Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
2659/07-2
Relator: MATA RIBEIRO
Descritores: RECONSTITUIÇÃO NATURAL
INDEMNIZAÇÃO EM DINHEIRO
NULIDADE DA SENTENÇA
Data do Acordão: 04/03/2008
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROCEDENTE
Sumário:
I – A obrigação de indemnizar decorrente da responsabilidade civil extracontratual, no nosso sistema é realizada através da chamada reposição ou reconstituição natural. Excepcionalmente, nos termos dos nºs 1 e 2 do art. 566 do citado Código, quando a reconstituição natural for impossível, ou não repare integralmente os danos, ou for excessivamente onerosa para o devedor, pode a indemnização ser fixada em dinheiro.
II – Tendo o autor pedido a reconstituição natural e não tendo o R. excepcionado a excessiva onerosidade da mesma, não pode o Tribunal conhecer oficiosamente dessa matéria e substituir a reconstituição natural por indemnização em dinheiro.
III – A substituição só pode ocorrer a requerimento do devedor e desde que alegue e prove a excessiva onerosidade da reposição natural.
IV- A substituição da reposição natural pela condenação numa indemnização em dinheiro, feita por iniciativa do Tribunal e sem que lhe tenha sido pedida, quer pelo R. quer pelo A., configura uma nulidade da sentença, na medida em que condena em objecto qualitativamente diferente do peticionado.
Decisão Texto Integral:
ACORDAM 0S JUÍZES DA SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA


C............., residente em 37E Rowley Way, London N W8 OSH, Inglaterra, demanda pela presente acção declarativa, com processo ordinário, instaurada no Tribunal da Comarca de Portalegre (2º Juízo), J................, Lda., sedeada em Portalegre, alegando circunstancialismo factual tendente a peticionar:
A) Se declare que a autora é legítima dona do referido prédio e da divisão para arrumos existente ao nível 1º piso;
B) Se condene a ré a reconhecer à autora, aquele direito de propriedade e a abster-se da prática de quaisquer actos sobre o mesmo prédio e divisão;
C) Se condene a ré a reconstruir a divisão para arrumos tal como ela se encontrava antes da sua demolição, no prazo de seis meses;
D) Se condene a ré a proceder à reparação, no mesmo prazo de seis meses, dos estragos por si provocados no prédio da autora, designadamente:
- a reparar o cunhal de nicho da parede no quarto adjacente à sala, no 1º piso;
- a reparar a queda do reboco do armário de parede do quarto adjacente cozinha, no 1º piso;
- a reparar as fissuras existentes no 2º piso.
E) Se condene a ré a pagar à autora a quantia de € 3.000,00 (três mil euros), a título de danos morais;
F) Se condene a ré a pagar à autora as despesas com honorários de técnico de construção que esta vier a realizar e a liquidar em execução de sentença.
Citada a ré, veio contestar, invocando factos tendentes a concluir pela improcedência do pedido, e ao mesmo tempo, deduzir pedido reconvencional peticionando a condenação da autora a pagar-lhe a quantia global de € 24.603,62, acrescida de € 371,28 diários, até alteração dos factos que lhe dão lugar.
Em sede de resposta a autora concluiu pela improcedência do pedido reconvencional.
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Saneado e julgado o processo em sede de 1ª instância, foi proferida sentença que no que concerne ao seu dispositivo reza:
Com base na fundamentação exposta e dentro do quadro legal que se deixou traçado, decido julgar parcialmente procedente por provada a presente acção intentada por C............. e, em consequência:
A) Declaro que a autora é proprietária do prédio urbano sito em Portalegre, na Rua Tenente Valadim, nºs 19 e 21 e Largo dos Combatentes, nº 16, inscrito na matriz da freguesia de S. Lourenço, concelho de Portalegre sob o art. 1733º e inscrito e descrito a seu favor na Conservatória do Registo Predial de Portalegre sob o nº 01295/130904, abrangendo o direito de propriedade da autora a divisão destinada arrumos que se situava ao nível do primeiro piso deste seu prédio, e condeno a ré “J................, Ldª”, a reconhecer esse direito;
B) Condeno a ré a reparar o cunhal de nicho da parede no quarto adjacente à sala, no 1º piso; a reparar a queda do reboco do armário de parede do quarto adjacente à cozinha, no 1º piso e a reparar as fissuras existentes no 2º piso, tudo do prédio da autora, no prazo de seis meses;
C) Condeno a ré a pagar à autora a título de indemnização por danos não patrimoniais e pela privação da sobredita divisão nos termos supra mencionados, a quantia total de € 3.000,00 (três mil euros);
D) Absolvo a ré do demais peticionado.
