Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | JOÃO LUÍS NUNES | ||
Descritores: | CONTRATO DE TRABALHO RESCISÃO PELO TRABALHADOR INDEMNIZAÇÃO DE ANTIGUIDADE | ||
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Data do Acordão: | 06/07/2011 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PARCIALMENTE PROCEDENTE | ||
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Sumário: | I - Em caso de resolução do contrato por falta culposa de pagamento pontual da retribuição, o trabalhador tem direito a indemnização a fixar entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, tendo em conta o valor da retribuição e o grau de ilicitude do comportamento do trabalhador. II - Mostra-se ajustada a fixação da indemnização em 20 dias de retribuição base, no seguinte circunstancialismo: - a Ré não pagou pontualmente as retribuições de Maio a Novembro de 2009, vindo o Autor, com esse fundamento, a resolver o contrato em Dezembro de 2009; - o Autor auferia mensalmente € 698,32 de retribuição base, € 91,00 de subsídio de alimentação e € 349,16 por compensação pelo trabalho nocturno; - a Ré já há alguns anos que se debatia com dificuldades económicas e financeiras, tendo vindo ao longo do tempo a “endividar-se” junto de entidades bancárias; - em Novembro de 2009, perante a aproximação da época de Natal e Ano Novo, tendo em conta a actividade exercida (Pastelaria e afins) decidiu reabrir os estabelecimentos, a fim de, entre o mais, proceder ao pagamento das retribuições em dívida aos trabalhadores; - com vista a essa reabertura contactou o Autor e outros trabalhadores, e, na sequência, aquele recusou-se a reiniciar as funções e comunicou à Ré a resolução do contrato com fundamento no não pagamento das retribuições.* Sumário elaborado pelo relator | ||
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Decisão Texto Integral: |
Proc. n.º 230/10.7TTABT.E1 * Tendo-se procedido à audiência de partes e não se tendo logrado obter o acordo das mesmas, contestou a Ré, confessando não ter pago ao Autor algumas das retribuições e subsídios peticionados, o que ficou a dever-se a total incapacidade económico-financeira de satisfazer tal obrigação e justificou a resolução do contrato com justa causa por parte do trabalhador; todavia, nega que exista fundamento para a atribuição ao Autor de indemnização por danos não patrimoniais. * Respondeu o Autor, reconhecendo que em Julho de 2009 a Ré lhe pagou € 700,00 por conta das retribuições em atraso.* Foi dispensada a realização de audiência preliminar, elaborado despacho saneador stricto sensu, fixado valor à causa e consignados os factos assentes e a base instrutória, que não foram objecto de reclamação.* Os autos prosseguiram os seus termos, com a realização da audiência de discussão e julgamento, resposta à matéria de facto, que não foi objecto de reclamação, após o que foi proferida sentença, em 21 de Dezembro de 2010, cuja parte decisória é do seguinte teor:«Nos termos de facto e de direito expostos julgo a presente acção parcialmente procedente por provada e consequentemente condeno a Ré J... Lda. a pagar ao Autor A... a quantia global de € 22.249,17, sendo € 16.352,36, a título de indemnização e € 5.896,81 a título de créditos salariais vencidos.». * Inconformada com a decisão, a Ré dela interpôs recurso para este tribunal, tendo nas alegações apresentadas formulado as seguintes conclusões:«A) Impugna-se a decisão proferida sobre a matéria de facto, no que concerne à resposta dada aos QUESITOS 12º e 18º da base instrutória, que na óptica da recorrente e atenta a prova produzida, deverão ser considerados PROVADOS: A)A) Relativamente a tais QUESITOS 12º e 18º, a resposta positiva aos factos neles contidos advém da conjugação dos depoimentos prestados pelas testemunhas V… e AC…, que sobre eles depuseram de forma clara e afirmativa, nos termos dos excertos acima transcritos e constantes da gravação do julgamento, cujo registo, preciso e separado de cada um desses depoimentos, é também identificado. A)B) Os meios probatórios referidos, depoimentos das identificadas testemunhas, impunha a decisão de Provados tais pontos da matéria de facto, e não a decisão recorrida, que