por não ter sido respeitada a ratio da lei o que, naturalmente, implica a violação dos direitos, liberdades e garantias do Sinistrado.
54. Assim, e desde logo, não se compreende como puderam os Senhores Peritos dispensar a avaliação objectiva e individual do Sinistrado, atendendo a que as sequelas, que se verificam no joelho, não são manifestas nem inequívocas, sendo sempre necessário proceder à avaliação física e objectiva do mesmo.
55. Ainda que assim fosse, e salvo melhor entendimento, deveria sempre constar do auto de exame por junta médica que se tinha dispensado a avaliação física do Sinistrado, por as sequelas serem aparentes ou por terem concluído, da análise de outros elementos dos autos, quais as sequelas do mesmo, sendo que, não resultando do auto de exame por junta médica qualquer observação quanto ao facto de dois dos três peritos médicos não terem necessitado de avaliar o Sinistrado para concluir qual o estado clínico do mesmo, haveria lugar a falta de fundamentação, em violação do disposto no n.º 8 das Instruções Gerais, do Anexo I, da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidente de Trabalho ou Doença Profissional, sendo que, para além do mais, está em causa a medição de uma lesão, da qual resulta, de modo objectivo, uma incapacidade permanente.
56. Dito de outra maneira, se a lesão tiver 1 cm, temos um grau de incapacidade, e 5 cm temos outra. Ora, só pela lesão em causa seria de todo conveniente que os três médicos medissem e efectuassem as diligências médicas necessárias ou, pelo menos, o fizessem em simultâneo. O que não pode acontecer é um avaliar a lesão e medir e os outros não verificarem e aderirem somente à avaliação realizada por este.
57. Tanto assim é que, no âmbito do exame pericial singular, que consta anexo ao auto de junta médica, foi atribuída uma atrofia de 3 cm ao Sinistrado, e no âmbito da perícia colegial foi-lhe atribuída uma atrofia de 1,5 cm, pelo que só o facto de as medições divergirem no dobro seria motivo suficiente para despertar consciências e para que mais do que uma pessoa observasse esta circunstância em concreto.
58. Ora, o que se pretendia chamar a atenção do Tribunal A Quo, sem invocar falsidades ou outras vicissitudes, nem invocar todos os formalismos que, muitas vezes, obstam a uma sã Justiça, mas também não cair no sim porque sim, era somente o seguinte:
59. A avaliação é colegial não é por uma questão nominativa, é por uma questão de segurança e de transparência, e garante maior imparcialidade, uma vez que errar é também humano.
60. Muito embora possa haver um elemento que preside, ou seja, que dá a palavra aos outros, isso não significa que os outros não tenham um papel activo e crítico, existindo, por isso mesmo, nalgumas situações, a possibilidade de votar vencido e fundamentar.
61. Ora, só se consegue o último desiderato acima referido se se fizer um juízo objectivo e crítico, não se compreendendo como, no caso concreto do Recorrente, poderia qualquer perito emitir parecer fundamentado sobre as sequelas e natureza e grau de incapacidade do mesmo, somente por olhar para o Sinistrado, sem realizar qualquer acto médico, sendo que, neste caso, dois dos peritos que, obrigatoriamente, devem participar na diligência de junta médico, para emitir o seu parecer, basearam-se na avaliação e medições feitas pelo outro perito médico,
62. O que certamente não corresponde ao objectivo do legislador e não confere a tal exame médico a certeza e segurança jurídica necessária para atribuir ao Sinistrado uma incapacidade permanente.
63. Mais, não resulta de nenhuma prática de bons procedimentos conhecida pelo Recorrente que o exame objectivo só tenha de ser feito por um dos peritos, nem tão pouco servindo como justificação a pandemia, não podendo os procedimentos ser “atenuados” por esse motivo, sendo que, ou fazemos como deve ser e como a lei obriga, ou então arranjamos procedimentos para aplicar em situações de pandemia, mas antes temos de alterar a lei.
64. Assim sendo, e atento o supra exposto, que reconduz à nulidade da diligência de junta médica e, consequentemente, do respectivo auto de exame por junta médica, verifica-se que, ao decidir nos termos que constam do despacho recorrido, violou o Douto Tribunal A Quo o disposto no n.º 1 do artigo 480º do Código de Processo Civil e o disposto no artigo 139º do CPT, devendo ser substituído por outro que defira a arguida nulidade da diligência de junta médica.
65. Quanto a este ponto, desde já se refere que o Sinistrado invocou, para além da nulidade do auto de junta médica, a nulidade da própria diligência de exame por junta médica realizada, nos termos dos artigos 20º e 21º do requerimento apresentado a 10-02-2022, sendo que o Tribunal A Quo não se pronunciou quanto a tal questão.
66. Em último lugar, pronuncia-se o douto Tribunal sobre a fundamentação, ou falta dela, do resultado da avaliação pericial realizada ao Recorrente, começando por referir, no despacho ora recorrido, que “(…) a resposta a esta questão é dada pelo próprio autor, pois a junta médica mostrou-se concordante com a avaliação singular invocada pelo sinistrado ao reconduzir as sequelas ao Capítulo I 12.1.2.a) da T.N.I., que prevê um coeficiente de incapacidade de 0,01 a 0,05.
67. Quanto a este ponto, importa referir que é falso que a junta médica se tenha demonstrado concordante com a avaliação singular invocada pelo autor. Na verdade, verifica-se que os Senhores Peritos entendem que as lesões do Sinistrado se enquadram no Capítulo I 12.1.2.a), que prevê um coeficiente de incapacidade de 0,01 a 0,05. Contudo, da avaliação singular invocada pelo Autor e junta aos autos pelo mesmo, na data da realização da referida junta médica, resulta que o Perito subscritor considera que as sequelas que o Sinistrado apresenta- dor e hipotrofia muscular superior a 2cm- são enquadráveis no Capítulo I 12.1.3.b), referente a sequelas de meniscectomia, prevendo um coeficiente de incapacidade de 0,04 a 0,10.
68. Assim sendo, a perícia colegial ora realizada não é concordante com a perícia singular invocada pelo Autor, discordando não só quanto ao coeficiente de incapacidade a atribuir ao Sinistrado, como também quanto às próprias sequelas que o Sinistrado apresenta, assim como não é concordante com a perícia singular realizada na fase conciliatória do processo, conforme relatório datado de 22-01-2019, que considerou que o Autor apresentava “sequelas de lesão meniscal interna, externa e ligamento cruzado anterior, com atrofia de 3 cm”, enquadrando-as no Capítulo I 12.1.2.a), mas atribuindo um coeficiente de incapacidade de 0,04, sem que se compreenda qual o fundamento para tais discrepâncias, não se encontrando devidamente justificadas as respostas apresentadas pelos Senhores Peritos.
69. De salientar que, existindo discrepâncias entre os vários relatórios médicos que constam dos autos, seria conveniente que o Tribunal A Quo, antes de proferir decisão sobre o grau e natureza da incapacidade do Sinistrado, ordenasse a realização de exames complementares, nomeadamente da especialidade de ortopedia, nos termos do n.º 7 do artigo 139º do CPT, sendo que, no mesmo sentido, decidiu o Tribunal da Relação de Évora, por acórdão datado de 25-09-2014, no âmbito do processo n.º 298/13.4TTSTR.E1, disponível em www.dgsi.pt.
70. Não obstante o supra exposto, conclui o Tribunal A Quo, relativamente à falta de fundamentação do resultado da avaliação médica, ser de considerar “suficientemente justificada a ponderação de 0,02 na referida escada de 0,01 a 0,05”, indeferindo a arguida nulidade do auto de junta médica. Sucede que, se atentarmos ao requerimento datado de 10-02-2022, com a referência 41291169, verifica-se que o Recorrente não arguiu somente a falta de fundamentação na aplicação ao Autor, pelos Senhores Peritos, de um coeficiente de incapacidade de 0,02, arguindo a falta de fundamentação de todas as respostas dadas pelos Senhores Peritos aos Quesitos que foram submetidos à apreciação dos mesmos, pelo que o despacho ora recorrido, para além de não se pronunciar sobre todas as questões submetidas à apreciação do Tribunal A Quo, não fundamenta a decisão nele vertida, limitando-se a referir que a Tabela Nacional de Incapacidades por Acidentes de Trabalho admite alguma discricionariedade técnica na fixação dos coeficientes de incapacidade e que é a mesma concordante com a avaliação singular,
71. Sendo tal fundamentação, salvo melhor entendimento, inexistente para concluir que o auto de exame por junta médica e as respostas dos Senhores Peritos aos Quesitos 1 a 16 se encontram devidamente fundamentados, sendo esta questão, no entender do Recorrente, relevante para a decisão de mérito.
72. Ora, a omissão de pronúncia é um vício que ocorre quando o Tribunal não se pronuncia sobre questões com relevância para a decisão de mérito, sendo que, dispõe o n.º 2 do artigo 608º do CPC que “O Juíz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras (…)”.
73. Nesse sentido, resulta da alínea d) do n.º 1 do artigo 615º do CPC, que a sentença é nula quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
74. Assim, e atendendo ao supra exposto, entende o Recorrente que o despacho recorrido é nulo, com fundamento em omissão de pronúncia, ao abrigo dos artigos 608º, n.º 2 e 615º, n.º 1, alínea d), todos do CPC.
75. Por outro lado, resulta do n.º 1 do artigo 154º do Código de processo Civil, aplicável ex vi alínea a) do n.º 2 do artigo 1º do CPT que as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas, pelo que carece o despacho ora recorrido de fundamentação, relativa à falta de fundamentação das conclusões dos senhores peritos constantes do auto de exame por junta médica, devendo ser revogado, por violar o disposto no n.º 1 do artigo 154º do CPC.
76. Não obstante, verifica-se que dispõe o n.º 8 das Instruções Gerais, do Anexo I, da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidente de Trabalho ou Doença Profissional que “O resultado dos exames é expresso em ficha apropriada, devendo os peritos fundamentar todas as suas conclusões.” (sublinhado e negrito nosso).
77. Ora, em primeiro lugar, desconhecemos se a ficha apropriada designada na lei correspondente ao auto de exame por junta médica, que é redigido numa folha com timbre do próprio Tribunal.
78. Não obstante, muito embora conste do auto de exame médico a conclusão ou conclusões, em momento algum se pode considerar isso uma fundamentação.
79. Ora, é requisito das decisões também judiciais, que tenham de ser fundamentadas, sendo que, para tal, deverá ser fácil, a uma qualquer pessoa, perceber porque é que foi decidido num sentido e não noutro.
80. Mais, não basta que se encontre fundamentada a conclusão do coeficiente de incapacidade a atribuir ao Sinistrado, sendo necessário que todas as conclusões dos Senhores Peritos se encontrem fundamentadas, de modo a possibilitar o julgador de captar as razões e o processo lógico que conduziu às conclusões dos senhores peritos.
81. Ora, analisando as respostas dadas pelos Senhores Peritos aos Quesitos 5 a 15, referente às concretas limitações que padece o Sinistrado- sendo questionado se o Sinistrado consegue subir escadas e escadotes, fletir as pernas, ajoelhar-se ou agachar-se, pôr-se de cócoras, entre outras, verifica-se que os mesmos dão uma resposta sem que tenha sido feita uma concreta avaliação do estado de saúde do Sinistrado que permita responder à questão, nomeadamente pedindo ao Sinistrado que se ajoelhe, que suba escadas, que se agache ou coloque de cócoras, não sendo possível compreender quais os factos em que se baseiam os peritos médicos para atingir a conclusão de que o Sinistrado pode ou não realizar as tarefas descritas nesses quesitos.
