| Acórdão do Tribunal da Relação de  Évora | |||
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| Relator: | ELISABETE VALENTE | ||
| Descritores: | ASSEMBLEIA DE CONDÓMINOS ANULAÇÃO DE DELIBERAÇÕES LEGITIMIDADE PASSIVA | ||
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| Data do Acordão: | 10/17/2013 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
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| Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
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| Sumário: | I - Quem deve figurar como parte passiva em acção onde se pede a anulação de deliberações de Assembleia-geral de condóminos são os condóminos que votaram a deliberação em causa, pois: II -Não estamos no âmbito dos poderes do administrador para que possa ser parte em juízo nos termos do art.º 6º, al. e), do C.P.C. já que, em matéria de deliberação da assembleia de condóminos o administrador não tem quaisquer poderes nem exerce qualquer função administrativa. III - Pode até ser, ele próprio administrador, um condómino não votante e opositor da deliberação em crise. IV - O facto do legislador ter previsto que o administrador represente judicialmente os condóminos no art. 1443º nº 6 do CC é decisivo para afastar a legitimidade do próprio condomínio e dá sentido à conclusão de que a acção deve ser proposta contra os condóminos e não contra o condomínio. Sumário da relatora | ||
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| Decisão Texto Integral: | Acordam, em audiência, os juízes da secção cível do Tribunal da Relação de Évora: 1- Relatório: A 26.11.2011, no Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal, B... instaurou acção declarativa sob forma sumária contra N..., na qualidade de administrador do Condomínio do prédio sito nos nºs 36,37,38ª e 40 da Avenida … em …, pedindo a anulação das deliberações da Assembleia Geral de 29 de Setembro de 2011, de condóminos do referido prédio. Alegou a A, em síntese, que, tal assembleia se efectuou sem que a Autora tivesse sido regularmente convocada, pelo que, não pode participar das deliberações que também lhe dizem respeito, não prescindindo de estar presente. Contestou o Réu negando a irregularidade da convocação. Foi elaborado Despacho Saneador, onde se decidiu que se verificava a excepção dilatória da ilegitimidade e o Réu foi absolvido da instância. Da decisão que julgou a excepção de ilegitimidade procedente recorreu a Autora pedindo a revogação da mesma e formulou as seguintes conclusões (após convite ao aperfeiçoamento): «1- A pretensão da recorrente com os fundamentos invocados para a revogação da douta sentença proferida pelo tribunal a quo é legitima. 2- A douta sentença viola claramente o vertido nos arts. 1433º e 1437º do CPC, uma vez que nas acções anulatórias de deliberações tomadas pela assembleia de condóminos, o administrador é parte legitima como réu sempre que aquelas respeitem às partes comuns. Aliás trata-se no fundo, do corolário do art. 1436º do CC que prevê a sua legitimidade como Autor ou como Réu, sendo que devia o tribunal a quo ter determinado que o Réu, aqui recorrido, nesta qualidade, tem legitimidade passiva, em matéria de suspensão/anulação de deliberações condomínios. 3 – A douta sentença viola o disposto nos arts. 508º nº 1 e nº 2 e art. 265º, ambos do CPC, porquanto, ainda que se entendesse e perfilhasse a douta opinião da meritíssima juíza a quo no sentido de estarmos perante a excepção de ilegitimidade, sempre se dirá que, a douta decisão violou a lei uma vez que, findos os articulados, devia ter sido proferido despacho a convidar a Autora, ora recorrente a providenciar pelo suprimento da excepção dilatória de preterição de consórcio necessário requerendo a intervenção principal passiva dos demais condóminos. Nestes termos nos melhores de direito e com o mui douto suprimento de V. Exas. ilustres juízes desembargadores, deve ser dado provimento ao recurso e prolatado douto acórdão que revogue a douta sentença e considere o Réu parte legitima, devendo para o efeito os autos baixar à 1ª instância para ulteriores termos do processo. Pois só assim se fará justiça » Colhidos os vistos legais e nada obstando ao conhecimento do objecto do recurso, cumpre apreciar e decidir. As factos provados com interesse para a decisão são os que constam do supra relatório. 