Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2402/20.7T8FAR-A.E1
Relator: MANUEL BARGADO
Descritores: MAIOR ACOMPANHADO
MEIOS DE PROVA
REJEIÇÃO
Data do Acordão: 05/23/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário:
I - O direito à prova não se esgota no direito à sua proposição – antes se concretiza, sobretudo no tocante às provas constituendas, no direito à sua produção. Todavia, os atos relativos à produção da prova, como qualquer outro ato processual, estão sujeitos a um princípio da utilidade ou de economia: no processo não podem ser praticados, pelas partes ou pelo tribunal, atos inúteis, isto é, que sejam desnecessários para a tutela da situação jurídica invocada em juízo.
II - Tendo a prova requerida sido rejeitada com o fundamento na impertinência das diligências probatórias requeridas, por nada adiantarem à decisão do incidente em causa, o que é uma consequência inerente aos requerimentos probatórios injustificados, não se mostra violado o direito à prova dos recorrentes.
(Sumário elaborado pelo relator)
Decisão Texto Integral:
Proc. nº 2402/20.7T8FAR-A.E1

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora

I - RELATÓRIO
O Ministério Público instaurou a presente ação especial de acompanhamento de maior relativamente a AA, na qual foi proferida sentença, transitada em julgado, em cujo dispositivo se consignou:
«Tendo em conta a factualidade apurada e o que resulta do disposto nos artigos 900º do CPC e 139º do CC, decido:
a) decretar o acompanhamento de AA por motivo da sua anomalia psíquica;
b) designo como acompanhante do beneficiário, BB, unida de facto do mesmo;
c) decretar que o requerido passa a beneficiar das seguintes medidas de acompanhamento:
i- o acompanhante agora designado assumirá a representação geral do beneficiário;
ii- o beneficiário não pode exercer livremente os direitos pessoais de testar nem doar nem celebrar quaisquer negócios da vida corrente;
d) As medidas de acompanhamento agora definidas tornaram-se convenientes desde 21.07.2020;
e) Consigna-se que o beneficiário não celebrou testamento vital nem outorgou procuração para cuidados de saúde (art. 900º/3, do CPC).
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Sem custas (art. 4º/1-l, do RCP).
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Registe e Notifique e Publicite mediante a afixação de edital à porta do tribunal e, após trânsito, cumpra o preceituado no artigo 1920º-B do Código Civil, ex vi do disposto no artigo 902º do Código de Processo Civil.
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Revisão das medidas
Sem prejuízo das medidas fixadas poderem ser revistas ou levantadas a todo o tempo e sempre que a evolução do beneficiário o justificar (art. 904º, do CPC), as medidas agora aplicadas deverão ser revistas anualmente (art. 155º do CC).»
Em 15.03.2024, no âmbito do presente apenso de incidente de remoção da acompanhante, suscitado por CC e DD, pais do beneficiário, vieram estes requerer:
1- Que se solicite, novamente, à Santa Casa da Misericórdia ... a identificação do enfermeiro, com indicação do nome completo e direção “atendendo ao princípio da colaboração, que sem dúvida não resulta do ofício da Santa Casa da Misericórdia”;
2- Que sejam ouvidos como testemunhas o Director da Fundação ... e Manutenção ..., em ..., e bem assim a terapeuta responsável pelo mesmo (presume-se que os requerentes e refiram ao beneficiário);
3- Que seja realizada avaliação psicológica e despiste do consumo de canabinoides e álcool à Acompanhante EE “atendendo às declarações prestadas” por esta;
4- Que seja nomeado tutor provisório pelo tribunal até ser proferida decisão final.»
