Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | SÉRGIO CORVACHO | ||
Descritores: | HOMICÍDIO QUALIFICADO CO-AUTORIA CUMPLICIDADE IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO | ||
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Data do Acordão: | 10/18/2018 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
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Sumário: | I - À luz da lógica e da normalidade das coisas, quando duas pessoas intervêm numa conduta que tem como alvo um terceiro, a atuação é concertada e os propósitos são conjuntamente assumidos. II - Se outras razões não houvesse, o comportamento do arguido recorrente ao ter apertado o pescoço da vítima, puxando ele de um lado e o coarguido do outro uma meia de vidro enrolada à volta dessa parte do corpo, foi inequivocamente demonstrativo da sua assunção do propósito de matar este ofendido, já que qualquer pessoa sabe que o descrito procedimento é idóneo a causar a asfixia e consequentemente a morte a quem seja alvo dele. III - O facto de ofendido ter acabado por falecer em virtude dos ferimentos causados pelas facadas, que lhe foram desferidas pelo coarguido, é irrelevante para a responsabilização do recorrente, porquanto nada permite afirmar que ele tenha, de alguma forma, desistido do propósito de tirar a vida ao ofendido ou se tenha demarcado das facadas que o coarguido lhe infligiu. | ||
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, NA SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA I. Relatório Por acórdão do Tribunal Colectivo do Juízo Central Criminal de Santarém do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, proferido em 7/5/18 no Processo Comum nº 196/17.2JALRA, foi decidido: Pelo exposto, com os fundamentos invocados e de acordo com as disposições legais acima citadas, julga-se a acusação parcialmente procedente, por provada, e em consequência: a) Absolve-se o arguido LL quanto à prática de um crime de furto, na forma tentada, p. e p. no art. 203º/1, 22º/1 e 2 e 23º/1 e 2, do C. Penal. b) Absolve-se o arguido LL quanto à prática de um crime de abuso sexual de pessoa incapaz de resistência, p. e p. no art. 165º/1, e 2, do C. Penal. c) Absolve-se o arguido LL quanto à prática de um crime de furto, p. e p. no art. 203º/1, do C. Penal. d) Condena-se o arguido AA, pela prática de: - um crime de roubo qualificado na pessoa de CC, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 14.º, n.º 1 e do Código Penal e 210.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal, por referência ao art. 204.º, n.º 1, al. b) do mesmo diploma legal, na pena de 7 (sete) anos de prisão. - um crime de extorsão, na forma tentada, na pessoa de CC, p. e p. pelos artigos 22.º, 23.º, n.ºs 1 e 2, 14.º, n.º 1 e 223.º, n.º 1, todos do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 10 (dez) meses de prisão. - um crime de roubo qualificado na pessoa de AD , previsto e punido pelos artigos 14.º, n.º 1 e 210.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal, por referência ao art. 204.º, n.º 1, al. b) do mesmo diploma legal, na pena de 7 (sete) anos de prisão. - um crime de sequestro na pessoa de AD, p. e p. pelos artigos 14.º, n.º 1 e 158.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 5 (cinco) meses de prisão - um crime de roubo qualificado na pessoa de AP, p. e p. pelos artigos 14.º, n.º 1 e 210.º, n.º 1, e 2 do Código Penal, por referência ao art. 204.º, n.º 1, al. b) do mesmo diploma legal, na pena de 7 (sete) anos de prisão. - um crime de sequestro na pessoa de AP, p. e p. pelos artigos 14.º, n.º 1 e 158.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão. - um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 14.º, n.º 1, 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alínea g), todos do Código Penal, na pena de 20 (vinte) anos de prisão. - um crime de profanação de cadáver, p. e p. pelos artigos 14.º, n.º 1 e 254.º, n.º 1, al. a), ambos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão. - um crime de roubo qualificado na forma tentada (artigos 22.º, n.ºs 1 e 2 e 23.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal), na pessoa de AC, p. e p. pelos artigos 14.º, n.º 1 e 210.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal, por referência ao art. 204.º, n.º 1, al. b) do mesmo diploma legal, na pena de 4 (quatro) anos de prisão. e) Condena-se o arguido LL, pela prática de: - um crime de roubo qualificado na pessoa de AD, previsto e punido pelos artigos 14.º, n.º 1 e 210.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal, por referência ao art. 204.º, n.º 1, al. b) do mesmo diploma legal, na pena de 5 (cinco) anos de prisão. - um crime de sequestro na pessoa de AD, p. e p. pelos artigos 14.º, n.º 1 e 158.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão. - um crime de roubo qualificado na pessoa de AP, p. e p. pelos artigos 14.º, n.º 1 e 210.º, n.º 1 e 2 do Código Penal, por referência ao art. 204.º, n.º 1, al. b) do mesmo diploma legal, na pena de 5 (cinco) anos de prisão. - um crime de sequestro na pessoa de AP, p. e p. pelos artigos 14.º, n.º 1 e 158.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão. - um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artigos 14.º, n.º 1, 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alínea g), todos do Código Penal, na pena de 17 (dezassete) anos de prisão. - um crime de profanação de cadáver, p. e p. pelos artigos 14.º, n.º 1 e 254.º, n.º 1, al. a), ambos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão. - dois crimes de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelos artigos 14.º, n.º 1 do Código Penal e 3.º n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de03/05, com referência ao art. 121.º do Código da Estrada, na pena de 2 (dois) meses de prisão por cada um deles. e) Em cúmulo, pela prática dos crimes acima referidos, aplica-se ao arguido AA a pena única de 24 (vinte e quatro) anos de prisão. f) Em cúmulo, pela prática dos crimes acima referidos, aplica-se ao arguido LL a pena única de 20 (vinte) anos de prisão. g) Condena-se cada um dos arguidos nas custas do processo, as quais se fixam em 3 UC de taxa de justiça (art. 513º n.º 1 do Código de Processo Penal e art. 8º n.º 5, e tabela III do Regulamento das Custas Processuais) Julga-se ainda o pedidos de indemnização civil formulado pelos demandantes MR e NP parcialmente procedente, por provado, e em consequência: a) Condenam-se os arguidos no pagamento da quantia de € 10.000,00 (dez mil euros) ao demandante NP e de € 30.000,00 (trinta mil euros) à demandante MR, a título de indemnização por danos não patrimoniais por estes sofridos. b) Condenam-se os arguidos no pagamento da quantia de € 55.000,00 (cinquenta e cinco mil euros) aos demandantes, a título de indemnização por danos não patrimoniais (perda do direito à vida de AP). c) Condenam-se os arguidos no pagamento à demandante MR, da quantia de € 26.736,00 (vinte e seis mil setecentos e trinta e seis euros) a título de danos patrimoniais por esta sofridos. d) Condenam-se ainda os arguidos e os demandantes no pagamento das custas relativas ao pedido de indemnização civil, na proporção do respectivo decaimento (art. 527º n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil). Com base nos seguintes factos, que então se deram como provados (omitindo as condições pessoais e Registo Criminal do arguido não recorrente): Da acusação 1. No dia 19 de Abril de 2017, às 11h.13m., com o propósito de se encontrar com CC, advogada no concelho de Almeirim, contactou telefonicamente esta, através do número de telemóvel 9127---, solicitando-lhe os seus serviços; marcou um encontro com esta junto ao restaurante “Almourol”, pelas 14h.00m. 2. À hora marcada, CC, por indicação prévia do arguido AA, estacionou o seu veículo automóvel no parque de estacionamento do restaurante supra referido. 3. De seguida, o arguido dirigiu-se à viatura de CC, abriu a porta do lugar do pendura, entrou e sentou-se. 4. Em acto contínuo, o arguido AA retirou de dentro das calças que trajava um objecto com a aparência exterior de uma faca de tamanho médio e apontou-o à zona do abdómen de CC. 5. Simultaneamente, proferiu na direcção daquela, de modo brusco, a seguinte expressão: “A partir de agora vais fazer o que eu mandar. Segue”. 6. CC conduziu o seu veículo até uma estrada de terra batida, na direcção de Tancos, por determinação do arguido AA. 7. Aí, parou o veículo e, por determinação daquele, entregou-lhe todo o dinheiro que tinha, concretamente 60,00€ (sessenta euros) e dois cartões de débito, um do Banco Millennium e outro da Caixa Geral de Depósitos. 8. Após, e sempre empunhando o objecto com a aparência exterior de uma faca de tamanho médio, ordenou que CC saísse do carro. 9. O arguido AA aproximou-se daquela e, mais uma vez, de forma brusca, disse-lhe: “Fui contratado para matá-la a troco de 25.000,00€ (vinte e cinco mil euros); saí da prisão há 24 horas e estive preso no Norte durante 14 (catorze) anos”. 10. Ao ouvir as palavras proferidas pelo arguido AA, expressando as suas intenções, naquele circunstancialismo, CC começou imediatamente a chorar, dizendo, em simultâneo, que tinha filhos e netos que precisavam de sua ajuda e que nunca tinha feito mal a ninguém, concluindo que toda esta situação seria um equívoco. 11. Depois disto, o arguido AA simulou um telefonema para a suposta pessoa que encomendou o crime de homicídio, informando-o de que já não ia cometer qualquer crime por CC ter netos e não ter sido informado deste pormenor. 12. O arguido falou sempre em tom de voz alto, com o propósito de CC ouvir toda a conversa. 13. Assim que desligou a chamada, o arguido AA disse a CC que não iria matá-la, mas que esta teria que lhe entregar dinheiro para que pudesse fugir, ao que esta respondeu que € 25.000,00 não lhe era possível, mas que poderia entregar-lhe no máximo € 3.000,00. 14. Perante a conversa do arguido AA, CC concordou imediatamente em dar-lhe os 3.000,00€ (três mil euros) exigidos, tendo para o efeito pedido o NIB (número de identificação bancária). 15. De seguida, entraram no veículo automóvel por determinação do arguido AA e ocuparam as mesmas posições. 16. Aí, o arguido AA efectuou um telefonema a alguém que lhe indicou um NIB, o qual o arguido soletrava para que CC anotasse num cartão. 17. Após, CC, por indicação do arguido AA, iniciou a marcha e abandonou o local, seguindo em direcção a Torres Novas. 18. Chegados a Torres Novas, a hora não concretamente apurada, mas seguramente antes das 15h.35m., CC deixou o arguido AA junto da rotunda das bombas de gasolina, na zona industrial daquela cidade. 19. O arguido AA levou consigo o dinheiro e os dois cartões de débito da ofendida, no valor de 60,00€ (sessenta euros), fazendo-os seus, sabendo que pertenciam a esta. 20. Depois de ter deixado CC, o arguido AA entre as 15h.35m. do dia 19 de Abril de 2017 e as 22h.01m. do dia 22 de Abril de 2017 enviou-lhe várias mensagens escritas, do seu telemóvel com o número 91274---, e fez-lhe várias chamadas, solicitando a transferência bancária do valor acordado. 