Acórdão do Tribunal da Relação de
Évora
Processo:
171/24.0GBVVC-A.E1
Relator: FÁTIMA BERNARDES
Descritores: PRIMEIRO INTERROGATÓRIO JUDICIAL
PROVAS QUE FUNDAMENTAM A DETENÇÃO
COMUNICAÇÃO
Data do Acordão: 09/30/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: N
Sumário: I - Estando em causa a apreciação de requerimento do Ministério Público para aplicação ao arguido, detido fora de flagrante delito, de uma medida de coação diversa do TIR, tendo sido já deduzida acusação pública e, por essa via, delimitado o objeto do processo, o dever de informação a prestar pelo juiz, ao arguido, no interrogatório a realizar para o efeito, nos termos previstos no artigo 141º, nºs 1 e 4, aplicável ex vi do artigo 144º, nº 1, ambos do C. P. Penal, com as devidas adaptações, mormente se o arguido estiver inteirado da acusação contra si deduzida, deverá contemplar, essencialmente, os concretos factos e elementos de prova que levam a sustentar a verificação de algum dos perigos previstos no artigo 204º, nº 1, do C. P. Penal, pressuposto de aplicação de qualquer medida de coação, à exceção do termo de identidade e residência.
II - Analisado o requerimento formulado pelo Ministério Público, dele resulta ter sido determinada a apresentação dos autos e do arguido ao Exº Juiz de Instrução, para 1º Interrogatório Judicial de Arguido Detido, a quem se requer a aplicação de medida de coação, para além do T.I.R. já prestado, com os fundamentos que constam do mandado de detenção.
III - Ora, do mandado de detenção, cujos fundamentos foram comunicados ao arguido (com a entrega de cópia do despacho que determinou a sua emissão), constam os factos e os meios de prova, pelo que o Exº Juiz de Instrução Criminal não tinha fundamento para indeferir o requerimento formulado pelo Ministério Público (para sujeição do arguido a interrogatório judicial).
IV - O requerimento formulado pelo Ministério Público, de apresentação do arguido, para realização de interrogatório judicial, com vista à aplicação de medida de coação, para além do TIR, remetendo para os fundamentos constantes dos mandados de detenção, e, por via do teor destes, para o despacho em que foi determinada a respetiva emissão, observou o disposto no nº 1 do artigo 141º do C. P. Penal.
Decisão Texto Integral:

Acordam, em conferência, na Secção Criminal (2.ª Subsecção) do Tribunal da Relação de Évora:

1. RELATÓRIO

1.1. Nos autos de inquérito n.º 171/24.0GBVVC, encerrado este, o Ministério Público deduziu, em 26/05/2025, acusação contra M, melhor identificado nos autos, imputando-lhe a prática, como autor material, de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152º, n.ºs 1, al. a), 4 e 5, do Código Penal.
1.2. Por despacho proferido em 06/06/2025, o Ministério Público determinou a emissão de mandados de detenção fora de flagrante delito, do arguido, ao abrigo do disposto nos artigos 254º, n.º 1, al. a), 257º, n.º 1, alíneas a), b) e c) e 258º do CPP e 30º, n.º 2, da Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro, com vista à sua apresentação ao Juiz de Instrução Criminal, para realização de interrogatório judicial e aplicação de medida(s) de coação, que permitissem acautelar o perigo de continuação da atividade criminosa e a necessidade de proteção da vítima de violência doméstica.
1.3. Cumpridos os mandados de detenção, pelo OPC, em 06/06/2025, o Ministério Público, proferiu despacho, determinando a apresentação dos autos e do arguido ao JIC para 1.º interrogatório judicial de arguido detido, requerendo a aplicação de medida de coação, para além do TIR, já prestado.
1.4. O Sr. Juiz de Instrução Criminal, proferiu despacho em 06/06/2025, decidindo indeferir a realização do interrogatório do arguido, por falta de indicação de meios de prova, no requerimento do Ministério Público, em violação do disposto no artigo 141º, n.º 1, do CPP e consequente impossibilidade de aplicar medida de coação nos termos requeridos, ordenando a libertação do arguido.
1.5. Inconformado com o assim decidido, o Ministério Público interpôs recurso para este Tribunal da Relação, apresentando a respetiva motivação, da qual extraiu as seguintes conclusões:
«1. O Ministério Público, inconformado com o despacho proferido pelo Mm.º Juiz de Instrução Criminal, no dia 06/06/2025, em que recusou a realização de 1ª interrogatório judicial de arguido detido, nos termos do artigo 141.º do Código de Processo Penal, in essentia, porque no despacho de apresentação, não se encontravam expressamente elencados os meios de prova recolhidos pelo Ministério Público.
