Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
876/22.0T8OLH-B.E1
Relator: TOMÉ DE CARVALHO
Descritores: DECLARAÇÃO DE INSOLVÊNCIA
REQUISITOS
ÓNUS DA PROVA
Data do Acordão: 06/15/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Sumário: 1 – A insolvência traduz-se na insusceptibilidade de o devedor satisfazer obrigações que, pelo seu significado no conjunto do passivo do devedor, ou pelas próprias circunstâncias do cumprimento evidenciam a impotência para continuar a satisfazer a generalidade dos seus compromissos.
2 – É incontroverso que a alegação e a prova dos factos cuja verificação faz presumir a situação de insolvência constitui ónus que impende sobre o credor que requeira a declaração de insolvência.
3 – A verificação dos factos-índice permite presumir a situação de insolvência do devedor mas este pode sempre ilidir esta presunção, provando que, não obstante a ocorrência de um ou mais factos do tipo enunciado, a situação de insolvência não se verifica.
(Sumário do Relator)
Decisão Texto Integral: Processo n.º 876/22.0T8OLH-B.E1
Tribunal Judicial da Comarca ... – Juízo de Comércio ... – J...
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Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório:
As sociedades “A..., SA” e “(…) de ..., SA” vieram requerer a insolvência de “B...– Unipessoal, Lda.”. Proferida sentença declaratória da insolvência, a requerida veio interpor recurso.
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As requerentes afirmavam que eram detentoras de créditos sobre a “B...– Unipessoal, Lda.” e que esta sociedade se encontrava impossibilitada de garantir o pagamento da dívida, mostrando-se reunidos os requisitos exigidos pelo artigo 20.º, n.º 1, alíneas a), b) e g), subalínea IV, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
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A requerida apresentou contestação em que afirmou que não se encontrava numa situação de insolvência.
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Realizado julgamento, para além do mais, por sentença datada de 23/02/2023, o Juízo de Comércio ... decidiu declarar a insolvência de “B..., Unipessoal, Lda.”.
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Inconformada com tal decisão, a recorrente apresentou recurso e as suas alegações continham as seguintes conclusões:
«A. De acordo com o disposto no artigo 662.º, n.º 1, do CPC, a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
B. Na oposição à declaração de insolvência apresentada pela recorrente nos presentes autos, alegou a mesma no artigo 274.º do referido articulado que “... a Requerida tem a sua situação contributiva e fiscal regularizada perante a Segurança Social e a Autoridade Tributária, existindo apenas relativamente à Autoridade Tributária um plano prestacional, que tem vindo a ser integralmente cumprido pela Requerida, conforme documentos n.º 79, 80 e 82.”
C. Tendo junto para prova dos referidos factos uma certidão emitida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, emitida em 12 de setembro de 2022 (documento n.º 79), declaração emitida pelo Instituto de Segurança Social, IP, emitida em 12 de setembro de 2022 (documento n.º 80) e detalhe do benefício PERES constante do portal da AT (documento n.º 82).
D. No ponto 115 da factualidade dada como provada o Douto Tribunal a quo considera provado que: “A Requerida beneficiou de um plano de pagamento de dívidas tributárias em prestações, que englobou um total em dívida de € 30.839,56, que foi cumprido, estando ainda em dívida apenas o valor de € 6.312,54 referente a prestações vincendas”.
E. Não constando da factualidade dada como provada, como se impunha, pela prova documental produzida que a ora recorrente tem a sua situação contributiva e fiscal regularizada perante a Segurança Social e a Autoridade Tributária.
F. Nos pontos 2 e 3 dos factos não provados, considera o Douto Tribunal como não provado que: “2- Devido à situação pandémica e à consequente quebra de facturação ao longo dos períodos de encerramento dos estabelecimentos, nomeadamente, entre Março e Maio de 2020 e Janeiro de 2021, a Requerida deparou-se com dificuldades financeiras que levaram a que o sócio gerente da mesma solicitasse a aplicação das medidas excepcionais de apoio às empresas, por forma a poder honrar os seus compromissos.
3- Medidas essas que foram recusadas pelas Requerentes”.
G. Das declarações de parte do legal representante da recorrente resulta que: (Áudio - 20221019155652_4298868_2870841) Legal representante da recorrente: minutos 07:28 “Em 2020 só abri uma das lojas 15 dias salvo o erro...”
Legal representante da recorrente: minutos 07:33 “...estávamos impedidos pelo estado, portanto, pelo governo, não é, de abrir as lojas e não sei o quê, de mexer nas blusas, uma série de alíneas e abri o snack bar e o outro quiosque da falésia acho dois meses, em vez de oito meses, nos dois...”
Legal representante da recorrente: minutos 07:48 “Nunca me foi aprovado, nada nem tentado negociar nada, como é que eu hei-de dizer, a moratória...”
Meritíssimo Juiz: minutos 07:58 “Portanto a única coisa que a marina fez foi repartir em mais prestações...”
Legal representante da recorrente: minutos 08:02 “Isso já foi muito depois, quando perguntei porque é que não tinha acesso a certas moratórias, foi-me dito que eles é que não queriam aceder à moratória e foi aí que foi negado, a (…) não quis aceder a moratórias, foi-me dito nas reuniões a mim, lá com a senhora AA presente, eles não iam aceder às moratórias...”
Meritíssimo Juiz: minutos 08:24 “Portanto eles não, não pretendiam aceder a nenhum apoio estatal...”
...
Legal representante da recorrente: minutos 08:30 “...tínhamos que faturar e pronto...”
H. Do depoimento da testemunha BB, resulta que:
(Áudio - 20221207141804_4298868_2870841) Testemunha BB: minutos 7:25 “Quando me pergunta se a empresa tem capacidade, se tem dívidas (imperceptível), o que eu analisei foi, neste momento a empresa tem, eu na altura não sabia responder a essa pergunta das contas caucionadas, eu não sabia de cor. Neste momento a empresa tem uma conta caucionada de 50.000,00 euros, a zero, ou seja, pode, estão disponíveis para usar e portanto, essa possibilidade de ir buscar o dinheiro sem grande dificuldade, mas não está usada, não é uma dívida, é neste momento uma possibilidade de disponibilidade de dinheiro, não é... Os últimos extratos a que eu tenho acesso, em contas à ordem, 18.400,00 euros e em caixa, 26.000,00 mil, por volta dos 26.100,00. Portanto, em termos de disponibilidade da empresa, diretas, eu somei 94.535,00 euros. Perguntei também ao sócio gerente se ele tinha alguma disponibilidade pessoal, caso fosse necessário para cobrir alguma dívida, ele retornou-me com informação, com extratos e etc., parte pessoal, portanto, neste momento o património pessoal com disponibilidade num curto espaço de tempo...”
Testemunha BB: minutos 08:59 “Tenho aqui extratos de hoje, extratos bancários, 9.900,00 euros aqui, (imperceptível), portanto, ele apresentou-me provas destes valores que me estava a dizer e a empresa. Ele em nome pessoal, ele trabalha numa empresa portanto, é ... acho que mediadora imobiliária, certo?... e tem vendas feitas também com valores a receber, que a empresa assume através de uma declaração assinada (imperceptível). Portanto, tem, num curto espaço de tempo e com os valores ele conseguiria assegurar 20.500,00 euros pessoal, visto que a empresa é só dele, portanto, ele é o único sócio, portanto, ele não teria problemas em disponibilizar, é o capital da empresa disponível e o capital de sócio em relação à pergunta da capacidade para pagar.”
Meritíssimo Juiz: minutos 09:55 “Isso é um pouco diferente do que pelo próprio Sr. CC nos foi declarado na sessão de julgamento em que a senhora cá esteve.”
...
Testemunha BB: minutos 10:35 “Neste momento a informação que eu tenho dele é que, ele não estava a ver aqui, nós estivemos a falar sobre isto, ele não estava a ver, a possibilidade dos 50.000,00 euros que ele não tencionava ir buscar, se não fosse realmente necessário...”
Atento o teor do depoimento da testemunha BB, a matéria supratranscrita deveria ter sido considerada provada pelo Tribunal, julgando-se como factos provados que:
a) A recorrente tem uma conta caucionada de 50.000,00 euros disponíveis; para usar;
b) A recorrente tem contas à ordem cujo saldo é atualmente de 18.400,00 euros;
c) A recorrente tem em caixa 26.000,00 euros;
d) O sócio da recorrente dispõe de um saldo de € 9.900,00 numa conta bancária pessoal, conseguindo assegurar num curto espaço de tempo o valor de € 20.500,00.
I. O erro na apreciação das provas consiste em o Tribunal ter dado como provado ou não provado determinado facto, quando a conclusão deveria ter sido manifestamente contrária, seja por força de uma incongruência lógica, seja por ofender princípios e leis científicas, nomeadamente das ciências da natureza e das ciências físicas ou contrariar princípios gerais da experiência comum (sendo em todos os casos o erro mesmo notório e evidente) seja também quando a valoração das provas produzidas apontarem num sentido diverso do acolhido pela decisão judicial mas, note-se, excluindo este.
J. Devendo o Douto Tribunal ad quem dar como provados os factos constantes do artigo 274 alegados em sede de oposição à declaração de insolvência pela recorrente, os factos constantes da douta sentença recorrida, dos pontos 2 e 3 dos factos não provados e os factos relativos à disponibilidade financeira da recorrente, bem como dos factos relativos à disponibilidade financeira do seu sócio, para assegurar o cumprimento das obrigações da mesma.
K. Estatui o artigo 615.º do CPC, sob epígrafe “Causas de nulidade da sentença”:
“1 – É nula a sentença quando: (...)
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão;
L. Face à matéria dada como provada nos presentes autos, deveria o tribunal a quo ter considerado inexigível o montante reclamado pelas recorridas, com base no qual fundamentaram o pedido de declaração de insolvência da recorrente.
M. Já que, tal como consta da factualidade dada como provada nos pontos 17, 18 e 19, encontra-se pendente no Tribunal Judicial da Comarca ..., ação declarativa de condenação, no Juízo Central Cível ... - Juiz ... com o n.º 1287/22...., na qual ao recorridas pediram ao Tribunal que determine a restituição imediata dos estabelecimentos “C...” e o “D...”, que integram o apoio de praia simples sito na ..., ..., freguesia ..., concelho ..., bem como no pagamento da quantia de € 122.277,16.
N. Tendo a recorrente invocado nos referidos autos a inexistência por parte das recorridas de título de utilização válido que lhes permita exigir o pagamento das quantias das quais se arrogam credoras, bem como a entrega dos supra identificados estabelecimentos.
O. Tal como foi decidido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal ..., na providência cautelar n.º 306/22.....
P. Não sendo as recorridas, desde 31 de dezembro de 2019, titulares de quaisquer licenças relativas aos estabelecimentos “C...” e “D...” que lhes atribua legitimidade para peticionar a condenação da Requerida a proceder à restituição às mesmas dos referidos estabelecimentos, que integram o apoio de praia simples sito na ..., ..., freguesia ..., concelho ....
Q. Nem para exigir o pagamento do montante do qual se arrogam credoras, no valor de € 114.317,30 (cento e catorze mil, trezentos e dezassete euros e trinta cêntimos), pois as rendas que vêm reclamar dizem respeito a um período em que já não dispunham de qualquer título de utilização válido.
R. Invocou ainda a recorrente na ação cível supra referida a nulidade dos “Acordos de Colaboração”.
S. Uma vez que, as recorridas, tal como resulta do ponto 11 da factualidade dada como provada, estavam impedidas de ceder alienar ou onerar, a qualquer título, os direitos emergentes da concessão, salvo nos casos previstos na lei ou devidamente autorizados, tal como consta do ponto 3 das obrigações genéricas do titular da licença definidas no alvará supra identificado, o que as impedia de celebrar quaisquer “Acordos de Colaboração”, cessão de exploração ou subconcessão.
T. O mesmo sucedendo relativamente à Autorização de Utilização dos Recursos Hídricos – Ocupação do DPH por Apoio de Praia, com o n.º ...H8, com início em 19/04/2013.
U. Como resulta do ponto 19 dos factos dados como provados a ação cível em que se discute a existência dos créditos reclamados pelas recorridas, que serviu de fundamento ao pedido de declaração de insolvência da recorrente, ainda se encontra pendente.
V. O douto Tribunal a quo por um lado considerou provado que as recorridas não são titulares de licença válida que lhes permita explorar os estabelecimentos comerciais C... e D..., desde 31 de dezembro de 2019.
X. Considerou também provado que, de acordo com o ponto 3 das obrigações genéricas do titular da licença definidas no alvará supra identificado, as recorridas estavam impedidas de ceder, onerar, a qualquer título, os direitos emergentes da concessão.
Z. Em contradição com os factos supra expostos julgados provados, considerou o Tribunal a quo que os valores reclamados pelas recorridas são devidos pela recorrente.
AA. Verificando-se clara oposição entre os fundamentos de facto e direito considerados.
AB. Em violação do disposto na alínea c) do artigo 615.º do CPC e, assim, ferindo de nulidade a sentença a quo, porquanto os fundamentos de facto e de direito considerados estão em clara oposição com a decisão proferida.
AC. Na ação cível onde são reclamados por parte das recorridas os créditos que serviram de fundamento ao pedido de declaração de insolvência, não existe qualquer decisão relativa à exigibilidade do crédito reclamado pelas recorridas.
AD. Constituindo fundamento do pedido de declaração de insolvência um crédito litigioso.
AE. Não tendo as recorridas indicado quaisquer outros credores, nem tendo sido apurada a existência de quaisquer outros créditos.