21. Apesar de ter sido constrangida pelo arguido AA, por meio de ameaça contra a sua vida, CC nunca efectuou qualquer transferência bancária para o NIB indicado por aquele. 22. Entre as 14h.00m. e hora não concretamente determinada do dia 19 de Abril de 2017, após ocorrência dos acontecimentos acima descritos, o arguido AA privou ilegitimamente CC da sua liberdade de movimentos. 23. O arguido AA sabia que todo o circunstancialismo a que submeteu CC, designadamente entrar na viatura desta e apontar-lhe uma faca, ordenar-lhe que fosse para um local isolado e dizer-lhe que tinha sido contratado para matá-la, era suficiente e adequado a que esta lhe entregasse todos os objectos de valor que tinha em sua posse e outros em momento futuro, conseguindo, assim, para si, um enriquecimento ilegítimo. 24. Mais sabia o arguido AA que CC era advogada, tendo sido esta a causa da marcação do encontro, pois solicitou-lhe os seus préstimos quando a contactou telefonicamente. 25. O arguido agiu de forma deliberada, livre e consciente, com o propósito concretizado de se introduzir no veículo automóvel de CC e de se apoderar ilegitimamente de todo o dinheiro e objetos com valor que encontrasse na posse desta, através de ameaça com perigo iminente para a vida e integridade física, pondo-a na impossibilidade de reagir, bem sabendo que aqueles não lhe pertenciam e que agia contra a vontade da legítima proprietária. 26. O arguido agiu de forma deliberada, livre e consciente, com o propósito alcançado de privar CC da sua liberdade de movimentos. 27. O arguido AA agiu ainda de forma deliberada, livre e consciente, com o propósito não alcançado de, com intenção de conseguir para si enriquecimento ilegítimo, constranger CC a uma disposição patrimonial no valor de 3.000,00€ (três mil euros), por meio de ameaça com mal importante para esta. 28. O arguido só não conseguiu concretizar os seus intentos por circunstâncias alheias à sua vontade. 29. Os arguidos, AA e LL, conhecem-se há vários anos. 30. No dia 27 de Abril de 2017, cerca das 22 horas, os arguidos, em cumprimento de um plano previamente traçado por ambos, encontravam-se no parque de estacionamento junto à zona de entrada do Hospital de Torres Novas, à espera que alguém entrasse num dos veículos automóveis aí estacionados. 31. No mesmo circunstancialismo de tempo e lugar, AD, empregada no refeitório do Hospital de Torres Novas, dirigiu-se ao seu veículo automóvel ligeiro de passageiros de marca “Renault”, modelo “Mégane”, azul escuro, com a matrícula -JS. 32. Ao verem AD a entrar na viatura, os arguidos, em cumprimento do plano elaborado, dirigiram-se imediatamente àquela e entraram; o arguido LL sentou-se no lado do pendura e o arguido AA sentou-se no banco de trás. 33. Acto contínuo, o arguido LL deu, em tom de voz alto, na direcção de AD, a seguinte ordem verbal: “Siga”. 34. Em cumprimento da ordem, AD colocou a sua viatura em funcionamento e iniciou a marcha. 35. Foi sobretudo o arguido LL que indicou o caminho a seguir, determinando que seguisse para Tomar e depois para a localidade Riachos. 36. Durante o percurso, ambos os arguidos disseram a AD que se fizesse tudo o que pretendiam nada de mal lhe aconteceria. 37. Ainda durante o trajecto, a dado momento, o arguido LL proferiu, em tom de voz alto, na direcção de AD, a seguinte expressão: “Dá-me os cartões”. 38. Com medo do que os arguidos lhe pudessem fazer, AD entregou ao arguido LL 2 (dois) cartões de débito, um do Banco Montepio e outro do Novo Banco, associados às suas duas contas bancárias. 39. O arguido LL guardou os dois cartões de débito. 40. Após, o arguido LL ordenou que AD lhe desse os códigos pin, o que fez por ter medo dos arguidos. 41. Acto contínuo, o arguido LL deu indicação a AD para conduzir até ao Entroncamento. 42. Aí chegados, o arguido LL e AD saíram do carro e dirigiram-se a uma caixa ATM da Caixa Geral de Depósitos, sita em Rua 5 de Outubro, enquanto o arguido AA permaneceu no interior deste sentado. 43. Junto à supra referida caixa ATM, AD, em cumprimento do que lhe dizia o arguido LL, introduziu, alternadamente, os seus cartões de débito, digitou os códigos pin, seleccionou a opção “ levantamentos” e retirou de cada uma das suas contas bancárias o valor de 20,00€ (vinte euros). 44. De seguida, regressaram ao veículo automóvel; ocuparam as suas posições e o arguido LL deu indicação a AD para andar às voltas dentro da cidade do Entroncamento. 45. A certa altura, o arguido LL determinou que AD estacionasse o veículo automóvel na berma da estrada. 46. Acto contínuo, o arguido AA chegou-se à frente e proferiu na direcção de AD a seguinte expressão: “Agora, para te veres livre de nós, tens de ligar a uma amiga.” 47. Por se encontrar aterrorizada com toda a situação, AD pegou no seu telemóvel com o número 916838--- e ligou para o número 919160---, pertencente à sua amiga e vizinha CS. 48. Por indicação dos arguidos, AD combinou encontrar-se com CS no parque de estacionamento do supermercado “Modelo” de Torres Novas, invocando como motivo o facto de a sua viatura estar avariada. 49. Assim, AD recebeu ordem dos arguidos para se dirigir ao local do encontro. 50. Volvidos alguns minutos, e já se encontrando junto ao parque de estacionamento do supermercado, os arguidos avistaram o veículo automóvel conduzido por CS e deixaram aproximar-se. 51. Quando ambos os veículos já se encontravam lado a lado, os arguidos viram que CS estava acompanhada de um homem, que no caso era o namorado desta. 52. De imediato, ordenaram a AD que arrancasse com o veículo automóvel, abandonando o local. Assim o fez. 53. O arguido LL, de seguida, determinou que os conduzisse até Tomar novamente. 54. Chegados à cidade de Tomar, o arguido LL disse para AD estacionar a viatura junto a uma caixa ATM do Banco BPI, sita em Rua Dr. Cândido Madureira. 55. Desta vez, o arguido AA e AD saíram do carro e dirigiram-se à referida máquina ATM, enquanto o arguido LL permaneceu sentado. 56. Junto à caixa ATM, o arguido AA, introduziu, alternadamente, os dois cartões de débito, digitou os códigos pin, seleccionou a opção “ levantamentos” e da conta bancária do banco Montepio levantou a quantia de € 120,00 e da outra, a de € 200,00. 57. De seguida, regressaram ao veículo automóvel; ocuparam as suas posições e o arguido AA deu indicação a AD para iniciar a marcha, em direcção a Atalaia. 58. Nesta localidade, AD estacionou a viatura, num local ermo, junto a umas árvores. 59. Cerca da 01h.50m., os arguidos deram a AD, para que os tomasse, três comprimidos de “Lorenin 1 mg”, dizendo-lhe que era para esquecer tudo o que se tinha passado e para dormir, bem como que precisava de o fazer caso quisesse ir ter com a sua família, o que a ofendida fez. 60. Volvidos alguns minutos, AD adormeceu profundamente. 61. O arguido LL ocupou o lugar de condutor e o arguido AA seguiu no lugar de pendura. Abandonaram o local. 62. Os arguidos dirigiram-se, então, até ao parque de estacionamento localizado nas traseiras do “Hotel Gameiro”, sito na Avenida Dr. José Eduardo Vítor das Neves, no Entroncamento. 63. Aí, os arguidos deixaram a ofendida dentro da viatura, onde viria a acordar sentada no banco do condutor. 64. De imediato, os arguidos abandonaram o local, levando consigo os seguintes objectos e quantias em dinheiro: a) 440,00€ (quatrocentos e quarenta euros); b) (2) dois cartões de débito, um do Montepio e outro do Novo Banco; c) 1 (um) telemóvel de marca e IMEI desconhecidos, no valor de 120,00€ (cento e vinte euros); d) 1 (uma) aliança em ouro amarelo, de valor não concretamente determinado, mas seguramente não inferior a 50,00€ (cinquenta euros). 65. Os arguidos apoderaram-se de objectos e quantias em dinheiro, no valor total de € 610,00 (seiscentos e dez euros) que pertenciam a AD. 66. Os arguidos mantiveram AD no interior da viatura desde cerca das 22 horas do dia 27 de Abril, até pelo menos às 2 horas da madrugada seguinte. 67. AD só acordou e se deu conta de que estava no parque de estacionamento cerca das 10 horas do dia 28 de Abril de 2017, quando foi encontrada pelos seus sobrinhos, BC e RS. 68. Os arguidos tinham perfeito conhecimento de que a conduta por si levada a cabo era suficiente e adequada a causar medo e inquietação a AD, pondo-a na impossibilidade de resistir, obrigando-a dar-lhes tudo o que pretendiam, tanto mais que se tratavam de dois homens totalmente desconhecidos para esta, com boa compleição física, no interior da viatura sem autorização, obrigando-a a cumprir tudo o que lhe determinavam, sob pena de algo de mal lhe acontecer. 69. Mais sabiam os arguidos que se introduziam num veículo de forma forçada, isto é, sem autorização da legítima proprietária e contra a vontade desta. 70. Os arguidos tinham perfeito conhecimento de que mantiveram AD privada da sua liberdade durante várias horas, sem para isso estarem legitimados. 71. Os arguidos agiram de forma deliberada, livre e consciente, mediante o cumprimento de um plano previamente gizado e em comunhão de esforços, com o propósito concretizado de se introduzirem no veículo automóvel de AD e de se apoderarem ilegitimamente de todo o dinheiro e objetos com valor que encontrassem na posse desta, através de ameaça com perigo iminente para a vida e integridade física, pondo-a na impossibilidade de reagir, bem sabendo que aqueles não lhes pertenciam e que agiam contra a vontade da legítima proprietária. 72. Os arguidos agiram ainda de forma deliberada, livre e consciente, mediante um plano previamente gizado e em comunhão de intentos, com o propósito alcançado de privar AD da sua liberdade de movimentos. 73. No dia 29 de Abril de 2017, cerca das 22h.20m., os arguidos, AA e LL, em cumprimento de um plano previamente elaborado, encontravam-se no parque de estacionamento do supermercado “Pingo Doce” de Torres Novas, escondidos atrás de uns arbustos, à espera que alguém entrasse num dos veículos automóveis aí estacionados. 74. No mesmo circunstancialismo de tempo e lugar, AC, subchefe de loja na empresa “X”, na superfície comercial do supra citado supermercado, dirigiu-se ao seu veículo automóvel ligeiro de passageiros de marca “Opel”, modelo “Astra”, cinzento e com a matrícula -IZ. 75. Ao verem AC a entrar na viatura, o arguido AA dirigiu-se imediatamente a esta, permanecendo o arguido LL, atrás dos arbustos, a vigiar. 76. Sucede, porém, que, como AC já tinha trancado as portas do veículo, o arguido AA não conseguiu entrar. 77. Não obstante, o arguido AA começou a bater no vidro da porta do lado do pendura, fazendo sinal com a mão para baixar. 78. Assustada, AC começou a gritar dentro do veículo automóvel; concomitantemente, o arguido AA deu a volta à viatura e começou a forçar o puxador da porta do lado do condutor e a dar murros no vidro, com o propósito de entrar naquele. 79. Apesar do medo que sentia naquele momento, AC ligou a sua viatura, fez marcha atrás e abandonou o local a alta velocidade. 