Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
126/24.5T8SNS.E1
Relator: FILIPE AVEIRO MARQUES
Descritores: HORÁRIO DE TRABALHO
ALTERAÇÃO
TRABALHO POR TURNOS
TRABALHO PORTUÁRIO
DESCANSO SEMANAL
FÉRIAS
ACORDO DE EMPRESA
Data do Acordão: 07/10/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA RECORRIDA
Área Temática: SOCIAL
Sumário: Sumário:
1. Por não se tratarem de horários individualmente acordados com cada trabalhador nem terem sido fixados por regulamentação colectiva, não estavam as rés empregadoras impedidas de alterar os horários de trabalho, desde que essa alteração fosse precedida de informação e consulta aos trabalhadores e comunicada com a antecedência devida.

2. No caso de pessoas que trabalham em portos está legalmente caracterizada a necessidade de assegurar a continuidade do serviço e, por isso, da realização do trabalho por turnos.

3. Não resulta do Acordo de Empresa aplicável que os descansos dos trabalhadores por turnos tenham de coincidir com o fim-de-semana.

4. Uma vez que em acordo de 2017 nunca chegou a existir uma marcação de férias individual, nem desse acordo se pode retirar que as partes tenham acordado em conceder esse direito aos trabalhadores, já que essa forma de marcação de férias era um pressuposto para um horário que nunca chegou a entrar em vigor e não para todos os futuros horários, não se pode dizer que do novo regime de marcação de férias fixado pelas rés resulte qualquer violação da lei ou da regulamentação colectiva.

Decisão Texto Integral: Apelação n.º 126/24.5T8SNS.E1
(Secção Social)

Relator: Filipe Aveiro Marques


1.º Adjunto: Mário Branco Coelho


2.ª Adjunta: Paula do Paço


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Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Évora:

I. RELATÓRIO:

I.A.


“SINDICATO XXI – ASSOCIAÇÃO SINDICAL DOS TRABALHADORES, TÉCNICOS, E OPERADORES DOS TERMINAIS DE CARGA CONTENTORIZADA DO PORTO DE SINES”, associação autora na acção comum que intentou contra “PSA SINES – TERMINAIS DE CONTENTORES, S.A.” e “LABORSINES – EMPRESA DE TRABALHO PORTUÁRIO UNIPESSOAL, LDA.”, veio interpor recurso da sentença proferida pelo Juízo do Trabalho de Sines, do Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal, que terminou com o seguinte dispositivo:

Em face de tudo quanto se deixou exposto, o Tribunal julga a presente acção totalmente improcedente e, em consequência, absolve as rés de todos os pedidos contra estas deduzidos pela autora.

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Custas a cargo da autora (artigo 527.º, n.º 1 e 2, do Código de Processo Civil), sem prejuízo da isenção de que beneficia, cfr. artigo 4.º, n.º 1 alínea f), do RCP.”.

Na sua petição inicial a associação sindical autora tinha peticionado o seguinte:

Nestes termos e nos demais de direito deverá a presente ação ser considerada procedente por provada e em consequência:

A)

Ser declarada a ilicitude da alteração do horário de trabalho, por ilegalidade do mesmo, decidida unilateralmente pelas RR., o qual entrou em vigor em 8/02/2024, através da comunicação interna com a referência CI/MD 02/24 de 31/1/2024 e Comunicação interna CI/MD 01/24.

B)

Serem as RR., na sequência da procedência do pedido anteriormente formulado, condenadas a suspender a aplicação do novo horário, ordenando-se a reposição do horário anterior.

C)

Deverão ainda as RR. ser condenadas no cumprimento de todas as imposições legais e convencionais que se mostrem violadas pela decisão de alteração do horário e abster-se da prática de atos ilegais no que diz respeito à alteração unilateral do horário de trabalho dos trabalhadores no setor das operações, em violação dos acordos anteriormente celebrados, acordo de empresa e demais legislação.

Alegou, muito em síntese, que em 11/05/2017 foi alcançado entre a PSA Sines, Laborsines, Sindicato XXI e a APS-Administração dos Portos de Sines e do Algarve, o acordo definitivo sobre o novo horário de trabalho, criação do 5.º turno e eliminação do horário de transição dos novos trabalhadores. As rés encetaram negociações com a autora e com a Comissão de Trabalhadores visando a alteração deste horário de trabalho, não tendo chegado a acordo. As rés comunicaram o novo horário, que se encontra em vigor desde 08/02/2024. A alteração unilateral do horário configura uma violação do acordo de 2017 e dos pressupostos aí estabelecidos, um retirar de direitos dos trabalhadores e constitui uma violação do AE.


Contestaram as rés dizendo, muito em suma, que as alterações introduzidas no horário implementado pelas rés em 08/02/2024 não são violadoras de qualquer norma legal ou convencional (Acordo de Empresa) aplicável nem são suscetíveis de colocar em causa qualquer direito dos trabalhadores, nomeadamente o direito ao repouso e a própria segurança no trabalho, pelo que defendem a improcedência da acção.


Realizado julgamento, foi proferida a sentença recorrida.

I.B.

A autora/apelante apresentou alegações que terminam com as seguintes conclusões:

A)

A Recorrente, na sequencia do decaimento na presente ação, entende que não pode conformar-se com a douta sentença proferida, desde logo pela importância que representa tal decaimento na vida de 990 trabalhadores e respetivos familiares, em concreto nas questões decididas pelo Tribunal Recorrido de alteração unilateral do horário e respetiva validade jurídica da mesma, as consequência que tal acarreta, aumentando a carga horária no período de verão, a retirada de 5 fins de semana completos por mês, a retirada de um dia de folga na rotação noite/manhãs, em que se retira no período de verão fins de semana completos a vários turnos/equipas e na questão das férias, as quais resultam com o sistema implementado, na prática, a marcação de todas as férias pela empresa.

B)

O Tribunal recorrido, atenta a matéria dada como provada, decidiu que as recorridas podiam alterar unilateralmente o horário porque lhes compete em regra tal elaboração como instrumento de gestão e previsto que está também na cláusula 10ª do AE, que o Acordo de 2017 estaria em vigor de forma transitória, e que procederam a uma consulta aos trabalhadores, tendo proposto vários horários, que não foram aceites, e que tal alteração foi motivada e não discricionária.

C)

A celebração de acordos entre as empresas e os seus trabalhadores constituem formas legitimas de contratação, embora tratando-se de uma forma de contratação atípica, deve a mesma produzir os seus efeitos e vincula as partes no seu cumprimento, como neste ponto bem decidiu o tribunal recorrido, decorrendo dos princípios da liberdade sindical e dos princípios da contratação coletiva.

D)

Aliás neste preciso sentido, da validade e efeitos que deve ter este tipo de acordos invoca o Tribunal Recorrido a doutrina de A. Nunes de Carvalho, Mário Pinto, bem como o acórdão do STJ, todos já mencionados nas presentes alegações para as quais respeitosamente se remete.

E)

De tal forma de contratação atípica resulta o Acordo de 2017, o qual tinha como pressupostos como resulta dos factos provados em (13) e que pela sua importância se reproduz parcialmente: Ciclos M/T/N; Garantir o mesmo ciclo todo o ano; intervalos maiores em cada rotação (M/T/N), maior intervalo a acontecer entre a rotação N/M; pelo menos o mesmo número de folgas em fins de semana existentes no horário atual; férias marcadas individualmente.

F)

O Tribunal recorrido reconhece a validade do acordo e os seus efeitos, o mesmo será dizer, os pressupostos do acordo quanto ao horário, mas considera o horário decorrente do mesmo, transitório.

G)

Cotejando o acordo de 2017 e atento o elemento literal, consta do mesmo a frase “Acordo definitivo sobre um novo horário de trabalho” e consequentemente tem o significado que não vai ser alterado; o elemento lógico abrange o mesmo, várias matérias importantes, designadamente criando o 5º turno) e o elemento temporal (traduzido na sua duração, sendo significativa e relevante a sua duração de 5 anos) se conclui não ser o referido horário meramente transitório.

H)

Pelo exposto a interpretação preconizada pelo tribunal recorrido de que o horário de trabalho era transitório, quando não o era, constitui uma errada interpretação do acordo e dos seus efeitos e constitui uma decisão errada que deve ser revogada.

I)

E não sendo transitório, salvo melhor opinião, pode concluir-se pela violação do acordo de 2017 e seus pressupostos, resultando na reposição do horário anterior!

J)

E consequentemente, não tendo o referido acordo carater transitório, importa a suspensão ou revogação do atual horário e a reposição do anterior, ou alternativamente outro horário que contemple as premissas ou pressupostos do horário anterior estabelecido, não sendo a Ora Recorrente contra todo e qualquer horário, mas sim contra este novo horário que não contempla esses pressupostos.

