Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | JOÃO GOMES DE SOUSA | ||
Descritores: | ESCUTAS TELEFÓNICAS PRAZOS PROIBIÇÃO DE PROVA NULIDADE SANÁVEL EFEITOS | ||
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Data do Acordão: | 04/08/2014 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | RECURSOS PENAIS | ||
Decisão: | NÃO PROVIDOS | ||
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Sumário: | I - O incumprimento dos prazos constantes dos n.ºs 3 e 4 do art. 188.º do Código de Processo Penal não tem a gravidade equivalente a uma falta de autorização judicial para a realização de uma escuta telefónica, limitando-se a serem prazos ordenadores do procedimento, não lhes podendo ser assacada uma consequência tão gravosa (a destruição da prova) como a correspondente à ausência de autorização judicial. II - Em princípio e pelas regras das nulidades processuais, designadamente o da taxatividade das nulidades e dos vícios inerentes, seria um caso de mera irregularidade, por incumprimento de norma reguladora da forma de produção de prova, e o prazo para a sua invocação sempre seria o previsto no art. 123º, n.º 1, do Código de Processo Penal. No entanto, o art. 190.º do mesmo Código reconduz o vício à categoria de nulidade. III - Se a realização de uma escuta telefónica sem autorização judicial só pode ser qualificada como uma proibição de prova – imprestabilidade como prova - a que é aplicável o regime das nulidades insanáveis vista a violação dos arts. 126.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, e 32.º, n.º 8, da Constituição da República Portuguesa, já a nulidade das regras de produção de prova se deve reconduzir à categoria de nulidade sanável. IV - Como tal, esta invalidade não implica um efeito à distância daí resultante, pelo que os meios de prova posteriores mantêm a sua plena validade. | ||
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Decisão Texto Integral: | Processo n. 343/12.0JAFAR.E1 Acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A - Relatório: No Tribunal Judicial da Comarca de Faro – 2º Juízo Criminal e Círculo judicial, no processo comum colectivo supra numerado foi deduzida acusação contra os arguidos: A, (…); B, (…); C, (…); D, (…); E, (…) e F, (…), imputando-lhes a prática dos factos descritos na acusação que constitui folhas 369 e seguintes dos autos, suscetíveis de integrar a prática, pelos arguidos, dos seguintes crimes: - Os arguidos B, A, D, F, E, em autoria material e singular, na prática, cada um deles, de 1 crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelos artigos 2º, nºs 2 e 4, e 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15/93, de 22/01 (republicado pela Lei nº 18/2009, de 11/05), por referência às Tabelas I-B e I-C, anexas ao referido diploma legal, e ao artigo 9º, e correspondente mapa, da Portaria nº 94/96, de 26/03; - O arguido C, em autoria material e singular, e enquanto cúmplice, na prática de 1 crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punível pelos artigos 27º do Código Penal, e 21º, nº1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22/01 (republicado pela Lei nº 18/2009, de 11/05). * O tribunal recorrido veio, por acórdão de 18 de Novembro de 2013, a julgar a acusação parcialmente procedente e a:Absolver o arguido C do crime de que vem acusado; Condenar o arguido A como coautor (e reincidente) de um crime de tráfico, previsto e punível pelo artigo 21º, nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, 75º e 76º do Código Penal na pena de 8 anos de prisão; Condenar o arguido B como coautor de um crime de tráfico, previsto e punível pelo artigo 21º, nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 5 anos de prisão; Condenar o arguido E como coautor de um crime de tráfico, previsto e punível pelo artigo 21º, nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 5 anos e 6 meses de prisão; Condenar a arguida D como coautora de um crime de tráfico, previsto e punível pelo artigo 21º, nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 4 anos e 3 meses de prisão; Suspender na sua execução a pena de prisão imposta à arguida D pelo período de 4 anos e 3 meses, mediante regime de prova (artigo 50º, nº 1 e 5 e 53º, nº 3 do Código Penal); Condenar a arguida F como coautora de um crime de tráfico, previsto e punível pelo artigo 21º, nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de janeiro, na pena de 4 anos e 6 meses de prisão; Suspender na sua execução a pena de prisão imposta à arguida F pelo período de 4 anos e 6 meses, mediante regime de prova (artigo 50º, nº 1 e 5 e 53º, nº 3 do Código Penal); Declarar perdidos a favor do Estado, nos termos do disposto nos artigos 62º, nº 2 e 35º do Decreto-lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, os seguintes bens: A droga apreendida; A peça de roupa e sapatilhas apreendidas; Os telemóveis apreendidos (com exceção do apreendido ao arguido C); O veículo apreendido ao arguido B; Ordenar a destruição da droga; Ordenar a restituição ao arguido C do telemóvel que lhe foi apreendido, desde já se advertindo o mesmo que caso não requeira o seu levantamento no prazo de três meses poderá ter que pagar os custos do depósito. Caso não requeira o seu levantamento no período de um ano será o telemóvel declarado perdido a favor do Estado; * Inconformados, interpuseram recurso os arguidos A, B e E, com as seguintes conclusões (transcritas): A I – Ao contrário do douto entendimento expresso no Acórdão recorrido, sempre se dirá, com o devido respeito por melhor opinião, que a matéria de facto dada como provada, designadamente: - tipo, qualidade e quantidade de produto estupefaciente em causa; - tipo e quantidade de actos de tráfico (02 actos de tráfico, relativamente a um dos quais não houve introdução do produto estupefaciente no mercado) - ausência de uma actividade estruturada, profissionalizada e reiterada de aquisição e venda de estupefacientes, deveria ter sido subsumida pelo tribunal “a quo” no tipo privilegiado previsto no artigo 25º, al. a) da Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro - tráfico de menor gravidade - e não na disposição legal contida no artigo 21º deste diploma legal. II- Da matéria provada resulta evidente que estão em causa nos autos apenas dois actos de tráfico, consubstanciados no envio postal de uma encomenda para a Região Autonoma da Madeira pela arguida F e na detenção e entrega da droga por parte de E a B e ao transporte que este efectuou da mesma do concelho de Mafra para o Algarve. III- No primeiro caso, embora o produto estupefaciente fosse cocaína e haxixe, as quantidades em causa são diminutas (12,143g de cocaína e 5,743 g de haxixe), aproximando-se do limite quantitativo legal para um consumo médio. IV- Relativamente ao produto estupefaciente transportado pelo arguido B, o mesmo não chegou a ser introduzido no mercado, não havendo dissiminação do mesmo, o que terá de relevar no tocante à gravidade dos factos, da ilicitude do acto e da culpa do agente. V - A detenção de um telemóvel por parte de um recluso, embora consubstancie uma violação das normas internas dos estabelecimentos prisionais, não se pode considerar um facto excepcional ou raro. Como é consabido, é prática comum dos reclusos a detenção e utilização de telemóveis o que, embora não desculpe a actuação do recorrente, retira à mesma a dimensão de gravidade e excepcionalidade que a douta decisão que ora se põe em crise lhe pretende dar. Alem do que o ora recorrente não destinava a posse e utilização do telemovel apenas à prática de actos ilícitos. VI- Relativamente ao uso de veículo para transporte da droga, sempre se dirá que a viatura em causa é propriedade do pai do ora recorrente e também co-arguido nos presentes autos, sendo a única viatura que o mesmo detém e que utiliza nas deslocações do seu dia-a-dia. VII - Quanto ao envolvimento de várias pessoas na prática dos actos ilícitos, é por demais evidente a inexistência de uma actividade estruturada, profissionalizada e reiterada de aquisição de estupefacientes para consumo e/ou revenda de forma profissionalizada. Numa consideração mais atenta dos factos provados para avultar, resulta claro que não pode, no caso sub judice, falar-se de associação, grupo ou organização, mas sim apenas na união de esforços de vários elementos de um agregado familiar. Trata-se única e simplesmente de uma família de vários elementos ligados única e simplesmente em co-autoria. VIII - Nada se apurou acerca da eventual existência e/ou dimensão da revenda do produto estupefaciente, de quaisquer proventos monetários retirados pelos arguidos, da eventual compensação económica do ora recorrente pela sua participação e se os arguidos destinavam o produto estupefaciente em causa à distribuição por grande ou pequeno número de pessoas, nem a eventual proporção da compensação remuneratória que obteram ou pretenderam obter. A participação do recorrente nos factos em causa foi ocasional, não consubstanciando um modo de vida. IX - «In casu», e face à factualidade provada, interpretada à luz do espírito do sistema global, tendo-se presentes as implicações do princípio da proporcionalidade e aquele entendimento jurisprudencial, sempre se dirá que se estaria perante uma actividade de tráfico de menor gravidade nos termos previstos no artigo 25° do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro. X- A tipificação do artigo 25° parece significar o objectivo de permitir ao julgador que, sem prejuízo do natural rigor na concretização da intervenção penal relativamente a crimes desta natureza, encontre a medida justa de punição em casos que, embora porventura de gravidade ainda significativa, ficam aquém da gravidade do ilícito justificativa da tipificação do artigo 21° e encontram resposta adequada dentro das molduras penais previstas no artigo 25°. XI- Deve atender-se à imagem global da actividade de tráfico ou à “valorização global dos factos mediante a valoração das concretas circunstâncias em que o crime foi realizado. Como modelos operativos dessa diminuição considerável da ilicitude, a lei aponta, a título exemplificativo, para os meios utilizados (organização e logística demonstradas), a modalidade ou as circunstâncias da acção (grau de perigosidade para a difusão das drogas), a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações dos estupefacientes. XII- De há alguns anos a esta parte, situações que eram tratadas como consubstanciando o crime previsto e punido pelo artigo 21º do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, vêm merecendo menor censura com a sua integração no crime privilegiado de tráfico de menor gravidade”, como se constata nos Acórdãos do STJ de 24/11/99, no BMJ 491/88, de 22/10/98, no BMJ 480/43, e de 23/09/88, no BMJ 479/252 e o do STJ de 28/06/2000, publicado no BMJ. 498/59. XIII-A jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça dos últimos anos tem vindo a alargar o campo de aplicação do aludido artigo 25.º a tudo quanto seja pequeno tráfico, aos ‘dealers’ ou ‘retalhistas’ de rua, sem ligações a quaisquer redes e quase sempre desprovidos de quaisquer organizações ou de meios logísticos, e sem acesso a grandes ou avultadas quantidades de droga. Situações que se situam no pequeno tráfico, mas que todavia já não estão no patamar inicial e reduzido do traficante-consumidor. XIV- In casu, face à factualidade provada, interpretada à luz do espírito do sistema global, tendo-se presentes as implicações do princípio da proporcionalidade e aquele entendimento jurisprudencial, sempre se dirá que se estaria perante uma actividade de tráfico de menor gravidade nos termos previstos no artigo 25° do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro. XV - Ainda que a factualidade dada como provada seja integrada no tipo do artigo 21º do Decreto-Lei n° 15/93, de 22 de Janeiro, os factos em causa consubstanciam uma situação que se integra numa “área cinzenta”, ainda muito perto do limite minimo da pena abstratamente prevista neste normativo. XVI - Face ao exposto, ao não decidir neste sentido, o tribunal “a quo”, para além de outras normas e princípios, violou os artigos 14.º, 40.º, 50.º, 53.º, 64.º e 71.º todos do C.P., os artigos 21º, e 25.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro e os artigos 18.º e 32.º da Constituição da Republica Portuguesa. XVII – Vem a douta decisão ora em crise aplicar ao caso vertente o instituito da reincidência. Ora, embora os requisitos de ordem formal estejam preenchidos in casu, a reincidência, como circunstancia geral agravante que é, carece sempre de verificação cumulativa do pressuposto de ordem material, ie, para que a reincidência opere é necessária a conclusão por parte do julgador, de que a pena anteriormente aplicada ao arguido não lhe serviu de advertência suficiente para o mesmo se afastar da criminalidade. XVIII- Não obstante os presentes factos consubstanciarem a prática de um crime de tráfico de estupefacientes, enquanto a condenação anterior respeita à prática de crimes contra as pessoas e o património, considera o tribunal “a quo” na douta decisão em crise que “ …tais crimes foram cometidos para o arguido (e o seu companheiro) obtivesse por via da força droga que era detida por terceiro. O móbil dos crimes era a droga e não outro”. Ora, salvo o devido respeiro, que é muito, entende o recorrente que tais considerações por já se afastarem muito da matéria dada como provada, carecem de fundamentação, além de extravasarem os limites da livre apreciação da prova. Há um esforço por parte do tribunal “a quo” para criar uma conexão com os factos anteriormente praticados pelo arguido, ora recorrente, no sentido da criação da imagem de continuidade da actividade criminosa do mesmo. Esforço este que ultrapassa e viola os limites legalmente explanados da actividade de valoração probatória do juiz. XIX - O artigo 127.º do C.P.P. ao consagrar o princípio da livre apreciação da prova elege como ideia rectora que o julgador não se encontra sujeito às regras rígidas da prova tarifada, o que não poderá significar que a actividade de valoração da prova seja arbitrária, mas antes vinculada à busca da verdade e limitada pelas regras da experiência comum e por restrições legais.O julgador é livre, ao apreciar as provas, embora tal apreciação seja “vinculada aos princípios em que se consubstancia o direito probatório e às normas da experiência comum, da lógica, regras de natureza científica que se devem incluir no âmbito do direito probatório”. XX - Também a este propósito, salienta o Prof. Figueiredo Dias [ix] “a liberdade de apreciação da prova é uma liberdade de acordo com um dever - o dever de perseguir a verdade material - de tal sorte que a apreciação há-de ser, em concreto, recondutível a critérios objectivos e, portanto, em geral susceptível de motivação e controlo”. XXI -Tem que ser sempre motivada e fundamentada a forma como foi adquirida certa convicção, impondo-se ao julgador o dever de dar a conhecer o seu suporte racional, o que resulta do art. 374° n° 2 do Código de Processo Penal. Há a exigência de que tal processo de formação da convicção seja devidamente objectivado e motivado e que o resultado final esteja em consonância com essa objectivação suficiente e racionalmente motivada. Assim, a livre convicção não pode confundir-se com a íntima convicção do julgador. XXII - In casu, entende o recorrente que o tribunal “a quo” não fundamenta as considerações que explana não identificando as premissas nas quais se alicerça para retirar as conclusões que retira acerca do mobil do crime por parte do recorrente, violando o disposto nos artigos 127º e 374° n° 2 ambos do Código de Processo Penal. XXIII - Diz-nos o artigo 40.