82. Mais acresce que, relativamente ao Quesito 16, onde é questionado se o Sinistrado padece de incapacidade permanente para o trabalho habitual, os peritos médicos respondem “Não”, não sendo feita a devida análise e ponderação das concretas tarefas desempenhadas pelo Sinistrado no âmbito do exercício das suas funções habituais, em correspondência com as limitações de que padece, nem tão pouco sendo feita qualquer alusão a eventual documentação analisada pelos Senhores Peritos.
83. Ora, o que se questionava, nesse quesito 16, era efectivamente se as sequelas que o Sinistrado apresenta, resultantes do acidente de trabalho que sofreu, lhe permitem ou não desempenhar um conjunto de tarefas que constituem o núcleo essencial da actividade profissional do Sinistrado, sendo que a análise de uma eventual incapacidade permanente para o trabalho habitual passa, também pela apreciação do tipo de tarefas concretas que o trabalhador habitualmente desempenha.
84. Neste sentido, resulta dos autos principais, com a referência 6900058, datado de 17-06-2020, um parecer elaborado por Técnico Superior do Instituto do Emprego e Formação Profissional, I.P., do qual resulta ser entendimento daquela Entidade que o Trabalhador “apresenta estar incapacitado para desenvolver as tarefas do seu posto de trabalho (…)”, tendo em conta as concretas funções exercidas pelo Sinistrado e as sequelas que padece.
85. Não sendo feita tal ponderação, e não tendo os senhores peritos conhecimentos das funções executadas pelo sinistrado em momento prévio ao acidente de trabalho não poderiam os mesmos, com a devida certeza e segurança, formular juízos quanto ao facto de o mesmo estar afectado ou não de uma incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual.
86. No mesmo sentido, pronunciou-se o Douto Tribunal da Relação do Porto, por acórdão proferido a 20-01-2020, no âmbito do processo n.º 3404/18.9T8PNF.P1, assim como por acórdão datado de 22-06-2020, proferido no âmbito do processo n.º 3242/18.9T8VFR-P1, bem como por acórdão proferido no âmbito do processo n.º 179/15.7Y3VNG.P1, datado de 10-10-2016, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
87. Por outro lado, resulta do n.º 10 das Instruções Gerais, do Anexo I, da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidente de Trabalho ou Doença Profissional que na determinação da incapacidade global a atribuir devem ser ponderadas as efectivas possibilidades de reabilitação profissional do sinistrado, face às suas aptidões e capacidades restantes, podendo, neste caso, e sempre que seja considerado adequado ou conveniente, ser solicitado parecer às entidades competentes nas áreas do emprego e formação profissional, sobre as efectivas possibilidades de reabilitação do sinistrado.
88. Assim, e do teor do auto de exame, não se verifica ter sido efectuada qualquer alusão à reabilitação profissional do Sinistrado, pelo que, também neste ponto, carece o mesmo de fundamentação.
89. Assim, e atentos os fundamentos supra expostos, considera o Sinistrado que o auto de exame por junta médica é nulo, por falta de fundamentação, nos termos do n.º 1 do artigo 195º do Código de Processo Civil, sendo que o despacho recorrido, ao indeferir a arguida nulidade, viola as normas constantes do n.º 1 do artigo 195º do Código de Processo Civil, bem como o n.º 8 das Instruções Gerais, do Anexo I, da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidente de Trabalho ou Doença Profissional, devendo o mesmo ser revogado e, consequentemente, determinada a repetição da diligência de junta médica, nomeadamente com a realização de todas as diligências necessárias à formulação de juízo sobre a incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual por parte do Sinistrado e fundamentando as respectivas respostas, em conformidade com o supra explanado.
90. Por último, vem o Recorrente condenado a suportar duas U.C.’s pelo “anómalo incidente”, segundo resulta do despacho ora recorrido.
91. Em primeiro lugar, verifica-se que não fundamentou o Tribunal A Quo a decisão de condenação do Sinistrado, limitando-se a referir “Condeno o Autor a suportar duas UC’s pelo presente anómalo incidente”.
92.Ora, atendendo a que todas as decisões proferidas no processo devem ser sempre fundamentadas, ao abrigo do artigo 154º do Código de processo Civil, aplicável ex vi alínea a) do n.º 2 do artigo 1º do CPT, verifica-se que o despacho ora recorrido encontra-se numa clara violação do disposto no n.º 1 do artigo 154º do CPC, também no que se reporta à condenação do Sinistrado em custas processuais, devendo, em consequência, ser revogado.
93. Por outro lado, é considerado acidente anómalo aquele que é estranho ao desenvolvimento da lide, aquele que se distancia da normal tramitação de um processo judicial, consubstanciando numa actividade ou conduta processual entorpecedora da acção da justiça, sendo que devem ser consideradas abrangidas pela tributação específica da acção as questões que surjam no seio da dinâmica normal do processo, que não tenham carácter descabido.
94. Na verdade, dispõe o n.º 8 do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro, que “Consideram-se procedimentos ou incidentes anómalos as ocorrências estranhas ao desenvolvimento normal da lide que devam ser tributados segundo os princípios que regem a condenação em custas.”
95. Ora, no caso em apreço, verifica-se que o requerimento apresentado pelo Sinistrado a 10-02-2022, com a referência 41291169, se trata de um requerimento de arguição de nulidade do auto de exame por junta médica realizado ao Autor, apresentado no devido tempo, isto é, no prazo de 10 dias contados a partir da notificação do auto de exame, pelo que, incluindo-se as arguições de nulidade na tramitação normal de um processo judicial, e não tendo o requerimento de arguição de nulidade do Autor comportado qualquer acréscimo anormal da actividade processual, não se trata tal requerimento de uma ocorrência estranha ao desenvolvimento da lide, razão pela qual não é tributável como incidente anómalo o requerimento de arguição de nulidade apresentado pelo Autor.
96. Pelo que, não obstante a falta de fundamentação, o despacho ora recorrido não tem qualquer fundamento legal para a condenação do Recorrente em custas processuais por incidente anómalo, devendo o mesmo ser revogado, na parte em que condenou o Recorrente em custas processuais por incidente anómalo, com todas as legais consequências.
97. Em igual sentido, pronunciou-se o Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão datado de 20-03-2019, proferido no âmbito do processo n.º 171/16.4GASEI-A.C1, disponível em www.dgsi.pt.
98. Não obstante, verifica-se que, após o requerimento do Autor, de 10-02-2022, com a referência 41291169- o qual originou a condenação do Autor em duas UC’s por incidente anómalo, conforme atrás ficou exposto, veio a Ré- Fidelidade- Companhia de Seguros, S.A. apresentar resposta, através de requerimento, datado de 23-02-2022, com a referência 41429015, resultando do mesmo o seguinte “Fidelidade (…), tendo sido notificada do requerimento do A., vem dizer o seguinte: (…)”.
99. Assim, tal requerimento constitui uma resposta ao requerimento apresentado pelo Autor a 10-02-2022, requerimento que motivou a condenação do Autor em incidente anómalo.
100. Assim, verifica-se que a Ré Fidelidade- Companhia de Seguros, S.A., ao responder ao requerimento apresentado pelo Autor, não foi condenada no pagamento de taxas de justiça por incidente anómalo, ao contrário do que sucedeu com o Autor, sendo que este requerimento da Ré foi motivado pelo requerimento do Autor, encontrando-se ambos os requerimentos em semelhantes condições procedimentais, sem que lhes tenha sido dado o mesmo tratamento.
101. Neste sentido, dispõe o artigo 4º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 1º, n.º 1, alínea a) do Código de Processo de Trabalho, que “O tribunal deve assegurar, ao longo de todo o processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no exercício de faculdades, no uso de meios de defesa e na aplicação de cominações ou de sanções processuais.” (sublinhado nosso).
102. Assim, sem prejuízo de todo o supra exposto, e ao condenar o Autor a suportar duas UC’s por incidente anómalo, sem que a Ré Fidelidade- Companhia de Seguros, S.A. tenha sido, igualmente, condenada no mesmo pagamento, incorre a sentença ora recorrida na violação dos princípios da igualdade e da equidade, nomeadamente em violação do disposto nos artigos 4º do Código de Processo Civil.
103. Por outro lado, na referida sentença proferida a 21-03-2022, no âmbito do Apenso A, vem, também, o Tribunal A Quo indicar quais os factos provados e não provados considerados no âmbito do referido Apenso A.
104. Para tal, começa o Mmo. Juiz de Direito por referir que os Exmos. Senhores Peritos apresentaram um laudo unânime quanto à questão da incapacidade, mais referindo que, pese embora o desencontro das partes, “entende-se que deve dar-se prevalência ao juízo unânime resultante da junta médica, por se tratar de uma prova sujeita ao contraditório, produzida na presença do Juiz e evidenciar suficientes e atendíveis razões de ciência.”
105. Ora, no âmbito da diligência de junta médica, o Autor apresentou Relatório Médico-Legal, elaborado pelo Sr. Dr. HH, Médico perito em avaliação do dano corporal pelo I.M.L. Coimbra, relatório que se encontra anexo ao auto de exame por Junta Médica constante do Apenso A, sob a referência citius 84827242, datado de 02-10-2020, constando de tal documento que o Autor apresenta, como sequelas, dor e hipotrofia muscular superior a 2cm, atribuindo ao mesmo uma IPP de 6%, nos termos do Capítulo I, 12.1.3. b), à qual acrescia o factor de bonificação de 1,5 atendendo ao posto de trabalho não reconvertível, atribuindo ao Sinistrado uma IPP de 9%, sendo que, tal relatório médico foi notificado à Ré Fidelidade- Companhia de Seguros, S.A., mediante notificação electrónica datada de 02-10-2020, com a referência 84846409, não tendo a Ré se pronunciado quanto ao referido relatório médico.
106. Assim, verifica-se que o relatório médico elaborado pelo Sr. Dr. HH, anexo ao Auto de Exame por Junta Médica, também se trata de prova sujeita ao contraditório, sendo que igualmente evidencia suficientes e atendíveis razões de ciência, sendo que o Tribunal A Quo não o tomou, também, em consideração para a decisão que proferiu, situação que consubstancia uma violação do disposto no artigo 413º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi alínea b) do n.º 2 do artigo 1º do Código de Processo Civil.
107. Não obstante o supra exposto, e tendo em conta o entendimento do Tribunal, vertido na sentença ora recorrida, não se pode considerar que o auto de exame por junta médica prevalece sobre o relatório médico apresentado pelo Sinistrado, por a primeira se tratar de prova sujeita ao contraditório, sendo certo que ambas as situações foram sujeitas ao contraditório.
108. Assim sendo, carece de fundamentação a sentença final proferida no âmbito do Apenso A, para fixação da incapacidade, não sendo possível compreender que razões levaram o Tribunal A Quo a optar por dar prevalência ao laudo dos peritos intervenientes na diligência de junta médica e não ao relatório médico elaborado pelo Sr. Dr. HH, e apresentado pelo Autor no âmbito da referida diligência, não sendo feita qualquer análise crítica dos referidos meios de prova, conforme impõe o n.º 4 do artigo 607º do Código de Processo Civil, 109. Sendo certo que, para além do mais, foi arguida pelo Autor a nulidade da diligência de junta médica e do respectivo auto, atendendo a que a mesma não se encontra devidamente fundamentada, conforme infra melhor explanado, pelo que, a ser considerado nulo o auto de exame por junta médica, terá a sentença final proferida no âmbito do Apenso A de ser considerada, igualmente, nula, por falta de fundamentação, nos termos do n.º 4 do artigo 607º do Código de Processo Civil.