AF. Constituindo as recorridas o único credor da recorrente, tal como referido na Douta sentença, segundo a qual estas são “...as credoras maioritárias da Requerida, senão as únicas...”.
AG. De acordo com o artigo 20.º do CIRE, no seu n.º 1 “a declaração de insolvência de um devedor pode ser requerida por quem for legalmente responsável pelas suas dívidas, por qualquer credor, ainda que condicional e qualquer que seja a natureza do seu crédito, ou ainda pelo Ministério Público em representação das entidades cujos interesses lhe estão legalmente confiados”.
AH. À luz da suprarreferida disposição legal, qualquer credor constitui sujeito legitimado para requerer a insolvência, defendendo a maioria da jurisprudência que o titular de um crédito litigioso tem legitimidade para requerer a insolvência do devedor do controvertido crédito, segundo a tese da legitimidade ampla.
AI. Porém, de acordo com a jurisprudência, tal posição não se pode manter se estiver em causa uma situação em que o credor requerente da insolvência, que o faz enquanto titular de um crédito litigioso, constitui o único credor do devedor cuja insolvência requer.
AJ. As recorridas não indicaram a existência de outros credores e a recorrente negou a sua existência.
AK. Apesar da insolvência poder decorrer do incumprimento de uma única obrigação, o certo é que não há insolvência sem, pelo menos, uma obrigação vencida.
AL. questão da verificação da existência do crédito das recorridas é de natureza manifestamente complexa, não sendo a mesma suscetível de ser apreciada num processo que se pretende célere, de caráter urgente como sucede no processo de insolvência.
AM. Impondo-se por tal motivo o apuramento prévio ao processo de insolvência da existência e exigibilidade do crédito alegado pelas recorridas.
AN. Obstando, no caso concreto, a natureza litigiosa do referido crédito à procedência do pedido de declaração de insolvência.
AO. Pelo que, violou o Tribunal a quo, ao decretar a insolvência da recorrente, requerida pelas recorridas, únicas credoras da recorrente, com base num crédito litigioso, que constitui o único crédito, o disposto nos artigos 20.º e 3.º do CIRE.
AP. Segundo o Meritíssimo Juiz a quo, “...de acordo com o critério do n.º 2 do artigo 3.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, a sociedade Requerida está insolvente.”
AQ. Conclui o douto Tribunal que, face aos resultados negativos apresentados entre 2019 e 2021, “...não só a sociedade Requerida está em situação de insolvência técnica, como é devedora do valor € 114.317,30, obrigação essa já vencida, não dispondo de meios para a satisfazer.”
AR. Não tendo o Tribunal considerado que os resultados negativos apresentados pela recorrente, devem-se ao facto de, relativamente aos anos de 2020 e de 2021, estarem contabilizadas as faturas emitidas pela empresa (…) de ..., relativas ao Snack-Bar e D....
AS. Cujos montantes reclamados, como já se referiu, ainda se encontram a ser discutidos na ação cível pendente no Tribunal Judicial da Comarca ..., supra identificada e que ainda não foram confirmados judicialmente, não tendo sido proferida, no mencionado processo, decisão.
AT. Faturas estas que, de acordo com as normas contabilísticas aplicáveis, não devem ser consideradas no apuramento da situação financeira da recorrente.
AU. Sendo esta a causa dos resultados negativos registados pela recorrente, conforme resulta da análise de rácios relativos ao período de 2019 a 2022, excluindo as faturas emitidas pelas recorridas, nos anos de 2020 e de 2021, referentes ao C....
AV. Segundo os quais, de acordo com o indicador de liquidez geral, a capacidade da empresa para fazer face aos seus compromissos de curto prazo, em 2019 de 41%, verificando-se um aumento da liquidez para 84% em 2020, 136% em 2021, subindo a liquidez geral da recorrente para 155% em 2022.
AX. Sendo o prazo médio de pagamento aos fornecedores é de 15 dias em 2019, 18 dias em 2020, 30 dias em 2021 e 36 dias em 2022.
AZ. Relativamente à análise dos rácios de autonomia financeira e de ním 2019 a recorrente apresenta um nível de endividamento de 165,59%, o qual sofre uma redução acentuada nos anos seguintes, constituindo uma evolução positiva da situação financeira da mesma, apresentando em 2020 um nível de endividamento d 108,37%, em 2021 de 75,58% e em 2022 de 66,57%.
BA. Mesmo que assim não fosse, com base apenas nos resultados negativos considerados pelo Tribunal a quo, não poderia ser declarada a insolvência da recorrente, uma vez que a situação de insolvência não se subsume à situação da sociedade apresentar um ativo líquido negativo, isto é, de apresentar um passivo superior ao ativo.
BB. Tal, por si só, não significa que a recorrente, ao longo dos anos em análise, não apresente capacidade para liquidar a totalidade das suas dívidas de curto prazo, ao contrário do decidido pelo douto Tribunal a quo.
BC. Impondo-se a avaliação da disponibilidade da recorrente e do seu sócio, a título pessoal, para garantir o cumprimento das obrigações da mesma.
BD. A qual resulta do depoimento prestado pela testemunha BB, o qual ficou gravado em áudio, identificado com o número 20221207141804_4298868_2870841, refere a testemunha BB, contabilista certificada da recorrente, o seguinte:
Testemunha BB: minutos 7:25 “Quando me pergunta se a empresa tem capacidade, se tem dívidas (impercetível), o que eu analise foi, neste momento a empresa tem, eu na altura não sabia responder a essa pergunta das contas caucionadas, eu não sabia de cor. Neste momento a empresa tem uma conta caucionada de 50.000,00 euros, a zero, ou seja, pode, estão disponíveis para usar e portanto, essa possibilidade de ir buscar o dinheiro sem grande dificuldade, mas não está usada, não é uma dívida, é neste momento uma possibilidade de disponibilidade de dinheiro, não é.
Os últimos extratos a que eu tenho acesso, em contas à ordem, 18.400,00 euros e em caixa, 26.000,00 mil, por volta dos 26.100,00. Portanto, em termos de disponibilidade da empresa, diretas, eu somei 94.535,00 euros. Perguntei também ao sócio gerente se ele tinha alguma disponibilidade pessoal, caso fosse necessário para cobrir alguma dívida, ele retornou-me com informação, com extratos e etc., parte pessoal, portanto, neste momento o património pessoal com disponibilidade num curto espaço de tempo...”
Testemunha BB: minutos 08:59
“Tenho aqui extratos de hoje, extratos bancários, 9.900,00 aqui, (impercetível), portanto, ele apresentou-me provas destes valores que me estava a dizer e a empresa, ele em nome pessoal ele trabalha numa empresa portanto, é, acho que mediadora imobiliária, certo?, e tem vendas feitas também com valores a receber, que a empresa assume através de uma declaração assinada (imperceptível). Portanto, tem, num curto espaço de tempo e com os valores ele conseguiria assegurar 20.500,00 euros pessoal, visto que a empresa é só dele, portanto, ele é o único sócio, portanto, ele não teria problemas em disponibilizar, é o capital da empresa disponível e o capital de sócio em relação à pergunta da capacidade para pagar.”
Meritíssimo Juiz: minutos 09:55
Isso é um pouco diferente do que pelo próprio Sr. CC nos foi declarado na sessão de julgamento em que a senhora cá esteve.
...
Testemunha BB: minutos 10:35
“Neste momento a informação que eu tenho dele é que, ele não estava a ver aqui, nós estivemos a falar sobre isto, ele não estava a ver, a possibilidade dos 50.000,00 euros que ele não tencionava ir buscar, se não fosse realmente necessário...”
BE. Matéria esta que deveria ter sido considerada como provada pelo Tribunal.
BF. Tendo sido requerida pela mandatária da recorrente a junção aos autos dos documentos, na posse da referida testemunha, com base nos quais esta prestou o seu depoimento, nomeadamente, extratos das contas bancárias da recorrente, do Novo Banco e do Bankinter, extratos das contas bancárias do legal representante desta, certidão atualizada emitida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, comprovativa da situação fiscal regularizada, à data de 06-12-2022, declaração emitida pelo Instituto de Segurança Social, IP, à data de 06-12-2022, comprovativa da situação contributiva regularizada, balanço e demonstração de resultados previsional até 31-10-2022, balancete analítico de 2022, extratos contabilísticos do fornecedor (…) de ... de 2020 a 2022, bem como uma declaração comprovativa de vendas realizadas na atividade imobiliária do legal representante da recorrente.
BG. Requerimento este que foi parcialmente indeferido pelo douto Tribunal a quo, não tendo sido admitida a junção dos extratos das contas bancárias da recorrente, do (…) Banco e do (…), extratos das contas bancárias do legal representante desta, certidão atualizada emitida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, comprovativa da situação fiscal regularizada, à data de 06-12-2022, declaração emitida pelo Instituto de Segurança Social, IP, à data de 06-12-2022, comprovativa da situação contributiva regularizada, bem como uma declaração comprovativa de vendas realizadas na atividade imobiliária do legal representante da recorrente.
BH. Nos termos do artigo 423.º, n.º 3, 2ª parte, do CPC, são admitidos os documentos cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior.
BI. Na sequência do depoimento da testemunha BB, tornou-se necessária a apresentação dos documentos com base nos quais a mesma prestou o seu depoimento e dos quais esta era portadora, tal como determinado pelo Meritíssimo Juiz a quo, no seu despacho de 14-11-2022, nomeadamente dos documentos comprovativos da situação contabilística da recorrente, os quais comprovam a disponibilidade financeira quer da recorrente, quer do sócio da mesma.
BJ. Verificando-se que o Tribunal a quo devia ter admitido a junção dos documentos pela recorrente no requerimento de 07/12/2022, com fundamento no disposto no artigo 423.º, n.º 3, 2ª parte, por se ter tornado necessária a apresentação dos mesmos, na sequência do depoimento da testemunha BB e em cumprimento do dever de atualidade que deve revestir a sentença que decreta a insolvência.
BK. Ao não o fazer violou o Tribunal a quo a suprarreferida disposição legal.
BL. Apesar do indeferimento da junção dos documentos suprarreferidos, do depoimento da testemunha supra identificada, resulta que a recorrente e o seu sócio, a título pessoal, dispõem de meios que lhe permitem cumprir as suas obrigações.
BM. Factos estes que deveriam ter sido considerados provados pelo Tribunal a quo.
BN. A insolvência corresponde à impossibilidade de cumprimento pontual das obrigações vencidas, por ausência de liquidez e não à insuficiência patrimonial, correspondente a uma situação líquida negativa.
BO. Pode haver situação líquida positiva e haver insolvência, se se verificar que a falta de crédito não permite ao devedor superar a sua carência de liquidez para cumprir as suas obrigações vencidas, assim como, inversamente, uma situação líquida negativa não implicará a insolvência do devedor se o recurso ao crédito lhe permitir cumprir pontualmente as suas obrigações.
BP. Pelo que, não deveria o Tribunal a quo ter declarado a insolvência da recorrente, destruindo desta forma uma empresa perfeitamente viável, atirando para o desemprego os trabalhadores que a recorrente tem ao seu serviço, para garantir o funcionamento do C..., os quais, bem como os respetivos agregados, dependem do salário que auferem.
BQ. Declaração esta que, de acordo com os argumentos supra expostos, viola o disposto no artigo 3.º, n.º 2, do CIRE.
Termos em que, obtido de V. Exas., Venerandos Desembargadores, o provimento do presente recurso, espera-se:
a) A prolação de douta decisão que revogue a douta sentença recorrida e indefira o pedido de declaração de insolvência formulado pelas recorridas, por inexistência dos factos que servem de fundamento ao pedido;
Ou caso assim não se entenda,
b) que seja revogada a douta sentença e ordenada a repetição do julgamento para prova dos factos que, no entender da ora recorrente, sustentam a solvabilidade da devedora.
Assim se fazendo a costumada Justiça!»
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As requerentes apresentaram resposta ao recurso interposto, pugnando pela respectiva improcedência.
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Admitido o recurso, foram observados os vistos legais. *
II – Objecto do recurso:
É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo diploma).
Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito a apurar se existe:
i) motivo para não conhecer de parte do objecto do recurso.
ii) a nulidade prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil.
iii) erro na apreciação da matéria de facto.
iv) erro de direito, na dimensão em que deveria ser julgado improcedente o pedido de declaração de insolvência.
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III – Factualidade assente:
3.1 – Factos provados
1 – A 1.ª Requerente, anteriormente denominada “E..., SA”, tem como objecto social a «compra e venda de móveis e imóveis, incluindo a revenda dos imóveis adquiridos para esse fim, bem como a urbanização, loteamento, construção e administração de bens imóveis próprios ou alheios, elaboração de estudos e projectos e prestação de serviços relativos à actividade imobiliária, exploração de actividades hoteleiras e de golfe».
2 – A 2.ª Requerente é uma sociedade anónima que tem como objecto social, «a administração de Portos de Recreio».
3 – A Requerida é uma sociedade unipessoal por quotas que tem como objecto social a «Exploração de snack-bar, bar, cafetaria, restaurante e outros estabelecimentos de hotelaria e restauração. Exploração de concessões e apoios de praia, aluguer de equipamento de recreio e lazer. Organização e promoção de festas e eventos desportivos, musicais, culturais e de lazer. Comércio a retalho de artigos de papelaria, jornais e revistas, artigos de praia e artesanato».
4 – A Requerida tem o capital social de € 5.000,00 (cinco mil euros).
5 – O capital social da Requerida é integralmente detido pelo seu sócio único CC.
6 – O sócio único da requerida é também seu gerente.
