Acórdão do Tribunal da Relação de Évora | |||
Processo: |
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Relator: | RICARDO MIRANDA PEIXOTO | ||
Descritores: | TESTEMUNHAS NOTIFICAÇÃO APRESENTAÇÃO DE NOVOS MEIOS DE PROVA | ||
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Data do Acordão: | 07/10/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
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Sumário: | I. A impossibilidade de notificação de testemunha arrolada consente à parte a sua substituição por outra testemunha ou o adiamento da sua inquirição por prazo indispensável, não excedente a 30 dias (cfr. alínea b) do n.º 3 do artigo 508.º do CPC). II. Depois dos vinte dias anteriores à realização do julgamento, só são admitidos, a impulso das partes, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior. III. A frustração da notificação de testemunha admitida não constitui ocorrência posterior justificativa da necessidade de produção de prova ao abrigo do n.º 3 do artigo 423.º do CPC, quando a parte tinha, no momento da propositura da acção, todos os elementos para ponderar a necessidade de produção daqueles meios de prova. (Sumário do Relator) | ||
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Decisão Texto Integral: | Apelação 692/22.0T8ABT-A.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Portalegre, Juízo de Competência Genérica de Ponte de Sor - Juiz 1 * SUMÁRIO (artigo 663.º, n.º 7, do CPC):*** (…) * Relator: Ricardo Miranda Peixoto; 1º Adjunto: Filipe César Osório; e 2ª Adjunto: Ana Pessoa. * I. RELATÓRIO*** * A.(…) propôs contra (…) a presente acção com processo comum, pedindo a condenação desta no pagamento da quantia global líquida de € 17.750,00, acrescida da quantia que “venha a ter de assumir face ao seu comportamento inadimplente” e daquela que for devida “pelas deslocações da autora em transportes públicos desde que chegou a Portugal”, acrescidas de juros de mora. Alegou, em síntese, que vendeu à Ré veículo automóvel entre Abril e Junho de 2010, pelo valor de € 1.000,00, entregando-lhe a viatura e a respectiva declaração de venda. A Ré apenas pagou à Autora € 250,00 do preço acordado e quando, em 2016, esta quis desalfandegar outro automóvel, constatou que estava impedida de o fazer em consequência de uma dívida à Autoridade Tributária, correspondente ao valor das portagens e imposto de selo que a Ré não liquidou, resultantes do uso e da titularidade do veículo vendido entre 2010 e 2016, no valor global de € 6.000,00. A Autora tem vindo a pagar a aludida dívida à AT, em prestações mensais de € 110,00 cada, e continua sem veículo automóvel pois não consegue desalfandegar o seu enquanto a dívida na Autoridade Tributária não estiver totalmente paga, o que lhe causa danos e transtornos. B. A Ré contestou, defendendo-se por excepção e por impugnação: Excepcionou: a sua ilegitimidade passiva por não ter celebrado o contrato de compra e venda com a Autora; e a prescrição do eventual direito de crédito da Autora. Impugnou a celebração do contrato e o uso da respectiva viatura, alegados pela Autora. C. A Autora exerceu o contraditório à matéria de excepção, pugnando pela sua improcedência. D. Realizada audiência prévia, foi proferido despacho-saneador que julgou improcedente a excepção dilatória de ilegitimidade da Ré, identificou o objecto do litígio e enunciou os temas da prova. E. Notificada a 12.08.2024 da frustração da notificação da testemunha (…) que havia arrolado, veio a Autora, no dia 10.09.2024, sob a referência Citius 49806559 / 2605878, entre o mais, requerer: “(…) com vista a fazer prova do que pretendia provar com a inquirição daquela (…), nos termos do disposto no artigo 432.