º do Código Penal que a aplicação das penas visa a protecção de bens jurídicos e reintegração do agente na sociedade (nº 1) e que em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa (nº 2). XXIV- Porém, como se refere no Ac. STJ de 23/11/2011, acima referenciado, “no que respeita ao crime de tráfico de estupefacientes, o legislador adoptou um esquema de tipificação penal em que leva em conta que a grande maioria dos casos que chegam aos tribunais se apresentam como pouco investigados, pelo que há uma «zona cinzenta» em que o juiz fica na dúvida sobre a real dimensão do tráfico em causa e, nesses casos, deverá, tendencialmente, aplicar uma pena cuja medida concreta é coincidente na moldura penal abstracta do crime de tráfico comum e na do crime de tráfico menor gravidade, a qual, conforme se pode verificar pelos artigos 21.º e 25.º, se situa entre os 4 e os 5 anos de prisão” (…)” – cf. acórdão desse Venerando Tribunal da Relação de 25/09/2012, in www.dgsi.pt. XXV- Assim, na esteira do douto acórdão desse Venerando Tribunal, entende o recorrente que a subsunção da matéria dada como provada no tipo privilegiado previsto no artigo 25º do DL nº 15/93, de 22 de Janeiro – tráfico de menor gravidade -, e a aplicação de uma pena que se situe nos limites máximos deste normativo (cf. artigo 50.º do C.P.), mostrar-se-ia a mais consentânea com a matéria dada como provada e ainda a mais adequada às exigências de prevenção, quer geral, quer especial do caso em concreto, sendo ainda suficiente para se atingir os fins ínsitos na norma incriminadora, contribuindo para a mais adequada ressocialização do mesmo. XXVI- Caso assim se não entenda, e se opere a subsunção da matéria dada como provada no tipo previsto no artigo 21º do DL nº 15/93, de 22 de Janeiro, a aplicação de uma pena que se situe nos limites mínimos deste normativo (cf. artigo 50.º do C.P.), mostrar-se-ia mais consentânea com a matéria dada como provada e mais adequada às exigências de prevenção, quer geral, quer especial do caso em concreto, sendo ainda suficiente para se atingir os fins ínsitos na norma incriminadora, contribuindo para a mais adequada ressocialização do recorrente, factor a ter em consideração atenta a idade do ora recorrente. XXVII – Caso se entenda ser de aplicar a agravação determinada pela aplicação ao caso so instituto a reincidência, ie, a agravação do limite mínimo da pena abstratamente aplicável em um terço, a aplicação de uma pena que se situe nos limites mínimos deste normativo, i.e, uma pena de 05 anos e 04 meses de prisão (cf. artigo 50.º do C.P.), mostrar-se-ia a mais consentânea com a matéria dada como provada e assim a mais adequada às exigências de prevenção, quer geral, quer especial do caso em concreto, sendo ainda suficiente para se atingir os fins ínsitos na norma incriminadora, contribuindo para a mais adequada ressocialização do recorrente, factor a ter em consideração atenta a idade do ora recorrente. XXVIII- Face ao exposto, a decisão recorrida, para além de outras normas e princípios violou os artigos 14.º, 40.º, 50.º, 53.º, 64.º, 71.º, 127º e 374° n° 2 todos do C.P., os artigos 21º e 25.º do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro e os artigos 18.º e 32.º da Constituição da Republica Portuguesa. Termos em que, Requer-se a V. Exas. que concedam provimento ao presente recurso e, consequentemente, revoguem a douta decisão recorrida substituindo-a por outra que altere a qualificação jurídica para o tipo previsto no artigo 25º da Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, e a aplicação de uma pena no limite máximo aí previsto; ou ainda, à cautela, por dever de patrocínio, Que V. Exas. revoguem a douta decisão recorrida, substituindo-a por outra que, mantendo a qualificação jurídica para o tipo previsto no artigo 21º do DL nº 15/93, de 22 de Janeiro, determine a não aplicabilidade do instituto da reincidência e aplique uma pena situada nos limites mínimos deste normativo. Caso ainda assim se não entenda, à cautela, por dever de patrocínio, Que V. Exas. revoguem a douta decisão recorrida, substituindo-a por outra que, mantendo a qualificação jurídica para o tipo previsto no artigo 21º do DL nº 15/93, de 22 de Janeiro, e agravadando o limite mínimo da pena abstratamente aplicável em um terço, por força da aplicabilidade do instituto da reincidência, determine a aplicação de uma pena que se situe nos limites mínimos deste normativo, i.e, uma pena de 05 anos e 04 meses de prisão. B 1º- Foi o Recorrente condenado prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo p. e p. no Art.º 21º, n.º 1 DL 15/93 de 22/01. 2º- A aplicação de uma pena de prisão de 5 anos, será de colocar em sério risco ao Recorrente, para além da sua estabilidade emocional e social, as perspectivas de reintegração social. 3º- Entende o Recorrente que, face a todo o circunstancialismo da prática do crime, a pena que lhe foi aplicada é muito severa, imerecida, excessiva injusta, desproporcional e desadequada, violando as exigências de preservação da dignidade humana, constitucionalmente consagradas. 4º- O Recorrente mostrou arrependimento, tem bom comportamento social, encontrando-se socialmente e familiarmente integrado, confessando integralmente os factos. 5º- Entende o Recorrente, que o douto Tribunal a quo não tomou tais circunstâncias atenuantes em consideração, como resulta dos autos e do douto Acórdão ora em Recurso; pelo que, devem as mesmas serem consideradas nos termos do artigo 40º n.º 1 e n.º 2 e 70º e 71º do Código Penal. 6º- Por isso, entende o Recorrente que o Tribunal a quo condenou-o numa pena, manifestamente, excessiva, desproporcional e desadequada, tendo em conta a culpa do mesmo. 7º- No caso dos autos, as exigências de prevenção especial são não prementes atendendo a que o Recorrente não tem condenações anteriores. 8º- Em face de todo este circunstancialismo, entendemos que a pena de prisão aplicada no douto Acórdão em Recurso, excede a medida da culpa subjacente ao crime. 9º- E não o tendo feito, aplicou o douto Tribunal a quo, uma pena desconforme com a factualidade, sendo desproporcional e desadequada, face às circunstâncias atenuantes resultantes dos autos. 10º- Aplicar ao Recorrente uma pena de prisão viola o chamado princípio da proporcionalidade e, portanto, o artigo 18º CRP. Sempre que se mostre desnecessária a aplicação ao Recorrente da pena privativa da liberdade. 11º- Ao decidir diferentemente, nos termos do douto Acórdão em Recurso, violou o douto Tribunal a quo o Princípio do Direito à Integridade Pessoal, o disposto nos Artºs 40º, n.ºs 1 a 3, 70º, 71º do Código Penal, o Art.º 25º da Constituição da República Portuguesa, e o Art.º 21º do DL 15/93 de 22/01. 12º- O Tribunal a quo violou assim também, os Princípios do direito internacional relacionados com a dignidade humana, a finalidade de emenda e recuperação social, designadamente, os artigos 5º e 25º n.º1 da Declaração Universal dos Direitos do Homem, o artigo 7º do Pacto Internacional Sobre os Direitos Civis e Políticos e o artigo 3º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem. 13º- O Tribunal recorrido deveria ter interpretado as normas constantes dos art.s 40º, 50º e 71º do C.P. e 18 nº 2 da C.R.P. no sentido de que as finalidades das penas, nomeadamente no que tange a um delinquente primário, são a sua reintegração na sociedade, bem como a sua reeducação e ressocialização, e não com o sentido com que as terá interpretado, de que ao arguido deve ser aplicada desde logo a mais severa das punições, restritiva da sua liberdade, que é a pena de prisão efectiva, não lhe sendo dada oportunidade de se reabilitar e de não cometer novos crimes mediante a censura do facto e a ameaça de prisão (conforme art.º 50º do C.P. que o tribunal deveria ter considerado, relativamente ao qual no entender do recorrente estão verificados todos os seus pressupostos. 14º- Assim, considerando as motivações invocadas pelo arguido, as finalidades e funções das penas nomeadamente na vertente da prevenção especial positiva, a culpa do agente, o tempo decorrido da prática do facto e as determinações que o acórdão recorrido deveria ter observado constantes nos arts. 40 nº1 e nº2, 50, 71 do C.P. e art. 18 nº2 da C.R.P., haveria que punir o arguido com 4 anos de prisão, suspensa na sua execução, o que constituiria séria censura e aviso para o Recorrente. 15º- No caso dos autos, considerando a situação familiar, e as fortes expectativas de reinserção do ora Recorrente, atendendo a que o mesmo está socialmente integrado, e que ainda não sentiu o carácter repressivo da prisão, não se mostra aplicável pena de prisão efectiva, pelo que, a pena aplicada deverá ser reduzida para o mínimo legal aplicável, determinando-se a suspensão da sua execução. 16º- A suspensão da execução da pena de prisão em casos de tráfico de estupefacientes, não é atentatória da necessidade estratégica de nacional de combate a este tipo de crime, nem faz desacreditar as expectativas comunitárias na validade da norma jurídica violada e serve claramente os imperativos de prevenção geral. 17º- Assim, tudo ponderado, entende-se que os factos provados e atinentes à personalidade, condições de vida, e comportamento do arguido após a prática do delito, assumem relevo para fundamentarem um juízo de prognose favorável à suspensão da execução da pena. 18º- Deverá atender-se favoravelmente a aplicação da suspensão da execução da pena de prisão (art. 50º do C.P.), assente na expetativa de que a simples censura e ameaça da prisão realizem de forma adequada, necessária e suficiente as finalidades da prevenção. 19º- Sendo o Recorrente primário neste tipo de crime, deverá a pena que lhe foi aplicada ser suspensa na sua execução, conforme previsto no artigo 50º nº 1 do Código Penal. 20º- A Decisão recorrida violou os arts. 40, nº1 e 2, 50º e 71º do Código Penal e art.18 nº 2 da C.R.P., pelo que, deve ser revogada nos termos expostos. Nestes termos e nos melhores de direito que Vossas Exªs doutamente suprirão, deve o presente Recurso ser julgado procedente, com todas as consequências legais. E 1-Compulsados os autos, verifica-se que as intercepções efectuadas entre os dias 24 /4/2012 a 8/5/2012 são dadas a conhecer ao M.P. em 9/5/2012 e , portanto, já depois de decorrido o prazo de 15 dias previsto no artigo 188.º, n.º 3 do C.P.P.:. 2-E o mesmo sucede com as intercepções e gravações realizadas no período compreendido entre os dias 19/6/2012 e 3/7/2012 que chegam ao conhecimento do M.P. em 4/7/2012. 3-Bem como, com as efectuadas entre 3/7/2012 e 17/7/2012 que são dadas a conhecer ao M.P. , em 18/7/2012 , 4- E , por fim, as que decorreram entre o dia 24/9/2012 até 7/10/2012 chegam ao conhecimento do M.P. em 9/10/2012, ou seja, 24 horas após o prazo limite estabelecido na lei. 5- Por outro lado, os suportes técnicos das intercepções efectuadas entre 22/5/2012 e 5/6/2012 são levados pelo M.P. ao conhecimento do Mm.º Juiz , em 8/6/2012, e , por isso, já depois de decorrido o prazo de 48 horas estabelecido na previsão do artigo 188.º, n.º 4 do C.P.P.. 6-Acresce que de acordo com o disposto no n.º 1.º do art. 187.º do C.P.P. a intercepção e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas só podem ser autorizadas por despacho fundamentado do juiz de instrução. 7-Ora, a intercepção efectuada no dia 18/11/2012 que tem como alvo o ora recorrente não foi autorizada por despacho do Mm.º Juiz. Senão veja-se: 8-O douto despacho judicial de 9/10/2012 prorroga por 30 dias a autorização de intercepção dos alvos indicados a fls.750. 9-Contudo, os despachos proferidos a 24/10/2012, na data de 6/11/2012 e em 6/11/2012 são omissos quanto a autorizações de intercepção das conversações telefónicas . 10 –É ainda de salientar que do despacho do Mm.º Juiz, proferido a 9/10/2012, já não consta a indicação de autorização do alvo 935329751, outro arguido, mas que condiciona a restante produção de prova . 11- Em face de todo o exposto, não podem ser consideradas as escutas realizadas ao ora recorrente nas datas de 20/10/2012, 21/10/2012 e 18/11/2012 , nem a busca realizada nesta última data. 12-Com efeito, a prova proibida contamina a restante prova , uma vez que existe um nexo de dependência cronológica, lógica e valorativa entre a prova proibida e a restante prova ( artigo 122.º, n.º 1 do C.P.P. e art. 187.º, 188.º , n.º 3 e n.º 4, art. 190.º, 126.º do mesmo Diploma). 13- Pelo que se impõe a absolvição do arguido (art. 187.º, 188.º , n.º 3 e n.º 4, art. 190.º, 126.º do C.P.P.). Mas ainda que assim não se entenda 14- O douto acórdão recorrido, ao aplicar ao arguido a pena de 5 anos e 6 meses de prisão enferma de erro de direito, por violação do art. 40.º, n.º 1 e n.º 2 , art. 71.º, n.º 1 e n.º 2 do C.P. pois que não valorou de modo proporcionado o grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste , a gravidade das suas consequências, o dolo, os fins ou motivos que determinaram o crime, as condições pessoais do agente e a sua situação económica , a conduta anterior ao facto e a posterior a este,especialmente quando esta seja destinada a reparar as consequências do crime,tudo factores que, a serem valorados justificariam que a pena concreta aplicada tivesse medida mais benigna e fosse suspensa na sua execução. * Respondeu o Digno Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal da Comarca de Beja, com as seguintes conclusões: ao recurso do arguido A a) no conjunto dos factos praticados pelo recorrente a ilicitude não se mostra consideravelmente diminuida; b) motivo porque tais factos não podem integrar o crime de tráfico de menor gravidade p. e p. no art. 25 (e 21) do DL 15/93; c) tendo em conta os factos dados por provados, nomeadamente a anterior condenação – por factos relacionados com a aquisição de estupefacientes – e o cumprimento de pena de prisão (em curso aquando deste crime) pelo arguido, condenação e pena que não foram suficientes para o afastar da prática de novos crimes, a condenação como reincidente é justificada; d) a medida da pena aplicada ao recorrente está devida e correctamente fundamentada no acórdão, de acordo com o art. 71 do CP, não sendo invocadas no recurso razões que justifiquem uma alteração; e) pelo que o recurso não merece provimento, devendo ser mantido o acórdão recorrido. ao recurso do arguido B a) a medida da pena aplicada ao recorrente está devida e correctamente fundamentada no acórdão, sendo a pena fixada justa e adequada; b) defendendo a aplicação de pena inferior, o recorrente não invoca circunstâncias que ponham em causa tal fundamentação e justifiquem uma medida diferente; c) a pena aplicada ao recorrente não pode ser suspensa na sua execução, nomeadamente face ás exigências de prevenção geral que se verificam no caso; d) pelo que o recurso não merece provimento, devendo ser mantido o acórdão recorrido. ao recurso do arguido E a) o telefone do recorrrente foi interceptado com autorização judicial, autorização sucessivamente prorrogada até ao dia 26/11/2012; b) assim, em 18/11/2012 – como alíás em todo o período em que a intercepção ocorreu – a escuta telefónica estava devidamente autorizada, não havendo qualquer nulidade ou prova proibida nela; c) o eventual incumprimento dos prazos de 15 dias e de 48 hs. para apresentação das escutas ao Mº Pº e ao Juiz, prazos previstos nos nºs: 3 e 4 do art. 188 do CPP, representa a violação de formalismos exigidos na execução das escutas e não dos seus pressupostos materiais; d) o incumprimento daqueles prazos consubstancia por isso uma nulidade processual sujeita ao regime dos arts. 118 e ss. do CPP e não uma prova proibida; e) assim, mesmo admitindo-se que tivesse havido violações dos prazos referidos, as eventuais nulidades estariam sanadas, face ao disposto no art. 120, nºs: 1 e 3, c) do CPP, uma vez que só (agora) em recurso o recorrente as invocou; f) a medida da pena aplicada ao recorrente está devida e correctamente fundamentada no acórdão, sendo a pena fixada justa e adequada; g) defendendo a aplicação de pena inferior, o recorrente não invoca circunstâncias que ponham em causa tal fundamentação e justifiquem uma medida diferente; h) pelo que o recurso não merece provimento, devendo ser mantido o acórdão recorrido. * A Exmª. Procuradora-geral Adjunta neste Tribunal da Relação emitiu parecer.Foi cumprido o disposto no artigo 417º n.