7 – Com efeitos a partir de 1 de Junho de 2007, foi atribuída pela Administração da Região Hidrográfica do ..., I.P. à “E..., SA” (actualmente denominada “A..., SA”) uma licença de utilização do domínio público hídrico, titulada pelo Alvará n.º ...1..., para instalação do apoio de simples denominado “C...”, na ..., ... (...), freguesia ..., concelho ..., com funções complementares de alimentos pré-confeccionados, refrigerantes e gelados, com o teor do alvará junto com o requerimento inicial como documento n.º 4 e que se dá por integralmente reproduzido.
8 – Tal apoio de praia integra um snack-bar, denominado “C...”, destinado a comércio de produtos pré-confeccionados, refrigerantes e gelados, e um quiosque, denominado “C...”, destinado a comércio de artigos de praia, artesanato, lembranças, tabaco, jornais, revistas, gelados e análogos.
9 – O prazo de validade desta licença de utilização do domínio público hídrico terminava, de acordo com o respectivo alvará, no dia 31 de Dezembro de 2017.
10 – Das condições gerais da licença definidas no respectivo alvará consta, no ponto 10.º, o seguinte: “A licença caduca nas condições previstas no artigo 33.º do Decreto-Lei n.º 226-A/2007, de 31 de Maio”.
11 – Das obrigações genéricas do titular da licença definidas no respectivo alvará consta, no ponto 3.º, o seguinte: “Não ceder, alienar ou onerar, a qualquer título, os direitos emergentes da concessão, salvo nos casos previstos na lei ou devidamente autorizados”.
12 – Em 11 de Abril de 2018, foi remetido para a 2ª Requerente uma mensagem por correio electrónico, subscrita pelo Director Regional da Administração da Região Hidrográfica do ..., com o seguinte teor: «(…)De acordo com o solicitado no v/ email e para os devidos efeitos, informa-se que, tal como determina o n.º 9 do artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 226-A/2007, de 31 de Maio, alterado pelos Decreto-Lei n.º 93/2008, de 4 de Junho (retificado pela Declaração de Retificação n.º 32/2008, de 11 de junho), e pela Lei n.º 44/2012, de 29 de Agosto, a licença acima mencionada referente ao Apoio de Praia Simples denominado “C...”, sito na ... continua válida até à decisão final do procedimento concursal com prazo máximo de dois anos após a data de término da licença.(…)», com o teor do documento n.º 7 junto com o requerimento inicial, que se dá por reproduzido na íntegra.
13 – Em 17 de Dezembro de 2020, foi remetido para a 2ª Requerente uma mensagem por correio electrónico, subscrita pelo Director Regional da Administração da Região Hidrográfica do ..., com o seguinte teor: «(…) De acordo com o solicitado no v/ email e para os devidos efeitos, informa-se que, dada a situação de pandemia COVID 19 que impossibilitou a transferência de competências para o Município, bem como a abertura de concurso tal como determina o n.º 9 do artigo 21.º do Decreto-Lei n.º 226-A/2007, de 31 de Maio, alterado pelos Decreto-Lei n.º 93/2008, de 4 de Junho (retificado pela Declaração de Retificação n.º 32/2008, de 11 de Junho), e pela Lei n.º 44/2012, de 29 de Agosto, a licença acima mencionada referente ao Apoio de Praia Simples denominado “C...”, sito na ... continua válida de acordo com o Decreto-Lei n.º 22/2020, de 16 de maio.(…)», com o teor do documento nº 8 junto com o requerimento inicial, que se dá por reproduzido na íntegra.
14 – Em 25 de Agosto de 2021, foi remetido para a 2ª Requerente uma mensagem de correio electrónico, subscrita pelo Director Regional da Administração da Região Hidrográfica do ..., com o seguinte teor: «(…) De acordo com o solicitado no v/ mail informa-se V. Exa. que as competências referentes à estrutura denominada "C...” transitaram estes ano para a Câmara Municipal ... pelo que deverá solicitar esclarecimentos a esta, conforme n/ ofício n.º ...06 de 15/06/2021 (…)».
15 – Em 15 de Março de 2022, foi emitida pelo Município ... uma factura/recibo com o valor correspondente à liquidação da taxa de recursos hídricos relativa ao ano de 2021 (“TRH/2021”), devida como contrapartida pela ocupação privativa do domínio público marítimo, relativa ao apoio de praia designado “C...”, cujo pagamento foi efectuado pela “A..., SA”.
16 – Entre a 1ª e a 2ª Requerentes foi celebrado um contrato através do qual a “(…) de ..., SA” assumiu a responsabilidade pela administração e exploração dos referidos apoios de praia e das instalações neles integradas.
17 – No dia 11 de abril de 2022, as ora Requerentes interpuseram contra a ora Requerida ação declarativa de condenação, no Juízo Central Cível ..., acção essa que foi distribuída ao Juiz ... com o n.º 1287/22.....
18 – Nessa acção, as ora Requerentes pediram ao Tribunal que determine a restituição imediata dos estabelecimentos “C...” e o “D...”, que integram o apoio de praia simples sito na ..., ..., freguesia ..., concelho ..., bem como no pagamento da quantia de € 122.277,16.
19 – Tal acção encontra-se pendente de decisão.
20 – A 15/06/2022, a 1ª e 2ª Requerente propuseram um procedimento cautelar contra a Requerida no Tribunal Administrativo e Fiscal ..., pedindo ao Tribunal que intimasse a Requerida a entregar às Requerentes o “C...” e o “D...”, procedimento esse que pendeu sob o n.º 306/22.....
21 – O Tribunal Administrativo e Fiscal ... julgou improcedente tal pedido e indeferiu o decretamento de tal providência cautelar.
22 – Na fundamentação da sua decisão, o Tribunal Administrativo e Fiscal ... sustentou, além do mais, o seguinte:
«E neste caso concreto, como se evidencia, falta efectivamente às requerentes a necessária legitimidade – não processual, mas substantiva – sem a qual, como julgamos, a pretensão que formularão no processo principal não poderá ser julgada procedente. Com efeito, como resulta da matéria apurada, foi concedida à primeira requerente uma licença que lhe conferia o direito de utilização privativa sobre a parcela do domínio público hídrico onde foi instalado o apoio de praia, que inclui o snack-bar e o quiosque em cuja posse as requerentes pretendem ser restituídas, com efeitos a partir de 1 de Junho de 2007 e, conforme nela foi fixado, com termo em 31 de Dezembro de 2017 [cfr. alíneas a) a c) dos factos provados].
Ora, nos termos do disposto no artigo 33.º, alínea a), do Decreto-Lei n.º 226- A/2007, de 31 de Maio, diploma que estabelece o regime da utilização dos recursos hídricos [aplicável à licença ora em discussão (cfr. artigos 90.º e 98.º)], os títulos de utilização caducam com o decurso do prazo fixado: ou seja, neste caso em concreto, a licença concedida à primeira requerente caducaria em 31 de Dezembro de 2017 [cfr. alínea d) dos factos provados].
E ainda que o prazo de validade desta licença tenha sido excepcionalmente prorrogado até à decisão final do procedimento de concurso (que ainda não havia sido iniciado), ao abrigo do artigo 21.º, n.º 9, do referido Decreto-Lei n.º 226-A/2007 – por decisão que, note-se, para além da declaração remetida por correio electrónico subscrita pelo Director Regional da Administração da Região Hidrográfica do ... em 11 de Agosto de 2018 [cfr. alínea j) dos factos provados], não consta documentada no processo, nem terá sido antecedida de pedido algum expressamente formulado nesse sentido – essa prorrogação nunca poderia exceder o prazo máximo de dois anos, por força do disposto na parte final desse mesmo preceito: ou seja, a licença caducaria, necessariamente, em 31 de Dezembro de 2019.
É certo que, em 30 de Outubro de 2020, foi emitida uma declaração pelo Director Regional da Administração da Região Hidrográfica do ... da qual consta que, nessa data, a licença continuava “válida de acordo com o Decreto-Lei n.º 22/2020, de 16 de maio” [cfr. alínea k) dos factos provados].
No entanto, e independentemente da validade ou dos efeitos desta declaração [que, como se prefigura, não consubstancia um acto administrativo, por não conter uma decisão (no caso, de prorrogação do prazo de validade da licença) tendente a produzir efeitos jurídicos externos naquela situação individual e concreta, mas quando muito um acto certificativo, que, aliás, sempre seria nulo, por força do disposto no artigo 161.º, n.º 2, alínea j), do Código do Procedimento Administrativo, por ser inverídico o facto certificado], o certo é que esta remissão para o Decreto-Lei n.º 22/2020, de 16 de Maio, só se compreende, com sentido útil, se feita para artigo 16.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março (que o referido Decreto-Lei n.º 22/2020 alterou e republicou), à luz do qual as licenças cuja validade tivesse expirado a partir da data da entrada em vigor deste mesmo decreto-lei (em 9 de Março de 2020 – cfr. artigos 36.º e 37.º) ou nos 15 dias imediatamente anteriores - o que não é manifestamente o caso – seriam aceites, nos mesmos termos, até (e apenas até) 30 de outubro de 2020, data em que, aliás, a dita declaração foi emitida.
E sendo assim, quando foi intentado o presente processo cautelar, em 15 de Junho de 2022 – e quando as competências em causa já se consideravam transferidas para as autarquias locais, com efeitos em 1 de Janeiro de 2021 [cfr. artigo 4.º, n.º 3, da Lei n.º 50/2018, de 16 de Agosto; cfr., também, alínea l) dos factos provados] – a licença concedida à primeira requerente, que antes lhe conferia o direito de uso privativo sobre aquela parcela do domínio público hídrico onde foi instalado o apoio de praia em causa, estaria já, sempre e de qualquer forma, caducada.
A tanto não obsta, note-se, o facto de ter sido paga a taxa de recursos hídricos, referente, aliás, ao ano de 2021 (e não ao ano de 2022), quando a liquidação dela, na falta de um título de utilização do domínio público hídrico válido e eficaz, é insusceptível de conferir ao particular, por si só, o direito de utilização privativa e exclusiva da parcela em causa.
Como tal, não sendo as requerentes, actualmente, titulares do direito de utilização da parcela do domínio público hídrico onde se encontram instalados os equipamentos em causa, não têm as mesmas, efectivamente, legitimidade (substantiva) para exigir das autoridades competentes, com fundamento no artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 226-A/2007, de 31 de Maio, a adopção das providências adequadas para garantia desse direito – que não têm –, nem, como tal, para pedir, com fundamento na inércia dessas mesmas autoridades, a intimação da entidade requerida a restituir-lhes essa mesma parcela ou os equipamentos que nela estão implantados».
23 – Tal sentença foi confirmada pelo Tribunal Central Administrativo ..., por acórdão de 26/01/2023.
24 – A 29/08/2022, as Requerentes propuseram o presente processo de insolvência contra a Requerida, pedindo a sua declaração de insolvência.
25 – Considerando que a Requerida dispunha de conhecimento, know-how e experiência na exploração de estabelecimentos desta natureza, no âmbito das suas actividades e respectivas qualidades, as Requerentes e a Requerida celebraram diversos acordos com vista à exploração dos equipamentos atrás identificados, entre os anos de 2007 e 2021.
26 – Ao abrigo de tais acordos, as Requerentes colocaram à disposição da Requerida as instalações identificadas nestes autos, respectivamente, o “F...”, o “C...” e o “D...”, bem como os respectivos equipamentos.
27 – Sendo que a Requerida procedia à exploração de tais unidades nos termos acordados com as Requerentes, obrigando-se a prestar aos utentes da ... os serviços de refeições, bebidas frescas, cafés e outros produtos alimentares, sendo da sua responsabilidade as despesas inerentes à aquisição de produtos, confeção de refeições, todos os encargos com o pessoal, consumos de água, gás, eletricidade e telefone, assim como todas as despesas relacionadas com o funcionamento das instalações e atendimento ao público, e de todas as licenças com exclusão das directamente relacionadas com a concessão.
28 – A Requerida obrigava-se também a garantir o funcionamento dos supra identificados quiosques, sitos na ... e na Praia da ..., destinados à venda ao público de artigos de praia, artesanato, lembranças, tabaco, jornais, revistas, gelados e análogos.
29 – Os direitos e obrigações inerentes de ambas as partes foram estabelecidos nos referidos acordos, celebrados ao longo dos anos desde 2007 e com duração anual.
30 – No âmbito da execução de tais acordos, as Requerentes entregaram à Requerida os estabelecimentos denominados “C...”, “D...” e “F...”.
31 – Em 22 de Outubro de 2019, as Requerentes e a Requerida celebraram um acordo que designaram «Acordo de Colaboração», com a referência ...19..., relativo ao “F...” e respectivo equipamentos, com o teor do documento n.º 9 junto com a petição inicial e que se dá por reproduzido na íntegra.
32 – Nos termos da cláusula sétima do referido acordo, as receitas seriam repartidas entre a 2.ª Requerente e a Requerida, garantindo a Requerida à 2.ª Requerente uma receita mínima de € 28.935,00, a pagar da seguinte forma:
(i) € 5.798,66, acrescido de IVA, até 30 de Junho de 2020;
(ii) € 8.655,30, acrescido de IVA, até 30 de Julho de 2020;
(iii) € 11.484,33, acrescido de IVA, até 31 de Agosto de 2020;
(iv) € 2.996,71, acrescido de IVA, até 15 de Setembro de 2020; e
(v) € 2.673,57, acrescido de IVA, até 15 de Setembro de 2020.
33 – O acordo relativo ao “F...” foi celebrado pelo prazo de um (1) ano, com início em 1 de Novembro de 2019 e termo em 31 de Outubro de 2020.