º do CPC (…): a) A notificação da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões, com sede na Av. (…), 76, 1600-205 Lisboa, para, em prazo a determinar por V. Exa. vir aos autos informar se o veículo automóvel com a matricula (…), tem ou teve, desde 2010 seguro obrigatório e em caso afirmativo em que Seguradora ou Seguradoras, com datas e números de apólices; b) Após e caso a informação seja no sentido de o veículo ter ou ter tido seguro válido, requer a notificação da(s) seguradora(s) para, em prazo a fixar doutamente por V. Exa., e com referência ao número de apólice que vier a ser indicado, virem aos autos juntar a respectiva apólice. c) Desde já e caso venham a ser juntas aos autos apólices em nome de terceiros, requer a audição dos mesmos como testemunhas, para o que se requer a respectiva notificação. d) Requer a notificação da Autoridade Tributária, a notificar no Serviço de Finanças de Abrantes, sito na Rua Nossa Senhora da Conceição para, em prazo a determinar doutamente por V. Exa., vir aos autos juntar certidão da situação tributária da A., de onde conste a informação se a mesma foi ou é devedora de valores referentes a Imposto único de circulação referente ao veículo (…), desde que data, se e quando foi citada pessoalmente e se se encontra a pagar voluntariamente ou se permanecem valores em dívida, e quais os montantes. e) Requer, ainda, a notificação da Autoridade Tributária, a notificar no Serviço de Finanças de Abrantes, sito na Rua Nossa Senhora da Conceição, para em prazo a determinar doutamente por V. Exa., vir aos autos informar se contra a A. corre ou correram desde 2010 processos de contra ordenação por falta de pagamento do imposto único de circulação, referente ao veículo (…), e em caso afirmativo desde que data, se e quando foi a A. citada pessoalmente e se se encontra a pagar voluntariamente ou se permanecem valores em dívida , e quais os montantes. f) Requer ainda a notificação da Autoridade Tributária, a notificar no Serviço de Finanças de Abrantes, sito na Rua Nossa Senhora da Conceição, para em prazo a determinar doutamente por V. Exa., vir aos autos informar se contra a A. correm processos de execução por falta de pagamento de portagens, com referência ao veículo (…), e em caso afirmativo, quais, e em que data foram instaurados, se e quando foi citada pessoalmente e se se encontra a pagar voluntariamente ou se permanecem valores em dívida, e quais os montantes. (…)”. F. Com data de 24.09.2024 e referência Citius 33741110, foi proferido despacho contendo, entre outro, o seguinte teor: “ (…) Referência 2605878, segunda parte: Atento o disposto no artigo 552.º, n.º 2, do CPC, indefere-se o demais requerido, já que estão em causa meios de prova cuja produção deveria ter sido requerida na petição inicial ou, em alternativa, em sede de audiência prévia (cfr. artigo 598.º, n.º 1, do C.P.C.), o que não sucedeu. Notifique. (…)” G. Inconformada com a segunda parte do despacho aludido em F., a Autora interpôs recurso de apelação. Concluiu as suas alegações nos seguintes termos (transcrição parcial, sem negrito e sublinhado da origem): “(…) 1) Por notificação de 12/08/2024 foi a Recorrente notificada de que uma das testemunhas por si arroladas não havia sido notificada. 2) Não tendo mais elementos que ajudassem na identificação e não tendo o contacto da testemunha de molde a permitir a sua notificação, viu-se a Recorrente na contingência de ficar impedida de provar os factos por si alegados na P.I., pois que, ninguém para além da testemunha não notificada tinha/tem conhecimento dos factos e acesso a elementos essenciais à descoberta da verdade e prova dos factos alegados pela Recorrente. Sendo, ipso facto, essencial a sua inquirição. E, não tendo a Recorrente como contactar a testemunha, não dispondo de nenhum outro elemento identificativo desta para além dos trazidos aos autos, também a não podia substituir porquanto mais ninguém sabe o que sabe aquela testemunha. Razão pela qual foi a mesma indicada logo na P.I.. 3) Assim, viu-se a Recorrente a braços com a necessidade de procurar a prova por outras formas, nomeadamente mediante documentos, que estando na posse de terceiros e fora do acesso da Recorrente apenas o Tribunal poderia obter, sobretudo a tempo da audiência, agendada para 09/10/2024. 4) E, por requerimento de 10/09/2024, nos termos do disposto no artigo 432.º do CPC, para o qual remeteu, e com a expressa indicação de que o requerimento apresentado visava fazer a prova dos factos que pretendia conseguir com a inquirição da testemunha não notificada, requereu a notificação de vários terceiros na posse de documentos para virem aos autos juntá-los. 5) Sendo que, foi notificada do indeferimento de tais pedidos, a 2 dias da realização da audiência, em 7/10/2024. (…) 6) Com o devido respeito, o requerimento apresentado pela Recorrente tinha cabimento e merecia ser deferido nos termos do disposto no artigo 423.