2. O Mmº Juiz de Instrução justificou a sua posição, referindo, em síntese, que:
- O requerimento de apresentação omitiu os elementos de prova ou qualquer indicação destes;
- Não se respeitou o disposto no artigo 144.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, aplicável por via da remissão do artigo 144 (terá existido lapso de escrita, referindo-se certamente o Mm.º Juiz ao artigo 141.º, n.º 1 do Código de Processo Penal);
3. Respeitosamente, não assiste razão ao Mm.º Juiz de Instrução Criminal.
4. O Mm.º Juiz fez uma interpretação errada do requerimento, bem como do disposto no artigo 141.º, n.º 1 do Código de Processo Penal.
5. O Mm.º Juiz de Instrução equivocou-se na interpretação que fez do despacho de apresentação, já que o mesmo, ainda que não contivesse literal e expressamente indicados os meios de prova, remetia expressamente para os mandados de detenção fora de flagrante delito emitidos (onde constavam esses meios de prova) e por sua vez, com remissão para a acusação, entretanto já deduzida.
6. Não podia nem devia o Mm.º Juiz de Instrução analisar o despacho de apresentação de forma estanque e desconectada do restante Processo, como fez.
7. Os direitos de defesa do arguido não foram violados ou postos em causa, tendo em conta que o mesmo foi confrontado com esses meios de prova, ao ser notificado dos mandados de detenção.
8. Por seu turno, a interpretação feita pelo Mm.º Juiz de Instrução do artigo 141.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, vertida no despacho recorrido, é, salvo o devido respeito, desajustada e incompleta.
9. Deve naturalmente o arguido ser confrontado, o mais depressa possível, com os factos que lhe são imputados, bem assim com os meios de prova que sustentam tal imputação.
10. E à luz do disposto no artigo 141.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, constitui interpretação adequada e ajuizada que tais elementos devem constar do despacho de apresentação.
11. Repete-se, pela derradeira vez, que no nosso entendimento, ainda que de forma não exemplar, esses elementos estavam presentes, por via de remissão, que exigia uma análise e confrontação em bloco, o que o Mm.º Juiz de Instrução não fez.
12. Porém, a verdade é que, decorre igualmente do artigo 141.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, o dever do Tribunal e do Mm.º Juiz de Instrução, o fornecimento ao arguido desses elementos.
13. Elementos esses que se encontravam integral e totalmente à disposição do Mm.º Juiz de Instrução Criminal, que poderia e deveria perfeitamente tê-los enunciado e apresentado ao arguido.
14. Segundo Paulo Pinto de Albuquerque, no seu Comentário do Código de Processo Penal – (2) ALBUQUERQUE, PAULO PINTO, COMENTÁRIO…4ª edição atualizada, Universidade Católica Editora, abril de 2011, pp. 404 e ss. – a estrutura do interrogatório judicial obedece a uma sequência de momentos, onde se destaca o momento em que se informa o arguido dos elementos do processo que indiciam os factos imputados, sempre que a sua comunicação não puser em causa a investigação, a descoberta da verdade ou os direitos dos participantes processuais ou das vítimas do crime.
15. Na verdade, foi o Mm.º Juiz de Instrução quem violou o disposto no artigo 141.º, n.º 1 do Código de Processo Penal.
16. A leitura atenta da apresentação do arguido, impunha a remissão para o mandado de detenção, que por sua vez impunha a remissão para a acusação.
17. Todos os elementos necessários, a uma efetivação da defesa do arguido, estavam perante o Mm.º Juiz, e, portanto, perante o arguido, pelo que se impunha a enunciação desses elementos ao arguido, o que não foi feito.
18. Pelo exposto, o Mm.º Juiz de Instrução, ao decidir do modo em que decidiu, no despacho aqui posto em crise, violou o disposto no artigo 141.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, já que decorre dessa norma, o dever ao Juiz de Instrução de elencar, entre outros factos pertinentes para a defesa, os meios de prova.
19. Interpretou mal o Mm.º Juiz de Instrução o despacho de apresentação do Ministério Público e demais elementos, que leitura atenta permitiria concluir pela presença de todos os elementos necessários, para garantia da defesa do arguido, processo justo e equitativo.