34 – Em 17 de Junho de 2020, as Requerentes e a Requerida celebraram um acordo que designaram «Acordo de Colaboração», com a referência ...20..., relativo ao “C...” e respectivos equipamentos, com o teor do documento n.º 9 junto com a petição inicial e que se dá por reproduzido na íntegra.
35 – Nos termos da cláusula oitava do referido acordo, as receitas seriam repartidas entre a 2.ª Requerente e a Requerida, garantindo a Requerida à 2.ª Requerente uma receita mínima de € 69.769,02, a pagar da seguinte forma:
(i) € 12.028,64, acrescido de IVA, até 20 de Julho de 2020;
(ii) € 42.692,53, acrescido de IVA, até 20 de Agosto de 2020; e
(iii) € 15.047,85, acrescido de IVA, até 20 de Setembro de 2020.
36 – O Acordo relativo ao “C...” foi celebrado pelo período de um (1) ano, com início em 1 de Junho de 2020 e termo em 31 de Maio de 2021.
37 – Em 17 de Junho de 2020, as Requerentes e a Requerida celebraram um acordo que designaram «Acordo de Colaboração», com a referência ...20..., relativo ao “D...” e respectivos equipamentos, com o teor do documento n.º 11 junto com a petição inicial e que se dá por reproduzido na íntegra.
38 – Nos termos da cláusula sétima do referido acordo, as receitas seriam repartidas entre a 2.ª Requerente e a Requerida, garantindo a Requerida à 2.ª Requerente uma receita mínima de € 18.392,12, a pagar da seguinte forma:
(i) € 2.643,82, acrescido de IVA, até 15 de Julho de 2020;
(ii) € 13.074,74, acrescido de IVA, até 15 de Agosto de 2020; e
(iii) € 2.673,57, acrescido de IVA, até 15 de Setembro de 2020.
39 – O Acordo relativo ao “D...” foi celebrado por um (1) ano, com início em1 de Junho de 2020 e termo em 31 de maio de 2021.
40 – Em virtude das consequências da pandemia Covid 19, todos os acordos de colaboração foram objecto de um aditamento.
41 – Assim, por aditamento de 6 de Agosto de 2020, celebrado entre Requerentes e Requerida, foi o «Acordo de Colaboração» relativo ao “F...” prorrogado, tendo o prazo de vigência do mesmo sido alargado até 31 de Outubro de 2021, com o teor do documento n.º 12 junto com a petição inicial e que se dá por reproduzido na íntegra.
42 – Nos termos dos n.ºs 1 e 2 da cláusula primeira do atrás mencionado «Aditamento ao Acordo de Colaboração», as partes acordaram que as receitas mínimas a entregar pela Requerida à 2.ª Requerente, relativamente ao ano de 2020, seriam de € 28.935,00, acrescidas de IVA a pagar nos termos da cláusula sétima do acordo celebrado em 22 de Outubro de 2019.
43 – O valor referido no artigo anterior deveria ser pago mensalmente, entre Junho de 2020 e maio de 2021, em prestações mensais, iguais e sucessivas de € 2.630,46 cada, acrescidas de IVA à taxa legal em vigor.
44 – Por aditamento de 6 de Agosto de 2020, celebrado entre Requerentes e Requerida, foi o «Acordo de Colaboração» relativo ao “C...”, objecto de alteração, com o teor do documento n.º 13 junto com a petição inicial e que se dá por reproduzido na íntegra.
45 – Nos termos dos n.ºs 1 e 2 da cláusula primeira do atrás mencionado «Aditamento ao Acordo de Colaboração», relativo estabelecimento “C...”, ficou acordado entre a Requerida e as Requerentes, entre outras obrigações, que a Requerida garantia uma receita mínima à 2.ª Requerente, relativa ao ano de 2020, no montante de € 69.769,02, acrescida de IVA à taxa legal em vigor.
46 – O valor referido no artigo anterior deveria ser pago, mensalmente, entre Junho de 2020 e maio de 2021, em prestações mensais, iguais e sucessivas de € 6.342,64, acrescidas de IVA à taxa legal em vigor.
47 – Por aditamento de 6 de Agosto de 2020 e com produção de efeitos a 30 de Julho de 2020, celebrado entre Requerentes e Requerida, foi o «Acordo de Colaboração» relativo ao “D...”, com o teor do documento n.º 14 junto com a petição inicial e que se dá por reproduzido na íntegra.
48 – Nos termos dos n.ºs 1 e 2 da cláusula primeira do atrás mencionado «Aditamento ao Acordo de Colaboração», relativo estabelecimento “D...”, ficou acordado entre a Requerida e as Requerentes, entre outras obrigações, que a Requerida garantia a uma receita mínima à 2.ª Requerente, relativa ao ano de 2020, no montante de € 18.392,12, acrescida de IVA à taxa legal em vigor.
49 – O valor referido no artigo anterior deveria ser pago, mensalmente, entre Junho de 2020 e Maio de 2021, em prestações mensais, iguais e sucessivas de € 1.672,00, acrescidas de IVA à taxa legal em vigor.
50 – Além dos montantes mínimos garantidos atrás mencionados, a Requerida teria ainda que assegurar todos os pagamentos inerentes à actividade e funcionamento de todos os estabelecimentos, nomeadamente os consumos de electricidade e água, cujo fornecimento junto das entidades fornecedoras dos mesmos era assegurado pela 1.ª Requerente, e debitado à Requerida, em conformidade com o estabelecido, relativamente ao acordo de colaboração n.º 047/06/ACOR/2021/MV (C...) no n.º 2 da cláusula quarta, no que respeita ao acordo n.º 048/06/ACOR/2020/MV (D...), no n.º 2 da cláusula terceira, dos mencionados acordos e no que respeita ao acordo de colaboração n.º 136/10/ACOR/2019/MV (F...), no n.º 2 da cláusula terceira.
51 – A relação contratual entre as Requerentes e a Requerida prolongava-se há vários anos, sempre com base em “acordos de colaboração” de duração anual.
52 – Contudo, a partir de Dezembro de 2020, a Requerida deixou de pagar à 2.ª Requerente os montantes devidos ao abrigo dos acordos de colaboração e respectivos aditamentos celebrados entre as partes.
53 – Relativamente ao estabelecimento ora denominado “G...” (contrato com a Ref.ª ...19...) a Requerida não pagou a quantia de € 19.412,82, referente às facturas que seguidamente se discriminam:
(i) Factura n.º ...74, datada e vencida em 05/12/2020, no valor de € 3.235,47;
(ii) Factura n.º ...47, datada e vencida em 05/01/2021, no valor de € 3.235,47;
(iii) Factura n.º ...80, datada e vencida em 02/02/2021, no valor de € 3.235,47;
(iv) Factura n.º ...27, datada e vencida em 01/03/2021, no valor de € 3.235,47;
(v) Factura n.º ...24, datada e vencida em 04/04/2021, no valor de € 3.235,47; e
(vi) Factura n.º ...44, datada e vencida em 02/05/2021, no valor de € 3.235,47.
54 – Relativamente ao estabelecimento ora denominado “C...” (contrato com a Ref.ª ...20...) encontra-se em dívida a quantia de € 82.565,12, referentes às facturas que seguidamente se discriminam:
(i) Factura n.º ...72, datada e vencida em 05/12/2020, no valor de € 7.801,45;
(ii) Factura n.º ...45, datada e vencida em 05/01/2021, no valor de € 7.801,45;
(iii) Factura n.º ...78, datada e vencida em 02/02/2021, no valor de € 7.801,45;
(iv) Factura n.º ...25, datada e vencida em 01/03/2021, no valor de € 7.801,45;
(v) Factura n.º ...22, datada e vencida em 04/04/2021, no valor de € 7.801,45;
(vi) Factura n.º ...42, datada e vencida em 02/05/2021, no valor de € 7.801,45;
(vii) Factura n.º ...41, datada e vencida em 30/09/2021, no valor de € 28.605,30;
(viii) Factura n.º ...72, datada e vencida em 31/10/2021, no valor de € 7.151,12.
55 – Relativamente ao estabelecimento ora denominado “D...” (contrato com a ref.ª ...20...) encontra-se em dívida a quantia de € 12.339,36, referentes às facturas que seguidamente se discriminam:
(i) Factura n.º ...73, datada e vencida em 05/12/2020, no valor de € 2.056,56;
(ii) Factura n.º ...46, datada e vencida em 05/01/2021, no valor de € 2.056,56;
(iii) Factura n.º ...79, datada e vencida em 02/02/2021, no valor de € 2.056,56;
(iv) Factura n.º ...26, datada e vencida em 01/03/2021, no valor de € 2.056,56;
(v) Factura n.º ...23, datada e vencida em 04/04/2021, no valor de € 2.056,56; e
(vi) Factura n.º ...43, datada e vencida em 02/05/2021, no valor de € 2.056,56.
56 – Os representantes da 2ª Requerente reuniram por diversas vezes com o gerente da Requerida, CC, com o objectivo de encontrar uma solução de pagamento da quantia em dívida.
57 – Na sequência destas diligências, a Requerida, através do seu gerente CC, enviou no dia 13 de maio de 2021, uma mensagem de correio electrónico dirigido à actual directora da (…) de ..., DD, com o seguinte teor: “Venho por este meio informar que estamos a espera de serem resolvidos últimos detalhes pelo Banco, para que possamos proceder à liquidação da divida que temos à (…), no valor de € 78.560,88. Situação que deverá estar resolvida nos próximos dias do presente Maio. Cumprimentos CC”, com o teor do documento n.º 35 junto com a petição inicial, que se dá aqui por reproduzido na íntegra.
58 – Em 1 de Junho de 2021, no seguimento de mais uma reunião com os responsáveis da 2ª Requerente, o gerente da Requerida enviou novo e-mail para a directora da (…), com o com o teor do documento n.º 36 junto com a petição inicial, que se dá aqui por reproduzido na íntegra:
“Bom dia DD
No seguimento da nossa reunião, envio o plano elaborado pela B... Lda.
Entendemos que neste programa de pagamento conseguimos cumprir as datas assinaladas
04-6-21 - € 11.222,98
11-6-21 - € 11.222,98
18-6-21 - € 11.222,98
25-6-21 - € 11.222,98
02-7-21 - € 11.222,98
09-7 21 - € 11.222,98
16-7-21 - € 11.222,98
Obrigado pela colaboração e compreensão
Cumprimentos CC”.
59 – Na mesma data, a Requerida, através do seu gerente, enviou um novo email, agora dirigido à administradora das Requerentes, EE, com o seguinte teor: “Bom dia Sra. EE Peço que analise o plano de pagamentos com o pensamento de que tudo fiz para resolver esta situação. Como acredito na sua palavra que gostaria que nós continuássemos parceiros, acredite na minha também. Este projeto sempre foi tudo para mim e sempre apostei tudo nele na esperança de fazermos um projeto maior. A ida do advogado ontem não foi mal intencionada, não tenho estado bem e fui eu que lhe pedi que me acompanha se só para melhor comunicar. Relembro aos 14 anos passados em que sempre trabalhamos bem em conjunto com a (…) de .... Atentamente CC”, com o com o teor do documento n.º 37 junto com a petição inicial, que se dá aqui por reproduzido na íntegra.
60 – As Requerentes aceitaram a proposta de pagamento realizada pela Requerida, tendo na sequência do princípio de entendimento estabelecido com esta última, procedido à elaboração de novo “acordo de colaboração” e de um acordo de pagamento das quantias que estavam dívida, os quais foram remetidos ao gerente da Requerente para assinatura.
61 – Sucede que o gerente da Requerida não o assinou, nem executou os seus termos.
62 – A Requerida também não procedeu a nenhum dos pagamentos assumidos no plano de pagamento por si proposto no email de 1 de Junho de 2021.
63 – Não obstante, as Requerentes permitiram que a Requerida continuasse a exploração das instalações atrás descritas, nos termos previstos nos “acordos de colaboração” celebrados entre as partes.
64 – Isto porque a 2.ª Requerente, que tinha a gestão dos espaços, acreditava que seria possível manter a colaboração com a Requerida, e, não pretendeu impedir a Requerida de ter acesso a receitas que seriam obtidas com a época alta de verão, no verão de 2021, pois esperava que dessa forma esta conseguisse regularizar a sua dívida perante a 2.ª Requerente.
65 – Assim, os referidos acordos de colaboração mantiveram-se e a Requerida continuou a explorar os atrás identificados estabelecimentos, respectivamente, o “F...”, o “C...” e o “D...”.
66 – Contudo, a Requerida continuou a não cumprir os termos dos acordos de colaboração e não pagava à 2.ª Requerente as quantias acordadas, designadamente as quantias mínimas garantidas que correspondiam à contrapartida pela exploração dos equipamentos.
67 – Pelo que foi iniciada nova negociação, tendo as Requerentes proposto à Requerida um novo acordo relativo ao pagamento dos valores em dívida e à futura colaboração entre as partes no que concerne à exploração do equipamento denominado “C...”, designadamente através de uma nova sociedade que seria detida pelo gerente da Requerida e pela sociedade “H..., SA”.
68 – A sociedade a constituir teria uma participação de 15% (quinze por cento) do gerente da Requerida.
69 – Ainda nos termos da proposta, estabeleceu-se que os valores em dívida até Julho de 2021 seriam pagos pela sociedade a constituir, que passaria a explorar o equipamento denominado “C...”.
70 – Os valores relativos ao período de Agosto de 2021 até à constituição da nova sociedade seriam pagos pela Requerida.