º do CPC e artigo 432.º do mesmo diploma legal. 7) Dispõe o artigo 423.º do CPC que os documentos podem ser apresentados após os limites temporais a que faz referência o douto despacho ora recorrido, (n.º 3 do citado preceito) “cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior”. O que é, sem margem para dúvidas, o caso dos autos. 8) A prova documental aqui requerida mais não é que aquela que se mostra necessária face à não notificação de determinada testemunha e por isso a sua junção aos autos apenas se mostrou necessária em virtude de ocorrência posterior, em concreto não notificação de testemunha que na sua posse tem tais elementos, notificada à Recorrente em 12/08/2024. 9) Sendo aplicável o disposto no artigo 432.º do CPC por se tratar de documento na posse de terceiro. Ora, mesmo que admitamos que a Recorrente os pudesse carrear para os autos, desde o despacho de indeferimento até à audiência teria apenas 2 dias, sendo que, é do conhecimento geral que dificilmente as instituições em causa emitem certidões nesse prazo. 10) Porque se tratou de prova documental cuja necessidade de obtenção decorre de facto posterior ao limite temporal regra para a junção de documentos aos autos, deveria ter sido deferido o requerido, nos termos do disposto nos artigos 423.º e 432.º do CPC, o que não tendo acontecido pôs em causa a possibilidade de a Recorrente fazer prova dos factos por si alegados na P.I. e pondo em causa o seu legítimo direito de acesso â justiça, de cariz constitucional. (…)”. H. A Recorrida não respondeu às alegações da Recorrente. I. Admitido o recurso, colheram-se os vistos dos Srs. Juízes Desembargadores Adjuntos. J. Questões a decidir O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações dos Recorrentes, sem prejuízo da sua ampliação a requerimento dos Recorridos (artigos 635.º, n.º 4, 636.º e 639.º, n.ºs 1 e 2, do CPC). Não é, assim, possível conhecer de questões nelas não contidas, salvo se forem do conhecimento oficioso (artigo 608.º, n.º 2, parte final, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, parte final, ambos do CPC). Também está vedado o conhecimento de questões novas (que não tenham sido objecto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de questões prévias judiciais, destinando-se, por natureza, à sua reapreciação e consequente confirmação, anulação, alteração e/ou revogação. É apenas uma, a questão, exclusivamente jurídico-processual, em apreciação no presente recurso: Se devia ter sido deferido o requerimento, junto pela Autora antes do início da audiência de julgamento, solicitando a notificação de entidades públicas e privadas para prestarem informações e juntarem documentos, bem como a inquirição como testemunhas de pessoas que viessem a ser identificadas em tais informações. * II. FUNDAMENTAÇÃO*** * A. De facto* O recurso é exclusivamente de direito e os elementos relevantes para a decisão constam do relatório antecedente.* B. De direito* Vem o presente recurso interposto de despacho que indeferiu o requerimento, apresentado pela Autora depois de designada data para realização da audiência de julgamento, solicitando a notificação entidades públicas e privadas para prestarem informações e juntarem documentos, bem como a inquirição como testemunhas de pessoas que viessem a ser identificadas em tais informações.Sintetizando as razões da discordância, apresentadas nas conclusões do recurso interposto, considera a Autora que: - os documentos podem ser apresentados após os limites temporais a que faz referência o douto despacho ora recorrido (cfr. n.º 3 do artigo 423.º do CPC) quando a sua apresentação não tenha sido possível até àquele momento ou se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior, situação esta que se verifica no caso dos autos, já que foi a frustração da notificação de uma testemunha que obrigou a Autora a procurar um meio de prova alternativo; - ao caso é também aplicável o disposto no artigo 432.