110. Sem prejuízo do supra exposto, verifica-se, da sentença proferida no âmbito do apenso A, que da mesma constam apenas os factos considerados provados e não provados pelo Tribunal A Quo, sem que se encontrem especificados os fundamentos de facto e de direito que justificam tal decisão de facto, sendo somente indicado que resulta do laudo unânime dos Exmos. Peritos.
111. Assim, e devendo constar da sentença os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil, verifica-se que é a mesma nula, por violar o disposto na referida norma- alínea b) do n.º 1 do artigo 615º do Código de Processo Civil.
112. Ademais, e no que se reporta ao ponto 1) dos factos não provados, importa atentar às declarações médicas constantes do processo principal, juntas pelo Autor sob os Docs. n.ºs 2 e 3 da petição inicial junta aos autos a 02-07-2019, com a referência citius 60637535, sendo que da declaração médica junta aos autos sob o Doc. n.º 3 da petição inicial, datada de 09-05-2018, resulta o seguinte: “(…) Aguardamos a decisão do Tribunal para avaliação das incapacidades, até lá consideramos que o trabalhador está inapto para a sua função, não podendo este apresentar-se ao trabalho”. (sublinhado nosso).
113. A inaptidão do Trabalhador para a sua função foi comunicada atempadamente à Ré Fidelidade- Companhia de Seguros, S.A., conforme Doc. n.º 4 do requerimento apresentado nos autos a 11-11-2019, com a referência citius 6388820, e depoimento da testemunha CC, que confirmou ter feito essa comunicação à Ré.
114. Ora, tendo por base tal declaração junta aos autos sob o Doc. n.º 3 da petição inicial junta a 02-07-2019, com a referência 6063735, deveria o Tribunal ter considerado como provado o facto 1) dos factos não provados, considerando que, desde a data da alta clínica, até à decisão do Tribunal, o Trabalhador continuou a sofrer incapacidade temporária absoluta para o Trabalho.
115. Importa, ainda, referir que, conforme resulta dos artigos 59º a 62º da petição inicial, o Autor, para o exercício da sua profissão, necessita de realizar formações, na vertente prática e teórica, sem as quais não poderá realizar qualquer função, nomeadamente o CURSO SIRIRF- Segurança na Intervenção em Redes e Infraestruturas da rede fixa- telecomunicações”, conforme Doc. n.º 11 junto com a petição inicial, sendo certo que, para regressar ao trabalho, o Autor teria necessariamente de realizar a referida formação, contudo, e por não ter sido declarado apto para o exercício das suas funções por parte da Medicina do Trabalho, não poderia o Autor realizar a referida formação, constando dos pré-requisitos para a participação do Curso constantes do referido Doc. n.º 11 “Ficha de Aptidão para o trabalho com resultado “apto”.
116. Assim sendo, verifica-se que o Tribunal A Quo, não considerando a documentação acima referida, que foi junta aos autos em devido tempo, violou o disposto no referido artigo 413º do Código de Processo Civil, aplicável ex vi alínea b) do n.º 2 do artigo 1º do Código de Processo Civil, que estabelece a obrigatoriedade do Tribunal tomar em consideração todas as provas produzidas.
117. Novamente a respeito da questão relativa à Incapacidade Permanente Absoluta para o Trabalho Habitual, limita-se o Tribunal A Quo a, no ponto 10) dos factos não provados, não julgar como provado que “As sequelas importam para o autor a incapacidade absoluta para o trabalho de juntista”, sem especificar que razões o levaram a decidir não julgar provado tal facto, sendo certo que, conforme anteriormente referido, resulta dos autos documentação suficiente que impunha uma decisão diversa da proferida quanto à matéria de facto, nomeadamente o já referido Parecer n.º 1087/DEM/EM-OC/2020, datado de 17-06-2020, elaborado pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional, I.P. junto na plataforma citius, sob a referência 6900058, mediante o qual se conclui que o Sinistrado “apresenta estar incapacitado para desenvolver as tarefas do seu posto de trabalho.
118. Ora, da análise da sentença final proferida no âmbito do processo principal, assim como da análise da sentença final proferida no âmbito do apenso para fixação da incapacidade- Apenso A-, ambas sentenças ora recorridas, é feita tábua rasa do documento elaborado pelo Instituto do Emprego e Formação Profissional, I.P., não sendo feita qualquer alusão à sua existência no processo, não sendo valorada a conclusão do referido Instituto, nem sendo fundamentado qualquer facto que permita perceber porque motivo o Tribunal A Quo não considerou o documento em causa, pelo que considera o Recorrente que a sentença final, proferida no âmbito do processo principal, e da qual ora se recorre, é nula, nos termos da supracitada alínea b) do n.º 1 do artigo 615º do CPT, violando a sentença em causa o disposto nos n.ºs 3 e 4 do artigo 607º do Código de Processo Civil.
Nestes Termos e nos Melhores de Direito, dado que seja por V.Exªs., Venerandos Desembargadores, o V. douto suprimento, deve ser concedido provimento ao presente recurso e, em consequência, serem as sentenças ora recorridas revogadas, sendo substituídas por outras, atentos os fundamentos expostos, com o que se fará a desejada JUSTIÇA!
A Ré “Fidelidade, S.A.” veio apresentar contra-alegações, onde pugnou pela improcedência do recurso.
Por despacho proferido em 13-07-2022, o tribunal a quo determinou a retificação da sentença na parte decisória, ficando a constar que “o capital de remição de € 3.752,69 correspondente a uma pensão anual de € 225,02, devida desde o dia 25/4/2018, por uma IPP de 2% e não de 11% - art.ºs 613.º e 614.º, do Código de Processo Civil”.
O tribunal de 1.ª instância admitiu o recurso como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo, após a subida dos autos ao Tribunal da Relação, sido dado cumprimento ao preceituado no n.º 3 do art. 87.º do Código de Processo do Trabalho, no qual a Exma. Sra. Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer, pugnando pela improcedência do recurso.
O Autor veio responder a tal parecer, insistindo pela procedência do recurso apresentado.
Neste tribunal, o recurso foi admitido nos seus precisos termos.
Foram os autos aos vistos, pelo que cumpre agora apreciar e decidir.
II – Objeto do Recurso
Nos termos dos arts. 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do Código de Processo Civil, aplicáveis por remissão do artigo 87.º n.º 1 do Código de Processo de Trabalho, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente, ressalvada a matéria de conhecimento oficioso.
No caso em apreço, as questões que importa decidir são:
Recurso do despacho proferido em 21-03-2022 no Apenso A
1) Nulidade do despacho que indeferiu a nulidade do auto de exame por junta médica;
2) Nulidade do auto de exame por junta médica;
3) Nulidade da condenação do Autor em 2 UC´s;
4) Inexistência de um incidente anómalo;
Recurso da sentença proferida em 21-03-2022 no Apenso A
5) Nulidade da sentença proferida no Apenso A;
6) Impugnação da matéria de facto;
Recurso da sentença proferida no processo principal
7) Violação do art. 135.º do Código de Processo do Trabalho;
8) Nulidade da sentença;
9) Impugnação da matéria de facto; e
10) Existência de uma situação de IPATH.
III – Matéria de Facto
O tribunal de 1.ª instância deu como provados os seguintes factos:
A) O autor AA nasceu no dia .../.../1986;
B) No dia 12 de Maio de 2017, cerca das 11,30 horas, em Telheiro, Portimão, depois de fazer umas ligações de telecomunicações e ao dirigir-se para a carrinha, o autor escorregou e, em queda, torceu o joelho direito;
C) Em consequência, resultou traumatismo desse joelho, com dor e impotência funcional;
D) Nesse dia, hora e local, o autor exercia as funções de juntista, por conta de BB;
E) Que lhe pagava a remuneração global anual de € 16.073;
F) Esta firma tinha a responsabilidade civil emergente de acidentes laborais transferida para a ré Fidelidade – Companhia de Seguros, S.A., por apólice de seguro de acidentes de trabalho;
G) Em consequência do descrito evento, o autor sofreu incapacidade temporária absoluta para o trabalho desde o dia 13/5/2017 até ao dia 22/3/2018 [por lapso, escreveu-se antes o dia 23/3/2018, quando as partes acordaram o dia anterior];
H) A ré seguradora pagou ao autor, a título de indemnizações por incapacidade temporária, a quantia global de € 9.882,43.
I) O autor evidencia como sequelas ligeira instabilidade anterior e amiotrofia de 1,5 cm.;
J) As sequelas do autor importam uma I.P.P. de 2%;
K) O A. sofreu incapacidade temporária parcial para o trabalho de 20% desde o dia 23/3/2018 até ao dia 24/4/2018;
L) O autor, como consequência do descrito evento, em marchas muito prolongadas sentirá algum desconforto;
M) E dificuldade em caminhar em pisos inclinados e irregulares, nomeadamente subir e descer ladeiras; e,
N) Subir escadas e escadotes;
O) As tarefas desempenhadas pelo autor implicam a realização, entre outras, das seguintes funções:
- Subir e descer postes de telecomunicações, entre 7 a 12 metros do solo, para retirar os cabos de fibra óptica, ligar os cabos e voltar a colocá-los no poste, sendo que por vezes a ligação tem de ser efectuada no topo do próprio poste de telecomunicações, quando a dimensão do cabo não permite puxá-lo para o solo;
- Descer às CVP’s (caixas de visita pública), a cerca de 4 metros do solo, retirar os cabos, liga-los e voltar a acondicioná-los;
- Efectuar instalações de ponte de distribuição óptico (PDO) nas colunas montantes dos edifícios;
- Transportar o material necessário (equipamento e máquinas) para a obra a realizar;
- Movimentação manual de cargas;
- Posição de agachado;
- Trabalho em altura;
- Trabalho em caixas de telecomunicações subterrâneas;
- Movimentação em pavimentos, por vezes, irregulares;
- Transporte de carga (material de trabalho, como mala de ferramentas, mesa de apoio, máquina de fusão com a qual executa as ligações, escada, equipamento a instalar);
- Permanecer de pé por períodos variáveis de tempo;
- Trabalho realizado em instalações eléctricas;
- Utilização de instrumentos vibratórios;
- Esforços com os membros inferiores; e,
- Equilíbrio.
P) O autor, na sequência do sinistro ocorrido nos autos, teve de se deslocar, em veículo próprio, ao Tribunal de Trabalho de Tomar, ida e volta (13,6km x 2), ao Gabinete Médico-Legal e Forense do Médio Tejo, em Tomar, ida e volta (14,5km x 2);
Q) A ré disponibilizou ao autor transporte de táxi ao autor para a realização de tratamentos e exames.
E deu como não provados os seguintes factos:
R) O autor, na sequência do sinistro ocorrido nos autos, teve de se deslocar, em veículo próprio, para tratamentos e realização de exames, ao Hospital CUF de Santarém (51,4 km x 9), à Afidea, no Entroncamento (14,7km x 1), à Clínica Alto dos Moinhos, da Ré, em Lisboa (129km x 2), ao Hospital da Santa Casa da Misericórdia do Entroncamento (14,1km x 8), à Clínica Econova - Diagnóstico Ecográfico de Torres Novas Ldª. (12,8km x 2);
S) O local de residência do autor, na ..., não dispõe de transportes públicos para assegurar tais deslocações;
T) Através de contacto telefónico da firma Entrosegur – Sociedade de Mediação de Seguros, Lda., a ré Fidelidade assumiu perante o autor que suportaria tais deslocações;
U) A ré informou-o que deveria passar a deslocar-se em veículo próprio e que lhe seria paga a despesa em função da distância percorrida.
IV – Enquadramento jurídico
Conforme supra mencionámos, o que importa analisar no presente recurso são as diversas questões supra mencionadas.