º 2 do Código de Processo Penal. *** B - Fundamentação:B.1.1 - O Tribunal recorrido deu como provados os seguintes factos: 1) O arguido A encontra-se no Estabelecimento Prisional do Funchal desde o dia 25 de novembro de 2009, em cumprimento da pena de prisão de 18 anos à ordem do Proc. Comum Coletivo nº 862/09.6TBFAR, do 1º juízo de competência especializada criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Faro; 2) Em data não apurada, mas ocorrida não antes do mês de abril de 2012, o arguido A decidiu dedicar-se a introduzir produto estupefaciente – sobretudo, cocaína e haxixe - na Região Autónoma da Madeira, adquirindo o produto estupefaciente a indivíduos de identidade não apurada; 3) Com vista à concretização dos seus intentos, e por forma a estabelecer contactos com o exterior, o arguido A durante vários dias insistiu com o arguido C, guarda prisional que se encontrava em exercício de funções no Estabelecimento Prisional do Funchal, para que lhe providenciasse dois telemóveis, e, em contrapartida, entregava-lhe a quantia de € 80,00 por cada telemóvel; 4) O arguido C acedeu, e entregou ao arguido A, no Estabelecimento Prisional do Funchal, dois telemóveis, um dos quais, da rede Optimus, e o outro, da rede TMN, que adquiriu para esse propósito, e recebeu, do arguido, a quantia de € 80,00, sabendo que se destinavam a estabelecer contactos com o exterior; 5) O arguido A utilizou os telemóveis para contactar com pessoas no exterior do estabelecimento onde era recluso e para a atividade de tráfico de estupefacientes adiante descrita; 6) Assim, e na posse dos referidos telemóveis, o arguido A estabeleceu vários contactos para o exterior do Estabelecimento Prisional do Funchal, entre os meses de abril e novembro de 2012, para várias pessoas, e sobretudo, com a arguida D, através do telemóvel que utilizava, marca Huawei, de cor preta, com o IMEI (…), com o cartão SIM da operadora TMN com o nº (…), e com o arguido E para combinarem o envio do produto estupefaciente para a Madeira. 7) O arguido A estabeleceu ainda vários contactos com B, seu pai, para combinarem o transporte de cocaína que estava na posse de E para São Brás de Alportel; 8) No seu plano de atuação criminosa, o arguido A contava com o auxílio da sua então namorada, a arguida D, que residia em Câmara de Lobos, e que tinha como função a receção e distribuição do produto estupefaciente; 9) Os arguidos A e D contavam, ainda, com a colaboração da mãe desta, a arguida F e do seu companheiro, o arguido E, residentes na Venda do Pinheiro, que tinham como função guardar o produto estupefaciente, na sua residência, com vista à sua entrega, em momento oportuno, e, de acordo com as ordens do arguido A; 10) Uma dessas entregas ocorreu no dia 6 de agosto de 2012, quando a arguida F remeteu, via postal, e através dos serviços dos CTT da Malveira, uma encomenda postal dirigida à morada da filha, a arguida D, no Bairro (…) Madeira, 9300 (utilizando outros nomes), que continha no seu interior um pano de cor branca que envolvia uma par de ténis de criança, de cor vermelha, sendo que, por debaixo da palmilha do pé direito encontrava-se acondicionada uma embalagem de plástico que continha 12,143 gramas (peso líquido) de cocaína, e, por debaixo da palmilha do pé esquerdo, encontravam-se acondicionadas quatro porções de haxixe, com o peso líquido total de 5,743 gramas, que foram apreendidos pelos Inspetores da Polícia Judiciaria na estação dos CTT de Câmara de Lobos, no dia 10 de agosto de 2012, em cumprimento de mandado judicial de busca e apreensão de correspondência; 11) Entre os meses de agosto e novembro de 2012, o arguido A, através de um dos telemóveis indicados em 3º, contactou por várias vezes com os arguidos E e B, para combinarem a entrega de uma porção de cocaína (pertencente ao arguido A) que o arguido E tinha guardada a pedido do arguido A; 12) Num desses contactos telefónicos, o arguido A combinou com o arguido E que o arguido B, seu pai, se deslocaria à Venda do Pinheiro a fim de receber a referida porção de cocaína, que se destinava a ser vendida na zona de São Brás de Alportel, e que lhe pagaria, posteriormente, a quantia de € 1 000,00, o que o arguido E aceitou; 13) Em cumprimento do combinado, e após diversos contactos telefónicos estabelecidos com os arguidos A e E, no dia 18 de novembro de 2012, pela manhã, o arguido B, conduzindo o veículo ligeiro de passageiros de sua propriedade, marca Renault, modelo 19, cor vermelha, com a matrícula (…), dirigiu-se à Venda do Pinheiro, acompanhado de uma amiga, G e do neto desta, dividindo os custos da viagem; 14) Já durante a tarde, e conforme combinado nos contactos telefónicos estabelecidos, o arguido B dirigiu-se, sozinho, e conduzindo o mesmo veículo, à zona da Venda do Pinheiro, onde, num cruzamento da estrada com direção a Bucelas, se encontrou com o arguido E, que lhe entregou a cocaína, com o peso líquido de 206,300 gramas, guardada dentro de um saco de plástico dos supermercados “Plus”, dentro de uma embalagem própria para congelação com os dizeres “Bosque Verde”, envolvida em papel aderente e acondicionada dentro de um preservativo; 15) A cocaína assim acondicionada estava escondida no compartimento dos fusíveis, localizado abaixo do porta-luvas, em frente ao banco do pendura; 16) O arguido B veio a ser intercetado no mesmo dia, pelas 22:20 horas, pelos inspetores da Polícia Judiciária, na Estrada Nacional 270, que liga Loulé a São Brás de Alportel, perto da zona de Vilarinho, tendo sido apreendido o produto estupefaciente referido, bem como o telemóvel marca Nokia, de cor preta, modelo 1680-c-2, com o IMEI (…), com o cartão da TMN com o nº (…), que o arguido utilizava nos contactos com o arguido A; 17) O arguido C, guarda prisional, agiu de forma livre, deliberada e consciente, bem sabendo que, ao entregar os telemóveis ao arguido A, recluso que se encontrava no Estabelecimento Prisional do Funchal, onde exercia funções, acedendo ao pedido deste, permitia-lhe estabelecer contactos para o exterior; 18) Nas circunstâncias descritas, o arguido A agiu de forma livre, deliberada e consciente, e com a intenção de introduzir produto cocaína e haxixe na Região Autónoma da Madeira, o que logrou conseguir; 19) O mesmo arguido A agiu também de forma livre, deliberada e consciente com conhecimento da qualidade, quantidade e características da cocaína apreendida no dia 18 de novembro de 2012, visando a sua distribuição e venda na zona de São Brás de Alportel, e daí auferir rendimentos, bem sabendo que a sua aquisição, detenção, consumo e cedência eram proibidos; 20) Nas circunstâncias descritas em 6º, 8º a 10º, as arguidas D e F agiram de forma livre, deliberada e consciente, com conhecimento da qualidade, quantidade e características dos produtos estupefacientes apreendidos, bem sabendo ambas que se tratava de haxixe e cocaína, e visando a sua introdução na Região Autónoma da Madeira, dissimulados numa encomenda postal, como fizeram, e a sua distribuição e venda a terceiros, pretendendo daí obter rendimentos, bem sabendo que a sua aquisição, detenção, consumo e cedência eram proibidos; 21) O arguido E agiu de forma livre, deliberada e consciente, com conhecimento da qualidade, quantidade e características do produto estupefaciente apreendido, que sabia ser cocaína, e que havia mantido guardado a pedido do arguido A, por vários meses, aguardando instruções sobre a sua entrega, como fez, e entregando-o arguido B, conforme lhe foi indicado, e com vista a obter rendimentos com a sua posterior distribuição e venda a terceiros, bem sabendo que a sua aquisição, detenção, consumo e cedência eram proibidos; 22) O arguido B agiu de forma livre, deliberada e consciente, com conhecimento da qualidade, quantidade e características do produto estupefaciente apreendido, que sabia ser cocaína, que lhe foi entregue pelo arguido E na zona Venda do Pinheiro, a pedido do arguido A, visando o seu transporte e a sua distribuição e venda a terceiros na zona de São Brás de Alportel, bem sabendo que a sua aquisição, detenção, consumo e cedência eram proibidos; 23) Os arguidos agiram, sempre, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei; 24) A nasceu no continente português, inserido numa família descrita como detentora de uma condição socioeconómica equilibrada; 25) O seu processo de crescimento ocorreu junto dos progenitores até aos 14 anos de idade, altura em que aconteceu a separação dos mesmos. Nesta sequência, o A emigrou com a mãe e os irmãos para Inglaterra. Manteve continuidade nos contactos com o pai, ainda que num registo irregular; 26) A concluiu o equivalente ao12º ano de escolaridade; 27) Aos 17 anos de idade teve a sua primeira experiência remunerada, como empregado de mesa, situação que durou cerca de um ano; 28) Dos 18 aos 20 anos de idade esteve em Portugal, onde estabeleceu uma relação afetiva da qual resultou o nascimento de um filho, que já atingiu a maioridade; 29) No referido período, A dedicou-se à venda de time-sharing. Em Inglaterra desenvolveu outros trabalhos variados, em moldes contínuos. 30) A experienciou consumos de haxixe no final da adolescência, em contexto lúdico e épocas festivas. Após, efetuou escalada para consumos de heroína, sob a forma fumada, apresentando um processo de adição significativa; 31) A aderiu a um programa de desabituação, sentindo que conseguiu ultrapassar a dependência das drogas; 32) Antes da sua reclusão, A mantinha alguma mobilidade geográfica entre Inglaterra e Portugal; 33) Durante a sua atual reclusão, por altura dos períodos de visita conheceu a atual namorada, coarguida no processo (D) e a mãe desta, também coarguida (F); 34) A mantém contactos regulares com D, beneficiando de visitas íntimas com esta; 35) Com o pai, comerciante, mantinha contactos telefónicos e contava com algum apoio económico deste. 36) Em enquadramento prisional A revela-se um recluso com um comportamento instável, registando várias sanções disciplinares por “posse ou tráfico de dinheiro ou outros objetos não consentidos” e “intimidação aos companheiros de reclusão”; 37) Foi integrado laboralmente como faxina, envolvendo-se também em atividades como o desporto e artes plásticas; 38) No contacto interpessoal, A apresenta-se como um indivíduo com capacidades de comunicação e efetua uma auto caracterização de apetência por novas experiências e passagem de limites, evidenciando apetência pelo risco; 39) A assume envolvimento no processo e contextualiza-o num cenário de ambição económica e de ausência de preocupação relativamente às consequências que poderiam advir dado encontrar-se em cumprimento de pena de prisão; 40) Por sentença de 3 de novembro de 2006, transitada em julgado no dia 10 de maio de 2010, proferida no âmbito dos autos de processo comum singular 113/03.7GDFARdo 1º juízo de competência especializada criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, foi o arguido condenado na pena de 75 dias de multa pela prática, em 25 de março de 2003, de um crime de condução sem habilitação legal; 41) Esta pena está extinta pelo cumprimento; 42) Por acórdão de 21 de outubro de 2009, transitado em julgado no dia 2 de agosto de 2010, proferido no âmbito dos autos de processo comum coletivo 862/09.6TBFAR do 1º juízo de competência especializada criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, foi o arguido condenado pela prática, no dia 2 de outubro de 2007, de um crime de sequestro (na pena de 1 ano de prisão), um crime de homicídio qualificado (na pena de 16 anos de prisão) e um crime de roubo agravado (na pena de 5 anos de prisão), por ter praticado os factos que a seguir se descrevem: 43) No dia 02 de Outubro de 2007, pelas 21.45 hrs., H e o arguido A deslocaram-se no veículo com a matrícula (…), marca e modelo Volkswagen Polo G40, para a EM 520-1, no Sítio do Pé do Cerro, em Santa Bárbara de Nexe, Faro, com o objetivo de matarem o I, indivíduo que se dedicava à venda de produtos estupefacientes, e, ainda, de se apropriarem do dinheiro e dos produtos estupefacientes que I tivesse na sua posse. 44) Para o efeito, o H muniu-se de uma arma caçadeira, e o arguido A muniu-se de uma pistola. 45) Aí chegados, e após estacionarem o veículo na berma da estrada no sentido Loulé - Santa Bárbara de Nexe, o arguido A saiu do veículo e apontou uma pistola à cara do J, que se encontrava no local para adquirir heroína, saindo de seguida do automóvel o H, levando uma caçadeira, que também se aproximou do J, e ambos obrigaram o J a deixar que o arguido A o revistasse, o qual lhe tirou dos bolsos cerca de 16 euros em dinheiro, valor que o H e o arguido A fizeram seus, e ainda uma carteira com documentos, as chaves do carro do J e dois telemóveis, objetos estes que abandonaram no local, deixando-os no chão. 46) Depois, o arguido A disse ao H “quando eles chegarem apontas à cabeça e disparas logo”, referindo-se ao I e acompanhante, perguntando ainda ao J quando chegam os pretos, e se o (…) está quase a chegar. 47) De seguida, o H e o arguido A ordenaram ao J que saísse da estrada e fosse para uma ribanceira sita na lateral esquerda da estrada, o que este fez, colocando-se o H ao volante da sua viatura, enquanto o arguido A se sentou no banco da frente do lado direito da viatura, com a porta aberta, e com a arma apontada ao J, enquanto aguardavam a chegada do veículo com a matrícula (…), que se aproximava do local, e que ainda demorou alguns minutos a chegar ao local. 