º do CPC por se tratar de documentos na posse de terceiro para além de que, entre a notificação do despacho de indeferimento e a audiência mediaram apenas 2 dias, pelo que dificilmente conseguiria a Autora obtê-los nesse prazo; - o despacho recorrido pôs em causa a possibilidade de a Recorrente fazer prova dos factos por si alegados na P.I. e o seu legítimo direito constitucional de acesso à justiça. * Ponderemos, por isso, as razões apresentadas pela Recorrente, à luz das regras processuais vigentes e aplicáveis ao caso.É sabido que o processo civil tem como estruturante o princípio do dispositivo pelo qual “[à]s partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as exceções invocadas” (cfr. artigo 5.º, n.º 1, do CPC). Com José Lebre de Freitas (in “Código de Processo Civil Anotado”, Volume 1º, Coimbra Editora, 1999, pág. 465) o princípio dispositivo impõe que às partes caiba “…a formação a matéria de facto da causa, mediante a alegação nos articulados, dos factos principais, isto é, dos que integram a causa de pedir, fundando o pedido, e daqueles em que se baseiam as excepções peremptórias. Sem prejuízo de os factos da causa poderem ser alegados por qualquer das partes, cada uma tem o ónus da alegação daqueles que têm um efeito que lhe é favorável (…) cuja inobservância dá lugar, consoante o caso, à improcedência da acção ou à improcedência da excepção…”. O ónus de alegação, projecta-se, por seu turno, no ónus da prova dos factos constitutivos do direito arrogado por aquele que invocar o direito em juízo, assim como dos factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado por aquele contra quem a invocação é feita (cfr. artigo 342.º do Código Civil). A lei processual regula os momentos processuais próprios para as partes requerem a produção dos meios de prova dos factos que lhes compete demonstrar. No que respeita à prova testemunhal, o artigo 552.º, n.º 2, do CPC prevê que o autor deve apresentar o rol de testemunhas e requerer outros meios de prova no final da p.i. e, caso o réu conteste, pode alterá-lo na réplica ou no prazo de 10 dias a contar da notificação da contestação. As partes podem também: - alterar/aditar o rol já apresentado, na audiência prévia quando a esta haja lugar (cfr. artigo 598.º, n.º 1, do CPC) ou até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final, sendo a parte contrária notificada para usar, querendo, de igual faculdade, no prazo de cinco dias (cfr. artigo 598.º, n.º 2, do CPC); - substituir as testemunhas que estejam definitiva ou temporariamente impossibilitadas de depor, mudado de residência depois de oferecidas, não tiverem sido notificadas devendo tê-lo sido, no caso de outro impedimento legítimo ou, ainda, faltado ao julgamento sem motivo justificado e não forem encontradas para comparecer sob custódia (cfr. artigos 508.º, n.ºs 3 e 4 e 510.º, ambos do CPC). Relativamente à prova por informações / documentos pretendida pela Autora, o artigo 423.º do CPC prevê que os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da acção ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes (n.º 1), podendo ainda ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final (sujeitando-se a parte apresentante a condenação em multa, excepto se provar que os não pôde oferecer com o articulado) (n.º 2). Sem prejuízo da possibilidade de intervenção oficiosa do juiz, depois dos 20 dias anteriores à realização do julgamento, só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior (n.º 3). Sobre as situações excepcionadas pelo n.º 3, José Lebre de Freitas refere constituir exemplo de “…impossibilidade de apresentação o de o documento se encontrar em poder de terceiro, que só posteriormente o disponibiliza, de a certidão de documento arquivado em notário ou outra repartição pública, atempadamente requerida, só posteriormente ser emitida ou de a parte só posteriormente ter conhecimento da existência do documento. (…)” e de “…ocorrência posterior que torna necessário o documento, (…) uma causa de transmissão do direito litigioso, determinante da habilitação da parte (artigo 377.º), ou a própria sentença, que haja decidido com base em facto novo oficiosamente cognoscível (artigo 514.º) ou em solução de questão de direito não discutida, com desrespeito do princípio do contraditório (artigo 3.º, n.