20. De acordo com o disposto no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, datado de 16/12/2021, relator Doutor Nuno Garcia, disponível em www.dgsi.pt, “O artigo 141.º, n.º 4, alínea e), permite que o arguido detido sujeito a primeiro interrogatório judicial não seja informado de determinados elementos de prova indiciadores dos factos imputados se a comunicação dos mesmos puser em causa a investigação ou dificultar a descoberta da verdade [ou se criar perigo para a vida, a integridade física ou psíquica ou a liberdade dos participantes processuais ou das vítimas do crime].O artigo 194.º, n.º 6, alínea b), permite que na fundamentação do despacho que aplicar medida de coacção ou de garantia patrimonial não sejam enunciados os mesmos elementos de prova se a sua comunicação puser gravemente em causa a investigação ou impossibilitar a descoberta da verdade [ou criar perigo para a vida, a integridade física ou psíquica ou a liberdade dos participantes processuais ou das vítimas do crime. Esta diversidade de regimes, se levada à letra, envolve uma evidente restrição dos direitos de defesa, que não é tolerável. Na verdade, ao arguido podem vir a ser sonegados, no interrogatório, elementos de prova, com fundamento em que a sua comunicação poria (simplesmente) em causa a investigação ou dificultaria (sem impossibilitar) a descoberta da verdade; mas esses elementos já lhe serão comunicados, com o despacho de aplicação da medida de coacção, se não puserem gravemente em causa a investigação ou não impossibilitarem a descoberta da verdade. No entanto, relativamente a tais elementos de prova, que o arguido não conhecia, não pôde obviamente defender-se. Deverá, pois, adoptar-se um critério único de informação ao arguido, que não pode deixar de ser o do n.º 6, b) deste artigo [194.º], único que permite a defesa eficaz do arguido». À luz deste entendimento, que temos por correcto, o juiz de instrução, no primeiro interrogatório judicial, deve dar conhecimento e permitir que o arguido aceda a todos os elementos de prova que indiciam os factos imputados, só não devendo fazê-lo se o conhecimento de tais elementos por parte daquele puser gravemente em causa a investigação ou impossibilitar a descoberta da verdade [ou criar perigo para a vida, integridade física ou psíquica ou a liberdade dos participantes processuais ou vítimas do crime]”.
21. O Juiz de Instrução tem o poder-dever, salvo motivos invocados pelo Ministério Público (como por exemplo, quando o Processo se encontre sob segredo de justiça) de apresentar e enunciar ao arguido os factos que lhe são imputados, bem como os meios de prova que sustentam tal imputação.
22. De acordo com o disposto no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 27/09/2023, relatora Doutora Cristina Almeida e Sousa, disponível em www.dgsi.pt, “Os elementos relevantes para o exercício do contraditório, neste contexto, são aqueles que se mostrarem evidenciados no requerimento apresentado pelo Ministério Público e nos deveres de informação do JIC, tal como regulados nos arts. 141º e 194º do CPP, de cujo elenco também fazem parte as menções acerca da matéria probatória recolhida, até ao momento da audição do arguido.”
23. Ainda que se entendesse que o despacho de apresentação, sem a menção (literal e expressa) dos meios de prova, pudesse contender com as garantias de defesa do arguido, e violar o disposto no artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa, não é de abandonar a administração da justiça, nem o dever que incumbe (também) ao Juiz de Instrução de confrontar o arguido com os factos e meios de prova que os sustentam.
24. Pelo que, terá o Mm.º Juiz de Instrução violado o disposto no artigo 7.º do Código de Processo Civil, ex vi artigo 4.º do Código de Processo Penal, Princípio da Cooperação.
25. Caso o Mm.º Juiz de Instrução entendesse que não poderia apresentar os factos e meios de prova ao arguido (que no nosso entendimento, seria já um erro), poderia e deveria ter oferecido ao Ministério Público a oportunidade de aditar os elementos de prova, que já constavam do processo, não estavam sob segredo de justiça, nem se pretendia obstar ao arguido o acesso a esses elementos.
26. Numa palavra, o Mm.º Juiz de Instrução interpretou erroneamente o artigo 141.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, no sentido de, não constando literal e expressamente do despacho de apresentação, terão sido violados os direitos de defesa do arguido, na modalidade de conhecimento (ser confrontado) com os factos que lhe são imputados e os meios de prova que sustentam tal imputação.
27. Tal interpretação assenta, no nosso entendimento, num equívoco.
28. Ainda assim, entendendo que tais elementos deveriam constar do despacho de apresentação, deveria o Mm.º Juiz de Instrução ter interpretado a norma constante do artigo 141.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, no sentido de sobre ele fazer recair o dever de informar o arguido dos elementos relevantes que constavam do processo.
29. Se nada mais valesse, deveria ainda o Mm.º Juiz de Instrução ter interpretado a norma, em conjunção com o disposto no artigo 7.º do Código de Processo Civil, por via do artigo 4.º do Código de Processo Penal, no sentido de permitir ao Ministério Público a oportunidade de aditar e complementar tal despacho, antes da realização do interrogatório judicial de arguido detido, e dando oportunidade ao arguido de conhecer os factos e meios de prova, que sustentam os factos imputados.
30. Pelo exposto, deverão V. Excelências conferir provimento ao Recurso ora interposto e determinar a realização de 1º interrogatório judicial de arguido detido, nos termos e em respeito do disposto nos artigos 141.º, n.º 1 do Código de Processo Penal e 7.º do Código de Processo Civil, por via do artigo 4.º do Código de Processo Penal.
Com o que farão JUSTIÇA.»

1.6. O arguido respondeu ao recurso, pugnando pela sua improcedência, formulando as seguintes conclusões:
«1 - A situação pessoal do arguido, no plano de lei de processo penal não se enquadra nem justifica a sua detenção nos termos e para efeitos do Artº 257º nº 1 alíneas a), b) e c) do C. Proc. Penal.