Recurso do despacho proferido em 21-03-2022 no Apenso A
1) Nulidade do despacho que indeferiu a nulidade do auto de exame por junta médica
a) Considera o Autor que o despacho proferido em 21-03-2022 no Apenso A é nulo, por omissão de pronúncia, nos termos dos arts. 608.º, n.º 2 e 615.º, n.º 1, al. d), do Código de Processo Civil:
(i) por nesse despacho não ter sido apreciada a nulidade da diligência de exame por junta médica, visto que o tribunal apenas se pronunciou sobre a nulidade do auto de exame por junta médica;
(ii) por nesse despacho não ter sido apreciada a falta de fundamentação de todas as respostas dadas pelos senhores peritos.
Dispõe o art. 615.º, n.º 1, al. d), do Código de Processo Civil, que:
1 - É nula a sentença quando:
(…)
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;

Dispõe ainda o art. 608.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, que:
2 - O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.

Resulta, assim, das citadas disposições legais que a nulidade por omissão de pronúncia ocorre quando o juiz não se pronuncia sobre todas as questões que lhe tenham sido submetidas pelas partes, excluindo aquelas cuja decisão se mostre prejudicada pela solução já dada a outras, ou não se pronuncie sobre questões que a lei lhe imponha o conhecimento.
Porém, não se deve confundir questão com consideração, argumento ou razão, sendo que o tribunal apenas se encontra vinculado às questões invocadas pelas partes (tendo de proferir decisão relativamente a todas, com exceção daquelas que tenham ficado prejudicadas por decisões anteriormente tomadas e não podendo decidir de outras a não ser que sejam de conhecimento oficioso), já não aos fundamentos/argumentações invocados.
Conforme bem referiu Alberto dos Reis[5]:
São, na verdade, coisas diferentes: deixar de conhecer a questão de que devia conhecer-se e deixar de apreciar qualquer consideração, argumento ou razão produzido pela parte. Quando as partes põem ao tribunal determinada questão, socorrem-se, a cada passo, de várias razões ou fundamentos para fazer valer o seu ponto de vista; o que importa é que o tribunal decida a questão posta; não lhe incumbe apreciar todos os fundamentos ou razões em que elas se apoiam para sustentar a sua pretensão.