K)

As recorridas subscreveram e vincularam-se ao acordo de 2017 e seus pressupostos, de boa-fé. O enquadramento do tribunal recorrido de que seria tal acordo transitório, é errada igualmente por 2 motivos. O primeiro consistirá na relevância jurídica que o próprio tribunal reconhece e que depois contraditoriamente afirma a sua transitoriedade, e o segundo é que a decisão proferida torna absoluta e completamente irrelevantes quaisquer acordos que não constituam acordos de empresa.

L)

Assim, a interpretação do tribunal recorrido face à transitoriedade do acordo, que não acompanhamos, pelos motivos já expostos, podendo as Recorridas proceder à alteração do horário é igualmente errada ao não considerar o facto de em 2017 as recorridas terem voluntariamente prescindido dessas prorrogatórias legais, subscrevendo o aludido acordo.

M)

Para além de tornar irrelevantes, quer na prática, quer juridicamente, quaisquer acordos atípicos que não estabelecidos no AE, desincentivando a negociação coletiva.

N)

Pelo exposto, a transitoriedade do acordo decidida pelo Tribunal constitui um erro na interpretação e aplicação do direito aos factos que por esse motivo deverá ser revogada.

O)

A delicadeza do problema que constitui a alteração de um horário de trabalho, em que de um lado temos a empresa no qual o horário é um instrumento de gestão e por outro lado o trabalhador, em que é seriamente afetada a sua vida familiar, como bem reconhece Monteiro Fernandes na obra referida na sentença e no corpo das alegações, para as quais respeitosamente se remete, é, pois, manifesta.

P)

Constituindo a presente discussão na presente ação uma escolha entre um instrumento de gestão (entre muitos outros) e a vida pessoal e familiar de 990 pessoas, tal escolha tem de levar em conta necessariamente o direito ao descanso e ao repouso dos Trabalhadores sob pena de completo esvaziamento de proteção legal dos mesmos, quanto a esses direitos.

Q)

A decisão proferida, não salvaguarda de forma efetiva e proactiva esses direitos, resultando assim o seu esvaziamento.

R)

Da análise objetiva do novo horário resulta que o mesmo aumenta a carga horária de 37 horas para 40 ou mais horas, no período de verão, existindo semanas em que fazem 44 e 48 horas (facto provado 35).

S)

O Tribunal recorrido considerou provado o ponto 11 dos factos provados, do qual consta: «Podendo vigorar um regime de flexibilidade de modo a permitir um máximo de 10 horas diárias desde que em cada período de referência não seja excedido a média de 40 horas por semana, tendo os períodos de referência a duração de 4 meses, com início, em princípio, nos meses de Janeiro, Maio e Setembro ou alternativamente na 1ª, 18ª e 35ª semana de cada ano.» explanando neste ponto o nº2 e nº3 da clausula 10ª do AE.

T)

Do novo horário consta que no período de verão entre Maio e Setembro (facto provado 35) vigorará um regime de flexibilidade abrangendo 2 períodos, o de maio a agosto e o de setembro a dezembro (embora neste apenas setembro seja abrangido) abrangendo dois períodos e não apenas um.

U)

Nesta situação concreta o novo horário não cumpre o estabelecido na cláusula 10ª-nº2 e nº3 do AE, reproduzido no corpo das presentes alegações e para o qual respeitosamente se remete, o qual permite um (e não dois) regime de flexibilidade constituído por 4 meses, e estabelece 4 meses para esse período e não 5 meses.

V)

Pelo que não cumprindo o estabelecido no AE o Tribunal recorrido cometeu um erro de julgamento, aplicando erradamente o direito aos factos, pelo que a referida sentença, salvo melhor opinião, deverá ser revogada.

W)

O Tribunal Recorrido vem a julgar como provado o ponto 34 e o ponto 36 da matéria de facto dos quais consta:

«34. Mantém a média semanal por ano não superior a 37 horas de trabalho, sendo essa média de 40 horas no período entre Maio e 15 de Setembro e sendo assegurada a média semanal por ano de 40 horas nos períodos de referência de Janeiro a Abril, Maio a Agosto e Setembro a Dezembro ou com início, respectivamente, na 1ª, 18.ª e 35.ª semana de cada ano.

36. No período de Junho a Setembro, os trabalhadores fazem 48 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de mais 48 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de 32 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de mais 32 horas num período de 7 dias consecutivos.»

X)

Contudo, atento o referido documento 9 (novo horário) contata-se objetivamente que não é observada a média de 40 horas semanais, tendo o referido ponto sido incorretamente julgado, impondo-se a sua retificação, introduzindo as alterações nos termos a seguir discriminados:

Y)

O facto provado em 34., deve assim ser alterado para a seguinte redação: «34. mantêm a média semanal por ano não superior a 37 horas, sendo essa média de 40 horas ultrapassada no período entre Maio e 15 de Setembro e não sendo ultrapassada a média semanal por ano de 40 horas nos períodos de referência de janeiro a Abril, e de 15 de setembro a dezembro».

Z)

Bem como do referido documento 9 concatenado com os depoimentos das testemunhas AA, BB e CC, demonstram o excesso das 40 horas em média por semana em junho, julho e agosto do turno A; o turno B em junho também excede, o turno C em junho, o turno D em agosto e o turno E em junho e julho, impõe a alteração do ponto 36., devendo constar da matéria de facto como não provado, uma vez que foi igualmente incorretamente incluído.

AA)

Não se sabendo verdadeiramente como chega o Tribunal Recorrido a tal conclusão, uma vez que as horas que fazem não são todas iguais, pois não fazem sempre este padrão 48/32, pelo que tal facto dado como provado no ponto 36., é errado, importando determinar exatamente quais os turnos que o fazem já que essa conclusão mostra-se objetivamente errada.

BB)

Impõe-se por isso a substituição do facto dado como provado no ponto 36, pois tal não é o que resulta da observação do documento 9 com a PI e da prova testemunhal produzida, devendo ser dado como não provado.

CC)

O tribunal da Relação pode em ambos os casos alterar a matéria de facto, podendo funcionar como tribunal de substituição quando, como é o presente caso, se funda o recurso em errada apreciação da prova.

DD)

Assim a conclusão a que chega o tribunal recorrido de que não ocorre violação do AE, quando refere a média mensal de 40 horas semanais, é errada, e não pode subsistir, impondo-se a sua revogação.

EE)

O direito ao descanso como meio de recuperação física e mental e de convívio também constitui um direito que se encontra constitucionalmente previsto no artº59º-nº1-d) da Constituição da República Portuguesa, consubstanciando-se no artº127º-nº3 do Código do Trabalho, sendo essencial para o trabalhador, pela importância que tem, que sejam efetivamente e ativamente garantidos na prática esse direito.

FF)

O novo horário de 2024 retira 5 fins de semana completos relativamente ao horário anterior (facto provado em 37.) e que há equipas/turnos que não têm um único fim de semana completo por mês (facto provado em 38.).

GG)

A decisão proferida pelo tribunal recorrido, e conclusão que retira, em que refere como termo de comparação o horário anterior ao de 2017 e que vigorava à data de 11/5/2017, como tinha menos fins de semana e este novo horário de 2024 tem 17 fins de semana, este mantém o pressuposto acordado em 2017 (mesmo número de fins de semana) é manifestamente errada, já que é sobre o horário que efetivamente foi implementado e que entrou em vigor em 1/1/2018 que deve ser feita a comparação.

HH)

Sendo feita a comparação com o horário anterior a 11/5/2017, como o tribunal recorrida faz, tal não atende à vontade das partes em substituir esse horário, o qual seria sempre inaplicável no futuro e substituído pelo da engenharia que comtemplava 22 fins de semana completos por ano, sendo sobre este que deve ser feita a comparação, sob pena de tal interpretação representar um verdadeiro retrocesso do que são os direitos dos trabalhadores, que quanto a essa matéria devem ser salvaguardados.

II)

A interpretação e a conclusão que o tribunal recorrido retira quanto a esses factos provados, do facto de haver turnos que no período de verão não gozam um único fim de semana completo por mês, admitindo a violação do contratualmente espelhado pela partes, mas que tal encontrar-se-ia mitigado pelo facto de os turnos irem entrando de férias, é errada, pois não vão todos de férias no mesmo mês, e por cada turno que entra de férias os outros 4 turnos não entram e nesse turnos efetivamente não tem sequer um fim de semana completo por mês, durante os meses de verão.