Aberta vista ao Ministério Público, este promoveu o indeferimento do requerido em 1, 3 e 4 do aludido requerimento, manifestando concordância com a inquirição da terapeuta referida em 2, mas considerou irrelevante a inquirição do diretor da instituição.
Subsequentemente, em 20.03.2024, foi proferido despacho no qual se decidiu:
«Termos em que, indefere-se o requerido e antes referido em 1, 3 e 4 e defere-se a diligência referida supra em 2, relegando-se o seu agendamento para a data designada para a continuação da produção de prova do incidente
Por requerimento de 19.03.2024, ou seja, um dia antes da prolação do referido despacho, vieram os pais do beneficiário requerer:
i- o aditamento ao rol de testemunhas, indicando 3 testemunhas, comprometendo-se a apresentar uma e requerem a notificação das restantes;
ii- que seja solicitado à GNR ... o envio do “nº dos autos de ocorrência relativamente às visitas ao menor FF”;
iii- que seja requisitada a ficha clínica ao ... e que seja identificada a pessoa contactada por esta instituição hospitalar quando ocorrem hospitalizações do beneficiário;
iv- que seja solicitada à Unidade de Cuidados Continuados onde o beneficiário se encontra informação quanto à possibilidade de recuperação deste.
Aberta vista ao Ministério Público em 20.03.2024, este promoveu o indeferimento do requerido, tendo nessa mesma data sido proferido despacho com o seguinte dispositivo:
«Face ao exposto, relativamente ao requerimento apresentado em 19.03.2024, decido:
a) Indeferir as diligências requeridas nos pontos 1, 2, 3, 4, 5 e 7 desse requerimento;
b) Deferir a diligência ali requerida em 6 e, em consequência, determino que se oficie ao ... solicitando que informe quem é a pessoa de contacto que consta do processo clínico do beneficiário em caso de hospitalização deste. Para melhor esclarecimento remeta a identificação do beneficiário, da acompanhante e da progenitora do beneficiário e consigne que a informação pretendida é pedida no âmbito do incidente de remoção de acompanhante suscitado nestes autos de acompanhamento de maior.
Notifique.»
Inconformados com o decidido neste despacho e no despacho anteriormente referido, ambos prolatados em 20.03.2024, apelaram os requerentes, tendo finalizado a respetiva alegação com a formulação das conclusões que a seguir se transcrevem:
«1. Por despacho datado de 20-03-2024 o tribunal “a quo” indeferiu o requerido e antes referido em 1, 3 e 4 e deferiu a diligência referida em 2, relegando-se o seu agendamento para a data designada para a continuação da produção de prova do incidente.
2. E por despacho datado de 20-03-2024 que indeferiu as diligências requeridas nos pontos 1, 2, 3, 4, 5 e 7 do requerimento apresentado e deferiu o requerido em 6.
3. Os ora Recorrentes não se conformam com os despachos de que ora se recorre.
4. No que respeita à identificação do Enfermeiro consideramos que a resposta remetida aos autos pela Santa Casa da Misericórdia ... não foi minimamente esclarecedora, até porque a Santa Casa da Misericórdia ... limitou-se a informar que o Sr. GG, enfermeiro, não é colaborador da instituição, porém não se designou a informar se o nome estaria correto, se não é colaborador, mas já foi, nada mais tendo sido informado aos autos, o que em nosso entender viola o princípio da colaboração.
5. Motivo pelo qual deveria o tribunal “a quo” ter aceite o requerido pelos ora Recorrentes por a forma a se apurar o paradeiro da testemunha GG, Enfermeiro.
6. Quanto às diligências requeridas em 3 andou mal o tribunal “a quo” ao indeferir a requerida avaliação psicológica e despiste de consumo de canabinoides e álcool, pois tais exames visavam demonstrar o alegado pelos ora Recorrentes em relação à conduta e à personalidade da acompanhante.