considerou que quanto a eles não foi efectuada qualquer prova convincente, ou porque a prova efectuada se revelou manifestamente insuficiente ou porque outros factos que resultaram provados contradizem estes. Para além desta invocação, todavia, o Tribunal a quo não enumera nem explicita que outros factos (provados) contradizem estes, não ponderando, de facto, o suficiente valor probatório dos depoimentos em causa e a sua inequívoca credibilidade e isenção, com relevo para a consideração de tais artigos 12º e 18º da Base Instrutória como provados. B) A conjugação de toda a prova produzida, da matéria de facto constante da decisão recorrida e, também, da que acima se requer seja também considerada provada, deverá levar à alteração do valor da indemnização a atribuir ao autor, em consequência da sua resolução do contrato de trabalho com invocação de justa causa. C) Prevendo o n.º 1 do artigo 396º do Código do Trabalho que o valor de tal indemnização deve ser determinado entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, D) Não se pode aceitar como adequado e proporcional ao grau da ilicitude do comportamento do empregador – que a citada disposição impõe como um dos elementos a ponderar na determinação de tal quantum – o montante correspondente a 30 dias de retribuição base por ano de antiguidade, fixado na decisão recorrida. E) Toda a prova produzida e relevante para a ponderação da conduta da empresa ré/empregador, aponta para a sua total incapacidade para fazer face ao cumprimento das suas obrigações em consequência de claras e insuperáveis dificuldades económicas e financeiras, facto reconhecido pelo autor e pelas restantes testemunhas, antigas trabalhadoras da ré. F) Tal prova deve levar à consideração de um inequívoco diminuto grau de culpa da ré e, consequentemente, determinar que a ponderação do grau de ilicitude do seu comportamento, fundamenta a fixação de um montante indemnizatório correspondente ao mínimo dos 15 dias de retribuição base por ano de antiguidade do autor, que a citada disposição legal também prevê. G) A verificação de tal grau (diminuto) de ilicitude do comportamento da ré, em conjugação com a sua actual situação económico-financeira (e sem qualquer actividade), reflexo de uma crise vivida no país e que na douta sentença recorrida se reconhece afectar fortemente empresas com a dimensão da ré, H) Deverá levar à consideração de que é inequivocamente desproporcional e desadequada, no caso concreto, fixar-se a obrigação da ré em suportar o pagamento de uma indemnização correspondente a três vezes o valor dos créditos salariais devidos ao autor, que não conseguiu pagar. I) A sentença recorrida violou assim o disposto no n.º 1 do artigo 396º e n.º 3 do artigo 351º do Código do Trabalho, não valorando devidamente todos os elementos que em tais disposições se afirmam como essenciais e relevantes para o cômputo do valor da indemnização em causa. J) Pelo que a decisão recorrida deverá ser alterada, na parte em que condena a recorrente no pagamento ao autor de € 16.352,36 a título de indemnização pela cessação do seu contrato de trabalho, K) E substituída por outra, que determine que o cômputo de tal indemnização não deve exceder o valor correspondente a 15 dias de retribuição base por cada ano completo de antiguidade do autor, por ser esse o valor adequado e proporcional à factualidade provada no caso concreto.». * O recorrido não respondeu ao recurso.* O recurso foi admitido, como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo.* Neste tribunal, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer, o qual não foi objecto de resposta, em que concordando com a motivação e respectivas conclusões da recorrente, se pronuncia pela procedência do recurso.* Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.* II. Objecto do recursoO objecto dos recursos é delimitado pelas conclusões das alegações de recurso, como resulta do disposto nos artigos 684.º, n.º 3 e 685.º-A, n.º 1, do Código de Processo Civil, ex vi do artigo 1.