71 – Este projecto de acordo foi confirmado por FF, por email dirigido à administradora das Requerentes, EE, em 7 de Outubro de 2021, que seguidamente se reproduz: “Bom dia Sra. D. EE, Primeiramente, permita-me apresentar-lhe os meus sinceros e cordiais cumprimentos, esperando que se encontre bem de saúde. Em segundo lugar e, na sequência dos nossos diversos contactos, venho reafirmar a nossa intenção de continuar a nossa parceria com a (…) de ... SA relativamente ao Apoio Casa da (…) e adicionalmente, celebrar uma nova parceria relativamente ao Apoio C..., que se localiza mesmo em frente ao nosso hotel, o .... Contudo, como a Sra. D. EE tem conhecimento, tendo em conta o sucedido com a ASAE relativamente ao acordo em vigor com o Casa da (…), uma vez que o interveniente no contrato é a H..., proprietária do hotel, estamos neste momento a criar duas firmas, uma para a exploração do Casa da (…) e outra para a exploração do C.... Esta última terá a participação de 15% por parte do CC. A constituição destas firmas é muito importante para nós, uma vez que as coimas da ASAE são calculadas em função do volume de negócios da firma exploradora. Ora, como no Casa da (…) a firma exploradora é a H..., cujo volume de negócios é substancial, as coimas são também proporcionalmente elevadas. Como combinamos, até que a constituição destas firmas fique concluída pagaremos as rendas do Casa da (…) em duodécimos, como, aliás, temos efetuado desde o ano passado. Logo que a constituição das firmas se conclua e, como também acordamos, pagaremos as rendas, já em nome dessas novas firmas, em duodécimos até ao próximo mês de Junho de 2022. Posteriormente, a partir de Julho de 2022, que se confirme o final efetivo desta terrível pandemia, temos intenção de voltar ao plano de pagamentos que foi estipulado inicialmente. Relativamente ao C..., acordamos proceder de igual modo. Entretanto, ficou acordado com o CC que ele pagaria as rendas desde Agosto até ao momento de constituição da nova firma que explorará o C.... As rendas em atraso junto da (…) de ..., SA até Julho de 2021 inclusive, serão suportadas por essa nova firma. Ou seja, no momento da alteração do contrato para essa nova firma, providenciaremos a mesma com os fundos necessários para a liquidação dessas rendas atrasadas até Julho de 2021. Em simultâneo, acertaremos internamente com o CC a forma de ele proceder, através da sua futura quota, ao pagamento desse montante. Como referi telefonicamente à Sra. D. EE, na passada 6ª feira, dia 1 de Outubro, contactei o CC, informando-o de que não estava a cumprir com o que tínhamos combinado, pelo que deveria, o mais urgentemente possível, proceder à liquidação das rendas do C... relativas aos meses Agosto e Setembro. Caso ele não proceda em conformidade, pois teremos que pensar numa alternativa. Cá estaremos para, em conjunto convosco, resolvermos essa eventual situação. Creio que, resumidamente, esta é a descrição das alterações em curso. Contudo, se necessitar de alguma eventual clarificação, por favor não hesite em me contactar. Entretanto, despeço-me com muita amizade, FF PCA- (…) – Hotéis de (…), SA”, com o com o teor do documento n.º 38 junto com a petição inicial, que se dá aqui por reproduzido na íntegra.
72 – O referido projecto de acordo não se concretizou por vontade da Requerida.
73 – Em face das circunstâncias descritas e da dívida da Requerida, as Requerentes não procederam à renovação do acordo de colaboração para o estabelecimento denominado “G...”, o qual terminou em 31 de Outubro de 2021.
74 – Em relação a tal intitulado “acordo de colaboração”, a Requerida não pagou à 2.ª Requerente a quantia de € 19.412,82.
75 – Em 18 de Janeiro de 2022, a 2.ª Requerente solicitou à Requerida o pagamento da quantia em dívida, por carta registada com aviso de recepção e também remetida por protocolo, com o teor do documento n.º 39 junto com a petição inicial que se dá por reproduzido na íntegra.
76 – Tal comunicação foi expedida em 20 de Janeiro de 2022 e recepcionada pela Requerida no próprio dia 20 de Janeiro de 2022, por entrega em protocolo e em 21 de Janeiro de 2022 por carta registada com aviso de recepção.
77 – Não obstante tal solicitação, a Requerida não pagou à Requerente, até ao momento, a quantia de € 19.412,82, relativa ao estabelecimento aqui identificado como “Quiosque (…)”.
78 – Relativamente ao intitulado “acordo de colaboração” com a ref.ª ...02... e respectivo aditamento, referente ao equipamento denominado “C...” e ao intitulado “acordo de colaboração” com a ref.ª ...20... e respectivo aditamento, referente ao equipamento denominado “D...”, a Requerida não pagou à Requerente a quantia de € 122.412,43, acrescida de € 6.538,79 referente a consumos de electricidade e água.
79 – Nessa sequência, em 19 de Janeiro de 2022, a 2.ª Requerente solicitou à Requerida o pagamento de tal quantia, através de carta registada com aviso de recepção, com o teor do documento n.º 43 junto com a petição inicial que se dá por reproduzido na íntegra.
80 – A referida comunicação foi expedida em 20 de Janeiro de 2022, e recebida pela Requerida a 21 de Janeiro de 2022.
81 – Não obstante tal solicitação, a Requerida não pagou à Requerente, até ao momento, a quantia de € 122.412,43, acrescida de € 6.538,79, relativa aos estabelecimentos aqui identificados como “C...” e “D...”.
82 – Em face de tais faltas de pagamento, a 2ª Requerente comunicou à Requerida a resolução, por justa causa, do intitulado “acordo de colaboração” com a Ref.ª ...20... relativo estabelecimento denominado “C...”, e respectivo aditamento de 6 de Agosto de 2020.
83 – Tal comunicação foi realizada através de carta registada com aviso de recepção, expedida em 28 de Janeiro de 2022, recebida pela Requerida em 2 de Fevereiro de 2022.
84 – A comunicação foi também recepcionada pela Requerida em 28 de Janeiro de 2022, por entrega em protocolo.
85 – Do mesmo modo, a 2ª Requerente comunicou à Requerida a resolução, por justa causa, do intitulado “acordo de colaboração” com a ref.ª ...20... relativo estabelecimento denominado “D...”, e respectivo aditamento de 6 de Agosto de 2020.
86 – Tal comunicação foi realizada através de carta registada com aviso de recepção, expedida em 28 de Janeiro de 2022, recebida pela Requerida em 2 de Fevereiro de 2022.
87 – Assim, em síntese, a Requerida deve à 2.ª Requerente a quantia de € 114.317,30, correspondendo:
a) a quantia de € 82.565,12 ao “C...”;
b) a quantia de € 12.339,36 ao “D...”; e
c) a quantia de € 19.412,82 ao “F...”.
88 – Nas referidas notificações remetidas pela 2.ª Requerente à Requerida, foi solicitada a entrega de “C...” e “D...” no dia 3 de Fevereiro de 2022.
89 – Sendo que o “F...” já tinha sido entregue às Requerentes.
90 – A Requerida não entregou nessa data os estabelecimentos “C...” e “D...” às Requerentes.
91 – Desde 2007, a Requerida tem vindo a investir lucros nos estabelecimentos comerciais em causa, designadamente no C... para modernização e conforto do estabelecimento, em máquinas, eletrodomésticos, equipamentos para o snack-bar, mesas, cadeiras, toldos e plantas para a esplanada.
92 – A Requerida tem ao seu serviço, para garantir o funcionamento do snack-bar, 4 trabalhadores.
93 – A partir de então, os elementos da empresa de segurança Securitas, contratada pelas Requerentes, passaram a fazer visitas regulares ao estabelecimento, passando várias vezes ao dia junto ao local.
94 – Em data não determinada do ano de 2022, a EDP procedeu ao corte de fornecimento de electricidade do C..., a pedido do titular do contrato de fornecimento de eletricidade, ou seja, as Requerentes.
95 – Tendo posteriormente o sócio gerente da Requerida e o gerente do Snack-Bar verificado que o contador se encontrava selado pela equipa de cortes da EDP.
96 – Na sequência do corte de fornecimento de eletricidade foram desligadas as câmaras de vigilância do estabelecimento.
97 – Situação que gera um alarme para a Securitas, sendo procedimento da empresa deslocar-se imediatamente ao local para verificar se algo de anormal aconteceu.
98 – Tendo o referido alarme sido ignorado pelos seguranças que se encontravam de serviço.
99 – Na sequência de tal situação o sócio gerente da Requerida contactou a empresa de segurança para saber o motivo pelo qual não lhe foi comunicado o disparo do alarme do estabelecimento na sequência do corte de eletricidade, tendo sido informado que deveria contactar a (…) de ....
100 – Na manhã do dia 27 de Abril de 2022, foi arrombada a porta do espaço onde se encontrava instalado o contador de água do estabelecimento, tendo sido retirado do local o referido contador, selado pela (…) e de seguida fechada a porta novamente.
101 – Tendo o estabelecimento comercial da Ré ficado privado de água e eletricidade.
102 – Acontece que, as instalações que integram o C..., possuem balneário, enfermaria e wc, para apoio aos utentes da praia.
103 – Com o corte do fornecimento de água e eletricidade realizado, ficaram as referidas instalações (balneário, enfermaria e wc) impossibilitadas de funcionar.
104 – Para poder garantir aos utentes da praia a utilização dos referidos serviços, foi a Requerida obrigada a instalar no Snack-Bar um depósito de água e um gerador.
105 – Na tentativa de impedir a instalação do depósito de água e do gerador, para que a Requerida ficasse impedida de abrir ao público o snack-bar, os representantes das Requerentes apresentaram queixa junto da GNR, alegando que a Requerida tinha em curso uma obra ilegal, os quais se deslocaram, ao C....
106 – Tendo sido ainda realizadas participações contra a Requerida junto da Câmara Municipal ... e da ASAE.
107 – Tendo sido realizadas pelas referidas autoridades fiscalizações ao estabelecimento comercial C....
108 – Por ordem das Requerentes foi remetida à empresa I... uma mensagem de correio electrónico, no momento em que esta se encontrava a realizar trabalhos melhoramento do sistema de segurança do estabelecimento, nomeadamente, a nível das câmaras de segurança do estabelecimento, para impedir a realização dos trabalhos.
109 – Foram realizadas obras de abertura de um buraco, com uma máquina retroescavadora, junto à estrutura do C..., as quais provocaram o rebentamento de um tubo de água e consequente alagamento de terra e do espaço de acesso ao estabelecimento.
110 – Relativamente ao exercício de 2019, a Requerida regista contabilisticamente:
(i) um resultado líquido negativo do período, no valor de - € 38.054,44;
(ii) o activo não corrente no valor de € 29.994,54, o activo corrente no valor de € 49.046,31, sendo o activo no valor total de € 79.040,85.
(iii) o passivo não corrente no valor de € 12.645,23, o passivo corrente no valor de € 118.235,74, sendo o passivo no valor total de € 130.880,97.
(iv) um capital próprio negativo em - € 51.840,12.
111 – Relativamente ao exercício de 2020, a Requerida regista contabilisticamente:
(i) um resultado líquido negativo do período, no valor de - € 19.603,21;
(ii) o activo não corrente no valor de € 20.916,74, o activo corrente no valor de € 41.610,51, sendo o activo no valor total de € 62.527,25.
(iii) o passivo não corrente no valor de € 11.933,20, o passivo corrente no valor de € 122.037,38, sendo o passivo no valor total de € 133.970,58.
(iv) um capital próprio negativo em - € 71.443,33.
112 – Relativamente ao exercício de 2021, a Requerida regista contabilisticamente:
(i) um resultado líquido negativo do período, no valor de - € 32.163,41;
(ii) o activo não corrente no valor de € 12.829,55, o activo corrente no valor de € 49.378,24, sendo o activo no valor total de € 62.207,79.
(iii) o passivo não corrente no valor de € 11.760,85, o passivo corrente no valor de € 134.450,50, sendo o passivo no valor total de € 146.211,35.
(iv) um capital próprio negativo em - € 84.003,53.
113 – Relativamente ao exercício de 2022, e tendo por base apenas o período de Janeiro a Outubro de 2022, a Requerida regista provisoriamente:
(i) um resultado líquido positivo do período, no valor de € 23.635,37;
(ii) o activo não corrente no valor de € 10.741,86, o activo corrente no valor de € 91.428,90, sendo o activo no valor total de € 102.170,76.
(iii) o passivo não corrente no valor de € 9.798,60, o passivo corrente no valor de € 152.538,92, sendo o passivo no valor total de € 162.538,92.
(iv) um capital próprio negativo em - € 60.368,16.
114 – Da análise da contabilidade da Requerida, verificam-se os seguintes dados: (…)
115 – A Requerida beneficiou de um plano de pagamento de dívidas tributárias em prestações, que englobou um total em dívida de € 30.839,56, que foi cumprido, estando ainda em dívida apenas o valor de € 6.312,54 referente a prestações vincendas.
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3.2 – Matéria de facto não provada:
1 – O sócio gerente da Requerida dedica-se exclusivamente à exploração do referido estabelecimento comercial, C..., o qual constitui a sua fonte de rendimento.
2 – Devido à situação pandémica e à consequente quebra de faturação ao longo dos períodos de encerramento dos estabelecimentos, nomeadamente, entre Março e Maio de 2020 e Janeiro de 2021, a requerida deparou-se com dificuldades financeiras que levaram a que o sócio gerente da mesma solicitasse a aplicação das medidas excepcionais de apoio às empresas, por forma a poder honrar os seus compromissos.
3 – Medidas essas que foram recusadas pelas Requerentes.