2 - Em termos definitivos e finais face ao depoimento já solicitado pelo recorrido, em sede de instrução, o presente recurso também se revela completamente inútil, já que por sua livre e espontânea iniciativa solicitou ao Meritíssimo Juiz de Instrução, nestes autos, dia e hora para prestar o seu depoimento, o mesmo que é dizer ser sujeito ao interrogatório desejado pelo Ilustre Recorrente;
Termos em que deve ser julgado completamente improcedente, até por desproporcionado o presente recurso, sem esquecer a sua manifesta inutilidade face à requerida abertura de instrução com o subsequente legal depoimento e interrogatório do arguido, ora recorrido.
Assim se fazendo JUSTIÇA»

1.7. O recurso foi regularmente admitido, tendo o Mm.º JIC a quo sustentado o despacho recorrido (artigo 414º, n.º 4, do CPP).
1.8. Subidos os autos a este Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta apôs visto.
1.6. Efetuado o exame preliminar e colhidos os vistos legais, realizou-se a conferência.
Cumpre agora apreciar e decidir:


2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1. Delimitação do objeto do recurso
É consabido que as conclusões formuladas pelo recorrente extraídas da motivação do recurso balizam ou delimitam o objeto deste último (cf. artigo 412º do CPP), sem prejuízo da apreciação das questões de natureza oficiosa.
Assim, no caso em análise, considerando os fundamentos do recurso, a questão suscitada é a de saber se, no despacho recorrido, foi feita uma errada interpretação do artigo 141º, n.º 1, do CPP, ao indeferir-se a realização de interrogatório judicial do arguido detido, para aplicação de medida de coação para além do termo de identidade e residência, requerida pelo MP, por não constar desse requerimento a indicação dos meios de prova.


2.2. O despacho recorrido é do seguinte teor:
«Por despacho referência 35316017 vem requerida a apresentação de arguido detido para aplicação de medida de coacção para além do termo de identidade e residência a quem imputa a prática de um crime de violência doméstica previsto no art.º 152.º, n.º1, al. a), n.º 4 e 5, do Código Penal.
Determina o art.º 141.º, n.º1, do Cód. Processo Penal, “O arguido detido que não deva ser de imediato julgado é interrogado pelo juiz de instrução, no prazo máximo de quarenta e oito horas após a detenção, logo que lhe for presente com a indicação circunstanciada dos motivos da detenção e das provas que a fundamentam.”.
De acordo com o art.º 144.º, n.º1, do Cód. Processo Penal, “Os subsequentes interrogatórios de arguido preso e os interrogatórios de arguido em liberdade são feitos no inquérito pelo Ministério Público e na instrução e em julgamento pelo respectivo juiz, obedecendo, em tudo quanto for aplicável, às disposições deste capítulo.”.
O requerimento de apresentação para além da imputação criminal é composto por 55 artigos referentes à descrição factual.
O requerimento de apresentação omitiu os elementos de prova ou qualquer indicação destes.
Não se respeitou o disposto no art.º 144.º, n.º1, do Cód. Processo Penal, aplicável por via da remissão do art.º 144.º do sobredito diploma.
No Acórdão do Tribunal Constitucional 416/2003 de 24/09/2003, e face às disposições paralelas do artigo 5º, nºs 2 e 4, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem - que, respectivamente, referem que "qualquer pessoa presa deve ser informada, no mais breve prazo e em língua que compreenda, das razões da sua prisão e de qualquer acusação formulada contra ela", e que "qualquer pessoa privada da sua liberdade por prisão ou detenção tem direito a recorrer a um tribunal, a fim de que este se pronuncie, em curto prazo de tempo, sobre a legalidade da sua detenção e ordene a sua libertação, se a detenção for ilegal”.
"O direito de saber porque se foi detido é indubitavelmente um dos direitos primordiais do indivíduo”, pois “saber que não se pode ser detido sem conhecer as respectivas razões é a primeira condição da segurança pessoal, é o teste de que se vive numa sociedade democrática e num verdadeiro Estado de Direito";
Acresce que, “conhecer os motivos da detenção é também a condição sine qua non de uma verdadeira «igualdade de armas»: para se poder defender, para se poder prevalecer das garantias de um processo equitativo, é preciso primeiro saber as razões pelas quais se foi detido”, sob pena de “não apenas ser negado o princípio da presunção de inocência mas também a faculdade de a pessoa detida contestar o bem fundado das suspeitas que pesam sobre ela e de recorrer para um tribunal superior a fim de ser apreciada a legalidade da sua detenção" (cfr. Régis de Gouttes em Louis Edmond Pettiti e outros, La Convention Européenne des Droits de l'Homme - Commentaire article par article, ed. Economica, Paris, 1995, págs. 203-210).