E, a ser assim, a sentença não padece de nulidade quando não aborda todos os fundamentos invocados pela parte para justificar determinada opção jurídica, desde que aprecie a questão jurídica invocada, apresentando a sua própria fundamentação.
Cita-se, pela relevância na matéria, o acórdão do STJ, proferido em 15-12-2011, no âmbito do processo n.º 17/09.0TELSB.L1.S1, consultável em www.dgsi.pt:
IV - A omissão de pronúncia significa, fundamentalmente, a ausência de posição ou de decisão do tribunal sobre matérias em que a lei imponha que o juiz tome posição expressa. Tais questões são aquelas que os sujeitos processuais interessados submetem à apreciação do tribunal (art. 660.°, n.º 2, do CPC) e as que sejam de conhecimento oficioso, de que o tribunal deva conhecer independentemente de alegação e do conteúdo concreto da questão controvertida, quer digam respeito à relação material, quer à relação processual.
V - Como uniformemente tem sido entendido no STJ, a omissão de pronúncia só se verifica quando o juiz deixa de se pronunciar sobre questões que lhe foram submetidas pelas partes e que como tal tem de abordar e resolver, ou de que deve conhecer oficiosamente, entendendo-se por questões os dissídios ou problemas concretos a decidir e não as razões, no sentido de simples argumentos, opiniões, motivos, ou doutrinas expendidos pelos interessados na apresentação das respectivas posições, na defesa das teses em presença.

Sobre o que seja “questão”, por contraponto a argumento, razão ou fundamento, refere-se o acórdão do TRL, proferido em 08-05-2019[6]:
A omissão de pronúncia é um vício que ocorre quando o Tribunal não se pronuncia sobre essas questões com relevância para a decisão de mérito e não quanto a todo e qualquer argumento aduzido.
O vocábulo legal -“questões”- não abrange todos os argumentos invocados pelas partes.
Reporta-se apenas às pretensões deduzidas ou aos elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, às concretas controvérsias centrais a dirimir.

Por outro lado, não se pode confundir omissão de pronúncia, que se terá de entender como ausência de apreciação, com deficiente ou obscura fundamentação.
Cita-se a este propósito, o acórdão do STJ, proferido em 22-01-2015, no âmbito do Proc. 24/09.2TBMDA.C2.S2, consultável em www.dgsi.pt:
(…) a nulidade por omissão de pronúncia apenas se verifica quando o tribunal deixa de apreciar questões que tinha de conhecer, mas já não quando, no entender do recorrente, as razões da decisão resultam pouco explicitadas ou não se conhecem de argumentos invocados.

Transcreve-se ainda o que consta da obra O Código de Processo Civil Anotado, Vol. I, de António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa[7]:
4. Acresce ainda uma frequente confusão entre nulidade da decisão e discordância quanto ao resultado, entre a falta de fundamentação e uma fundamentação insuficiente ou divergente da pretendida ou mesmo entre a omissão de pronúncia (relativamente a alguma questão ou pretensão) e a falta de resposta a algum argumento dos muitos que florescem nas alegações de recurso.

Importa ainda salientar que este regime jurídico se aplica aos despachos por força do disposto no art. 613.º, n.º 3, do Código de Processo Civil.
Decidamos.

(i) Nulidade do despacho que indeferiu a nulidade do auto de exame por junta médica por nesse despacho não ter sido apreciada a nulidade da diligência de exame por junta médica, visto que o tribunal apenas se pronunciou sobre a nulidade do auto de exame por junta médica
Conforme consta do pedido formulado pelo Autor no seu requerimento de 10-02-2022, aquilo que o mesmo pretende é a nulidade do auto de exame por junta médica, sendo a invocada nulidade da diligência de exame por junta médica um dos seus fundamentos. Tal fundamento assentou expressamente na circunstância de, segundo o Autor, este apenas ter sido observado objetivamente por um dos três peritos presentes.
Ora, sobre tal fundamento pronunciou-se o tribunal a quo nos seguintes termos:
Antes de mais, relativamente à questão do sinistrado somente ter sido examinado por um dos 3 peritos que constituía a dita junta médica, dir-se-á que o requerimento apresentado no dia 10/2/2022 continua tão enigmático como a primeira versão apresentada no dia 15/10/2020.
O que é estranho, pois era expectável que o autor – depois de tomar conhecimento do despacho proferido a 4/11/2020 – fosse mais claro e assertivo sobre os fundamento e alcance dessa afirmação. Aliás, tal afirmação chega a ser contraditória pois começa por referir que foi só examinado por um perito, mas que eram 3 os peritos que constituía a dita junta médica. Fica por esclarecer o que os outros dois peritos estavam a fazer na junta, se é que não o estavam a examinar, mas estavam presentes… E o que é que o sinistrado entende quando afirma que “é necessário que intervenham activamente na diligência e avaliação do Sinistrado”. Eventualmente o sinistrado entende que um médico não consegue emitir um juízo pericial por meio apenas do estudo dos elementos do processo e da observação clínica realizada à sua frente por outro colega. Ou seja, o sinistrado pretende ensinar os peritos a realizar um exame médico!
De qualquer forma, a afirmação em como o sinistrado foi somente examinado por um dos 3 peritos que constituía a dita junta médica é contrariada pelo teor do próprio auto e aquele não invocou a sua falsidade.
O que determina a improcedência deste fundamento.

Deste modo, quanto a este fundamento de nulidade do auto de exame por junta médica por nulidade da diligência de exame por junta médica inexiste no despacho proferido em 21-03-2022 no Apenso A, e independentemente da assertividade da argumentação apresentada, qualquer omissão de pronúncia.
Assim, improcede, nesta parte, a pretensão do Autor.

(ii) Nulidade do despacho que indeferiu a nulidade do auto de exame por junta médica por nesse despacho não ter sido apreciada a falta de fundamentação de todas as respostas dadas pelos senhores peritos
Considera o Autor que, apesar de ter invocado no requerimento de 10-02-2022 a falta de fundamentação de todas as respostas dadas pelos senhores peritos, o despacho judicial proferido em 21-03-2022 no Apenso A apenas se pronunciou sobre a resposta dada ao quesito 2.
Consta do despacho recorrido sobre este ponto o seguinte:
Quanto às objecções sobre a nulidade da fundamentação para o resultado da avaliação, a resposta a esta questão é dada pelo próprio autor, pois a junta médica mostrou-se concordante com a avaliação singular invocada pelo sinistrado ao reconduzir as sequelas ao Capítulo I 12.1.2. a), da T.N.I., que prevê um coeficiente de incapacidade de 0,01 a 0,05.
A mesma tabela também admite alguma discricionariedade técnica na fixação dos coeficientes de incapacidade e consagra instruções gerais (6 e 7) e instruções especificas para a sua determinação.
O autor simplesmente não reconhece o âmbito de discricionariedade técnica consagrado na T.N.I., sendo que os peritos não divergiram relativamente ao que aí está consagrado. Sendo que até o podiam fazer, desde que justificadamente, como aí se dispõe. Além disso, o autor apenas lê as respostas uma a uma, esquecendo-se que o laudo pericial deve ter uma unidade intrínseca, lógica e coerente, e que umas respostas podem justificar ou prejudicar outras respostas.
Sendo o resultado da junta médica concordante com a avaliação singular, mas considerando que a sequela no joelho revela apenas ligeira instabilidade anterior e amiotrofia de 1,5 cm., é de considerar suficientemente justificada a ponderação de 0,02 na referida escala de 0,01 a 0,05.
Em face da definição limitada das sequelas de IPP de 2%, sua natureza e grau, não se vê que mais fosse preciso acrescentar para afastar o pretendido reconhecimento de IPATH pela junta médica.
Pelo exposto, indefiro a arguida nulidade do auto de junta médica.