JJ)

Ao verificar-se como o Tribunal Recorrido reconhece, a violação do acordo na medida em que são retirados os 5 fins de semana completos e vários trabalhadores não tem um único fim de semana completo no período de verão, não se compreende, nem se aceita, de que forma poderá ocorrer a referida mitigação para os restantes 780 trabalhadores, ou pelo menos os outros 4 turnos que não tem um único fim de semana esse mês durante o verão, sendo esta decisão proferida inaceitável para a recorrente e principalmente para os mais de 990 trabalhadores afetados.

KK)

Donde se conclui que o tribunal recorrido interpreta e aplica incorretamente o direito aos factos, pois ao reconhecer a violação do acordo não existe mitigação possível, e ao dar como provados (os factos em 37 e 38) da retirada dos 5 fins de semana e dos fins de semana do período de verão, constituindo uma violação do direito ao descanso, tal constitui um erro de julgamento quanto a tais questões, devendo por essa razão a sentença proferida ser revogada.

LL)

A recorrente suscitou a questão de que com o novo horário existe a violação do direito a marcar férias individualmente, o qual está estabelecido no acordo de 2017 e descrito no facto provado em 13., na frase “férias marcadas individualmente”.

MM)

Tal direito ou liberdade de escolha não era absoluto consistindo num regime de prioridades em que trabalhadores sem prioridade ou prioridade inferior, só tinham a possibilidade de marcar férias nos slots (períodos) que os trabalhadores com prioridade ou com prioridade superior não pretendiam (facto provado nem 91).

NN)

Da alteração levada a efeito pelas recorridas e no novo horário introduzido, como resulta dos factos provados de 39 a 41, o novo horário introduz períodos obrigatórios em slots temporais de 15 dias no período de verão, de 1 de junho a 15 de setembro, aumentado de 11/12 dias para 15 dias a obrigatoriedade de marcar férias.

OO)

No novo horário o trabalhador não escolhe o período que quer gozar, pois tal é agora imposto que goze férias entre 1 de junho e 15 de setembro, como a mesma determinar (quando antes o podia fazer em dois períodos temporais).

PP)

Daqui resulta desde logo e necessariamente a conclusão de que no novo horário não existe qualquer liberdade de escolha, pois o período de 15 dias é aquele e não outro, e consequentemente ocorre também aqui a violação quanto a ferias do Acordo de 2017, já que desaparece totalmente o direito a marcar férias individualmente.

QQ)

As recorridas impuseram no novo horário uma pré-marcação dos restantes 7 dias de férias (facto provado 43) nos meses de maio, segunda quinzena de setembro e outubro, impondo como regra para a alteração destes 7 dias para qualquer outro dia do ano, que o máximo de trabalhadores ausentes por turno seja de 2 trabalhadores por dia, num universo de 180 a 190 trabalhadores (facto provado 44), podendo ainda tal pré-marcação sobrepor-se a dias que seriam de gozo de folgas (facto provado 45).

RR)

Do regime de férias agora implementado quanto a remarcação dos restantes 7 dias, num universo de 180/190 dias apenas dois trabalhadores o possam fazer resulta a impossibilidade prática de os trabalhadores puderem efetivamente marcar quaisquer dias de férias, pelo que em rigor é retirada aos trabalhadores a possibilidade de marcação de férias, quer pela imposição de marcação dos restantes 7 dias, quer pelo número de trabalhadores que podem solicitar a remarcação.

SS)

Pelo exposto considerando o tribunal recorrido que o acordo de 2017 deve produzir efeitos entre as partes, sendo, portanto, o mesmo vinculativo e prevendo o acordo expressamente o direito a “férias marcadas individualmente” o regime de férias imposto pelas recorridas com o novo horário, com a marcação de períodos de férias e remarcação de férias dos restantes 7 dias, não reconhece nem acolhe qualquer tipo de direito a marcar férias individualmente.

TT)

A conclusão do tribunal Recorrido em como não há violação do acordo é assim errada, devendo ser revogada, porque efetivamente retira qualquer possibilidade individual de marcar ou remarcar dias de férias.

UU)

O recorrente entende que a decisão recorrida violou as normas jurídicas constantes do Artº59 nº1 b) e D) da Constituição da Républica Portuguesa e do Artº127 nº3 do Código do Trabalho e dos números 2 e 3 da Clausula 10ª do Acordo de Empresa.

Nestes termos e nos demais de direito, atentas as conclusões apresentadas, deverá ser dado provimento ao presente Recurso e a decisão proferida revogada e substituída por outra que suspenda o novo horário, ordenando-se a reposição do horário anterior e condenando-se as Recorridas no cumprimento das disposições legais e convencionais, abstendo-se de atos ilegais relativos á alteração unilateral do horário, no sector das operações, em violação dos acordos anteriormente celebrados.

Assim se fazendo Serena e Objetiva JUSTIÇA!

I.C.

As rés/apeladas responderam defendendo a total improcedência do recurso.


I.D.


O recurso foi devidamente recebido pelo tribunal a quo.


O Ministério Público junto do Tribunal da Relação emitiu parecer onde concluiu que: “somos de parecer que o horário em vigor perdeu qualquer natureza provisória e que, mesmo que assim não se entenda, as caraterísticas do horário acordado foram violadas Pelo que, s.m.o., deve merecer provimento o recurso”.


As partes não responderam tempestivamente.


Após os vistos, cumpre decidir.


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II. QUESTÕES A DECIDIR:

As conclusões das alegações de recurso delimitam o respetivo objecto de acordo com o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, ambos do Código de Processo Civil, sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha, mas não haverá lugar à apreciação de questões cuja análise se torne irrelevante por força do tratamento empreendido no acórdão (artigos 608.º, n.º 2 e 663.º, n.º 2, do mesmo diploma).


No caso, impõe-se apreciar:

a. Impugnação da matéria de facto;

b. Eventual erro de julgamento quanto à legalidade da alteração do horário de trabalho.


***

III. FUNDAMENTAÇÃO:

III.A. Fundamentação de facto:

III.A.1 Impugnação da matéria de facto:

A recorrente cumpriu minimamente (pelo menos em parte, como se verá) os requisitos do artigo 640.º do Código de Processo Civil, pelo que se impõe a análise das questões suscitadas na sua impugnação da matéria de facto.


Na verdade, como se sumariou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27/02/2024 (processo n.º 2351/21.1T8PDL.L1.S1[1]): “Para o cumprimento do ónus de especificação do art. 640.º, n.º 1, do CPC, os concretos pontos de facto impugnados devem ser feitos nas respectivas conclusões, porque delimitadoras do âmbito do recurso e constituírem o fundamento da alteração da decisão. Já quanto à especificação dos meios probatórios e à exigência da decisão alternativa, a lei não impõe que seja feita nas conclusões, podendo sê-lo no corpo da motivação”.


Assim, conforme o disposto no artigo 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, esta Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento (mesmo superveniente) impuserem decisão diversa.


a) Em primeiro lugar, defende a autora/recorrente (alíneas W) a Y) das suas conclusões) que o ponto 34 da matéria de facto provada da sentença recorrida passe a ter outra redacção.


A sentença recorrida, nesse ponto 34, deu como provado que: “Mantém a média semanal por ano não superior a 37 horas de trabalho, sendo essa média de 40 horas no período entre Maio e 15 de Setembro e sendo assegurada a média semanal por ano de 40 horas nos períodos de referência de Janeiro a Abril, Maio a Agosto e Setembro a Dezembro ou com início, respectivamente, na 1ª, 18.ª e 35.ª semana de cada ano”.


Nesse particular a sentença recorrida fundamentou tal resposta do seguinte modo: “Por outro lado, no período entre Maio e 15 de Setembro existem semanas em que as equipas/turnos realizam entre 40 a 48 horas de trabalho (somadas as horas), conforme foi identificado por DD e pelas testemunhas EE, FF e GG e foi também confirmado pelas testemunhas HH e II. Ocorre que, conforme se retira dos dois documentos de fls. 121, que ilustram uma apresentação vertical do HT do doc. 9 v.º da PI e foi confirmado por HH e II, nos períodos de referência previstos no AE quer em meses (Janeiro a Abril; Maio a Agosto e Setembro a Dezembro de cada ano) quer em semanas (com início da 1.ª, 18.ª e 35.ª semana do ano), a média de trabalho semanal é a ilustrada naqueles documentos de fls. 121, não ultrapassando as 40 horas semanais. Com efeito, conforme se retira desses documentos e dos depoimentos de HH e II, a média semanal de horas trabalhadas no ano é igual, sendo que nos 3 períodos de referência previstos no Acordo de Empresa (quer em meses, quer em semanas), conforme os documentos de fls. 121 que confirmaram, não é excedida a média de 40 horas semanais em cada período de referência (o que é distinto da mera soma de horas de trabalho por semana)”.