2 – Objecto do Recurso: Questões a decidir tendo em conta o objecto do recurso delimitado pela recorrente nas conclusões das suas alegações, nos termos do artigo 684º, nº 3 CPC, por ordem lógica e sem prejuízo do conhecimento de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil (Significa isso que, todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, têm de se considerar decididas e arrumadas, não podendo delas conhecer o tribunal de recurso): Quem deve figurar como parte passiva em acção onde se pede a anulação de deliberações de Assembleia-geral de condóminos (Administrador do condomínio ou condóminos que votaram a deliberação em causa)? 3. Análise do Recurso: Como acima referimos, o que importa analisar é tão só a questão de saber se o Réu, na qualidade de administrador do condomínio, tem legitimidade para ser demandado na presente acção, em que vem pedida a anulação da deliberação tomada em assembleia geral dos condóminos. A recorrente sustenta a posição afirmativa, alegando que, em termos práticos isso evita as dificuldades de fazer citar e intervir todos os condóminos. Têm existido divisão na jurisprudência. Estamos com aqueles que defendem o entendimento expresso na decisão recorrida – vide entre outros, Acs. STJ de 29.05.2007, proc. nº 07ª1484, CJ/STJ, 2007, 2º, p. 97, de 24.06.2008, proc. nº 08ª1755, de 6.11.2008, proc nº 08B2784; de 29/11/2006, Proc. 06A2913, da RP de 09-02-1993, Proc.º 9240946 e de 27-01-2011, Proc. 2532/08.3TBVCD.P1, de 15.05.2012, proc. nº 570/11.8TJPRT.P1 e de 27.01.2011, proc. nº 2532/08.3TBVCD.P1, todos acessíveis em www.dgsi.pt. E, também para nós, faz sentido esse entendimento. De facto, nos termos do art.º 6º, al. e), do C.P.C., tem personalidade judiciária” o condomínio resultante da propriedade horizontal relativamente às acções que se inserem no âmbito dos poderes do administrador”. O critério é pois saber se estamos no âmbito dos poderes do administrador para que possa ser parte em juízo, ou, caso contrário, compete aos condóminos, agir em juízo em seu nome próprio. Ora, em matéria de deliberação da assembleia de condóminos o administrador não tem quaisquer poderes nem exerce qualquer função administrativa. Pelo contrário, como se pode ler no Ac. STJ de 29-11-2006, Proc.º 06A2913, in www.dgsi.pt, que seguimos de perto: « A apreciação e votação das questões submetidas à assembleia de condóminos só a estes pertence, não desempenhando, nessa sede, o administrador, qualquer papel. O que lhe compete, isso sim, é o dever de executar as deliberações da assembleia (art.º 1436 b) do C.C.) e nessa actividade funcional, se porventura a execução da deliberação tiver a ver com actos conservatórios relativos às partes comuns, já nada impedirá que o condomínio prejudicado, por ex, accione directamente o administrador. Então, estaremos em pleno âmbito do disposto no art.º 1437, nº 2. Mas, não é esta a perspectiva do art.º 1433º. Segundo o nº 1 do preceito “as deliberações da assembleia contrárias à lei ou a regulamentos anteriormente aprovados são anuláveis a requerimento de qualquer condómino que os não tenha votado”, o que significa que a conduta pode ser sancionada com a anulabilidade, isto é, a deliberação contrária à lei ou ao regulamento, é da exclusiva responsabilidade dos condóminos que a votarem, não envolvendo o exercício de qualquer poder ou desempenho de funções da parte do administrador, enquanto tal. Em certos casos, o administrador pode mesmo ser ele próprio um condómino não votante e opositor da deliberação em crise, situação em que muito mal se entenderia a sua