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo do Trabalho. Assim, tendo em conta as conclusões da recorrente são as seguintes as questões essenciais decidendas: (i) saber se existe fundamento para alterar a matéria de facto; (ii) saber se a indemnização de antiguidade fixada ao apelado (30 dias de retribuição por cada ano ou fracção) se mostra excessiva, devendo a mesma ser fixada em 15 dias de antiguidade. * III. Factos A) A 1.ª instância deu como provada a seguinte factualidade: 1. O Autor foi admitido ao serviço da Ré em 1 de Junho de 1986, mediante a celebração de contrato individual de trabalho sem termo, tendo ficado sob as ordens, direcção e fiscalização da Ré a partir daquela data; 2. O Autor foi admitido pela Ré para desempenhar as funções correspondentes à categoria profissional de Pasteleiro de Primeira, sendo o seu local de trabalho a pastelaria da Ré denominada “P…”, sita na Rua …; 3. O Autor trabalhou por conta, sob a autoridade e direcção da Ré, de 1 de Junho de 1986 até 11 de Dezembro de 2009; 4. O Autor viria a fazer cessar o contrato individual de trabalho com justa causa, por carta registada, datada de 9 de Dezembro de 2009, com efeitos a partir de 11 de Dezembro de 2009, tendo invocado como fundamentos constitutivos de justa causa para a cessação do contrato de trabalho, a falta culposa de pagamento pontual da retribuição; 5. Em Dezembro de 2009, o Autor tinha a categoria profissional de Pasteleiro de Primeira e auferia da Ré a remuneração base mensal de €6 98,32, acrescida de subsídio de alimentação no montante fixo de € 91,00 mensais e do montante mensal fixo de € 349,16, devido a título de compensação devida pelo trabalho nocturno com carácter regular que o autor prestava; 6. Em Maio de 2009 a Ré deixou de pagar pontualmente a retribuição do autor, estando por liquidar ao autor as retribuições referentes aos meses de Maio a Novembro de 2009; 7. Em Julho de 2009, por conta das retribuições em atraso a Ré liquidou ao Autor € 700,00, que este recebeu através de depósito, na conta bancária n.º … do M…; 8. Do dia 6 de Julho de 2009 ao dia 4 de Agosto de 2009, o A. não prestou trabalho a favor da Ré, em virtude de se encontrar temporariamente incapacitado para o efeito, por assistência a familiares”; 9. Encontra-se por liquidar ao autor o subsídio de férias vencido em 1 de Janeiro de 2009, bem como o proporcional do subsídio de férias e de Natal referente ao trabalho prestado no ano de 2009; 10. Ao ter deixado de receber o salário que lhe era devido a partir de Maio de 2009, o autor ficou apreensivo e ansioso; 11. O autor ao ver-se privado do seu salário ao longo de sete meses passou a viver numa situação de grandes dificuldades financeiras; 12. O autor é viúvo e tem pelo menos a seu encargo um filho menor; 13. O autor passou a não ter condições económicas para poder honrar os seus compromissos; 14. O autor viveu momentos de tristeza, por não poder fazer face aos seus compromissos financeiros, tendo recorrido à ajuda financeira de familiares e amigos; 15. A Ré liquidou ao Autor 50% do valor da retribuição total referente ao mês de Maio de 2009; 16. A Ré desde há já alguns anos se tem vindo a debater com crescentes dificuldades económicas e financeiras, tendo vindo ao longo do tempo a “endividar-se” junto da Banca, de modo a conseguir continuar a cumprir as suas obrigações; 17. No decurso do ano de 2009 a Ré deixou de conseguir fazer face ao pagamento dos salários dos seus trabalhadores; 18. A Ré decidiu reabrir os seus estabelecimentos no mês de Dezembro de 2009; 19. Com o objectivo de aproveitar os proventos que lhe poderiam advir do período de festas, natal e ano novo, tradicionalmente um dos períodos do ano em que mais vendia os seus artigos de pastelaria, e com isso, poder tentar regularizar o pagamento dos salários aos seus trabalhadores; 20. Antes de terminar o mês de Novembro de 2009, a Ré contactou o autor, tal como contactou outros dos seus trabalhadores, informando-o da necessidade de reiniciar o exercício das suas funções, de modo a assegurar o reinício da produção da empresa; 21. Na mesma altura, foi informado de que lhe poderia ser paga uma parte das retribuições em dívida, cerca de 3 meses de salário, e que seria retomado o pagamento mensal das retribuições que lhe eram devidas; 22. Foi na sequência deste contacto que a Ré com ele estabeleceu, que o Autor se recusou a reiniciar o exercício das suas funções na empresa; 23. Foi só em consequência deste contacto, estabelecido pela Ré, que o A lhe remeteu a comunicação de resolução do seu contrato de trabalho, com justa causa. * IV. Enquadramento JurídicoComo se afirmou supra (sob n.