E) Julgo improcedente por não provado o pedido reconvencional deduzido pela ré/reconvinte “J................, Ldª” e dele absolvo a autora/reconvinda C..............
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Desta decisão foi interposto, pela autora, o presente recurso de apelação, no qual se requer que seja revogada tal decisão, relativamente à alínea C) da parte dispositiva, terminando por formular as seguintes conclusões:
a) A Autora peticionou a condenação da Ré a reconstruir a divisão que esta demoliu;
b) A douta sentença recorrida condenou a Ré, em substituição da restauração natural peticionada pela Autora, no pagamento de indemnização em dinheiro;
e) A douta sentença recorrida não aplicou, e devia ter aplicado o disposto no artigo 562° do CC.
d) A condenação da Ré no pagamento de indemnização traduz a condenação em objecto diverso do pedido, pelo que é causa de nulidade da sentença, nesta parte, por força do disposto no artigo 668° n°1 al. e) do CPC;
e) Ainda que assim não se entenda, o que se admite por mera cautela de patrocínio, o certo é que não foram alegados factos que permitam determinar qual o custo da reconstrução da divisão demolida e,
f) consequentemente, determinar se a mesma é excessivamente onerosa para a Ré;
g) Por outro lado, a Ré não requereu que a reconstrução da divisão fosse substituída pela fixação de indemnização, pelo que também por esta razão tal substituição não é possível.
h) Mas ainda que assim não se entendesse, não foram alegados factos que permitam apurar o valor a atribuir à Autora em sede de substituição da restauração natural por indemnização em dinheiro,
i) sendo certo que a quantia fixada — 2.800,00€ - é manifestamente insuficiente.
j) Aliás, a fixação de indemnização com fundamento na equidade, prevista no artigo 566° n°3 do CC, só é admissível se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos.
k) Tal impossibilidade, no entanto, terá de resultar de uma impossibilidade objectiva — isto é, terá de resultar do facto do dano não ser averiguável — e não apenas de não terem sido levados ao processo os factos que permitiriam a sua determinação, os quais, no caso deveriam ter sido levados pela Ré.
l) Assim, não é aplicável ao caso sub judicie o disposto no artigo 566° n°3 do CC pelo que não poderia a indemnização ser fixada com base na equidade.
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Não foram apresentadas, pela ré, contra alegações.
O Juiz a quo proferiu despacho sustentando a inexistência da nulidade da sentença, arguida pela recorrente.
Estão colhidos os vistos legais.
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Apreciando e decidindo

Tudo visto e analisado, tendo por base as provas existentes e em atenção o direito aplicável, cumpre decidir, sendo certo que o objecto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento é oficioso - disposições combinadas dos artºs 660º n.º 2, 661º, 664º, 684º n.º 3 e 690º todos do Cód. Proc. Civil.
Assim, sinteticamente, são as seguintes as questões que importa apreciar:
- Da nulidade da sentença traduzida em condenação que versa sobre objecto diverso do pedido.
2ª – Da reparação do dano – condenação na reconstituição da situação que existiria se o mesmo não se tivesse verificado / condenação indemnizatória baseada na equidade.
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Na sentença recorrida foi considerado como provado o seguinte quadro factual:
1- O prédio urbano sito em Portalegre, na Rua Tenente Valadim, nºs 19 e 21 e Largo dos Combatentes, nº 16, está inscrito na matriz da freguesia de S. Lourenço, concelho de Portalegre sob o art. 1733º e encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Portalegre sob o nº 01295/130904, com inscrição a favor da autora (Al. A) da matéria de facto assente).
2- Tal prédio foi adquirido pela autora em 03/03/1989, através de escritura pública de compra e venda outorgada no Cartório Notarial de Portalegre (Al. B) da matéria de facto assente).
3- O prédio urbano sito em Portalegre, no Largo Dr. Alves de Sousa, está inscrito na matriz da freguesia de S. Lourenço, concelho de Portalegre sob o art. 659º e encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Portalegre sob o nº 401/19891031, com inscrição a favor da ré (Al. C) da matéria de facto assente).
