Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
| Processo: |
| ||
| Relator: | MARIA ALEXANDRA SANTOS | ||
| Descritores: | INVENTÁRIO PARA SEPARAÇÃO DE MEAÇÕES COMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA | ||
| Data do Acordão: | 06/12/2008 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Meio Processual: | AGRAVO CÍVEL | ||
| Decisão: | NÃO PROVIDO | ||
| Sumário: | I – A competência em razão da matéria deve ser determinada em face da pretensão deduzida pelo autor na petição inicial. II – O inventário para separação de meações, nos termos dos artigos 825º e 1406º, do CPC correrá termos nos Tribunais Comuns; Se tiver por base o artigo 1404º do CPC deverá correr termos nos Tribunais de Família e Menores. III – O processo de inventário não faz parte dos incidentes típicos das execuções fiscais, mas sim uma questão prejudicial que determina a suspensão da execução fiscal até à conclusão do inventário no Tribunal Competente. | ||
| Decisão Texto Integral: | * “A” veio requerer contra “B”, nos termos e para os efeitos do disposto nos art°s 825° e 1406° do CPC, inventário para separação de meações, dirigido ao Tribunal de Família e Menores de …, alegando em resumo: PROCESSO Nº 3010/07 – 3 * ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA * A requerente e o requerido foram casados entre si, tendo, porém, sido já decretado o seu divórcio por decisão da C.R.C. de …, de 23/11/2006, transitada em julgado. Existem bens comuns do dissolvido casal a partilhar, entre os quais o direito de superfície sobre um prédio que corresponde a um lote de terreno para construção urbana e respectiva construção, que identificam. Nuns autos de execução fiscal que corre termos na Direcção de Finanças de …, em sede de reversão fiscal contra o requerido enquanto executado (com o fundamento na sua exclusiva responsabilidade tributária), foi ordenada a penhora do referido bem, o qual é um bem comum do dissolvido casal, pelo que a requerente tem a sua meação penhorada. Tendo sido citada para, querendo, requerer a separação de bens nos termos do art° 220° do CPPT, conclui se proceda a inventário para separação da sua meação por via da partilha de bens em casos especiais. Sucede que, por lapso, o processo foi apresentado e deu entrada no Tribunal da Comarca de … onde o Exmº Juiz, apreciando liminarmente, declarou verificar-se a incompetência daquele tribunal em razão da matéria e absolveu o R. da instância (art°s 101°, 102°, 288° nº 1 al. a) 493° e 494° al. a) todos do CPC). A requerimento da requerente e após convite nesse sentido, foi o processo remetido ao Tribunal de Família e Menores de …, nos termos do art° 105° nº 2 do CPC. Recebido o processo neste Tribunal, o Exmº Juiz proferiu, então, a decisão de fls. 34 e segs. onde, entendendo que o tribunal competente para a presente acção é o Tribunal Judicial de …, declarou aquele Tribunal de Família materialmente incompetente e, em consequência, indeferiu liminarmente o requerimento inicial. Foi desta decisão que, inconformada, agravou a requerente, alegando e formulando as seguintes conclusões: 1 - A agravante requereu e bem, a remessa do inventário ao Tribunal de Família e Menores de … 2 - Por despacho de fls., veio o Mmº Juiz a quo declarar a incompetência do tribunal para os termos do presente processo, considerando que seriam antes competentes os Tribunais Cíveis com base na conjugação dos art°s 81 ° al. c) e 77° nº 1 al. a) da Lei 3/99 de 10/12, com o art° 1404 nº 3 do CPC. 3 - Dispõe o art° 81° n° 1 al. a) da LOTJ "compete aos Tribunais de Família preparar e julgar inventários requeridos na sequência de acções de separação de pessoas e bens e de divórcio, bem como procedimentos cautelares com aqueles relacionados". 4 - Sendo de concluir que o Tribunal a quo não deveria ter aplicado a norma adjectiva prevista no art° 77° n° 1 al. a), mas sim a norma prevista no art° 81 ° nº 1 al. c). 5 - Porquanto resulta desta disposição legal com clareza que os inventários entre ex-cônjuges cabem na esfera material dos Tribunais de Família. 6 - Independentemente do divórcio ser decretado pelo Tribunal ou pela Conservatória. 