º 3) (in “Op. Cit.”, Volume 2º, Coimbra Editora, 2001, págs. 426 e 427). * Sustenta a Autora que a apresentação dos documentos em apreço se tornou necessária em virtude da frustração da notificação de uma testemunha, de que a Recorrente tomou conhecimento por notificação de 12.08.2024, o que a obrigou a procurar meios de prova alternativos.Vejamos se lhe assiste razão. Em jeito de nota prévia, a Autora não identifica quais os concretos factos que com os meios de prova requeridos a 10.09.2024 pretende demonstrar, limitando-se a referir-se genericamente aos factos alegados na p.i., o que torna mais espinhosa a compreensão da sua relevância pelo tribunal. Ainda assim, partindo de cada um dos elementos de prova identificados, podemos tecer as seguintes considerações: a), b) e c) Os pedidos das alíneas em apreço visam obter, através da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões e junto de companhias de seguros, as apólices dos contratos que, desde o ano de 2010, tiveram por objecto o veículo automóvel alegadamente vendido pela Autora à Ré e, bem assim, ouvir como testemunhas as pessoas que neles figurem como segurados. Não se alcança, nem a Autora justifica, como é que o testemunho de (…), não notificada, permitiria produzir prova que dispensasse a eventual relevância dos meios documental e testemunhal agora identificados. Para além da apontada falta de explicação, a confirmação da existência de contratos de seguro automóvel celebrados depois de 2010 sempre dependeria da junção das respectivas apólices, sendo insusceptível de ser suprida pela prova de um ou mais testemunhos. Era, por isso, exigível à Autora que, considerando a produção de tais meios de prova relevante ao apuramento de factos por si alegados, tivesse, no momento processual da propositura da acção, noção da necessidade de obter tais informações junto de entidades públicas e privadas e do interesse em ouvir como testemunhas as pessoas que celebraram esses contratos de seguro, incluindo-os nos requerimentos de produção prova previstos para as fases dos articulados ou da audiência prévia / despacho-saneador. d), e) e f) Estas alíneas do requerimento da Autora, dizem respeito a informações a prestar pela Autoridade Tributária, Serviço de Finanças de Abrantes, sobre a existência de dívidas da Autora resultantes do IUC do veículo (…) e de processos contra si – de contraordenação com esse fundamento e de execução por falta de pagamento da passagem em portagens do mesmo veículo –, respectivas datas, pagamentos realizados e remanescentes em dívida. Sendo clara a atinência destes meios de prova com os prejuízos reclamados pela Autora na presente acção, decorrentes do pagamento de obrigações inerentes à propriedade e à utilização da viatura pela Ré, desde 2010, resulta também evidente que a prova de tais factos se faz, sobretudo, através de documentos. Estejam eles na disponibilidade da Autora como as correspondentes notificações que tenha recebido na condição de sujeito passivo / devedora / arguida / executada fiscal, ou como os comprovativos dos pagamentos que tenha realizado junto da A.T., ou na disponibilidade de terceiras entidades como A.T., a poder justificar a intermediação do tribunal ao abrigo do disposto no artigo 432.º do CPC. Deste modo, ainda que a testemunha (…) tivesse conhecimento de algum dos factos referentes à cobrança, dirigida à Autora, de dívidas resultantes da circulação do veículo depois de 2010, bom é de ver que tal prova não permitiria dispensar os documentos comprovativos dos factos cuja junção sempre seria necessária. Donde sobressai que, à boleia da frustração da notificação de uma testemunha por si indicada, a Autora veio pretender produzir, tardiamente, vários meios de prova de factos que, não sendo propícios a uma demonstração, forte e concludente, pela via testemunhal, sabia, ou deveria saber, desde a propositura da presente acção, que seria mais adequado realizar pela via documental. * Concluímos, assim, que não é a ausência de notificação da testemunha (…) que justifica a eventual necessidade dos meios de prova solicitados pela Autora no requerimento de 10.09.20204, mas a circunstância da Recorrente não ter requerido a produção destes nos momentos processuais próprios, em que se encontravam já reunidas todas as condições para avaliar se eram, ou não, relevantes à demonstração dos factos que alegou como fundamento da sua pretensão.Acresce que a lei adjectiva prevê explicitamente a consequência da impossibilidade de notificação de testemunha arrolada, permitindo a sua substituição por outra testemunha ou o adiamento da sua inquirição por prazo indispensável, não excedente a 30 dias (cfr. alínea b) do n.