º II), as questões essenciais decidendas centram-se em determinar (i) se existe fundamento para alterar a matéria de facto fixada pelo tribunal recorrido, mais concretamente no sentido de dar como provados os factos que constam dos quesitos 12.º e 18.º da Base instrutória e (ii) se a indemnização por resolução do contrato fixada ao Autor se mostra ajustada ao caso. Analisemos, de per si, cada uma das questões. * 1. Da impugnação da matéria de facto.A recorrente impugna a matéria fixada pelo tribunal recorrido no que aos artigos 12.º e 18.º da base instrutória respeita, por considerar, muito em resumo, que os depoimentos prestados pelas testemunhas V… e AC… impunham a resposta positiva aos mesmos, quando, é certo, e ao invés, o tribunal os deu como não provados. Vejamos. Estipula o artigo 685.º-B, do Código de Processo Civil, na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24-08: «1. Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. 2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados e seja possível a identificação precisa e separada dos depoimentos, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso no que se refere à impugnação da matéria de facto, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda, sem prejuízo da possibilidade de, por sua iniciativa, proceder à respectiva transcrição. 3. (…). 4. Quando a gravação da audiência for efectuada através de meio que não permita a identificação precisa e separada dos depoimentos, as partes devem proceder às transcrições previstas nos números anteriores». No caso em apreciação, a recorrente indica não só os concretos pontos da matéria de facto que impugna (artigos 12.º e 18.º da Base instrutória), como também os concretos meios probatórios em que funda tal impugnação (os aludidos depoimentos, que localiza e transcreve). Nada obsta, por isso, a que se conheça da referida impugnação. * São do seguinte teor, os artigos 12.º e 18.º da Base instrutória:«12º Para o efeito, para voltar à actividade, a Ré contava com o aqui A, um dos trabalhadores do sector que assegurava o fabrico próprio dos bolos e demais pastelaria que constituía o objecto da actividade, e cujo contrato continuava em vigor?»;«18º A Ré actualmente não tem qualquer actividade e, por isso, não tem quaisquer ganhos, encontrando-se em desequilíbrio económico-financeiro e com total falta de liquidez?».A tais artigos o tribunal recorrido respondeu «Não Provados». Consta da respectiva motivação da matéria de facto que foi dada a resposta negativa (aos artigos em causa, bem como a outros), «(…) porque relativamente aos factos que constam dos mesmos não foi efectuada qualquer prova convincente, ou porque a prova efectuada revelou-se de manifestamente insuficiente para dar tais factos como provados ou porque outros factos que resultaram provados contradizem estes.». Ora, relativamente ao artigo 12.º da Base Instrutória, V… (que foi trabalhador da Ré, tendo o contrato cessado em Dezembro de 2009), afirmou, além do mais, que os trabalhadores tinham noção das dificuldades que a empresa estava a atravessar – até porque esta chegou a ter 21 trabalhadores e “ultimamente” eram cerca de metade –, e que a empresa “contava” com ele, assim como, “presume”, com os colegas para retomar a actividade. De igual modo, a testemunha AC… (também trabalhador da Ré) afirmou que a empresa lhe disse que “tinha falado” com todos os trabalhadores (incluindo o Autor) para reiniciarem funções em Dezembro de 2009, mas que só ele viria a reiniciar as mesmas. Dos referidos depoimentos, parece poder concluir-se que continuando a empresa Ré a ter nos seus quadros vários trabalhadores, contava com eles (incluindo o Autor) para reiniciar a actividade. Não se vislumbra que outra prova produzida, ou outros factos dados como provados afastem tal conclusão. Aliás, a resposta positiva a tal artigo parece harmonizar-se com o que consta dos n.