7 - Já que tal disposição legal ao atribuir competência aos Tribunais de Família para os inventários subsequentes aos divórcios, não faz distinção entre o divórcio decretado pelo Tribunal ou pela Conservatória. 8 - Termos em que, deve pelas razões expostas, revogar-se a decisão recorrida, substituindo-se a mesma por outra que ordene ao prosseguimento do inventário, assim se fazendo a costumada Justiça. O Exmº Juiz manteve a sua decisão. * Colhidos os vistos legais cumpre decidir. Delimitando-se o âmbito do recurso pelas conclusões da alegação do recorrente abrangendo apenas as questões aí contidas (art°s 684° n° 3 e 690° n° 1 do CPC), verifica-se que a única questão a decidir é saber se o Tribunal de Família e Menores de … é materialmente competente para os termos do presente processo de inventário. * A factualidade a ter em conta é a que resulta já do relatório supra. Como é sabido, tal como acontece em relação a qualquer outro pressuposto processual, também a competência em razão da matéria deve ser determinada em face da relação jurídica processual tal como a A. configura na petição inicial e mais propriamente, em face da pretensão nela deduzida - cfr. Prof. Manuel de Andrade in "Noções Elementares de P.C.", ed. 1979, p. 90 e, entre outros, Acs. do STJ de 12/01/94 e 9/05/95, CJSTJ, respectivamente T. I, p. 38 e T. II, p. 68). Como ensinava o Prof. Manuel de Andrade, há que atender para este efeito aos termos em que foi posta a acção - seja quanto aos seus elementos objectivos (natureza da providência solicitada ou do direito para o qual se pretende a tutela judiciária, facto ou acto de onde teria resultado esse direito, bens pleiteados, etc), seja quanto aos seus elementos subjectivos (identidade das partes) (ob. e loc cit.) ln casu, a pretensão formulada pela requerente foi que "se proceda a inventário para separação da meação da requerente por via da partilha dos bens em casos especiais" e invoca expressamente, o disposto nos art°s 825° e 1406° do CPC, alegando ter sido "citada para requerer, querendo, a separação de bens nos termos do disposto no artº 220 do CPPT em processo de execução fiscal que pende contra o requerido. Efectivamente, conforme se verifica da certidão junta a fls. 18/19, no referido processo de execução fiscal foi proferido, em 24/05/2007, o seguinte despacho "Para efeitos do disposto no artº 2200 do CP.P.T, cite-se o cônjuge do executado “B” (.), para querendo, requerer a separação judicial de bens". Dispõe o referido preceito legal que "Na execução para cobrança de coima fiscal ou com fundamento em responsabilidade tributária exclusiva de um dos cônjuges, podem ser imediatamente penhorados bens comuns, devendo neste caso citar-se o outro cônjuge para requerer a separação judicial de bens, prosseguindo a execução sobre os bens penhorados se a separação não for requerida no prazo de 30 dias ou se se suspender a instância por inércia ou negligência do requerente em promover os seus termos processuais". O âmbito da jurisdição fiscal encontra-se definido nos art°s 212° da CRP e 4° e 49° do E.T.A.F., de que decorre que compete aos tribunais fiscais pronunciar-se apenas sobre as relações jurídicas fiscais. O inventário para separação de meações que emerge duma execução fiscal não integra uma questão fiscal mas antes uma questão privada entre cônjuges. O inventário para separação de meações não faz parte dos incidentes típicos da execução fiscal previstos no art° 166° do CPPT, nem é um incidente atípico pois não se trata de ocorrência extraordinária que interfira com o andamento normal do processo, constituindo, isso sim, questão prejudicial que determina a suspensão da execução até à sua decisão no tribunal competente. Não cabendo no âmbito da competência dos tribunais administrativos e fiscais, a separação judicial de bens deve ser requerida no tribunal comum e o meio competente é o processo de inventário, com as especialidades do art° 1406° do CPC (cfr. Anselmo de Castro "A Acção Executiva, Singular, Comum e Especial", p. 115; Lopes Cardoso, Manual da Acção Executiva, ps. 349, 355 e 356; J. A. Lopes Cardoso, Partilhas Judiciais, voI. I, p. 376). Tal procedimento, à semelhança do previsto no art° 825° do CPC, é um procedimento processual