Pretende a autora/recorrente que esse ponto 34 passe a ter a seguinte redacção: “mantêm a média semanal por ano não superior a 37 horas, sendo essa média de 40 horas ultrapassada no período entre Maio e 15 de Setembro e não sendo ultrapassada a média semanal por ano de 40 horas nos períodos de referência de janeiro a Abril, e de 15 de setembro a dezembro”.


Para tanto, invocou, apenas, o teor do documento 9 (novo horário) e disse que do mesmo se retira que não é observada a média de 40 horas semanais, tendo o referido ponto sido incorretamente julgado (alínea X) das suas conclusões).


No entanto, nem com muito boa vontade se pode retirar do referido documento 9 junto com a petição inicial aquilo que a recorrente pretende. Sem qualquer enquadramento feito por outros documentos ou pelos restantes depoimentos, de tal documento nem se retira qual o efectivo horário: sem qualquer legenda, não se sabe a que correspondem as letras e siglas que do mesmo constam.


Assim, tal documento não é idóneo para afastar, por si só, a fundamentação a que se chegou no Tribunal a quo. Não sendo invocado qualquer outro meio de prova que imponha decisão diversa deve improceder a impugnação nesta parte.


b) Pretende a autora/recorrente (alíneas Z) a CC) das suas conclusões) que o ponto 36 dos factos provados seja considerado não provado.


A sentença recorrida deu como provado, nesse ponto 36 dos factos provados, que: “No período de Junho a Setembro, os trabalhadores fazem 48 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de mais 48 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de 32 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de mais 32 horas num período de 7 dias consecutivos”.


Fundamentou o Tribunal a quo, além do que já ficou consignado, nos seguintes termos: “Note-se que a leitura do horário de trabalho levada a cabo por JJ, bem como pelas testemunhas EE, FF e GG foi realizada por recurso a exemplos semanais (períodos de 7 dias) e semana a semana, sem considerar os períodos de referência previstos no Acordo de Empresa e sem ter em conta também dever ser desconsiderado o período de férias de cada equipa, conforme também previsto nesse AE”.


Invoca a ré/recorrente que o referido documento 9 concatenado com os depoimentos das testemunhas AA, BB e CC, demonstram o excesso das 40 horas em média por semana em Junho, Julho e Agosto do turno A; o turno B em Junho também excede, o turno C em Junho, o turno D em Agosto e o turno E em Junho e Julho (alínea Z) das suas conclusões).


No entanto, percorrendo as alegações da associação sindical recorrente não se vislumbra que a mesma tenha dado cumprimento, quanto à prova testemunhal produzida, ao ónus que decorre do artigo 640.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil ao não transcrever nem indicar as passagens da gravação contendo os depoimentos que, na sua visão, impunham decisão diversa.


Seguindo o decidido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 14/07/2021 (processo n.º 65/18.9T8EPS.G1.S1[2]) “o ónus de fundamentar a discordância quanto à decisão de facto proferida não é observado quando o apelante: (i) se insurge genericamente quanto à convicção formada pelo tribunal a quo; (ii) se limita a sinalizar que existe um meio de prova, v.g., testemunha, que diverge dos factos tidos como provados pelo tribunal a quo, pretendendo arrimar – sem mais – nesse meio de prova uma decisão de facto diversa da expressa pelo tribunal a quo”.


Não se podendo usar o depoimento das testemunhas para fundar a alteração pretendida, resta o referido documento invocado que, como se disse e só por si, não impõe decisão diversa daquela a que chegou o Tribunal a quo.


Improcede, também nesta parte, a impugnação da matéria de facto.


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III.A.2 Factos provados:

Considera-se, por isso, provado o seguinte:

1. O Sindicato XXI é uma associação sindical constituída pelos trabalhadores portuários que exercem a sua atividade profissional em empresa de estiva, nos terminais de carga contentorizada no Porto de Sines, representando os trabalhadores seus associados que exercem funções no terminal de contentores do Porto de Sines.

2. A ré PSA Sines tem por objeto o planeamento, conceção, construção, equipamento, gestão, exploração e desenvolvimento do Terminal de Contentores em Sines, no âmbito do contrato de concessão celebrado com o Estado Português, bem como a realização de todas as atividades com ela relacionadas.

3. A ré Laborsines é uma empresa de trabalho portuário cujo objeto é o desenvolvimento da atividade de cedência temporária de trabalhadores portuários a empresas de estiva e a quaisquer outras entidades que movimentem cargas na zona portuária do Porto de Sines, ou noutros portos do continente.

4. No âmbito da sua atividade, a ré PSA Sines é a empresa que gere e opera o Terminal de Contentores de Sines (Terminal XXI), desenvolvendo a atividade de movimentação de carga contentorizada (estiva) em regime de concessão, utilizando para o efeito mão de obra portuária.

5. Neste contexto, a ré PSA Sines recorre à cedência de mão de obra portuária por parte da ré Laborsines, empresa de trabalho portuário, licenciada para o efeito, cuja atividade consiste exclusivamente na cedência de trabalhadores qualificados para o exercício das diferentes tarefas portuárias de movimentação de cargas (operadores portuários).

6. A ré Laborsines é detida a 100% pela ré PSA Sines, sendo empresas que se encontram em relação de domínio.

7. No âmbito da atividade desenvolvida, a ré PSA Sines tem actualmente ao serviço no seu estabelecimento, Terminal de Contentores do Porto de Sines (Terminal XXI), cerca de 1210 trabalhadores, sendo 230 trabalhadores vinculados à ré PSA Sines e 980 trabalhadores cedidos pela ré Laborsines.

8. As relações laborais estabelecidas entre os associados da autora e as rés encontram-se reguladas, para além do mais, por um Acordo de Empresa (AE), celebrado entre PSA e Sindicato XXI, publicado no BTE n.º 18, de 15.05.2011.

9. O horário de trabalho no Terminal XXI, o qual é aplicado, para além do mais, ao sector das operações, compreende três turnos com cobertura de sábados, domingos e feriados, das 8h00 as 16h00, das 16h00 as 00h00 e das 00h00 as 8h00.

10. O horário de turnos com cobertura de sábados, domingos e feriados será normalmente organizado em turnos de 7 horas e trinta minutos de trabalho diário, com um intervalo de trinta minutos, não podendo haver mais de 5 horas de trabalho seguidas e em cada período de sete dias de calendário, um dia de descanso semanal obrigatório e um dia de descanso complementar, o qual deve ser concedido imediatamente antes ou depois do dia de descanso obrigatório, sempre que possível.

11. Podendo vigorar um regime de flexibilidade de modo a permitir um máximo de 10 horas diárias desde que em cada período de referência não seja excedido a média de 40 horas por semana, tendo os períodos de referência a duração de 4 meses, com início, em princípio, nos meses de Janeiro, Maio e Setembro ou alternativamente na 1ª, 18ª e 35ª semana de cada ano.

12. Na sequência da greve decretada a partir das 00h00 de 29.04.2017 até às 00h00 de 13.05.2017, com paralisação total das operações realizadas nas duas últimas horas de cada período de trabalho de cada turno e da greve decretada a partir das 00h00 de 29.04.2017 até às 00h00 de 29.04.2018, com paralisação total das operações realizadas em qualquer período de trabalho suplementar (antecipação, prolongamento e serviço extraordinário), em 11.05.2017 foi alcançado entre a PSA Sines, Laborsines e o Sindicato XXI, apenas com subscrição a final também da APS-Administração dos Portos de Sines e do Algarve, um Acordo sobre várias matérias, entre as quais sobre o novo horário de trabalho e a criação do 5.º turno e eliminação do horário de transição dos novos trabalhadores.

13. Resulta do referido Acordo intitulado “Acordo definitivo sobre o novo horário de trabalho e a criação do 5.º turno e eliminação do horário de transição dos novos trabalhadores”

«As partes acordam que a situação deverá ser analisada por um comité de trabalho formado por uma empresa especialista em consultoria de recursos humanos, representantes dos recursos humanos e operações da empresa, representantes sindicais e da comissão de trabalhadores, no sentido da PSA Sines apresentar até 16.06.2017[3], um horário de trabalho ou mais, que leve em conta os seguintes pressupostos, que consta da Cl nº 15/17, de 27-03.2017:

- Garantir ciclos M/T/N;

- Garantir o mesmo ciclo durante todo o ano;

- Intervalos maiores entre cada rotação (M/T/N);

- Maior intervalo a acontecer entre a rotação N/M;

- Pelo menos o mesmo número de folgas em fins de semana existentes no horário atual;

- Férias marcadas individualmente.