ºs 18 a 20 da matéria de facto: em síntese, que a Ré decidiu reabrir os estabelecimentos e, para tanto, antes de finais de Novembro de 2009 contactou o Autor e os outros trabalhadores. Assim, e salvo o devido respeito por entendimento diverso, entende-se ser de dar como provado, no essencial, o que consta do artigo 12.º da Base Instrutória. Nesta sequência, acrescenta-se à “matéria de facto” um facto, sob o n.º 24, com o seguinte teor: «Para voltar à actividade, a Ré contava com o aqui Autor, um dos trabalhadores do sector que assegurava o fabrico próprio dos bolos e demais pastelaria que constituía o objecto da sua actividade». Em relação ao artigo 18.º da Base Instrutória, a referida testemunha AC… confirmou que a Ré se encontrava sem actividade (à data da audiência de julgamento – Dezembro de 2010 – ele encontrava-se a desempenhar funções nas anteriores instalações da Ré, por conta de outra entidade – PR…) e que se apercebeu que a mesma estava com dificuldades económicas cerca de dois anos antes, quando não foi pago pontualmente um subsídio de férias. Em face de tal depoimento, que se afigura credível e objectivo, entende-se poder dar como provado, sem hesitação, que a Ré, em Dezembro de 2009, não tinha actividade. Mas o mesmo se diga em relação à restante factualidade perguntada no artigo 18.º da Base Instrutória (se a Ré não tem quaisquer ganhos, se encontra em desequilíbrio económico-financeiro e com total falta de liquidez). Para além do referido depoimento, a resposta positiva à mesma é consentânea com outra matéria de facto provada, maxime nos artigos 16.º, 17.º, 18.º e 19.º da matéria de facto. Assim, acrescenta-se à “matéria de facto” um facto, sob o n.º 25, com o seguinte teor: «Em Dezembro de 2009 a Ré não tinha actividade, não tinha ganhos, encontrando-se em desequilíbrio económico-financeiro e com falta de liquidez». Procedem, por consequência, nesta parte, as conclusões das alegações de recurso, aditando-se à matéria de facto, os factos com os n.º 24 e 25, com o teor supra referido. * 2. Da indemnização de antiguidadeO tribunal recorrido após analisar e decidir que o Autor/apelado resolveu com justa causa o contrato de trabalho – face à falta de pagamento pontual da retribuição –, fixou a indemnização em 30 dias por cada ano de antiguidade ou fracção. Para tanto, escreveu-se na sentença recorrida: «De acordo como disposto no art. 396º n.º 1 do C.T. 2009 o trabalhador que opte pela resolução do contrato de trabalho quando a falta de pagamento pontual da retribuição se prolongue por um período superior a 60 dias sobre a data do vencimento tem direito a uma indemnização por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos que deve corresponder a uma indemnização a fixar entre quinze e quarenta e cinco dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade e no caso de fracção de ano o valor é calculado proporcionalmente – ver n.º 2 do citado artigo. Por outro lado, a indemnização a atribuir ao trabalhador não pode ser nunca inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades – ver n.º 1 in fine do citado artigo. Em face da posição por nós acima assumida no sentido de considerarmos verificada a resolução do contrato nos termos previstos no nºs 2 al. a) e 5 do art. 394º do C.T. 2009, tem o autor direito à indemnização a que alude o citado artigo 396º n.º 1 do C.T. 2009. Tendo em atenção o disposto no art. 396º nºs 1 e 2 do C.T.2009, o facto do autor ter uma antiguidade reportada a 1/06/1986 e cabendo ao Tribunal fixar o montante, entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, atendendo ao valor da retribuição auferida pelo autor e ao circunstancialismo do caso, não podendo a indemnização ser inferior a três meses de retribuição base e diuturnidades, afigura-se-nos adequado e proporcional à situação em concreto, tendo em atenção a crise económica que o País atravessa que se vem reflectindo nas dificuldades reais que vivem as pequenas e médias empresas, na qual se insere a empresa Ré, a culpa do empregador e a gravidade da sua conduta, decide-se fixar a indemnização atribuir ao autor no montante correspondente a 30 dias de vencimento