48) O veículo de matrícula (…), ocupado por I, que o conduzia, e por pelo menos outro indivíduo, seguia na direção Loulé - Santa Bárbara de Nexe, mas, ao chegar àquele local, inverteu o sentido de marcha a cerca de 30 a 50 metros do local onde estava o veículo do H, ficando no sentido inverso (Santa Bárbara de Nexe – Loulé), após o que o I imobilizou o veículo. 49) Logo que o I imobilizou o seu veículo, o H e o arguido A dirigiram-se a esse veículo. 50) O H, que tinha na sua posse a arma caçadeira, e o arguido A, que empunhava a pistola, aproximaram-se pelo lado esquerdo do veículo (atento o sentido de marcha deste), onde o I se encontrava sentado no lugar do condutor, posicionando-se o arguido perto da porta do veículo, ao pé do condutor, e o H junto do carro, em posição não concretamente apurada mas próxima e atrás do condutor. 51) Após o arguido A dizer para um dos indivíduos que se encontravam no veículo «então (…), tudo bem, passa a cena», pelo menos o H, por detrás e de cima para baixo, disparou dois tiros com a arma caçadeira na direção do I, tendo-o atingido com um dos tiros no semi-torax esquerdo, tendo então o I conseguido pôr em marcha o seu automóvel, que se foi imobilizar na berma da estrada, uns metros à frente. 52) De seguida, o H e o arguido A regressaram ao veículo com a matrícula (…), Volkswagen Polo G40, e abandonaram o local em direção a Santa Bárbara de Nexe. 53) O tiro referido em i. atingiu o pulmão esquerdo, a cápsula hepática, o baço e a região abdominal do I, o que foi causa da sua morte. 54) O H e o arguido A agiram de comum acordo, e em comunhão de esforços e de intentos, com a intenção de obterem para si o dinheiro que J tinha na sua posse, e que sabiam não lhes pertencer, usando as armas como forma de forçá-lo a entregar-lhes o dinheiro e os objetos que tinha na sua posse, contra a sua vontade, bem sabendo que tal forma era adequada a concretizar os seus intentos, o que conseguiram. 55) Ao disparar na direção do I, o H agiu mediante acordo prévio e em comum acordo com o arguido A, e com o intuito de provocar a morte de I, o que ambos queriam e conseguiram. 56) O arguido e H sabiam que, ao agir como descrito em e., privavam de liberdade o J, o que quiseram fazer. 57) O H e o arguido A agiram mediante acordo prévio, em comunhão de esforços e de intentos, e de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo de que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei, tendo capacidade para se determinarem de acordo com tal conhecimento. 58) Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena de 18 anos de prisão; 59) O arguido foi detido no âmbito do processo de extradição no dia 7 de setembro de 2008 e manteve-se nessa situação até ao dia 26 de maio de 2009, data em que foi entregue às autoridades portuguesas. No dia 27 de setembro de 2009 foi sujeito a prisão preventiva no âmbito do presente processo, mantendo-se nessa situação até ao trânsito em julgado da decisão que o condenou, passando, após, a cumprir pena à ordem do mesmo processo. 60) À data dos factos, B vivia sozinho. Tem três filhos de um casamento cuja separação ocorreu há cerca de 20 anos, mantendo ainda contacto com a antiga mulher; 61) O contacto com os filhos (incluindo com o A) foi irregular após a separação; 62) Emigrou ainda jovem para a Venezuela, onde permaneceu mais de 10 anos, tendo trabalhado sobretudo como mecânico. Regressado a Portugal trabalhou com regularidade até 1998, tendo cessado o contrato com direito a indemnização e permanecido posteriormente 3 anos no fundo de desemprego. Trabalhava há aproximadamente dois anos numa geladaria explorada por um sobrinho, auferindo um salário de € 600,00; 63) Habitava em casa cedida a título gratuito, sendo a sua situação económica adequada à satisfação mínima das suas necessidades básicas; 64) Sofreu enfarte há cerca de 3 anos, encontrando-se desde então em acompanhamento médico e tomando medicação adequada; 65) Apesar de bastante sociável, apresenta-se como um individuo com poucas ligações significativas, mantendo antes de preso apenas uma relação próxima com o sobrinho que lhe dava emprego e apoio, atitude que ainda mantém, visitando-o na prisão e mostrando-se disponível para o ajudar; 66) Evidenciou atitudes negativas face ao crime em geral e ao crime dos autos em particular, reconhecendo os interesses em causa e parecendo compreender e aceitar a intervenção do sistema de justiça penal; 67) Tem mantido no Estabelecimento Prisional um comportamento adequado às normas institucionais; 68) Ao arguido não são conhecidos antecedentes criminais; 69) D cresceu num bairro social desfavorecido e segregado, caracterizado por circunstâncias sociais de pobreza, pela intervenção alargada dos sistemas de proteção social, pelas problemáticas de alcoolismo e de drogas, pelos grupos sociais desviantes e pela criminalidade; 70) As condições de vulnerabilidade caracterizavam também o contexto familiar da D, tendo crescido numa família numerosa, com um estrato socioeconómico e cultural desfavorecido e com um enquadramento socioeducativo pouco sensível à monitorização de rotinas, à supervisão de sociabilidades e à imposição de limites; 71) Nestas circunstâncias, os seus cinco irmãos já tiveram contatos com o sistema de justiça, sendo que três deles cumprem pena de prisão presentemente, em virtude de uma delinquência de precariedade muito associada aos problemas de toxicodependência que consolidaram; 72) D tem o 4º ano de escolaridade, apresentando um percurso muito irregular, contando com várias retenções que a própria justifica com a auto perceção de que “não era esperta, não era boa para a escola” (sic). Era já adolescente quando abandonou o sistema de ensino; 73) Começou a trabalhar nesta altura na área da limpeza, onde permaneceu quase dois anos, mas de modo informal. Posteriormente, ainda trabalhou num hipermercado, pelo período de um mês, após o que saiu por problemas de relacionamento com os pares. D encontra-se sem atividade laboral há vários anos; 74) D estabeleceu um relacionamento afetivo com um companheiro com uma problemática de toxicodependência, que entretanto já faleceu. Desta relação nasceu uma filha, que tem presentemente quatro anos de idade. 75) D reside com o seu pai, pescador; com um irmão, que está desempregado e integrado num projeto terapêutico para a toxicodependência; com um irmão, de 17 anos, que tem processo tutelar educativo pendente, e com a filha, que tem problemas de saúde desde o nascimento e já foi submetida a intervenção cirúrgica no Continente Português, continuando a necessitar de acompanhamento médico; 76) A mãe de D, coarguida D, divide desde há alguns anos a sua vivência entre o Continente Português - onde estabeleceu uma nova relação com um companheiro - e a Madeira, sendo que quando se encontra nesta Região, volta a integrar o agregado constituído; 77) Os três irmãos que cumprem pena de prisão integram este sistema familiar quando em situação de liberdade; 78) D faz uma avaliação idealizada da sua família, considerando-a funcional, negligenciando, deste modo, os indicadores disruptivos relacionados com as problemáticas sociais e criminais de vários elementos do seu sistema familiar; 79) D não desenvolve atividade profissional há vários anos, afirmando-se como o elemento responsável pela organização e gestão de todo o espaço familiar, bem como pela prestação de cuidados à filha, assumindo, deste modo, a figura de doméstica; 80) D tem como rendimentos próprios o abono e a pensão de sobrevivência da sua filha, que se situam num montante de cerca de € 175,00, apresentando uma situação económica que não lhe permite a sua autonomização. Ainda assim, no passado, já chegou a deslocar-se ao Continente Português, para passar férias junto da sua mãe, invocando ter beneficiado do apoio desta e do seu progenitor; 81) Os rendimentos da D são canalizados para as suas despesas mais pessoais e os do progenitor, resultantes da atividade de pescador, asseguram os vários encargos domésticos. Ainda assim, a família veio a exteriorizar maiores dificuldades económicas só no corrente ano, uma vez que os seus membros só recentemente solicitaram apoios sociais, tendo beneficiado de um subsídio de cooperação, no valor de € 200,00, pelo período aproximado de quatro meses; 82) D efetua algumas deslocações ao Estabelecimento Prisional do Funchal, onde mantém familiares recluídos e conheceu o coarguido A, com quem veio a estabelecer uma relação afetiva que se mantém até o momento presente, beneficiando o casal do regime de visita íntima. Apesar do namorado estar sujeito ao cumprimento de uma pena de prisão longa, os planos de futuro da arguida passam por manter este relacionamento. 83) À arguida não são conhecidos antecedentes criminais; 84) C é o mais velho de uma fratria de três elementos, tendo o seu desenvolvimento e processo de socialização decorrido num contexto socioeconómico e cultural desfavorecido, ainda que com valorização e interiorização de valores pró-sociais. O pai, funcionário de armazém e a mãe doméstica, tentaram proporcionar as condições mínimas necessárias ao desenvolvimento dos descendentes, numa dinâmica familiar descrita como funcional e afetivamente coesa; 85) A sua inserção no sistema de ensino decorreu favoravelmente, tendo abandonado a escola no final do 9º ano para iniciar uma atividade laboral como forma de apoiar os progenitores e adquirir alguns bens para consumo próprio. Veio mais tarde, já na idade adulta, a reintegrar o sistema de ensino onde concluiu o 11º ano; 86) No período da adolescência desenvolveu uma experiência de trabalho como funcionário de um estabelecimento comercial grossista, onde permaneceu até à sua entrada para cumprimento do serviço militar obrigatório. Celebrou contrato com o exército, tendo mantido este vínculo durante 7 anos, tendo numa fase posterior integrado a carreira de Guarda Prisional; 87) C contraiu matrimónio em 1996, tendo-se divorciado em 2012, não chegando a ter filhos; 88) C partilha o imóvel com a ex-cônjuge, embora assumam estilos de vida independentes; 89) Residem num imóvel de tipologia T3, que pretendiam adquirir em conjunto, através de empréstimo bancário. Contudo, na sequência de problemas de construção não foi celebrada escritura, encontrando-se o proprietário do prédio em parte incerta, pelo que não se encontram a pagar qualquer prestação pela habitação. Beneficia neste contexto de condições de habitabilidade e conforto, denotando-se algum investimento sem que seja ostensivo; 90) As despesas com a manutenção da casa são partilhadas por C e pela ex-cônjuge, as restantes, como supermercado, são realizadas individualmente e as refeições separadas; 91) No plano económico C possui uma condição estável, conseguindo satisfazer as suas necessidades de manutenção de forma satisfatória; 92) O arguido exerce a função de Guarda Prisional no Estabelecimento Prisional do Funchal há vários anos; 93) Mantém uma relação de proximidade com os familiares de origem, nomeadamente com os progenitores e os dois irmãos, evidenciando sentimentos de coesão e pertença; 94) Os tempos livres são ocupados em atividades relacionadas com a prática desportiva, atividades ao ar livre, nomeadamente caminhadas, e convívios com amigos convencionais; 95) No plano pessoal demonstra ser um indivíduo que tende a evitar o conflito revelando desejo de agradar aos outros. Tais características, no atual contexto de trabalho poderão dificultar o exercício da autoridade e a imposição de limites; 96) Na sequência do presente processo, C sofreu uma suspensão de 90 dias, tendo já regressado ao trabalho, aguardando o desfecho do processo de inquérito; 97) Ao arguido não são conhecidos antecedentes criminais; 98) F é natural da Ilha da Madeira e oriunda de um agregado familiar numeroso e de escassos recursos económicos; 99) Nasceu e cresceu no seio de uma família nuclear formada pelos pais e dezassete filhos, sendo a arguida a mais velha dos irmãos. O pai era pescador e a mãe trabalhadora rural; 100) Após a conclusão da 4ª classe, começou a ajudar a mãe nas diversas tarefas domésticas, deixando de existir condições materiais e económicas para prosseguir os estudos; 101) Com catorze anos começou a trabalhar como empregada doméstica em casas particulares, com carácter relativamente regular; 102) Posteriormente, passou a trabalhar num restaurante, primeiro como empregada de limpeza e depois como cozinheira; 103) Após o encerramento do restaurante, onde trabalhou cerca de doze anos, manteve atividade de cozinheira em outros estabelecimentos idênticos, desta vez com maior irregularidade; 104) Casou em 1983, de cujo relacionamento nasceram seis filhos. Atualmente os filhos têm todos vida autónoma em relação ao agregado familiar de origem, com exceção do filho mais novo, com dezassete anos, encontrando-se este a viver com a mãe e padrasto, E; 105) O marido era pescador e usufruía de uma situação económica relativamente estável, pelo que, ao longo do tempo, não se registaram dificuldades especiais no suporte das despesas correntes; 106) No âmbito familiar, referiu que um dos filhos (que atualmente tem 24 anos) é toxicodependente (estando inserido num programa de recuperação à base de metadona). Dois outros dois filhos cumpriram pena de prisão efetiva; 107) Há cerca de cinco anos foi para Lisboa, alegadamente, na sequência de uma situação de infidelidade conjugal protagonizada pelo marido. 