80. Devido ao pânico, ao fazer as manobras para fugir, AC embateu com o seu veículo automóvel num dois pilares de sustentação dos toldos do parque de estacionamento. 81. AC ficou com muito medo do arguido AA e do que lhe podia ter acontecido se não tivesse as portas da viatura trancadas. 82. O arguido AA só não obrigou AC a entregar-lhe todos os seus pertences, incluindo dinheiro, porque não conseguiu introduzir-se na viatura. 83. A não concretização dos desígnios do arguido derivou de uma circunstância alheia à vontade deste, designadamente ao fecho das portas da viatura por AC assim que entrou na mesma. 84. O arguido AA tinha perfeito conhecimento de que a conduta por si levada a cabo era suficiente e adequada a causar medo e inquietação a AC, pondo-a na impossibilidade de resistir, obrigando-a dar-lhe tudo o que pretendia, só não tendo conseguido lograr os seus intentos por circunstâncias alheias à sua vontade. 85. Mais sabia o arguido que pretendia introduzir-se num veículo de forma forçada, isto é, sem autorização da legítima proprietária e contra a vontade desta. 86. O arguido AA agiu de forma deliberada, livre e consciente com o propósito não alcançado de se apropriar, com ilegítima intenção, de todos os bens móveis com valor que se encontrassem na posse de AC, mediante a ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física desta, pondo-a necessariamente na impossibilidade de resistir. 87. Só não conseguiu concretizar os seus intentos por circunstâncias alheias à sua vontade. 88. O arguido AA conheceu AP, há vários anos, por ocasião de uns negócios que celebraram tendo este sido testemunha de acusação no Processo n.º ---/10.5JALRA, que correu os seus termos nesta Comarca de Santarém. 89. AP era taxista no Entroncamento. 90. Em data não concretamente apurada, mas seguramente antes das 18h.00m. do dia 1 de maio de 2017, os arguidos gizaram um plano, com o propósito de se apoderarem de todo o dinheiro e objectos de valor que se encontrassem na posse de AP. 91. Assim, no dia 1 de maio de 2017, cerca das 18h.00m., os arguidos, sem se identificarem, contactaram telefonicamente AP e solicitaram os seus serviços de taxista, requerendo que comparecesse nas imediações da “Residencial Rui”, sita na Travessa do Poço, n.º 1, Bairro do Nicho, em Torres Novas. 92. AP, que se encontrava na Praça de Táxis do Entroncamento, dirigiu-se ao local, com o seu veículo automóvel ligeiro de passageiros de marca “Mercedes-Benz”, modelo 190 e com a matrícula --KF. 93. Aí chegado, AP recolheu os arguidos, que se encontravam à sua espera, tendo AA ocupado o banco da frente e LL o banco detrás; disseram-lhe que pretendiam ir para a Golegã, iniciando AP, de imediato, a marcha. 94. Volvidos alguns minutos, o arguido AA retirou de dentro das calças que trajava um objeto com a aparência exterior de uma faca de tamanho médio e apontou-o à zona do abdómen de AP. 95. Simultaneamente, exigiu que AP lhe entregasse todo o dinheiro que tinha e os cartões de débito e crédito. 96. Receando pela sua vida e integridade física, AP entregou ao arguido AA 30,00€ (trinta euros) em notas do Banco Central Europeu, um cartão de débito e o respectivo código pin e dois cheques com os n.ºs 3556110618 e 2656110619, associados à conta bancária n.º 40097734223, titulada por aquele. 97. Acto contínuo, os arguidos ordenaram que AP estacionasse a viatura junto de uma caixa ATM do Banco BPI, sita em Largo da Imaculada Conceição, na Golegã. 98. Após, o arguido LL saiu do carro, dirigiu-se à referida máquina ATM, introduziu o cartão de débito de AP, digitou o código pin, seleccionou a opção “levantamento” e, assim, apoderou-se da quantia de 200,00€ (duzentos euros). 99. De imediato, regressou à viatura, tendo AP iniciado a marcha. 100. Naquele hiato temporal, o arguido AA, apontando um objecto com a aparência exterior de uma faca, obrigou AP a assinar os dois cheques e a preencher os campos da quantia com os valores de 1.500,00€ (mil e quinhentos euros) e 2.500,00€ (dois mil e quinhentos euros). 101. Por AP já ter visto os seus rostos, já ter sido testemunha de acusação num processo no qual o arguido AA foi condenado e por terem sério receio de que este pudesse incriminá-los pela prática destes factos, os arguidos decidiram alterar o plano inicial, pondo termo à vida daquele. 102. Assim, os arguidos determinaram que AP parasse a viatura junto à Igreja da Golegã e fosse para o banco detrás. 103. Aí, os arguidos, em comunhão de esforços e intentos, socorrendo-se de uma gravata vermelha que traziam consigo, amarraram os pés de AP, impossibilitando-o de se locomover. 104. De seguida, ataram os braços de AP atrás da cabeça, utilizando para o efeito um pedaço de tecido, um atacador e uma meia de vidro. 105. Após, o arguido LL conduziu a viatura até uma estrada de terra batida, que dá acesso à “Quinta da Rainha”, num sítio ermo, junto à localidade de Meia Via, em Torres Novas. 106. Aí chegados, os arguidos, em união de esforços e utilizando a força muscular, retiraram AP do veículo automóvel e sentaram-no no chão. 107. Acto contínuo, os arguidos, actuando conjuntamente, enrolaram à volta do pescoço de AP uma meia de vidro e, agarrando com as suas mãos nas duas pontas, fizeram força em direcções opostas, apertando até sufocar aquele. 108. Estando AP já inanimado, o arguido AA, utilizando a sua força muscular, introduziu a lâmina de uma faca na zona do mamilo esquerdo do corpo daquele e, utilizando a mesma faca, fez um corte por baixo do queixo, atingindo a zona da garganta. 109. Encontrando-se o corpo de AP já sem vida, os arguidos, em comunhão de esforços e utilizando a força muscular, arrastaram o corpo daquele, cerca de 60 (sessenta) metros, até uma zona mais escondida. 110. Antes de abandonar o corpo de AP e o local, o arguido LL retirou-lhe e levou consigo um anel em ouro amarelo com uma pedra preta, uma aliança em ouro amarelo com a inscrição “Maria do Rosário” e um fio em ouro amarelo de malha batida 3x1, com um crucifixo. 111. De imediato, os arguidos abandonaram local, fazendo uso do veículo automóvel de AP. 112. Deixaram a viatura abandonada na estrada, junto à Capela da Ladeira do Pinheiro, em Meia Via, Torres Novas. 113. Da conduta levada a cabo pelos arguidos resultaram para AP várias lesões, nomeadamente: Hábito externo: Cabeça: Escoriação ao nível da porção lateral do supercílio direito medindo um centímetro de comprimento por meio centímetro de largura e outra inferiormente medindo cinco centímetros de comprimento por um centímetro de largura. Ferida contusa ao nível da pálpebra superior direita medindo um centímetro de comprimento por três milímetros de afastamento de bordos. Escoriação lateralmente à pálpebra superior esquerda medindo um centímetro de comprimento por meio comprimento de largura. Equimose arroxeada da pálpebra superior esquerda, associada a edema dos tecidos subjacentes, medindo cinco centímetros de comprimento por dois centímetros e meio de largura. Equimose arroxeada na pálpebra inferior medindo dois centímetros de eixo maior por meio centímetro de eixo menor. Hemorragia subconjuntival ocular e palpebral à esquerda. Duas equimoses na região malar esquerda a maior medindo dois centímetros e meio de eixo maior por um centímetro de eixo menor sobre a qual se visualizam anteriormente um ferida medindo quatro centímetros de comprimento por dois centímetros de largura e uma posterior, várias feridas dispostas linear e longitudinalmente, com áreas de interrupção entre elas, a maior medindo três milímetros. Feridas milimétricas retroauriculares à esquerda. Equimose arroxeada na região occipital, sensivelmente ao nível da linha média, medindo meio centímetro de diâmetro. Lateral e superiormente, à direita da lesão descrita, escoriação medindo sete centímetros de comprimento por dois centímetros de largura. Petéquias dispersas nas conjuntivas palpebrais bilateralmente e na mucosa oral. Pescoço: Ferida cortante oblíqua de cima para baixo e da esquerda para a direita, com abundantes vestígios hemáticos e de terra que, após removidos, permitiram visualizar uma lesão com bisei de cima para baixo, desde a região submandibular à esquerda até terço superior da região cervical anterior, à direita, medindo quinze centímetros e meio de comprimento com trinta e três milímetros de afastamento máximo dos bordos. Na extremidade direita, a ferida prolongava-se linear por vinte e três milímetros (cauda) e na extremidade esquerda visualiza-se uma continuidade lateral superior (cauda), linear, medindo dezassete milímetros de comprimento e outra inferior (cauda) medindo quinze milímetros de comprimento. Na porção central da ferida, sensivelmente ao nível da linha média, presença de uma indentação no bordo superior ao longo de nove milímetros de comprimento e com três milímetros de largura. Sulco único, horizontalizado, ligeiramente ascendente à direita, aproximando-se do bordo inferior da ferida descrita anteriormente, ao nível da linha média, com segmentos com fundo apergaminhado, mais sobre o lado esquerdo, e com largura máxima de cinco milímetros à esquerda. Escoriações na porção posterior da região cervical lateral direita, a maior medindo cinco milímetros de comprimento. Tórax: Equimose arroxeada pelo terço superior da porção lateral do hemitórax direito medindo um centímetro e meio de eixo maior por um centímetro de eixo menor. Equimose arroxeada na região mamária direita medindo três centímetros de eixo maior por dois centímetros e meio de eixo menor. Duas equimoses pelo terço inferior da face lateral do hemitórax direito, a maior localizada inferiormente, medindo dois centímetros e meio de maior por dois centímetros de eixo menor. Solução de continuidade com bordos lisos e regulares, esboçando uma secção triangular de base superior, oblíqua ínferomedialmente, medindo um centímetro e meio de comprimento com seis centímetros de afastamento dos bordos. O centro do componente inciso da ferida corto-perfurante descrita distava sete centímetros da linha média, nove centímetros do mamilo (situado infero-lateralmente) e cento e vinte e quatro centímetros e meio do calcanhar ipsilateral. A extremidade superior, sensivelmente retilínea, apresentava uma discreta indentação inferior ao nível do ponto médio. Escoriação no terço superior da face posterior do tórax, ligeiramente à direita da linha média, medindo dois centímetros de comprimento. Duas equimoses arroxeadas pelo terço médio/inferior da face lateral do hemitórax esquerdo a maior medindo um centímetro e meio de diâmetro e a outra, localizada superiormente, um centímetro de eixo maior por meio centímetro de eixo menor. Membro superior direito: Equimose na face posterior do ombro medindo um centímetro de diâmetro. Equimose avermelhada pela face anterior do braço medindo treze centímetros de eixo maior por seis centímetros e meio de eixo menor, no seio da qual se visualizam quatros áreas equimóticas arroxeadas, a maior medindo