por cada ano completo ou fracção de antiguidade. Procedendo agora ao cálculo do valor da indemnização devida ao autor tendo por referência o valor do seu vencimento base no montante de €698,32, bem como o facto de para efeitos de antiguidade ser considerada a data de 1/06/1986 e tendo o contrato terminado em 11/12/2009 é devida ao autor a indemnização global de €16.352,36, assim calculada: €698,362x 23 (anos) + €698,32:12 x 5 (meses).». A Ré/apelante não questiona que o Autor/apelado tenha resolvido o contrato com justa causa, por falta de pagamento pontual da retribuição, e, assim, que tenha direito a uma indemnização por antiguidade; o que ela questiona é que prevendo a lei que essa indemnização seja fixada entre 15 e 45 dias por cada ano de antiguidade ou fracção, o tribunal recorrido a tenha fixado em 30 dias. É, pois, apenas esta a questão que urge decidir. Como decorre do disposto no artigo 396.º, n.ºs 1 e 2, conjugado com o n.º 2 do artigo 394.º, ambos da Lei n.º 7/2009, de 12 de Fevereiro de 2009, que aprovou o Código do Trabalho (é incontroverso que tendo os factos ocorrido na vigência deste compêndio legal, é o mesmo aplicável ao caso), em caso de resolução do contrato por falta culposa de pagamento pontual da retribuição, o trabalhador tem direito a indemnização a fixar entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade, «(…) atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude do comportamento do empregador (…)», sendo que em caso de fracção de ano de antiguidade, o valor da indemnização é calculado proporcionalmente. Isto é, nos termos da lei, o trabalhador deve ser indemnizado pelos danos sofridos, sendo que a quantificação dos dias de indemnização deverá ter em conta: (i) o valor da retribuição do trabalhador; (ii) o grau de ilicitude do comportamento do empregador, o mesmo é dizer, a antijuricidade da conduta do empregador que desencadeou a resolução do contrato pelo trabalhador. No caso que nos ocupa, a resolução do contrato teve o seu fundamento na falta de pagamento pontual da retribuição, sendo certo que constitui dever do empregador pagar pontualmente a retribuição (cfr. artigo 127.º, n.º 1, alínea b), do Código do Trabalho). Essa falta de pagamento pontual da retribuição, que se prolongou por período superior a 60 dias, é de considerar culposa (n.º 5 do artigo 394.º do Código do Trabalho). Não obstante o que se deixa assinalado, e tendo em vista a fixação da indemnização e, com ela, o comportamento da Ré que desencadeou a resolução do contrato, importa ponderar que: - a falta de pagamento pontual da retribuição se prolongou pelo período de Maio a Novembro de 2009, sendo certo que o trabalhador resolveu o contrato de trabalho em Dezembro de 2009 (n.ºs 4 e 6 dos factos provados); - a Ré desde há alguns anos que se vinha debatendo com crescentes dificuldades económicas e financeiras, tendo vindo ao longo do tempo a endividar-se junto da Banca e no decurso de 2009 deixou de conseguir fazer face ao pagamento dos salários aos trabalhadores (n.º s 16 e 17); - entretanto, a Ré, que não tinha actividade e se encontrava em desequilíbrio económico e financeiro, em Dezembro de 2009 decidiu reabrir os estabelecimentos, procurando aproveitar os proventos da actividade que habitualmente decorrem das festas de Natal e Ano Novo e, assim, regularizar o pagamento dos salários dos trabalhadores (n.ºs 18, 19 e 25); - Com aquele intuito (de reiniciar as funções), antes do final de Novembro de 2009, e uma vez que para esse efeito contava com o Autor, contactou o mesmo (assim como outros dos trabalhadores), informando-o de que lhe poderia ser paga parte das retribuições em dívida (cerca de 3 meses de salário) e que seria retomado o pagamento mensal das retribuições devidas (n.