4- A ré adquiriu este prédio pelo preço de € 55.000,00 (cinquenta e cinco mil euros) (Resposta ao quesito 32º).
5- Os prédios acima identificados são confinantes entre si (Al. D) da matéria de facto assente).
6- O edifício que constituía o prédio identificado em 3) foi demolido pela ré (Al. E) da matéria de facto assente).
7- A demolição ocorreu entre 15 e 19 de Novembro de 2004 (Resposta ao quesito 28º).
8- E foi pública e antecipadamente afixada (Resposta ao quesito 29º).
9- Existia, ao nível do 1º piso do prédio referido em 1), uma divisão para arrumos (Resposta ao quesito 1º).
10- Cujo único acesso era feito por porta existente no prédio pertencente à autora (Resposta ao quesito 2º).
11- Essa porta tinha a fechadura do lado do prédio da autora (Resposta ao quesito 20º).
12- A quota de soleira do prédio da ré é diferente e superior da do prédio da autora (Resposta ao quesito 22º).
13- A divisão em causa assenta na placa do rés-do-chão do prédio da ré e o prédio da autora da acesso à mesma ao nível do seu primeiro andar (Resposta ao quesito 23º).
14- A autora por si e pelos seus antepossuidores, têm utilizado a divisão a que se acede pelo primeiro andar do prédio identificado em 1), há pelo menos trinta anos (Resposta ao quesito 3º).
15- A autora tem pago os impostos devidos pela propriedade do prédio mencionado sob o nº 1), conforme documento de fls. 125 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (Resposta ao quesito 4º).
16- A autora recebe rendas como contrapartida da cedência para habitação de terceiros, do r/c do prédio a que alude o nº 1) (Resposta ao quesito 5º).
17- A divisão a que se vem aludindo nunca foi objecto de arrendamento autónomo (Resposta ao quesito 26º).
18- Em data não concretamente apurada, a autora procedeu a reparações, designadamente, na cobertura da referida divisão (Resposta ao quesito 6º).
19- A autora por si e por seus antepossuidores utilizavam ininterruptamente a divisão a que se acede pelo primeiro andar do prédio a que se reporta o nº 1), sem oposição, e na convicção de que tal divisão integra tal prédio e que, como tal, lhes pertence (Resposta ao quesito 7º).
20- Durante a obra de demolição do edifício identificado em 3) foi também demolida e eliminada a divisão de arrumos a que se vem aludindo (Resposta ao quesito 8º).
21- E tapada com alvenaria em tijolo, a porta que dava acesso a tal divisão (Resposta ao quesito 9º).
22- A demolição de tal divisão foi efectuada sem o conhecimento da autora (Resposta ao quesito 10º).
23- Em consequência da demolição, o prédio da autora sofreu a queda parcial do cunhal de um nicho da parede no quarto adjacente à sala, no primeiro piso (Resposta ao quesito 11º).
24- E a queda do reboco de um armário de parede no quarto adjacente à cozinha no primeiro piso (Resposta ao quesito 12º).
25- E ocorreu a abertura de fissuras no arrumo situado no segundo piso (Resposta ao quesito 13º).
26- A demolição da divisão a que se vem aludindo e os estragos acabados de mencionar provocaram nervosismo na autora (Resposta ao quesito 16º).
27- Situação agravada pelo facto de não poder acompanhar pessoalmente pois reside em Inglaterra (Resposta ao quesito 17º).
28- A autora contratou técnico para fazer a vistoria do prédio (Resposta ao quesito 18º).
29- A ré é uma empresa que tem por objecto social a aquisição de imóveis para construção e recuperação e a promoção de operações de loteamento e urbanização, administração e venda (Al. G) da matéria de facto assente).
30- As obras do prédio da ré foram embargadas no dia 13 de Dezembro de 2005 e determinado o respectivo levantamento por decisão proferida em 13 de Fevereiro de 2006 (Al. F) da matéria de facto assente).
31- A ré para demolir e reconstruir o prédio tal como ele se encontra descrito no auto de embargo de obra nova, a fls. 37 e 38 do procedimento cautelar, pagou ao empreiteiro N…………….. o montante de € 94.279,06 (noventa e quatro mil duzentos e setenta e nove euros e seis cêntimos) (Resposta ao quesito 33º).
32- Após o embargo, a ré não pode por razões de segurança retirar as madeiras, vigas, prumos metálicos e os utensílios da carpintaria pertencentes a F…………………… (Resposta ao quesito 35º).