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IV – Fundamentação:
4.1 – Questão prévia – Da (in)admissibilidade parcial do recurso:
A sociedade recorrente entende que o Tribunal a quo devia ter admitido a junção dos documentos nos termos do requerido em 07/12/2022, com fundamento no disposto no artigo 423.º, n.º 3, 2ª parte[1], do Código de Processo Civil, por se ter tornado necessária a apresentação dos mesmos, na sequência do depoimento da testemunha BB e em cumprimento do dever de actualidade que deve revestir a sentença que decreta a insolvência.
A documentação em causa correspondia a extractos das contas bancárias da recorrente, do (…) Banco e do (…), extractos das contas bancárias do legal representante desta, certidão actualizada emitida pela Autoridade Tributária e Aduaneira, declaração emitida pelo Instituto de Segurança Social, IP, balanço e demonstração de resultados previsional até 31/10/2022, balancete analítico de 2022, extractos contabilísticos do fornecedor (…) de ... de 2020 a 2022, bem como uma declaração comprovativa de vendas realizadas na actividade imobiliária do legal representante da recorrente.
Conforme resulta da análise da acta da Audiência de Discussão e Julgamento, realizada no dia 7 de dezembro de 2022, com a referência ...30, esse requerimento foi parcialmente indeferido pelo Tribunal a quo.
Efectivamente, tal como pugnam as recorridas, a matéria em causa deveria ter sido objecto de impugnação recursal autónoma, ao abrigo do disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 644.º[2] do Código de Processo Civil, por se tratar de um despacho de rejeição parcial de um meio de prova.
A sentença proferida está datada de 23/02/2023 e o recurso foi interposto em 27/03/2023 e, desta equação, resulta que, no momento da interposição da impugnação recursal, o despacho de não admissão da prova estava consolidado, face ao trânsito em julgado da decisão interlocutória.
Na realidade, a recorrente foi imediatamente notificada do despacho que rejeitou a referida prova documental, no decurso da sessão de julgamento ocorrida em 07/12/2022. Assim, por força do disposto no n.º 3 do artigo 638.º[3] do Código de Processo Civil, em caso de discordância com a referida decisão, deveria ter sido interposto o respectivo recurso até ao dia 22/12/2022.
Neste enquadramento, mostra-se assim precludida a possibilidade de ser discutida nesta sede o eventual erro de direito relacionado com a não admissão sub judice. E, assim, no plano finalístico, consequencialmente, a documentação em causa não pode ser aproveitada para a formulação do juízo silogístico por parte do Tribunal de Recurso.
Deste jeito, o conhecimento das conclusões referentes à matéria da não admissibilidade da prova mostra-se prejudicado, estando este Tribunal de recurso impedido de se pronunciar sobre esse objecto processual, face ao princípio do caso julgado.
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4.2 – Nulidade prevista na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil:
É nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou quando ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que a torne ininteligível (alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil).
A este propósito, Alberto dos Reis refere «dois tipos de sentença viciada: a sentença injusta e a sentença nula. A primeira enferma de erro de julgamento; a segunda enferma de erro de actividade (erro de construção ou formação»[4].
Entre os fundamentos e a decisão não pode haver contradição lógica: se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão e, em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença. Esta oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta: quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento e não perante oposição geradora de nulidade; mas já quando o raciocínio expresso na fundamentação aponta para determinada consequência jurídica e na conclusão é tirada outra consequência, ainda que esta seja a juridicamente correcta, a nulidade verifica-se. A oposição entre os fundamentos e a decisão tem o seu correspondente na contradição entre o pedido e a causa de pedir, geradora de ineptidão da petição inicial[5].
Na concepção de Antunes Varela «não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro de construção do silogismo judiciário»[6].
Está sedimentada na doutrina e na jurisprudência a ideia de esta nulidade se verifica quando existe um vício real no raciocínio do julgador, na medida em que a fundamentação aponta num sentido e a decisão segue direcção distinta.
A nossa lei impõe que o silogismo da decisão se ache correctamente estruturado por forma a que a conclusão extraída corresponda às premissas de que ele emerge e a desconformidade não está no conteúdo destas mas no processo lógico desenvolvido. E essa oposição não se confunde com o erro na subsunção dos factos à norma jurídica ou, muito menos, com o erro na interpretação desta, pois quando, embora mal, o juiz entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação ou dela decorre, encontramo-nos perante o erro de julgamento. Se, ao invés, ocorrer a assinalada desconformidade, a decisão é nula por contradição entre a fundamentação lavrada e o segmento decisório[7] [8].
Em síntese, a nulidade da sentença, por oposição entre os fundamentos e a decisão, só acontece quando aqueles conduzirem a uma decisão diferente.
Analisada a estrutura da decisão e as conexões existentes entre os motivos de facto e de direito a que faz apelo e o veredicto final verifica-se que existe uma lógica na arquitectura da sentença e, dessa forma, a invocada nulidade não se verifica.
Se a interpretação e a relevância que a sentença deu a certos factos e se a conclusão que deles se extraiu foram, ou não, as mais correctas, é questão que tem a ver com o mérito da decisão e com um eventual erro de julgamento, mas que nada tem a ver com a construção lógica da sentença que se mostra correctamente formulada.
De igual modo, se existiam factos que, a serem provados, impunham uma solução distinta, a existir o vício, o mesmo está relacionado não com uma nulidade mas com um eventual erro na fixação da factualidade apurada.
Assim sendo, também carece de fundamento a arguição efectuada ao abrigo do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil.
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4.3 – Do erro sobre a matéria de facto:
Só à Relação compete, em princípio, modificar a decisão sobre a matéria de facto, podendo alterar as respostas aos pontos da base instrutória, a partir da prova testemunhal extractada nos autos e dos demais elementos que sirvam de base à respectiva decisão, desde que dos mesmos constem todos os dados probatórios, necessários e suficientes, para o efeito, dentro do quadro normativo e através do exercício dos poderes conferidos pelo artigo 662.º do Código de Processo Civil.
Em face disso, a questão crucial é a de apurar se a decisão do Tribunal de Primeira Instância que deu como provados (e não provados) certos factos pode ser alterada nesta sede – ou, noutra formulação, é tarefa do Tribunal da Relação apurar se essa decisão fáctica está viciada em erro de avaliação ou foi produzida com algum meio de prova ilícito e, se assim for, actuar em conformidade com os poderes que lhe estão confiados.
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A prova como demonstração efectiva (segundo a convicção do juiz) da realidade de um facto «não é certeza lógica mas tão-só um alto grau de probabilidade suficiente para as necessidades práticas da vida (certeza histórico-empírica)»[9].
A apreciação da prova deve ocorrer sob o signo da probabilidade lógica – de evidence and inference –, ou seja, segundo o grau de confirmação lógica que os enunciados de facto obtêm a partir das provas disponíveis.
O sistema judicial nacional combina o sistema da livre apreciação ou do íntimo convencimento com o sistema da prova positiva ou legal, posto que, tomando em consideração a análise da motivação da respectiva decisão e as provas produzidas, importa aferir se os elementos de convicção probatória foram obtidos em conformidade com o princípio da convicção racional, consagrado pelo n.º 5 do artigo 607.º do Código de Processo Civil.
A valoração da prova, nomeadamente a testemunhal, deve ser efectuada segundo um critério de probabilidade lógica, através da confirmação lógica da factualidade em apreciação a partir da análise e ponderação da prova disponibilizada[10].
A jurisprudência mais avalizada firma o entendimento que a «prova testemunhal, tal como acontece com a prova indiciária de qualquer outra natureza, pode e deve ser objecto de formulação de deduções e induções, as quais, partindo da inteligência, há-de basear-se na correcção de raciocínio, mediante a utilização das regras de experiência [o id quod plerumque accidit] e de conhecimentos científicos.
Na transição de um facto conhecido para a aquisição ou para a prova de um facto desconhecido, têm de intervir as presunções naturais, como juízos de avaliação, através de procedimentos lógicos e intelectuais, que permitam, fundadamente, afirmar, segundo as regras da experiência, que determinado facto, não, anteriormente, conhecido, nem, directamente, provado, é a natural consequência ou resulta, com toda a probabilidade próxima da certeza, ou para além de toda a dúvida razoável, de um facto conhecido»[11].
Neste enquadramento jurídico-existencial, a credibilidade concreta de um meio individualizado de prova tem subjacente a aplicação de máximas de experiência comum que devem enformar a opção do julgador e cuja validade se objectiva e se afere em determinado contexto histórico e jurídico, à luz da sua compatibilidade lógica com o sentido comum e com critérios de normalidade social, os quais permitem (ou não) aceitar a certeza subjectiva da sua realidade[12].
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A recorrente pretende a alteração da decisão de facto quanto aos pontos 115[13] dos factos provados e 2[14] e 3[15] da factualidade não provada.
Quanto à questão da situação contributiva e fiscal estar regularizada perante a Segurança Social e a Autoridade Tributária, a recorrente entende que a mesma se revela devidamente comprovada.
No que concerne aos pontos 2 e 3 da matéria de facto dada como não provada, a recorrente sustenta que os mesmos deveriam integrar o elenco dos factos provados, socorrendo-se, para o efeito, basicamente, dos contributos testemunhais tirados à contabilista da empresa e, num segundo patamar, às próprias declarações prestadas pelo legal representada da sociedade requerida.
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Neste particular o Meritíssimo Juiz de Direito justificou a adopção do facto provado n.º 115 com o teor dos documentos emitidos pela Autoridade Tributária e Aduaneira e juntos aos autos.
Relativamente aos factos não provados (2 e 3), na óptica da Primeira Instância, ficou assinalado que não foi produzida qualquer prova de que resultasse a solicitação, pela Requerida, da aplicação das medidas excepcionais de apoio às empresas para mitigar as dificuldades financeiras resultantes das restrições impostas por força da pandemia Covid-19.
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A recorrente pretende ainda que o Tribunal da Relação de Évora amplie a decisão de facto, introduzindo matéria relacionada com a disponibilidade financeira da recorrente e do seu sócio, em ordem a assegurar que é capaz de realizar o cumprimento das obrigações da sociedade.
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Foi ouvida toda a prova, analisada a documentação admitida nos autos e visitados os elementos disponibilizados pelo administrador de insolvência.
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Quanto à pretendida alteração relativamente ao facto identificado em 115, a decisão do Tribunal funda-se na prova documental junta aos autos e não existe qualquer meio de prova admitido que infirme aquilo que consta da certidão emitida pela Autoridade Tributária e daqui decorre que nenhuma alteração será promovida.
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Quanto aos pontos 2 e 3 dos factos não provados, não se encontra qualquer prova sólida e sustentada que permita reformular o juízo prudencial do Tribunal a quo.
Neste particular, o legal representante da sociedade requerida foi vago, pouco assertivo e nada convincente quanto ao tema da falta de disponibilidade da requerentes para conceder qualquer moratória, afirmando inclusivamente que não houve qualquer tentativa de renegociação contratual.
Mesmo que tivesse solicitado alguma medida de apoio excepcional quanto à sua empresa, o visado não a conseguiu transmitir com clareza e credibilidade ao Tribunal, donde resulta que, também, aqui, não existe qualquer suporte para permitir a alteração da decisão de facto.
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A pretendida introdução da factualidade relativa à disponibilidade financeira da recorrente para assumir o pagamento das dívidas e a regularização do seu passivo assenta basicamente nas declarações de BB e, residualmente, nas declarações prestadas pelo legal representante.
Analisado o depoimento de BB, apesar desta surgir associada a uma missão quase de porta-voz dos interesses societários, aquilo que transparece é a natureza, por vezes, contraditória com o depoimento tomado ao legal representante da requerida. E, na dinâmica da prestação do seu testemunho, nota-se que titubeia e não mostra solidez quando é inquirida directamente pelo Tribunal ou nos momentos em que são exercidas as instâncias pela parte contrária.
Ainda que a empresa tivesse uma conta caucionada de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), isso apenas permitiria garantir uma melhoria da tesouraria. Todavia, a conta caucionada representa igualmente um débito a que acrescem os custos bancários a ela associados, sendo que esta verba não permitiria regularizar o passivo da requerida e aumentava a dependência do sistema bancário.
Aliás, em contraponto, nas declarações de parte prestadas em sede de audiência de discussão e julgamento, o legal representante da sociedade requerida assumiu que, desde Novembro de 2020, a empresa não procedeu ao pagamento de qualquer valor às recorridas, por falta de capacidade financeira para o fazer e que essa situação se mantém à presente data.
Em acréscimo, da análise dos elementos contabilísticos disponibilizados não resulta a existência de qualquer verba em caixa, devendo aqui prevalecer o rigor das contas, face à opinião subjectiva da requerente. E até se estranha que, tendo o referido capital, não haja amortizado parte das suas dívidas.
Na verdade, desde 2019 até ao anterior exercício, a sociedade requerida apresentava um nível de endividamento superior a 100% e não demonstrava ter capacidade financeira para liquidar as suas dívidas, apresentando rácios de solvabilidade negativos nos últimos 4 anos.
Por outras palavras, o detalhe da situação económica e financeira da sociedade evidencia claramente uma incapacidade para satisfação das dívidas de curto, médio e longo prazo e a requerida está situação de falência técnica.
O relatório elaborado pelo administrador de insolvência é absolutamente convicto e credível, ao formular um juízo negativo, afiançando que «não vemos que a empresa tenha condições para se manter activa, pois não tem activo nem temos conhecimento que tenha estabelecimento para explorar e gerar receitas». E este prognóstico desfavorável traduz-se ainda na projecção que «não se prevê a obtenção de valores para a satisfação dos créditos».