dois centímetros e meio de eixo maior por dois centímetros de eixo menor. Equimose avermelhada pelo terço médio da face posterior do braço medindo quatro centímetros de eixo maior por dois centímetros de eixo menor. Inferiormente à lesão descrita, ligeiramente acima do cotovelo, equimose arroxeada medindo quatro centímetros de eixo maior por um centímetro e meio de eixo menor. Quatro escoriações com crosta pela face posterior do antebraço medindo a maior quatro centímetros de comprimento. Várias equimoses avermelhadas pela face posterior do antebraço, a maior medindo cinco centímetros de eixo maior por dois centímetros de eixo menor. Duas escoriações milimétricas sensivelmente ao nível da face posterior do punho. Dorso da mão com equimose arroxeada, edema dos tecidos subjacentes e múltiplas escoriações. Sulco oblíquo ínfero lateral, desde o nível do punho até sensivelmente a área entre a inserção do dedo polegar e indicador, em relação com aplicação de meio de restrição física. Membro superior esquerdo: Equimose avermelhada pela face medial do braço medindo dois centímetros de eixo maior por um centímetro e meio de eixo menor. Equimose arroxeada pelo terço inferior da face medial do braço medindo seis centímetros de eixo maior por dois centímetros e meio de eixo menor. Equimose arroxeada localizada ligeiramente superior e lateralmente à descrita, medindo meio centímetro de diâmetro. Equimose arroxeada com formato quadrangular pelo terço inferior da porção medial da face anterior do antebraço medindo três centímetros de comprimento por dois centímetros e meio de largura. Equimose arroxeada pelo terço superior da face posterior do braço, medindo um centímetro e meio de comprimento por um centímetro de largura. Equimose arroxeada pela face lateral do cotovelo medindo seis centímetros de comprimento por quatro centímetros de largura. Equimose arroxeada pelo terço superior da porção lateral da face posterior do antebraço medindo quatro centímetros de eixo maior por dois centímetros e meio de comprimento. Equimose arroxeada no dorso da mão medindo quatro centímetros de eixo maior por dois centímetros e meio de eixo menor. Escoriação no dorso dos dedos médio e anular, a maior medindo três centímetros de comprimento por um centímetro de largura. Sulco horizontalizado ao nível do punho em relação com aplicação de meio de constrição física. Membro inferior direito: Sulco mais evidente na porção medial do tornozelo em relação com aplicação de meio de restrição física. Membro inferior esquerdo: Sulco mais evidente visível na porção medial do tornozelo em relação com aplicação de meio de restrição física. Hábito interno: Cabeça: Partes moles: Infiltração sanguínea parietal esquerda com edema acentuado dos tecidos interessando uma área com 7x3cm; infiltração sanguínea em toda a espessura do músculo temporal esquerdo. Cavidade oral e língua: Escoriações milimétricas na face mucosa do lábio superior; equimoses arroxeadas com um a dois milímetros ao nível da mucosa oral, ao nível dos lábios, em provável relação com traumatismo produzido por dentes; vestígios de terra dispersos internamente na face mucosa dos lábios e dorso da língua. Pescoço: Tecido celular subcutâneo: Solução de continuidade dos tecidos em relação com lesão descrita no hábito externo, com atingimento do plano adiposo subcutâneo; ao nível da porção direita da região cervical, a lesão aprofunda-se ao longo de aproximadamente três centímetros, com atingimento do músculo platisma e permitindo a visualização da superfície anterior do osso hióide; infiltração sanguínea dos tecidos e da fascia que envolve a glândula sublingual esquerda. Vasos e nervos: Discreta infiltração sanguínea da adventícia da artéria carótida comum esquerda ao nível da lesão cervical descrita anteriormente. Estruturas Cartilagíneas: Fratura do corno superior esquerdo da cartilagem tiróideia com infiltração sanguínea dos tecidos adjacentes. 114. Estas lesões foram causa necessária e adequada da morte de AP, verificada apenas no dia 2 de maio de 2017, pelas 17h.55m. 115. Apesar de AP se encontrar de mãos e pés atados, sem representar, por isso, qualquer ameaça para os arguidos, mesmo assim estes decidiram, com recurso a uma meia de vidro, sufocá-lo até o deixar sem sinais vitais. 116. Os arguidos, quando decidiram matar AP, tinham em vista assegurar a sua impunidade quanto ao cometimento dos crimes na pessoa deste, pois sabiam que era capaz de apresentar queixa contra a eles e testemunhar em tribunal, como efectivamente chegou a fazer. 117. Os arguidos tinham perfeito conhecimento de que os métodos por si usados eram suficientes e adequados a causar a morte de AP, como veio a acontecer. 118. Os arguidos agiram de forma deliberada, livre e consciente, mediante um plano previamente traçado e em comunhão de esforços, com o propósito alcançado de matar AP, tendo em vista encobrir a prática dos crimes ora imputados, demonstrando um profundo desprezo pelo valor da vida humana. 119. Os arguidos sabiam que ao arrastar o cadáver de AP para uma zona mais escondida de um sítio ermo, dificilmente seria encontrado por terceiros. 120. Os arguidos agiram de forma deliberada livre e consciente, mediante um plano previamente traçado e em comunhão de esforços, com o propósito alcançado de ocultar o cadáver de AP, sem para tal estarem autorizados por quem de direito. 121. Os arguidos tinham perfeito conhecimento de que a conduta por si levada a cabo era suficiente e adequada a causar medo e inquietação a AP, pondo-o na impossibilidade de resistir, obrigando-o a dar-lhes tudo o que pretendiam, como aconteceu, tanto mais que se tratavam de dois homens com compleição física robusta. 122. Os arguidos agiram de forma deliberada, livre e consciente, mediante o cumprimento de um plano previamente gizado e em comunhão de esforços, com o propósito concretizado de se apoderarem ilegitimamente de todo o dinheiro e objectos com valor que encontrassem na posse AP, através de ameaça com perigo iminente para a vida e integridade física, pondo-o na impossibilidade de reagir, bem sabendo que aqueles não lhes pertenciam e que agiam contra a vontade do legítimo proprietário. 123. Os arguidos tinham perfeito conhecimento de que mantiveram AP privado da sua liberdade durante várias horas, sem para isso estarem legitimados. 124. Os arguidos agiram ainda de forma deliberada, livre e consciente, em cumprimento de um plano e em comunhão de intentos, com o propósito alcançado de privar AP da sua liberdade de movimentos. 125. No dia 28 de Abril de 2017, em hora não concretamente apurada, mas seguramente entre as 02h.00m. e as 02h.30m., o arguido LL conduziu o veículo automóvel ligeiro de passageiros de marca “Renault”, modelo “Megane”, com a matrícula --JS, propriedade de AD, desde a localidade de Atalaia até ao parque de estacionamento do supermercado, sito nas traseiras do “Hotel Gameiro”, na Avenida Dr. José Eduardo Vítor das Neves, no Entroncamento. 126. No dia 1 de maio de 2017, em hora não concretamente apurada, mas seguramente depois das 18h.00m., o arguido conduziu o veículo automóvel ligeiro de passageiros de marca “Mercedes-Benz”, modelo 190 e com a matrícula ---KF, desde a estrada de terra batida que dá acesso à “Quinta da Rainha”, junto à localidade de Meia Via, até à Capela da Ladeira do Pinheiro, sita em Estrada do Pinheiro, Meia Via, Torres Novas. 127. O arguido LL não possui documento legal que o habilite a conduzir. 128. O arguido agiu de forma deliberada, livre e consciente, com o propósito concretizado de conduzir em via pública veículo a motor, apesar de saber que não estava legalmente habilitado. 129. Os arguidos conheciam a proibição e punição de todas as suas condutas. Dos pedidos de indemnização civil 130. AP faleceu no estado de casado com a demandante em primeiras núpcias de ambos. 131. A Demandante esteve casada com o falecido por mais de 40 anos. 132. Na constância do seu casamento, eram a companhia e o apoio um do outro e mantinham uma relação conjugal respeitadora e afectuosa. 133. A Demandante sofre muito com a perda inesperada do marido, com a falta do seu apoio, da sua companhia e da assistência que ele lhe proporcionava. 134. Sofre todos os dias imensa saudade do seu marido. 135. A Demandante tem crises de choro, momentos de angústia e problemas de sono. 136. O Demandante NP, filho do falecido AP, sofre muito com a morte de seu pai, sentindo-se triste e desamparado. 137. O Demandante NP tinha no seu pai um bom amigo, que sempre o apoiou na sua vida pessoal e profissional, sendo ambos taxistas. 138. O falecido AP era uma pessoa activa a trabalhadora, saudável, alegre e com amor à vida. 139. Morreu com 69 anos de idade. 140. À data da sua morte, AP auferia mensalmente, da sua actividade como taxista, pelo menos, valor equivalente ao salário mínimo de € 557,00, num total anual de € 6.684,00. 141. A Demandante era doméstica à data da morte do seu marido, o que ainda sucede. 142. A Demandante viva com o marido e beneficiava, em parte, dos rendimentos auferidos pelo mesmo, nomeadamente para fazer face às suas despesas de alimentação, habitação e vestuário, higiene e saúde, deslocações e lazer. 143. A Demandante não tinha, como não tem, outras fontes de rendimento. Mais se provou que 144. O arguido LL não tem antecedentes criminais. ----------------------------------------------------------------------------------------------------------------- 174. LL nasceu em Vila Nova da Barquinha, local onde sempre viveu. É o 2º filho de uma fratria de quatro irmãos germanos. 175. O pai era sargento-ajudante na Base Militar de Tancos, a mãe sempre foi doméstica. 176. A família apresentava uma economia familiar modesta, e um bom relacionamento. 177. No plano escolar, LL habilitou-se com o 4º ano de escolaridade, nível de ensino que obteve aos 14 anos de idade, com repetidas reprovações ao longo do seu percurso. 178. Posteriormente, conseguiu colocação laboral na área da pintura da construção civil. 179. Aos 19 anos de idade, ingressou no exército português para fazer a tropa, onde esteve durante 1 ano. 180. Após terminar o serviço militar, retomou a actividade laboral de pintor da construção civil. Contudo, nem sempre conseguia exercer a profissão de forma continuada e estruturada. 181. Chegou também a trabalhar na área da mecânica e como electricista. 182. LL nunca constituiu família, ficando a residir com os progenitores, até ao falecimento destes. 183. Na sequência do falecimento dos progenitores, os filhos optaram por vender a residência familiar, sendo o arguido, obrigado a encontrar outro local para morar. 184. Na altura arrendou uma casa na Atalaia, Vila Nova da Barquinha, mas aí permaneceu apenas um ano devido a desentendimentos com o proprietário da habitação. 185. LL passou a apresentar precariedade económica e habitacional, a persistir num trajecto de vida caracterizado pela ausência de adesão a projectos sociais construtivos e sinalização de inadaptação social. 