Uma vez mais, e independentemente da assertividade ou suficiência da fundamentação apresentada, o despacho recorrido apreciou a questão da falta de fundamentação da resposta dada pelos senhores peritos aos quesitos formulados, julgando-a improcedente, por considerar que a fundamentação apresentada para a fixação de uma IPP de 2% justificava a resposta dada aos demais quesitos.
Dir-se-á, de qualquer modo, que, no requerimento apresentado em 10-02-2022, o Autor, ao invés daquilo que afirmou em sede de recurso, apenas formulou a expressa falta de fundamentação das respostas dadas aos quesitos 2 e 16, imputando às respostas formuladas aos quesitos 5 a 15, não o vício da falta de fundamentação, antes sim, o da errada fundamentação, por não ter sido solicitado ao Autor, durante a diligência de exame por junta médica, a realização daquele tipo de movimentos. Ora, uma errada fundamentação não equivale, como já se referiu supra, a falta de fundamentação.
Pelo exposto, improcede também aqui a pretensão do Autor.

2) Nulidade do auto de exame por junta médica
Segundo o Apelante, nas suas conclusões recursivas, o despacho proferido em 21-03-2022 no Apenso A, errou ao considerar inexistir nulidade do auto de exame por junta médica, uma vez que este auto é nulo pelos seguintes motivos:
a) nulidade da diligência de exame por junta médica, visto o Autor apenas ter sido examinado por um dos três peritos, apesar de se tratar de um exame colegial; e
b) Falta de fundamentação por:
(i) não constar de tal auto que o Autor apenas foi observado por um dos peritos, nem ter sido apresentado o motivo para a dispensa de observação pelos outros dois peritos;
(ii) não fazer qualquer alusão à reabilitação profissional do sinistrado;
(iii) não estarem fundamentadas as conclusões apresentadas pelos peritos médicos.

a) Nulidade da diligência de exame por junta médica, visto o Autor apenas ter sido examinado por um dos três peritos, apesar de se tratar de um exame colegial
Entende o Autor que a circunstância de apenas um dos peritos médico ter interagido física e diretamente consigo determinou a violação do disposto nos arts. 480.º, n.º 1, do Código de Processo Civil e 139.º do Código de Processo do Trabalho, o que implicou a nulidade da diligência de exame por junta médica e, consequentemente, a nulidade do seu auto.
Vem, assim, o Autor invocar uma nulidade processual, nos termos do art. 195.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, ocorrida durante a diligência de exame por junta médica, uma vez que considera que deveria ter sido fisicamente tocado pelos três peritos médicos e não apenas por um. Acontece, porém, que, nos termos do art. 199.º, n.º 1, do mesmo Diploma Legal, tal nulidade apenas poderia ter sido arguida até ao final da diligência de exame por junta médica, o que não aconteceu, pelo que precludiu o direito a invocá-la.
Nesta conformidade, improcede, nesta parte, a pretensão do Autor.

b) Falta de fundamentação do auto de exame por junta médica

(i) por não constar de tal auto que o Autor apenas foi observado por um dos peritos, nem ter sido apresentado o motivo para a dispensa de observação pelos outros dois peritos
Basta atentar no requerimento apresentado pelo Autor em 10-02-2022 para se constatar que este fundamento para a nulidade por falta de fundamentação do auto de exame por junta médica nele não consta.
E, a ser assim, trata-se de uma questão nova, apenas equacionada em sede recursiva. Tratando-se de uma questão nova, não invocada pelo Autor a não ser nas alegações de recurso, e não se tratando de questão de conhecimento oficioso, encontra-se a mesma vedada para apreciação por este Tribunal.
Cita-se a este propósito o acórdão deste Tribunal da Relação, proferido em 12-03-2015[8]:
I- Os recursos, por natureza, visam a reapreciação de decisões judiciais (visam uma alteração do decidido), pelo que não podem ser um meio de introduzir questões novas e assim obter decisões diferentes com base numa fundamentação que não podia ter sido considerada na instância recorrida.

Cita-se igualmente o acórdão do STJ, proferido em 17-11-2016[9]:
II - Os recursos são meios de impugnação de decisões judiciais através dos quais se visa reapreciar e modificar decisões já proferidas que incidam sobre questões que tenham sido anteriormente apreciadas, e não criá-las sobre matéria nova, não podendo confrontar-se o Tribunal ad quem com questões novas, salvo aquelas que são de conhecimento oficioso.

Nesta conformidade, por este Tribunal se encontrar impossibilitado de proceder à apreciação desta nova questão suscitada pelo Autor, não a iremos apreciar.

(ii) por não fazer qualquer alusão à reabilitação profissional do sinistrado
Considera o Autor que, em face do disposto na Instrução Geral 10 da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidente de Trabalho e Doença Profissional, constante no Anexo I, o auto de exame por junta médica padece do vício de falta de fundamentação por nele não constar qualquer alusão à reabilitação profissional do Autor.
Estatui a referida Instrução Geral 10 que:
10 — Na determinação da incapacidade global a atribuir devem ser ponderadas as efectivas possibilidades de reabilitação profissional do sinistrado, face às suas aptidões e às suas capacidades restantes. Para tanto, sempre que seja considerado adequado ou conveniente, podem as partes interessadas ou o Tribunal solicitar parecer às entidades competentes nas áreas do emprego e formação profissional, sobre as efectivas possibilidades de reabilitação do sinistrado.

Na realidade, o disposto nesta Instrução Geral reporta-se às situações em que a junta médica determina uma situação de IPATH, o que, manifestamente, não é o caso dos presentes autos.
Cita-se, a este propósito, o disposto no acórdão do TRL, proferido em 15-12-2022[10]:
A junta médica deve sempre fixar o coeficiente de incapacidade geral do sinistrado de acordo com o estabelecido nos n.ºs 1 e 3 do art.º 21.º da LAT, uma vez que decorre do aí preceituado que nenhuma situação está excluída da sua aplicação.
Se tal coeficiente de incapacidade geral for determinante de IPATH, deve a junta médica autonomizar o grau de capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível, atendendo à idade, qualificações profissionais e escolares e à possibilidade, concretamente avaliada, de integração profissional do sinistrado, nos termos do ponto 5.A das Instruções Gerais da TNI, podendo o juiz requisitar parecer prévio de peritos especializados, designadamente dos serviços competentes do ministério responsável pela área laboral, em conformidade com o previsto conjugadamente no n.º 4 do art.º 21.º da LAT e no n.º 7 do art.º 139.º do Código de Processo do Trabalho.
Realizada a prova pericial referida, o juiz profere decisão em que, além do mais, a aprecia e avalia criticamente, com vista à fixação da natureza e grau de incapacidade do sinistrado e, tratando-se de IPATH, também do grau de capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível, em função do qual determina uma pensão anual e vitalícia compreendida entre 50 % e 70 % da sua retribuição e um subsídio por situações de elevada incapacidade permanente compreendido entre 70 % e 100 % de 12 vezes o valor de 1,1 IAS, nos termos conjugados dos art.ºs 48.º, n.º 3, al. b) e 67.º, n.º 3 da LAT e do art.º 140.º do Código de Processo do Trabalho.

Pelo exposto, improcede, nesta parte, a pretensão do Autor.

(iii) por não estarem fundamentadas as conclusões apresentadas pelos peritos médicos
Entende o Autor que as respostas aos quesitos 5 a 15 do auto de exame por junta médica não se encontram fundamentadas, uma vez que os peritos médicos deram tais respostas sem terem feito uma concreta avaliação do estado de saúde do Autor que permitisse responder a tais quesitos, nomeadamente, pedindo ao Autor que se ajoelhasse, que subisse escadas, que se agachasse ou colocasse de cócoras.
Por sua vez, quanto à resposta dada ao quesito 16, os senhores peritos médicos limitaram-se a responder “Não”, não tendo efetuado a devida análise e ponderação das concretas tarefas desempenhadas pelo Autor no âmbito do exercício das suas funções habituais, em correspondência com as limitações de que padece, nem tão pouco sendo feita qualquer alusão a eventual documentação analisada pelos senhores peritos.
Dispõe a Instrução Geral 8 da Tabela Nacional de Incapacidades por Acidente de Trabalho e Doença Profissional, constante no Anexo I, que:
8 — O resultado dos exames é expresso em ficha apropriada, devendo os peritos fundamentar todas as suas conclusões.