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Conhecendo das questões
Sustenta a recorrente que a decisão impugnada enferma de nulidade ao condenar a ré no pagamento duma indemnização em detrimento da restauração natural que havia sido peticionada, com a invocação de que a reconstrução da divisão destruída do imóvel seria demasiado onerosa.
A lei processual impõe limites à condenação, quer relativamente à quantidade que é peticionada, quer relativamente ao objecto da pretensão, não sendo permitido proferir condenação em objecto diverso do que se pedir – artº 661º n.º 1 do Cód. Proc. Civil, relevando, assim, o princípio do dispositivo, que atribui às partes a iniciativa e o impulso processual, e do contraditório, que impõe que o tribunal não possa resolver conflito de interesses, que a acção pressupõe, sem que a resolução lhe seja pedida por uma das partes e a outra seja devidamente chamadas a deduzir oposição. [1]
Ultrapassando a condenação esses limites, a sentença é nula, por força do disposto no artº 668º nº 1 al. e) do Cód. Proc. Civil. [2]
No caso em apreço, constatamos que numa das vertentes da decisão (a que foi impugnada), foi proferida condenação em objecto diverso do que se pediu consubstanciando tal uma alteração qualitativa do pedido, [3] a qual foi implicitamente reconhecida pelo Julgador a quo, mas justificada pela excessiva onerosidade da reconstrução pedida, o que o levou a optar pela fixação duma indemnização, muito embora reconheça expressamente que a “ré não pediu a fixação da indemnização em dinheiro como substituição da reconstrução pedida pela autora”. [4]
Mas será que justificando o Julgador o motivo pelo qual profere condenação indemnizatória em detrimento da reconstituição natural, peticionada, tal faz com que não se possa configurar a sua actuação na nulidade a que alude o artº 668º n.º 1 al. e) do Cód. Proc. Civil, como defende o Mmo. Juiz recorrido no seu despacho de sustentação. [5]
Para o caso dos autos, a nossa resposta não poderá deixar de ser negativa. Houve efectivamente violação do disposto no artº 661º n.º 1 do CPC, que configura a nulidade prevista no artº 668º n.º 1 al. e) do CPC, conforme passaremos a demonstrar.
Decorre do disposto no artº 566º n.º 1 do Cód. Civil que a indemnização só deve ser fixada em dinheiro quando “a restituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor”. O legislador optou, assim, como primeira alternativa, pela reparação do dano mediante reconstituição natural. Se o dano real consistiu numa demolição duma construção, impõe-se que o lesante seja condenado na sua edificação, como forma de ressarcimento dos danos sofridos. [6] A indemnização em dinheiro tem carácter subsidiário. [7]
Assim, deparando-se com o que considera ser “excessiva onerosidade da reconstrução,” o Julgador a quo, entendeu por bem, oficiosamente, optar pela fixação de indemnização em vez de condenar na reconstrução.
No entanto não o podia fazer, sem que tivesse sido o devedor a requerer a conversão da obrigação de restauração ou reconstrução, em obrigação pecuniária, através da alegação e prova de elementos que objectivamente consubstanciem uma situação de desproporção donde resulte à evidência a excessiva onerosidade para aquele, de modo a aferir do sentido de justiça e de proporcionalidade, imposto pela reconstituição da situação que existiria, se o facto não se tivesse verificado.
Têm-se reconhecido que “a excessiva onerosidade deve ser entendida no sentido de que não pode ser feita oficiosamente” [8] devendo a obrigação de restauração natural ser convertida em obrigação pecuniária, apenas, nos casos em que a requerimento do devedor, este alegue a verificação de tal onerosidade excessiva. [9]
Do compulsar dos autos, especialmente dos respectivos articulados, se verifica que em algum momento a ré, para a eventualidade de procedência da acção, veio invocar que a reconstituição natural se apresentava como meio impróprio ou inadequado por ser excessivamente onerosa para si, requerendo, por tal a sua conversão em obrigação pecuniária.
Nestes termos é, quanto a nós, manifesta, por ter condenado em objecto qualitativamente diferente do peticionado, a nulidade da sentença.