186. À data da sua prisão preventiva, encontrava-se a residir há cerca de um mês numa Residencial em Torres Novas, onde pagava 30€/dia pelo quarto. 187. Encontrava-se desempregado há cerca de 3 anos, sendo beneficiário do Rendimento Social de Inserção, recebendo um valor mensal de cerca de 150€. 188. Devido à sua situação económica precária, era apoiado pelo Centro de Dia de Vila Nova da Barquinha, que lhe fornecia alimentação através da cantina social. 189. O arguido assume consumos de estupefacientes iniciados já em idade adulta (não conseguindo identificar concretamente em que idade), nomeadamente de haxixe. 190. Em contexto social, por vezes, mantinha consumo excessivo de bebidas alcoólicas, desvalorizando no entanto a necessidade de qualquer tratamento/acompanhamento para estas problemáticas. 191. Ao nível da ocupação de tempos livres, não mantinha actividades estruturadas, ocupando o seu tempo no convívio com o grupo de pares ou com o co-arguido no presente processo. 192. Presentemente, não tem relação significativa com os irmãos, os quais também vivem com dificuldades e não têm condições para o acolher nem para lhe prestar apoio. 193. Mantinha alguma relação de convívio com uma tia, MG, que pontualmente, o ajudava a nível alimentar. 194. Aparenta ser uma pessoa com reduzido autocontrolo, e falta de motivação para estruturar um projecto de vida pró-social, centrando-se apenas na satisfação dos seus desejos e necessidades imediatas. 195. No meio comunitário, tem uma imagem social desfavorável, devido aos consumos de estupefacientes e fracos hábitos de trabalho. 196. Sendo a primeira vez que está preso, LL encara a situação de reclusão com alguma ligeireza e tende a adoptar uma atitude de minimização perante os tipos de comportamento em causa no presente processo, desvalorizando os danos nas eventuais vítimas de condutas de idêntica natureza. 197. Em meio prisional, tem apresentado um comportamento consentâneo com as normas e regras institucionais. 198. Encontra-se inactivo. 199. Por apresentar uma postura de alguma instabilidade emocional, tem acompanhamento médico e psicológico e faz medicação a nível de ansiolíticos. 200. Preso há cerca de 8 meses, nunca teve visitas de familiares ou de amigos, apenas tendo mantido contacto telefónico uma vez com a tia MG. O mesmo acórdão julgou os seguintes factos não provados: 1. Na ocasião referida no ponto 7 dos factos provados, a ofendida CC entregou igualmente ao arguido AA dois maços de cigarros. 2. O arguido AA aproximou-se de CC e disse-lhe: “dou-te as informações todas destes homens ciganos se me deres 3.000,00€ (três mil euros) para fugir”, “eles vão-me matar” e “agora não recebo 25.000,00€ (vinte e cinco mil euros) porque não sou capaz de te matar”. 3. Depois de desligar o telemóvel, o arguido AA, empunhando um objecto com a aparência exterior de uma faca, obrigou CC a escrever e a assinar uma declaração, com a seguinte afirmação: “ Eu, CC, não fui obrigada a nada, dei tudo de livre vontade.” 4. Na ocasião referida no ponto 19 dos factos provados, o arguido AA levou igualmente consigo os dois maços de tabaco e a declaração escrita por CC. 5. A ofendida AD entregou ao arguido LL a sua bolsa que continha no seu interior, designadamente 5,00€ (cinco euros) em moedas do banco Central Europeu e documentos pessoais. 6. O arguido LL retirou e guardou a referida quantia de € 5,00 em dinheiro. 7. Na situação referida no ponto 43 dos factos provados, a ofendida AD apenas levantou as quantias em questão, por aquela máquina não ter mais dinheiro disponível. 8. Volvidos alguns minutos, o arguido LL deu indicação a AD para se dirigir à localidade de Vila Nova da Barquinha. 9. Aí chegados, os arguidos ordenaram que AD estacionasse a viatura junto a uma caixa ATM da Caixa Geral de Depósitos, existente no edifício da Junta de Freguesia da Atalaia, sito em Rua Patriarca José. 10. Mais uma vez, o arguido LL e AD saíram do carro e dirigiram-se àquela caixa ATM, enquanto o arguido AA permaneceu sentado. 11. Junto à caixa ATM, AD, em cumprimento do que lhe dizia o arguido LL, introduziu, alternadamente, os seus dois cartões de débito, digitou os códigos pin, seleccionou a opção “ levantamentos” e retirou da sua conta bancária do Banco Montepio, a quantia de 100,00€ (cem euros) e da outra, o valor de 200,00€ (duzentos euros). 12. Durante o percurso acima descrito, AD recebeu diversas chamadas telefónicas de sua amiga e de seu marido, contudo, nunca as atendeu, porque os arguidos não a autorizaram. 13. O arguido LL agarrou ao colo AD, colocou-a no banco detrás da viatura e despiu-a. 14. Acto contínuo, despiu-se, colocou-se em cima de AD e introduziu o seu pénis erecto na vagina desta. O arguido LL fez vários movimentos para cima e para baixo, introduzindo e saindo, até ejacular no interior da vagina de AD. 15. Durante todo este tempo, AD esteve a dormir profundamente por causa do efeito dos medicamentos administrados. 16. O arguido LL agiu ainda de forma deliberada, livre e consciente, com o propósito concretizado de praticar ato sexual de relevo, designadamente cópula, com AD, bem sabendo que esta se encontrava incapaz de opor resistência por força da sobredosagem de medicamentos soníferos. 17. Na ocasião referida no ponto 64 dos factos provados, os arguidos levaram igualmente consigo 1 (um) porta-chaves com as duas chaves da viatura, no valor de 30,00€ (trinta euros), e 1 (um) cartão de compras do supermercado “Intermarché”; 18. Nas circunstâncias referidas no ponto 78 dos factos provados, o arguido AA visava e facilitar a entrada ao arguido LL que se mantinha escondido. 19. Na situação descrita nos pontos 75 a 87, o arguido LL actuou conjuntamente com o arguido AA, mediante um plano previamente traçado e em comunhão de esforços, 20. No dia 02/05/2017, na posse do cartão de débito de AP, o arguido LL, procedeu ao levantamento, numa caixa ATM, da quantia de 160,00€ (cento e sessenta euros). 21. Ao proceder ao levantamento daquela quantia, o arguido LL apoderou-se desta, sem autorização prévia dos herdeiros de AP. O arguido sabia que o cartão e o dinheiro não lhe pertenciam e que não estava autorizado a detê-los e utilizá-los. 22. O arguido LL agiu de forma deliberada, livre e consciente, com o propósito alcançado de, com ilegítima intenção, se apropriar do dinheiro, bem sabendo que o mesmo não lhe pertencia e que actuava contra a vontade do legítimo proprietário. Do referido acórdão interpôs recurso o arguido LL, com a devida motivação, tendo formulado as seguintes conclusões: 1 – O arguido LL foi em cúmulo jurídico condenado na pena única de 20 anos de prisão. 2- É ainda condenado a pagar aos demandantes a quantia de 111.736,00€ a título de compensação por danos não patrimoniais, patrimoniais, perda do direito à vida. 3- Na mesma sentença o arguido é também condenado em taxa de justiça e custas da acção penal; 4- O tribunal A quo deu como provados entre outros os seguintes factos com interesse para esta causa penal, 88, 90, 91,100,101,103,104,106,108,113, 114,117 e 118 5 - O tribunal A quo, alicerçou a sua convicção nas declarações prestadas em julgamento pelo arguido AA, que afirmou que tais actos foram praticados conjuntamente, por ambos os arguidos, conforme fls 41 parágrafo 2.º do acórdão proferido; 6- O acordão proferido, a fls. 67, 2 paragrafo, que foi levado em linha de conta a (…) conduta do arguido AA, de o mesmo ter praticado o crime de homicídio qualificado contra alguém, que conhecia há largos anos, aproveitando-se desse conhecimento para o chamar junto de si, com o pretexto de pretender os seus serviços(…) ; 7- Ficou provado no acordão proferido, ponto 114 dos factos provados e de acordo com as lesões descritas no facto provado 113 do acordão relatório da autopsia-volume 5.º de folhas 1147 a fls 1151 verso) as lesões em sintese (…)que o ofendido AP, lhe foi cortada a garganta da esquerda para a direita, desde a região submandibular á esquerda até terço superior da região cervical anterior à direita com 15 centimetros e três de largura, e desferiu ainda um golpe de faca no peito na zona do coração deste com uma perfuração de 7 centímetroso, (…) . 8 – Lesões estas que segundo as declarações do Arguido AA, em audiência de julgamento conforme consignado em acta 2018 04 16 04 113003 2756001 2871701 (01h:49s), já conhecia o ofendido há muito tempo, referiu o mesmo que (03mts:33s) que não sabe o que aconteceu (08mts:25s) que foi tudo muito espontâneo, e que não combinou nada com o outro arguido LL, 9 - Confessou ainda o arguido AA nas suas declarações (17mts:25s) que o amarrou sozinho, o ofendido, e que confessa também, que foi ele que desferiu as facadas (19mts:25s) e acabou por confirmar o arguido AA que foi também quem fez o corte na garganta do ofendido AP, nas suas declarações aos (21mts e 42s); 10- A defesa do arguido, LL, veio em alegações, entre outras situações alegar que o arguido LL, não possui registo criminal, pessoa influenciada, foi aliciado pelo arguido AA, que tinha um vasto registo criminal, inclusíve com o cumprimento de penas efectivas, entre outras a ultima delas no âmbito do processo n.º---/10.5JALRA que correu seus termos também no tribunal de Santarém, processo este onde a Vítima de homicídio AP, testemunhou contra o arguido AA, pessoa que já conhecia há muitos anos; 11 – De acordo com as declarações feitas pelos arguidos, considera-se incorrectamente julgada os factos provados no douto acórdão nos seus pontos, 90, 91, 100, 101, 103, 104, 106, 108, 113 e 114, 117 e 118, porque não se pode afirmar com base nas declarações dos arguidos que o arguido LL agiu em conjugação de esforços com o autor material dos crime de homicídio AA; 12- Pelo que não se poderá falar de uma situação de co-autoria material ou moral, nos termos do artigo 26.º do c.penal, isto porque o arguido AA, nas suas declarações produzidas em audiência de julgamento, confessou que quem tinha infligidos o corte na garganta da esquerda para a direita com cerca de 15 centímetros e espetado a faca no peito da vitima que lhe causou a morte segundo o relatório da autopsia foi ele próprio conforme consignado em acta 2018 04 16 04 113003 2756001 2871701 ao (19mts:25s) e ao (21mts e 42s). 13- Não se coloca a situação de autoria material pois quem matou o ofendido foi o arguido AA, nem numa situação de autoria moral, porque quem tinha móbil do crime era o arguido AA, que já possuía diversas divergências com o ofendido AP, atento que este arguido considerava que o testemunho daquele o tinha colocado no estabelecimento prisional; 14- Necessariamente caímos na figura da cumplicidade, artigo 27.º do C.penal e salvo o devido respeito por opinião diversa, deveria ter sido essas a regras que o tribunal deveria ter alicerçado a sua decisão relativamente ao arguido LL, determinado a pena aplicada e não as regras da co-autoria; 15- Devendo portanto ter sido o arguido LL condenado por uma situação de cumplicidade, fixando-se uma pena especialmente atenuada em comparação ao do autor; 16- Impugna-se portanto a decisão proferida sobre a matéria de facto, assim bem como sobre a aplicação do direito, ao abrigo do disposto nos Arts. 410.