Todos os elementos contabilísticos são assim negatórios da existência de meios próprios para garantir o pagamento dos encargos e das dívidas.
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Quanto às disponibilidades pessoais do legal representante, importa sublinhar que, na sessão de 19/10/2022, o próprio afirmou que não tinha património pessoal que pudesse disponibilizar para proceder ao pagamento aqui discutido.
E, neste segmento do seu testemunho, a contabilista limita-se a carrear para os autos informação que foi transmitida directamente pelo mencionado CC, mas que não reúne igualmente a virtualidade para considerar que o Juiz titular do processo errou, por omissão, ao não integrar a referida matéria nos factos provados.
Mais, estamos no domínio da mera especulação, pois se o legal representante tivesse interesse em mobilizar fundos próprios para o pagamento da dívida teria tido oportunidade para, em tempo útil, o fazer.
Ao invés, sempre verbalizou a incapacidade para o fazer e, também, por força disso, a Requerida também não procedeu a nenhum dos pagamentos assumidos no plano de pagamento por si proposto no email de 01/06/2021.
Neste campo, a jurisprudência é ilustrativa que não se deve proceder à reapreciação da matéria de facto quando a matéria pretendida aditar pelo recorrente não tem qualquer relevância jurídica para o caso em apreciação, designadamente, por consubstanciar a referência a juízos conclusivos ou de Direito, indemonstráveis probatoriamente, sob pena de se desenvolver atividade processual que se sabe ser inútil, o que contraria os princípios da celeridade e da economia processuais.
Na verdade, como defendemos recorrentemente, os Tribunais Superiores entendem que os recursos sobre a impugnação da matéria de facto têm sempre carácter ou natureza instrumental, devendo as questões submetidas à apreciação poder repercutir-se, de forma útil e efectiva, na decisão a proferir pelo Tribunal ad quem, de modo alterar ou modificar, no todo ou em parte, a solução jurídica que se obteve no caso concreto. De outro modo, no plano formal, não haverá interesse processual em promover a revisão dos factos controvertidos[16].
E na situação judicanda aquilo que interessa é saber se a sociedade tem meios para regularizar dívidas e não se o legal representante gera a expectativa de se substituir à sociedade requerida no pagamento de dívidas. E esta esperança mostra-se defraudada, quando, ao longo de todo o tempo, a gerência nunca teve qualquer comportamento concludente que permitisse asseverar que utilizaria fundos próprios em montante suficiente para garantir o cumprimento das obrigações contratuais assumidas e não pagas pela sociedade.
Sopesados todos os argumentos esgrimidos pelas partes e a interpretação da audição de todo o suporte magnetofónico gravado e a demais prova presente nos autos, o Meritíssimo Juiz de Direito estava legitimado a decidir nos termos em que o fez.
A terminar, vimos pugnando que a alocução fundamento para impor decisão diversa, nos termos proclamados pelo n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil, não se basta com a possibilidade de uma alternativa decisória antes exige que o juízo efectuado pela Primeira Instância esteja estruturado num lapso relevante no processo de avaliação da prova[17]. E na presente situação não existe assim nenhum erro de facto.
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4.4 – Do erro de direito:
O processo de insolvência é uma execução colectiva ou universal. Nesta execução universal intervêm todos os credores do insolvente e na mesma é atingido, em princípio, todo o património deste devedor, tal como se retira da interpretação integrada dos artigos 1.º[18], 47.º[19], n.ºs 1 a 3, 128.º[20], n.ºs 1 e 3 e 149.º[21], n.ºs 1 e 2, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
Em função disto, tal como decorre do estabelecido no n.º 1 do artigo 3.º[22] do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, perante a impossibilidade de assumir o cumprimento de todas as suas obrigações vencidas, todos os credores podem reclamar os seus créditos e todo o património do devedor responde pelas suas dívidas.
A avaliação de uma situação de insolvência deve ser balizada de acordo com o recorte normativo presente no artigo 20.º[23] do referido diploma. E assim impõe-se perguntar se os factos provados revelam (i) um quadro de suspensão generalizada do pagamento das obrigações vencidas (ii) de falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações ou representa (iii) ou se se verifica outra situação que se inscreva no conceito em discussão?
Os factos enunciados na norma do n.º 1 do artigo 20.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas são indícios ou sintomas da situação de falência (factos-índice). É através deles que, normalmente a situação de insolvência se manifesta ou se exterioriza. Por isso, a verificação de qualquer deles permite presumir a situação de insolvência do devedor mas este pode sempre ilidir esta presunção, provando que, não obstante a ocorrência de um ou mais factos do tipo enunciado, a situação de insolvência não se verifica[24].
Carvalho Fernandes e João Labareda sublinham que aquilo que verdadeiramente releva para a insolvência é a insusceptibilidade de satisfazer obrigações que, pelo seu significado no conjunto do passivo do devedor, ou pelas próprias circunstâncias do incumprimento, evidenciam a impotência, para o obrigado, de continuar a satisfazer a generalidade dos seus compromissos. Nesta linha de raciocínio «pode até suceder que a não satisfação de um pequeno número de obrigações ou até de uma única indicie, só por si, a penúria do devedor, característica da sua insolvência actual»[25].
Na visão de Menezes Leitão a insolvência corresponde à impossibilidade de cumprimento pontual das obrigações, e não à mera insuficiência patrimonial, correspondente a uma situação líquida negativa, uma vez que o recurso ao crédito pode permitir ao devedor suprir a carência de liquidez para cumprir as suas obrigações[26].
Nesta ordem de ideias, à verificação do estado de insolvência está subjacente o conceito de solvabilidade, podendo acontecer que:
- o passivo é superior ao activo, mas não se verificar a situação de insolvência por existir facilidade de recurso ao crédito para satisfazer as dívidas excedentárias;
- o activo é superior ao passivo vencido, mas o devedor encontra-se em situação de insolvência por falta de liquidez do seu activo[27].
Assim, o que releva para a insolvência é a insusceptibilidade de o devedor satisfazer obrigações que, pelo seu significado no conjunto do passivo do devedor, ou pelas próprias circunstâncias do cumprimento evidenciam a impotência para continuar a satisfazer a generalidade dos seus compromissos.
Complementarmente, a lei equipara ainda a situação de insolvência iminente à situação de insolvência actual como fundamento de apresentação à insolvência, como ressalta da leitura do n.º 4 do artigo 3.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
A iminência da insolvência caracteriza-se pela ocorrência de circunstâncias que, não tendo ainda conduzido ao incumprimento em condições de poder considerar-se situação de insolvência já actual, com toda a probabilidade a vão determinar a curto prazo, exactamente pela insuficiência do activo líquido e disponível para satisfazer o passivo exigível[28]. Ou, na formulação de Catarina Serra, a insolvência iminente é a situação em que o devedor antevê que estará impossibilitado de cumprir as suas obrigações quando elas se vencerem, no futuro próximo[29].
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Recentrando na situação concreta, o Tribunal recorrido debateu com acerto e de forma clara a matéria sobre a nulidade dos “Acordos de Colaboração”, da existência de uma dívida por causa e por conta desses vínculos contratuais e dos pactos complementares ou substitutivos celebrados entre contratantes e, bem assim, a problemática do abuso de direito.
Sopesando o deve e o haver, o Tribunal a quo sufragou o entendimento que a sociedade Requerida está em situação de insolvência técnica e é devedora de uma obrigação já vencida que não dispõe de meios para a satisfazer esse pagamento.
Os rácios de solvabilidade negativos, a incapacidade actual para gerar receitas e a não existência de bens susceptíveis de garantir a satisfação de compromissos implicam que se considere que a situação seja integrada na previsão da alínea b) do n.º 1 do artigo 20.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
Efectivamente, estamos perante um cenário de falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revela a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações.
Ao contrário daquilo que se havia proposto comprovar, a recorrente não conseguiu demonstrar a existência de uma situação patrimonial, financeira e económica que permitisse concluir que tinha capacidade para assumir com êxito o cumprimento das obrigações passadas, presentes e futuras.
Estamos perante uma pessoa colectiva que regista um passivo que é manifestamente superior ao activo, avaliado segundo as normas contabilísticas aplicáveis. Por força daquilo que consta dos pontos 110[30], 111[31], 112[32], 113[33] e da súmula contabilística contida no gráfico incorporado no ponto 114 dos autos, em associação com a situação actual dos estabelecimentos, é de concluir que a requerida está em situação de insolvência.
É incontroverso que a alegação e a prova dos factos cuja verificação faz presumir a situação de insolvência constitui ónus que impende sobre o credor que requeira a declaração de insolvência, o que fez. No pólo oposto, a requerida não logrou ilidir a presunção que a sua situação se integrava nas alíneas b) e h) do n.º 1 do artigo 20.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas.
Nos presentes autos, os credores requerentes da insolvência actuam enquanto titulares de um crédito litigioso, mas não são os únicos credores da sociedade devedora, tal como está demonstrado no relatório do administrador de insolvência e na própria matéria de facto.
Resulta claramente do relatório do administrador de insolvência elaborado ao abrigo do disposto no artigo 155.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas que inexistem fundos ou disponibilidades financeiras para garantir a satisfação dos créditos reclamados e que a empresa se encontra insolvente.
Neste capítulo, em jeito de síntese final, como a recorrente não logrou ilidir as presunções decorrentes do disposto no mencionado n.º 1 do artigo 20.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, o Tribunal da Relação de Évora tem de firmar posição no sentido de que a requerida se encontra insolvente, mantendo-se assim a decisão recorrida, pois nenhum dos argumentos recursivos tem a idoneidade para reverter o sentido do anteriormente decidido.
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V – Sumário: (…)
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VI – Decisão:
Nestes termos e pelo exposto, tendo em atenção o quadro legal aplicável e o enquadramento fáctico envolvente, decide-se julgar improcedente o recurso interposto, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas a cargo da recorrente, tendo em atenção o disposto no artigo 527.º do Código de Processo Civil.
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Processei e revi.
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Évora, 15/06/2023

José Manuel Costa Galo Tomé de Carvalho

José Manuel Lopes Barata

Cristina Maria Xavier Machado Dá Mesquita

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[1] Artigo 423.º (Momento da apresentação):
1 - Os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes.
2 - Se não forem juntos com o articulado respetivo, os documentos podem ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado.
3 - Após o limite temporal previsto no número anterior, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior.
[2] Artigo 644.º (Apelações autónomas):
1 - Cabe recurso de apelação:
a) Da decisão, proferida em 1.ª instância, que ponha termo à causa ou a procedimento cautelar ou incidente processado autonomamente;
b) Do despacho saneador que, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa ou absolva da instância o réu ou algum dos réus quanto a algum ou alguns dos pedidos.
2 - Cabe ainda recurso de apelação das seguintes decisões do tribunal de 1.ª instância:
a) Da decisão que aprecie o impedimento do juiz;
b) Da decisão que aprecie a competência absoluta do tribunal;
c) Da decisão que decrete a suspensão da instância;
d) Do despacho de admissão ou rejeição de algum articulado ou meio de prova;
e) Da decisão que condene em multa ou comine outra sanção processual;
f) Da decisão que ordene o cancelamento de qualquer registo;
g) De decisão proferida depois da decisão final;
h) Das decisões cuja impugnação com o recurso da decisão final seria absolutamente inútil;
i) Nos demais casos especialmente previstos na lei.
3 - As restantes decisões proferidas pelo tribunal de 1.ª instância podem ser impugnadas no recurso que venha a ser interposto das decisões previstas no n.º 1.
4 - Se não houver recurso da decisão final, as decisões interlocutórias que tenham interesse para o apelante independentemente daquela decisão podem ser impugnadas num recurso único, a interpor após o trânsito da referida decisão.
[3] Artigo 638.º (Prazos):
1 - O prazo para a interposição do recurso é de 30 dias e conta-se a partir da notificação da decisão, reduzindo-se para 15 dias nos processos urgentes e nos casos previstos no n.º 2 do artigo 644.º e no artigo 677.º.
2 - Se a parte for revel e não dever ser notificada nos termos do artigo 249.º, o prazo de interposição corre desde a publicação da decisão, exceto se a revelia da parte cessar antes de decorrido esse prazo, caso em que a sentença ou despacho tem de ser notificado e o prazo começa a correr da data da notificação.
3 - Tratando-se de despachos ou sentenças orais, reproduzidos no processo, o prazo corre do dia em que foram proferidos, se a parte esteve presente ou foi notificada para assistir ao ato.
4 - Quando, fora dos casos previstos nos números anteriores, não tenha de fazer-se a notificação, o prazo corre desde o dia em que o interessado teve conhecimento da decisão.
5 - Em prazo idêntico ao da interposição, pode o recorrido responder à alegação do recorrente.
6 - Na sua alegação, o recorrido pode impugnar a admissibilidade ou a tempestividade do recurso, bem como a legitimidade do recorrente.
7 - Se o recurso tiver por objeto a reapreciação da prova gravada, ao prazo de interposição e de resposta acrescem 10 dias.
8 - Sendo requerida pelo recorrido a ampliação do objeto do recurso, nos termos do artigo 636.º, pode o recorrente responder à matéria da ampliação, nos 15 dias posteriores à notificação do requerimento.
9 - Havendo vários recorrentes ou vários recorridos, ainda que representados por advogados diferentes, o prazo das respetivas alegações é único, incumbindo à secretaria providenciar para que todos possam proceder ao exame do processo durante o prazo de que beneficiam.
[4] José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, Coimbra, 1984, pág. 122.
[5] Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, Coimbra Editora, Coimbra, 2001, pág. 670.