Relativamente às respostas dadas aos quesitos 5 a 15 do auto de exame por junta médica, conforme já se referiu supra, as eventuais nulidades ocorridas durante a diligência de exame por junta médica deveriam ter sido, de imediato, arguidas, pelo a sua não arguição implicou a sanação desses eventuais vícios.
Vejamos, então, a fundamentação que nelas consta, independentemente de quaisquer outras vicissitudes.
Na realidade, em face da atribuição de uma ligeira instabilidade anterior e amiotrofia de 1,5 cm no joelho direito do Autor, as respostas dadas aos quesitos 5 a 14 apresentam-se suficientemente esclarecedoras.
O mesmo, porém, já não ocorre relativamente à resposta ao quesito 15, uma vez que nessa resposta os senhores peritos se limitaram a recorrer a um tipo de resposta muito típica nestes pareceres, mas que nada esclarece, ou seja, responderam que “Consegue, com as limitações inerentes à IPP fixada”. Ora, aquilo que se pretende neste tipo de exame é que especificamente se concretize quais são as limitações inerentes à IPP fixada.
De igual modo, a resposta dada ao quesito 16 não se mostra fundamentada, uma vez que, em concreto, deveria ter sido esclarecido se o desconforto sentido pelo Autor em marcha muito prolongada e intensa, bem como as dificuldades sentidas por este ao caminhar em pisos inclinados e irregulares, nomeadamente subir e descer ladeiras, e ao subir escadas e escadotes, bem como as limitações de que padece (e que não se mostram concretizadas) nos trabalhos com carga pesada que impliquem movimentos e força por parte do joelho direito, o impedem ou limitam, e se sim, em que medida, no exercício, nomeadamente das seguintes atividades[11]:
- Subir e descer postes de telecomunicações, entre 7 a 12 metros do solo, para retirar os cabos de fibra ótica, ligar os cabos e voltar a colocá-los no poste, sendo que por vezes a ligação tem de ser efetuada no topo do próprio poste de telecomunicações, quando a dimensão do cabo não permite puxá-lo para o solo;
- Descer às CVP’s (caixas de visita pública), a cerca de 4 metros do solo, retirar os cabos, liga-los e voltar a acondicioná-los;
- Efetuar instalações de ponte de distribuição ótico (PDO) nas colunas montantes dos edifícios;
- Transportar o material necessário (equipamento e máquinas) para a obra a realizar;
- Movimentação manual de cargas;
- Posição de agachado;
- Trabalho em altura;
- Trabalho em caixas de telecomunicações subterrâneas;
- Movimentação em pavimentos, por vezes, irregulares;
- Transporte de carga (material de trabalho, como mala de ferramentas, mesa de apoio, máquina de fusão com a qual executa as ligações, escada, equipamento a instalar);
- Permanecer de pé por períodos variáveis de tempo;
- Trabalho realizado em instalações elétricas;
- Utilização de instrumentos vibratórios;
- Esforços com os membros inferiores; e
- Equilíbrio.
De igual modo, deveria ter sido perguntado aos senhores peritos o que consta do quesito 10 da petição inicial do Autor, que, porém, não fez parte dos quesitos que o tribunal a quo entendeu ser de formular.
Consta em tal quesito o seguinte:
10) O Sinistrado pode desempenhar as suas funções, em condições de segurança e sem dor?

Na realidade, era fundamental questionar os senhores peritos médicos se, em face das limitações do joelho direito do Autor, pode o mesmo, sem por em causa a sua segurança e sem lhe causar sofrimento, em concreto e especificamente (i) subir e descer postes de telecomunicações, entre 7 a 12 metros do solo, para retirar os cabos de fibra ótica, ligar os cabos e voltar a colocá-los no poste, sendo que por vezes a ligação tem de ser efetuada no topo do próprio poste de telecomunicações, quando a dimensão do cabo não permite puxá-lo para o solo; (ii) descer às CVP’s (caixas de visita pública), a cerca de 4 metros do solo, retirar os cabos, liga-los e voltar a acondicioná-los; (iii) efetuar instalações de ponte de distribuição ótico (PDO) nas colunas montantes dos edifícios; (iv) transportar o material necessário (equipamento e máquinas) para a obra a realizar, bem como transportar carga pesada; (v) efetuar em altura trabalhos na posição de agachado; (vi) efetuar trabalho em caixas de telecomunicações subterrâneas; (vii) movimentar-se em pavimentos, por vezes, irregulares; (viii) permanecer de pé por períodos variáveis de tempo; (ix) utilizar instrumentos vibratórios; (x) exercer esforços com os membros inferiores; e (xi) exercer atividades em que se exija equilíbrio.
Efetivamente é de ponderar, não só o tipo de escadas que o sinistrado sobe e desce na sua atividade profissional, como também se a sua limitação no joelho direito, ainda que reduzida, pode aumentar os riscos de queda em altura, até pela dor que tal tipo de esforço lhe pode causar.
E, a ser assim, é evidente que o relatório pericial da junta médica não esclarece fundadamente, não só todas as limitações de que o Autor padece (como ocorre na resposta ao quesito 15), como a repercussão dessas limitações na atividade profissional do Autor, concretamente, se determinadas dessas concretas tarefas agravam, ou não, o risco de queda e de dor, pondo em causa a sua segurança.
Ora, tal vício, constitui uma nulidade processual, por influir na decisão da causa, nos termos do art. 195.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, sendo que apenas determina a nulidade do auto de exame médico relativamente às respostas dadas aos quesitos 15 e 16, devendo ser reaberta tal junta médica para proceder às respostas a tais quesitos, os quais serão devidamente reformulados para que as respetivas respostas sejam o mais esclarecedoras possíveis e isto sem prejuízo de o juiz do tribunal a quo formular, querendo, outros quesitos que entenda por pertinentes.
Tal circunstância determina, igualmente, a revogação parcial do despacho judicial que indeferiu a nulidade do auto de exame por junta médica, proferido em 21-03-2022 no apenso A, na parte em que considerou inexistir falta de fundamentação nas respostas dadas aos quesitos 15 e 16, devendo, nessa parte, tal despacho ser substituído nos seguintes termos:
- por existir falta de fundamentação do auto de exame por junta médica, quanto aos quesitos 15 e 16, que serão reformulados para se tornarem mais percetíveis, determina-se a sua nulidade parcial quanto a tais respostas, reabrindo-se o exame por junta médica, a fim de que os senhores peritos procedam às respostas dos seguintes quesitos (sem prejuízo de o juiz do tribunal a quo formular, querendo, outros quesitos que entenda por pertinentes):
a) Quais são, em concreto, as limitações de que padece o Autor ao realizar trabalhos com carga pesada e que impliquem a movimentação do joelho direito e aplicação de força nesse membro?
b) Em face das limitações do joelho direito do Autor, pode o mesmo, sem por em causa a sua segurança e sem lhe causar sofrimento, em concreto e especificamente, (i) subir e descer postes de telecomunicações, entre 7 a 12 metros do solo, para retirar os cabos de fibra ótica, ligar os cabos e voltar a colocá-los no poste, sendo que por vezes a ligação tem de ser efetuada no topo do próprio poste de telecomunicações, quando a dimensão do cabo não permite puxá-lo para o solo; (ii) descer às CVP’s (caixas de visita pública), a cerca de 4 metros do solo, retirar os cabos, liga-los e voltar a acondicioná-los; (iii) efetuar instalações de ponte de distribuição ótico (PDO) nas colunas montantes dos edifícios; (iv) transportar o material necessário (equipamento e máquinas) para a obra a realizar, bem como transportar carga pesada; (v) efetuar em altura trabalhos na posição de agachado; (vi) efetuar trabalho em caixas de telecomunicações subterrâneas; (vii) movimentar-se em pavimentos, por vezes, irregulares; (viii) permanecer de pé por períodos variáveis de tempo; (ix) utilizar instrumentos vibratórios; (x) exercer esforços com os membros inferiores; e (xi) exercer atividades em que se exija equilíbrio?
c) Se o desconforto, a dificuldade e a dor que o Autor pode vivenciar em determinadas atividades, designadamente no ato de subir e descer escadas, escadotes e postes de telecomunicações, aumentam os riscos de queda em altura?
Esta revogação parcial do referido despacho judicial, por dar razão parcial à pretensão do Autor, sempre determinaria, nos termos do art. 527.º, nºs. 1 e 2, do Código de Processo, a condenação em custas, entre Autor e Ré, na proporção do respetivo decaimento.
Acontece, porém, que o Autor foi tributado, no seu decaimento das nulidades que invocou do auto de exame por junta médica, por anómalo incidente.
No entanto, a invocação de nulidades, no prazo legalmente estatuído, integra a normal tramitação da lide, razão pela qual não deverá ser taxada como incidente anómalo.
Veja-se, pela sua clareza, o acórdão do TRC, proferido em 20-03-2019[12]:
I – Anómalo, estranho ao desenvolvimento da lide, a justificar tributação autónoma, é o requerimento que se distancie da normalidade da tramitação, dando corpo a uma actividade ou conduta processual entorpecedora da acção da justiça.
II - Ao invés, as questões que surjam no seio da dinâmica normal do processo e que não revistam um “carácter descabido” devem ser consideradas abrangidas na tributação específica da causa.
III - O requerimento de arguição de nulidade, apresentado no momento processual apropriado, sem que seja descabido ou dilatório, não dando causa a um acréscimo anormal da actividade processual, tão pouco a uma excessiva demora na tramitação do processo, não constitui uma ocorrência estranha ao desenvolvimento da lide, não sendo, em razão disso, tributável como incidente anómalo.