intervenção promovendo os interesses dos condóminos que votaram a deliberação impugnada.» Assim, as acções de impugnação das deliberações tomadas pela assembleia de condóminos são propostas contra os condóminos atenta a falta de personalidade judiciária do condomínio e a ausência de especial solução consagrada pelo legislador que permita supri-la. O facto do legislador ter previsto que o administrador represente judicialmente os condóminos não significa que a acção deva ser proposta contra os condóminos que votaram a favor da aprovação deliberação da deliberação impugnada, enquanto titulares do interesse relevante em contradizer. Aliás, o facto de se prever essa representação, dá sentido á conclusão de que a acção deve ser proposta contra os condóminos e não contra o condomínio. Como refere o Ac. STJ de 6.11.2008, proc nº 08B2784: «O art. 1433º não o refere expressamente; mas fornece uma pista importantíssima, ao aludir, no seu n.º 6, aos «condóminos contra quem são propostas as acções». Este n.º 6 é, desde logo, decisivo no afastar da legitimidade do próprio condomínio, e no afirmar da legitimidade dos condóminos, apenas suscitando algumas dúvidas quanto a saber quais os condóminos contra quem a acção deve ser proposta. (…) Em suma: a nosso ver, e não obstante alguma controvérsia jurisprudencial sobre a questão, a acção de anulação de deliberação da assembleia de condóminos tem como réus apenas os condóminos, individualmente considerados, que, presentes ou representados na dita assembleia, hajam aprovado a deliberação. É contra eles que a acção deve ser proposta. Todavia, de acordo com o disposto no n.º 6 do art. 1433º, eles são representados na acção pelo administrador ou por pessoa que a assembleia designar para esse efeito, razão por que, na petição inicial, deve (ou pode, como melhor se verá) ser pedida a citação de todos eles na pessoa incumbida da sua representação judiciária.» Embora o art. 1437º nº 2 do CC disponha que «o administrador pode também ser demandado nas acções respeitantes ás partes comuns do edifício», deve entender-se que é assim quando se trata de relações com terceiros e não está em causa a anulação de uma deliberação do condomínio (mas sim outro tipo de acção, como por exemplo, na sequência de reparação defeituosa nas partes comuns do imóvel). Quanto à preocupação da recorrente relativa ás dificuldades de fazer citar e intervir todos os condóminos, para obstar a tal dificuldade basta a autora pode pedir que a citação se faça no administrador, coisa diferente de intentar a acção contra ele. A recorrente também não tem razão, quando afirma que o Mmº juiz “a quo” não podia ter decidido que existia ilegitimidade passiva, mas antes deveria ter convidado a Autora a suprir tal excepção requerendo a intervenção principal passiva dos demais condóminos. É que o Réu nos presentes autos não poderia permanecer na acção nos termos em que está configurada a sua intervenção. A acção foi proposta contra o mesmo na qualidade de administrador do condomínio e não como condómino (aliás nem se sabe se foi votante na deliberação em causa e em que sentido votou). Nos termos do art. 269º do CPC só é possível sanar a ilegitimidade quando se trate de litisconsórcio necessário e assim para além dos que já estão na acção, devem estar outros e por isso são chamados os que faltam. Ora, no caso dos autos, faltam todos, porque quem está na acção é o réu a título de administrador e a esse título não pode estar. Não cabe por isso o recurso ao mecanismo invocado pela Autora. Improcedem, pelo exposto, as conclusões da recorrente. 4. Dispositivo Pelo exposto, em audiência, os juízes da secção cível do Tribunal da Relação de Évora acordam em julgar totalmente improcedente o recurso de apelação interposto confirmando-se, consequentemente, a decisão recorrida. Custas do recurso de apelação a cargo da recorrente. Évora, 17.10.2013 Elisabete Valente Maria Cristina Cerdeira Maria Alexandra Afonso de Moura Santos |