108) Na altura, não teria qualquer apoio ou referência familiar no Continente. Entretanto passou a coabitar com E, pessoa que já conhecia da Ilha da Madeira; 109) Retomou a atividade de limpezas num restaurante da zona da Ericeira, seguindo-se a atividade de cozinheira; 110) Desde que chegou ao Continente não referiu a existência de períodos de desemprego, mantendo-se sempre a trabalhar nas áreas mencionadas; 111) F reside desde há cerca de três semanas na rua (…); 112) F trabalha num restaurante desde há cerca de quatro meses, auferindo € 600,00 mensais; 113) Há data dos factos, F e companheiro residiam na rua (…) Mafra; 114) Mantinha-se em situação pessoal, social e laboral idêntica a atual; 115) A situação jurídico-penal parece não ter tido impacto significativo no modo de vida geral de F; 116) À arguida não são conhecidos antecedentes criminais; 117) E é oriundo de um agregado familiar numeroso e de escassos recursos económicos; 118) Nasceu e cresceu no seio de uma família nuclear formada pelos pais e sete filhos, seis raparigas e um rapaz; 119) Os pais, entretanto falecidos, dedicavam-se à agricultura de subsistência e comercializavam o excedente localmente; 120) Após a conclusão da 4ª classe, E começou a ajudar os pais na atividade agrícola, alegando a inexistência de condições materiais e económicas para prosseguir os estudos académicos; 121) Com catorze anos passou a trabalhar na construção civil, com carácter regular, atividade que manteve ininterruptamente até 1996. Esta atividade era desenvolvida por conta de diversos subempreiteiros, sem qualquer vínculo contratual ou descontos legais; 122) Inicialmente trabalhou na Ilha da Madeira, de onde é natural e em 1978 passou a trabalhar em Lisboa, onde viveu cerca de trinta anos; 123) Em 1996 sofreu um grave acidente de trabalho e ficou dois anos de baixa médica. Gradualmente, foi retomando a atividade de construção civil, desta vez desenvolvendo trabalhos menos exigentes do ponto de vista físico. Deste modo, e com exceção do período de doença por acidente, E sempre conseguiu trabalho e rendimentos regulares, permitindo-lhe fazer face às suas despesas correntes sem constrangimentos especiais; 124) Em 2008 sofreu um enfarte do miocárdio e ficou mais um ano inativo em termos laborais. Voltou gradualmente ao trabalho, embora, e em virtude da crescente diminuição da oferta a partir de então, não conseguiu trabalhar regularmente, vendo assim diminuir significativamente os seus rendimentos; 125) Em 2009, face à dificuldade em suportar as despesas correntes, recorreu aos serviços da Segurança Social, requerendo o Rendimento Social de Inserção, passando a receber um subsídio de cerca de € 500,00 mensais. No âmbito da atribuição desse subsídio, foi-lhe dada a possibilidade de trabalhar ao serviço da Stª. Casa da Misericórdia da Venda do Pinheiro; 126) Entre 2011 e 24 de abril 2013 trabalhou como motorista para aquela entidade, auferindo cerca de € 500,00 mensais, altura em que findou o contrato de trabalho; 127) E tem um filho do primeiro relacionamento, com trinta e oito anos, carpinteiro; 128) E está divorciado há cerca de cinco anos e vive desde então em união de facto com F, vendo ainda com o filho desta, com dezassete anos; 129) E reside desde há cerca de três semanas na rua (…). Trata-se de uma casa arrendada para onde o agregado familiar se mudou por motivos económicos, sendo que o valor da renda mais baixo do que aquele que pagavam na anterior morada; 130) Reside com a companheira, coarguida no presente processo judicial, e enteado, com dezassete anos, o qual terá sofrido um grave acidente doméstico, daí resultando lesões irreversíveis que afetam a sua atividade normal; 131) E encontra-se atualmente desempregado e recebe € 360,00 de subsídio de desemprego; 132) Paralelamente, executa alguns trabalhos ocasionais na construção civil, a fim de equilibrar a sua situação económica; 133) A companheira trabalha há quatro meses como cozinheira num restaurante na Ericeira, auferindo € 600,00 mensais; 134) Há data dos factos, E trabalhava na Stª. Casa da Misericórdia de Venda do Pinheiro, com a categoria de trabalhador auxiliar, auferindo € 437,83 mensais; 135) O comportamento social de E parece expressar-se segundo padrões adequados às normas e convenções; 136) Por sentença de 24 de novembro de 2008, transitada em julgado no dia 19 de janeiro de 2009, proferida no âmbito do processo especial sumário 441/08.5PAPTS do Tribunal Judicial da Comarca da Ponta do Sol, foi o arguido condenado pela prática, em 22 de novembro de 2008, de um crime de condução em estado de embriaguez, na pena de 70 dias de multa; 137) A pena referida foi convertida em prisão subsidiária, que foi suspensa na sua execução pelo período de um ano; 138) Por sentença de 16 de maio de 2011, transitada em julgado no mesmo dia, proferida no âmbito do processo especial sumaríssimo nº 17/10.7GCMFR do Juízo de Média e Pequena Instância Criminal da Comarca de Grande Lisboa Noroeste, foi o arguido condenado pela prática, em 6 de janeiro de 2010, de um crime de dano, na pena de 100 dias de multa. *** B.1.2 - Não se provou que:Não se provaram os demais factos constantes da acusação, sendo certo que aqui não se consideram as alegações de direito, conclusivas, meramente probatórias ou absolutamente irrelevantes para a decisão (que deverão ser ponderadas em sede própria deste acórdão). Reputam-se alegações de direito, conclusivas, meramente probatórias, impugnativas de outros factos ou absolutamente irrelevantes para a decisão, entre outras, as que a seguir se indicam: A parte não considerada do artigo 6º da acusação, já que contém afirmações genéricas cujos factos concretos vêm descritos nos factos seguintes; Na encomenda remetida via CTT no dia 6 de agosto de 2012 (a que aludem os factos provados, F utilizou “nomes pouco legíveis”, já que se trata de afirmação conclusiva; Concretamente, não se provaram os seguintes factos: Da acusação a) O arguido A encontra-se no Estabelecimento Prisional do Funchal desde o dia 25 de novembro de 2009, em cumprimento da pena de prisão de 18 anos à ordem do Proc. Comum Coletivo nº 869/09.6TBFAR, do 1º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Faro, mas sim à ordem do processo referido em 1 dos factos provados; b) O arguido A tomou ainda a decisão de angariar como distribuidores de estupefacientes na Região Autónoma da Madeira ex-reclusos; c) O arguido C entregou ao arguido A os telemóveis referidos na matéria de facto julgada provada sabendo que se destinavam a estabelecer contactos com o exterior no âmbito das atividades de tráfico de estupefacientes; d) O arguido C recebeu do arguido A a quantia em numerário de € 160,00; e) Os arguidos E e F tinham como função guardar o produto estupefaciente na sua residência, tendo-se demonstrado apenas o que consta da matéria de facto julgada provada; f) O arguido A contactou telefonicamente com o seu pai para combinarem o envio do produto estupefaciente para a Madeira; g) Os arguidos E e F procederam, pelo menos por duas vezes, ao envio postal, através dos CTT, de encomendas postais que continham objetos que tinham acondicionadas e escondidas quantidades pequenas de produtos estupefacientes, dirigidas à arguida D, que se encontrava no Funchal, e que se destinavam a ser divididas em doses individuais e a serem distribuídas aos distribuidores, que, por sua vez, vendiam aos consumidores, tendo-se demonstrado apenas o que consta da matéria de facto julgada provada; h) O peso líquido da cocaína remetida na encomenda postal dos CTT referida na matéria de facto julgada provada era de 12,022 gramas; i) O peso líquido da canábis (resina) remetida na encomenda postal dos CTT referida na matéria de facto julgada provada era de 5,506 gramas; j) Os contactos telefónicos estabelecidos pelo arguido A entre os meses de agosto e novembro de 2012, com os arguidos B e E foram feitos com os dois telemóveis referidos no ponto 3 dos factos provados, tendo-se demonstrado apenas o que consta da matéria de facto julgada provada; k) A arguida D tivesse sido contactada ou tivesse contactado alguém telefonicamente (ou não) em ordem a combinar a entrega da porção de cocaína que veio a ser apreendida ao arguido B no dia 18 de novembro de 2012; l) No dia 18 de novembro de 2012, durante a manhã, B dirigiu-se a Lisboa mas sim à Venda do Pinheiro; m) A cocaína que foi apreendida no dia 18 de novembro de 2012 estivesse guardada na residência de E sita na rua (…), tendo-se apenas demonstrado o que está descrito nos factos provados; n) Foi o arguido B quem escondeu a cocaína apreendida no seu automóvel no compartimento dos fusíveis, localizado abaixo do porta-luvas, em frente ao banco do pendura, tendo-se demonstrado apenas o que consta da matéria de facto julgada provada; o) A cocaína apreendida ao arguido B no dia 18 de novembro de 2012 tinha o peso líquido de 206,097 gramas, mas sim o que consta da matéria de facto julgada provada; p) O arguido C sabia que ao entregar os telemóveis ao arguido A lhe prestava auxílio material a atividades ilícitas, incluindo, de tráfico de estupefacientes, a que sabia que o arguido A se dedicava, como, efetivamente, aconteceu; q) O arguido B atuou visando auferir rendimentos da venda da cocaína que deteve e transportou a terceiros. *** B.1.3 - E apresentou as seguintes razões para fundamentar a matéria de facto:«O decidido em matéria de facto funda-se em todos os meios de prova produzidos na audiência de discussão e julgamento e bem assim nos documentos e autos valorados (cada um de per si e no confronto com os demais meios de prova) de forma crítica e de acordo com as regras da experiência comum. As declarações dos arguidos e os depoimentos das testemunhas apenas foram positivamente valorados na medida em que os respetivos declarantes demonstraram ter conhecimento direto e pessoal sobre os factos e as declarações e depoimentos se revelaram claros, precisos e isentos de contradições. Todos os sujeitos processuais tiveram ampla oportunidade de discutir todos os documentos de que o Tribunal se serviu para fundar a sua convicção. Relativamente à prova pericial, teve-se em consideração o princípio que emana do artigo 163º, nº 1 daquele Código, segundo o qual “o juízo técnico, científico ou artístico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre apreciação do julgador.” Sem embargo, não deixou o Tribunal de fazer um exame crítico de tal meio de prova. O Tribunal não ponderou quaisquer autos cujo acesso em julgamento lhe está vedado por lei. Quanto aos factos descritos sob o nº 1 da matéria de facto julgada provada e I dos factos não provados, o decidido funda-se essencialmente no teor do certificado do registo criminal do arguido (que constitui folhas 593 e seguintes). De tal certificado resulta que o arguido foi condenado na pena de 18 anos de prisão pela prática, em 2 de outubro de 2007, de um crime de homicídio qualificado, um crime de sequestro e um crime de roubo no âmbito do processo identificado nos factos provados. Por seu turno, da informação constante de folhas 90 do processo apenso (90/11.0JAFUN) resulta que o arguido deu entrada no Estabelecimento Prisional do Funchal na data referida nos factos provados, obviamente em cumprimento da falada pena de prisão, já que a decisão que impôs a citada pena de 18 anos de prisão transitou em julgado no dia 2 de Agosto de 2010 (tal como flui do certificado do registo criminal). O arguido A nas declarações que prestou na audiência, confirmou o facto que o Tribunal julgou provado (exceto – por não o saber de cor - quanto à identificação do número do processo). Quanto aos factos descritos em 2 dos factos provados e em II dos factos não provados, o decidido funda-se essencialmente nos meios de prova que, a seguir se indicam e analisam. O arguido A, nas declarações que prestou na audiência de discussão, explicou que, na cadeia, conheceu um recluso colombiano que lhe propôs um negócio de venda de droga que lhes daria muito dinheiro. O arguido decidiu então enganar o referido recluso, ficando-lhe com a droga (sem a pagar) e diligenciando para que a mesma fosse vendida na rua (isto é, fora do Estabelecimento Prisional). O arguido não referiu em que data tomou tal decisão. Reconheceu, todavia, que pressionou muito o arguido C, que era guarda prisional no Estabelecimento Prisional do Funchal, para lhe arranjar uns telemóveis e declarou que recebeu dele os telemóveis em causa em datas diferentes. Esta versão dos factos foi também confirmada pelo próprio C que, detidamente, explicou de que modo se sentiu pressionado para entregar os telemóveis ao arguido e a razão que o levou a aceitar o pedido de entregar os telemóveis. Às declarações de C regressaremos mais tarde, quando cuidarmos de fundamentar os factos atinentes ao conhecimento que este arguido tinha do destino específico que iria ser dado aos telemóveis. Para já interessa reter o facto de as declarações dos dois arguidos serem concordantes no sentido de que a aquisição e entrega dos telemóveis por parte do guarda prisional ao recluso terem sido antecedidas de grande pressão exercida por este sobre aquele. Um dos telemóveis em causa foi adquirido por C no dia 5 de julho de 2012. Com efeito, este arguido confirmou que o recibo que está fotocopiado a folhas 892 do apenso 90/11.0JAFUN respeita à aquisição de um dos telemóveis em causa (o arguido esclareceu também que na altura da compra indicou um nome que não era o seu e por isso o seu nome não consta do recibo). Declarou ainda que os dois telemóveis foram adquiridos no mesmo dia e foram entregues ao arguido no mesmo dia. Nesta parte, a versão dos factos trazida a juízo por C não é concordante com a versão apresentada por A (que afirmou que os telemóveis foram entregues em dias diferentes). Analisados os autos de transcrição das interceções telefónicas (em especial, as dos apensos I e II e do anexo A, verifica-se que, inicialmente, isto é, em abril de 2012, o arguido (que já estava preso no Estabelecimento Prisional do Funchal) usava um telefone com o nº (…). Em agosto do mesmo ano, o arguido usava o telefone nº (…). Tendo isto presente e considerando que o recibo acima aludido respeita a apenas um telemóvel, é evidente que os telemóveis que o arguido C forneceu ao arguido A foram adquiridos e entregues em datas diferentes, tendo a primeira entrega ocorrido pelo menos em abril de 2012 e a segunda no verão do mesmo ano. Não há dúvida de que os telemóveis em causa foram utilizados pelo arguido A: os autos de transcrição das interceções telefónicas constantes do apenso I e II e anexo A (alvos 50694M e 52200040) demonstram bem a utilização por parte daquele arguido do telefone com o número (…) e (…). Também não se demonstrou que o arguido tivesse tomado a decisão de angariar ex-reclusos como distribuidores da droga. As transcrições das interceções telefónicas demonstram que o arguido precisava de alguém para vender a droga na rua, mas não que essas pessoas fossem (necessariamente) ex-reclusos. Sintomático do que se acaba de dizer é o que consta de folhas 7 do apenso I, em que o arguido A desabafa com o seu interlocutor a dizer (entre o mais que não interessa aqui considerar) “se eu tivesse um gajo, olha, se eu tivesse um gajo em São Brás que se agarrasse a ela (…)”. O arguido refere-se obviamente (o que se retira claramente de toda a conversação) a cocaína de que já dispõe e que quer vender e à necessidade de encontrar alguém que a queira vender (não referindo que o potencial vendedor tem que ser um ex-recluso). A comunicação intercetada e transcrita data de 26 de junho de 2012. Ainda mais esclarecedora do que atrás se afirmou é o auto de transcrição da interceção telefónica que consta de folhas 2 do apenso II (em que o mesmo arguido pergunta ao interlocutor “onde é que um gajo pá pode despachar aí uma branca aí em São Brás, pá?” E, mais adiante, afirma “”(…) quero é despachar aquilo, pá”. E, ainda mais adiante “interessa é despachar aquilo, meu…”. O arguido está a referir-se à branca, isto é, à cocaína de que dispõe em Mafra, perto da Ericeira (tal como ele refere no primeiro auto citado) e mostra-se interessado em vendê-la (nada referindo quanto a especiais características do vendedor ou do comprador). Os meios de prova que se acabam de analisar foram também determinantes na decisão que o Tribunal tomou ao julgar provado o descrito em 3 e 4 dos factos provados. Nenhum dos dois arguidos envolvidos na transação dos telemóveis (A e C) reconheceu que o primeiro entregou ao segundo a quantia de € 160,00. O arguido A referiu ter entregado € 60,00 ou pouco mais (afirmando que foi a quantia correspondente ao preço dos telemóveis). Já C referiu ter recebido quantia inferior aos telemóveis (mas não superior a € 80,00). Em face destes