7. Ao indeferir tais diligência probatórias o tribunal “a quo” impossibilitou os ora Recorrentes de demonstrar o alegado nos artigos 7, 11, 12, 13, 14, 15 e 16 do requerimento inicial, o que viola o disposto nos artigos 6.º/1 e 411.º do Código de Processo Civil.
8. No que toca à requerida nomeação do “tutor provisório” da prova já produzida, nomeadamente das declarações já prestadas pelos aqui recorrentes resulta que os interesses do beneficiário não estão a ser acautelados, nomeadamente porquanto a acompanhante não permite as visitas dos pais ora Recorrentes ao beneficiário, nem que o mesmo seja acompanhado na doença.
9. O que sucede é que o mesmo está institucionalizado e por vezes tem necessidade de ser hospitalizado, porém não se faz acompanhar por nenhum familiar, pois nem a acompanhante o acompanha, nem permite que os pais o façam.
10. A acompanhante ao não permitir as visitas aos ora Recorrentes viola os deveres de cuidado e de diligência a que está obrigada nos termos do disposto no artigo 146.º, n.º 1, do Código Civil.
11. O despacho de que ora se recorre viola assim o disposto no artigo 891.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
12. Devendo o despacho recorrido ser revogado e consequentemente deverá ser proferido outro que ordene a nomeação a título provisório de acompanhante nos termos do disposto no artigo 891.º, n.º 2 do Código de Processo Civil.
13. Relativamente ao aditamento ao rol de testemunhas o tribunal “a quo” indeferiu o requerido por entender que os ora Recorrentes não fundamentam minimamente a pertinência ou relevância das testemunhas agora indicadas e por não vislumbrar pertinência na inquirição das mesmas.
14. Sucede que os ora Recorrentes arrolaram as testemunhas em apreço e requereram as já referidas diligências probatórias na sequência da produção de prova já iniciada e visando fazer prova do alegado em sede de requerimento inicial.
15. Não se compreendendo o motivo pelo qual o tribunal “a quo” indeferiu as diligências probatórias requeridas pelos ora Recorrentes.
16. Os despachos proferidos de que ora se recorre não se encontram devidamente fundamentos, invocando-se a nulidade dos mesmos por ocorrência do vício de falta de fundamentação.
17. O tribunal “a quo” ao indeferir as diligências probatórias já requeridas viola o poder/dever de prosseguir o apuramento da verdade material e os artigos 6.º/1 e 411.º do Código de Processo Civil, o Juiz tem o poder-dever de realizar ou ordenar oficiosamente as diligências necessárias ao apuramento da verdade.
18. Violou assim o tribunal “a quo” o vertido no artigo 411.º do Código de Processo Civil, porquanto ao inferir o requerido faz com que não seja produzida prova suficiente indispensável à boa aplicação da Justiça, em cumprimento do princípio do inquisitório que impõe ao julgador que realize ou ordene, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos que lhe é lícito conhecer.
19. Veja-se a este propósito aquele que tem sido o entendimento maioritário da nossa jurisprudência, nomeadamente o vertido no Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, processo n.º 572/11.4TTPNF-A.C1.P1, datado de 09-02-2015.
20. Termos em que deverão os despachos recorridos serem revogados por violação dos supra mencionados preceitos legais e consequentemente deverá ser admita a produção de prova nos termos requeridos.
Nestes termos e nos melhores de direito deverá o presente recurso de apelação ser julgado procedente por provado e em consequência deverão os despachos recorridos serem revogados e consequentemente deverá ser admita a produção de prova nos termos requeridos, com o que se fará Justiça!»