° n.º1 e 2, als. c) e 3, e 412°-2, 3 e 4 do CPP, por considerar que houve erro notório na apreciação da prova; 17- Impondo o relatório pericial da autopsia e as declarações dos arguidos, conclusões diferentes daquelas que levaram à condenação do arguido LL, porque não se poderia concluir que o arguido praticou os factos de que vinha acusado em co-autoria, salvo melhor opinião, há dúvida, e uma dúvida razoável e insanável, motivável, que abona em favor do arguido em nome do princípio do in dubio pro reo, da proibição da indefesa, do princípio do contraditório mas também do princípio do estado de direito democrático e do princípio da legalidade (art.ºs 2; 3 n.º 2, 32.º n.ºs 2 e 5 todos da C.R.P., pelo que, não poderia o Tribunal a quo ter dado como provado os pontos 90, 91, 100, 101, 103, 104, 106, 108, 113 e 114, 117 e 118, dos factos provados acima elencados. 18- Devendo o arguido LL ter sido condenado por uma situação de cumplicidade, fixando-se uma pena especialmente atenuada em comparação ao do autor; Nestes termos e nos mais de direitos, deve o presente recurso ser julgado procedente e provado e, consequentemente deve o arguido ora Recorrente: 1- Ser especialmente atenuada a pena em que foi condenado única de 20 anos de prisão; 2- Do pagamento da taxa de justiça e demais encargos judiciais; 3- Ser especialmente atenuado relativamente ao pagamento do pedido de indemnização cível, apresentado pelos Assistentes; O recurso interposto foi admitido com subida imediata, nos próprios autos, e efeito suspensivo. O MP respondeu à motivação do recorrente, tendo formulado as seguintes conclusões: 1. Por Acórdão proferido em 7 de Maio de 2018 no âmbito dos presentes autos foi o recorrente LL condenado pela prática de: - um crime de roubo qualificado na pessoa de AD, p. e p. pelos arts.º 14.º, n.º 1 e 210.º, n.ºs 1 e 2 do Código Penal, por referência ao art.º 204.º, n.º 1, al. b) do mesmo diploma legal, na pena de 5 (cinco) anos de prisão. - um crime de sequestro na pessoa de AD, p. e p. pelos arts.º 14.º, n.º 1 e 158.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão. - um crime de roubo qualificado na pessoa de AP, p. e p. pelos arts.º 14.º, n.º 1 e 210.º, n.º 1 e 2 do Código Penal, por referência ao art.º 204.º, n.º 1, al. b) do mesmo diploma legal, na pena de 5 (cinco) anos de prisão. - um crime de sequestro na pessoa de AP, p. e p. pelos arts.º 14.º, n.º 1 e 158.º, n.º 1 do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 2 (dois) meses de prisão. - um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos arts.º 14.º, n.º 1, 131.º e 132.º, n.ºs 1 e 2, alínea g), todos do Código Penal, na pena de 17 (dezassete) anos de prisão. - um crime de profanação de cadáver, p. e p. pelos arts.º 14.º, n.º 1 e 254.º, n.º 1, al. a), ambos do Código Penal, na pena de 1 (um) ano de prisão. - dois crimes de condução de veículo sem habilitação legal, p. e p. pelos arts.º 14.º, n.º 1 do Código Penal e 3.º n.ºs 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de03/05, com referência ao art.º 121.º do Código da Estrada, na pena de 2 (dois) meses de prisão por cada um deles. Em cúmulo, pela prática dos crimes acima referidos, na pena única de 20 (vinte) anos de prisão. 2. O erro notório, previsto na alínea c), do n. 2, do artigo 410.º, é um vício de raciocínio na apreciação das provas, evidenciado pela simples leitura do texto da decisão; erro tão evidente que salta aos olhos do leitor médio, sem necessidade de qualquer exercício mental: as provas revelam claramente um sentido e a decisão extraiu ilação contrária, logicamente impossível, incluindo ou excluindo da matéria fáctica provada algum facto essencial (neste sentido vd., entre outros, Acórdão do STJ de 28-10-1998, in www.dgsi.pt). 3. Ao contrário do alegado pelo recorrente, o acórdão recorrido não padece de tal vício. 4. Efectivamente, o Tribunal a quo teve em consideração, conforme melhor consta da motivação, as declarações prestadas pelo próprio recorrente em sede de primeiro interrogatório judicial de arguido detido, bem como nas suas declarações prestadas em sede de julgamento. 5. Teve ainda em consideração as declarações prestadas pelo arguido AA em sede de inquérito, perante magistrada do Ministério Público onde negou ter sido ele a amarrar os pés à vítima AP, que foram ambos que arrastaram o corpo do mesmo para o local onde veio a ser encontrado (cfr. ficheiro áudio: 20171018110558¬-_2715559_2872671, de 18.10.2017, inicio: 00:00 a 12:30), que foi o arguido LL que ficou com o fio que aquele trazia no pescoço bem como com os anéis, sendo que foi o recorrente que lhos tirou da mão, designadamente o anel de casado. Que depois de terem parado naquele local, quando regressou de ter ido fazer uma necessidade, já o arguido LL estava a apertar o pescoço da vítima com uma meia de nylon (cfr. mesmo ficheiro e mesmo dia, 13:44 a 14:50). 6. Estas declarações conjugadas com o teor do relatório de autópsia, com o facto de ter sido o arguido LL que sempre conduziu o veículo automóvel (táxi) da vítima, quer para o local onde a vítima foi morta quer para o local onde a viatura veio posteriormente a ser encontrada, que foram encontrados na sua posse (recorrente) o fio, os anéis e o cartão multibanco da vítima que se encontravam no interior de uma bolsa que trazia consigo, que foram encontrados vestígios do calçado do recorrente junto ao local para onde o corpo foi arrastado e abandonado, e a versão apresentada também pelo recorrente que o dinheiro subtraído foi dividido entre ambos, dúvidas não subsistem que o recorrente teve uma participação activa na morte de AP. 7. A proibição da indefesa que consiste na privação ou limitação do direito de defesa do particular perante os órgãos judiciais, junto dos quais se discutem questões que lhes dizem respeito, não se verifica no vertente caso, uma vez que não se verificou qualquer inobservância de normas processuais ou de princípios gerais de processo que tenha acarretado a impossibilidade do recorrente exercer o seu direito de alegar, daí resultando prejuízos efectivos para os seus interesses. 8. O princípio in dubio pro reo, é uma dimensão do princípio da presunção de inocência e configura-se, basicamente, como uma regra de decisão: produzida a prova e efetuada a sua valoração, quando o resultado for a dúvida, razoável e insuperável, sobre a realidade dos factos, ou seja, subsistindo, no espírito do julgador, uma dúvida positiva e invencível sobre a verificação, ou não, de determinado facto o juiz deve decidir a favor do arguido, dando como não provado o facto que lhe é desfavorável. 9. No caso em apreço, nenhuma dúvida se suscitou ao tribunal quanto aos factos que deveria dar como provados ou não provados, tendo a prova sido reputada suficiente para a decisão da causa, isto é, foi considerada bastante e não dando margem para dúvidas que o arguido LL actuou em co-autoria com o arguido AA. 10 E, atenta a fundamentação da decisão, explanada de forma clara e pormenorizada, é perfeitamente consequente e lógico o raciocínio seguido pelo Tribunal e conducente à condenação do arguido/recorrente, dado ter considerado provados os factos integradores dos elementos objectivos e subjectivos constitutivos do tipo legal de crime em causa. 11. A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (art.º 410.º, nº 2, al. a) do CPP) é a “lacuna no apuramento da matéria de facto indispensável para a decisão de direito, isto é, quando se chega à conclusão de que com os factos dados como provados não era possível atingir-se a decisão de direito a que se chegou, havendo assim um hiato nessa matéria que é preciso preencher” (Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 8ª ed. Lisboa, 2012, p. 74). 12. Ao contrário do alegado pelo recorrente, da leitura do acórdão não resulta que o mesmo enferme deste vício. 13. Da sentença recorrida consta a enumeração dos factos provados e não provados. 14. Assim como se encontra correctamente feito e devidamente justificado o enquadramento jurídico-penal. 15. Pelo que se verifica-se mostrar-se feita a indicação completa das provas, bem como o exame crítico das mesmas provas, que formaram a convicção do tribunal. 16. Pode dizer-se que a doutrina e a jurisprudência consideram como elementos da comparticipação criminosa sob a forma de co-autoria os seguintes: - a intervenção directa na fase de execução do crime (execução conjunta do facto); - o acordo para a realização conjunta do facto; acordo que não pressupõe a participação de todos na elaboração do plano comum de execução do facto; que não tem de ser expresso, podendo manifestar-se através de qualquer comportamento concludente; e que não tem de ser prévio ao início da prestação do contributo do respectivo co-autor; - o domínio funcional do facto, no sentido de “deter e exercer o domínio positivo do facto típico” ou seja o domínio da sua função, do seu contributo, na realização do tipo, de tal forma que, numa perspectiva ex ante, a omissão do seu contributo impediria a realização do facto típico na forma planeada. 17. A cumplicidade, pressupõe um mero auxílio material ou moral à prática por outrem do facto doloso, por forma que ao cúmplice falta o domínio do facto típico como elemento indispensável da co-autoria. 18. Atenta a matéria de facto assente, não se pode afirmar que o resultado morte foi apenas pretendido pelo arguido AA, devendo imputar-se o mesmo, ainda que a título eventual, ao recorrente LL. 19. Pelo que, face à matéria fáctica assente, o ora recorrente não pode deixar de ser condenado como co-autor do crime de homicídio qualificado. 20. Como resulta claramente dos factos provados sob os nºs 98. e 101. a 110, embora os arguidos tivessem ido além do plano previamente combinado – atrair a vitima AP através de uma chamada telefónica para posteriormente o roubarem - a verdade é que o homicídio praticado estava na previsão de ambos, pelo menos a título de dolo eventual. 21. Perante a factualidade assente, não há dúvidas que o arguido/recorrente praticou o crime de homicídio, em co-autoria: existiu uma resolução comum com um plano previamente traçado; por outro lado, foi também acordado entre ambos que o produto do assalto seria dividido pelos dois; além disso, estabeleceram uma “divisão de tarefas” a realizar por cada um deles, todas elas com manifesta relevância para o alcance da finalidade pretendida: o arguido LL conduziu o veículo até ao local onde a vítima acabou por ser morta e voltou a conduzir o veículo para o local onde acabou por ser encontrado, participação esta que foi imprescindível não só para a execução do plano traçado, uma vez que o arguido AA não sabia conduzir e a vítima encontrava-se manietada, mas também para a fuga do local após os factos. 