Nos acórdãos de 13 de Fevereiro de 2001, nos casos Lietzow v. Alemanha, Garcia Alva v. Alemanha, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem catalogou os critérios gerais que perfilha nesta matéria referindo que: "O Tribunal recorda que as pessoas detidas ou presas têm direito a que seja examinado o respeito das exigências processuais e de fundo necessárias à legalidade, no sentido da Convenção, da sua privação de liberdade. Consequentemente, o tribunal competente deve verificar quer o respeito das regras processuais da [legislação interna] e do carácter razoável das suspeitas que motivam a detenção, quer a legitimidade do objectivo perseguido por esta e em seguida pela prisão. Tal pressuposto decorre do direito a um processo contraditório garantido pelo artigo 6º da Convenção, que, no processo penal, implica, para a acusação como para a defesa, a faculdade de tomar conhecimento das considerações ou elementos de prova produzidos pela outra parte, bem como a de os discutir.”.
Segundo Germano Marques da Silva (Curso de Processo Penal, III vol., 2ª edição, Editorial Verbo, 2000, pág. 101), "relativamente aos actos jurisdicionais atinentes à aplicação de medidas de coacção e de garantia patrimonial importa que sejam públicos e que o arguido tenha efectivamente meios de se defender, o que passa pelo conhecimento das provas contra ele carreadas e que na perspectiva da acusação justificam a aplicação de medidas de segurança”. É que, como se lê no II volume da mesma obra (1993, pág. 223), "uma medida de coacção representa sempre a restrição da liberdade do arguido e por isso só na impossibilidade ou em circunstâncias verdadeiramente excepcionais deve ser aplicada sem que antes se tenha dado a possibilidade ao arguido de se defender, elidindo ou enfraquecendo a prova dos pressupostos que a podem legitimar”.
Em face da omissão identificada, não deu o Ministério Público cumprimento ao art.º 141.º e 144.º do Cód. Processo Penal, vedando ao tribunal apreciar o carácter sustentado, ou não, das razões que motivam a detenção e eventual aplicação de medida de coacção. Desconhece-se por completo os elementos que o Ministério Público entende dever comunicar ao arguido e se os mesmos asseguram uma defesa eficaz. A falta de indicação de prova naufraga qualquer pretensão, porquanto, e no que respeita ao dever de fundamentação dos despachos de aplicação de medida de coacção, qualquer decisão que não assente em “elementos do processo que indiciam os factos imputados”, padece de nulidade, conforme ao art.º 194.º, n.º4, do Cód. Processo Penal.
Nos termos expostos, ao abrigo das disposições legais e arestos citados, decide-se, por se encontrar violado o art.º 141.º, n.º1, do Cód. Processo Penal, indeferir a realização do interrogatório do arguido.
Consequentemente, sendo impossível aplicar medida de coacção por falta de meios de prova indicados pelo Ministério Público, determino que se proceda à libertação imediata do arguido, nos termos do art.º 261.º, n.º1, do Cód. Processo Penal.
Notifique.»


2.3. O requerimento do Ministério Público sobre o qual recaiu o despacho recorrido é do seguinte teor:
«(…).
O arguido foi validamente detido nos termos das disposições conjugadas dos artigos 254.º, n.º 1, al. a), 257.º, n.º 1, als. a), b) e c), todos do CPP e 30.º, n.º 2 da Lei n.º 112/2009 de 16 de setembro.
Diligencie junto do SINOA pela indicação de defensor oficioso ao arguido.

**
Apresente os autos e o arguido M (melhor identificado no auto de detenção) ao M.mo Juiz de Instrução para 1.º Interrogatório Judicial de Arguido Detido a quem se requer a aplicação medida de coacção, para além do T.I.R. já prestado, com os fundamentos que constam do mandado de detenção:
No âmbito dos presentes autos, foi deduzida acusação contra o arguido M no dia 26 de maio de 2025, pela prática de crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea a) e n.º 4 e 5 do Código Penal, contra a sua ex-companheira, L, factos praticados desde 29 de outubro de 2024 e que perduraram até 09 de maio de 2025.
O despacho de acusação foi, entretanto, notificado ao arguido.
Contudo, no entendimento do Ministério Público surgiram indícios fortes da ocorrência de factualidade delituosa similar, posteriores à dedução da acusação, que impõem revisão e agravamento do estatuto coativo do arguido.
Com efeito, o arguido encontra-se fortemente indiciado da prática dos seguintes factos, que configuram crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea a) e n.º 4 e 5 do Código Penal.

(……………………………..).
***
Cumpre referir que no nosso entendimento, o Tribunal competente para julgamento dos factos será o Tribunal Judicial da Comarca de Elvas. Com efeito, apesar dos primeiros factos terem sido praticados em Vila Viçosa, o arguido persistiu na conduta, posteriormente, em Elvas, quando a vítima aí se encontrava.