O Ministério Público contra-alegou, pugnando pela confirmação dos despachos recorridos.

Dispensados os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – ÂMBITO DO RECURSO
Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões dos recorrentes, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso (artigos 608°, n° 2, 635°, nº 4 e 639°, n° 1, do CPC), a questão essencial a decidir é a de saber se deviam ter sido admitidas as diligências de prova requeridas pelos recorrentes.

III – FUNDAMENTAÇÃO
OS FACTOS
A factualidade e a dinâmica processual a considerar para a decisão do recurso são as descritas no antecedente relatório.

O DIREITO
A lei confere ao juiz o poder de dirigir o processo de molde a atingir um desfecho célere, com respeito pelos direitos processuais das partes, onde se incluem designadamente a realização de diligências de prova necessárias.
Como é sabido, a prova é a atividade destinada à formação da convicção do tribunal sobre a realidade dos factos controvertidos, atividade que incumbe à parte onerada, que não obterá uma decisão favorável se não satisfizer esse ónus (arts. 341º, 342º e 346º do Código Civil e 414º do CPC).
Para cumprir um tal ónus, a parte tem de utilizar um dos meios de prova legalmente ou contratualmente admitidos ou não excluídos por convenção das partes (art. 345º do Código Civil).
Atenta a importância do cumprimento do ónus de prova para o proferimento de uma decisão favorável – e acentuando os deveres correlativos que decorrem desse ónus – fala-se de um direito à prova, que constitui uma dimensão ineliminável do direito constitucional a um processo equitativo (art. 20º, nº 4, da CRP) e, como se afigura claro, o direito à prova não se esgota no direito à sua proposição, antes se concretiza, sobretudo no tocante às provas constituendas, no direito à sua produção.
Contudo, os atos relativos à produção da prova, como qualquer outro ato processual, estão submetidos, por inteiro, a um princípio da utilidade ou de economia: no processo não podem ser praticados, pelas partes ou pelo tribunal, atos inúteis, isto é, que sejam desnecessários para a tutela da situação jurídica invocada em juízo (arts. 130º e 534º, nº 1, 1ª parte, e 2, do CPC)[1].
No caso concreto, estamos perante um processo de acompanhamento de maior, que é um processo especial, ao qual se aplicam, com as necessárias adaptações, o disposto nos processos de jurisdição voluntária, designadamente no que respeita aos poderes do juiz e ao critério do julgamento, como resulta do nº 1 do art. 891º do CPC.
Ora, nestes processos, «[o] tribunal pode (…) investigar livremente os factos, coligir as provas, ordenar os inquéritos e recolher as informações convenientes; só são admitidas as provas que o juiz considere necessárias» - n.º 2 do artigo 986.º do CPC.
Sobre a matéria da produção de provas neste tipo de processos, tendo em consideração as disposições processuais em vigor à época, mas de teor substancialmente idêntico às atuais, escrevia o Prof. Alberto dos Reis:
«…o artigo 1448.º concede ao juiz a faculdade latitudinária de recusar a produção de quaisquer provas, requeridas ou oferecidas pelas partes, quando as julgue desnecessárias.
Também neste ponto se nota uma ampliação considerável dos poderes do juiz em matéria de jurisdição contenciosa. O juiz pode repelir o que for impertinente ou meramente dilatório (art. 266.º); pode recusar a junção de documentos impertinentes ou desnecessários (art. 556.º); mas não lhe é lícito, no processo comum, privar a parte do direito de produzir prova por depoimento de parte, por arbitramento, por testemunhas, a título de que essas provas não são necessárias.
Vê-se, pois, que, de um modo geral, o juiz goza na jurisprudência voluntária, em matéria de facto, de poderes mais extensos do que na jurisdição contenciosa».[2]
O juiz pode, pois, recusar a produção das provas que não considere necessário produzir.
No caso, a Sr.ª Juíza a quo indeferiu a produção das provas acima referidas, e entendemos que decidiu bem. Senão vejamos:
Assim, no que respeita à primeira diligência indicada pelos recorrentes no seu requerimento de 15.03.2024, isto é, que se solicitasse novamente à Santa Casa da Misericórdia ... o nome completo e o paradeiro da testemunha GG, o qual exercia ou teria exercido funções naquela instituição, o despacho recorrido acolheu a promoção do Ministério Público no sentido do seu indeferimento, sob ponderação de que a Santa Casa da Misericórdia já havia esclarecido nos autos que o enfermeiro GG não é colaborador daquela instituição.
Ora, tendo em conta tal resposta, não se vê a relevância de se insistir com aquela instituição no sentido prestar uma informação que já se sabe de antemão a mesma não pode fornecer, sendo que os recorrentes nada de novo trouxeram aos autos que justificasse insistir em tal informação, pelo que bem andou a Sr.ª Juíza ao indeferir tal diligência de prova.