22. Do exposto resulta uma intervenção fundamental do recorrente nos factos (tinha o domínio funcional a que acima fizemos referência) e agiu de acordo com o plano previamente acordado entre ambos. 23. E, assim sendo, é justa e adequada a pena que lhe foi aplicada pela prática deste crime, não havendo lugar a qualquer atenuação especial. 24. No mais, não se mostrará violado qualquer preceito legal, nem desrespeitado qualquer direito. 25. Pelo que o acórdão recorrido não merece qualquer censura. Face ao exposto, deve o Acórdão recorrido ser confirmado. Assim se fazendo a costumada JUSTIÇA Pela Digna Procuradora-Geral Adjunta em funções junto desta Relação foi emitido parecer sobre o recurso interposto, no sentido da sua improcedência. O parecer emitido foi notificado aos sujeitos processuais, que não exerceram o seu direito de resposta. Foram colhidos os vistos legais e procedeu-se à conferência. II. Fundamentação Nos recursos penais, o «thema decidendum» é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, as quais deixámos enunciadas supra. A sindicância do acórdão sob recurso, tal como transparece das conclusões do recorrente, concretiza-se, em primeira linha, na impugnação da decisão sobre a matéria de facto. Como consequência jurídica da pretendida alteração da matéria de facto provada, o arguido recorrente peticiona: - Enquadramento da sua intervenção no crime de homicídio qualificado de que foi ofendido AP na figura da cumplicidade; - Condenação do recorrente numa pena única especialmente atenuada; - Atenuação especial da indemnização em cujo pagamento foi condenado. A propósito da impugnação da decisão sobre a matéria de facto, convirá recordar que tem vindo a constituir jurisprudência constante dos Tribunais da Relação a asserção segundo a qual o recurso sobre esta matéria não envolve para o Tribunal «ad quem» a realização de um novo julgamento, com a reanálise de todo o complexo de elementos probatórios produzidos, mas antes tem por finalidade o reexame dos erros de procedimento ou de julgamento, que tenham afectado a decisão recorrida e que o recorrente tenha indicado, e, bem assim, das provas que, no entender deste, impusessem, e não apenas sugerissem ou possibilitassem, uma decisão de conteúdo diferente. No caso concreto, o recorrente entende terem sido incorrectamente julgados os pontos 90, 91, 100, 101, 103, 104, 106, 108, 113, 114, 117 e 118 dos factos dados como provados. Faz basear a sua pretensão, em síntese, na valorização, para efeitos de convicção, das declarações prestadas pelo próprio arguido recorrente e pelo co-arguido AA (este, na audiência de julgamento). Para fundamentação do juízo probatório nele emitido, com relevo para a impugnação em apreço, o acórdão recorrido expende (transcrição com diferente tipo de letra): C. MOTIVAÇÃO O Tribunal fundou a sua convicção, quanto à matéria de facto dada como provada e não provada, com base no conjunto da prova produzida, analisada criticamente, à luz das regras do bom senso e da experiência comum. Quanto aos factos relativos ao ofendido AP, foram antes de mais consideradas as declarações prestadas pelos arguidos. Com efeito, quer o arguido LL (em sede de primeiro interrogatório judicial de arguido detido), quer o arguido AA (igualmente em primeiro interrogatório e também em declarações prestadas em audiência de julgamento) admitiram a prática dos factos, divergindo contudo, as respectivas versões, em alguns aspectos, quanto aos concretos actos praticados por cada um deles. Resulta no entanto de tais declarações que os arguidos actuaram conjuntamente, sendo indiferentemente um ou outro quem praticava os actos materiais, em verdadeira conjugação de esforços para finalidade comum, para além do que alguns de tais actos demandaram certamente a intervenção simultânea de ambos. É o caso do estrangulamento feito com uma meia de vidro, tendo em conta a força seguramente necessária para o fazer a alguém que, certamente, se terá debatido para tentar evitar tal acto, e também do transporte do corpo já inanimado de AP, tendo em conta a distância percorrida e o respectivo peso (considerando a referência no relatório de autopsia, ao seu excesso de peso). Em declarações prestadas em julgamento, aliás, o arguido AA afirmou mesmo que tais actos foram praticados conjunta e simultaneamente por ambos os arguidos, o que, em face do acima exposto, se tem por credível. Mais se considerou, para prova de tais factos, o relatório de inspecção ao local (fls. 94-102), bem como as imagens, do corpo do ofendido e local onde foi encontrado, e da viatura, juntas a fls. 127-149 e, quanto à descrição das lesões sofridas e causadoras da morte do ofendido, o relatório de autópsia médico-legal, complementado pelos esclarecimentos do perito médico subscritor do mesmo, em sede de audiência de julgamento, de tudo resultando terem sido tais lesões efectivamente causadoras da morte daquele. Foi ainda tido em conta o teor do auto de apreensão de fls. 112, do qual resulta terem sido encontrados na posse do arguido LL o cartão multibanco e diversas peças em ouro do ofendido, as quais foram reconhecidas pela viúva e pelo filho do ofendido (fls. 635 e 256), cujo valor resultou do exame de fls. 631, e ainda o auto de apreensão de fls. 552 e ss, do qual resulta terem sido encontrados os cheques do ofendido no quarto ocupado pelos arguidos numa residencial, bem como a listagem de chamadas efectuadas pelo telefone do arguido AA (fls. 704), incluindo as chamadas feitas, na data dos factos, para o número correspondente ao telefone de AP. Os factos relativos às situações em que o arguido LL conduziu as viaturas acima identificadas, dos ofendidos AD e AP, foram considerados os elementos de prova já acima referidos quanto a tais episódios e, quanto à ausência de habilitação legal do mesmo para conduzir, o resultado à pesquisa efectuada nas bases de dados do IMT. A matéria relativa aos elementos subjectivos decorre logicamente da demais matéria de facto provada, não podendo deixar de concluir-se, fazendo uso das regras da lógica e da experiência comum, e considerando os factos praticados – designadamente quanto ao número, profundidade e localização dos golpes feitos pelo arguido no corpo da vítima - que o primeiro necessariamente actuou com o propósito de tirar a vida ao segundo, agindo de forma livre e deliberada, e não podendo deixar de conhecer o carácter proibido da sua conduta. No que respeita à matéria alegada no pedido de indemnização civil, foi desde logo considerado o teor dos assentos de casamento, de nascimento e de óbito de fls. 1295 a 1298, para demonstração dos factos relativos à relação familiar entre o ofendido AP e os demandantes. A restante matéria de facto relativa a tal pedido resulta do teor das declarações prestadas pelos demandantes, tidas por credíveis e espontâneas, bem como do depoimento da testemunha JM, que confirmou a proximidade existente entre o casal e a circunstância de não ser conhecida outra fonte de rendimento à Demandante, que vivia do ordenado do seu marido. Foram ainda considerados os depoimentos dos agentes da PSP LF, JA e JV, os quais deram conta da sua intervenção, designadamente na localização dos arguidos e do cadáver do ofendido AP, bem como das demais diligências efectuadas nessa sequência, e também o do Sr. Inspector da PJ AV, o qual confirmou os vestígios detectados no local onde foi encontrado o cadáver e junto do mesmo. Procedemos à audição do registo sonoro dos meios de prova gravados, relevantes para a apreciação da impugnação da matéria de facto, concretamente, as declarações prestadas pelos arguidos LL e AA. Dos autos constam as declarações prestadas por ambos os arguidos, no respectivo primeiro interrogatório judicial, em situação de detenção, e num interrogatório subsequente, efectuado durante a fase processual de inquérito, pela Digna Magistrada do MP. Na audiência de julgamento, o arguido LL remeteu-se ao silêncio, enquanto o arguido AA prestou declarações, após a produção da prova testemunhal e a tomada de esclarecimentos ao Exº Perito Médico. Entre os factos impugnados pelo arguido LL, em sede de recurso, contam-se os descritos nos pontos 113 e 114, que consistem, respectivamente, na enumeração das lesões físicas sofridas pelo ofendido AP e na afirmação de que estas foram «causa necessária e adequada» da sua morte. Dada a natureza desses factos, cuja verificação envolve um juízo médico-científico, a convicção probatória do Tribunal «a quo», relativamente a eles, assentou necessariamente em meios de prova pericial, a saber o relatório da autópsia médico-legal feita ao ofendido AP e os esclarecimentos prestados em audiência pelo seu Autor. Os pressupostos da produção da referida categoria de meios de prova vêm previstos no art. 151º do CPP: A prova pericial tem lugar quando a percepção ou a apreciação dos factos exigirem especiais conhecimentos técnicos, científicos ou artísticos. Sobre o valor probatório específico da prova pericial dispõe o art. 163º do CPP: 1 - O juízo técnico, científico ou artístico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre apreciação do julgador. 2 - Sempre que a convicção do julgador divergir do juízo contido no parecer dos peritos, deve aquele fundamentar a divergência. Acerca do poder vinculativo da prova pericial, interessará ter em consideração aquilo que se expende na fundamentação do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16/10/2013, relatado pelo Exº Conselheiro Dr. Santos Cabral, proferido no processo nº 36/11.6PJOER.L1.S1 e disponível em www.dgsi.pt (transcrição com diferente tipo de letra): Na verdade, dispõe o normativo do artigo 163 do CPP que o juízo técnico, científico ou artístico inerente à prova pericial se presume subtraído à apreciação do julgador. Porém, a presunção é elidível na medida em que pode ser afastada quando a convicção do julgador divergir do juízo contido no parecer dos peritos, desde que seja (devidamente) fundamentada essa divergência. Este dispositivo converge com a lição de Figueiredo Dias (Direito Processual Penal, I vol., pp. 209 e 210) que, já no domínio do CPP de 1929, sustentava que «se os dados de facto que servem de base ao parecer estão sujeitos à livre apreciação do juiz – que, contrariando-os, pode furtar validade ao parecer – já o juízo científico ou parecer propriamente dito só é susceptível de uma crítica igualmente material e científica. Quer dizer: perante um certo juízo cientificamente provado, de acordo com as exigências legais, o tribunal guarda a sua inteira liberdade no que toca à apreciação da base de facto pressuposta; quanto, porém, ao juízo científico, a apreciação há-de ser científica também e estará, por conseguinte, subtraída em princípio à competência do tribunal – salvo casos inequívocos de erro, mas nos quais o juiz terá então de motivar a sua divergência». A nível da valoração da prova pericial no processo penal, ao permitir-se (apesar da presunção do nº 1 do artigo 163º do CPP) a divergência fundamentada, acaba por não se anular, de forma absoluta, a margem de apreciação livre