Por seu turno, também se dirá, que mesmo que se considerasse possível a conversão oficiosa, por parte do juiz, mesmo sem requerimento expresso do devedor, sempre de factos articulados por este e da sua prova é que se teria de concluir pelo apuramento do custo da reconstituição natural e, a partir do mesmo estabelecerem-se parâmetros que conduzissem à conclusão da verificação da excessiva onerosidade, o que, de modo algum, acontece no caso em apreço, já que, pura e simplesmente, a ré considerando a divisão em causa como sua, demoliu-a e não cuidou de prevenir para efeitos de eventual condenação no pedido, outras vertentes, nomeadamente a da obrigação pecuniária em substituição da restauração natural, mesmo sabendo, ab initio, que a autora se arrogava como proprietária de tal divisão, tendo, até, instaurado procedimento cautelar de embargo de obra nova que foi decretado numa fase inicial sendo, apenas, levantado após julgamento da oposição apresentada pela ré.
Assim, os autos não fornecem elementos, para apurar o montante dos danos por si sofridos com o recurso à reparação natural, muito embora essa possibilidade se apresentasse com real. Ou seja, esse dano era averiguável, só não o tendo sido, por inércia da ré/devedora em carrear para os autos elementos que possibilitassem ao julgador fazer essa averiguação.
Deste modo, também, nunca o julgador podia ter-se socorrido da equidade para determinar o montante indemnizatório a suportar pela ré em detrimento da restauração natural, chamando à colação o artº 566º n.º 3 do Cód. Civil, uma vez que o disposto neste n.º 3 “não dispensa o lesado de alegar e provar os factos que revelem a existência de danos e permitam a sua avaliação segundo um juízo de equidade.” [10] [11]
Não tendo sido alegados e consequentemente provados tais factos, não podia o Julgador, tal como o fez, partindo de meras conjecturas, designadamente referentes a valores da construção na cidade de Portalegre, sem qualquer especificação concreta, concluir pela existência de danos de modo a concretizá-los no montante determinado de € 2 800,00.
Nestes termos, estando devidamente reconhecido o direito de propriedade da autora sobre uma divisão de um prédio urbano, [12] em questão nos autos, que a ré demoliu, não nos resta, senão, reconhecer a bondade das conclusões do recurso interposto pela autora e consequentemente julgar este procedente, revogando a decisão de 1º instância, na parte impugnada [13] e condenar a ré a reconstruir a divisão em causa.
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DECISÂO
Pelo exposto, decide-se, nos termos supra referidos, julgar procedente a apelação e, consequentemente, revogar a sentença recorrida, na parte impugnada, condenando-se a ré a, no prazo de seis meses, reconstruir a divisão para arrumos de modo a repor a situação que existiria se não tivesse ocorrido a demolição.
Custas pela apelada.

Évora, 03 de Abril de 2008

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Mata Ribeiro
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Sílvio Teixeira de Sousa
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Rui Machado e Moura




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[1] - v. Ac. Relação do Porto de 03/05/1990 in BMJ, 397º, 566.
[2] - v. Alberto dos Reis in Código de Processo Civil Anotado, vol. V, 1981, 67.
[3] - v. Alberto dos Reis in ob. cit., 68.
[4] - v. fls. 26 da sentença impugnada, a fls. 165 dos autos.
[5] - “Justificando o motivo pelo qual não deveria condenar-se a ré na reconstituição natural do dano - reconstrução da divisão para arrumos – o tribunal entendeu que o dano efectivamente sofrido pela autora poderia ser ressarcido mediante a fixação de uma indemnização em dinheiro (cfr. artº 566º do Cód. civil), tendo deste modo qualificado os factos, do ponto de vista jurídico, da forma distinta da indicada pela autora, o que não lhe está vedado por lei (artº 664º do CPC). Nestes termos entendo que não há nulidade que deva ser suprida.”
[6] - v. Antunes Varela in Das obrigações em Geral, 2ª edição, vol. 1º, 760.
[7] - v. Pires de Lima e A. Varela in Código Civil Anotado, 1982, vol. I, 550.
[8] - v. Vaz Serra in Obrigação de Indemnização, BMJ, 84º, 143.
[9] - v. Pires de Lima e A. Varela in ob. cit. 551.
[10] - v. Pires de Lima e A. Varela in ob. cit. 553.
[11] - V. Ac. STA de 14/11/1996 imn BMJ 461º, 244.
[12] - Reconhecimento este feito na sentença de 1ª instância, com a qual a ré se conformou.
[13] - Al. C) da parte decisória.