Se até à data de 01.08.2017 (até para efeitos da constituição do 5º turno), não se chegar a acordo, deverá entrar em vigor de forma transitória o horário já discutido para o Deptº de Engª (anexo 1) (…)

Sendo que caberá à empresa apresentar alternativas, que incluam os pressupostos da referida Cl nº 15/17, podendo este prazo ser alargado.

As datas acima mencionadas, apenas poderão ser alteradas por mútuo acordo.

(…)»

14. Na sequência do acordo, foi contratada pela ré PSA uma empresa de consultoria de Recursos Humanos para criar horários alternativos que tivessem em conta os pressupostos elencados no acordo.

15. Todas as propostas elaboradas foram rejeitadas pela autora, não tendo sido possível até 01.08.2017 encontrar uma solução por acordo.

16. Por isso, tal como previsto também no acordo para essa eventualidade, entrou em vigor de forma transitória o horário já discutido para o Departamento de Engenharia.

17. Este horário, denominado horário de 2017, vigorou desde 01.01.2018 até 07.02.2024.

18. Em 2023 foi proposto pelas rés proceder a um esclarecimento de modo a tornar mais clara a regulação do horário quanto ao dia de M/T dia de sobreposição tendo, tendo sido alcançado um novo acordo denominado acordo de M/T o qual não alterou a matriz de horário.

19. Do horário de 2017 e desse ajustamento para o dia de M/T em 2023 resultou que o horário em vigor entre 01.01.2018 e 07.02.2024 estava desenhado para 5 equipas, turno A, B, C, D e E, e contemplava a laboração contínua de 24 horas por dia, 7 dias por semana e 365 dias por ano, existindo 4 feriados obrigatórios (Ano Novo, Páscoa; Dia do Trabalhador e Natal).

20. Este horário assenta num ciclo de 35 dias (5 semanas) onde o trabalhador faz as manhãs (T2), tardes (T3) e noites (T1), por esta ordem.

21. Neste ciclo de 35 dias o trabalhador tem 12 dias de folga, trabalhando 23 dias.

22. Tem igualmente 2 fins de semanas de folga nesse ciclo, 3 dias de folga sempre após os dias de trabalhos nas noites (T1), as folgas são designadas por folga complementar (CD) ou folga obrigatória (MD).

23. No ciclo de 35 dias existem 2 dias designados de M/T em que ocorre sobreposição de equipas e o trabalhador está escalado para ou ir de manhã (T2) ou de tarde (T3), acontecendo esta situação apenas à segunda-feira ou sexta-feira.

24. Neste horário, a média semanal por ano era de 37 horas de trabalho.

25. Em Agosto de 2023 as rés encetaram negociação com a Direção do Sindicato XXI e com a Comissão de Trabalhadores visando introduzir uma alteração naquele horário.

26. A versão de horário a alterar foi submetida à votação dos trabalhadores no dia 29.12.2023, tendo sido recusada pela maioria dos trabalhadores, com o resultado da votação: votos não (453), votos sim (78), votos nulos (1), votos em branco (5).

27. Face a essa não aceitação, as rés trabalharam num novo horário de trabalho.

28. E convocaram uma reunião com a autora e a Comissão de Trabalhadores da ré PSA Sines, onde foi apresentada a proposta de horário e prestados esclarecimentos de que forma o mesmo iria introduzir melhorias na produtividade e disponibilidade de mão de obra nas operações do terminal e a essencialidade dessas melhorias e disponibilidade no contexto actual da empresa.

29. Após esta reunião, em 16.01.2024, as rés apresentaram à Direcção da autora e à Comissão de Trabalhadores uma comunicação acompanhada de um novo horário, informando da sua pretensão de implementar tal horário aos Operadores Portuários que exercem a sua actividade em regime de turnos rotativos, com efeitos a partir de 01.02.2024, aguardando o prazo de 3 dias a contar da recepção da missiva, que comunicassem o que tivessem por conveniente.

30. Em 16.01.2024 as rés efectuaram uma comunicação interna, com a ref.ª CI/MD 01/24, com o novo horário de trabalho a aplicar ao sector das operações, constando da comunicação a alteração aos pressupostos do horário em termos de horas médias no período de Verão (Maio a Setembro), bem como as diferenças existentes entre os dois horários, o actual e o que pretendem aplicar a partir de 01.02.2024.

31. Com data de 24.01.2024, a autora apresentou a sua resposta, opondo-se ao novo horário.

32. Por comunicação Interna com a referência CI/MD 02/24 de 31.01.2024, as rés comunicaram aos trabalhadores o novo horário de trabalho, a aplicar a partir de 08.02.2024.

33. O novo horário de trabalho, nos meses de Janeiro, Fevereiro, Março, Abril, Novembro e Dezembro corresponde à mesma matriz do horário de 2017, com a alteração dos dias de M/T serem considerados como dias de folga “CD”.

34. Mantém a média semanal por ano não superior a 37 horas de trabalho, sendo essa média de 40 horas no período entre Maio e 15 de Setembro e sendo assegurada a média semanal por ano de 40 horas nos períodos de referência de Janeiro a Abril, Maio a Agosto e Setembro a Dezembro ou com início, respectivamente, na 1ª, 18.ª e 35.ª semana de cada ano.

35. No período entre Maio e 15 de Setembro, existem semanas em que as equipas/turnos realizam 44 e 48 horas.

36. No período de Junho a Setembro, os trabalhadores fazem 48 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de mais 48 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de 32 horas, num período de 7 dias consecutivos, seguido de mais 32 horas num período de 7 dias consecutivos.

37. O horário que vigorou até 31.12.2017 tinha 13 fins de semana completos por ano, o horário de 2017 tinha 22 fins de semana completos por ano e o novo horário tem 17 fins de semana completos por ano.

38. Há equipas/turnos que com o novo horário não têm um único fim de semana completo (sábado e domingo) de folga num mês, que são:

a. - mês de Junho equipas B e C;

b. - mês de Julho equipas A e E;

c. - mês de Agosto equipas C e E;

d. - mês de Setembro equipas B e D.

39. O novo horário introduz alteração do período de gozo de férias com a introdução de janelas temporais (slots) obrigatórias de 15 dias no período de Verão (1 de Junho a 15 de Setembro).

40. Como tal, aumentou de 11/12 dias para 15 dias a obrigatoriedade de marcação de dias de férias, que era feita de acordo com regras tais como as especializações de cada trabalhador (skills), funções principais e secundarias desempenhadas.

41. A marcação definida pelas rés de 15 dias de férias implicará, como princípio, que todos os trabalhadores de cada uma das 5 equipas/Turnos (A, B, C, D e E), no seu período de tempo correspondente, estejam ausentes do terminal em gozo de férias.

42. Para este efeito, neste período, as restantes equipas que não se encontrem no período de gozo de ferias, terão de cumprir um ciclo de 4 manhãs (08:00-16:00), 1 dia de folga, 4 tardes (16:00-00:00), 1 dia de folga, 4 noites (00:00-08:00), 2 dias de folga e retorna ao início do ciclo.

43. Nos meses de Maio, segunda quinzena de Setembro e Outubro passou a existir uma pré-marcação pelas requeridas dos restantes 7 dias de férias.

44. Os trabalhadores podem alterar estes dias de férias, para qualquer um dos restantes dias do ano, para além do mais, e por regra, desde que o máximo de trabalhadores ausentes, seja de 2 trabalhadores por dia, no total de todos os trabalhadores de cada equipa, tendo cada uma cerca de 180/190 de trabalhadores.

45. A pré-marcação de 7 dias de férias pode sobrepor-se a dias que seriam de gozo de folga, mas quando um trabalhador tem a pretensão de realizar uma remarcação destes dias de férias poderá ser realizada troca e trabalhará em T2 (08:00-16:00).

46. Durante o período de consulta foram realizadas várias reuniões/sessões de esclarecimento onde estiveram presentes elementos das operações e dos recursos humanos da ré PSA Sines, tendo sido explicado à autora que a alteração do horário de trabalho se trata de uma medida indispensável à sobrevivência das rés e à manutenção dos postos de trabalho de centenas de trabalhadores, em particular, o seu cash-flow, com referência a Março de 2024, nos termos do quadro Documento 5 da oposição na providência cautelar.

47. Os movimentos de transhipment constituem 85% da atividade da PSA Sines, sendo os outros cerca de 15% inerentes à exportação e importação, denominada “carga local”.

48. Em 2023 as exportações diminuíram 31,2%, tendência que já se verificava desde 2020, mas agravada pelo impacto da suspensão de atividade da “Indorama” (que exportava cerca de 90% da sua atividade pelo porto de Sines) devido à perda de competitividade com os mercados dos EUA e América do Sul relativamente aos produtos concorrentes do Extremo Oriente.