específico, como resulta do disposto no art° 1406° do CPC, normativo este em que se prescrevem as regras próprias pelo qual se deve reger ainda que fazendo apelo, em parte, a normas que regem para outro tipo de inventário, tal como seja para o art° 1404° do CPC. Ora, no art° 1404° nº 3 do CPC determina-se que "O inventário corre por apenso ao processo de separação, divórcio, declaração de nulidade ou anulação e segue os termos prescritos nas secções anteriores". Todavia, como é óbvio, a possibilidade de se requerer a separação de bens, no âmbito do art° 825° do CPC, tem como pressuposto a inexistência de qualquer das situações previstas naquele normativo - separação divórcio e declaração de nulidade ou anulação - antes pressupondo a manutenção ou pendência do casamento, sendo até que nos termos do nº 5 deste normativo" Não tendo o exequente invocado a incomunicabilidade da dívida, pode qualquer dos cônjuges, no prazo da oposição, requerer a separação de bens, ou juntar certidão da acção pendente, sob pena de a execução prosseguir nos bens penhorados", sendo que "Apensado o requerimento em que se pede a separação, ou junta a certidão, a execução fica suspensa até à partilha; se por esta os bens penhorados não couberem ao executado, podem ser penhorados outros que lhe tenham cabido, permanecendo a anterior penhora até nova apreensão" . Daí resulta que não é aplicável ao requerimento de separação de bens nos termos do art° 825º do CPC/art° 220 do CPPT, o disposto no na 3 do art° 14040; aliás o afastamento da aplicabilidade de tal preceito, resulta logo do disposto na 1ª parte do nº 1 do art° 14060 do CPC, na medida em que aí se dispõe que "Requerendo-se a separação de bens nos termos do artº 825 ou ... ", sendo certo que neste se refere onde e como deve ser instaurado o respectivo procedimento processual. Deste normativo, designadamente do seu nº 7 resulta que o inventário para separação de bens corre por apenso à execução e como processo incidental desta, sendo que também do artº 96° nº 1 resulta que "O tribunal competente para a acção é também competente para conhecer dos incidentes que nela se levantem e das questões que o réu suscite como meio de defesa", Sucede que, in casu, ocorre uma situação de natureza excepcional que é a da incompetência dos tribunais tributários (art° 151 ° do CPPT) (o processo executivo pende na Direcção de Finanças de …), para tramitar o processo de inventário, o que, conduziria como acima se disse à necessidade da propositura do inventário nos tribunais comuns. Porém, como também já se referiu, in casu, os cônjuges encontram-se já divorciados por sentença de 23/11/2006, transitada em julgado, tendo a citação para efeitos do art° 2200 do CPPT sido ordenada em 24/05/2007. Devia, pois, ter sido dado conhecimento àquela execução fiscal, da situação de divórcio que já vigorava entre os cônjuges. Assim sendo, não pode a requerente propor e fazer seguir, como pretende, inventário "para separação de meação da requerente por via da partilha de bens em casos especiais", nos termos do art° 825° e 1406° do CPC, mas antes, o inventário a que se refere o art° 1404° do CPC, isto é, na sequência do divórcio já decretado. Porém, aferindo-se, como se disse, a competência material do tribunal pela forma como a A. configura a acção, definida esta pelo pedido, pela causa de pedir e pela natureza das partes, o certo é que a agravante, ao contrário do que refere nas conclusões da sua alegação não propôs o presente inventário na sequência do seu decretado divórcio, caso em que, a nosso ver, caberia competência ao Tribunal de Família e Menores por caber na previsão do art° 81 ° nº 1 al. c) da LOTJ, mas sim, com fundamento na citação para efeitos do artº 220° do CPPT, como inventário para separação de meações nos termos do artº 825° e 1406° do CPC, situação que não cabe naquela previsão. Assim sendo, improcedem as conclusões da alegação da agravante, impondo-se, nos termos e com os fundamentos expostos, a confirmação da decisão recorrida. DECISÃO Nesta conformidade, acordam os Juízes desta Relação em negar provimento ao agravo e, em consequência, confirmar a decisão recorrida. Custas pela agravante. Évora, 2008.06.12 |