Deste modo, o despacho judicial que indeferiu a nulidade do auto de exame por junta médica, proferido em 21-03-2022 no apenso A, será também revogado na parte em que condenou o Autor em duas UC por incidente anómalo.
Por fim, fundando-se os factos dados como provados, quer na decisão final proferida em 21-03-2022 no Apenso A, quer na sentença proferida em 14-05-2022 no processo principal, no relatório da junta médica, o qual padece de evidentes deficiências, tais matérias factuais padecem igualmente de deficiências, inexistindo no processo os elementos de prova necessários para o apuramento desses factos essenciais à prolação de tais decisões.
Acresce que, para que possa ser dada efetiva resposta à questão de o Autor padecer, ou não, de uma situação de IPATH (visto que tal não decorre do grau de incapacidade permanente absoluta que é atribuída ao sinistrado, antes sim, da limitação que essa incapacidade produz na realização das suas concretas tarefas profissionais[13]), importará igualmente apurar, em concreto, não só quais são algumas das tarefas que o Autor efetua na sua atividade profissional[14], como, sobretudo, qual é o núcleo essencial das tarefas que exerce, ou seja, aquelas de que depende o exercício da sua profissão.
Nesta conformidade, nos termos da al. c) do n.º 2 do art. 662.º do Código de Processo Civil, padecendo a matéria de facto da decisão proferida em 21-03-2022 no Apenso A e da sentença proferida 14-05-2022 nos autos principais, de deficiência, por assentar no parecer da junta médica não suficientemente fundamentado e esclarecedor, e inexistindo no processo os elementos necessários para suprir tal vício, importa declarar a anulação[15] quer da decisão proferida em 21-03-2022 no Apenso A quer da sentença proferida 14-05-2022 nos autos principais, e determinar a reabertura do exame por junta médica, de forma a que os peritos que nela participaram supram as insuficiências indicadas, a fim de se apurar, fundadamente, se o sinistrado padece, ou não, de IPATH.
De igual modo, deverá o tribunal a quo apurar, de acordo com as diligências de prova que entender por convenientes e se necessário com recurso à reabertura da audiência de discussão e julgamento, quais são as atividades exercidas pelo Autor que constituem o seu núcleo essencial.
Em face do supra exposto, ficam prejudicadas as demais questões invocadas no recurso interposto pelo Autor.
V – Decisão
Pelo exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora, em julgar o recurso procedente, e, em consequência:
1) Determinar a revogação parcial do despacho judicial que indeferiu a nulidade do auto de exame por junta médica, proferido em 21-03-2022 no apenso A:
(i) na parte em que considerou inexistir falta de fundamentação nas respostas dadas aos quesitos 15 e 16, devendo, nessa parte, tal despacho ser substituído nos seguintes termos:
- por existir falta de fundamentação do auto de exame por junta médica, quanto aos quesitos 15 e 16, que serão reformulados para se tornarem mais percetíveis, determina-se a sua nulidade parcial quanto a tais respostas, reabrindo-se o exame por junta médica, a fim de que os senhores peritos procedam às respostas dos seguintes quesitos (sem prejuízo de o juiz do tribunal a quo formular, querendo, outros quesitos que entenda por pertinentes):
a) Quais são, em concreto, as limitações de que padece o Autor ao realizar trabalhos com carga pesada e que impliquem a movimentação do joelho direito e aplicação de força nesse membro?
b) Em face das limitações do joelho direito do Autor, pode o mesmo, sem por em causa a sua segurança e sem lhe causar sofrimento, em concreto e especificamente, (i) subir e descer postes de telecomunicações, entre 7 a 12 metros do solo, para retirar os cabos de fibra ótica, ligar os cabos e voltar a colocá-los no poste, sendo que por vezes a ligação tem de ser efetuada no topo do próprio poste de telecomunicações, quando a dimensão do cabo não permite puxá-lo para o solo; (ii) descer às CVP’s (caixas de visita pública), a cerca de 4 metros do solo, retirar os cabos, liga-los e voltar a acondicioná-los; (iii) efetuar instalações de ponte de distribuição ótico (PDO) nas colunas montantes dos edifícios; (iv) transportar o material necessário (equipamento e máquinas) para a obra a realizar, bem como transportar carga pesada; (v) efetuar em altura trabalhos na posição de agachado; (vi) efetuar trabalho em caixas de telecomunicações subterrâneas; (vii) movimentar-se em pavimentos, por vezes, irregulares; (viii) permanecer de pé por períodos variáveis de tempo; (ix) utilizar instrumentos vibratórios; (x) exercer esforços com os membros inferiores; e (xi) exercer atividades em que se exija equilíbrio?
c) Se o desconforto, a dificuldade e a dor que o Autor pode vivenciar em determinadas atividades, designadamente no ato de subir e descer escadas, escadotes e postes de telecomunicações, aumentam os riscos de queda em altura?
(ii) na parte em que condenou o Autor em duas UC por incidente anómalo;
2) Declarar a anulação quer da decisão proferida em 21-03-2022 no Apenso A quer da sentença proferida 14-05-2022 nos autos principais, nos termos da al. c) do n.º 2 do art. 662.º do Código de Processo Civil, devendo, para além das diligência inerentes ao auto de exame por junta médica, o tribunal a quo apurar, de acordo com as diligências de prova que entender por convenientes e se necessário com recurso à reabertura da audiência de discussão e julgamento, quais são as atividades exercidas pelo Autor que constituem o seu núcleo essencial.
Custas pela Apelada (art. 527.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).
Notifique.
Évora, 16 de março de 2023
Emília Ramos Costa (relatora)
Mário Branco Coelho
Paula do Paço

__________________________________________________
[1] Relatora: Emília Ramos Costa; 1.º Adjunto: Mário Branco Coelho; 2.ª Adjunta: Paula do Paço.
[2] Doravante “Fidelidade, S.A.”.
[3] Junto ao processo em 29-03-2019.
[4] Processo n.º 1142/18.1T8PTM-A, doravante identificado por apenso A.
[5] In Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, pág. 143.
[6] No âmbito do processo n.º 1211/09.9GACSC-A.L2-3, consultável em www.dgsi.pt.
[7] Almedina, 2018, pág. 737.
[8] No âmbito do processo n.º 55/14.0TBAVS.E1, consultável em www.dgsi.pt.
[9] No âmbito do processo n.º 861/13.3TTVIS.C1.S2, consultável em www.dgsi.pt.
[10] No âmbito do processo n.º 2192/19.6T8BRR.L1-4, consultável em www.dgsi.pt.
[11] Foi dado como provado, no facto o) da sentença proferida no processo principal, serem estas, entre outras, as tarefas desempenhadas pelo Autor.
[12] No âmbito do processo n.º 171/16.4GASEI-A.C1, consultável em www.dgsi.pt.
[13] Ver acórdãos do TRE proferido em 12-09-2018 no âmbito do processo n.º 3996/16.7T8STB.E1; do TRG proferido em 24-10-2019 no âmbito do processo n.º 1730/15.8T8VRL.G1; e TRP proferido em 30-05-2018 no âmbito do processo n.º 2024/15.4T8AVR.P1, consultáveis em www.dgsi.pt.
[14] Como consta do facto O) dado como provado na sentença proferida nos autos principais.
[15] Vejam-se, neste sentido, os acórdãos do TRP, proferidos em 13-02-2017 no âmbito do processo n.º 1961/15.0T8VFR.P1 e em 14-12-2022 no âmbito do processo n.º 850/20.1T8PNF.P1; e do TRE proferidos em 23-04-2020 no âmbito do processo n.º 789/17.8T8BJA.E1, e em 30-06-2022 no âmbito do processo n.º 1882/20.5T8STR.E1, consultáveis em www.dgsi.pt.