49. E pelo aumento da concorrência de outros portos, nomeadamente Lisboa e Setúbal, que conseguiram atrair linhas regulares de diversas companhias de navegação com a movimentação de carga local, anteriormente movimentada no Terminal XXI, como é o caso da Navigator, que exportava através do porto de Sines e têm vindo a reduzir os seus volumes neste porto.

50. Embora as importações tenham aumentado em 2023, relativamente a 2022, continuam abaixo dos níveis registados em 2020 e 2021:
Moves20202021var.2022var.2023var.
Export135,715134,953-0.6%127,091-5.8%87,388-31.2%
Import68,52668,376-0.2%62,541-8.5%67,1927.4%
51. O volume de contentores movimentados nos anos de 2022 e 2023 foi de 1.6 M TEUS, abaixo da capacidade instalada de 2 M TEUS.

52. Desde há 4 anos os volumes de contentores movimentados estão abaixo da capacidade instalada.

53. Para tal contribui, para além da falta de capacidade do porto de Sines de potenciar a sua capacidade instalada, a existência de uma elevada concorrência de portos/terminais muito próximos de Sines e que facilmente permitem um desvio de movimentos, nomeadamente, Valência e Barcelona que têm vindo a assumir uma abordagem muito agressiva e competitiva.

54. Estes Terminais disponibilizam ao cliente custos de mão de obra mais baratos e melhores níveis de eficiência de escala, para além de terem acesso a carga local (exportação/importação) para compensar a perda de receitas.

55. Os principais clientes como a MSC ou a Maersk já desviam carga para Valência e Barcelona (no caso da MSC) ou outros portos/terminais no sul de Espanha, como Algeciras, e Norte de África, como Casablanca e Tânger (no caso da Maersk), opção que podem acentuar se o Terminal de Sines não se tornar mais atrativo, ao nível da sua capacidade de movimentação, tendo por base a sua mão de obra.

56. Os custos operacionais de pessoal, de 2022 para 2023 aumentaram cerca de 15%, por força da aplicação automática do Índice de Preço do Consumidor (IPC), 7,8%, para além dos aumentos inerentes ao acordo de progressão de carreiras.

57. De 2023 para 2024, o aumento decorrente da aplicação automática do IPC ascendeu a 4,3%.

58. As taxas de juro (bancárias) aumentaram cerca de 7-9%,

59. Os custos com a segurança cibernética, nomeadamente, ao nível de seguros, tiveram um acréscimo de cerca de 10-12%.

60. O custo da energia em 2022 comparativamente a 2021, teve um aumento de cerca de 300%.

61. As novas políticas europeias e consequentes obrigações no âmbito da ESG (ambiente, sustentabilidade e governação) agravaram os custos dos clientes em cerca de 20%, nomeadamente, o novo regime de taxas de carbono, o que leva a que os clientes procurem os portos onde não estão sujeitos a essas taxas.

62. Os custos de imobilizado, investimento da expansão e substituição aumentaram entre 30% de 2022 para 50% em 2023.

63. Os clientes, nomeadamente a MSC, não aceitam aumentos de tarifas na proporção do aumento de custos e procuram outros portos dentro e fora da EU que se mostram mais competitivos.

64. A situação económico financeira da ré PSA Sines, em particular, o seu cash‑flow, com referência a Março de 2024, contém a seguinte informação relativa às receitas vs custos anuais:

+ 13M de cash flow operacional;

- 21M de investimento;

- 31M fase 3;

- 24M Banca,

- 5M juros.

65. Em Março de 2024, a ré PSA Sines e por inerência a ré Laborsines, não tinha liquidez para fazer face às suas obrigações.

66. Em final de Dezembro de 2023 a ré PSA Sines solicitou um empréstimo de 55 milhões de euros, tendo apenas obtido um empréstimo de 44 milhões de euros.

67. O recurso aos acionistas para obter o empréstimo, constitui um agravamento da dívida que já ascende a cerca de 100 milhões de euros e decorre da circunstância de a ré PSA Sines não cumprir com os rácios de solvabilidade exigidos para obtenção de crédito bancário.

68. Das 10 gruas (em Fevereiro de 2024 ficaram prontas mais duas) que tinha instaladas no Terminal, a PSA Sines apenas conseguiu colocar em funcionamento 6/7 gruas, muito esporadicamente 8 com recurso a trabalho suplementar.

69. Para tal contribuía o horário de trabalho, o nível de absentismo, quer aos períodos normais de trabalho, agravado com a medida que possibilita aos trabalhadores faltar sem apresentar um documento médico justificativo de suporte, bastando uma declaração de honra, quer a recusa de prestação de trabalho suplementar e a escassez de mão de obra, em particular na zona de Sines, pois embora abertas candidaturas, não apareciam candidatos.

70. A percentagem de absentismo ronda os 7,1% por turno.

71. A percentagem de recusa de prestação de trabalho suplementar ascende a 45%.

72. Em 2023, apenas 351 trabalhadores dos 1126 das rés, adquiriram dias de majoração de férias, conforme previsto no Acordo de Empresa e desses 351, apenas 298 adquiriram o máximo de 3 dias, o que significa que apenas 298 trabalhadores não faltaram ou faltaram apenas 1 dia, justificadamente.

73. Com o anterior horário de trabalho, em vigor desde 01.01.2018 até 07.02.2024, verificava-se o seguinte: 199 operadores por equipa/turno; 995 operadores no total (distribuídos por 5 equipas); 23 trabalhadores de férias por turno; 20 ausências não planeadas por turno, em média; cerca de 160 trabalhadores disponíveis por turno, em média.

74. Para trabalharem 6 gruas são precisos cerca de 140 operadores e para trabalharem 7 gruas são precisos cerca de 160 operadores

75. Com este horário, em regra, apenas era possível operar 6/7 gruas.

76. Neste horário existiam 2 dias de sobreposição (M/T), em que havia uma equipa e meia disponível nas manhãs e uma equipa e meia disponível nas tardes, todas as segundas e sextas-feiras, no entanto, isso não se refletia no alinhamento dos navios, pois nesses dias havia mais mão de obra, mas não havia necessariamente mais navios, o que criava um excedente de mão de obra nesses turnos e falta da mesma nos restantes.

77. Uma das exigências dos clientes das rés, e em especial do principal cliente, a MSC (cerca de 95% dos volumes movimentados), para ter confiança e manter os que já estão ou trazer mais movimentos para o Terminal de Sines, é que seja garantido aumento do número de gruas a funcionar durante a escala dos navios.

78. Quanto mais gruas estiverem em funcionamento menores serão os tempos de espera dos navios decorrentes da falta de gruas em funcionamento e menor o risco de cancelamento de escalas, com deslocação para outro porto.

79. Existindo já atualmente uma capacidade instalada de 12 gruas, a segurança do cliente para trazer os movimentos para Sines exigia pelo menos 9 gruas em funcionamento.

80. As rés implementaram um conjunto de benefícios ou incentivos à prestação de trabalho suplementar e à assiduidade:

- em Junho de 2023 e para vigorar no período de Julho a Outubro foi comunicado aos colaboradores um incentivo à prestação de trabalho suplementar e um incentivo à assiduidade.

- em Agosto de 2023 foi comunicado incentivo, para vigorar de Agosto a Dezembro de 2023, tendo por base objetivos de produtividade e segurança.

81. Tais incentivos não surtiram o efeito útil pretendido pelas rés.

82. Neste contexto e perante a impossibilidade de chegar a um acordo com a autora para a alteração do horário de trabalho, as rés avançaram com uma alteração unilateral dos horários.

83. Com o novo horário, é possível garantir o funcionamento, por regra, de 7/8 gruas, já perto das 9 gruas, com 170 operadores disponíveis por turno, em média.

84. Para trabalhar com 8 gruas são necessários cerca de 180 operadores por turno, sendo muitas vezes suficiente para trabalhar normalmente 9 gruas quando não há serviço de comboio ou alocando pessoal do lashing/unlashing (quando não necessário).

85. Tal permite aumentar a receita decorrente do acréscimo de volumes de contentores movimentados sem aumentar os custos com pessoal.

86. As rés implementaram um incentivo para 2024 tendo por base os volumes no ano de 2024.

87. Os turnos são de 8 horas, existindo um intervalo de 30 minutos para pausa de descanso/refeição, para a denominada “bucha”, que é considerado tempo efetivo de trabalho.

88. No anterior horário também existiam situações ao longo do ano em que, num período de 7 dias consecutivos, os trabalhadores prestavam um total de 48 horas.

89. No novo horário, existem mais 3 fins de semana de 3 dias (em que há uma folga junto ao fim de semana) e mais 2 situações de 2 folgas em dias consecutivos.