do julgador. Pode-se afirmar que a pré-fixada valoração da prova pericial convive com o princípio da livre apreciação da prova, não obstante (só a nível da presunção contida no nº 1 do artigo 163º) ser configurada como uma sua “excepção”. Porém, qualquer divergência relevante não se basta com uma apreciação genérica e pouco consistente, sob pena de se incorrer numa inadmissível valoração subjectiva ou na falta de fundamentação. Nos termos do artigo citado o juízo técnico, científico ou artístico inerente à prova pericial presume-se subtraído à livre apreciação do julgador, dispondo o nº 2, do mesmo preceito legal que, sempre que a convicção do julgador divergir do juízo contido no parecer dos peritos, deve aquele fundamentar a divergência. A presunção que o artigo consagra não é, como refere Germano Marques da Silva (Ob. cit., vol. II, p. 198.), uma verdadeira presunção, no sentido de ilação que a lei tira de um facto conhecido para firmar um facto desconhecido; o que a lei verdadeiramente dispõe é que, salvo na existência de fundamento em crítica material da mesma natureza, isto é, científica, técnica ou artística, o relatório pericial se impõe ao julgador. Não é necessária uma contraprova, basta a valoração diversa dos argumentos invocados pelos peritos e que são fundamento do juízo pericial. Considera Marques Ferreira que se trata de uma presunção “natural” a qual, por conseguinte, cederá mediante contraprova. Efectivamente, não seria lógico que, pelo menos nas perícias em que houvesse votos de vencido (art. 157º, nº 5 do CPP), se pretendesse impor ao tribunal um juízo científico com valor probatório pleno, cedendo apenas perante a prova do contrário (Meios de prova In: Jornadas de Direito Processual Penal: o novo código de processo penal. – p. 219-270 Ob. cit., p. 259). De acordo com a orientação interpretativa consagrada no Aresto agora citado e com a qual concordamos, o juízo pericial (médico-científico, no caso em apreço) impõe-se ao Tribunal, a menos que este o afaste com apoio em argumentos científicos da mesma natureza. Na motivação do recurso e nas suas conclusões, o arguido LL não adianta quaisquer argumentos de ordem científica tendentes a desmentir o juízo pericial formulado no relatório da autópsia do ofendido AP. Pelo contrário, a impugnação deduzida pelo recorrente da matéria de facto fixada pela primeira instância parece pressupor, pelo menos até certo ponto, a bondade desse juízo científico, porquanto questiona determinados factos, respeitantes à sua intervenção individual no processo que culminou no decesso do mesmo ofendido, com fundamento na sua incompatibilidade com os resultados da autópsia. Nesta conformidade, e por não existirem razões que justifiquem, em termos legais, o afastamento da prevalência da prova pericial, teremos de manter inalterado o juízo de prova emitido sobre os factos descritos nos pontos 113 e 114 da matéria assente. Aqui chegados, importa que nos confrontemos criticamente com as declarações prestadas pelos arguidos LL e AA, nas diferentes fases processuais. Nas declarações que cada um prestou, em sede de primeiro interrogatório, ambos os arguidos reconheceram ter tido intervenção, juntamente com o respectivo co-arguido na factualidade de que foi ofendido o falecido AP e que culminou na morte deste. Contudo, tanto um arguido como outro optaram por alijar no co-arguido respectivo a responsabilidade pela iniciativa e pelos aspectos mais graves das condutas que vitimaram AP, procurando a cada passo dar a entender que tomaram parte nessa factualidade «a contragosto» e sem verdadeiro propósito de lesar o ofendido, muito menos de lhe tirar a vida. Semelhantes narrativas desempenham, na perspectiva dos arguidos que as produzem, uma função desculpabilizante e tendente a eximi-los, na medida do possível, da responsabilização jurídica, que as suas condutas reclamam, mas caem frequentemente em incoerência, já que não é concebível, em termos lógicos, que alguém se envolva numa actuação com outra pessoa, com vista a desapossar um terceiro, por meios violentes, dos bens que é portador e, por fim, a causar-lhe morte, a não ser em regime de pleno empenhamento. A descrita postura foi mantida por ambos os arguidos, no essencial, nas respostas que deram ao interrogatório subsequente, ainda na fase processual de inquérito. Pelo seu conteúdo, é manifesta a falta de credibilidade das declarações prestadas durante o inquérito, pelos dois arguidos. Diferentemente sucede com as declarações, que o arguido AA prestou em audiência de julgamento. É certo que o referido arguido produziu essas suas declarações já depois de produzida a totalidade da prova pessoal e de proferidos as alegações pelo MP e pelos ilustres advogados presentes, como é seu direito, o que lhe conferiu objectivamente a possibilidade de «adaptar» o seu conteúdo às necessidades da sua defesa, se assim o tivesse entendido. De todo modo, não se nos afigura que tenha sido esse o caso, pelo menos, no que diz respeito aos factos de que foi vítima AP. Nas declarações que prestou em primeiro interrogatório, o arguido AA procurou sistematicamente empurrar para o arguido LL (tal como este tentou fazer reciprocamente) a responsabilidade da iniciativa das condutas ilícitas, que então lhes eram indiciariamente imputadas, e da prática dos actos mais gravosos, que as integravam. Pelo contrário, em sede de audiência, aquele arguido reconheceu que os factos em detrimento de AP foram praticados por «mútuo acordo», como também foi assumido entre os dois arguidos, pelo menos a partir de certa altura, o propósito de infligir a morte a este ofendido, ainda que nada tenha sido explicitamente combinado entre eles, pois tudo foi «muito espontâneo». Como pode verificar-se, o arguido AA efectuou um sensível progresso, das declarações que prestou em inquérito para aquelas que prestou em audiência, no sentido da assunção das suas responsabilidades. Em semelhante contexto, não vislumbramos como plausível que o arguido AA tenha querido atribuir ao arguido LL alguma responsabilidade que este não tenha efectivamente tido. Por fim, a versão dos factos defendida pelo arguido AA nas suas mais recentes declarações é que faz sentido, à luz da lógica e da normalidade das coisas, pois quando duas pessoas intervêm numa conduta que tem como alvo um terceiro, a actuação é concertada e os propósitos são conjuntamente assumidos. Apesar de manter algumas incoerências, como a alegação de que não sabe explicar porque tomou a decisão de tirar a vida a AP, as declarações prestadas pelo arguido AA merecem o crédito que lhes foi emprestado pelo Tribunal «a quo», quanto à prova dos factos agora questionados pelo recorrente. Na motivação do recurso, o arguido LL não rejeita de todo essas declarações, mas antes pretende efectuar uma leitura das mesmas distinta daquela que o Tribunal Colectivo levou a cabo, a fim de, em conjugação com o relatório da autópsia chegar uma conclusão probatória oposta. Resultou da autópsia do ofendido AP e encontra-se reflectido no ponto 113 da matéria provada que a causa directa da sua morte foram os ferimentos na garganta e no tórax, que lhe provocaram as facadas desferidas nessas partes do corpo pelo arguido AA. O recorrente apoia-se na afirmação feita pelo arguido AA no sentido de que não combinaram entre si matar AP e que tudo se passou de forma muito espontânea, para se excluir a si mesmo desse propósito letal. Atenta a forma como actuaram os dois arguidos, não é impossível que tenham formado «ab initio» a intenção de infligir a morte ao ofendido. Contudo, a não ter sido assim, e a terem os arguidos inicialmente formado apenas o propósito de «assaltar» AP, é concebível, à luz da experiência comum, que, no calor da acção, tenham assumido conjuntamente a intenção de lhe tirar a vida, sem necessidade de o verbalizar. De resto, se outras razões não houvesse, o comportamento do arguido LL, ao ter apertado o pescoço de AP, puxando ele de um lado e o co-arguido do outro uma meia de vidro enrolada à volta dessa parte do corpo, foi inequivocamente demonstrativo da sua assunção do propósito de matar este ofendido, já que qualquer pessoa sabe que o descrito procedimento é idóneo a causar a asfixia e consequentemente a morte a quem seja alvo dele. Aparentemente, o descrito tratamento não terá sido suficiente para provocar o decesso do ofendido e este acabou por falecer dos ferimentos causados pelas facadas, que lhe foram desferidas pelo arguido AA. Contudo, tal facto é irrelevante para a responsabilização do arguido recorrente, porquanto nada permite que ele tenha, de alguma forma, desistido do propósito de tirar a vida ao ofendido ou se tenha demarcado das facadas que o co-arguido lhe infligiu. Nesta conformidade, importa concluir que não existem razões para reverter o juízo probatório emitido pelo Tribunal Colectivo, relativamente aos factos impugnados pelo recorrente. Invoca o recorrente que o Tribunal «a quo» ao ter julgado os factos por si impugnados transgrediu o princípio «in dubio pro reo» O postulado «in dubio pro reo» constitui um afloramento, ao nível da apreciação da prova, do princípio da presunção da inocência, constitucionalmente consagrado (art. 32º nº 2 da CRP), e obriga o Tribunal julgar não provado qualquer facto desfavorável ao arguido sempre que subsista uma dúvida racional, razoável e insanável sobre a sua existência. Segundo vimos entendendo, só nos encontraremos perante uma dúvida justificativa do apelo ao princípio «in dubio pro reo» nos casos em que, depois de efectuado o exame crítico da prova permaneça em aberto uma hipótese factual alternativa à probanda, que não seja de rejeitar por desconforme aos critérios que presidem à valoração probatória, mormente, a experiência comum, a normalidade das coisas e a lógica geralmente aceite. Tudo visto, e salvo melhor opinião, julgamos ter ficado demonstrado, através da análise da prova feita pelo Tribunal Colectivo e por nós corroborada, salvaguardado o poder vinculativo reforçado atribuído à prova pericial, que não subsiste espaço lógico para outra hipótese factual que não aquela que foi julgada provada pelo Tribunal «a quo. Consequentemente, impõe-se concluir que o juízo probatório emitido no acórdão sob recurso, na parte impugnada pelo recorrente, não viola a regra «in dubio pro reo», nem o princípio de presunção da inocência, fracassando tal impugnação. As vertentes jurídicas da pretensão recursiva têm como pressuposto o sucesso da impugnação da decisão sobre a matéria de facto. Perante o fracasso dessa impugnação, terão de improceder também os efeitos jurídicos que o recorrente pretendia alcançar. III. Decisão Pelo exposto, acordam os Juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora em negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida. Custas a cargo do recorrente, fixando-se em 3 UC a taxa de justiça. Notifique. Évora, 18/10/2018 (processado e revisto pelo relator) Sérgio Bruno Povoas Corvacho João Manuel Monteiro Amaro |