meios de prova (os únicos que se produziram sobre o facto que agora se cuida de fundamentar), impõe-se julgar provado que C recebeu € 80,00, mas não provado que tivesse recebido os € 160,00 alegados na acusação. No que tange ao conhecimento que este último arguido tinha sobre a utilização que o arguido A ia dar aos telemóveis, é evidente que não poderia o Tribunal deixar de julgar provado que os mesmos iriam ser usados para comunicações com o exterior. É essa, de resto a sua função natural. O arguido A declarou ao Tribunal ter dito ao guarda prisional que contactou que o telefone era essencialmente para falar com a namorada. Também C referiu o mesmo facto. Porque não se produziram outras provas sobre o acordo dos dois arguidos ou o conhecimento que C tinha sobre as intenções de o arguido recluso vir a usar os telemóveis na prática de atos de tráfico de droga, impunha-se julgar tal facto não provado. Não deixa de se acrescentar que as regras da experiência comum levam também a concluir que um recluso que pede ao um guarda prisional para lhe fornecer um telemóvel (o que constitui uma violação dos deveres profissionais dos guardas prisionais, mas também uma violação das regras de segurança dos estabelecimentos prisionais) não vai dizer ao guarda prisional que pretende o telemóvel para com ele cometer crimes. Por este motivo, o Tribunal julgou não provado o descrito em III e em XV. Os autos de transcrição das interceções telefónicas já referidos são suficientes para demonstrar a veracidade do descrito em 5 dos factos provados, sendo ainda certo que o arguido não se limitou a contactar telefonicamente com pessoas por causa de assuntos relacionados com droga. Uma das pessoas para quem o arguido A telefonou foi para seu pai, o arguido B (a relação de parentesco resulta do teor da certidão do assento de nascimento que constitui folhas 331 e seguintes do processo principal). A Polícia Judiciária apreendeu a B o telemóvel que este trazia consigo no dia 18 de novembro de 2012. Trata-se de um telemóvel da marca Nokia, modelo 1680-2 com o IMEI referido na matéria de facto julgada provada. Trata-se, pois, do telefone correspondente ao alvo 52754040 que esteve a ser intercetado pela Polícia Judiciária (e a que respeita o apeno 4). Da mera leitura das várias interceções ali transcritas se conclui que o arguido A contactou telefonicamente e várias vezes o seu pai para tratar de questões relacionadas com o transporte da cocaína que veio a ser apreendida na posse do próprio arguido B. No dia 24 de novembro de 2012, a Polícia Judiciária apreendeu do telemóvel da arguida D e que esta tinha na sua posse. Trata-se de um telemóvel da marca Huawei, de cor preta, com o IMEI (…) e com o cartão SIM da operadora TMN com o nº (…) (tal como flui do teor do auto de apreensão que constitui folhas 895 do apenso 90/11.0JAFUN. As comunicações estabelecidas de e para tal telemóvel e número de telefone foram objeto de interceção. Analisados os autos de transcrição de algumas das interceções telefónicas realizadas (designada, mas não exclusivamente, as do apenso 3), conclui-se claramente que o arguido A, por várias vezes, contactou com a arguida D para tratar de assuntos relacionados com o transporte de droga, designadamente com a receção da droga pelo correio, tal como está descrito nos factos provados. Anote-se que o arguido A, na audiência, referiu-se várias vezes a esta arguida como sendo a sua “companheira” ou “namorada”, sendo certo que tal relacionamento se extrai claramente do teor de alguns autos de transcrição (v.g. o auto que constitui folhas 76 e seguintes do anexo A). A residência de tal arguida é em Câmara de Lobos (tal como resulta claramente do termo de identidade e residência por ela prestado a folhas 971 do apenso 90/11.0JAFUN. Não há, deste modo, qualquer dúvida de que a utilizadora do telemóvel referido era a arguida D. E era outra pessoa contactada pelo arguido para tratar dos assuntos relacionados com o transporte da cocaína que veio a ser apreendida na posse de B e da que foi remetida via CTT para a Região Autónoma da Madeira. Estão transcritas nos apensos 4 e 5 algumas das conversações mantidas pelo arguido E com os arguidos A (folhas 2 do apenso 5), B (folhas 7 do apenso 4) e F (folhas 8 do apenso 5). Mais adiante voltaremos a analisar outros meios de prova relevantes. Mas, do exposto resultam já abundantemente demonstrados os factos constantes do ponto 6 a 8 dos factos provados. Já não se extrai de nenhum meio de prova que o arguido A tenha combinado com o seu pai o envio de droga para o Funchal, pelo que tal facto tem que ser julgado não provado. Relativamente aos factos descritos sob os números 9 e 10 da matéria de facto julgada provada, o decidido funda-se essencialmente no teor dos autos de interceção telefónica que constam do apenso 6 (que contém apenas um auto) e apenso 5 (v.g. folhas 8). Destas duas interceções resulta claro que a arguida F não só estava a par do envio da encomenda postal para o Funchal, mas também que colaborou ativamente nesse envio, comprando o envelope que considerou adequado e promovendo a expedição do mesmo. O envelope foi intercetado pela Polícia Judiciária e aberto (cumpridas as necessárias formalidades legais, tal como resulta do teor do mandado de busca e apreensão de correspondência, do auto de apreensão, da cota de folhas 506 e do auto de abertura de encomenda postal que constituem folhas 503, 504, 506 e 507 e seguinte do apenso 90/11.0JAFUN), tendo-se verificado que no seu interior estavam as coisas descritas na matéria de facto julgada provada. Da análise do próprio envelope se retira a identificação do nome que foi escrito como sendo o nome do remetente (“(…)”) e do destinatário. O envelope e todo o seu conteúdo estão representados nos registos fotográficos que constituem folhas 510 e seguintes do apenso 90/11.0JAFUN. A folhas 1053 e seguintes do mesmo apenso encontram-se os fotogramas das filmagens captadas pelo circuito digital de vídeo da Estação de Correios da Malveira onde se pode ver a arguida F a entrar no falado posto dos CTT, a ser atendida ao balcão por um dos funcionários para comprar o envelope e, após, a sair do posto dos correios (fotos de folhas a 1056). No conjunto de fotogramas que se segue vê-se a mesma arguida a entrar novamente na mesma estação dos CTT, a aguardar a sua vez para ser atendida (segurando na mão o envelope), a entregar o envelope para expedição e a sair da estação dos CTT. Os fotogramas a que acabámos de nos referir foram impressos na sequência de diligência de visionamento do CD retirado do sistema do circuito digital de vídeo da referida estação dos correios (conforme auto que constitui folhas 1052 do apenso 90/11.0JAFUN). O CD consta de folhas 640 do mesmo apenso. O envio da encomenda postal que veio a ser apreendida pela Polícia Judiciária foi previamente combinado entre os arguidos E e F, sendo que, alguns detalhes de tal combinação foram acertados por telemóvel. Assim, resulta claro do auto de transcrição da conversação telefónica estabelecida entre estes dois arguidos no dia 6 de agosto de 2012 (às 16:32 horas) que o primeiro queria saber se a segunda já tinha adquirido o envelope. Trata-se, tendo em conta a data e hora da conversação e todo o teor desta, do envelope para enviar a droga para o Funchal. De resto, resulta do mesmo auto que a encomenda vai ser expedida a partir da Malveira (o que os fotogramas atrás referidos comprovam). Do auto de interceção telefónica que consta de folhas 1 do apenso 3 resulta que a preocupação do arguido A no dia 8 de agosto era saber (junto de D) se “o carteiro já passou”. Relevante é ainda o auto que consta de folhas 2 do mesmo apenso, em que, no dia 10 de agosto de 2012, F afirma que mandou a encomenda na segunda-feira à tarde (o dia 6 de agosto de 2012 foi segunda-feira) e estranha que a encomenda ainda não tenha chegado nem sido devolvida ao remetente. Na mesma conversação a arguida F refere ter posto “o nome do (…)”. O arguido A declarou que não teve nenhum envolvimento no envio da droga do continente português para o Funchal. Segundo o arguido, a F (mãe da D) tem vários filhos toxicodependentes. No decurso do processo soube que aquela teria enviado a droga para o Funchal a fim de ser entregue ao seu filho (que assim não teria a tentação de roubar). Mais esclareceu o arguido que mostrou interesse na receção das encomendas idas do continente, pois estava à espera que chegasse roupa contrafeita que o mesmo tinha pedido. A tese dos factos do arguido, neste particular, não merece qualquer credibilidade por várias razões. Em primeiro lugar, em conversação telefónica alguma que haja sido intercetada, o arguido encomenda ou refere ter encomendado roupa (ainda que a roupa tenha sido utilizada, isso sim, para dissimular a cocaína e o haxixe apreendidos). Das numerosas chamadas telefónicas efetuadas e recebidas pelo arguido A e que foram transcritas, este arguido demonstra sempre grande preocupação quanto ao destino a dar à droga que detém. Dois dias após a expedição da encomenda postal com a droga, o arguido contactou com sua namorada para saber se a encomenda já tinha chegado (perguntando se o carteiro já chegou”). Em conversas com a sua namorada, o arguido dá instruções sobre o modo como ela deve vender a droga (v.g. folhas 74 e 75 do anexo A). Acresce que a droga de que E e F dispunham pertencia a A. Não é razoável acreditar que F iria usar (oferecer) parte da droga sem que o dono soubesse. Por último, não tem sentido adquirir droga no continente e enviar para a Madeira e correr o risco de a droga ser apreendida se na Madeira, tal como resulta da interceção acima referida, a cocaína é muito barata (facto que foi confirmado pela testemunha K, inspetor da Polícia Judiciária do Funchal). Perante as provas atrás analisadas torna-se evidente que todos os arguidos referidos nos pontos 9 e 10 dos factos provados tinham conhecimento da operação de envio de droga do continente para o Funchal e todos tiveram a participação ali descrita. Quanto à quantidade e natureza de droga em causa, revelou-se determinante o relatório pericial de toxicologia forense elaborado pelo Laboratório de Polícia Científica da Polícia Judiciária que constitui folhas 794 do apenso 90/11.0JAFUN. A quantidade de droga referida na acusação corresponde ao peso líquido da amostra cofre. Sabidamente, o peso líquido de cada estupefaciente deve ser calculado subtraindo-se a tara ao respetivo peso bruto. No caso da cocaína, o peso bruto é, de acordo com o falado relatório pericial, de 14,110 gramas. A tara é de 1,967 gramas. Logo, o peso líquido é o que consta dos factos provados. No que tange ao haxixe (resina de canábis), o peso líquido é logo indicado na parte do relatório que identifica o material recebido para análise. Na acusação alega-se que os arguidos procederam a um outro envio de droga pelos CTT. Tal é sugerido pelos autos de interceção das comunicações telefónicas (designadamente pelas que constam de folhas 73 do anexo A e folhas 8 do apenso I). Entende-se, todavia, que estas duas conversações, por si só, são insuficientes para concluir que os arguidos A, D, E e F tenham procedido, antes de 6 de agosto de 2012, ao envio de droga pelo correio do Continente para a Madeira. Cumpre, por último, referir que não resulta da prova produzida (que é, basicamente, a que foi já referida e analisada) que a droga remetida pelos CTT seria, após ser dividia em doses individuais, entregue a distribuidores que, por sua vez, vendiam aos consumidores, razão pela qual, nesta parte, os factos foram julgados não provados. Relativamente aos factos provados descritos sob os números 11 a 16 dos factos provados o decidido funda-se, desde logo, no auto de apreensão que constitui folhas 9 do processo principal. Refere-se tal auto à apreensão da droga que o arguido B detinha quando foi intercetado por elementos da Polícia Judiciária. A natureza da droga (cloridrato de cocaína) resulta do relatório pericial de toxicologia forense elaborado pelo Laboratório de Polícia Científica da Polícia Judiciária e que constitui folhas 155 do processo principal. De tal relatório resulta ainda evidente que o peso líquido da cocaína era de 206,300 gramas e não de 206,097. Com efeito, tal como acima referimos, o peso líquido afere-se subtraindo ao peso bruto (228,500 gramas) a tara (22,200 gramas). O peso líquido referido na acusação resulta da soma do pelo líquido da amostra cofre (18,497 gramas) com o peso líquido remanescente (187,600 gramas). Este método não considera que 0,203 grama foi gasta no exame (precisamente para aferir se a substância apresentada para exame era ou não cocaína. Do falado auto de apreensão resulta o local onde a droga estava escondida. Os factos (apreensão e local onde a droga estava escondida) foram confirmados pela testemunha L, inspetor da Polícia Judiciária que procedeu à revista do carro e localizou a droga. A mesma testemunha confirmou a apreensão documentada a folhas 10 do processo principal e que se refere ao telemóvel detido por B na altura em que foi abordado. A marca, modelo, EMEI e número de telefone do cartão estão bem identificados no auto. A mesma testemunha confirmou também o teor dos registos fotográficos que constituem folhas 15 e seguintes, que representam o carro conduzido pelo arguido B na altura em que foi intercetado, o local onde a droga estava escondida e o modo como a droga vinha acondicionada. L referiu no seu depoimento que o arguido, na altura, se fazia acompanhar de uma senhora e do neto dela. De resto, L confirmou o teor da informação de serviço que constitui folhas 2 e seguintes (referente à operação policial em que participou). O próprio arguido B referiu, nas declarações que prestou na audiência de discussão, que fez a viagem partilhando as despesas com uma senhora que se deslocou à venda do Pinheiro para ir ao aniversário da filha. O mesmo arguido reconheceu que trazia a cocaína que foi apreendida na caixa dos fusíveis do seu carro. Todavia, afirmou que foi a pessoa que lhe entregou a droga que ali a escondeu. Em face dos meios de prova assim produzidos, não poderia o Tribunal deixar de julgar provados os factos atinentes à viagem que B fez à Venda do Pinheiro para dali trazer a droga que foi apreendida. Impõe-se ainda julgar provado que a droga estava acondicionada e escondida nos termos referidos na matéria de facto julgada provada. O arguido B afirmou que não sabia que a coisa que lhe foi entregue era droga. Afirmou mesmo que nunca na sua vida vira droga. Ainda de acordo com o declarado por B na audiência de discussão, o seu filho (o coarguido A), durante muito tempo insistiu para que fosse buscar uma encomenda. Todavia, não lhe disse o que era nem a B passou pela cabeça que se tratava de droga. Nesta parte, a versão dos factos trazida a juízo não é verosímil nem compatível com outros meios de prova. Desde logo, não é verosímil que o arguido B não soubesse que o que transportava era droga tendo em conta as circunstâncias em que o transporte foi feito: deslocou-se de São Brás de Alportel (Algarve) à Venda do Pinheiro (concelho de Mafra, distrito de