90. No anterior horário, os trabalhadores eram obrigados a marcar 11/12 dias úteis no período de 1 de Maio (início das slots) a 31 de Maio e de 16 de Setembro a 31 de Outubro (fim das slots).

91. Em face do regime de prioridades então estabelecido, trabalhadores sem prioridade ou prioridade inferior apenas podiam marcar férias nas slots que os trabalhadores com prioridade ou prioridade superior não pretendiam.

92. O novo horário prevê a possibilidade de troca directa do período de 15 dias de férias entre trabalhadores da mesma skill.

93. A lógica do novo horário é garantir que as férias de uma equipa decorrem num período em que as restantes 4 equipas estão a fazer uma rotação que permita cobrir essa ausência.

94. Após o período de Inverno, a rotação começa gradualmente a mudar no início de Maio até ao final de Outubro, existindo neste período duas rotações distintas.

95. No período de Verão, todas as equipas têm folgas de 1 dia ao fim de semana.

96. O facto de 15 dias de férias estarem previamente agendados e não serem passíveis de alteração (exceto por troca direta com outro trabalhador da mesma skill), faz com que diariamente, o número de ausências seja reduzido de 43 para 22, o que se traduz em mais 1/2 gruas a trabalhar em cada turno.

97. A não vigência do novo horário significaria uma diferença de menos 356 a 404 contentores movimentados por dia, por grua, decorrente do funcionamento de 6/7 gruas por turno em vez das 8/9 gruas garantidas pelo novo horário.

98. O que representaria cerca de 10 686 a 12 129 contentores não movimentados por mês, por grua e cerca de 128 160 a 145 555 contentores não movimentados por ano, por grua.

99. O que implicaria uma não receita das rés nos seguintes valores:

i) Receita correspondente aos contentores movimentados por mês por uma grua = entre 971.880,00 € e 1.103.793,60 €;

ii) Receita correspondente aos contentores movimentados por ano por uma grua = entre 11.662.560,00 € e 13.245.505,00 €.

100. O que para 2 gruas, implicaria um não ganho de receita que ascenderá a cerca de 26 M de euros por ano.


*


III.A.3. Factos não provados:


Do elenco dos factos não provados continuará a constar que não se provou que:

A. A alteração do horário de trabalho acarreta inevitavelmente riscos de segurança dos trabalhadores pelo cansaço acumulado e consequentemente até da operação portuária.

B. Acarreta também menor produtividade.


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III.B. Fundamentação jurídica:


A. Em primeiro lugar, além da lei geral (Código do Trabalho e Decreto-Lei n.º 280/93, de 13 de Agosto, na redacção que foi dada pela Lei n.º 3/2013, de 14 de Janeiro), as relações entre os trabalhadores (cujos interesses são defendidos pela associação sindical autora) e as rés estão sujeitas ao Acordo de Empresa publicado no Boletim do Trabalho e Emprego n.º 18, de 15/05/2011[4].


Neste instrumento de regulamentação colectiva ficou assente, como princípio geral, que cabe à empresa, no exercício do seu poder directivo, determinar os horários de trabalho com respeito das normas legais imperativas em vigor (cf. cláusula 10.ª, n.º 1).


E, quanto ao acordo de 2017 (pontos 12 e 13 dos factos provados), já foi decidido por este Tribunal da Relação de Évora, no Acórdão de 12/09/2024 (processo n.º43/24.9T8SNS.E1[5]), que o mesmo não abrangia nenhum concreto horário de trabalho e que “a vinculação negocial a que se obrigaram as requeridas não implicou qualquer renúncia ao poder diretivo que detém o empregador e que lhe permite determinar e alterar o horário de trabalho dos trabalhadores ao seu serviço”.


Na verdade, desse acordo apenas resulta a obrigação de a “PSA Sines apresentar até 16.06.2017, um horário de trabalho” e que “Se até à data de 01.08.2017 (…) não se chegar a acordo, deverá entrar em vigor de forma transitória o horário já discutido para o Deptº de Engª” (sublinhado nosso).


Como não se chegou a acordo sobre um novo horário de trabalho, entrou em vigor o horário do departamento de engenharia que o acordo de 2017 previa, expressamente, que seria aplicado de forma transitória.


Como bem se refere na sentença recorrida, a entrada em vigor desse horário, ainda que tenha vigorado ao longo do tempo (desde 01/01/2018 até 07/02/2024), não teve a virtualidade de o consolidar em termos definitivos.


Mas, ainda que se entendesse que o decurso do tempo teria consolidado esse horário de trabalho, não estavam as rés impedidas de proceder à alteração do mesmo (por não se tratarem de horários individualmente acordados com cada trabalhador nem ter sido fixado por regulamentação colectiva), como decorre do regime geral dos artigos 212.º e 217.º do Código do Trabalho e cláusula 10.ª do Acordo de Empresa.


Na verdade, como se decidiu no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29/09/2016 (processo n.º 291/12.4TTLRA.C1.S2[6]): “Insere-se nos poderes de direção e organização do trabalho da entidade empregadora a faculdade de alterar unilateralmente e mesmo sem a anuência do trabalhador, o respetivo horário de trabalho, só o não podendo fazer se tiver sido expressamente acordado com o trabalhador, se tiver sido acordada a submissão da alteração a consentimento do trabalhador, se este tiver sido expressamente contratado para determinado tipo de horário ou se demonstre que foi só devido a certo horário que celebrou o contrato de trabalho, bem como nos casos em que o horário de trabalho seja fixado por regulamentação coletiva”.


Improcede, por isso, esta parte do recurso (alíneas A) a N) das suas conclusões).


B. Por outro lado, decorre dos factos apurados que na elaboração do novo horário de trabalho as rés deram cumprimento às condicionantes legais formais aplicáveis e decorrentes dos artigos 212.º e 217.º do Código do Trabalho (ver, também, o direito de informação e consulta previsto na Directiva 2002/14/CE do Parlamento Europeu e do Conselho de 11 de Março de 2002), além da cláusula 10.ª do Acordo de Empresa, não se vislumbrando qualquer violação de regras de boa fé (já que se tratou de alteração claramente motivada – ver, entre outros, os pontos 73 a 74 e 83 a 85 e 100 dos factos provados).


A alteração foi precedida de informação e consulta aos trabalhadores (pontos 28, 29 e 30 dos factos provados) e comunicada com a antecedência devida (ponto 32 dos factos provados). E foi, sobretudo, apresentada com uma justificação de natureza empresarial (racional e não caprichosa).


Resta saber se, na elaboração do novo horário, as rés deram cabal cumprimento ao comando do artigo 212.º, n.º 2, alíneas a) e b) do Código do Trabalho e, em caso negativo, quais as eventuais consequências.


C. Invoca a recorrente que a decisão das empresas rés, acolhida pela sentença recorrida, esvazia de protecção legal o direito ao descanso e ao repouso dos trabalhadores (alíneas O) a Q) das suas conclusões).


Diga-se que a própria Directiva 2003/88/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de Novembro de 2003, relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho, estabelece no seu 17.º, n.ºs 2 e 3, alínea c), ponto ii), que são permitidas derrogações (por via legislativa, regulamentar, administrativa ou por via de convenção colectivas ou acordos celebrados entre parceiros sociais) aos seus artigos 3.º, 4.º, 5.º, 8.º e 16.º (desde que seja concedida protecção adequada) no caso de pessoas que trabalhem em portos.


É o legislador europeu a considerar, por isso, que a actividade para a qual se estabeleceu o horário de trabalho em causa nos autos se caracteriza pela necessidade de assegurar a continuidade do serviço. Impõe-se, consequentemente, a necessidade de assegurar a realização do trabalho por turnos.


Em face das repercussões negativas do trabalho por turnos na saúde e na organização da vida familiar e social dos trabalhadores abrangidos por esse regime, o legislador adoptou medidas para o seu enquadramento e para a sua fiscalização como:

- a observância dos limites máximos dos períodos normais de trabalho fixados nos artigos 211.º, 230.º, n.º 1, 231.º e 232.º (cf. artigo 221.º, n.º 3);

- a necessidade de a mudança de turno ser precedida do dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar (artigo 221.º, n.º 4) com dia de descanso a cada período de 7 dias (nos casos de laboração contínua, artigo 221.º, n.º 5);

- a protecção adequada em matéria de saúde e de segurança (artigo 222.º); e

- a obrigação de o empregador efectuar um registo separado dos trabalhadores sujeitos ao regime de turnos (artigo 215.º, n.ºs 3 e 4 e 221.º, n.º 6, todos do Código do Trabalho).