º 3 do artigo 508.º do CPC). Não estando contemplada a possibilidade de substituir testemunhas por outros meios de prova, a parte deve realizar antecipadamente a ponderação da necessidade de produzir cada um dos meios previstos por lei, tendo presentes as regras processuais vigentes e a adequação de determinados meios probatórios à demonstração de certos factos controvertidos. Não faz, assim, sentido considerar que a frustração da notificação de uma testemunha constitui ocorrência justificativa da necessidade, nos termos e para os efeitos previstos pelo n.º 3 do artigo 423.º do CPC, da junção de documentos que, independentemente da produção de prova testemunhal, se antecipavam como relevantes à prova dos factos alegados. * Muito sumariamente, dir-se-á ainda que o despacho recorrido não viola a vertente probatória do direito de acesso dos cidadãos à justiça e à tutela efectiva dos tribunais para defesa dos seus direitos, constitucionalmente previsto no artigo 20.º da C.R.P., na medida em que as partes têm, no caso concreto, ao seu dispor o meio processual justo e equitativo para verem dirimido o direito a que se arrogam.À Autora, em igualdade de tratamento com a Ré, foi concedida a faculdade de indicar os seus meios de prova nos autos principais, o que fez. Vimos que só à Autora é imputável a omissão de indicação de outros meios probatórios nos momentos processuais próprios e que nenhuma ocorrência posterior criou a eventual necessidade de juntar documentos ou pedir informações em abono dos factos que alegou. Ora, o acesso a um processo justo e equitativo para o efectivo exercício dos direitos dos cidadãos, tem como finalidade a obtenção de uma “…decisão em prazo razoável…”, como decorre do n.º 4 do artigo 20.º da C.R.P.. Por isso, a lei processual não pode deixar de impor às partes prazos para o exercício das suas prerrogativas, entre as quais, pela sua importância, se destacam a alegação dos factos constitutivos da causa de pedir e da defesa e, bem assim, a indicação das provas a produzir em julgamento, sob pena da fase da instrução probatória se arrastar indefinidamente ao sabor da percepção que as partes tenham sobre a eficácia da prova entretanto apresentada ou produzida. Um processo sem prazos é potencialmente interminável, uma perversão do meio próprio para a afirmação do direito. * Consequentemente, nenhuma razão se encontra para proceder à revogação do despacho recorrido que incidiu sobre a arrogada possibilidade da Autora requerer a produção de meios de prova ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 423.º do CPC.* Questão distinta, não suscitada pelo despacho recorrido ou pelas alegações do presente recurso, é a faculdade de o juiz ordenar, oficiosamente, a produção dos meios de prova que entenda necessários ao seu esclarecimento na decisão dos factos que lhe seja permitido julgar, não sujeita aos prazos e aos pressupostos previstos para as partes indicarem os seus meios de prova.* Custas * Não havendo norma que preveja isenção (artigo 4.º, n.º 2, do RCP), o presente recurso está sujeito a custas (artigo 607.º, n.º 6, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, ambos do CPC).No critério definido pelos artigos 527.º, n.ºs 1 e 2 e 607.º, n.º 6, ambos do CPC, a responsabilidade pelo pagamento dos encargos e das custas de parte assenta no vencimento ou decaimento na causa ou, não havendo vencimento, no proveito. No caso vertente, a Autora foi vencida, pelo que deverá suportar as custas do recurso. * III. DECISÃO* Nestes termos, acordam os Juízes Desembargadores que compõem o coletivo da 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora, em:Julgar improcedente a presente apelação, confirmando o despacho recorrido. Condenar a Recorrente no pagamento das custas do presente recurso. Notifique. * Évora, 10 de Julho de 2025Ricardo Miranda Peixoto (Relator) Filipe César Osório (1º Adjunto) Ana Pessoa (2ª Adjunta) |