No entanto, por se encontrar o Inquérito terminado, foi deduzida acusação, e será oportunamente excecionada a incompetência territorial, aquando da remessa dos autos à distribuição.
Nos termos do artigo 33.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, será o Tribunal Central de Instrução Criminal da Comarca de Évora competente para os efeitos do presente despacho e pedido, aplicação de medida de coação mais gravosa do que o TIR ao arguido.
*
As condutas do arguido acima descritas são graves e evidenciam a violência psicológica a que a vítima tem sido sujeita.
Resulta dos elementos de prova juntos aos autos, um real, efectivo e iminente perigo de que o arguido dê continuidade à sua actividade criminosa, bem como o risco de que resultem das suas condutas consequências mais graves, impondo-se a aplicação ao mesmo de medidas coactivas que o impeçam e que protejam a vítima, não se mostrando o termo de identidade e residência suficiente e adequado para o efeito.
O arguido não se resigna com o término do relacionamento, e não desiste de incomodar, acossar e perseguir a vítima, num claro crescendo de gravidade e intensidade de condutas, fazendo-a sentir-se insegura, controlada, limitada na sua liberdade de movimentos, e com receio de que o arguido possa atentar contra si, contra a sua integridade física ou vida.
O arguido não cessa de importunar a vítima, dirigindo-se à sua residência e aí permanecendo vários minutos, tentando contactar a vítima pedindo-lhe que fale consigo, com pretextos enganosos e recorrendo ao seu filho menor para alcançar os seus intentos (descritos supra).
Dos factos pelos quais o arguido se encontra forte e suficientemente indiciado, resulta um claro perigo de continuação da atividade criminosa, que não se basta com mera sujeição a TIR nos termos do artigo 204.º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Penal.
Por outro lado, nos termos do artigo 30.º, n.º 2 da Lei n.º 112/2009, de 16 de setembro, a detenção fora de flagrante delito pelo crime previsto no número anterior pode ser efetuada por mandado do juiz ou do Ministério Público, se houver perigo de continuação da atividade criminosa ou se tal se mostrar imprescindível à proteção da vítima.
Por fim, dada a conduta persistente do arguido, e urgência no impedimento de tal conduta, não se afigura adequada a realização de interrogatório judicial mediante notificação em liberdade.
Resulta evidente que, in casu, a detenção fora de flagrante delito do arguido, para aplicação de medida de coação mais gravosa do que o TIR, se afigura imprescindível para a necessária proteção da vítima, garantindo a sua segurança, liberdade e paz.».

2.4. Colhem-se nos autos e do teor da certidão que os instrui, os seguintes elementos com relevância para a decisão da causa:
a) A detenção do arguido fora de flagrante delito foi ordenada pelo MP e teve lugar após a dedução da acusação pública, na qual é imputada ao arguido, a prática, como autor material, de um crime de violência doméstica, p. e p. pelo artigo 152º, n.ºs 1, al. a), 4 e 5, do Código Penal;
b) Na mencionada acusação, deduzida em 26/05/2026, relativamente ao estatuto coativo do arguido, o MP consignou o seguinte: «Porque se nos afigura serem inexistentes, por ora, quaisquer das situações de perigo tipificadas no art.º 204.º do Código de Processo Penal, requer-se que o arguido aguarde os ulteriores termos do processo com sujeição a termo de identidade e residência, nos termos do disposto no art.º 196.º do Código de Processo Penal, já prestado nos autos
c) No dia 06/06/2025, o MP proferiu despacho determinando a detenção do arguido fora de flagrante delito, por entender, que «surgiram indícios fortes da ocorrência de factualidade delituosa similar, posteriores à dedução da acusação, que impõe revisão e agravamento do estatuto coativo do arguido.»;
d) No despacho mencionado em c), o MP narrou, nos pontos 40. a 42. e 53. a 54., factos alegadamente ocorridos no dia 02/06/2025, supervenientes à dedução da acusação e como elementos de prova, no que tange a esses factos indicou o “Requerimento de 03/06/2025”;
e) Também nesse despacho o MP enunciou as razões pelas quais entendeu justificar-se a detenção do arguido fora de flagrante delito e não ser adequada a sua notificação, em liberdade, para a realização de interrogatório judicial;
f) O aludido requerimento de 03/06/2025 foi apresentado pela ofendida/vítima L;
g) Aquando da detenção do arguido, em observância do determinado nos referenciados mandados, foi-lhe entregue cópia do despacho do MP que ordenou a respetiva emissão.

2.5. Apreciação do mérito do recurso
Tal como acima referimos a questão suscitada no recurso e submetida à apreciação desta Relação é a de saber se, no despacho recorrido, foi feita uma errada interpretação do artigo 141º, n.º 1, do CPP, ao indeferir-se a realização de interrogatório judicial do arguido detido, para aplicação de medida de coação para além do termo de identidade e residência, requerida pelo MP, por não constar desse requerimento a indicação dos meios de prova.