Já antes da alteração do horário de trabalho vigorava o regime da organização de turnos e não se vislumbra que a nova organização concreta tenha passado a não se precaver o direito ao descanso dos trabalhadores abrangidos, pelo que improcedem essas conclusões da recorrente.


D. Invoca a recorrente que a alteração ao horário de trabalho viola a cláusula 10.ª, n.ºs 2 e 3 do Acordo de Empresa (alíneas R) a V) e DD) das conclusões).


Estabelece-se nos n.º 2 e 3 do referido acordo que:

2 – Poderá vigorar um regime de flexibilidade de modo a permitir um máximo de 10 horas de trabalho diário, desde que, em cada período de referência, não seja excedida a média de 40 horas por semana.

3 – Os períodos de referência no número anterior terão uma duração de quatro meses, com início, em princípio, nos meses de Janeiro, Maio e Setembro ou alternativamente na 1.ª, 18.ª e 35.ª semana de cada ano”.

O que resulta dos factos provados, porém, é que com o novo horário de trabalho, nos períodos de referência (sendo que os períodos de referência de 4 meses podem, em alternativa, ter início em Janeiro e fim em Abril, novo início em Maio e fim em Agosto, novo início em Setembro e fim em Dezembro; ou, então, ter início na 1.ª, 18.ª e 35.ª semana de cada ano), está assegurada a média semanal de 40 horas por semana (como resulta do ponto 34 dos factos provados), embora existam semanas em que as equipas realizam 44 e 48 horas (como resulta do ponto 35 dos factos provados). Atente-se, por outro lado ao ponto 87 dos factos provados.


Não se provou, por isso, como bem se decidiu na sentença recorrida, que com o novo horário se exceda o máximo das 10 horas de trabalho diário ou que, em cada período de referência, seja excedida a média de 40 horas por semana.


Improcedem, igualmente, estas conclusões da recorrente.


E. Por outro lado, ainda, invoca a recorrente que o novo horário retira 5 fins de semana completos relativamente ao horário anterior (alíneas EE) a KK) das suas conclusões).


Ora, como ensina Liberal Fernandes[7]: “A circunstância de certas empresas laborarem continuamente implica que os domingos estejam incluídos no respectivo regime de funcionamento normal; daí que a adopção do horário por turnos encerre de jure a possibilidade de derrogação do princípio da coincidência do descanso semanal com o domingo (art. 232º, n.º 2)”.


Não resulta do Acordo de Empresa (antes pelo contrário – basta ver a cláusula 10.ª, n.º 4, alínea c), dessa regulamentação colectiva) que os descansos tenham de coincidir com o fim-de-semana (pelo que a situação dos autos afasta-se, nesse particular, da que foi apreciada pelo Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 18/12/2019, processo n.º 1901/19.8T8VFX.L1-4[8]).


E, como bem se conclui na sentença recorrida, quando no acordo de 11/05/2027 (ponto 13 dos factos provados) se disse que as rés se comprometiam a apresentar um horário de trabalho que tenha como pressuposto “Pelo menos o mesmo número de folgas em fins de semana existentes no horário atual”, a referência a “horário atual” só se pode considerar como sendo feita ao horário que estava em vigor na data em que se celebrou esse acordo e não o discutido para o departamento de engenharia e que só viria a entrar em vigor posteriormente (e que, por isso, não era o actual, ou seja, o que vigorava na data do acordo).


Não faz, por isso, sentido a comparação entre o novo horário e o que vigorou antes dele, mas sim a comparação entre o novo e o que vigorava à data em que foi celebrado o referido acordo de 11/05/2017. E, por isso, como se decidiu na sentença recorrida: “Decorre do novo horário, comparativamente com aquele que vigorou até 31.12.2017 e que tinha 13 fins de semana completos por ano, que o HT que entrou em vigor em 08.02.2024, contempla mais quatro fins de semana completos por ano do que aquele”.


Não há violação de qualquer norma legal ou acordo colectivo celebrado.


Improcedem, por isso, estas conclusões apresentadas pela recorrente.


F. Finalmente, invoca a recorrente a violação do direito a marcar férias individualmente que decorreria do acordo celebrado (alíneas LL) a TT) das suas conclusões).


Dispõe o artigo 241.º do Código do Trabalho que, na falta de acordo, em pequena, média ou grande empresa, o empregador só pode marcar o período de férias entre 1 de Maio e 31 de Outubro, a menos que o instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou o parecer dos representantes dos trabalhadores admita época diferente.


Relativamente a férias, decorre da cláusula 23.º do Acordo de Empresa que “O planeamento do período de férias é da atribuição das entidades empregadoras, tendo em conta, se possível, as preferências manifestadas pelos trabalhadores, e garantindo sempre o regular funcionamento das entidades empregadoras”.


No acordo de 2017 as rés comprometeram-se, no entanto, a apresentar até 16/06/2017 um horário que tivesse como pressuposto a marcação de férias individual.


Todas as propostas elaboradas nessa sequência foram rejeitadas pela autora (ver ponto 15 dos factos provados), pelo que entrou em vigor outro horário onde não estava prevista a marcação de férias individual (ver ponto 16 dos factos provados). Ou seja, nunca chegou a existir uma marcação de férias individual, nem do referido acordo de 2017 se pode retirar que as partes tenham acordado em conceder esse direito aos trabalhadores (pelo contrário, essa forma de marcação de férias era um pressuposto para um horário que nunca chegou a entrar em vigor e não para todos os futuros horários).


De todo o modo, decorre das regras gerais, como ensina Pedro Romano Martinez[9], que se as partes estão a renegociar um contrato e há uma oposição inultrapassável, das circunstâncias concretas poderá deduzir-se que o mesmo foi denunciado.


O regime de marcação de férias fixado pelas rés e que decorreu da apresentação do novo horário de trabalho em apreciação não constitui, por isso e como se decidiu na sentença recorrida, qualquer violação da lei ou do Acordo de Empresa.


Improcede também esta parte do recurso e, por isso, improcede totalmente a pretensão da recorrente.


*


Custas:


Conforme estabelecido no artigo 527.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, a regra geral na condenação em custas é a de condenar a parte vencida. E havendo uma parte vencida não se passa ao critério subsidiário que é o da condenação em custas de quem tira proveito do recurso.


No caso, será de condenar a recorrente nas custas porque ficou vencida no recurso, sem prejuízo da isenção de que beneficia (artigo 4.º, n.º 1, alínea f), do Regulamento das Custas Processuais e 442.º, n.º 1, alínea a) e 443.º, n.º 1, alínea d), do Código do Trabalho).


***


III. DECISÃO:


Em face do exposto, decide-se julgar improcedente a apelação e, em conformidade, confirma-se a sentença recorrida.


Custas do recurso pela associação sindical recorrente, sem prejuízo da isenção de que beneficia.


Notifique-se.


Évora, 10 de Julho de 2025


Filipe Aveiro Marques


Mário Branco Coelho


Paula do Paço

_________________________________________

1. Acessível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/1007b672c0f9ed2980258ad6005cfad7.↩︎

2. Acessível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/19c3ddcb0fbc504980258714004da030.↩︎

3. Corrigindo-se o mero lapso de escrita quando ao ano que constava na sentença recorrida, colocando-o de acordo com a data constante do documento, não impugnado, que foi junto aos autos.↩︎

4. Celebrado entre a PSA Sines — Terminais de Contentores, S. A., e o Sindicato XXI — Associação Sindical dos Trabalhadores Administrativos, Técnicos e Operadores dos Terminais de Carga Contentorizada do Porto de Sines, acessível em https://bte.gep.msess.gov.pt/documentos/2011/18/15871595.pdf e a que a aderiu a ré LABORSINES — Empresa de Trabalho Portuário, Unipessoal, L.da., conforme acordo de adesão publicado no BTE, n.º 31, de 22/08/2011, acessível em https://bte.gep.msess.gov.pt/documentos/2011/31/34193420.pdf.↩︎

5. Proferido no procedimento cautelar apenso e publicado em https://www.dgsi.pt/jtre.nsf/134973db04f39bf2802579bf005f080b/7ed49794b7e994cd80258ba80030dc8a.↩︎

6. Acessível em https://www.dgsi.pt/jstj.nsf/954f0ce6ad9dd8b980256b5f003fa814/aa9cd5a5496553e68025803d0055605f.↩︎

7. Francisco Liberal Fernandes, O Trabalho e o Tempo: Comentário ao Código do Trabalho, Edição de Universidade do Porto Reitoria, 2018, Pág. 271.↩︎

8. Acessível em https://www.dgsi.pt/jtrl.nsf/33182fc732316039802565fa00497eec/b6c00749382aa8be802584e8003014bc.↩︎

9. Pedro Romano Martinez, Da Cessação do Contrato, Almedina, pág. 115.↩︎