Sustentam também os recorrentes que o Tribunal a quo não deveria ter indeferido a diligência por si indicada em terceiro lugar no requerimento de 15.03.2024, ou seja, que se procedesse a uma avaliação psicológica e a um despiste do consumo de canabinoídes e álcool à acompanhante EE, companheira do beneficiário.
Segundo os recorrentes, essa avaliação psicológica e exames toxicológicos visavam demonstrar o por si alegado no tocante à conduta e personalidade da acompanhante.
Mas não têm razão os recorrentes, pois tais diligências, considerando o objeto do incidente em causa, seriam manifestamente irrelevantes e impertinentes para a decisão a proferir a final quanto à requerida remoção de EE do cargo de acompanhante do beneficiário AA.
Revemo-nos, a este propósito, no que aduziu o Ministério Público nas contra-alegações:
«(…), tendo nomeadamente em conta que os factos que importa aquilatar se reportam até ao mês de dezembro último – data da dedução do incidente suscitado pelos requerentes – o resultado das diligências em questão nunca poderia aquilatar a ocorrência de qualquer uma das situações alegadamente verificadas naquele período.
Para além disso, nada se apurou das diligências efetuadas nos presentes autos até ao momento – nomeadamente da tomada de declarações à acompanhante e da inquirição das várias testemunhas já ouvidas – que indiciasse a existência, da parte da mesma EE, de algum problema relacionado com o abuso do consumo de álcool ou de estupefacientes.
Assim, nada se apurou que justificasse a realização de tais despistes – os quais, de resto – porque invasivos da esfera pessoal – a legislação portuguesa apenas obriga para aquilatar da eventual prática de crimes (nomeadamente, de crimes de tráfico/consumo de estupefacientes e de condução sob a influência de álcool e/ou de estupefacientes)».
Não assiste, pois, razão aos recorrentes neste ponto.

Afirmam também os recorrentes que mal andou o Tribunal a quo ao não nomear um “tutor/acompanhante provisório” ao beneficiário, considerando nomeadamente que a prova já produzida aponta no sentido de que os interesses do mesmo não estão a ser acautelados.
A este respeito escreveu-se no despacho recorrido:
«Em primeiro lugar, com a entrada em vigor, em 10.02.2019, da Lei nº 49/2018, deixou de existir a figura de tutor que foi substituída por acompanhante. Em segundo lugar, a decretação de medidas cautelares, como por exemplo, a nomeação a título provisório de acompanhante (art. 891º/2, do Código de Processo Civil), podem ser decretadas se e quando a situação o justificar. Ora, não se vislumbra que a situação justifique a medida requerida. Efectivamente, o beneficiário encontra-se institucionalizado, monitorizado e tanto quanto resulta dos autos os seus interesses estão a ser acautelados.»
Trata-se de uma análise correta, pois encontrando-se o beneficiário institucionalizado e monitorizado, o que acautela devidamente os seus interesses, não se justifica a adoção de uma tal medida, improcedendo também a alegação dos recorrentes neste ponto.