Lisboa) e aceitou trazer uma “encomenda” do filho que lhe foi entregue por outra pessoa que escondeu a “encomenda” no compartimento dos fusíveis do carro do arguido dizendo “Não tem nada a ver com isto. Isto é do seu filho.” Acresce que nas declarações que prestou no âmbito do primeiro interrogatório judicial de arguido detido, exaradas no auto respetivo que constitui folhas 39 e seguintes (declarações que foram lidas após o cumprimento das exigências impostas pelo artigo 357º do Código de Processo Penal), B afirmou saber que o que transportava era cocaína. Todavia, deu uma explicação bizarra para a sua detenção (alguém, no café, lhe disse que tomar cocaína com café fazia bem ao colesterol e à impotência sexual. Depois de confirmar as propriedades terapêuticas com o filho A foi, por indicação deste, buscar a cocaína à Malveira). O próprio arguido B na audiência de discussão explicou que lhe tinham falado, por brincadeira, nas indicações terapêuticas da cocaína (misturada com café) e decidiu, no primeiro interrogatório judicial, contar tal versão à senhora juíza de instrução criminal. De qualquer modo, outros meios de prova foram produzidos de onde decorre claramente que o arguido B conhecia a natureza estupefaciente da substância que transportou. No dia 23 de setembro de 2012, o arguido A telefonou ao seu pai e dá-lhe um número de telefone (…) do “(…)” e diz que aquilo não fica muito longe de Mafra. A pede ainda para o pai telefonar para o “(…)” e que depois este indica-lhe a morada. Nesse mesmo telefonema, o arguido A afirma que não pode pôr isso nas mãos do “moço”, pois não o conhece de lado nenhum (auto de transcrição de interceção telefónica que constitui folhas 7 e 8 do apenso 2). O número de telefone referido (…) pertence ao arguido E com quem o arguido B falou várias vezes ao telefone para combinar o encontro que se veio a realizar no dia 18 de novembro de 2012. Tais conversações constam, por exemplo, de folhas 7 a 12 do apenso 4). No dia 26 do mesmo mês e ano, o arguido A voltou a telefonar ao pai (auto de transcrição de interceção telefónica que constitui folhas 9 e 10 do apenso 2) e pergunta-lhe se consegue ir lá no domingo, ao que B responde que só se for no domingo. Na mesma conversa, o arguido A voltou a dizer que não quer pôr “isso assim na mão de um gajo que eu não sei onde é que ele mora nem nada!”. De imediato, o arguido B afirma: “Podem experimen… podem-se aventurar a ver…”. Concordando, o filho afirmar que não estão a falar em € 500,00 ou € 600,00, ao que B responde “Ah, sim, sim, sim.” Ainda com interesse para a decisão, na mesma conversação, o arguido B manifesta preocupação por não ter dinheiro para entregar à pessoa, ao que o seu filho o informa que “aquilo” é dele próprio e não de pessoa que lho vai entregar. De imediato o arguido B diz ao filho “Tá bem, atão eu vou lá buscar isso.” Resulta claro desta, na sequência, aliás, da anteriormente analisada, que o arguido A está a combinar com o seu pai a recolha, por parte deste, na área de Mafra, de uma coisa que o arguido E irá entregar-lhe. Fica ainda esclarecido que a coisa a recolher é cara e não pode ser entregue nas mãos de terceiros. Na conversação de 14 de outubro de 2012 (mesmo apenso, folhas 11 e 12), o arguido A informou o pai que “aquilo té em stand-by” porque está a ver se consegue vender as “peças” aqui (no Funchal, onde ele se encontra). Já na conversação anteriormente analisada os arguidos utilizam a palavra “peças” para se referirem à droga. Também na conversação estabelecida entre os mesmos dois arguidos no dia 6 de outubro de 2012 (auto de transcrição de interceção telefónica que constitui folhas 4 a 6 do apenso 4) o arguido A refere que falou com um recluso do Estabelecimento Prisional de Pinheiro da Cruz que lhe recomendou a não passar as “peças pá mão de mecânico nenhum sem (…) o orçamento tar pago”, querendo com isto significar que a droga não poderia ser entregue a outra pessoa sem que esta lhe pague primeiro. Não tem qualquer sentido supor que o arguido B estivesse convencido de que as conversas que entabulara com o filho visavam ir buscar peças a Mafra. O arguido B sabia bem que se estava a falar de droga (tanto que não perguntou a que peças o filho se referia, nem para que serviam, nem como ele as iria vender no Funchal). Tanto assim é que, nas comunicações estabelecidas entre este arguido e o arguido E (cf. autos de transcrição de interceções telefónicas que constituem folhas 7 e seguintes do apenso 4), o arguido B não refere o seu nome (identificando-se como familiar do “…”). Estes dois arguidos chegam a entabular conversas enigmáticas que só podem ser compreendidas no contexto do acordo referido nos factos provados. Exemplo disso é a conversa tida ao telefone no dia 18 de novembro de 2012, às 15:45 horas (sessão nº 571, a folhas 10 e 11 do apenso 4) em que, depois de B anunciar que está na Venda do Pinheiro e vai ao encontro de E, este diz que tem que esperar mais meia hora e explica “Que eu ainda tenho que ir…” A frase é interrompida por B que afirma “Tá bem, tá bem, pois, pois.” Tendo E continuado a explicação “… que eu tenho que me ir calçar!!” É evidente, no contexto das demais interceções telefónicas e dos demais meios de prova, que o arguido E está a dizer ao arguido B que ainda tem que ir buscar a droga onde a tem escondida e só depois se encontrará com ele. Por fim e ainda no que tange a interceções telefónicas, não deixa de se salientar a última conversação transcrita no apenso 4 (folhas 12) em que o arguido A perguntou ao pai se estava a conduzir, ao que este responde que já vai a caminho e que amanhã logo lhe telefonaria. Antes de desligar, o arguido A faz uma recomendação ao pai “aquilo tem que tar num sítio… seco, hã”. O arguido B não manifestou qualquer surpresa quanto ao modo como “aquilo” ou “as peças” foram escondidas no carro nem perguntou a razão pela qual as peças (de mecânica) teriam que ser guardadas em lugar seco. A conclusão que se impõe é óbvia: o arguido B sabia bem o que estava a transportar. Os meios de prova acima referidos impõem ainda a conclusão de que também o arguido E conhecia a natureza estupefaciente que entregou a B. De resto, o facto foi afirmado pelo próprio arguido A nas declarações que prestou na audiência de discussão, esclarecendo que, inicialmente, E guardou a droga sem saber do que se tratava. A referiu ainda ter prometido a E pelo menos € 1 000,00 como compensação por guardar a droga e a entregar a outra pessoa, quantia que pagaria depois de a conseguir vender. Quanto à propriedade do veículo conduzido pelo arguido E o decidido funda-se nas suas próprias declarações e no teor do documento que constitui folhas 321 do processo principal (que consiste numa informação do Registo Automóvel de Proprietário da Conservatória do Registo Civil, Predial, Comercial de São Brás de Alportel de onde resulta que o veículo está registado em nome daquele arguido). Não se demonstrou que a droga apreendida no dia 18 de novembro de 2012 estivesse guardada na residência do arguido E por duas razões fundamentais: em primeiro lugar não se fez a demonstração positiva de tal facto (ninguém o afirmou nem ali foram encontrados vestígios da existência da droga); em segundo lugar porque o que as conversações telefónicas transcritas sugerem é que a droga estava guardada fora de casa (apenso 4, folhas 10 e 11, sessão 571; apenso 5, folhas 3, na parte em que o arguido E diz ao arguido A “ele que também não venha muito cedo porque eu tenho que, eu, aquela merda não tá comigo, sabes que eu tenho que ir buscar aquela merda” e folhas 6). Não se demonstra também que as arguidas D e F tivessem tido, por algum modo, alguma participação no conjunto de factos que agora se cuida de fundamentar. O nome de F nem sequer vem referido na acusação (no que respeita, repete-se, ao conjunto de factos agora em referência). E, apesar de estar demonstrado que ela sabia o que o seu companheiro (o arguido E) estava a preparar e foi fazer no dia 18 de novembro de 2012 (tal como resulta claramente do auto de transcrição da interceção telefónica que constitui folhas 7 e 8 do apenso 5), o certo é que nada mais se demonstrou. O mesmo se diga, mutatis mutandis, relativamente à arguida D. Ela tomou conhecimento de que B iria buscar a droga à terra de sua mãe (auto de transcrição da interceção telefónica que constitui folhas 13 apenso 2). Mas de nenhum outro meio de prova resulta que a mesma teve ou iria ter qualquer participação na recolha, transporte, divisão e venda de droga (droga, de resto, que estava no concelho de Mafra e iria para o concelho de São Brás de Alportel, de passo que a arguida morava na Madeira). Apesar de o arguido A na audiência de discussão, ter referido que tinha “roubado” a droga a um colombiano e que queria restituí-la por a sua família estar a ser ameaçada, o certo é que resulta expresso de todas as transcrições de conversações telefónicas que o que o arguido pretendia era levar a droga para São Brás de Alportel a fim de aí ser vendida (por intermédio de outra pessoa) a consumidores. Para além dos autos de transcrição já citados e analisados, o que se acaba de referir resulta também dos seguintes: apenso 1; apenso 2, folhas 1, 4. Já antes, em abril e maio de 2012, depois de o arguido ter concluído que não conseguiria vender tudo de uma vez só, as suas conversas com terceiros visavam promover a venda a retalho de droga de que dispunha (ainda que por intermédio de outrem). É o que resulta de várias conversações telefónicas, designadamente as transcritas no anexo A, folhas 3, 8, 21, entre outras. Tendo em conta o que foi referido pelo arguido A na audiência de discussão e considerando o teor das interceções telefónicas já analisadas (e de outras que se podem citar), é evidente que as arguidas D, F e E pretendiam obter benefício económico com a remessa e venda da droga na Região Autónoma da Madeira. Já quanto ao arguido B não se fez prova de que o mesmo pretendia obter algum benefício económico com a atividade que desenvolveu. Das interceções telefónicas nada se retira a este respeito. Por outro lado, sendo pai do arguido, poderia ser movido por espírito de ajuda ao mesmo. Na dúvida e porque o facto, a demonstrar-se, poderia prejudicar o arguido, o Tribunal julgou o mesmo não provado. No que tange aos factos atinentes ao modo de vida pessoal, familiar, económico dos arguidos e aos seus antecedentes criminais, o decidido funda-se nos relatórios sociais juntos ao processo (relatórios que, pela diversidade das fontes a que recorreram e pela clareza e profundidade do seu conteúdo, merecem inteiro acolhimento por parte do Tribunal) e nos certificados do registo criminal juntos ao processo.» * Cumpre conhecer.*** B.2 – É sabido que o âmbito do recurso se define pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação sem prejuízo, contudo, das questões do conhecimento oficioso. São, assim, questões a abordar: - no recurso do arguido B a medida da pena (conclusões 1ª a 15ª) e a suspensão da sua execução (conclusões 16ª a 19ª); - no recurso do arguido E a legalidade das escutas telefónicas (conclusões 1ª a 13ª) e a medida da pena (conclusão 14); - no recurso do arguido A o tipo penal em causa (conclusões I a XVI), a reincidência (conclusões XVII a XXII) e a medida da pena (conclusões XXIII a XXVIII); Assim iremos tratar as questões com a seguinte ordem: No ponto B.3, no recurso do arguido A, o tipo penal em causa e a reincidência; no ponto B.4 o recurso do arguido E e a legalidade das escutas telefónicas; no ponto B.5 as medidas das penas e a suspensão da sua execução. * B.3 - O recurso do arguido A o tipo penal em causa e a reincidência.B.3.1 – Invocando o arguido uma diminuição da ilicitude do facto convém ter presente a constante posição da jurisprudência portuguesa ao determinar que no tipo contido no artigo 25º do Dec-Lei nº 15/93, de 22-01, se prevê uma ilicitude do facto consideravelmente diminuída, por referência à constante do artigo 21º do diploma, através da indicação de elementos factuais inseríveis na ilicitude do facto como indicadores dessa menor ilicitude e que devem ser analisados de forma global. Daí pretende-se que decorra, da menor gravidade do ilícito, um mais atenuado tratamento penal e um tratamento mais equitativo ou proporcional aos factos praticados, o que se concretiza no afastar da aplicabilidade do artigo 21º do diploma. É disso exemplo o Ac. do STJ de 24-01-2007 (Proc. 06P3112 - Cons. Santos Monteiro): I - O tipo legal de crime de tráfico de menor gravidade, construído sobre o tipo matriz, ou seja sobre o tipo-base previsto no art. 21.°, n.º 1, do DL 15/93, de 22/1, procura dar resposta, em nome da proibição de excesso, da equidade e da justiça, àquelas situações que, sem atingirem a gravidade pressuposta no tráfico simples, merecem reprovação, sendo injusto, sem se lançar mão de atenuação especial, não diversificar os campos de incidência, revelando-se, ainda, a perseguibilidade penal como um dos mais eficazes métodos para se atingir o tráfico no seu escalão médio e de maior dimensão. II - A gravidade à escala assim delineada encontra tradução na conformação da acção típica, enquanto não prescinde de a ilicitude, ou seja o demérito da acção típica, na sua expressão de contrariedade à lei, ser consideravelmente reduzida, um acto de repercussão ética de menor gravidade, em função da consideração, além do mais, dos meios utilizados, da modalidade ou circunstância da acção, da qualidade ou quantidade das substâncias ou preparações – al. a) daquele art. 25.