Vejamos:
O Mmº. Juiz a quo indeferiu a realização de interrogatório judicial do arguido detido, requerida pelo Ministério Público, com vista à aplicação de medida de coação, para além do TIR, já prestado nos autos, com fundamento em não constar do correspondente requerimento, apresentado pelo MP, a indicação dos meios de prova e, em face dessa omissão, ser impossível observar o dever de informação ao arguido sobre as razões da sua detenção, nos termos previstos no artigo 141º, n.º 1, aplicável ex vi do artigo 144º, n.º 1, ambos do CPP.
O Ministério Público/recorrente sustenta não ter de constar, expressamente, do requerimento em causa a indicação dos meios de prova, existindo, no caso em apreço, tal menção, através da remissão para os mandados de detenção, tendo sido entregue ao arguido cópia do despacho em que se ordenou a emissão desses mandados, pelo que o arguido se encontrava em condições de poder exercer o contraditório, além de constarem do processo essas provas, cabendo ao JIC informar o arguido em conformidade e, em última instância, podendo dirigir ao MP o convite para que as indicasse. Donde, defende o recorrente, ter sido feita, no despacho recorrido, uma errada interpretação do artigo 141º, n.º 1, do CPP.
Apreciando:
Relativamente ao primeiro interrogatório judicial de arguido detido, dispõe o artigo 141º, n.º 1, do CPP, que: «O arguido detido que não deva ser de imediato julgado e interrogado pelo juiz de instrução, no prazo máximo de quarenta e oito horas após a detenção, logo que lhe for presente com a indicação circunstanciada dos motivos da detenção e das provas que a fundamentam.».
O dever de informação a prestar ao arguido e que impende sobre o JIC, em 1.º interrogatório judicial de arguido detido, bem assim como noutros interrogatórios subsequentes, ex vi do disposto no artigo 144º, n.º 1, do CPP, tem o conteúdo definido nas diversas alíneas do n.º 4 do artigo 141º do CPP. Esse dever de informação, contempla, nomeadamente, os motivos da detenção, os concretos factos imputados e os elementos do processo que os indiciam (cf. artigo 141º, n.º 4, alíneas c), d) e e), do CPP).
A “indicação circunstanciada dos motivos da detenção e das provas que a fundamentam”, a efetuar pelo juiz ao arguido, em observância do disposto no n.º 1 do artigo 141º do CPP, deve ser entendida como aquela que permite ao juiz informar o arguido nos termos previstos nas alíneas c), d) e e), do n.º 4 do artigo 141º do CPP.
Tratando-se de uma situação em que esteja em causa a aplicação de uma medida de coação diversa do TIR, tendo sido já deduzida acusação contra o arguido e, por essa via, delimitado o objeto do processo, o dever de informação a prestar pelo juiz, ao arguido, no interrogatório judicial, que tenha lugar para o efeito, nos termos previstos no artigo 141º, n.ºs 1 e 4, aplicável ex vi do artigo 144º, n.º 1, ambos do CPP, com as devidas adaptações, mormente se o arguido estiver inteirado da acusação contra si deduzida, deve contemplar essencialmente os concretos factos e elementos de prova que levam a sustentar a verificação de algum dos perigos previstos no artigo 204º, n.º 1, do CPP, pressuposto de aplicação de qualquer medida de coação, à exceção do termo de identidade e residência.
O dever de informação por parte do juiz, nos termos sobreditos, visa assegurar o direito de defesa ao arguido, facultando-lhe o seu efetivo exercício e o direto ao contraditório, constitucionalmente consagrados (cf. artigo 32º, n.º 1 e 5 e 28º, n.º 1, ambos da CRP).
Volvendo ao caso dos autos, estamos perante uma situação em que foi ordenada, pelo Ministério Público, a detenção fora de flagrante delito, do arguido, em momento posterior à dedução da acusação pública, tendo por finalidade a sua apresentação ao JIC para aplicação de medida de coação (cf. artigos 254º, n.º 1, al. a), parte final e 194º, n.º 1, ambos do CPP).
Está em causa saber se o Sr. Juiz de Instrução Criminal a quo, em face do requerimento do MP que determinou a apresentação do arguido, detido fora de flagrante delito, a interrogatório judicial, foi confrontado com a impossibilidade de poder comunicar ao arguido as provas que fundamentam a sua detenção, por se verificar omissão da sua indicação pelo Ministério Público e tornando, consequentemente, inviável a aplicação de medida(s) de coação, para além do TIR já prestado.
Salvo o devido respeito pela posição contrária defendida no despacho recorrido, entendemos que enunciada questão merece resposta negativa, pelas razões que passamos a expor.
O artigo 141º, n.º 1, do CPP, enunciado no despacho recorrido e que o Mm.º Juiz quo considerou não ter sido respeitado pelo MP, no requerimento apresentado, no segmento que para o caso concreto releva, refere-se à “indicação circunstanciada dos motivos da detenção e das provas que a fundamentaram”.