ºs 21 e 24); - Na sequência de tal contacto que a Ré estabeleceu com o Autor, este recusou reiniciar as funções naquela e comunicou-lhe a resolução do contrato com justa causa. Ora, perante tal factualidade, embora se possa afirmar a existência de comportamento culposo da Ré – ao não ter pago pontualmente a retribuição durante mais de 60 dias –, o mesmo assume diminuta gravidade; basta para tanto ponderar que a Ré já há alguns anos se vinha debatendo com dificuldades económicas, recorrendo, por isso, ao endividamento junto da Banca e logo que viu a possibilidade de se abrir uma “janela de oportunidades” para voltar à actividade, em Dezembro de 2009, procurou aproveitar a mesma e, assim, cumprir as suas obrigações legais com o Autor. Numa época em que, cada vez mais, muitas empresas se vêm debatendo com dificuldades económico-financeiras e em que o espectro do desemprego paira sobre muitos dos seus trabalhadores, não pode deixar de se assinalar a atitude, louvável, da Ré que tudo parece ter feito para prosseguir a actividade e assim evitar colocar os seus trabalhadores no desemprego. Daí que, volta-se a sublinhar, se entenda que o comportamento da Ré assumiu diminuta ilicitude. Na ponderação da quantificação da indemnização não poderá também deixar de se atender à retribuição, modesta, do Autor – € 698,32 de retribuição mensal base, € 91,00 de subsídio de alimentação e € 349,16 pela prestação do trabalho nocturno – e às dificuldades por ele enfrentadas face ao não pagamento pontual da retribuição (cfr. factos provados n.ºs 10 a 14). Além disso, não poderá também olvidar-se que situando-se o limite médio da indemnização (entre os 15 e os 45 dias) nos trinta dias, existem outras disposições Código do Trabalho que, implicando a extinção da relação laboral sem imputação de culpa, seja ao trabalhador, seja ao empregador, conferem àquele o direito a uma compensação correspondente a um mês de retribuição base e diuturnidades, (cfr. artigos 366.º, 372.º e 379.º, do Código do Trabalho). Ponderados estes elementos e enfatizando, mais uma vez, o esforço feito pela Ré no sentido de reabrir os estabelecimentos e assim manter o contrato de trabalho com o Autor, apenas este tendo resolvido o mesmo na sequência daquela manifestação de vontade da empregadora, julga-se como razoável e adequada a indemnização de vinte (20) dias por cada ano de antiguidade ou fracção. Nesta sequência, é devida ao Autor a título de indemnização de antiguidade o valor de € 10.901,55 [€ 10.707,57 (€ 698,32: 30 x 20 x 23 anos) + € 193,98 (€ 698,32: 30 x 20: 12 meses x 5 meses)]. E, tendo em conta a importância de € 5.896,81 devida ao Autor a título de créditos salariais, em que a Ré foi condenada na 1.ª instância, e que não vem questionada, o valor total da importância em dívida ao Autor ascende a € 16.798,36. Procedem, por isso, parcialmente, nesta parte, as conclusões das alegações de recurso. * Vencidos no recurso, quer a Ré/apelante, quer o Autor/apelado, deverá cada um deles suportar o pagamento das custas respectivas.* V. DecisãoFace ao exposto, acordam os juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora em julgar parcialmente procedente o recurso interposto por J... Lda, e, em consequência: 1. Aditam-se à matéria de facto, os seguintes factos, sob os n.º 24 e 25: «24.Para voltar à actividade, a Ré contava com o aqui Autor, um dos trabalhadores do sector que assegurava o fabrico próprio dos bolos e demais pastelaria que constituía o objecto da sua actividade. 25. Em Dezembro de 2009 a Ré não tinha actividade, não tinha ganhos, encontrando-se em desequilíbrio económico-financeiro e com falta de liquidez». 2. Revoga-se a sentença recorrida, na parte em que condenou a Ré a pagar ao Autor A... a quantia de € 22.249,17 (sendo € 16.352,36 a título de indemnização de antiguidade e € 5.896,81 a título de créditos salariais vencidos), que se substitui pela condenação da mesma Ré a pagar ao Autor a quantia de € 16.798,36, sendo € 10.901,55 de indemnização de antiguidade (fixada em 20 dias por cada ano de antiguidade ou fracção) e € 5.896,81 a título de créditos salariais vencidos. Custas pela Ré/apelante e pelo Autor/apelado na proporção do decaimento. * (Em cumprimento do disposto no artigo 713.º, n.º 7, do Código de Processo Civil, elabora-se sumário, em documento anexo). * Évora, 07 de Junho de 2011 ………………………………………… (João Luís Nunes) ………………………………………….. (Acácio André Proença) ………………………………………….. (Joaquim Manuel Correia Pinto)
__________________________________________________ [1] Relator: João Nunes; Adjuntos: (1) Acácio Proença, (2) Correia Pinto. |