º. III - Essa ponderação, tal como este STJ tem repetidamente afirmado, não prescinde, antes exige, uma valoração global do evento, sem fazer avultar um seu elemento em detrimento do outro. Assim, a consideração da “diminuição considerável da ilicitude do facto” apresenta índices de ponderação assentes na consideração dos meios utilizados, da modalidade ou das circunstâncias da acção, da quantidade ou qualidade do produto traficado ou a traficar. [1] Ora, que revelam os factos provados? Que, bem pelo contrário, há um acréscimo considerável de ilicitude pela modalidade da acção, o controle da acção do interior de um estabelecimento prisional, com violação de normas do seu funcionamento interno pelo uso de telemóvel e pela conseguida violação de normas disciplinares por parte de um funcionário daquele estabelecimento. Estas circunstâncias, graves, não podem ser branqueadas pelo que é suposto “ser comum” entre arguidos, sob pena de a ilicitude passar a ser aferida pelo comportamento de arguidos. Ou seja, não há factos que permitam concluir por uma considerável diminuição da ilicitude, como esta se mostra acrescida com os factos provados. Mesmo os argumentos aduzidos pelo recorrente fazem por olvidar aspectos que, também, não revelam diminuição da ilicitude. Desde logo o tráfico de cocaína, qualidade de produto que não revela menor ilicitude, depois a sua quantidade – 206,300 gr mais 12,143 gr e não “apenas” 12,143 g como afirma o recorrente – a revelar já ambições de relevo num novo “mercado”. Ainda se deverão desatender alguns argumentos acrescentados como a “não introdução no mercado”, realidade nova juridicamente irrelevante para a consideração da ilicitude no caso concreto na medida em que não esteve dependente da vontade dos arguidos, sim das polícias, o que faz corresponder o argumento a uma “frustração” de facto, que não de iure. Quanto aos proventos monetários e à imprecisa quantificação da revenda são elementos de que o tipo prescinde, bastando-se com a mera posse e intenção de venda. Certo que são dois elementos que poderiam agravar a ilicitude já constatada, mas da sua inexistência não se pode inferir uma diminuição daquela a significar um salto para o tipo privilegiado. Por tudo, quando se fala em ilicitude diminuída isso não significa que o sentido da reprovação esteja no concreto esbatido já que a “diminuição da ilicitude” é um juízo comparativo referido a um tipo penal de muito maior gravame, o tipo base de tráfico de droga contido no artigo 21º do Dec-Lei n. 15/93, de 22-01. E esse juízo de reprovação tem que ser formulado nos limites definidos pelo legislador ou seja, entre as balizas abstractas da pena, em função do concreto revelado pelos factos. E mesmo apenas nesse âmbito e com a reincidência é difícil fazer um juízo de diminuição de ilicitude com os factos provados. Assim, não se pode falar em diminuição da ilicitude e está bem efectuada a subsunção ao tipo penal contido no artigo 21º do Dec-Lei nº 15/93, de 22-01. * B.3.2 – A reincidência.Até o recorrente concorda que estão preenchidos os requisitos formais que permitem falar na existência de reincidência. Assim apenas nos restará perguntar se o requisito material - a censura do agente pela condenação anterior não foi advertência suficiente contra o crime - se verifica em concreto. Não é necessário procurar muito para encontrar a resposta: se o arguido ainda está num estabelecimento prisional a cumprir a “advertência” anterior é lícito concluir que esta não foi suficiente para o afastar da prática de novos ilícitos já que até no estabelecimento prisional consegue organizar família, namorada e outros para a prática de crimes de grande ilicitude e reprovação social. É irrelevante a circunstância de o anterior crime ser de diversa natureza já que a lei não exige essa similitude. Aliás, a gravidade do anterior crime e do actual revela bem o desprezo do arguido pelas normas e é isso o relevante. Nem é por acaso que o recorrente se socorre do princípio da livre apreciação da prova para impugnar um raciocínio de direito no âmbito da ilicitude. Nas conclusões XIX a XXII invoca o recorrente uma nulidade de sentença por violação do princípio da livre apreciação da prova, considerando que o tribunal recorrido faz erradas e não sustentadas apreciações de facto quando procede à análise do requisito material da reincidência. Quer-nos parecer, no entanto, que se trata de análise de direito sobre um requisito material que impõe uma análise factual em função dos factos já anteriormente dados como provados, o que não implica, naturalmente, o uso do princípio da livre apreciação probatória mas sim a simples lógica. É, pois, improcedente o recurso do arguido nestes pontos, restando conhecer infra da pena imposta. * B.4 - O recurso do arguido E e a legalidade das escutas telefónicas.O recorrente coloca o acento tónico da sua alegação numa inexistência de autorização judicial para proceder a escuta do seu telemóvel nas datas de 20-10-2012, 21-10-2012 e 18-11-2012. Acresce a esta razão mais substancial a invocação de cumprimento dos prazos previstos nos números 3 e 4 do artigo 188º do Código de Processo Penal. A todas elas faz o recorrente corresponder uma utilização de prova proibida e, à invocação do efeito à distância, a inutilidade da mesma prova e de busca subsequente. Quer-nos parecer, no entanto, que diversas são as situações correspondentes às duas alegadas realidades, a verificarem-se: uma, a utilização de prova sem autorização judicial; outra, o não cumprimento de prazos de entrega da prova judicialmente autorizada. Impõe-se, portanto, esclarecer o que os autos demonstram. O arguido põe em relevo a ilicitude das escutas efectuadas em 20 e 21 de Outubro de 2012 e em 18 de Novembro de 2012. Sendo o número de telemóvel do arguido o (…) (alvo 51619M), as escutas referidas foram efectuadas a coberto das autorizações judiciais corporizadas pelos despachos de 11-09-2012 (fls. 686 último parágrafo, por referência a fls. 682 do 3º vol.) e 09-10-2012 (fls. 753 último parágrafo, por referência a fls. 750 do 4º Vol.). De notar que não nos referimos aos volumes do processo principal mas sim ao processo incorporado 90/11.0JAFUN-B. Não há, portanto, escutas não autorizadas judicialmente. Quanto à eventualidade de não terem sido cumpridos os prazos constantes dos ns. 3 e 4 do artigo 188 do Código de Processo Penal, eles não têm a gravidade equivalente a uma falta de autorização judicial – já que esta existe - limitando-se a serem prazos ordenadores do procedimento, não lhes podendo ser assacada uma consequência tão gravosa como a correspondente à ausência de autorização judicial, a destruição da prova. Em princípio e pelas regras das nulidades processuais, designadamente o da taxatividade das nulidades e dos vícios inerentes, este seria um caso de uma mera irregularidade por incumprimento de norma reguladora da forma de produção de prova e o prazo para a sua invocação sempre seria o previsto no art. 123º, n. 1 do Código de Processo Penal. No entanto, o artigo 190º do Código de Processo Penal reconduz o vício à categoria de nulidade. Se a realização de uma escuta telefónica sem autorização judicial só pode ser qualificada como uma proibição de prova – imprestabilidade como prova - a que é aplicável o regime das nulidades insanáveis vista a violação dos artigos 126º, n. 3 do Código de Processo Penal e 32º, n. 8 da Constituição da República Portuguesa, já a nulidade das regras de produção de prova se devem reconduzir à categoria de nulidades sanáveis. Como tal esta invalidade não implica um efeito à distância daí resultante pelo que os meios de prova posteriores mantêm a sua plena validade. Neste sentido o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 26-09-2007 (proc. 07P1890, sendo relator o Cons. Santos Cabral) quando afirma que (IV) «existe uma diferença qualitativa entre a intercepção efectuada à revelia de qualquer autorização legal e a que, autorizada nos termos legais, não obedeceu aos requisitos a que alude o art. 187.º do CPP. Nesta hipótese o meio de prova foi autorizado, e está concretamente delimitado em termos de alvo, prazo e forma de concretização, e, se os pressupostos de autorização judicial forem violados, estamos em face de uma patologia relativa a uma regra de produção de prova e não a uma situação de utilização de um meio proibido de prova (art. 126.º, n.º 3, do CPP)». Sendo uma proibição de prova um limite à descoberta da verdade por respeito a outros valores atendíveis e considerados muito relevantes pela ordem jurídica: «(VI) as regras de produção de prova – cf., v.g., o art. 341.° do CPP – visam apenas disciplinar o procedimento exterior da realização da prova na diversidade dos seus meios e métodos, não determinando a sua violação a reafirmação contrafáctica através da proibição de valoração. As regras de produção da prova configuram, na caracterização de Figueiredo Dias, «meras prescrições ordenativas de produção da prova, cuja violação não poderia acarretar a proibição de valorar como prova (...) mas unicamente a eventual responsabilidade (disciplinar, interna) do seu autor». Umas vezes pré-ordenadas à maximização da verdade material (como forma de assegurar a solvabilidade técnico-científica do meio de prova em causa), as regras de produção da prova podem igualmente ser ditadas para obviar ao sacrifício desnecessário e desproporcionado de determinados bens jurídicos. VII - Resumidamente, e dito com Peters, as regras de produção da prova são «ordenações do processo que devem possibilitar e assegurar a realização da prova. Elas visam dirigir o curso da obtenção da prova sem excluir a prova. As regras de produção da prova têm assim a tendência oposta à das proibições de prova. Do que aqui se trata não é de estabelecer limites à prova como sucede com as proibições prova, mas apenas de disciplinar os processos e modos como a prova deve ser regularmente levada a cabo». [2] E assim terá que ser por respeito à diferente valoração das condutas policiais consoante o que esteja em causa seja uma actuação em área que exija autorização judicial por risco de violação de valores constitucionalmente atendíveis – privacidade, intimidade, vida familiar, dignidade humana – diferentemente de uma conduta que apenas revela descuido, negligência no processamento da prova já licitamente obtida. Daqui não resulta que a conduta policial que não cumpra os prazos previstos nos ns. 3 e 4 do artigo 188º do Código de Processo Penal não deva ter consequências disciplinares para os intervenientes que os não cumpram, quer-se apenas significar que a ordem jurídica não quer que a prova licitamente obtida não seja considerada por mera violação de uma norma conformadora de comportamentos probatórios de carácter formal, procedimental. Esse comportamento não afecta a validade formal e substancial das escutas efectuadas, apenas atrasa o controlo das magistraturas sobre a sua efectivação e, naturalmente, o exercício do direito de defesa. Como se afirma no acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 28-03-2012 (proc. 86/08.0GBOVR.P1, rel. Eduarda Lobo) o (II) «o desrespeito dos prazos máximos estabelecidos nos nºs 3 e 4 do art. 188º do CPP não determina a proibição de utilização das escutas. * B.5 - As medidas das penas e a suspensão da sua execução.Os arguidos foram punidos com as seguintes penas: arguido A na pena de 8 anos de prisão; arguido E a pena de 5 anos e 6 meses de prisão; arguido B a pena de 5 anos de prisão. Quanto ao primeiro, A, é certo que tem intervenção nas duas situações factuais reveladas pelos autos, um dolo muito intenso, uma elevada ilicitude e apresenta-se-nos – face à personalidade do arguido, revelada nos factos - uma indesmentível grande necessidade de prevenção especial. É afirmação habitual da doutrina, com seguimento jurisprudencial, [3] que a prevenção geral positiva ou de integração, com o intuito de tutela dos bens jurídicos é a finalidade primeira da aplicação de uma pena, não fazendo esquecer a prevenção especial ou de socialização, a reintegração do agente na sociedade - art. 40.º, n.º 1, do CP. Tendo isso presente, os autos evidenciam condutas de grande ilicitude e – face ao comportamento anterior - que o arguido não interiorizou as anteriores condenações como uma advertência. E a sua culpa, a vertente pessoal do crime, o cunho da personalidade do agente tal como vertida no facto, que funciona como um limite às exigências de prevenção geral, está ainda para além da moldura concreta determinada pelo tribunal recorrido, pelo que nada há a alterar na pena imposta ao arguido. Quanto ao arguido E, a pena de 5 anos e 6 meses de prisão cumpre a sua função preventiva e também a culpa do arguido – muito intensa – a abarca. Concordando-se com o tribunal recorrido quanto à relativa importância do comportamento anterior – mesmo assim com dois comportamentos ilícito-criminais em 2008 e 2010 – a ilicitude inerente ao comportamento do arguido é muito relevante. De notar que o arguido tem intervenção nos dois feixes de factos provados e a quantidade de cocaína não é nada desprezível. A culpa é intensa e os motivos determinantes da conduta – o ganho financeiro à custa da lesão do bem jurídico de outrem – não serve de atenuante, bem pelo contrário. Entende-se, pois, estar bem doseada a pena concreta. Por fim quanto ao arguido B a pena de 5 anos de prisão surge como estando uma ano acima do mínimo abstracto. Sendo pai do arguido A, essa circunstância não pode surgir como atenuante geral na medida em que o actuar ilícito se não justifica seja qual for a perspectiva de análise. Ilicitude elevada e culpa intensa. Razoável quantidade de cocaína devidamente escondida em local que revela algum saber fazer. Não se nega uma coloração atenuante ao seu comportamento anterior. Mas reflete-se em si em maior proporção a vertente objectiva ligada à ilicitude e às circunstâncias que rodeiam o caso que não permitem alterar a pena e a facilidade com que se locomoveu no meio e a predisposição para a prática do ilícito não permite um juízo de prognose positivo. São, assim, improcedentes os recursos interpostos. *** C - DispositivoAssim, em face do exposto, acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal deste Tribunal de Relação de Évora em negar provimento aos recursos interpostos e, em consequência, confirmam a decisão recorrida. Custas pelos arguidos com a taxa de justiça de 4 (quatro) Ucs.. (elaborado e revisto pelo relator antes de assinado). Évora, 08 de Abril de 2014 João Gomes de Sousa Ana Bacelar Cruz __________________________________________________ [1] - Da abundante jurisprudência sobre esta matéria apenas se refere, por todos, o acórdão do STJ de 21-09-2011, por ser dos mais recentes. [2] - No mesmo sentido os acórdãos de 20-12-2006 (Rel. Cons. Oliveira Mendes) e de 14-11-2007 (Rel. Cons. Santos Cabral): «VIII - Existe uma diferença qualitativa entre a intercepção efectuada à revelia de qualquer autorização legal e a que, autorizada nos termos legais, não obedeceu aos requisitos a que alude o art. 187.º do CPP: nesta hipótese o meio de prova foi autorizado, e está concretamente delimitado em termos de alvo, prazo e forma de concretização, e se os pressupostos de autorização judicial forem violados estamos apenas em face de uma patologia relativa a uma regra de produção de prova. IX - As regras de produção da prova são «ordenações do processo que devem possibilitar e assegurar a realização da prova. Elas visam dirigir o curso da obtenção da prova sem excluir a prova. As regras de produção da prova têm assim a tendência oposta à das proibições de prova. Do que ali se trata não é de estabelecer limites à prova como sucede com as proibições de prova, mas apenas de disciplinar os processos e modos como a prova deve ser regularmente levada a cabo». X - Já o que define a proibição de prova é a prescrição de um limite à descoberta da verdade. XI - É esta distinção que terá de estar subjacente a qualquer análise do regime legal das escutas telefónicas, não confundindo as patologias que colidem com étimos e princípios inultrapassáveis – pois que integram o cerne dos direitos individuais com inscrição constitucional – com aquelas que se traduzem em mera irregularidade produzida no contexto amplo de um meio de prova que foi autorizado. XII - Quando o que está em causa é a forma como foram efectuadas as intercepções telefónicas produzidas no âmbito de meio de prova autorizado e perfeitamente definido carece de qualquer fundamento, sendo despropositada, a referência a uma prova proibida, devendo recorrer-se ao regime das nulidades sanáveis.» [3] - V. g., os Acs. do STJ de 24-01-2007 (06P4345), de 25-10-2006 (06P2938) e de 21-03-2007 (07P790). |