Essa indicação circunstanciada, em nosso entender, tem o sentido e alcance supra definidos.
Reitera-se que estando em causa a apreciação de requerimento do MP para aplicação ao arguido, detido fora de flagrante delito, de uma medida de coação diversa do TIR, tendo sido já deduzida acusação pública e, por essa via, delimitado o objeto do processo, o dever de informação a prestar pelo juiz, ao arguido, no interrogatório a realizar para o efeito, nos termos previstos no artigo 141º, n.ºs 1 e 4, aplicável ex vi do artigo 144º, n.º 1, ambos do CPP, com as devidas adaptações, mormente se o arguido estiver inteirado da acusação contra si deduzida, deverá contemplar, essencialmente, os concretos factos e elementos de prova que levam a sustentar a verificação de algum dos perigos previstos no artigo 204º, n.º 1, do CPP, pressuposto de aplicação de qualquer medida de coação, à exceção do termo de identidade e residência.
Analisado o requerimento formulado pelo MP, supra transcrito, em 2.3., dele resulta ter sido determinada a apresentação dos autos e do arguido «M (melhor identificado no auto de detenção) ao M.mo Juiz de Instrução para 1.º Interrogatório Judicial de Arguido Detido a quem se requer a aplicação medida de coacção, para além do T.I.R. já prestado, com os fundamentos que constam do mandado de detenção (…) - nosso sublinhado -.
Dos mandados de detenção em apreço consta, além do mais, ter sido determinado pelo MP, que o arguido fosse notificado do conteúdo do despacho em que foi ordenada a emissão desses mandados, com a entrega da cópia de tal despacho, o que foi cumprido.
No despacho em que foi ordenada a emissão dos mandados de detenção o MP narrou, nos pontos 40. a 42. e 53. a 54., factos alegadamente ocorridos no dia 02/06/2025, supervenientes à dedução da acusação e como elementos de prova, no que tange a esses factos indicou o “Requerimento de 03/06/2025”. Também nesse despacho o MP enunciou as razões pelas quais entendeu justificar-se a detenção do arguido fora de flagrante delito e não ser adequada a sua notificação, em liberdade, para a realização de interrogatório judicial.
Neste quadro, afigura-se-nos inequívoco ter o MP, no requerimento que foi objeto de apreciação no despacho recorrido e, contrariamente ao entendimento sufragado pelo Mm.º Juiz a quo, indicado os meios de prova fundamentadores da detenção do arguido, fazendo-o por remissão para os mandados de detenção, os quais foram acompanhados da cópia do despacho em que foi ordenada a respetiva emissão, cuja entrega ao arguido foi efetuada, no ato da sua detenção.
Concluímos, assim, que o requerimento formulado pelo MP, de apresentação do arguido, para realização de interrogatório judicial, com vista à aplicação de medida de coação, para além do TIR, remetendo para os fundamentos constantes dos mandados de detenção e, por via do teor destes, para o despacho em que foi determinada a respetiva emissão, observou o disposto no n.º 1 do artigo 141º do CPP.
Na concreta situação descrita, não se alcança como o Mm.º JIC a quo pudesse considerar não estarem reunidos os requisitos, por falta de indicação pelo MP, no requerimento apresentado, dos elementos de prova indiciadores dos factos imputados, tendentes a poder informar o arguido, nos termos legalmente exigidos e tendo em vista a aplicação de medida de coação, para além do TIR, já prestado.
Não se verifica, por isso, no requerimento do MP, a omissão que determinou o indeferimento, no despacho recorrido, da realização de interrogatório judicial do arguido, com vista à aplicação de medida de coação, pelo que, não pode manter-se o despacho recorrido.
Termos em que, dando provimento ao recurso, se revoga o despacho recorrido, determinando-se que seja substituído por outro que determine a realização de interrogatório judicial ao arguido, para os efeitos requeridos pelo Ministério Público.
Tendo, entretanto, sido declarada aberta a fase de instrução, requerida pelo arguido e, nesse âmbito, determinado, pelo Mm.º JIC, o interrogatório do arguido, poderá, eventualmente, nessa ocasião, o arguido ser também interrogado tendo em vista a finalidade pretendida pelo MP, isto sem prejuízo, de, no caso de se entender que tal se justifica, se designar outra data, prévia, para o efeito.

3. DECISÃO
Nestes termos, acordam os Juízes da Secção Criminal (2.ª Subsecção) do Tribunal da Relação de Évora, em conceder provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público e, em consequência:
Revoga-se o despacho recorrido, o qual deve ser substituído por outro que determine a realização de interrogatório judicial ao arguido, para os efeitos requeridos pelo Ministério Público.
Sem tributação.
Notifique.

Évora, 30 de setembro de 2025
Fátima Bernardes
Fernando Pina
Henrique Pavão