Por último, insurgem-se os recorrentes contra a decisão que indeferiu as diligências constantes dos pontos 1, 2, 3, 4, 5 e 7 do seu requerimento de 19.03.2024, que segundo eles se destinam a fazer prova do alegado no requerimento inicial.
Escreveu-se a este respeito no despacho recorrido:
«Nestes autos os Requerentes do incidente indicaram, até à data, 2 testemunhas no requerimento inicial (das quais prescindiram de uma e a outra, o enfermeiro GG, não foi possível a sua localização) e 5 testemunhas no requerimento apresentado em 3.01.2024, que o tribunal admitiu por despacho de 24.01.2024.
A produção de prova já teve início, pelo que o requerimento de aditamento do rol de testemunhas agora apresentado em 19.03.2024 não respeita o prazo de antecedência consagrado no artigo 598º do Código de Processo Civil (preceito invocado pelos Requerentes), além de que o número de testemunhas que agora pretendem aditar ultrapassa o limite legal.
Acresce que, os Requerentes não fundamentam minimamente a pertinência ou relevância das testemunhas agora indicadas.
Mais, se por um lado, se desconhece quem seja HH, e por isso não nos é possível sequer aquilatar da utilidade da sua inquirição, por outro lado, a testemunha II será a pessoa a que os requerentes se referem em 13º do requerimento de 20.12.2023, e assim sendo não se vislumbra por que motivo não a indicaram com o rol inicial, e FF será o filho do beneficiário e da acompanhante e é menor de idade.
Assim, não se vislumbrando pertinência na inquirição das testemunhas HH e II e, por a sua pouca idade e relação familiar e emocional com os intervenientes destes autos, desaconselhar a inquirição da testemunha FF, não se admite o aditamento ao rol de testemunhas nem se determina oficiosamente a inquirição das pessoas indicadas.
No que diz respeito à diligência identificada no ponto (ii) supra (solicitação à GNR), na medida em que não está em causa nestes autos aferir da regulação das responsabilidades parentais do menor FF, nem se vislumbrar pertinência na diligência requerida para o esclarecimento dos factos, indefere-se o requerido.
Quanto à diligência acima referida em (iii) e porque foi mencionado pela Requerente ser ela a pessoa de contacto do beneficiário junto do CHUA, defere-se o requerido.
Por último, não se vislumbra pertinência na realização da diligência identificada supra em (iv). Efectivamente, o estado de saúde do beneficiário e a sua evolução, que se espera que seja favorável, apenas pode ser atestado e avaliado por médico, não assumindo a entidade “Unidade de Cuidados Continuados” essa qualidade, pelo que vai a referida diligência indeferida.»
Subscrevemos este entendimento, o qual se mostra perfeitamente razoável e proporcionado, considerando os interesses em causa no presente incidente e o que resulta dos próprios autos, afigurando-se despiciendo qualquer outro argumento para demonstrar a falta de razão dos recorrentes.
Em suma, tendo a prova requerida sido rejeitada com o fundamento na impertinência das diligências probatórias requeridas, por nada adiantarem à decisão do incidente em causa, o que é uma consequência inerente aos requerimentos probatórios injustificados, não se mostra violado o direito à prova dos recorrentes.

Uma última palavra para dizer que não têm a mínima razão os recorrentes quando afirmam, na conclusão 16, que «[o]s despachos proferidos de que ora se recorre não se encontram devidamente fundamentos, invocando-se a nulidade dos mesmos por ocorrência do vício de falta de fundamentação.
Os despachos recorridos estão devidamente fundamentados, como uma simples leitura dos mesmos o evidencia, confundindo os recorrentes nulidade com um eventual erro de julgamento, que no caso é inexistente, como vimos supra.
O que sucede é que os recorrentes não se conformam com o decidido e, sem mais argumentos para esgrimir, apodam de nulos por falta de fundamentação os despachos recorridos, mas sem razão.
Por conseguinte, o recurso improcede, não se mostrando violadas as normas invocadas ou quaisquer outras.
Ante a isenção legal, não há lugar à condenação dos recorrentes nas custas do presente recurso - cf. art.º 4.º, n.º 2, al. h), do RCP.

IV – DECISÃO
Pelo exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação, confirmando as decisões recorridas.
Não são devidas custas pelo recurso, atenta a isenção legal.
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Évora, 23 de maio de 2024
Manuel Bargado (Relator)
Mário Branco Coelho
Francisco Xavier
(documento com assinaturas eletrónicas)
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[1] Cfr. acórdão da Relação de Coimbra de 16.04.2013, proc. 3234/09.9T2AGD-C.C1, in www.dgsi.pt.
[2] Processos Especiais, Vol. II, reimpressão. Coimbra Editora, 1982, pp. 399-400.