[6] Antunes Varela, Miguel Bezerra, Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, 2ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, pág. 686.
[7] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16/02/2005, in www.dgsi.pt.
[8] No mesmo sentido, Acórdão da Relação de Lisboa de 09/07/2014, in www.dgsi.pt.
[9] Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, 1979, Coimbra, pág. 191.
[10] Antunes Varela, Miguel Varela e Sampaio e Nora, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, Coimbra, 1985, págs. 435-436.
[11] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de uniformização de jurisprudência de 21/06/2016, in www.dgsi.pt.
[12] Sobre esta matéria ver, em sentido próximo, o Acórdão da Relação de Lisboa de 19/05/2016, in www.dgsi.pt, que realça que «a prova dos factos assenta na certeza subjectiva da sua realidade, ou seja, no elevado grau de probabilidade de verificação daquele, suficiente para as necessidades práticas da vida, distinguindo-se da verosimilhança que assenta na simples probabilidade da sua verificação».
[13] (115) A Requerida beneficiou de um plano de pagamento de dívidas tributárias em prestações, que englobou um total em dívida de € 30.839,56, que foi cumprido, estando ainda em dívida apenas o valor de € 6.312,54 referente a prestações vincendas.
[14] (2) Devido à situação pandémica e à consequente quebra de faturação ao longo dos períodos de encerramento dos estabelecimentos, nomeadamente, entre março e maio de 2020 e janeiro de 2021, a requerida deparou-se com dificuldades financeiras que levaram a que o sócio gerente da mesma solicitasse a aplicação das medidas excepcionais de apoio às empresas, por forma a poder honrar os seus compromissos.
[15] (3) Medidas essas que foram recusadas pelas Requerentes.
[16] Acórdãos deste colectivo de Juízes do Tribunal da Relação de Évora datados de 30/01/2020, 08/10/2020, 30/06/2021, 15/12/2022 e 06/02/2023, entre outros disponibilizados em www.dgsi.pt.
[17] Por todos podem ser consultados os acórdãos de 30/01/2020, 13/02/2020, 04/06/2020, 08/10/2020, 03/12/2020, 13/05/2021, 30/06/2021 e 10/03/2023, entre muitos outros, disponíveis na plataforma www.dgsi.pt.
[18] Artigo 1.º (Finalidade):
1 - O processo de insolvência é um processo de execução universal que tem como finalidade a satisfação dos credores pela forma prevista num plano de insolvência, baseado, nomeadamente, na recuperação da empresa compreendida na massa insolvente, ou, quando tal não se afigure possível, na liquidação do património do devedor insolvente e a repartição do produto obtido pelos credores.
2 - Estando em situação económica difícil, ou em situação de insolvência meramente iminente, a empresa pode requerer ao tribunal a instauração de processo especial de revitalização, de acordo com o previsto nos artigos 17.º-A a 17.º-I.
3 - Tratando-se de devedor de qualquer outra natureza em situação económica difícil ou em situação de insolvência meramente iminente, este pode requerer ao tribunal processo especial para acordo de pagamento, previsto nos artigos 222.º-A a 222.º-I.
[19] Artigo 47.º (Conceito de credores da insolvência e classes de créditos sobre a insolvência):
1 - Declarada a insolvência, todos os titulares de créditos de natureza patrimonial sobre o insolvente, ou garantidos por bens integrantes da massa insolvente, cujo fundamento seja anterior à data dessa declaração, são considerados credores da insolvência, qualquer que seja a sua nacionalidade e domicílio.
2 - Os créditos referidos no número anterior, bem como os que lhes sejam equiparados, e as dívidas que lhes correspondem, são neste Código denominados, respectivamente, créditos sobre a insolvência e dívidas da insolvência.
3 - São equiparados aos titulares de créditos sobre a insolvência à data da declaração da insolvência aqueles que mostrem tê-los adquirido no decorrer do processo.
4 - Para efeitos deste Código, os créditos sobre a insolvência são:
a) ‘Garantidos’ e ‘privilegiados’ os créditos que beneficiem, respectivamente, de garantias reais, incluindo os privilégios creditórios especiais, e de privilégios creditórios gerais sobre bens integrantes da massa insolvente, até ao montante correspondente ao valor dos bens objecto das garantias ou dos privilégios gerais, tendo em conta as eventuais onerações prevalecentes;
b) ‘Subordinados’ os créditos enumerados no artigo seguinte, excepto quando beneficiem de privilégios creditórios, gerais ou especiais, ou de hipotecas legais, que não se extingam por efeito da declaração de insolvência;
c) ‘Comuns’ os demais créditos.
[20] Artigo 128.º (Reclamação de créditos):
1 - Dentro do prazo fixado para o efeito na sentença declaratória da insolvência, devem os credores da insolvência, incluindo o Ministério Público na defesa dos interesses das entidades que represente, reclamar a verificação dos seus créditos por meio de requerimento, acompanhado de todos os documentos probatórios de que disponham, no qual indiquem:
a) A sua proveniência, data de vencimento, montante de capital e de juros;
b) As condições a que estejam subordinados, tanto suspensivas como resolutivas;
c) A sua natureza comum, subordinada, privilegiada ou garantida, e, neste último caso, os bens ou direitos objecto da garantia e respectivos dados de identificação registral, se aplicável;
d) A existência de eventuais garantias pessoais, com identificação dos garantes;
e) A taxa de juros moratórios aplicável.
f) O número de identificação bancária ou outro equivalente.
2 - O requerimento é endereçado ao administrador da insolvência e apresentado por transmissão eletrónica de dados, nos termos definidos na portaria prevista no n.º 2 do artigo 17.º.
3 - Sempre que os credores da insolvência não estejam patrocinados, o requerimento de reclamação de créditos é apresentado no domicílio profissional do administrador da insolvência ou para aí remetido por correio eletrónico ou por via postal registada, devendo o administrador, respetivamente, assinar no ato de entrega, ou enviar ao credor no prazo de três dias da receção, comprovativo do recebimento, sendo o envio efetuado pela forma utilizada na reclamação.
4 - A reclamação de créditos prevista no n.º 1 pode efetuar-se através do formulário disponibilizado para o efeito no portal a definir por portaria do membro do governo responsável pela área da justiça ou através do formulário-tipo de reclamação de créditos previsto nos artigos 54.º e 55.º do Regulamento (UE) n.º 2015/848 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2015, nos casos em que aquele regulamento seja aplicável.
5 - A verificação tem por objecto todos os créditos sobre a insolvência, qualquer que seja a sua natureza e fundamento, e mesmo o credor que tenha o seu crédito reconhecido por decisão definitiva não está dispensado de o reclamar no processo de insolvência, se nele quiser obter pagamento.
[21] Artigo 149.º (Apreensão dos bens):
1 - Proferida a sentença declaratória da insolvência, procede-se à imediata apreensão dos elementos da contabilidade e de todos os bens integrantes da massa insolvente, ainda que estes tenham sido:
a) Arrestados, penhorados ou por qualquer forma apreendidos ou detidos, seja em que processo for, com ressalva apenas dos que hajam sido apreendidos por virtude de infracção, quer de carácter criminal, quer de mera ordenação social;
b) Objecto de cessão aos credores, nos termos dos artigos 831.º e seguintes do Código Civil.
2 - Se os bens já tiverem sido vendidos, a apreensão tem por objecto o produto da venda, caso este ainda não tenha sido pago aos credores ou entre eles repartido.
[22] Artigo 3.º (Situação de insolvência):
1 - É considerado em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas.
2 - As pessoas colectivas e os patrimónios autónomos por cujas dívidas nenhuma pessoa singular responda pessoal e ilimitadamente, por forma directa ou indirecta, são também considerados insolventes quando o seu passivo seja manifestamente superior ao activo, avaliados segundo as normas contabilísticas aplicáveis.
3 - Cessa o disposto no número anterior quando o activo seja superior ao passivo, avaliados em conformidade com as seguintes regras:
a) Consideram-se no activo e no passivo os elementos identificáveis, mesmo que não constantes do balanço, pelo seu justo valor;
b) Quando o devedor seja titular de uma empresa, a valorização baseia-se numa perspectiva de continuidade ou de liquidação, consoante o que se afigure mais provável, mas em qualquer caso com exclusão da rubrica de trespasse;
c) Não se incluem no passivo dívidas que apenas hajam de ser pagas à custa de fundos distribuíveis ou do activo restante depois de satisfeitos ou acautelados os direitos dos demais credores do devedor.
4 - Equipara-se à situação de insolvência actual a que seja meramente iminente, no caso de apresentação pelo devedor à insolvência.
[23] Artigo 20.º (Outros legitimados):
1 - A declaração de insolvência de um devedor pode ser requerida por quem for legalmente responsável pelas suas dívidas, por qualquer credor, ainda que condicional e qualquer que seja a natureza do seu crédito, ou ainda pelo Ministério Público, em representação das entidades cujos interesses lhe estão legalmente confiados, verificando-se algum dos seguintes factos:
a) Suspensão generalizada do pagamento das obrigações vencidas;
b) Falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações;
c) Fuga do titular da empresa ou dos administradores do devedor ou abandono do local em que a empresa tem a sede ou exerce a sua principal actividade, relacionados com a falta de solvabilidade do devedor e sem designação de substituto idóneo;
d) Dissipação, abandono, liquidação apressada ou ruinosa de bens e constituição fictícia de créditos;
e) Insuficiência de bens penhoráveis para pagamento do crédito do exequente verificada em processo executivo movido contra o devedor;
f) Incumprimento de obrigações previstas em plano de insolvência ou em plano de pagamentos, nas condições previstas na alínea a) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 218.º;
g) Incumprimento generalizado, nos últimos seis meses, de dívidas de algum dos seguintes tipos:
i) Tributárias;
ii) De contribuições e quotizações para a segurança social;
iii) Dívidas emergentes de contrato de trabalho, ou da violação ou cessação deste contrato;
iv) Rendas de qualquer tipo de locação, incluindo financeira, prestações do preço da compra ou de empréstimo garantido pela respectiva hipoteca, relativamente a local em que o devedor realize a sua actividade ou tenha a sua sede ou residência;
h) Sendo o devedor uma das entidades referidas no n.º 2 do artigo 3.º, manifesta superioridade do passivo sobre o activo segundo o último balanço aprovado, ou atraso superior a nove meses na aprovação e depósito das contas, se a tanto estiver legalmente obrigado.
2 - O disposto no número anterior não prejudica a possibilidade de representação das entidades públicas nos termos do artigo 13.º.
[24] Catarina Serra, «O Novo Regime Português da Insolvência», Uma Introdução, 3ª edição, Almedina., Coimbra, pág. 25.
[25] Luís Carvalho Fernandes e João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 3ª edição, Quid Juris, Lisboa, 2015, pág. 71.
[26] Menezes Leitão, Direito da Insolvência, Almedina, Coimbra, 2009, pág. 76.
[27] Neste sentido, vide Maria do Rosário Epifânio, Manual do Direito da Insolvência Almedina, Coimbra, 2016, págs. 19-30.
[28] Luís Carvalho Fernandes e João Labareda, Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 3ª edição, Quid Juris, Lisboa, 2015, pág. 87.
[29] Catarina Serra, Revitalização – a designação e o misterioso objecto designado. O Processo Homónimo (PER) e as suas ligações com a Insolvência (situação e processo) e com o SIREVE, in I Congresso de Direito da Insolvência, Almedina, Coimbra, 2013, pág. 91.
[30] (110) Relativamente ao exercício de 2019, a Requerida regista contabilisticamente:
(i) um resultado líquido negativo do período, no valor de - € 38.054,44;
(ii) o activo não corrente no valor de € 29.994,54, o activo corrente no valor de € 49.046,31, sendo o activo no valor total de € 79.040,85;
(iii) o passivo não corrente no valor de € 12.645,23, o passivo corrente no valor de € 118.235,74, sendo o passivo no valor total de € 130.880,97;
(iv) um capital próprio negativo em - € 51.840,12.
[31] (111) Relativamente ao exercício de 2020, a Requerida regista contabilisticamente:
(i) um resultado líquido negativo do período, no valor de - € 19.603,21;
(ii) o activo não corrente no valor de € 20.916,74, o activo corrente no valor de € 41.610,51, sendo o activo no valor total de € 62.527,25;
(iii) o passivo não corrente no valor de € 11.933,20, o passivo corrente no valor de € 122.037,38, sendo o passivo no valor total de € 133.970,58;
(iv) um capital próprio negativo em - € 71.443,33.
[32] (112) Relativamente ao exercício de 2021, a Requerida regista contabilisticamente:
(i) um resultado líquido negativo do período, no valor de - € 32.163,41;
(ii) o activo não corrente no valor de € 12.829,55, o activo corrente no valor de € 49.378,24, sendo o activo no valor total de € 62.207,79;
(iii) o passivo não corrente no valor de € 11.760,85, o passivo corrente no valor de € 134.450,50, sendo o passivo no valor total de € 146.211,35;
(iv) um capital próprio negativo em - € 84.003,53.
[33] (113) Relativamente ao exercício de 2022, e tendo por base apenas o período de Janeiro a Outubro de 2022, a Requerida regista provisoriamente:
(i) um resultado líquido positivo do período, no valor de € 23.635,37;
(ii) o activo não corrente no valor de € 10.741,86, o activo corrente no valor de € 91.428,90, sendo o activo no valor total de € 102.170,76;
(iii) o passivo não corrente no valor de € 9.798,60, o passivo corrente no valor de € 152.538,92, sendo o passivo no valor total de € 162.538,92;
(iv) um capital próprio negativo em - € 60.368,16.